Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 125/2023-T
Data da decisão: 2023-10-24  IMI  
Valor do pedido: € 44.526,33
Tema: IMI
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DECISÃO ARBITRAL

I – Relatório

 

A Requerente A..., com sede na ..., com o número de matrícula e pessoa coletiva ..., em 28-02-2023 requereu a constituição do Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1 alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com designação de árbitro pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, para apreciar a legalidade do ato tributário de liquidação de IMI n.º ... referente ao ano de 2021 no montante de € 44.526,33, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento de juros indemnizatórios.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e automaticamente notificado à Autoridade Tributária nos termos regulamentares.

O Conselho Deontológico do CAAD designou, aos 19 de abril de 2023, a ora signatária para formar o Tribunal Arbitral Singular, disso notificando as Partes, que não manifestaram vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1 alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, foi o Tribunal Arbitral regularmente constituído em 10 de maio de 2023.

Notificada a AT nos termos do artigo 17.º do RJAT para apresentar resposta, querendo, veio fazê-lo a 14 de junho de 2023, ainda dentro do prazo fixado para a apresentação da Resposta, requerendo a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide com fundamento na revogação do ato de liquidação objeto deste litígio arbitral.

Notificada pelo Tribunal Arbitral veio a Requerente pronunciar-se pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide face à revogação da liquidação, ficando as custas a cargo da AT por lhe ser imputável o facto gerador da inutilidade superveniente.

II – Saneamento do Processo

 

O Tribunal Arbitral é materialmente competente ao abrigo do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT).

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º n.º 2 do RJAT e Portaria n.º 11-A/2011, de 22 de março)

O processo não enferma de nulidades.

Cabe apreciar e decidir

 

III – Fundamentação

 

Segundo Lebre de Freitas,” a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá- se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da proveniência pretendida. Num e noutro caso, a proveniência deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios” – cfr. “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, pág. 633. No mesmo entendimento segue Lopes do Rego, Comentários, pág. 611 e Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum, pág. 381.

Subsumindo:

Analisados os autos, torna-se claro que o ato de liquidação impugnado foi objeto de revogação na pendência do processo arbitral, depois de proferido o despacho para notificação da AT nos termos e para os efeitos previsto no artigo 17.º, do RJAT, e antes do encerramento da discussão[1].

Deve entender-se como encerramento da discussão, em correspondência com o estabelecido no artigo 604.º, nº 3, alínea e) do CPC, o momento em que as partes produzam alegações orais ou o termo do prazo para as alegações escritas ou o termo da fase dos articulados quando as partes tenham dispensado as alegações finais e o estado do processo permita sem necessidade de mais indagações a apreciação do pedido.

Dito isto, a anulação do ato de liquidação dentro do prazo concedido para a apresentação da Resposta pela AT é tempestivo e satisfez a pretensão impugnatória da Requerente. O que quer dizer que, destruído totalmente o ato tributário sindicado por revogação administrativa na pendência da causa, a continuação da instância é não só inútil como mesmo e sobretudo impossível, por falta de objeto da lide.

A questão das custas

O princípio-regra nesta matéria é o de que suporta as custas quem dá causa à extinção da instância (cfr. artigos 527.º e 536.º n.ºs 3 e 4, do CPC1, ex vi artigo 29º, do RJAT).

Ora dos autos resulta que a AT foi informada da entrada no CAAD deste processo, designou os juristas em 15 de março de 2023, foi notificada da apresentação do pedido e ulteriormente, em 11 de maio de 2023, é notificada pelo Tribunal para responder. Sendo comunicada ao Tribunal, em 14 de junho de 2023, a revogação do ato tributário, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 13.º, do RJAT e, junto o respetivo despacho datado de 19 de maio de 2023.

Pois bem, à luz do artigo 13.º, n.º 1, do RJAT, a AT pode evitar a constituição do Tribunal Arbitral se, no prazo de 30 dias após conhecimento da existência do pedido arbitral, revogar totalmente os atos objeto daquele pedido.

Mas não é manifestamente o caso porquanto, sabendo da pendência do processo arbitral, a revogação do ato ou, mais exatamente, a sua comunicação, só vem a ocorrer numa fase relativamente avançada do processo, designadamente aquando da apresentação da Resposta nos termos do artigo 17.º, do RJAT.

À luz do sumariamente exposto, a extinção da instância não pode deixar de ser totalmente imputável à AT porquanto praticou o ato que veio a revogar e esta revogação ocorreu para além do prazo de 30 dias previsto no artigo 13.º, do RJAT.

IV. Decisão

Termos em que se decide julga extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

 

V. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 44.526,33 (quarenta e quatro mil quinhentos e vinte e seis euros e trinta e três cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

VI. Custas

Ficam as custas a cargo da Requerida (AT) na medida em que deu causa à extinção da instância (cfr. artigos 527.º e 536.º n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29º, do RJAT), fixando-se a taxa de arbitragem em € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária e dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT e 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

Lisboa, 24 de outubro de 2023

Notifique-se.

O Tribunal Arbitral

Cristina Coisinha

(Árbitra Singular)

 



[1] Artigo 168.º n.º 1 do CPA