Processo Arbitral n.º 140/2012-T
Acordam, nestes autos, os juízes-árbitros, Desembargador Manuel Luís Macaísta Malheiros, presidente, Exma. Sra. Dra. Adelaide Moura e Exmo. Sr. Dr. André Gonçalves, adjuntos:
1. RELATÓRIO
1.1 “…”, contribuinte fiscal n.º …, e …, contribuinte fiscal n.º …, doravante também designados por “Requerentes”, apresentaram pedido de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no artigo 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, doravante “RJAT”), sendo a “Requerida”, a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT”).
Os Requerentes pretendem a declaração da ilegalidade das liquidações de Adicionais de Imposto Municipal sobre as Transacções Onerosas de Imóveis (doravante “IMT”) e Juros Compensatórios n.º … e n.º …, de 03 de Abril de 2012, praticados na sequência dos Ofícios n.º … e …, de 14 de Março de 2012.
1.2 Como fundamento do seu pedido, os Requerentes alegaram em síntese que: /2012-T
Os Requerentes são ambos cidadãos Portugueses, casados no regime de separação de bens, tendo o Requerente – … [marido] – alterado o seu domicílio fiscal para Espanha a 19/12/2007 e a Requerente, sua mulher, … – alterado o seu domicílio para Espanha em 20/05/2010.
Em 20/05/2010, na 2.º Conservatória do Registo Predial de Cascais, os Requerentes outorgaram escritura pública de compra e venda, adquirindo, em partes iguais, imóvel destinado a habitação, sito na Avenida …, em Cascais, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º …, da freguesia de Cascais (doravante “Imóvel”).
Para aquisição deste imóvel, os Requerentes utilizaram a quantia de € 516.270,00 (quinhentos e dezasseis mil, duzentos e setenta euros), com proveniência na conta bancária n.º …, no Banco …, constituída por ambos em 09/11/2009.
A 13 de Maio de 2010, o Banco …, S.A. emitiu uma declaração onde expressamente refere que “para efeitos do disposto no Artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, de 9 de Julho, mantida em vigor pelo Decreto-lei n.º 323/95, de 29 de Novembro vem o Banco …, SA, com sede no Porto, …, declarar que o Sr. Dr. …, titular do BI no. …, NIF n.º …, emigrante em Espanha, e a Dra. …, titular do BI no. …, NIF …, transferiram para a Conta Poupança-Emigrante n.º …, € 516.270,00 (quinhentos e dezasseis mil, duzentos e setenta euros) ao abrigo la legislação em vigor, destinados à aquisição de habitação própria situada na Av. …, em Cascais, artigo matricial no …, inscrita na 1.ª Conservatória do registo Predial de Cascais sob o n.º …. Mais declara que a conta acima referida foi constituída em 9 de Novembro de 2009”.
Os Requerentes a 20 de Maio de 2010, apresentaram no Serviço de Finanças de Cascais – …, as declarações para liquidação de IMT com indicação do código 1, no campo 48, para assinalar a “isenção de imposto até ao dobro do montante transferido e utilizado na aquisição, através de conta poupança-emigrante”.
Foram emitidos os Documentos de Pagamento do IMT n.º … e …, com indicação de valor a pagar correspondente a € 0 (zero Euros).
Foram desencadeadas acções inspectivas internas, tendo a AT, em concreto o Serviço de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, concluído este Serviço, após exercício de Audição Prévia e Reclamação Graciosa pelos ora Requerentes (a qual foi objecto de indeferimento), em suma, que a conta poupança emigrante não cumpria os requisitos necessários para beneficiar da isenção de IMT, por força da sua constituição em 09 de Novembro de2009, não tendo sido, portanto, constituída ao abrigo do Decreto-Lei n.º 323/95 de 29 de Novembro, logo não podendo usufruir da isenção do art. 7.º do Decreto-lei 540/76, de 9 de Julho, conforme alterado, pelo que é devida a liquidação integral de IMT.
Em causa nos presentes autos está a aplicabilidade aos factos supra expostos da isenção de IMT nas aquisições por emigrantes portugueses de prédios urbanos ou as suas fracções na parte em que a matéria colectável não exceda o dobro do saldo de conta bancária aberta em Portugal e por estes titulada, que tenha sido produto de transferências realizadas do exterior, criada pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, de 9 de Julho.
Na sua exposição os Requerentes referem pormenorizadamente a evolução legislativa do Decreto-Lei 540/76, de 9 de Julho (doravante Decreto-Lei 540/76) e dos diplomas conexos, arguindo ilegal o entendimento da AT no sentido de que “o Decreto-Lei n.º 167/2006, de 17 de Agosto, revogou o âmbito da isenção prevista no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, de 9 de Julho, ou por via da revogação do Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro, ou por via da extinção das contas especiais denominadas conta-emigrante”.
Consideram os Requerentes que os Decretos-Lei n.º 140-A/86, de 14 de Junho, n.º 323/95, de 29 de Novembro e n.º 169/2006, de 17 de Agosto, não poderiam, em nenhum momento, alterar o âmbito de aplicação da isenção estabelecida no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76 (foi por diversas vezes referido pelos Requerentes no Requerimento de Constituição Arbitral o Decreto-Lei n.º 167/2006, certamente por lapso, entendendo este Tribunal que se estavam a referir ao citado Decreto-Lei n.º 169/2006).
Sustentam os Requerentes a sua posição no facto de que o objectivo do Decreto-Lei n.º 169/2006, foi apenas e só determinar a extinção do sistema poupança-emigrante, enquanto meio legal que possibilitou a contratação de empréstimo bonificados, fazendo referência expressa ao preâmbulo deste diploma, arguindo que a isenção de IMT está fora do âmbito do sistema de contratação de empréstimos bonificados, pelo que não era intenção do legislador proceder à revogação da isenção.
Salientam ainda os Requerentes que existem posteriores referências expressas na lei à isenção em causa, em particular o n.º 4, do artigo 17.º do código IMT.
Por fim, referem os Requerentes que para que os mencionados Decretos-Lei pudessem alterar o âmbito de aplicação da isenção, teriam de ser sustentados em autorização legislativa da Assembleia da República para o efeito, o que não aconteceu no presente caso.
Reforçando o argumento acima referido, invocam os artigos 103.º, n.º 2 e 3 e 165.º, n.º, i) da Constituição da República Portuguesa, diversa doutrina escrita sobre esta matéria, bem como o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 9 de Maio de 2012, proferido no âmbito do processo 888/11.
Os Requerentes consideram que não pode considerar-se limitativa da aplicação da isenção a data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 169/2006, de 17 de Agosto, “pelo que se deve reconhecer a aplicabilidade da isenção ao caso objecto dos presentes autos”,
Devendo ser inconstitucional a norma constante do artigo 9.º, n.º 1 do
Decreto-Lei n.º 169/2006, de 17 de Agosto (doravante “Decreto-Lei 169/2006”), quando interpretada no sentido de que procedeu à revogação da isenção de IMT prevista no artigo 7.º, do Decreto-Lei n.º 540/76, mantido em vigor pelo Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro (doravante Decreto-lei 323/95), considerando-se em vigor as normas relativas à abertura e movimentação das contas poupança-emigrante para efeitos da aplicação da isenção.
Solicitam os Requerentes a declaração de ilegalidade das liquidações adicionais de IMT identificadas.
Em sede de alegações finais escritas, os Requerentes argumentam que “a fundamentação do acto de liquidação adicional não pode ser dada a posterior, pelo que não pode considerar-se fundamento da manutenção da decisão da Autoridade Tributária a obrigação de fazer prova da regular constituição da Conta Poupança-Emigrante e da regularidade dos respectivos depósitos”.
Descrevem ainda os factos que consideram assentes, que não foram objecto de impugnação pela AT, e destacam que a questão em apreço se resume à possibilidade, ou não, do Governo, sem necessidade de obtenção de autorização legislativa, proceder à revogação da isenção fiscal em apreço, reiterando, em suma, os argumentos já expostos no Requerimento de Constituição Arbitral quanto a esta matéria, concluindo, naturalmente, pela procedência do pedido arbitral, declarando-se ilegais os actos de liquidação adicional de IMT e respectivos juros compensatórios em apreço.
1.3 A Autoridade Tributária e Aduaneira contestou alegando, desde logo, que os fundamentos arguidos pelos Requerentes careciam de base legal, pelos motivos que, também em resumo, passamos a expor:
A AT começa por descrever o denominado “sistema poupança-emigrante” instituído pelo já referido Decreto-Lei n.º 540/76, bem como as subsequentes alterações a este regime e diplomas conexos.
Refere a AT que deixando de vigorar o “sistema poupança-emigrante”, revogado pelo Decreto-Lei n.º 169/2006, a isenção de IMT perdeu a sua aplicabilidade, caducando.
Caducidade reforçada pela impossibilidade de aplicação prática dos pressupostos constitutivos da referida isenção, pois deixou de existir quer o crédito quer as contas emigrantes reguladas para efeitos de aplicação da isenção em apreço.
Salienta a AT a regularidade da manutenção de referências a este regime na legislação actual, em particular no n.º 4, do artigo 17.º do código IMT, constatando que o regime em apreço foi apenas revogado para efeitos de contratação de novas operações, aplicando-se a operações contratadas antes de 18/08/2006.
Com referência à questão arguida pelos Requerentes da necessidade desta isenção só poder ser objecto de revogação através de autorização legislativa da Assembleia da República para o efeito, refere a AT que esta abordagem deverá considerar-se manifestamente redutora, “porquanto o Decreto-Lei n.º 169/2006 não determinou a revogação da isenção prevista no art. 7.º do decreto-Lei n.º 540/77 mas antes a revogação, para operações futuras, do sistema poupança-emigrante regulado, então, pelo Decreto-Lei n.º 323/95, o qual definia os termos em que deviam ser realizadas as correspondentes operações de abertura de conta e concessões de empréstimos”.
Conclui a AT pela improcedência do entendimento dos Requerentes por falta de sustentação legal, referindo, subsidiariamente, que não se efectuou prova quanto aos requisitos da conta especial emigrante, mais concretamente os pressupostos legais contidos nos artigos n.º 1.º e 2.º da Portaria n.º 909/2003, em regulamentação do disposto nos artigos 7.º a 9.º do Decreto-Lei n.º 323/95.
Em sede de alegações finais escritas, arguiu a AT que a declaração emitida pelo … [banco] junto aos autos não comprova que ambos os Requerentes reúnam os pressupostos do estatuto de emigrantes, nem que as importâncias transferidas para uma conta sediada em Portugal tenham a sua proveniência no estrangeiro.
Reforça ainda que o art 7.º do Decreto-lei 540/76 cessou a sua vigência, para efeitos de operações futuras, com a revogação do Decreto-lei 323/95, pelo Decreto-Lei n.º 169/96, defendendo que apenas podem usufruir deste regime as aquisições de imóveis efectuadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 323/95, com conta aberta até 18/08/2006 (ou nos casos de recurso a crédito cujo pedido de financiamento tenha sido efectuado até 18/08/2006 e a aquisição do imóvel contratada até 30/10/2006).
Acrescenta referindo que, “mesmo sem recurso ao crédito, a aquisição, para efeitos da isenção em IMT, depende do saldo da “conta especial nos termos do art. 5.º, com observância do disposto no n.º 2 do art. 4.º”, sendo que essa conta especial e os normativos legais que regulam, a sua constituição foram revogados, para operações futuras, no caso para aberturas de contas após 18/08/2003, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 169/2006”.
Conclui a AT referindo que a cessação da vigência do art. 7.º do Decreto-Lei 540/796 decorreu não da sua revogação por outra norma, mas antes pela sua caducidade, a qual é reforçada pela impossibilidade da aplicação prática dos pressupostos constitutivos da referida isenção, devendo, portanto, o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído, é materialmente competente, o processo não enferma de vícios que o invalidem, não foram arguidas excepções e as Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostraram-se legítimas e as Requerentes estão regularmente representadas por Advogado, cumpre, pois, apreciar e decidir.
2.2 Constitui questão decidenda nos presentes autos a de saber sobre a legalidade das liquidações de IMT e de juros compensatórios acima enunciadas, no valor total de € 63.231,36.
2.3 Como pertinentes ao conhecimento e decisão da questão decidenda o Tribunal Arbitral dá como provados os seguintes factos:
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A 09 de Novembro de 2009, os Requerentes abriram junto do banco … conta bancária n.º …, denominada por esta instituição bancária “Conta Poupança-Emigrante”;
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A 20 de Maio de 2010, os Requerentes eram titulares da Conta Poupança-Emigrante n.º …, aberta junto do Banco …, S.A;
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A 20 de Maio de 2010, a mencionada Conta Poupança-Emigrante tinha, pelo menos, o saldo de 516.270,00 € depositados;
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A 20 de Maio de 2010, os Requerentes adquiriram o prédio urbano destinado a Habitação, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º …, da freguesia de Cascais, pelo valor de 1.000.000,00 €, utilizando para o efeito o saldo referido no parágrafo anterior no valor de 516.270,00 €;
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A 20 de Maio de 2010, na sequência da apresentação dos Modelos 1, com indicação do código 1, no campo 48, para assinalar a “isenção de imposto até ao dobro do montante transferido e utilizado na aquisição, através de conta poupança-emigrante”, prevista no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, de 9 de Julho, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 316/79, de 21 de Agosto, foram emitidos pelo Serviço de Finanças de Cascais – …, os Documentos de Pagamento do IMT n.º … e …, com indicação de valor a pagar correspondente a € 0 (zero Euros);
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Após acção inspectiva aos Requerentes, levada a cabo entre Fevereiro e Outubro de 2011, foram emitidas as liquidações adicionais de IMT e liquidações de Juros Compensatórios n.º … e n.º …, no montante de 31.630,68 €, cada uma, perfazendo o total de € 63.231,36, arguindo a AT a não aplicação da isenção de IMT invocada pelos Requerentes.
A convicção deste Tribunal fundamenta-se no acordo das partes relativamente aos factos dados como assentes e nos documentos com que os Requerentes instruíram o seu pedido.
Não existem factos com relevância para a decisão da causa que não tenham sido dados como provados.
2.4 Conforme atrás já referido, a questão decidenda resume-se à legalidade, ou não, das liquidações de IMT e de juros compensatórios acima enunciadas, no valor total de € 63.231,36.
Ou seja, importa apurar a legalidade da aplicação do art. 7.º do Decreto-Lei n.º540/76, conforme alterado, considerando a operação e os factos supra descritos.
O art. 7.º do Decreto-Lei n.º540/76, com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 316/79, de 21 de Agosto, determinava no seu n.º 1 que “as aquisições de prédios rústicos ou urbanos ou as suas fracções autónomas beneficiam de isenção de sisa se a matéria colectável que servir de base à liquidação não exceder o montante correspondente ao dobro do saldo revelado pela conta especial constituída nos termos do artigo 5.º, com observância do disposto no n.º 2 do artigo 4.º, ou ao dobro da parte do mesmo saldo utilizada na aquisição se não houver recurso ao crédito”.
O n.º 2 deste artigo referia que “se a matéria colectável exceder o montante referido no número anterior, liquidar-se-á sisa [agora, IMT] sobre o excesso” (informação entre parênteses rectos nossa).
A referida conta especial foi regulamentada pela Portaria n.º 418/79, de 11 de Agosto, em que se definiram as condições de abertura e movimentação das contas especiais denominadas “depósitos de poupança-crédito”, a qual foi alterada pela Portaria n.º 505/82, de 18 de Maio.
O Decreto-Lei n.º 79/79, de 9 de Abril procedeu a uma alteração profunda do então vigente sistema poupança-crédito, alterando os artigos 1.º a 5.º do Decreto-Lei n.º 540/76.
Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 140-A/86, de 14 de Junho, procedeu à revogação do Decreto-Lei n.º 540/76, excepto quanto ao disposto no seu artigo 7.º., procedendo à reformulação do sistema de poupança-crédito, passando a conta poupança crédito a denominar-se conta poupança-emigrante.
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro, revogou o Decreto-Lei n.º 140-A/86, de 14 de Junho, mantendo em vigor o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 316/79, de 21 de Agosto.
Finalmente, o Decreto-Lei n.º 167/2006, procedeu à revogação do Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro.
Com a revogação do Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro, justificada no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 167/2006, de 17 de Agosto, entre outras, pela inexistência de justificação sócio-económica para a manutenção do sistema poupança-emigrante, foram apenas salvaguardadas as operações já contratadas.
Ou seja, após 18/08/2006 deixou de ser possível o recurso ao sistema poupança-emigrante porque este foi objecto de revogação, salvaguardando-se apenas as operações já contratadas.
Considerando os diplomas legais supra referidos, deverá entender-se que a aplicabilidade da isenção prevista no art. 7.º do Decreto-Lei 540/76, conforme alterado, sempre esteve dependente do sistema poupança-emigrante.
Assim, acompanhamos o entendimento da AT no sentido de que, “apenas as aquisições de imóveis efectuados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 323/95, quer porque houve recurso ao crédito cujo pedido de financiamento foi efectuado até 18/08/2006 e a aquisição do imóvel foi contratada até 30/10/2006, nos termos do n.º 4 do art. 8.º do Decreto-Lei n.º 169/2006, quer porque não havendo recurso ao crédito foi utilizado o saldo da conta especial emigrante aberta até 18/08/2006, continuam a poder beneficiar da isenção de IMT em apreço”.
Considerando o acima exposto, entende-se óbvia e plenamente justificada a referência expressa ao Decreto-Lei n.º 540/76, referida no n.º 4, do artigo 17.º do código IMT, porquanto aquando da revogação do Decreto-Lei n.º 323/95 foram salvaguardadas as operações já em curso.
Assim, discordamos dos Requerentes quando estes argumentam que existindo referências expressas na lei à isenção em causa, contraria-se a alegada intenção do legislador de proceder á revogação desta isenção de IMT.
Com efeito, a manutenção de referência expressa a este regime está exclusivamente relacionada com o regime de salvaguarda expressamente previsto no Decreto-Lei n.º 169/2006, para as operações já contratadas previamente à revogação do Decreto-Lei 323/95 (ex vi Decreto-Lei n.º 169/2006).
No caso em apreço, conforme referem os Requerentes, a conta bancária que o banco …, na declaração anexa aos autos, denomina de conta Poupança-Emigrante, foi apenas aberta/constituída a 9 de Novembro de 2009.
Ou seja, a conta bancária em apreço foi aberta/constituída após a revogação do referido sistema poupança-emigrante regulado no Decreto-Lei 323/95, logo sem condições de poder usufruir do regime de isenção de IMT, previsto no art. 7.º do Decreto–Lei 540/76, conforme alterado, porquanto a aplicação desta isenção estava condicionada pela verificação dos pressupostos tal como enunciados no Decreto-Lei 323/95 (à data dos factos já revogado).
Considerando o acima exposto, entende-se irrelevante pronúncia sobre a questão associada à necessidade de comprovação da origem dos depósitos realizados e do cumprimento dos requisitos da Portaria n.º 909/2003, de 29 de Agosto, que regulamentava o Decreto-Lei 323/95.
Com efeito, mesmo que tais factos/requisitos se considerem concretizados/verificados, releva para efeitos da questão decidenda o facto da conta em apreço ter sido constituída/aberta apenas em 2009, logo em data posterior à revogação do Decreto-Lei 323/95, que regulava o sistema poupança-emigrante.
Conforme atrás já referimos, condição de aplicação da isenção de IMT prevista no art. 7.º do Decreto-Lei 540/76, conforme alterado, é a aplicabilidade do sistema poupança-emigrante aos fundos utilizados para efeitos de aquisição do imóvel, nos termos regulados no Decreto-Lei 323/95.
Ora, se o regime do Decreto-Lei 323/95 já estava revogado à data da constituição/abertura da conta bancária junto do … [banco], esta não pode preencher os seus requisitos, logo a operação em apreço não pode beneficiar da isenção de IMT arguida pelos Requerentes.
Assim, conforme refere a AT, e em nossa entender bem, “o art 7.º do Decreto-lei 540/76 cessou a sua vigência, para efeitos de operações futuras, com a revogação do Decreto-lei 323/95, pelo Decreto-Lei n.º 169/96: como resulta evidente do seu preâmbulo e respectivos normativos legais, apenas as aquisições de imóveis efectuadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 323/95, quer porque houve recurso ao crédito cujo pedido de financiamento foi efectuado até 18/08/2006 e a aquisição do imóvel foi contratada até 30/10/2006 (nos termos do n.º 4 do art. 8.º do Decreto-Lei n.º 169/2006), quer porque não havendo recurso ao crédito foi utilizado o saldo da conta especial emigrante aberta até 18/08/2006, continuam a poder beneficiar da isenção de IMT”.
Não tem por isso razão os Requerentes quando sustentam e requerem a declaração de ilegalidade das liquidações de IMT em apreço.
Por fim os Requerentes vêm também arguir a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 9.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 169/2006, quando interpretada no sentido de que procedeu à revogação da isenção de IMT prevista no artigo 7.º, do Decreto-Lei n.º 540/77.
Não têm razão, porém, os Requerentes.
Acompanhamos quanto a esta matéria o entendimento da AT no sentido de que “o Decreto-Lei 169/2006 não determinou a revogação da isenção prevista no art. 7.º do Decreto-Lei n.º 540/77 mas antes a revogação, para operações futuras, do sistema poupança-emigrante regulado, então, pelo Decreto-Lei n.º 323/95, o qual definia os termos em que deveriam ser realizadas as correspondentes operações de abertura de conta e concessões de empréstimos”.
Com efeito, com a revogação do sistema poupança-emigrante, para operações concretizadas após 18/08/2006, existe impossibilidade de aplicação prática dos pressupostos constitutivos da referida isenção de IMT, devendo considerar-se que caducou o benefício em apreço.
Está aqui em causa apenas a revogação do sistema poupança-emigrante, não tendo sido revogado o benefício fiscal do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 540/76, o qual, conforme a própria AT refere, continua e continuará a aplicar-se ao saldo de contas abertas até 18/08/2006, nas condições referidas no Decreto-Lei 323/95.
Ora, continuando este benefício fiscal a aplicar-se, desde que reunidos os requisitos para esse efeito, não colhe a argumentação que o mesmo foi objecto de revogação por norma incompetente.
Pelo que por esta razão deverá também improceder o pedido das Requerentes.
3. DECISÃO
Destarte, atento tudo o exposto, acordam, neste Tribunal Arbitral, em julgar improcedente o pedido formulado pelos Requerentes no presente processo arbitral tributário quanto à ilegalidade das liquidações de IMT e respectivos juros compensatórios.
De acordo com o disposto no art.º 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor do processo em € 63.231,36.
Nos termos do art.º 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, sendo devidas pelos Requerentes.
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Lisboa, 15 de Maio de 2013
Os Árbitros,
Desembargador Manuel Luís Macaísta Malheiros,
Dra. Adelaide Moura
Dr. André Gonçalves