Decisão Arbitral
Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. João Taborda da Gama e Professor Doutor Júlio Tormenta (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 12-09-2023, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., SUCURSAL EM PORTUGAL, sociedade com sede na Rua ..., ..., ...-... Lisboa, titular do número de pessoa coletiva e de contribuinte ..., doravante abreviadamente designada por "Requerente", veio, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária doravante designado como "RJAT"), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista:
a) a anulação da decisão de indeferimento que recaiu sobre o pedido de revisão ([1] ) que teve por objeto a autoliquidação de IVA referente ao período de Dezembro de 2018;
b) ser a autoliquidação em causa também anulada e corrigida, por erro no seu preenchimento e ilegalidade da percentagem de dedução de 26% então considerada, sendo aplicada a percentagem de dedução, resultantes do cálculo correto do pro rata, de 89% e a consequente dedução adicional de IVA, no montante de € 398.550,35, o que determina o reembolso do imposto entregue a mais pela Requerente, nesse montante;
c) ordenar-se o pagamento à Requerente dos juros indemnizatórios, devidos nos termos do artigo 43.º da LGT, por dedução inferior à devida, dos aludidos montantes, com as demais consequências legais.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 07-07-2023.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 25-08-2023, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 12-09-2023.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência dos pedidos.
Em 08-11-2023, realizou-se uma reunião, em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades e não são suscitados obstáculos à apreciação do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
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A Requerente é uma instituição de crédito;
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A Requerente não desenvolve actividade bancária geral, mas apenas realiza operações de crédito de veículos, aluguer de longa duração de veículos (ALD) e locação financeira de veículos, associadas a determinadas marcas, designadamente Renault e Dacia (depoimento da testemunha B...);
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Nos contratos de aluguer de veículos a Requerente adopta o modelo que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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Nos contratos de locação financeira a Requerente adopta o modelo que consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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Nos contratos de crédito de veículos a Requerente adopta o modelo que consta do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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No Ofício-Circulado n.º 30.108, de 30-01-2009, do Gabinete do Subdirector-Geral da área de Gestão do IVA, publicado em
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informação_fiscal/legislação/instruções_administrativas/Documents/OficCirc_30108.pdf, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais, o seguinte:
7. Face à actual redacção do artigo 23.º, a afectação real é o método que, tendo por base critérios objectivos de imputação, mais se ajusta ao apuramento do IVA dedutível nos bens e serviços de utilização mista.
8. Nesse sentido, considerando que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do prorata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação”, os sujeitos passivos que no âmbito de actividades financeiras pratiquem operações de Leasing ou de ALD, devem utilizar, nos termos do n.º2 do artigo 23º do CIVA, a afectação real com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades.
9. Na aplicação do método da afectação real, nos termos do número anterior e sempre que não seja possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD. Neste caso, a percentagem atrás referida não resulta da aplicação do n.º 4 do artigo 23º do CIVA.
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A Requerente adoptou, aquando do cálculo da percentagem de dedução definitiva do ano de 2018, plasmada na respetiva declaração periódica n.º..., entregue em 04-02-2019 (Documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), o procedimento previsto naquele Ofício-Circulado n.º 30.108, tendo apurado um coeficiente de imputação específico de 26%, o qual não teve em consideração, quer no numerador, quer no denominador da fracção, a “componente de amortização de capital” associada às rendas de locação financeira, que se refere naquele Ofício-Circulado (depoimento da testemunha B...);
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Em 03-02-2023, a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa que teve por objeto essa autoliquidação, nos termos que constam do processo administração, cujo teor se dá como reproduzido, em que defendeu que deveria ter calculado a percentagem de dedução definitiva de 2018, aplicável ao IVA incorrido nos designados recursos comuns da sua atividade, nos termos do n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA, incorporando no cálculo o valor da “amortização financeira” das rendas de Leasing e ALD, do que resultaria o apuramento, com referência ao ano de 2018, de uma percentagem de 89%, e não de 26%;
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O pedido de revisão oficiosa foi indeferido por despacho de 05-04-2023, proferido pelo Chefe de Divisão de Serviço Central da Unidade dos Grandes Contribuintes, com a fundamentação da informação que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
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Na fundamentação do despacho de indeferimento refere-se, além do mais, o seguinte:
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No entanto, não podemos abstrair-nos do facto dessas operações de locação (leasing e ALD) consubstanciarem uma modalidade de crédito (entre outras), pelo que a atividade da entidade locadora e, em substância, a concessão de financiamento, cuja contrapartida remuneratória e constituída, essencialmente, por juros e outros encargos incluídos nas rendas.
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A esse propósito, cumpre realçar que, um dos objetivos do legislador nesta matéria, foi assegurar o cumprimento do princípio da neutralidade fiscal, na vertente de princípio da igualdade que, no caso concreto, se consubstancia no facto de ser assegurado um tratamento fiscal equivalente, no sentido de igual onerosidade, em relação aquele que adquire um bem através de um contrato de locação financeira, face a outra pessoa que o adquire diretamente.
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Ora, o facto do valor integral da renda, pago pelo locatário ao locador, constituir o valor tributável sobre o qual incidira IVA tal não significa que a parte integrante da renda, correspondente a amortização financeira ou do capital tenha de ser incluída no computo do apuramento da percentagem de dedução, conjuntamente com a parte correspondente aos juros e outros encargos.
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Desde logo porque, a renda constitui o pagamento do serviço de concessão de financiamento ao locador, sendo composta por duas partes: capital ou amortização financeira, que mais não e que o reembolso da quantia "emprestada" e juros, acrescidos de eventuais encargos, que constituem a remuneração do locador.
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Note-se que, na perspetiva da operação de locação enquanto operação de concessão de financiamento, o valor de aquisição do bem objeto de contrato de locação corresponde ao capital financiado que constitui a componente de amortização financeira na renda liquidada pelo locador ao locatário.
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Sendo que, no momento da aquisição desse mesmo input, o sujeito passivo (locador) exerceu o direito a dedução integral do montante do IVA liquidado pelo fornecedor do bem objeto do contrato de locação, por via do método da imputação direta.
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Razão pela qual, não pode deixar de ser excluída do calculo da percentagem de dedução, sendo-lhe aplicável o método de afetação real com recurso a um critério de imputação objetivo, a parte da amortização financeira incluída na renda, uma vez que esta mais não e do que a restituição do capital financiado/investido para a aquisição do bem.
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Logo, a luz do princípio da neutralidade em que assenta o sistema deste imposto, fácil se torna perceber que a incidência do IVA sobre a totalidade da renda e a única forma de garantir que o Estado recupera o valor do imposto que foi já deduzido pelo sujeito passivo.
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Por outro lado, a inclusão no rácio entre operações com e sem direito a dedução da componente relativa a restituição do capital (amortização financeira), enquanto parte integrante da renda, provoca um aumento injustificado na percentagem de dedução definitiva, atendendo a que será significativa e positivamente influenciada, por via de uma mera restituição de um financiamento, cujo bem subjacente foi já objeto de liquidação e dedução de IVA no momento da aquisição.
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Este facto gerara deduções acrescidas para o sujeito passivo, relativamente a generalidade dos inputs de utilização mista, por via da utilização de um coeficiente, que nessa medida, se apresenta como exagerado, face a realidade das operações tributáveis.
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A atividade principal da locadora não consiste na compra e venda de bens, mas tão só na concessão de créditos a terceiros para aquisição desses bens, ainda que se substitua aos destinatários dos bens na aquisição, reservando para si o direito de propriedade. E dessa atividade obtém, fundamentalmente, juros.
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Deste modo, torna-se compreensível que no calculo do mencionado coeficiente de imputação específico, aplicável ao caso objeto de analise, e em harmonia com o entendimento da AT, deve considerar-se, apenas, o montante que excede o valor dos custos utilizados nas operações tributadas, uma vez que, através do método de imputação direta o IVA da parte relativa ao capital e integralmente deduzido.
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E é apenas aquele valor diferencial (que, genericamente, corresponde a juros) que se encontra conexo com os custos de aquisição de recursos utilizados indistintamente em operações com e sem direito a dedução.
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Se assim não fosse, permitir-se-ia um aumento artificial da percentagem de dedução do IVA incorrido com a generalidade dos bens ou serviços de utilização mista adquiridos pelo sujeito passivo.
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Do entendimento propugnado pela AT, não decorre, assim, qualquer restrição do direito legítimo a dedução. Antes pelo contrario, pugna pela inadmissibilidade do exercício do direito a dedução ilegítimo, na medida em que, a eventual execução do procedimento defendido pela Requerente colocaria em causa a neutralidade fiscal inerente a mecânica do IVA.
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Acresce, ainda, que o método do pro rata que a Requerente pretende ver aplicado, não tem mérito para medir o grau de utilização que as duas categorias de operações, com e sem direito a dedução, fazem dos bens e serviços que lhe são indistintamente alocados (utilização mista) e, consequentemente, não pode ser utilizado para determinar a parcela dedutível, cuja liquidação foi efetuada a montante por outros operadores económicos que se situam na fase imediatamente anterior do circuito económico.
(...)
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É precisamente no âmbito dos poderes conferidos à AT pela alínea b) do n.º 3 do artigo 23.ª CIVA, que tem por base a faculdade que vinha conferida na alínea c) do terceiro parágrafo do n.º 5 do artigo 17.º da Sexta Diretiva, que se enquadra o ofício - circulado n.º 30.108, aqui em discussão, prevendo uma solução que permite afastar a possibilidade de ocorrência de distorções significativas, quando estamos perante sujeitos passivos que realizem operações de locação financeira e ALD.
(...)
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Ou seja, a AT veio estabelecer a adoção de critérios mais adequados que permitam aferir com maior objetividade o grau de afetação de bens e serviços de utilização mista, nos casos como o presente.
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Importa ressalvar que a adoção do critério referido, é demostrativa que a AT admite a existência de algum grau de afetação dos recursos integrantes do conceito de despesas gerais incorridas pelos bancos no âmbito da celebração deste tipo de contratos. Muito embora seja um facto notório que, por norma, as operações desta natureza exigem uma utilização de recursos técnicos e administrativos bastante menos relevante que aqueles que se encontram afetos às atividades principais desenvolvidas pelas instituições bancárias como a Requerente.
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Por outro lado, tal não significa que os sujeitos passivos sejam obrigados a seguir o entendimento preconizado no ofício-circulado, aplicando o critério nele definido. Com efeito, como decorre do mesmo, a AT aceita que as instituições financeiras recorram a outros critérios de afetação real, desde que, os mesmos se mostrem idóneos ao fim pretendido.
(...)
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A questão principal que se dirime, nesta sede, foi já objeto de apreciação por parte do TJUE (Acórdão proferido no processa Banco Mais C-183/13, de 10 de julho de 2014), sendo que, 0 entendimento nele preconizado confirma a posição que tem vindo a ser assumida pela AT relativamente a esta matéria.
(...)
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Não subsistem dúvidas que a situação em apreço se enquadra na "maioria dos casos" a que se refere o citado acórdão, uma vez que a realização pela Requerente deste tipo de operações de locação financeira (maioritariamente) para o setor automóvel implica a utilização de parte dos bens ou serviços promíscuos, mas esta é "(...) sobretudo determinada pelo financiamento e gestão dos contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes, e não pela disponibilização dos veículos."
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Este entendimento veio, necessariamente, a ter acolhimento pelos nossos tribunais superiores, nomeadamente, no âmbito dos processos onde havia sido solicitado o reenvio prejudicial para o referido tribunal.
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Sendo de realçar, entre outros, o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do recurso n.º 052/19, de 04.03.2020 (...)
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O IVA que a Requerente deveria ter deduzido adicionalmente, caso não tivesse seguido o entendimento plasmado no identificado Ofício-Circulado, ascende a um total de € 398.550,35, apurado nos seguintes termos:
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As operações de locação financeira e ALD realizadas pela Requerente implicam a utilização de recursos comuns, designadamente rendas, telecomunicações ou informática, quer para a gestão dos contratos de financiamento, quer para a disponibilização e gestão dos bens locados, os quais são determinados predominantemente pelo facto de ser a proprietária dos referidos bens (depoimento da testemunha B...);
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Em 2018, as actividades da Requerente, em número de contratos, foram de cerca de 64% de locação financeira e ALD e 36% de crédito para aquisição de veículos e, normalmente, em número de contratos e volume financeiro, o Leasing e o ALD representam cerca de 70% da actividade anual da Requerente e o crédito para aquisição de automóveis cerca de 30% (depoimentos das testemunhas B..., C... e D...);
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Nas operações de crédito automóvel a Requerente actua como um intermediário financeiro, elaborando os contratos e entregando dinheiro aos clientes que tratam de adquirir o veículo e tratam de tudo o que se relaciona com a disponibilidade dos veículos (depoimento da testemunha B...);
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Nas operações de leasing e ALD de veículos a Requerente desenvolve um conjunto de actividades relacionadas com a disponibilidade dos veículos pelos seus clientes, designadamente: registos e suas alterações; tratamento de facturas relativas à aquisição dos veículos; pagamentos de IUC e emissão das respectivas facturas e envio de cartas aos clientes; intervenções relacionadas com contra-ordenações estradais, portagens; intervenções relativas à recuperação de veículos e sua guarda; organização de processos de venda nos casos em que os locatários não optam pela aquisição dos veículos; obtenção de serviços jurídicos para intervenções em julgamentos e processos judiciais e extrajudiciais; obtenção de certidões e de reconhecimento de assinaturas; realização de peritagens; tratamento contabilístico relacionado com propriedade do veículo (documentos n.ºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 20, cujos teores se dão como reproduzidos e depoimentos das testemunhas B..., C... e E...);
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Os contratos de locação financeira e ALD de veículos têm mais peças processuais que os de crédito para aquisição de veículos (depoimento da testemunha D...);
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Nos contratos de locação financeira e ALD de veículos são necessários mais contactos com clientes do que nos de crédito para aquisição de veículos (depoimento da testemunha D...);
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Nos contratos de locação financeira e ALD de veículos são necessários mais contactos com clientes do que nos de crédito para aquisição de veículos (depoimento da testemunha D...);
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A Requerente tinha cerca de 40 trabalhadores em 2018, que trabalhavam tanto na actividade de crédito de veículos como de locação financeira e ALD de veículos (depoimento da testemunha B...);
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A Requerente não possui um departamento que seja responsável pela gestão os contratos de Leasing e de ALD, nem tem funcionários afectos especificamente a essas duas atividades, sendo utilizados os recursos humanos comuns a toda a empresa (depoimento das testemunhas B... e D...);
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As situações de entrega do veículo ao banco nos contratos de crédito são excepcionais (depoimento da testemunha C...);
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A Requerente, em 2018, cobrava comissões a clientes de acordo com um preçário semelhante ao junto com a resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira, cujo teor se dá como reproduzido, embora nem sempre elas sejam cobradas, por razões comerciais, tendo em vista fazer perdurar as suas relações com os clientes, ou por ser inviável, como sucede nos casos de incumprimento dos contratos (depoimentos das testemunhas E... e D...);
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As operações de locação financeira reclamam maior uso de recursos comuns do que as operações de crédito automóvel (depoimentos das testemunhas B..., C..., e D...);
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A Requerente pagou a quantia autoliquidada referente à declaração de Dezembro de 2018 (informação em que se baseou o indeferimento do pedido de revisão oficiosa e artigo 270.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);
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Não é possível à Requerente identificar a que tipo de contratos ou de produtos respeitam certos custos, designadamente, os que se referem aos documentos n.ºs 7 a 23 juntos com o pedido arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;
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Em 05-07-2023, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
2.2.1. Não se provou a exacta medida da utilização de recursos de utilização mista pela Requerente relacionada com as operações de locação financeira e aluguer, apenas se tendo provado que é muito maior o consumo daqueles recursos relacionado com a actividade de locação financeira e aluguer de veículos do que o relativo à actividade de concessão de crédito para aquisição de veículos.
2.2.2. Não se provou que, no caso em apreço, a utilização do método de determinação do pro rata de baseado no volume de negócios, na situação concreta da Requerente, provoque ou possa provocar «distorções significativas da tributação», designadamente que possa «provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas provocar vantagens ou prejuízos injustificados».
Na verdade, estes juízos conclusivos são utilizados no ponto 8 do Ofício-Circulado n.º 30108, mas não foi apresentada qualquer prova das afirmações neles contidas, nem sequer são esclarecidas quais as «vantagens ou prejuízos injustificados» a que se alude.
De qualquer modo, nenhuma prova foi efectuada sobre essas distorções, na situação da Requerente, em que quase 2/3 da actividade que desenvolve é de operações de locação financeira e ALD.
2.2.3. Embora se tenha considerado provado que a Requerente pagou a quantia autoliquidada relativamente ao último período de 2018, não foi apurada a data em que foi feito o pagamento.
2.2.4. Não se provou que a aplicação do coeficiente de imputação específico previsto no ponto 9 do Ofício-Circular n.º 30.108, para determinação da percentagem de dedução de IVA relativamente a recursos de utilização mista, considerando no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos às operações de Leasing e de ALD, conduza a um apuramento mais preciso da parte real das despesas efetuadas com a aquisição dos bens e dos serviços de utilização mista que pode ser imputada a essas operações, do que o que resulta da determinação dessa percentagem com base no volume de negócios, incluindo o valor global d0s contratos celebrados pela Requerente relativos a essas operações.
2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos que foram dados como provados com base na prova testemunhal, nos documentos juntos pela Requerente e os que constam do processo administrativo.
A testemunha B... trabalha na área financeira da Requerente desde 2017.
A testemunha C..., trabalha na Requerente há 33 anos, nas áreas de recuperação de veículos e, actualmente, financeira.
A testemunha E... trabalha na Requerente desde 1989, nas áreas de recuperação de veículos e, actualmente, de gestão cliente.
A testemunha D... trabalha na Requerente desde 2017, na área de aceitação e registo de contratos.
Todas as testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento directo dos factos que relataram.
O facto de as testemunhas serem assalariados da Requerente, como refere a AT nas suas alegações, não justifica que não se dê credibilidade aos seus depoimentos, sob juramento, cuja falsidade pode justificar a imposição de sanções penais.
Os impedimentos e inabilidades que podem obstaculizar à intervenção como testemunha estão previstos na lei (artigos 495.º e 496.º do CPC) e, por isso, num Estado de Direito, em que os Tribunais estão sujeitos à lei (artigo 203.º da CRP), são esses obstáculos à intervenção de testemunhas que um Tribunal tem de aplicar e não os que a Autoridade Tributária e Aduaneira entende que seriam de aplicar se fosse ela, e não aos órgãos legislativos, que fosse constitucionalmente atribuído o poder de legislar.
Em última análise, as testemunhas indicadas pela Requerente estão em situação idêntica aos assalariados do Estado que a Autoridade Tributária e Aduaneira faz intervir na generalidade dos procedimentos e processos tributários, frequentemente também como testemunhas.
E, naturalmente, as pessoas mais bem informadas sobre o funcionamento da Requerente e que melhor podem esclarecer o Tribunal Arbitral sobre o seu funcionamento são as que nela trabalham quotidianamente.
Quanto à decisão da matéria de facto com base na convicção dos Árbitros é a própria lei que a impõe, nos processos arbitrais, ao estabelecer os princípios da «livre apreciação dos factos e a livre determinação das diligências de produção de prova necessárias, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros» [artigo 16.º, alínea e) do RJAT].
Também aqui, entre adoptar os critérios legais de apreciação da prova ou adoptar critérios alternativos que a Autoridade Tributária e Aduaneira preferiria, é obrigação dos Árbitros aplicar os primeiros.
3. Matéria de direito
3.1. Fundamentação relevante para aferir a legalidade da autoliquidação
Os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD decidem segundo o direito constituído (artigo 2.º, n.º 2, do RJAT), estando a sua actividade limitada à declaração da ilegalidade de actos dos tipos referidos no artigo 2.º, n.º 1, do mesmo diploma.
O processo arbitral tributário é, assim, um meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), sendo, como este, um meio processual de mera apreciação da legalidade de actos, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].
No âmbito de um contencioso de mera legalidade, esta tem de ser apreciada com base no acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida, inclusivamente as aventadas no processo arbitral, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos.
Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01-07-2020, processo n.º 309/14.6BEBRG), em que se entendeu que:
I – O tribunal, na apreciação da legalidade de uma decisão administrativa, não pode considerar que esta se alicerça noutros fundamentos que não aqueles que aí foram externados.
II – Assim, não pode julgar improcedente a impugnação judicial da decisão que indeferiu o pedido de revisão de um acto tributário alicerçando-se na não verificação de um requisito se a AT não usou esse fundamento para indeferir aquele pedido.
Por isso, não pode a Administração Tributária, após a prática do acto, justificá-lo por razões diferentes das que constem da sua fundamentação expressa.
Nos casos de autoliquidação, sujeitos a impugnação administrativa prévia necessária [artigos 131.º do CPPT e 2.º, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março], a fundamentação relevante para aferir a legalidade é a da respectiva decisão, neste caso, a de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
Na verdade, quando dois actos têm por objecto definir a posição da Administração Tributária sobre a mesma situação jurídica, o segundo, quando não é confirmativo, é revogatório por substituição. ( [2] )
Os actos que indeferem impugnações administrativas podem ser confirmativos, não alterando a ordem jurídica, quando «se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em atos administrativos anteriores» (artigo 53.º, n.º 1, do CPTA).
Mas, nomeadamente nos casos de impugnação administrativa de actos de liquidação ou autoliquidação, se a respectiva decisão mantém o acto impugnado com diferente fundamentação, deverá entender-se que se opera revogação por substituição daquele acto (que será ratificação-sanação se a fundamentação inicial era ilegal) ( [3] ), passando a subsistir na ordem jurídica um novo acto que, apesar de manter o conteúdo decisório, terá a nova fundamentação.
Nos casos em que uma decisão fundamentada da impugnação administrativa aprecia um acto sem fundamentação expressa (como sucede nos casos de pedido de revisão oficiosa de autoliquidação), não se está perante uma situação em que o acto seja confirmativo, à face do preceituado no artigo 53.º, n.º 1, do CPTA, pois a autoliquidação não tem fundamentação originária emitida pela Administração Tributária. Por isso, está-se perante uma situação de revogação por substituição, em que o acto subsiste na ordem jurídica após a decisão com a fundamentação que dela consta, como está ínsito no artigo 173.º do Código do Procedimento Administrativo de 2015. ( [4] )
Mas, também neste caso, não é relevante a fundamentação posterior ao acto que decidir a impugnação administrativa.
Assim, neste caso, é à face da fundamentação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa que há que apreciar a legalidade da auto-liquidação, sendo irrelevantes possíveis motivos de indeferimento que naquela não são invocados, designadamente os que apenas forem invocados na Resposta apresentada no processo arbitral e nas suas alegações.
3.2. Enquadramento da questão e posições das Partes
3.2.1. Legislação aplicável sobre o direito a dedução de IVA
Os artigos 168.º, 173.º e 174.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelecem o seguinte:
Artigo 168.º
Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado-Membro em que efectua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor os montantes seguintes:
a) O IVA devido ou pago nesse Estado-Membro em relação aos bens que lhe tenham sido ou venham a ser entregues e em relação aos serviços que lhe tenham sido ou venham a ser prestados por outro sujeito passivo;
b) O IVA devido em relação a operações assimiladas a entregas de bens e a prestações de serviços, em conformidade com a alínea a) do artigo 18.º e o artigo 27.º;
c) O IVA devido em relação às aquisições intracomunitárias de bens, em conformidade com o artigo 2.o, n.º 1, alínea b), subalínea i);
d) O IVA devido em relação a operações assimiladas a aquisições intracomunitárias, em conformidade com os artigos 21.º e 22.º;
e) O IVA devido ou pago em relação a bens importados para esse Estado–Membro.
Artigo 173.º
1. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efectuar tanto operações com direito à dedução, referidas nos artigos 168.º, 169.º e 170.º, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.
O pro rata de dedução é determinado, em conformidade com os artigos 174.º e 175.º, para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo.
2. Os Estados–Membros podem tomar as medidas seguintes:
a) Autorizar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade, se tiver contabilidades distintas para cada um desses sectores;
b) Obrigar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade e a manter contabilidades distintas para cada um desses sectores;
c) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços;
d) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no primeiro parágrafo do n.º 1, relativamente a todos os bens e serviços utilizados nas operações aí referidas;
e) Estabelecer que não seja tomado em consideração o IVA que não pode ser deduzido pelo sujeito passivo, quando o respectivo montante for insignificante. Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços;
Artigo 174.º
1. O pro rata de dedução resulta de uma fracção que inclui os seguintes montantes:
a) No numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações que confiram direito à dedução em conformidade com os artigos 168.º e 169.º;
b) No denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não confiram direito à dedução.
Os Estados–Membros podem incluir no denominador o montante das subvenções que não sejam as directamente ligadas ao preço das entregas de bens ou das prestações de serviços referidas no artigo 73.º.
2. Em derrogação do disposto no n.º 1, no cálculo do pro rata de dedução não são tomados em consideração os seguintes montantes:
a) O montante do volume de negócios relativo às entregas de bens de investimento utilizados pelo sujeito passivo na sua empresa;
b) O montante do volume de negócios relativo às operações acessórias imobiliárias e financeiras;
c) O montante do volume de negócios relativo às operações referidas nas alíneas b) a g) do n.º 1 do artigo 135.º, se se tratar de operações acessórias.
3. Quando façam uso da faculdade prevista no artigo 191.º de não exigir a regularização em relação aos bens de investimento, os Estados–Membros podem incluir o produto da cessão desses bens no cálculo do pro rata de dedução.
Os artigos 16.º, 19.º, 20.º e 23.º do CIVA estabelecem o seguinte, no que está em causa no presente processo:
Artigo 16.º
Valor tributável nas operações internas
1 - Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 10, o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto é o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro.
2 - Nos casos das transmissões de bens e das prestações de serviços a seguir enumeradas, o valor tributável é:
(...)
h) Para as operações resultantes de um contrato de locação financeira, o valor da renda recebida ou a receber do locatário.
Artigo 19.º
Direito à dedução
1 - Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram:
a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;
Artigo 20.º
Operações que conferem o direito à dedução
1 - Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes:
a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas;
Artigo 23.º
Métodos de dedução relativa a bens de utilização mista
1 - Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectuar operações que conferem direito a dedução e operações que não conferem esse direito, nos termos do artigo 20.º, a dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços que sejam utilizados na realização de ambos os tipos de operações é determinada do seguinte modo:
a) Tratando-se de um bem ou serviço parcialmente afecto à realização de operações não decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, o imposto não dedutível em resultado dessa afectação parcial é determinado nos termos do n.º 2;
b) Sem prejuízo do disposto na alínea anterior, tratando-se de um bem ou serviço afecto à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução.
2 - Não obstante o disposto da alínea b) do número anterior, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação.
3 - A administração fiscal pode obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o disposto no número anterior:
a) Quando o sujeito passivo exerça actividades económicas distintas;
b) Quando a aplicação do processo referido no n.º 1 conduza a distorções significativas na tributação.
4 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do n.º 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar a dedução nos termos do n.º 1 do artigo 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, bem como as subvenções não tributadas que não sejam subsídios ao equipamento.
3.2.2. O direito a dedução de IVA suportado com aquisições de bens e serviços utilizados para os fins das operações tributadas
Por isso, por força do disposto nos artigos 168.º, alínea a), da Directiva n.º 2006/112/CE e 20.º, n. 1, alínea a), do CIVA, a Requerente tem, em princípio, direito a deduzir o IVA suportado a montante nas aquisições de bens e serviços utilizados nas suas operações tributadas.
Em Portugal, a actividade de locação financeira mobiliária é totalmente tributada e não isenta, nos termos da alínea h) do n.º 1 do artigo 16.º do CIVA, pelo que uma entidade que desenvolva apenas este tipo de actividade pode deduzir todo o IVA suportado para a realizar.
Porém, a Requerente é um sujeito passivo misto, pois é uma instituição de crédito que, além de desenvolver actividade tributada e não isenta de locação financeira e ALD, realiza também operações isentas, neste caso apenas operações de financiamento/concessão de crédito para aquisição de veículos, que beneficiam da isenção prevista no n.º 27 do artigo 9.º do CIVA.
Relativamente aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efectuar tanto operações económicas com direito à dedução, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações [artigos 173.º, n.º 1, da Directiva n.º 2006/112/CE e 23.º, n 1, alínea b] do CIVA).
Essa proporção ou pro rata de dedução é determinada por uma fracção que inclui «no numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações que confiram direito à dedução» e «no denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não confiram direito à dedução» [artigo 174.º, n. 1, alíneas a] e b), da Directiva n.º 2006/112/CE.
Aplicando estas regras, sendo a actividade de locação financeira tributada e não isenta, quanto à totalidade do valor das rendas [artigo 16.º, n.º 2, alínea h], do CIVA], o montante destas deverá ser incluído totalmente no numerador, inclui-se no «montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações que confiram direito à dedução».
3.2.3. A limitação do direito à dedução relativamente a IVA suportado com aquisições de bens e serviços utilizados para os fins das operações tributadas
Estas regras da determinação do pro rata de dedução relativamente a actividades económicas, podem ser afastadas nas situações previstas no n.º 2 do artigo 173.º da Directiva n.º 2006/112/CE, em que se inclui «autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços».
Eventualmente, terá sido ao abrigo desta disposição, que tem alguma correspondência como os n.ºs 2 e 3, alínea b) do artigo 23.º do CIVA, que o Ofício-Circulado n.º 30108 estabeleceu, para este tipo de instituições que desenvolvem concomitantemente actividade de locação financeira, integralmente tributada, e outras actividade isentas, um regime especial relativo ao exercício do direito à dedução, por entender que «o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação”» (ponto 8).
Por um lado, esse regime consiste, em primeira linha, em impor a este tipo especial de sujeitos passivos, relativamente aos bens de utilização mista, a dedução segundo a afectação real, nos termos do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA, «com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades».
Em segunda linha, no ponto 9 daquele Ofício-Circulado n.º 30108, ainda «na aplicação do método da afectação real», estabelece-se que «sempre que não seja possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD».
Em suma, o regime especial previsto no Ofício-Circulado consiste em impor a este tipo de sujeitos passivos a dedução segundo a «afectação real», que deverá ser efectuada de duas formas:
– preferencialmente, «com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades»;
– sempre que tal não seja possível, a «afectação real» será efectuada utilizando um «coeficiente de imputação específico», que é determinado calculando a percentagem de dedução apenas com base no montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD, e não, como resultaria da aplicação do n.º 4 do artigo 23.º, com base em «todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma actividade económica».
A Requerente na autoliquidação relativa ao mês de Dezembro de 2018 aplicou a regra que consta do ponto 9 do referido Ofício Circulado, tendo no cálculo do pro rata de dedução definitivo, previsto no n.º 6 do artigo 23.º do CIVA, relativo a bens de utilização mista, excluído do numerador e do denominador da fracção as amortizações financeiras dos bens locados, pois não considerou «viável determinar um ou vários critérios objectivos passíveis de permitir, de forma rigorosa e segura, o montante do IVA dedutível, através do método da afectação real», como se indica no ponto 8 do Ofício Circulado.
Posteriormente, a Requerente constatou que, se tivesse incluído a totalidade das rendas do leasing no cálculo do critério de dedução, seria encontrada a percentagem de dedução de 89%, em vez de 26%.
A Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa da autoliquidação relativa ao último período de 2018, defendendo, em suma, que a desconsideração, no cálculo do pro rata, dos montantes relativos às amortizações financeiras no âmbito da actividade de leasing e ALD se apresenta em desconformidade com a legislação nacional e comunitária do IVA.
O pedido de revisão oficiosa foi indeferido.
3.2.4. Posições essenciais das Partes
A Requerente defende, em suma, o seguinte:
– os recursos humanos e materiais, comuns ou próprios, da atividade de Leasing e ALD, são muito superiores aos recursos afetos à atividade de crédito, pela natureza destes dois tipos de financiamento e, sobretudo, pelo facto de no primeiro caso a Requerente ser a proprietária dos bens;
– ficou demonstrado que a atividade de ALD e de Leasing absorveu a maioria dos custos e recursos, humanos e materiais, que a Requerente suporta com a totalidade das suas atividades, quer isentas, quer sujeitas a tributação;
– a AT, em momento algum demonstrou que a aplicação da percentagem de dedução apurada pela Requerente originaria, neste caso em concreto, uma distorção significativa na tributação;
– a atividade de concessão de crédito exercida pelos Bancos, apesar de algumas semelhanças naturais, não é em nada idêntica à atividade de financiamento automóvel, através de Leasing e de ALD;
– o que está em causa é direito da Requerente a utilizar um método de dedução dos seus encargos que, ao contrário do referido Ofício-Circulado, tenha em consideração a especificidade, os contornos e a dimensão da sua atividade de Leasing e de ALD, por oposição, nomeadamente, à atividade de crédito;
– a verdadeira distorção em termos de tributação ocorrerá nos casos em que seja excluída, do direito à dedução, para efeitos de apuramento do numerador a que o n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA se refere, uma parcela significativa da atividade do sujeito passivo, conforme sucederá se não for considerada a componente da renda paga pelos locatários a título de capital mutuado;
– o ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108 não está conforme à legislação nacional;
– qualquer imposição de um método de cálculo para apuramento do IVA dedutível em entidades com restrições no direito à dedução, deverá ser efetuada por Lei da Assembleia da República, de forma a respeitar o Princípio da Legalidade, conforme consagrado no n.º 2 do artigo 103.º, no n.º 5 do artigo 112.º e na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º, todos da Constituição da República Portuguesa, bem como previsto no artigo 55.º da LGT;
– a metodologia de cálculo proposta pela AT, por via do Ofício-Circulado, não é um critério objetivo;
– a jurisprudência do TJUE do acórdão Banco Mais apenas é aplicável caso se verifique, no caso concreto, que os recursos comuns são determinados sobretudo pelo financiamento e gestão dos contratos, que, como se verificou, não é o que se passa no caso vertente, pois a atividade de Leasing e de ALD é muito mais abrangente que essa realidade e, em concreto, na situação da Requerente, obriga à afetação de recursos humanos e materiais comuns, que são consumidos em todos os momentos do processo de financiamento e, inclusivamente, após o contrato ter terminado;
– o Código do IVA apenas prevê no seu n.º 2 do artigo 23.º a aplicação de critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, não permitindo, portanto, a aplicação de um pro rata considerando apenas os juros da atividade de leasing, conforme erradamente propugna o Ofício-Circulado;
– não se provou que a utilização do pro rata previsto no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA, quando utilizado por instituições financeiras que pratiquem simultaneamente operações de locação financeira e ALD provoca distorções significativas na tributação;
– a imposição do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30.108, no âmbito do Direito Nacional, apenas poderia ser feita por via de diploma legislativo e não de circular administrativa, pelo que a sua imposição “viola os princípios constitucionais da legalidade e da hierarquia das normas e o princípio administrativo da legalidade [artigos 103.º, n.º 2, e 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP e 55.º da LGT]”;
– o artigo 23.º, n.º 2, do CIVA é materialmente inconstitucional na interpretação de que permite à AT impor um método de determinação da matéria tributável por via de Circular, à face dos artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, e por violação do princípio da igualdade plasmado no artigo 13.º da CRP;
– o método de cálculo do pro rata terá que ter igualmente em conta o valor inicial do bem em causa no momento da sua entrega, uma vez que esse método não é suscetível de garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios;
– no caso concreto da Requerente, os recursos comuns por si utilizados, no âmbito da sua atividade, são determinados, quer pelo financiamento e gestão dos contratos, quer pela disponibilização dos bens locados;
– sendo a Requerente, na locação financeira, a legítima proprietária dos bens locados, surgem na sua esfera um conjunto de direitos e obrigações associados à propriedade de tais bens, que implicam, como se pode facilmente depreender, a necessidade de recursos humanos e materiais (i.e., recursos comuns) para a gestão dos referidos bens, algo que não se verificaria caso tal vínculo (propriedade) não existisse (não se verificando, naturalmente, na execução de um contrato de crédito em que a Requerente não assume a propriedade de qualquer bem);
– o facto de a Requerente ser a proprietária dos bens locados exige um esforço acrescido, por exemplo, na interação com os fornecedores dos bens no âmbito da entrega, aceitação e pagamento dos bens em causa e a contabilização e gestão de toda a documentação associada à propriedade dos bens, como a gestão e pagamento de impostos, multas e outras importâncias associadas à detenção dos bens e à respetiva imputação de tais montantes aos locatários;
– apesar da Requerente desenvolver o seu negócio na área financeira, não é uma entidade financeira “típica”, pois estando ligada a uma marca do setor automóvel, a sua ligação com o fabricante e com os distribuidores dos veículos comercializados é específica no contexto das típicas atividades de financiamento para o setor automóvel;
– numa situação de mera concessão de crédito não recaem na esfera da Requerente quaisquer encargos ou obrigações decorrentes da gestão e disponibilização dos bens dados em locação/ALD;
– não tem de haver sequer uma preponderância dos recursos de disponibilização dos veículos, em relação aos recursos com a gestão dos contratos, para se admitir a inserção da componente capital;
– basta demonstrar a muito maior afetação desses recursos a este tipo de contratos, seja no início, no final ou já após a sua cessação. E isso foi feito no caso vertente;
– a definição do âmbito do direito à dedução do IVA, e a as inerentes restrições, estão necessariamente sujeitas a aprovação por Lei da Assembleia da República ou por Decreto-Lei Autorizado do Governo (artigo 165.º, n.º 1, i) da CRP), não podendo admitir-se que o seja, através de uma mera instrução administrativa, pois, se assim for, estaremos também a violar o princípio fundamental do Estado de Direito, que é o da separação de poderes, plasmado no artigo 111.º da CRP, assim como a regra vertida no artigo 112.º, n.º 5, da CRP.
A Autoridade Tributária e Aduaneira acompanha, no essencial, a posição assumida na decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, dizendo o seguinte, em suma, no que não constitui fundamentação a posteriori:
– a locação financeira é o contrato pelo qual uma entidade - o locador financeiro - concede a outra - o locatário financeiro – o gozo temporário de uma coisa corpórea, adquirida, para o efeito, pelo próprio locador, a um terceiro, por indicação do locatário;
– o objecto deste tipo de contrato não é a transferência da propriedade, mas sim a cedência, pela locadora do uso do bem, isto é, a locadora obriga-se a prestar um serviço, traduzido na disponibilidade do bem em causa, recebendo em contrapartida, uma prestação, sem prejuízo, de nele se poder prever a opção de compra, no final do contrato, a favor do locatário, por um valor residual fixado por acordo das partes;
– um dos objectivos do legislador nesta matéria, foi assegurar o cumprimento do princípio da neutralidade fiscal, na vertente de princípio da igualdade que, no caso concreto, se consubstancia no facto de ser assegurado um tratamento fiscal equivalente, no sentido de igual onerosidade, em relação aquele que adquire um bem através de um contrato de locação financeira, face a outra pessoa que o adquire directamente;
– nem todo o valor pago a título de renda no âmbito de um contrato de locação financeira é correspondente à amortização financeira ou do capital;
– o valor de aquisição do bem objecto de contrato de locação corresponde ao capital financiado que constitui a componente de amortização financeira na renda liquidada pelo locador ao locatário;
– no momento da aquisição desse mesmo input, o sujeito passivo (locador) exerceu o direito à dedução integral do montante do IVA liquidado pelo fornecedor do bem objecto do contrato de locação, por via do método da imputação directa;
– deve ser excluída do cálculo da percentagem de dedução a parte da amortização financeira incluída na renda, uma vez que esta mais não é do que a restituição do capital financiado/investido para a aquisição do bem;
– a incidência do IVA sobre a totalidade da renda é a única forma de garantir que o Estado recupera o valor do imposto que foi já deduzido pelo sujeito passivo;
– é apenas aquele valor diferencial (que, genericamente, corresponde a juros) que se encontra conexo com os custos de aquisição de recursos utilizados, indistintamente, em operações com e sem direito à dedução;
– se assim não fosse, permitir-se-ia um aumento artificial da percentagem de dedução do IVA incorrido na aquisição da generalidade dos bens ou serviços com utilização mista;
– o procedimento adoptado pela Administração Tributária, está conforme com as normas internas e comunitárias, em especial, o artigo 16.º e 23.º CIVA, e com os artigos 174.º e 175.º da Diretiva IVA;
– o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira foi aceite pelo TJUE no processo n.º C-183/13 (Banco Mais), e também pelo Supremo Tribunal Administrativo;
– a AT veio a reproduzir o aludido critério através do Ofício-Circulado n.º 30.108, fê-lo apenas a pedido e de acordo com as instruções do legislador, que expressamente determinou;
– a AT podê-lo-ia até fazer casuisticamente, sujeito passivo a sujeito passivo, aplicando o critério que entendesse mais consentâneo à situação em concreto, que respeitasse a neutralidade do imposto;
– não se está, pois, perante uma excepção nem perante uma violação ao princípio da legalidade, presente no artigo 103.º, n.º 2 da CRP;
– a jurisdição arbitral está vinculada à interpretação efectuada pelo Tribunal relativamente ao artigo 17º, nº5 da Sexta Directiva IVA (actual artigo 173º, nº2 da Directiva nº 2006/112 CE), em causa nos presentes autos, já que o artigo 23º do Código do IVA procedeu à sua transposição para o direito interno;
– a decisão do TJUE tem valor de caso julgado e é obrigatória, nos termos do artigo 8.º, n.º 4, da CRP;
– a Requerente não consegue provar a quantificação do consumo de recursos afetos às várias atividades do banco e, dentro do leasing, as afetas à disponibilização e ao financiamento e gestão de contratos;
– o STA entendeu que é necessário «descortinar se a utilização de bens ou serviços de utilização mista por parte da Recorrida foi sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes ou, ao invés, pela disponibilização dos veículos»;
– essa prova competia somente à Requerente, o que não fez;
– o que as partes efetivamente se encontram, essencialmente, a discutir no plano arbitral é se o ato de disponibilização de um veículo no âmbito do contrato de locação financeira:
- é referente ao momento da pré-venda, à concepção e à entrega do veículo ao cliente, período que decorre, necessariamente, numa fase inicial do contrato, de
encomenda do veículo e de posterior disponibilização, numa relativa curta janela
temporal, não menos que 15 dias e não mais que um mês (em média); ou se
- é antes referente a todo o período de vida útil do contrato de locação financeira,
desde o momento da entrega, da colocação à disposição do veículo ao locatário, até ao termo final do contrato de locação financeira;
- ou se, tanto os actos de disponibilização de veículos, como os de financiamento
e de gestão de contrato são transversais a todo o período de vida útil do contrato,
incluindo também o momento de negociação inicial;
– a AT tem sustentado que, nos 4 anos de vida útil, que por norma correspondem à duração média do contrato de locação financeira, os custos mistos incorridos, seja no cálculo da taxa de financiamento conforme o perfil de cada cliente, seja na gestão corrente do contrato de locação financeira, seja ainda por vicissitudes no cumprimento desse mesmo contrato – que, a título de exemplo, incluem e obrigam a despesas com advogados, solicitadores, serviço de recuperação de automóveis, recuperação do crédito mal parado, correspondência, electricidade, consumíveis, etc. -, consubstanciam custos de financiamento e de gestão do contrato, por corresponderem à ase em que o financiamento é concedido aos clientes e por eles é abatido através de um regime de pagamentos prestacionais, bem como corresponde à gestão da relação contratual estabelecida entre Banco e clientes, a qual se prolonga no tempo, até à finalização do contrato de locação financeira;
– as testemunhas não podem definir o que é actividade de financiamento e de gestão do contrato e o que é disponibilização dos veículos;
– a parcela do capital, que é reembolsada parcelarmente pelos locatários ao Banco:
1) não representa o trabalho – e os consumos indiferenciados decorrentes desse trabalho - da Requerente, no âmbito da locação financeira;
2) nem tem previsto na sua composição qualquer montante cujo propósito seja o de reembolsar o Banco dos custos indiferenciados cuja percentagem de IVA aqui reclama;
– os atos que consomem recursos (custos comuns) durante a vigência do contrato são puros atos de gestão da locação financeira e de sobrevivência do financiamento concedido ao locatário;
– competia à Requerente contrariar esta posição, provando que os recursos são consumidos sobretudo pelos atos de disponibilização de veículos;
– e essa foi uma prova que a Requerente não fez;
– os 89% que a Requerente reclama em termos de dedução de IVA e que obteve por aplicação do prorata (23.º, n.º 4 CIVA) não assumem – não podem assumir - o significado de que os atos de disponibilização de veículo da locação financeira consomem especificamente 89% dos custos gerais, indiferenciados, que o Banco suporta em todas as suas atividades: sujeitas e isentas;
– tanto os gastos gerais, como o IVA que sobre eles incide, estão cobertos pelos juros (a que acresce IVA), pelas comissões (a que acresce IVA) e por despesas administrativas iniciais e durante o período de vida útil do contrato (a que acresce IVA), sendo que, como se disse e repete, todos esses valores concorrem, no campo do numerador, para apurar o direito que a Requerente tem a deduzir em sede de IVA em determinado período;
3.3. Apreciação da questão
Como resulta da matéria de facto fixada, a Requerente é uma instituição de crédito que, embora tenha designação de «banco» não desenvolve actividade bancária geral, mas apenas locação financeira e ALD de veículos e concessão de crédito para a aquisição de veículos das marcas Renault/Dacia.
A Requerente desenvolve actividade económica, tal como definida na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, que é tributada (a locação financeira e ALD, enquadrável no n.º 1 do artigo 4.º do CIVA), bem como actividade económica isenta (neste caso, apenas a concessão de crédito, nos termos do n.º 27 do artigo 9.º do CIVA).
Em regra, o IVA que for suportado pelo sujeito passivo na aquisição dos meios utilizados exclusivamente na sua actividade económica tributada é totalmente dedutível e o IVA suportado na aquisição de meios utilizados apenas na actividade isenta ou não prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, não pode ser deduzido [artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do CIVA e artigo 168.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006].
No caso em apreço, está em causa a dedução de IVA relativamente a meios utilizados indiferentemente tanto na actividade tributada (locação financeira e ALD), como na actividade económica isenta da Requerente (concessão de crédito de crédito para aquisição de veículos).
Relativamente aos meios de utilização mista, utilizados indiferentemente «para efectuar tanto operações com direito à dedução (...) como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações» (artigo 173.º n.º 1, da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006).
Tratando-se de um bem ou serviço afecto à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º «o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução», nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do CIVA.
Esta percentagem de imposto dedutível, ou «pro rata de dedução», resulta, em regra, de uma fracção que inclui no numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações que confiram direito à dedução e no denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não confiram direito à dedução (artigos 174.º da Directiva n.º 2006/112/CE e 23.º, n.º 4, do CIVA).
O pro rata de dedução é determinado anualmente, sendo fixado em percentagem e arredondado para a unidade imediatamente superior, e é aplicável provisoriamente, a determinado ano, calculado com base nas operações do ano anterior ou estimado provisoriamente, pelo sujeito passivo, de acordo com as suas previsões, sob controlo da administração (artigo 175.º, n.ºs 1 e 2, da Directiva n.º 2006/112/CE e n.ºs 6, 7 e 8, do artigo 23.º do CIVA).
Mas, o sujeito passivo pode optar por «efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação» (n.º 2 do artigo 23.º do CIVA). ([5] )
A utilização deste método de afectação real, em princípio opcional, passará a ser obrigatória se a Administração Fiscal o determinar, o que poderá fazer, nomeadamente, «quando a aplicação do processo referido no n.º 1 conduza a distorções significativas na tributação» [alínea b) do n.º 3 do artigo 23.º]. A Administração fiscal poderá também impor «condições especiais».
Através do referido Ofício-Circulado n.º 30108, de 30-01-2009, a Administração Fiscal, entendeu que relativamente às «instituições de crédito quando desenvolvam simultaneamente as actividades de Leasing ou de ALD», «o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação”», pelo que fez utilização da faculdade prevista no n.º 3 do artigo 23.º do CIVA, determinando que estes sujeitos passivos utilizem a «afectação real» (ponto 8).
Segundo os pontos 8 e 9, a «afectação real» deverá fazer-se das seguintes formas:
– se for possível, faz-se «a afectação real com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços, de modo a determinar o montante de IVA a deduzir relativamente ao conjunto das actividades» (ponto 8 daquele Ofício Circulado);
– se não for «possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALDs» (ponto 9 daquele Ofício Circulado); neste caso, fica afastada a aplicação da percentagem que resultaria da aplicação do n.º 4 do artigo 23.º.
No caso em apreço, está-se perante uma situação em que não há controvérsia entre as Partes quanto à inviabilidade de utilização do método da afectação real, com base em critérios objectivos, tendo a Requerente utilizado nas liquidações impugnadas este «coeficiente de imputação específico» determinado da forma prevista no ponto 9, considerando no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing ou de ALD, excluindo do numerador e do denominador da fracção as amortizações financeiras relativas aos contratos de locação financeira.
No entanto, a Requerente defende que este método é ilegal, pelo que deve ser determinado o pro rata de dedução nos termos previstos no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, isto é, deve ser considerado no cálculo da percentagem de dedução o montante anual da globalidade das rendas de locação financeira e não apenas o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing ou de ALD.
Para além disso, a Requerente coloca as questões:
– da inconstitucionalidade interpretação que é feita no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108 sobre o regime do artigo 23.º, n.ºs 2, 3 e 4, do CIVA, por ofensa dos princípios da hierarquia das normas, legalidade tributária e igualdade;
– da inexistência das distorções de tributação invocadas no ponto 8 do Ofício-Circulado n.º 30108.
3.3.1. Aplicação da jurisprudência do TJUE e do Supremo Tribunal Administrativo invocada pelas Partes
As Partes fazem referência ao acórdão do TJUE proferido no processo C-183/13, de 14-07-2014, «Banco Mais», em que se decidiu, no âmbito de reenvio prejudicial, que o artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977 «não se opõe a que um Estado-Membro, em circunstâncias como as do processo principal, obrigue um banco que exerce, nomeadamente, atividades de locação financeira a incluir, no numerador e no denominador da fração que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar».
No entanto, esta jurisprudência apenas é aplicável a bancos que, a par da actividade bancária geral, isenta de IVA, desenvolvem também operações tributadas em IVA de locação financeira e ALD, de muito menor dimensão que a actividade isenta.
A não aplicação dessa jurisprudência do TJUE a instituições financeiras que não desenvolvem actividade bancária geral foi esclarecida, com a autoridade do Pleno, pelo Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 30-09-2020, processo n.º 026/20.8BALSB:
(...) a doutrina que emana do Acórdão proferido pelo TJUE a 10 de Julho de 2014 no processo n.º C-183/13 (Acórdão Banco Mais) vale para os Bancos, que exercem operações de locação financeira concomitantemente com a respectiva actividade geral bancária, mas não para outras entidades, como as Instituições Financeiras de Crédito cuja actividade específica é o Leasing.
(...)
Conforme se explicitou no Acórdão proferido por este STA a 17 de Junho de 2015 no âmbito do Processo n.º 01874/13, aquilo que o TJUE concluiu no caso Banco Mais é “que a norma comunitária não se opõe a que um Estado-membro obrigue um banco que efectue, concomitantemente com a respectiva actividade geral bancária, operações de locação financeira, a incluir na fracção destinada ao apuramento do montante relativo ao direito a` dedução dos bens e serviços de utilização mista (edifícios, consumos de electricidade, serviços transversais, etc., que sejam utilizados indistintamente para a realização de operações que confiram e não confiram direito a dedução do IVA suportado), apenas a dita parte componente dos juros incluídos nas rendas de contratos de locação financeira, quando a utilização daqueles bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão destes contratos de locação e não pela disponibilização dos veículos”.
Compreendido o entendimento propugnado pelo TJUE, e sabendo-se que o Sujeito Passivo em causa no Acórdão Fundamento é um Banco, depressa se conclui que foi precisamente esta natureza jurídica que conduziu o STA a aplicar a jurisprudência resultante do caso Banco Mais em tal aresto, tal como aconteceu em diversos outros casos que envolviam entidades bancárias – vejam-se, a título de exemplo, os Acórdãos proferidos por esta Secção do STA a 29 de Outubro de 2014 no Processo n.º 01075/13, a 3 de Junho de 2015 no Processo n.º 0970/13, a 17 de Junho de 2015 no Processo n.º 0956/13 e a 27 de Janeiro de 2016 no Processo n.º 0331/14).
Como se conclui deste aresto, na interpretação que faz do acórdão Banco Mais, é o facto de um banco desenvolver, além da actividade de locação financeira e ALD, a actividade bancária geral isenta, de muito maior dimensão do que a actividade tributada, que poderá justificar que se façam restrições ao direito a dedução, aplicando o coeficiente de imputação específico previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado 30108, se se comprovar, em concreto, que este método garante uma determinação do pro rata de dedução do IVA pago a montante mais precisa do que a resultante da aplicação do método do volume de negócios.
Esta interpretação está em sintonia com o acórdão do TJUE de 18-10-2018, processo n.º C-153/17 Volkswagen Financial Services, em que esclareceu que os Estados-Membros podem, ao abrigo do artigo 173.º, n.º 2, da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, «aplicar, numa determinada operação, um método ou um critério de repartição diferente do método do volume de negócios, desde que esse método garanta uma determinação do pro rata de dedução do IVA pago a montante mais precisa do que a resultante da aplicação do método do volume de negócios (Acórdão de 8 de novembro de 2012, BLC Baumarkt, C-511/10, EU:C:2012:689, n.° 24)».
Como se refere neste acórdão, pode impor-se
– «um método ou um critério de repartição diferente do método do volume de negócios, desde que esse método garanta uma determinação do pro rata de dedução do IVA pago a montante mais precisa do que a resultante da aplicação do método do volume de negócios» (n.º 51);
– «qualquer Estado-Membro que decida autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efetuar a dedução com base na afetação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços deve garantir que as modalidades de cálculo do direito à dedução permitam estabelecer com a maior precisão a parte do IVA relativa às operações que conferem direito à dedução» (n.º 52);
Na mesma linha, tem decidido o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, inclusivamente no acórdão de 24-02-2021, proferido no processo n.º 084/19.8BALSB, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira na decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, ao dizer que «o que importava para o caso era que o critério adotado fosse «mais preciso» que o resultante do método residual (ver o parágrafo 34). Isto é, que permitisse estabelecer com maior precisão a parte do IVA relativa às operações que conferem o direito à dedução do que qualquer outro. Que fosse o mais «afinado» considerando as especificidades concretas da atividade do sujeito passivo». ( [6] )
A adequação da aplicação desta jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do TJUE ao caso em apreço é clara, pois está-se perante uma situação em que a única actividade isenta de IVA desenvolvida pelo sujeito passivo (que é a concessão de crédito para aquisição de veículos) é de muito menor expressão (quase metade), tanto em número de contratos como em volume de negócios, do que a actividade tributada em IVA (locação financeira e ALD de veículos).
Nesta específica situação, exigindo, em regra, cada um dos contratos de locação financeira e ALD muito maior utilização de recursos de utilização mista do cada um dos contratos de crédito para aquisição de veículos (como resulta da prova produzida), e sendo muito maior o número de contratos de locação financeira e de ALD de veículos do que o número de contratos de crédito para aquisição de veículos, é forçoso concluir que a percentagem de dedução de 26% aplicada pela Requerente em cumprimento do determinado no ponto 9 do Ofício Circulado n.º 30108 é manifestamente inferior ao real grau de utilização de recursos de utilização mista na actividade tributada.
Por isso, é de concluir que, nesta específica situação dos autos, o método de repartição determinação da percentagem de utilização dos recursos de utilização mista previsto neste ponto 9 do Ofício Circulado n.º 30108 não tem potencialidade para «garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios».
As decisões do TJUE proferidas em reenvio prejudicial têm carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, o que é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º) ( [7] ).
Assim, à luz desta jurisprudência, é de concluir que o critério de repartição com base no volume de negócios é o mais adequado no caso em apreço, pelo que a autoliquidação impugnada e a decisão do pedido de revisão oficiosa que a manteve enfermam de vício de violação de lei, por erro de aplicação do artigo 23º, n.ºs 2 e 4, do CIVA e artigo 173.º, n.º 2, da Directiva n.º 2006/112/CE.
3.3.2. Aplicação da jurisprudência do TJUE e do Supremo Tribunal Administrativo relativa a entidades com actividade bancária geral
De qualquer modo, mesmo que se entenda que a Requerente deve ser considerada um «banco», com actividade isenta reduzida a crédito para aquisição de veículos, sempre se teria de concluir a utilização de recursos de utilização mista é primacialmente afecta à disponibilização dos veículos, inerente aos contratos de locação financeira e ALD, que exigem, por exemplo, assegurar a entrega do veículo e tratar de registos e assuntos relacionados com infracções estradais e portagens.
Na verdade, todas as actividades referidas, que ocorrem apenas nos contratos de locação financeira e ALD de veículos por o veículo ser propriedade da Requerente e ser disponibilizado ao cliente durante o período de duração do contrato, são actividades geradas pela disponibilização dos veículos e não pelo financiamento ou gestão dos contratos.
Trata-se de actividades que não ocorrem quando não há disponibilização dos veículos, mas apenas financiamento, como sucede nos contratos de mera concessão de crédito para a aquisição de veículos, em que os clientes adquirem os veículos para si próprios e, por isso, a entidade financiadora não tem de assegurar todas as actividades decorrentes da qualidade de proprietário.
Assim, actividades relacionadas com a gestão dos contratos de locação financeira e ALD serão (como sucede com os contratos de concessão de crédito) apenas as que se reportam aos próprios contratos, como são a maior parte daquelas para que estão previstas comissões comuns para os contratos de locação financeira, ALD e crédito automóvel, com0, por exemplo, o reembolso antecipado parcial ou total, o processamento mensal das rendas ou prestações, a recuperação de valores em dívida e alterações contratuais, além de algumas exclusivas dos contratos de locação financeira e ALD, como são a transmissão da posição jurídica do cliente e alteração de registos.
Neste caso, apurou-se que, além da actividade anterior à entrega dos veículos, destinada à sua disponibilização aos clientes, é significativa a actividade posterior à entrega dos veículos que é provocada pela sua disponibilização, que ocorre nos contratos de locação financeira e ALD e não ocorre nos contratos de crédito para aquisição de veículos, em não é feita disponibilização dos veículos pela Requerente aos seus clientes.
Assim, na linha do ponto 57 do acórdão do TJUE proferido no processo C-153/17, é de concluir que o método imposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que não tem em conta uma afectação real e significativa de uma parte dos custos gerais à disponibilização dos veículos, não se pode considerar que reflicta objectivamente a parte real das despesas efetuadas com a aquisição dos bens e dos serviços de utilização mista que pode ser imputada a essas operações.
Por conseguinte, este método não é suscetível, neste caso concreto em apreço, de garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios.
Para além disso, é convicção do Tribunal Arbitral, embora sem a certeza absoluta que só poderia resultar de uma quantificação exacta ( [8] ), que as actividades anteriores à entrega dos veículos e as consideráveis actividades posteriores derivadas da manutenção dos veículos na posse dos clientes, que só existem nos contratos de locação financeira e ALD, foram de maior dimensão e consumiram mais recursos de utilização mista do que as derivadas do financiamento e gestão dos contratos.
Isto é, utilizando a terminologia do ponto 33 do acórdão do TJUE C-183/13 Banco Mais, é convicção do Tribunal Arbitral que a utilização de bens ou serviços de utilização mista por parte da Requerente, quanto a contratos de locação financeira e ALD, foi sobretudo determinada pela disponibilização dos veículos e «não pelo financiamento e gestão de contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes».
Por isso, a autoliquidação e a decisão de indeferimento do pedido de revisão, que têm como pressuposto de facto que a utilização de bens ou serviços de utilização mista por parte da Requerente, quanto a contratos de locação financeira e ALD, ser sobretudo determinada pelo financiamento e gestão de contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes e não pelas actividades conexas com a disponibilização dos veículos, enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto.
Essas autoliquidação e decisão do pedido de revisão oficiosa enfermam ainda por erro sobre os pressupostos de direito, ao terem subjacente o entendimento de que a imposição do método que consta do ponto 9. do Ofício-Circulado n.º 30108, pode ser efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, como foi, de forma genérica, sem apreciação casuística da questão de saber se a concreta utilização de bens ou serviços de utilização mista por parte da Requerente relacionados com os contratos de locação financeira foi ou não sobretudo determinada pela actividade de disponibilização dos veículos e não pelo financiamento e gestão de contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes.
3.3.3. Inconstitucionalidade da previsão de um método de dedução não previsto em diploma de natureza legislativa
Embora o artigo 173.º, n.º 2, da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, permita ao Estado Português, além do mais, «obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços», não foi legislativamente prevista no CIVA a possibilidade de aplicação de uma percentagem de dedução diferente da que se indica no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA.
Na verdade, entre os métodos para efectuar a dedução prevista no CIVA, não se inclui o método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, de 30-01-2009, mas sim, quanto a métodos que utilizam uma percentagem de dedução, apenas o indicado no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA e que o que foi permitido ao Estado Português pela Directiva, por via legislativa, não era permitido à Direcção-Geral dos Impostos, através de Ofício-Circular.
Esta questão de saber se, à face dos artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP (atinentes ao princípio da legalidade tributária), é permitida a criação normas inovatórias sobre métodos de efectuar a dedução (que se reconduzem a normas de determinação da matéria tributável), por via de Ofício-Circulado emitido pela Direcção-Geral de Impostos, como se prevê no artigo 23.º, n.º 2, do CIVA, é uma questão distinta da de saber se o Estado Português, por via legislativa, podia criar tais métodos, à face do artigo 173.º, n.º 2, alínea c), da Directiva n.º 2006/112/CE.
Esta questão da compatibilidade com a CRP do referido artigo 23.º, n.º 2, do CIVA e do Ofício-Circular referido, não é uma questão de interpretação do Direito da União, mas sim uma questão de Direito Nacional, uma questão de inconstitucionalidade de normas e não da correcção ou incorrecção da sua aplicação.
Esta questão de inconstitucionalidade não é, assim, a de saber se, à face do Direito da União Europeia, do CIVA e do Ofício-Circulado n.º 30108, a Administração Tributária podia impor ao Sujeito Passivo o método previsto no ponto 9 deste Ofício-Circular, mas sim a de saber se aquele artigo 23.º, n.º 2, do CIVA é materialmente inconstitucional se interpretado como permitindo à Administração Tributária impor um método de determinação da matéria tributável por via de Circular, à face dos artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP.
As regras sobre o direito à dedução de IVA, de que resulta o montante do imposto suportado pelo sujeito passivo, são regras de incidência objectiva.
Na verdade, são normas de incidência, em sentido lato, as que «definem o plano de incidência, ou seja, o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da mesma obrigação» ([9] ).
Neste sentido, tanto são normas de incidência as que determinam o sujeito activo e passivos da obrigação tributária, como as que indicam qual a matéria colectável, a taxa e os benefícios fiscais. ([10] )
Assim, por violação dos artigos 112.º, n.º 5, e 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), e 266.º, n.º 1, da CRP, recusa-se a aplicação do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA, na interpretação subjacente ao Ofício-Circulado n.º 30108, de 30-01-2009, segundo a qual, a Administração Tributária poderia impor aos sujeitos passivos de IVA, através de diploma normativo de natureza não legislativa, condições especiais limitadoras do direito à dedução, de que resulta os sujeitos passivos terem de suportar imposto que não suportariam se elas não existissem.
Consequentemente, o artigo 23.º, n.º 2, do CIVA é materialmente inconstitucional na interpretação de que permite à Administração Tributária impor um método de determinação da matéria tributável por via de Circular, à face dos artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP.
3.3.4. Ilegalidade da imposição através de norma administrativa de um método de execução do direito à dedução não previsto legislativamente
Não tendo o método de exercício do direito à dedução sido previsto no Ofício-Circulado n.º 30108 sido previsto em diploma de natureza legislativa, não pode a Administração Tributária determinar a sua aplicação, pois está subordinada ao princípio da legalidade em toda a sua actuação (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55º da LGT) e explicitado no artigo 3.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.
Este último diploma, definindo tal princípio, estabelece que «os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes forem conferidos e em conformidade com os respetivos fins».
À face desta norma, o princípio da legalidade deixou de ter «uma formulação unicamente negativa (como no período do Estado Liberal), para passar a ter uma formulação positiva, constituindo o fundamento, o critério e o limite de toda a actuação administrativa». ([11] )
Por isso, não tendo suporte legislativo a utilização do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, de 30-01-2009, é ilegal a imposição da sua utilização pela Requerente.
Mesmo que o método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado assegurasse mais eficazmente os referidos princípios, a falta da sua previsão em diploma de natureza legislativa nacional, em matéria em que não é directamente aplicável qualquer norma de direito da União Europeia, sempre seria um obstáculo intransponível à sua aplicação, por força do princípio da legalidade, em que se insere o da hierarquia das fontes de direito, à face do qual não é constitucionalmente admissível que seja reconhecido a actos de natureza não legislativa «o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos» (artigo 112.º, n.º 5, da CRP), para mais em matéria sujeita ao princípio da legalidade fiscal, em que se está perante matéria inserida na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP].
Na verdade, a força vinculativa das circulares e outras resoluções da Autoridade Tributária e Aduaneira de natureza geral e abstracta, publicitadas, circunscreve-se à ordem administrativa, pois resulta somente da autoridade hierárquica dos agentes de onde provêm e dos deveres de acatamento dos subordinados aos quais se dirigem. Por isso, as orientações genéricas da Autoridade Tributária e Aduaneira, nomeadamente quanto à interpretação da lei fiscal, apenas vinculam os funcionários sobre quem o emissor tem posição superior na hierarquia, mas essas orientações não vinculam os particulares, cidadãos ou contribuintes, nem os Tribunais, que devem interpretar e aplicar as leis fiscais sem qualquer dependência dos critérios adoptados pela Administração fiscal através dos referidos «despachos genéricos, das circulares e das instruções» (artigo 203.º da CRP). ([12] )
É com este alcance que o n.º 1 do artigo 68.º-A da LGT estabelece que «a administração tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza, independentemente da sua forma de comunicação, visando a uniformização da interpretação e da aplicação das normas tributárias».
Consequentemente, a autoliquidação efectuada pela Requerente aplicando as regras dos n.ºs 8 e 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, impostas pela Administração Tributária, enferma de vício de violação de lei, por ofensa do princípio da legalidade, decorrente da ilegalidade da imposição dessas regras, vício esse que justifica a anulação da autoliquidação, bem como da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que a confirmou.
3.3.5. Falta de prova de «distorções significativas da tributação»
De qualquer forma, a aceitar-se a possibilidade de a Administração Tributária impor o método previsto no ponto 9. do Ofício-Circulado 30108, ele só é aplicável, como se refere na alínea b) do n.º 3 do artigo 23.º do CIVA, «quando a aplicação do processo referido no n.º 1 conduza a distorções significativas na tributação».
A Administração Tributária defende que a aplicação do coeficiente de imputação específico é o único que se mostra adequado ao apuramento da percentagem de dedução, afastando as distorções na tributação, salvaguardando o princípio da neutralidade.
A Requerente defende que não se vislumbram distorções significativas na tributação derivadas do método da percentagem de dedução, nem a AT as apontou no referido Ofício-Circulado n.º 30108, limitando-se a alegar genericamente que elas podem ocorrer.
Na verdade, não se referem no Ofício-Circulado n.º 30108 em que consistem as «distorções significativas na tributação» que resultarão da aplicação do método do pro rata previsto no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, que tanto poderão provocar vantagens como prejuízos, formulando-se nesse sentido um juízo conclusivo, cujos fundamentos não se demonstram. A afirmação feita no ponto 8. do Ofício-Circulado de que «aplicação do prorata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas» é também conclusiva e obscura, pois não se esclarece quais as aludidas vantagens ou prejuízos, nem para quem, nem em que consiste a falta de coerência que se invoca.
De qualquer forma, o procedimento que a Administração Tributária impôs no referido Ofício-Circulado tem a potencialidade de provocar distorções significativas na tributação, como bem demonstram JOSÉ XAVIER DE BASTO e ANTÓNIO MARTINS ([13] ), relativamente à locação financeira com rendas mensais constantes:
«Ora não se consegue demonstrar que o expurgo da amortização financeira contribui para uma sintonia mais fina na determinação da parcela de imposto dedutível. Bem ao invés, demonstra-se que o procedimento que a AT quer obrigar o sujeito passivo a adoptar provoca distorções significativas de tributação e não consegue de modo algum o objectivo que a lei, no artigo 23.º, n.º 3, atribui ao método da afectação real – o objectivo de efectuar a dedução de “com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços [de uso “promíscuo”] em operações que conferem direito à dedução e em operações que não conferem esse direito.
Em financiamentos cujo reembolso é efectuado em prestações periódicas, sabe-se que os juros se apuram e pagam antes da amortização de capital, esta dada pela diferença entre renda total e juro pago. Nas sucessivas prestações, quer em termos de rendas constantes quer de rendas variáveis, como a seguir melhor se verá numericamente, a parte imputável a juros vai flutuando ao longo do tempo de duração do contrato».
Sendo assim, que consequência tem o apuramento do IVA dedutível segundo o método imposto pela AT de expurgar a amortização do cálculo da parcela dedutível? Tem a consequência de fazer flutuar a percentagem de IVA dedutível ao longo do tempo de duração do contrato.
Esta flutuação, porém, só teria razão de ser se houvesse fundamentos para crer que ao longo desse tempo a intensidade do uso dos inputs promíscuos flutuava também na mesma onda. Ora, é bem claro que não há qualquer razão para crer que seja assim. A intensidade do uso desses bens e serviços será eventualmente a mesma, ou se não for, não é através de uma percentagem de dedução calculada com quer a AT que poderá ser apurada essa eventual diferença de intensidade.
A solução imposta pela AT provoca, ela sim, distorções na tributação. Pode entender-se que o método do pro rata a que chamaríamos normal não apura com suficiente rigor a parcela de imposto dedutível, mas ele é, sem dúvida, melhor do que trabalhar com uma percentagem de dedução que faz flutuar a parcela de imposto dedutível ao longo do tempo sem qualquer relação com diferenças na intensidade do uso dos inputs promíscuos pelo sector de actividade cujas operações conferem direito à dedução.
A pretensão da AT em aperfeiçoar o apuramento do imposto dedutível só poderia eventualmente ser conseguida impondo um verdadeiro método de afectação real, não um pro rata manipulado, sem significado e adequação ao objectivo pretendido de evitar distorções significativas na tributação».
Assim, não se pode considerar demonstrado que, na situação em apreço, a determinação do pro rata baseado no volume de negócios provoque ou possa provocar «distorções significativas da tributação», havendo, antes, a certeza de que essas distorções resultam do método imposto pela Administração Tributária.
Pelo exposto, ao pressuporem que a aplicação do método previsto no artigo 23.º, n.º 4, do CIVA gera distorções significativas de tributação e que elas são evitadas pelo método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, a autoliquidação e a decisão da reclamação graciosa enfermam de vício de erro sobre os pressupostos de facto.
3.3.6. Princípio da igualdade
A distorção da tributação provocada pelo método previsto no Ofício-Circulado n.º 30108 detecta-se também quando se compara a limitação do direito à dedução quanto a recursos afectos à locação financeira quando é efectuada por um banco com a de um sujeito passivo que apenas se dedique às actividades de locação financeira e ALD.
Na verdade, o sujeito passivo que apenas se dedique à locação financeira e ALD poderá, sem qualquer limitação, deduzir a totalidade do IVA suportado nos bens e serviços que adquira para exercer essa actividade, pois ela é totalmente tributada, nos termos do artigo 16.º, n.º 1, alínea h) do CIVA, e o artigo 20.º, n.º 1, deste Código assegura o direito à dedução do imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos para realização das operações de transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.
Em última análise, à luz do referido Ofício Circulado, bastará apenas a realização de uma única operação de concessão de crédito, a par de milhares de operações de locação financeira, para o direito de dedução do IVA suportado com os custos gerais passar de total a insignificante.
Assim, o princípio da igualdade (proporcionalidade) exigirá que ao locador financeiro ou alugador de longa duração que, além dessa actividade tributada, desenvolve também actividade isenta, possa deduzir o IVA na parte proporcional ao volume de negócios daquela actividade.
Por isso, são materialmente inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), as normas do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, alínea b) do CIVA, se interpretadas como a aplicação do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108.
3.3.7. Questão da prova das percentagens de dedução indicadas pela Requerente, com aplicação dos dois métodos
A Administração Tributária questiona a quantificação da percentagem de dedução indicada pela Requerente, determinada com base no volume de negócios.
No entanto, a Administração Tributária, na decisão do pedido de revisão oficiosa, não pôs em dúvida que a percentagem de 26% aplicada na autoliquidação, com base no método indicado no Ofício Circulado 30108, e a percentagem de 89% pretendida pela Requerente é determinada com base nos mesmos valores dos volumes de negócios que serviram de cálculo para a primeira percentagem, apenas não considerando no cálculo da percentagem de dedução o valor correspondente às amortizações dos veículos.
Por isso, para além de não serem relevantes fundamentos invocados a posteriori, pelo que já se referiu, não se vê razão para duvidar do cálculo apresentado pela Requerente, que consta da alínea L. da matéria de facto fixada, baseado em dados utilizados na declaração de IVA.
3.3.8. Conclusão
Pelo exposto, conclui-se que,
– a jurisprudência do acórdão do TJUE Banco Mais, não é aplicável à Requerente, por não ser um banco com actividade bancária geral, sendo, antes, uma instituição financeira com actividades limitadas a locação financeira, ALD e crédito para a aquisição de veículos das marcas Renault/Dacia;
– no caso em apreço, a única actividade isenta de IVA desenvolvida pelo sujeito passivo (que é a concessão de crédito para aquisição de veículos) é de muito menor expressão (quase metade), tanto em número de contratos como em volume de negócios, do que a actividade tributada em IVA (locação financeira e ALD de veículos);
– nesta específica situação, exigindo, em regra, cada um dos contratos de locação financeira e ALD muito maior utilização de recursos de utilização mista do cada um dos contratos de crédito para aquisição de veículos, e sendo muito maior o número de contratos de locação financeira e de ALD de veículos do que o número de contratos de crédito para aquisição de veículos, é forçoso concluir que a percentagem de dedução de 26% aplicada pela Requerente em cumprimento do determinado no ponto 9 do Ofício Circulado n.º 30108 é manifestamente inferior ao real grau de utilização de recursos de utilização mista na actividade tributada;
– nesta específica situação dos autos, o método de repartição determinação da percentagem de utilização dos recursos de utilização mista previsto neste ponto 9 do Ofício Circulado n.º 30108 não tem potencialidade para «garantir uma repartição mais precisa do que o que decorreria da aplicação do critério de repartição baseado no volume de negócios»;
– à face da jurisprudência do Acórdão Banco Mais, a possibilidade de impor o método de cálculo do pro rata de dedução quanto a recursos de utilização mista previsto no n.º 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, no que concerne aos contratos de locação financeira efectuados por bancos, não é admitida generalizadamente, antes «tal situação será excepcional», dependendo de se verificar, casuisticamente, que a utilização dos «bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos» (processo C-183/13, Banco Mais, e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 15-11-2017, processo n.º 0485/17, e de 04-03-2015, processos n.ºs 081/13 e 01017/12, e de 04-03-2020, processos n.ºs 7/19.4BALSB e 052/19.0BALSB, entre muitos outros);
– é convicção do Tribunal Arbitral que a utilização de bens ou serviços de utilização mista por parte da Requerente, quanto a contratos de locação financeira e ALD, foi sobretudo determinada pela actividade de disponibilização dos veículos e «não pelo financiamento e gestão de contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes»;
– independentemente da compatibilidade daquele método como o Direito da União Europeia, a sua imposição no âmbito do Direito Nacional, apenas poderia ser feita por via de diploma legislativo e não de circular administrativa, pelo que aquela imposição viola os princípios constitucionais da legalidade e da hierarquia das normas e o princípio administrativo da legalidade [artigos 103.º, n.º 2, e 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP e 55.º da LGT];
– o artigo 23.º, n.º 2, do CIVA é materialmente inconstitucional na interpretação de que permite à Administração Tributária impor um método de determinação da matéria tributável por via de Circular, à face dos artigos 103.º, n.º 2, 112.º, n.º 5, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP;
– não se demonstrou que o método do pro rata previsto no artigo 23.º, n.º 4, do CIVA provoque «distorções significativas da tributação», pelo que não se verifica o pressuposto em que o Ofício-Circulado n.º 30108 assenta a imposição da aplicação do coeficiente de imputação específico previsto no seu n.º 9, e, consequentemente, a imposição na situação dos actos enferma de erro sobre os pressupostos de facto;
– são materialmente inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), as normas do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, alínea b) do CIVA, se interpretadas como a aplicação do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108;
– não tendo sido a hipotética não correspondência à realidade das percentagens indicadas pela Requerente um fundamento do indeferimento do pedido de revisão que manteve a autoliquidação, não pode ser invocado como fundamento de improcedência da pretensão da Requerente;
Pelo exposto, a utilização do «coeficiente de imputação específico» indicado no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108, enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, consubstanciado por ofensa do princípio da legalidade e errada interpretação dos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 23.º do CIVA, e da alínea c) do n.º 2 do artigo 173.º da Directiva n.º 2006/112, pelo que procede o pedido de pronúncia arbitral.
Consequentemente, a autoliquidação relativa ao último período de 2018, em que foi utilização do «coeficiente de imputação específico», enferma de vício de violação de lei, na parte correspondente à errada aplicação do método de cálculo do pro rata de dedução, o que justifica a sua anulação bem como da decisão de indeferimento do pedido de revisão que a manteve, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
4. Restituição de quantia paga em excesso e juros indemnizatórios
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.
Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios.
4.1. Reembolso
A Requerente pagou a quantia autoliquidada relativa ao último período de 2018 e pede o reembolso da quantia de € 398.550,35, correspondente à diferença entre o que pagou aplicando o pro rata de 26% e o que deveria ter pagado aplicando a percentagem de dedução de 89%.
O reembolso da quantia paga indevidamente é consequência directa da anulação da autoliquidação, pelo que a Requerente tem direito ao reembolso daquela quantia.
4.2. Juros indemnizatórios
No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução.
O n.º 1 do artigo 43.º da LGT reconhece o direito como quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços.
O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo n.º 402/06.
Como também se refere no mesmo acórdão, «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º, n.º 3, da LGT».
Este regime justifica-se pela falta de diligência do contribuinte em apresentar reclamação graciosa ou pedido de revisão no prazo desta, como se prevê no n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
O Supremo Tribunal Administrativo uniformizou jurisprudência neste sentido no acórdão uniformizador n.º 4/2023, de 30-09-2020, proferido no processo n.º 40/19.6BALSB, publicado no Diário da República, I Série, de 16-11-2023.
No caso em apreço, a norma à face da qual tem de ser aferida a existência de direito a juros indemnizatórios é a alínea c) deste n.º 3 do artigo 43.º da LGT, que estabelece que eles são devidos «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária».
Como decorre da matéria de facto fixada, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 03-02-2023 e foi decidido em 05-04-2023, antes de se ter completado um ano sobre a sua apresentação.
Assim, a Requerente não tem direito a juros indemnizatórios.
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
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Recusar com fundamento em inconstitucionalidade, por ser incompaginável com os 112.º, n.º 5, e 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), e 266.º, n.º 1, da CRP, a aplicação do artigo 23.º, n.ºs 2, 3 e 4 do CIVA, na interpretação que consta do ponto 9. Do Ofício Circulado n.º 30108, de 30-01-2009;
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Recusar com fundamento em inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), a aplicação das normas do artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, alínea b) do CIVA, na interpretação de que permitem a aplicação do método previsto no ponto 9 do Ofício-Circulado n.º 30108;
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Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à anulação parcial da autoliquidação de IVA respeitante ao mês de Dezembro de 2018, consubstanciada na declaração periódica n.º...;
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Anular a referida autoliquidação, na parte em que foi deduzido IVA em montante inferior ao que resulta do cálculo do pro rata nos termos do n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, com inclusão do valor total das rendas de locação financeira, por enfermar de erros sobre os pressupostos de facto e de direito;
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Anular a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, que manteve a autoliquidação;
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Julgar procedente o pedido de restituição da quantia paga em excesso e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente a quantia de € 398.550,35;
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Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º e 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 398.550,35.
7. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 6.426,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 13-12-2023
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(relator)
(João Taborda da Gama)
(Júlio Tormenta)
[1] A Requerente, por lapso evidente, refere «reclamação graciosa», quando pretendia aludir a pedido de revisão, que foi o meio procedimental que utilizou.
[2] Na terminologia do art. 79.º da LGT, como sucedia nos arts. 138.º e seguintes do CPA de 1991, a «anulação» administrativa tem a designação de «revogação».
O art. 165.º do CPA de 2015, precisou a terminologia distinguindo entre «revogação». que «é o acto administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade, e a «anulação administrativa», que «é o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro acto, com fundamento em invalidade».
No entanto, no procedimento tributário e contencioso tributário não houve qualquer alteração.
[3] A «ratificação» (ou «ratificação-sanação») é o acto administrativo pelo qual o órgão competente decide sanar um acto inválido anteriormente praticado, suprindo a ilegalidade que o vicia (FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, 1989, Volume III, página 414, e Curso de Direito Administrativo, Volume II, página 475).
[4] Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 06-10-1999, processo n.º 023379, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-09-2002, página 3102; de 29-05-2002, processo n.º 047541, publicado em Apêndice ao Diário da República 10-02-2004, página 4047; de 12-12-2002, processo n.º 047699; de 18-12-2002, processo n.º 048366; de 06-05-2020, processo n.º 512/10.8BEPRT.
[5] A utilização deste método é obrigatória de se tratar de bem não utilizados na actividade económica definida na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA.
[6] No mesmo sentido, pode ver-se o acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 20-01-0221, proferido no processo n.º 0101/19.1BALSB.
[7] Neste sentido, entre muitos, podem ver-se os seguintes acórdãos do STA: de 25-10-2000, processo n.º 25128, Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, página 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2593.
[8] J.P. REMÉDIO MARQUES, Acção declarativa à luz do Código revisto, 3.ªed., página 559:
«Dado que a demonstração da realidade dos factos nunca pode aspirar à certeza absoluta – a verdade acerca dos acontecimentos do mundo externo e do mundo psíquico é sempre contingente e é "filtrada" pela consciência do próprio sujeito –, a prova visa apenas formar no espírito do juiz um estado de convicção de que determinado facto respeitante a uma ocorrência alegada pela parte terá provável e razoavelmente acontecido.
A prova visa assim criar no espírito do julgador a convicção psicológica (certeza subjectiva) da realidade de um facto assente na certeza relativa do mesmo».
[9] SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 7.ª edição, página 126.
Em sentido idêntico, pode ver-se e NUNO SÁ GOMES, Manual de Direito Fiscal, volume II, página 56.
[10] Obra e local citados.
[11] FREITAS DO AMARAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA, em Código do Procedimento Administrativo Anotado, 3.ª edição, página 40.
Em sentido semelhante, pode ver-se o primeiro Autor em Curso de Direito Administrativo, volume II: «A lei não é apenas um limite à actuação da Administração: é também o fundamento da acção administrativa. Quer isto dizer que, hoje em dia, não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lho proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça». (FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, volume II, páginas 42-43.
Em sentido idêntico, pode ver-se MARCELO REBELO DE SOUSA, Lições de Direito Administrativo, 1999, volume I, página 84, que refere: «Com o Estado pós-liberal, em qualquer das suas três modalidades, a legalidade passa de externa a interna. A Constituição e a lei deixam de ser apenas limites à actividade administrativa, para passarem a ser fundamento dessa actividade.
Deixa de valer a lógica da liberdade ou da autonomia, da qual gozam os privados, que podem fazer tudo o que a Constituição e a lei não proíbem, para se afirmar a primazia da competência, a Administração Pública só pode fazer o que lhe é permitido pela Constituição e a lei, e nos exactos termos em que elas o permitem.».
Nesta linha tem vindo a decidir uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se, por exemplo, pelo acórdão de 13-11-2002, processo n.º 047932.
[12] Neste sentido, pode ver-se MANUAL DE DIREITO FISCAL, Pedro Soares Martinez, Edições Almedina, Coimbra, 1.ª Reimpressão -1984, página 109.
[13] Em “A determinação da parcela de IVA dedutível contida nos inputs “promíscuos” dos operadores de locação financeira – as consequências do Acórdão do TJUE no caso Banco Mais, de 10 de Julho de 2014 (Proc. C-183/13)”, publicado em Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano 10, n.º 1, página 27 e seguintes, 46-47.