Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 390/2023-T
Data da decisão: 2023-11-28  IMI  
Valor do pedido: € 91.920,08
Tema: IMI / AIMI – impugnação de liquidações com fundamento em errónea quantificação dos VPT’s-
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SUMÁRIO: Deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável (Ac. STA – Pleno CT – de 23-02-2023, proc. n.º 0102/22).

 

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO A..., NIF..., representado por B...– SGOIC, S.A., NIPC ..., com sede na ..., n.º ..., ...-... Lisboa, veio, nos termos legais, requerer a constituição de tribunal arbitral.

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

I – RELATÓRIO

 

  1. O Pedido

 

O Requerente peticiona:

 

- relativamente às liquidações de IMI referentes ao ano de 2019 (n.ºs 2019..., 2019... e 2019...), a sua anulação parcial no montante de € 39.394,32.

- relativamente à liquidação do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º2020..., relativa a 2020, a sua anulação parcial no montante de  € 52.525,76.

- pede, consequentemente, a anulação da decisão de indeferimento do procedimento de reclamação graciosa n.º ...2023... e a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.

 

  1. O Litígio

 

O Requerente alega, em suma, que as liquidações em causa, no relativo a prédios classificados como “terrenos para construção”, assentam em erradas quantificações dos respetivos VPT’s por terem sido consideradas a majoração de 25% do valor base prevista no n.º 1 do artigo 39.º do CIMI e a percentagem da área de implantação prevista no n.º 2 do artigo 45.º, em valor superior a 15%.

 

A reclamação graciosa foi indeferida por a Requerida a ter considerado precludido o direito à correção administrativa dos VPT´s subjacentes às liquidações, como adiante se concretizará. Posição que reafirma na sua resposta.

 

  1. Tramitação Processual

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 31/5/2023.

Os árbitros que constituem este Tribunal foram designados pelo CAAD e aceitaram tempestivamente as nomeações, as quais não foram objeto de impugnação.

O tribunal arbitral ficou constituído em 01/08/2023.

A Requerida apresentou Resposta e não juntou PA.

Por despacho arbitral de 09/10/2023, foi o Requerente notificado para, querendo, se pronunciar sobre a exceção de inutilidade superveniente da lide invocada pela Requerida na sua resposta.

A 20/10/2023, o Requerente defendeu a existência de uma inutilidade superveniente da lide (parcial) quanto ao IMI de 2019, a qual é imputável ao Requerente, e de uma inutilidade superveniente da lide (parcial) quanto ao AIMI de 2020, a qual é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, mais requerendo a “suspensão da instância até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida no processo n.º 361/21.8BECBR, nos termos do artigo 272.º do CPC, aplicável por força da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, tudo com as legais consequências”.

Por despacho de 15/11/2023 foi decidido dispensar, por falta de objeto, a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e prescindir da produção de alegações, nenhuma das partes se tendo oposto a tal despacho.

 

 

II - SANEAMENTO

O processo não enferma de nulidades ou de irregularidades.

 

III– PROVA

 

III. 1- Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. O Requerente é proprietário dos prédios urbanos, “terrenos para construção”, inscritos na matriz sob os artigos: -..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... , ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ...,..., ..., ... e ...- sitos na freguesia de ..., concelho de Coimbra.
  2. Em 01.12.2020, o Requerente apresentou um pedido de retificação da inscrição matricial dos prédios e, bem assim, submeteu as Declarações Modelo 1 adequadas para o efeito, onde pugnou pela neutralização dos elementos que considera indevidamente utilizados pela Autoridade Tributária.
  3. Notificado das avaliações, em 21.01.2021 requereu segundas avaliações.
  4. Em 30.08.2021, interpôs ação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (processo 361/21.8BECBR),com vista à contestação da avaliação definitiva dos prédios em causa.
  5. Paralelamente, deduziu reclamação graciosa contra as liquidações que ora impugna.
  6. Tal reclamação foi indeferida com a seguinte fundamentação:

“(…) a jurisprudência dos tribunais administrativos e fiscais tem vindo a defender que esses coeficientes não podem ser considerados na avaliação dos terrenos para construção, por se entender que o artigo 45.º do CIMI, na redação anterior a 01.01-2021, não permitia a sua aplicação. Sendo assim, cabe verificar se as avaliações emcausa podem ser anuladas com fundamento em invalidade, dado que tiveram origemem declarações modelo 1 de IMI anteriores a 01-01-2021. As avaliações efetuadas no âmbito do CIMI constituem atos em matéria tributária, dai que possam ser revogadas nos termos do artigo 79.º, n.º 1, da LGT, desde que estejam reunidos os pressupostos legais para o efeito.

 

Assim, quando a reclamação foi apresentada (30-12-2020), já tinham decorrido mais de cinco anos desde a realização das avaliações contestadas pelo contribuinte.

Desde modo, temos de concluir que foi ultrapassado o prazo legal para anular administrativamente esses atos de avaliação, com fundamento em invalidade, uma vez que já decorreu o prazo limite de cinco anos previsto no artigo 168.º, n.º 1, do CPTA.

 

  1. O Requerente procedeu ao pagamento dos montantes liquidados.

Todos estes factos estão documentalmente provados, não tendo suscitado qualquer divergência entre as partes.

 

III.2 - Factos não provados

Não existem factos não provados relevantes para a decisão da causa.

 

 

 

IV - O DIREITO

 

Citando o Requerente (nº 13 e 14 do requerimento inicial), a Autoridade Tributária pugnou pelo indeferimento do procedimento administrativo subjacente aos presentes autos por entender que, uma vez ultrapassado o prazo legal de 5 anos para revogação dos atos de avaliação do VPT dos PRÉDIOS, com fundamento na sua invalidade, previsto no n.º 1 do artigo 168.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), a anulação dos atos de liquidação ora sindicados não se afigura possível. Conclui, pois, a Autoridade Tributária, que os atos de liquidação sub judice se afiguram legais, na medida em que advieram do VPT que estava, à data dos factos, em vigor.

Sucede que, a posição da Autoridade Tributária é totalmente contrária à posição que tem vindo a ser defendida, quer pela jurisprudência, quer pela doutrina, que admitem expressamente que a legalidade das liquidações de IMI (e de AIMI) pode ser alvo de escrutínio, mesmo quando tenham por base um VPT cuja avaliação não foi contestada, uma vez que a própria liquidação será irremediavelmente ilegal.

 

Acontece que este entendimento jurisprudencial, por nós também sufragado, tem que ser considerado arredado pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido pelo STA em 23-02-2023, no processo n.º 0102/22: “Deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável.”

 

Pelo que, de acordo com o ditame do STA, há que concluir pela impossibilidade legal de apreciação do pedido uma vez que a situação em apreço é a da invocação da ilegalidade de liquidações com fundamento na ilegal fixação dos VPT’s subjacentes.

 

Duas notas mais:

 

- ao que afirma, o Requerente terá impugnado judicialmente a fixação dos VPT’s em causa em ação judicial que ainda correrá os seus termos no TAF de Coimbra, tendo requerido a suspensão do presente processo arbitral até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nessa ação.

Contudo, a pretensão do Requerente não pode ser atendida, pois para além de ainda estar em aberto a possibilidade deste, em caso de êxito nesta ação, poder ver satisfeito o que ora pede, a situação parece configurar, pelo menos materialmente, um caso de litispendência.

 

- o Requerente cita jurisprudência arbitral posterior ao referido acórdão do STA,  que conclui que apesar da não impugnabilidade (normal) de atos de liquidação de IMI com fundamento em ilegalidade na fixação do VPT que lhes serviu de base, os n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT admitem a possibilidade (excecional) de revisão oficiosa de atos tributários (incluindo liquidações de IMI) “com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.

 

Independentemente da bondade de tal dictum, o certo é que é inaplicável neste caso, pois aqui está em causa, diretamente, o indeferimento de um reclamação graciosa, procedimento que, muito embora podendo ter como causa qualquer ilegalidade, relativamente ao qual não existe a previsão fundamento de injustiça grave ou notória, diferentemente do que sucede relativamente à revisão oficiosa a pedido do interessado.

 

 

 

V – DECISÃO ARBITRAL

 

Pelo exposto, há que concluir pelo indeferimento total dos pedidos formulados pelo Requerente.

 

28 de novembro de2023

 

VALOR: € 91.920,08.

 

CUSTAS, no montante de € 2.754,00, a cargo do Requerente por ter sido total o seu decaimento.

 

Os árbitros

 

 

 

Rui Duarte Morais (relator)

 

 

Ana Paula Marques Rocha

 


 

 

Carla Alexandra Pacheco de Almeida Rocha da Cruz