SUMÁRIO:
I - Enquanto a herança se mantiver indivisa, cada herdeiro é titular de um direito a uma quota de uma massa de bens, que constitui um património autónomo e não de um direito individual sobre cada um dos bens que a integram.
II - A alienação de quinhão hereditário, mesmo que a herança seja apenas constituída por bens imóveis, não pode considerar-se “alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis”, pelo que não estão sujeitos a IRS os eventuais ganhos resultantes dessa alienação.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
A...– NIF ... representada por B..., NIF..., residente na ..., n.º... –... ...-...Venda do Pinheiro, na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito, vem, nos termos do artigo 10.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, apresentar pedido de pronúncia arbitral, tendo por objecto a liquidação de IRS n.º 2022..., de 22-12-2022, referente ao ano de 2020, no valor de € 50.361,99 (cinquenta mil e trezentos e sessenta e um euros e noventa e nove cêntimos), bem assim o indeferimento da reclamação graciosa por si apresentada, em 20/04/2023 - RG ...2023... .
Peticiona anulação da liquidação de IRS acima identificada, com as consequências legais.
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.
Em 18 de Julho de 2023, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e, automaticamente, notificado à AT.
Em conformidade com o disposto nos artigos 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o árbitro deste Tribunal Arbitral, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar (artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e c), do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD).
O Tribunal Arbitral ficou constituído em 25 de Setembro de 2023.
Em 30 de Outubro de 2023, a Requerida apresentou Resposta e juntou o processo administrativo.
A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) defendeu-se por impugnação, concluindo que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente, com as legais consequências.
Por despacho de 08 de Novembro de 2023, após a Requerente ter prescindido da prova testemunhal, dispensou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e determinou-se a prossecução dos autos com a produção de alegações escritas, por prazo simultâneo de 15 dias, nos termos do art. 120.º do CPPT, ex vi art. 29.º, n.º 1, a), do RJAT.
Apenas a Requerida ofereceu alegações, nas quais reiterou o entendimento já anteriormente expresso.
II. Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria para conhecer das liquidações aqui postas em crise, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
A acção é tempestiva, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, de acordo com a remissão operada para o artigo 102.º, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”).
III. Fundamentação de Facto
1. Matéria de Facto Provada
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente foi notificada para proceder à correcção da sua declaração de IRS de 2020 por forma a alterar o valor declarado em sede de mais valias - Anexo G -, designadamente o valor de realização do artigo U-... (...), imóvel constante da descrição..., da Freguesia da ..., na CRP de Lisboa - Docs. n.ºs 3 e 5 juntos com o PPA, que aqui se dão por reproduzidos.
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A Requerente declarou a alienação daquele imóvel, na sua declaração de IRS Modelo 3, mas o que transmitiu foi o quinhão hereditário do qual esse imóvel fazia parte, concretamente o quinhão hereditário pertencente a si e a seu falecido cônjuge, na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C..., falecida em 01/03/1985, e o quinhão hereditário pertencente a D..., na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C..., na qualidade de herdeira final deste, como consta de escritura pública outorgada no dia 18 de Junho de 2022 - Doc. n.º 4 junto com o PPA, que aqui se dá por reproduzido.
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A aquisição do mencionado quinhão hereditário foi registada na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, pela Ap. ..., de 2020/07/10, a favor da compradora E..., S.A., conforme certidão permanente anexa à petição - Doc. n.º 5 junto com o PPA, que aqui se dá por reproduzido.
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A liquidação impugnada - liquidação de IRS n.º 2022..., de 22/12/2022 - resulta da correção efetuada à declaração de IRS ...-2020-...-..., realizada no âmbito do procedimento de análise de divergências de IRS 2020 nº..., ao abrigo do despacho do Chefe de Finanças, datado de 15/12/2022 – Docs. n.ºs 1 e 2 juntos com o PPA e PA junto pela Requerida, que aqui se dão por reproduzidos.
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A Reclamação Graciosa apresentada pela Requerente - RG ...2023... – foi indeferida por despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Mafra, ao abrigo de delegação de competências do Director de Finanças de Lisboa, proferido em 13-06-2023, notificado pelo Ofício n.º ..., da mesma data, o qual se integra no citado Doc. n.º 2 e aqui se dá por reproduzido.
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O presente PPA foi apresentado em 17-07-2023.
2. Factos não Provados
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
3. Motivação da Decisão de Facto
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.
A convicção do Tribunal fundou-se na análise dos documentos existentes nos autos, nomeadamente o PA junto pela Requerida e os anexados com o PPA, conforme está refectido em relação a cada facto considerado provado.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
1. QUESTÃO A DECIDIR
A única questão a resolver consiste em ajuizar sobre se as alienações do quinhão hereditário, quando este inclua bens imóveis, se encontram abrangidas ou não pelo disposto na alínea a) do nº 1 do artº 10º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.
2 - APRECIAÇÃO
Alega a Requerente, em síntese:
- As mais-valias resultantes da alienação de um quinhão hereditário, como acontece no caso em apreço, não são sujeitas a incidência de IRS, dado que o conceito de quinhão hereditário não faz parte da alienação onerosa de direito real sobre bens imóveis, como tem sido jurisprudência pacífica e aceite.
- Recentemente, a 23.12.2022 foi prolatada uma decisão arbitral do CAAD no processo n.º 247/2022-T onde consta do sumário o seguinte:
“As mais-valias resultantes da alienação do direito ao quinhão hereditário constituído por imóveis não se encontram abrangidas pela norma de incidência do artigo 10º, nº 1, alínea a) do CIRS, por não integrar o conceito de alienação onerosa do direito real sobre bens imóveis, uma vez que não é transmitido um direito real sobre os bens da herança, mas “um direito abstratamente considerado e idealmente definido” de uma quota-parte na herança ilíquida e indivisa.”
- Reproduz-se parte da fundamentação do Acórdão proferido pelo SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:
“Por isso, não tendo ocorrido uma alienação de bens imóveis, uma vez que a Requerente não detém a propriedade de bens imóveis, mas apenas um direito ao quinhão hereditário desses bens imóveis, não estamos perante uma alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis a que se refere o artigo 10.º, nº 1, alínea a) do CIRS. Tal como é referido no acórdão do STA de 28.01.2015, processo n.º 0450/14, “os ganhos resultantes da alienação de quinhão hereditário constituído também por imóveis não estão abrangidos pela incidência do art. 10º nº 1 al. a) do CIRS, conforme o Supremo Tribunal Administrativo já fixou jurisprudência no aresto proferido em 25/11/2009, no processo n.º 0975/09”.”
A Autoridade Tributária (requerida) contrapõe, resumidamente:
- A única questão sub judice, prende-se como o facto de se determinar se as alienações do quinhão hereditário, se encontram abrangidas ou não pelo disposto na alínea a) do nº 1 do artº 10º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.
- Esta norma determina que: “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário.”.
- A disposição dos bens da herança não está dependente de uma partilha, desde que essa disposição seja efetuada conjuntamente por todos os herdeiros, conforme o prevê o disposto no nº 1 do artº 2091.º do CC: “os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros”.
- Nos termos do disposto no artigo 2124.º do C.C. a “(…) alienação de quinhão hereditário está sujeita às disposições reguladoras do negócio jurídico que lhe deu causa”, tendo, cfr. n.º do artigo 2126.º do mesmo Código, de ser “(…) feita por escritura pública ou documento particular autenticado se existirem bens cuja alienação deva ser efetuada por uma dessas formas”, como sucede na alienação de bens imóveis, artigo 875.º do C.C, que ocorreu no caso sub judice.
- Tal como estabelece o artigo 2128.º do C.C., o adquirente do “(…) quinhão hereditário sucede nos encargos respetivos” e segundo decorre do artigo 2119.º do C.C, feita a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único dos bens que lhe foram atribuídos.
- Do plasmado no artigo 1404.º do C.C. “As regras da compropriedade são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros direitos (…)”, afigurando-se pacífico que a alienação de quotas em propriedade de bens imóveis é subsumível à previsão contida na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS e que as suas regras são aplicáveis às situações de comunhão, como sucede com os quinhões hereditários, e, bem assim, é também comummente aceite a retroatividade da partilha, não se vislumbrando, assim, qual o fundamento para não se considerar as alienações de quinhões hereditários contendo imóveis como abrangidas por aquela previsão legal.
- A alienação de quinhões hereditários quando nestes se compreendam bens imóveis surge expressamente prevista como sujeita a IMT na parte final da alínea c) do n.º 5 do artigo 2.º do CIMT, sendo o valor relevante para efeitos de liquidação deste tributo que será considerado para efeitos de determinação de valor aquisitivo em sede de IRS.
- Como resulta do n.º 3 do artigo 11.º da LGT, na determinação do sentido da norma, in casu, a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS, o intérprete deve ter presente a substância económica dos factos tributários, a qual não varia consoante um imóvel seja transmitido de “per si” ou se inserido num quinhão hereditário.
- O quinhão hereditário detido pela Requerente traduz-se no direito de propriedade sobre uma quota do imóvel, na qualidade de herdeira adquiriu o domínio e posse dos bens da herança no momento da sua aceitação (Artigo 2050.º do CC), sendo evidente que a alienação do direito ao quinhão hereditário constituído também por bens imóveis cabe no âmbito da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS.
- Assim, o presente negócio jurídico, encontra-se sujeito a mais-valias tal como previsto na alínea a) do nº 1 do artº 10º do CIRS, sendo imputado como rendimento da categoria G, a proporção da respetiva quota, nos termos do disposto no artigo 19.º do CIRS.
Cumpre decidir.
Para o que aqui releva, o CIRS, no seu artigo 10.º, sob a epígrafe Mais-Valias, estabelece o seguinte:
“1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis;
(...)”
E a questão que se coloca é, como visto, a de determinar se eventuais ganhos emergentes da alienação de quinhão hereditário, quando este integre bens imóveis, pode ou não assimilar-se à alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis, para efeitos de tributação em mais-valias, à luz do preceituado naquele inciso legal.
Pode adiantar-se, desde já, que a questão a dirimir está plúrima e unanimemente discutida na jurispridência superior no sentido negativo, ou seja, de que a alienação de quinhão hereditário composto por bens imóveis, não constitui alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis.
Do elenco jurisprudencial destacam-se os arestos seguintes:
- do STA, de 25-11-2009, no P. 0975/09,
“I – Enquanto a herança se mantiver indivisa, cada herdeiro é titular de um direito a uma quota de uma massa de bens, que constitui um património autónomo e não um direito individual sobre cada um dos bens que a integram.
II – Assim, porque a alienação (no caso dos autos, permuta com outros bens de terceiro) de quinhão hereditário, mesmo que a herança seja apenas constituída por bens imóveis, não pode considerar-se “alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis”, não estão sujeitos a IRS os eventuais ganhos resultantes dessa alienação.
III – A impugnação judicial deduzida na sequência de indeferimento de reclamação graciosa e com o mesmo fundamento desta, tem por objecto a anulação do acto tributário.
IV – Deste modo, julgando o juiz procedente a impugnação por ilegalidade do acto tributário, deve anular esse acto e não anular o despacho de indeferimento da reclamação graciosa e ordenar a sua substituição por outro que, reconhecendo a ausência de norma de incidência acima exposta, decida a reclamação”.
- do STJ, de 09-12-2012, no P. 2752/07.8TBTVD.L1. S1,
“1. A transmissão do direito à meação e bem assim do direito ao quinhão hereditário fazem operar a passagem para a esfera jurídica dos compradores o conteúdo de um direito abstractamente considerado e idealmente definido, como expressão patrimonial ainda incerta e cujas demarcação e abrangência também se patenteiam inseguras.
2. O que aos adquirentes destes direitos fica atribuída é a possibilidade de poderem exercer naquela universalidade jurídica um seu direito próprio perante os restantes interessados no "direito à meação” e no “quinhão hereditário”, designadamente legitimando-os a, com vista a concretizar esta sua prerrogativa, se e quando assim o entenderem, darem os passos necessários tendentes a haver para si a quota-parte dos bens determinados que integram tal herança.
3. Enquanto se não constatar a efectiva titularidade de algum (ou alguns) bem concreto que constitui tal universalidade jurídica, os protegidos com esta venda não desfrutam do atinente direito sobre certo e determinado bem.
(...)”
- do STJ, de 30-01-2013, no P. 1100/11.7TBABT.E1.S1,
“I - Tanto a jurisprudência, como a mais abalizada doutrina da especialidade, apontam decisivamente no sentido de que só se pode dividir os bens da herança de que se seja proprietário, ou seja, que tenham sido atribuídos aos herdeiros em partilha previamente realizada.
II - A ratio de tal solução é muito simples: é que, até à partilha, os co-herdeiros de um património comum, adquirido por sucessão mortis-causa, não são donos dos bens que integram o acervo hereditário, nem mesmo em regime de compropriedade, pois apenas são titulares de um direito sobre a herança (acervo de direitos e obrigações) que incide sobre uma quota ou fracção da mesma para cada herdeiro, mas sem que se conheça quais os bens concretos que preenchem tal quota.
III - É pela partilha (extrajudicial ou judicial e, neste caso, através do processo de inventário-divisório) que serão adjudicados os bens dessa universalidade que é herança e que preencherão aquelas quotas.
Por isso, assim se ponderou no aresto deste Supremo Tribunal, de 04-02-1997 supra citado: «A compropriedade pressupõe um direito de propriedade comum sobre uma coisa ou bem concreto e individualizado, ao invés do que sucede na contitularidade do direito à herança que recai obre uma universalidade de bens, ignorando-se sobre qual ou quais deles o direito hereditário se concretizará».
IV - O Ilustre Professor de Coimbra, Doutor Rabindranath Capelo de Sousa assim ensina nas sua Lições de Direito das Sucessões: «Nos casos em que haja lugar à partilha da herança, segundo a opinião dominante, o domínio e posse sobre os bens em concreto da herança só se efectivam após a partilha, uma vez que até aí a herança constitui um património autónomo nada mais tendo os herdeiros do que o direito a uma quota parte do património hereditário» ( Lições de Direito das Sucessões, pg. 185).
V - Por sua vez, outro Professor de Coimbra, o Doutor Pereira Coelho, assim escreveu nas sua obra de Direito das Sucessões: «Não se trata uma vulgar compropriedade entendida como participação na propriedade de bens concretos e determinados. Pelo contrário, contitularidade do direito à herança significa tanto como um direito a uma parte ideal, não de cada um dos bens de que se compõe a herança, mas sim da própria herança em si mesma considerada» (Pereira Coelho, Direito das Sucessões, 2ª ed. 1966-1967).”[1]
Da força esmagadora desta corrente jurisprudencial e doutrinal, à qual se adere sem qualquer reserva, deve concluir-se que a alienação de quinhão hereditário composto por bens imóveis, não constitui alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis, designadamente para efeitos do disposto na alínea a) do nº 1 do artº 10º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares. Nessa medida, cumpre declarar a procedência do pedido formulado pela Requerente.
V. Decisão
Pelo exposto, decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral e, em consequência, determinar:
- I) a anulação da liquidação de IRS[2] aqui impugnada, com o n.º 2022..., de 22.12.2022, na quantia de € 50.361,99 (cinquenta mil trezentos e sessenta e um euros e noventa e nove cêntimos);
- II) a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira aqui requerida nas custas do processo.
VI. Valor do Processo
Fixa-se o valor do processo em € 50.361,99 (cinquenta mil trezentos e sessenta e um euros e noventa e nove cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e do artigo 306.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).
VII. Custas
Custas no montante de 2.142,00 €, a cargo da Requerida, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.º 5, do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 18 de Janeiro de 2024
O Árbitro,
(A. Sérgio de Matos)
[1] No mesmo sentido v. também os acórdãos do STA: de 05-02-2015, no P. 01808/13; de 15-06-2016, no P. 01863/13; de 28-01-2015, no P. 0450/14; de 12-02-2020, no P. 0360/12.0BECBR 449/18 e de 07-04-2021, no P. 077/17.0BEPDL. Bem asssim, as decisões arbitrais prolatadas nomeadamente nos P. 627/2017-T e 247/2017-T.
[2] De acordo com o Despacho de Retificação de 2024-01-25.