Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 613/2023-T
Data da decisão: 2024-01-24  IRS  
Valor do pedido: € 16.661,83
Tema: IRS - Inutilidade superveniente da lide - Anulação do acto tributário impugnado.
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SUMÁRIO: Atendendo a que, na pendência dos presentes autos de pronúncia arbitral, a Requerida anulou administrativamente o acto de liquidação de IRS impugnado e o Requerente manifestou não ter interesse no prosseguimento do processo arbitral quanto ao pedido de juros indemnizatórios, verifica-se a inutilidade superveniente da lide, da qual decorre a extinção da instância sem apreciação do mérito da causa.

DECISÃO ARBITRAL

«A... », com o número de identificação fiscal ... e domicílio na Rua..., ... ..., ...-... São Paulo, Brasil (doravante designada por “Requerente”), solicitou a constituição de Tribunal Arbitral e deduziu pedido de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e no artigo 10.º, ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”).

I.       Relatório

O pedido formulado pelo Requerente consiste na anulação parcial, no valor de € 16.661,83, da nota de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2022 ... referente ao ano de 2018 e no pagamento de juros indemnizatórios.

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante referida por “AT” ou “Requerida”).

O Tribunal foi regularmente constituído em 8 de Novembro de 2023 e é competente em razão da matéria. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas.

Não foram identificadas nulidades ou irregularidades.

  1. Decisão

Em 2018 o Requerente apurou mais-valias decorrentes da alienação de valores mobiliários, não tendo, por lapso, declarado tais ganhos. Consequentemente, a AT submeteu oficiosamente uma declaração de rendimentos, na qual foi inscrita uma mais-valia de € 53.377,90 de que resultou a emissão da nota de liquidação de IRS, controvertida nos autos, com imposto a pagar no valor de € 16.903,09.

Notificado do acto tributário, o Requerente submeteu uma declaração de IRS de substituição, na qual apurou uma mais-valia de € 861,66. E, paralelamente, apresentou reclamação graciosa contra a referida liquidação, na qual disponibilizou um documento bancário que, sintetizando os valores mobiliários alienados em 2018 e os correspondentes valores de aquisição e de alienação, suporta o valor da mais-valia por si apurada.

E dado que o IRS a pagar pelo Requerente se cingiria a € 241,26, o pedido formulado na reclamação graciosa consistiu na anulação parcial do acto de liquidação no valor de € 16.661,83. Tendo o valor liquidado sido objecto de pagamento, o Requerente solicitou a devolução desta última importância e o pagamento de juros indemnizatórios.

Na ausência de resposta da AT no prazo disponível para o efeito, o Requerente considerou a reclamação graciosa como tacitamente indeferida e apresentou pedido de pronúncia arbitral.

Notificada para apresentação de defesa e junção do processo administrativo, a Requerida submeteu a sua resposta, na qual alegou a excepção de inutilidade superveniente da lide. Concretamente, demonstrou que o Serviço de Finanças Lisboa ..., por despacho de 27 de Outubro de 2023, deferiu a reclamação graciosa nos termos pretendidos pelo Requerente.

Assim, e tendo a AT reconhecido a mais-valia nos termos declarados pelo Requerente,  foi emitida a liquidação de IRS n.º 2023..., datada de 3 de Novembro de 2023, que revogou o acto tributário impugnado.

Quanto aos juros indemnizatórios, a Requerida alega que, atenta a omissão de envio da declaração de IRS por parte do Requerente, os mesmos não se mostravam devidos por inexistência de erro imputável à AT.

Notificado para se pronunciar sobre a excepção invocada pela AT e o seu interesse na continuidade do processo arbitral, o Requerente informou considerar satisfeita a sua pretensão quanto à liquidação impugnada e que não pretende o prosseguimento do pedido de pronúncia arbitral quanto aos juros indemnizatórios.

 

Nos termos do n.º 3 do artigo 168.º do Código de Procedimento Administrativo, a anulação administrativa de um acto que tenha sido objecto de impugnação, pode ter lugar até ao encerramento da discussão (conforme a alínea e) do n.º 3 do artigo 604.º do Código de Processo Civil).

No caso em apreciação, a AT praticou um acto de anulação administrativa de que resulta a destruição, com efeito retroactivo, do acto impugnado com fundamento em invalidade (n.º 3 do artigo 171.º do Código de Procedimento Administrativo).

A anulação administrativa é tempestiva, visto ter sido praticada dentro do prazo para apresentação de resposta em processo arbitral. E estando satisfeita a pretensão do Requerente, a anulação conduz à inutilidade superveniente da lide (conforme a alínea e) do artigo 277.º do Código de Processo Civil).

A tudo isto acresce que o tribunal não tem de se pronunciar sobre o reembolso do imposto, dado que o mesmo é uma consequência da anulação do acto tributário, atento o dever da AT na reconstituição da situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado (artigo 43.º da Lei Geral Tributária).

Termos em que se decide julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

 

  1. Valor do Processo

Fixa-se ao processo o valor de € 16.661,83, indicado pelo Requerente, respeitante ao montante da liquidação de IRS cuja anulação pretende (valor da utilidade económica do pedido), e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

  1. Custas

Fixa-se as custas no montante de € 1.224,00 (mil duzentos e vinte e quatro euros), a suportar integralmente pela Requerida[1], por decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT.

24 de Janeiro de 2024

 

José Luís Ferreira

 

 

 



[1] De acordo com o Despacho de Retificação de 2024-02-02.