Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 311/2023-T
Data da decisão: 2023-10-19  IMI  
Valor do pedido: € 58.797,85
Tema: IMI e AIMI de 2017 a 2020. Terreno para construção. Revisão da matéria colectável.
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Sumário

I – As liquidações de IMI e AIMI efectuadas com base em valores patrimoniais que constem nas matrizes no ano a que se reportam, não enfermam de erro da Autoridade Tributária, pelo que um pedido de revisão oficiosa que coloque em causa esses valores, não pode ser deferido ao abrigo do nº 1 do artigo 78º da LGT;

II – A revisão da matéria colectável de IMI e AIMI, com fundamento em injustiça grave ou notória prevista nos nºs 4 e 5º do artigo 78º da LGT, não no artigo 115º do CIMI que se reporta a actos de liquidação e não a valores patrimoniais, pode ser promovida oficiosamente pela AT ou pelo contribuinte, no prazo de 3 anos.

III – Da revisão da matéria colectável, prevista nos nº 4 e 5 do artigo 78º da LGT, decorre a anulação dos actos consequentes que a tenham como pressuposto, como o são os actos de liquidação de IMI e AIMI.

 

I – Relatório

 

  1. A..., S.A. (“A...”), NIPC..., com sede na ..., ..., ..., ...-... Lisboa,  doravante designado por “Requerente”, veio ao abrigo do disposto nos artigos 2º nº 1 a) e 10º nº 1 a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), apresentar pedido de constituição de Tribunal Arbitral (PPA), “tendo por objeto a decisão de indeferimento do Pedido de Revisão Oficiosa do Ato Tributário  que correu termos sob o processo n.º ...2021... ... por si apresentado relativamente às liquidações do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”) e Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) ..., com referência aos exercícios de 2017 a 2020”, das quais resultou um valor global pago em excesso de € 58 797,85.

 

  1. Termina pedindo:
  1. a anulação parcial das liquidações de IMI com os n.ºs 2017..., 2017 ... e 2017..., 2018..., 2018... e 2018..., 2019..., 2019 ... e 2019..., por força da alteração do(s) Valor(es) Patrimonial(ais) Tributário(s) atribuído(s) ao artigo matricial 1381º para efeitos das liquidações de IMI emitidas por referência aos exercícios de 2017, 2018 e 2019; 
  2. a anulação parcial das liquidações de AIMI com os n.ºs 2018..., 2019 ... e 2020..., por força da alteração do(s) Valor(es) Patrimonial(ais) Tributário(s) atribuído(s) ao artigo matricial 1381º para efeitos das liquidações de AIMI emitidas por referência aos exercícios de 2018, 2019 e 2020; e
  3. em consequência disso, ser reconhecido o direito à Requerente ao reembolso do valor total de Euro 58.797,85 (cinquenta e oito mil euros, setecentos e noventa e sete euros e oitenta e cinco cêntimos), acrescido de juros indemnizatórios, em observância do disposto no artigo 43.º da LGT”.

 

  1. É demandada a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, adiante designada por Requerida ou AT.

 

  1. A Requerente fundamenta o pedido de pronúncia arbitral (PPA) nos seguintes termos:
  1. “... é uma sociedade de direito português, que se dedica à atividade de alojamento em estabelecimentos do tipo hoteleiro, de alojamento local e de outros locais de alojamento, e ainda de empreendimentos turísticos, bem como à atividade de prestação de serviços relacionados com esse alojamento” e “exerce ainda a atividade de compra e venda de imóveis, incluindo a revenda de imóveis adquiridos com esse fim, e a gestão e administração de imóveis, próprios ou alheios”.
  2.  “é proprietária de um terreno para construção, sito na Rua..., ...-..., Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o registo n.º...”.
  3.  Foi notificada das liquidações de IMI de 2017, 2018 e 2019 e de AIMI de 2018 a 2020, ambas considerando como VPT do terreno para construção os montantes de Euro 4.201.227,55 e Euro 4.264.245,96.
  4. No entanto “... na determinação do VPT previamente utilizado para efeitos de liquidação de IMI e AIMI sobre o aludido terreno para construção, foram erroneamente tidos em consideração os coeficientes de afetação, localização e qualidade e conforto, contrariamente à aplicação da fórmula de cálculo prevista no artigo 45.º do Código do IMI (na redação em vigor à data) e ao entendimento fixado pela jurisprudência”.
  5. Em “5 de novembro de 2021, ... apresentou um Pedido de Revisão do Ato Tributário, com vista à anulação das liquidações de IMI emitidas por referência aos exercícios de 2017, 2018 e 2019, e, bem assim, das liquidações de AIMI emitidas por referência aos exercícios de 2018, 2019 e 2020”. 
  6. Pedido de revisão que veio a ser indeferido com fundamento, nomeadamente, de que “relativamente à possibilidade de revisão oficiosa em apreço, ... tal revisão apenas seria possível se observados os condicionalismos previstos nos n.ºs 4 e 5 do artigo 78.º da LGT, referentes a atos de fixação de valores patrimoniais, facto que ... não se verificou, por não ter sido observado o prazo de 3 anos previsto no n.º 4 do referido artigo 78.º da LGT para requerer a revisão”.
  7. Sendo que a Requerente “na eventualidade de tal pedido não ser aceite ... , requereu, subsidiariamente, a revisão dos atos tributários em apreço, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 78.º da LGT, com fundamento em injustiça grave e notória”, “requisitos que, sempre se dirá, considerarem-se devidamente preenchidos no caso em apreço, uma vez que o imposto liquidado e efetivamente pago a título de IMI e AIMI, durante os períodos de tributação de 2017 a 2020, foi superior ao que era legalmente devido”. 
  8. E complementa: “já no que concerne à tempestividade do pedido, sempre se dirá que o prazo para ser autorizada a revisão da matéria tributável pelo dirigente máximo do serviço, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 78.º, é de três anos posteriores ao do ato tributário”.
  9. Conclui que o pedido de revisão foi apresentado tempestivamente acrescentando que: “ultrapassada que está a questão da possibilidade de requerer a revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMI e AIMI, mesmo sem a contestação prévia do ato administrativo de fixação do VPT que serviu de base às liquidações, por um lado, e reconhecido o vício substantivo de erro nos pressupostos de direito de que enfermam os atos de liquidação sub judice, por terem sido ilegalmente considerados os coeficientes de qualidade e conforto, localização e afetação na fórmula de cálculo do VPT que serviu de pressuposto às liquidações, por outro,  deve o douto Tribunal Arbitral julgar totalmente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, anular a decisão de indeferimento do Pedido de Revisão Oficiosa do Ato Tributário apresentado pela Requerente”.

 

  1. A Requerida, Autoridade Tributária (AT), apresentou resposta em 19.09.2023 referindo o seguinte:
  1. Impugna “por infundado todo o aduzido no pedido de pronúncia arbitral que contrarie todo o exposto, devendo decidir-se a final que os atos impugnados não padecem dos vícios que lhe foram assacados nem de nenhuns outros”.
  2. Considera que, muito embora tenha acolhido o entendimento preconizado pelos tribunais superiores no sentido que na determinação do VPT dos terrenos para construção, releva a regra específica constante do artigo 45.º do CIMI e não outra, não sendo considerados os coeficientes previstos na expressão matemática do artigo 38.º do CIMI, tais como os coeficientes de localização, de afetação, de qualidade e conforto, donde, verifica-se ausência de litígio quanto à forma de cálculo aplicável para determinar o VPT dos terrenos para construção; no entanto, a  pretensão da Requerente não pode proceder, porquanto:
  1. “Nos termos da mais recente jurisprudência consolidada   do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 23.02.2023 no processo n.º 102/22.2BALSB   eventuais vícios próprios e exclusivos do VPT são insuscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo”. Pelo que,
  2. Se “Por mero exercício académico, ao arrepio da recente jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, em prejuízo da segurança jurídica e da interpretação sistemática e harmonizada da lei, desde já se refere que não existe de enquadramento legal que possa sustentar a possibilidade de revisão oficiosa dos atos de avaliação de valores patrimoniais.
  3. Primeiramente, porque o artigo 78.º da LGT não abrange os atos de avaliação patrimonial, que não são atos tributários, previstos no n.º 1, nem são atos de apuramento da matéria tributável previstos no n.º 4 daquela norma.
  4. Acresce que tão pouco se verifica qualquer erro no ato de liquidação, foi calculado com base no VPT constante na matriz predial em estrito e integral cumprimento da lei.  Tão pouco o fundamento da injustiça grave ou notória do nº 4 do art. 78° da LGT, é invocável quando a liquidação do IMI tenha sido efetuada de acordo com o nº 1 do artigo 113º do CIM, com base nos valores patrimoniais inscritos na matriz predial, não impugnados com esse fundamento pelo sujeito passivo no prazo e nos termos previstos na lei, tal como se refere na Decisão arbitral n.º 667/2021-T,
  5. Apesar da questão  da inadmissibilidade  do pedido de revisão oficiosa sobre esta matéria estar resolvida face à Uniformização da Jurisprudência do Acórdão de 23.02.2023 do Supremo Tribunal Administrativo  o pedido de revisão oficiosa - tendo em conta a data de apresentação do pedido de revisão oficiosa das liquidações e de interposição da presente ação - sempre  seria intempestivo face ao prazo previsto  no n.º 4 do artigo 78.º da Lei Geral Tributária” conforme Decisões CAAD P. 487/2020-T e 540/2020-T
  6. Considera não ser possível à AT promover “a revogação e a anulação dos atos administrativos em matéria tributária” ... uma vez que decorre do nº 1 do artigo 158º do CPA “que apenas são passíveis de anulação os atos de fixação dos VPT nos casos em que não tenham decorrido cinco anos desde a respetiva emissão”, o que não é o caso deste processo.
  7.  Pelo que conclui que, para o imóvel aqui em causa “já se encontra precludido o prazo para anulação administrativa do ato que fixe valor patrimonial tributário o qual se encontra sanado e produz efeitos jurídicos, nomeadamente para efeitos de cálculo de IMI”.
  1. Acrescenta que “caso o tribunal, ..., julgar a ação procedente, não deverá ser fixado o valor do montante a reembolsar pois o tribunal não possui todos os elementos necessários para o efeito.  Ou seja, a quantificação do montante devido, deve ser apurado em sede de execução da decisão arbitral, o que desde já se peticiona”.
  2. Finalmente, quanto ao pedido de juros indemnizatórios refere que “... à data dos factos, a Administração Tributária fez a aplicação da lei, vinculadamente pois como órgão executivo está adstrita constitucionalmente, donde necessariamente se conclui que não se verifica nenhum erro imputável aos serviços da Requerente, não estando assim preenchido o requisito previsto no n.º 1 do artigo 43º da LGT
  1. Conclui pela manutenção dos actos tributários impugnados e pela total improcedência do PPA.

 

  1. Por despacho do Tribunal Arbitral Singular (TAS) de 03.07.2023 foi a Requerida notificada para contestar, tendo respondido em 19.09.2023 e não juntou o PA nem se pronunciou sobre o tema.

 

  1. Por despacho do TAS de 19.09.2023 foi dispensada a realização da reunião de partes a que se refere o artigo 18º do RJAT e foi dispensada a apresentação de alegações, por não se justificar.

Neste despacho foi ainda convidada a Requerente a juntar (1) o teor integral do pedido de revisão onde conste a data de entrega (2) e o teor da resposta em sede de audição prévia e a Requerida para se pronunciar quanto à não junção do PA, documentos que em 2023.10.18 a Requerente juntou ao processo.

A AT não usou da faculdade suscitada pelo TAS, pelo que, nomeadamente, face ao nº 6 do artigo 84º do CPTA, serão apreciados os factos relevantes para a decisão da causa tendo em conta os documentos juntos pela Requerente (incluindo em 2023.10.18) e face à posição das partes, designadamente quanto ao referido no artigo 4º do PPA e no artigo 14º da Resposta da AT.

 

  1. O pedido de constituição do tribunal arbitral (PPA) foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228. ° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular (TAS) o signatário desta decisão, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram oportuna e devidamente notificadas da designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6. ° e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular (TAS) foi constituído em 03 de Julho de 2023, pelo que se encontra regularmente constituído.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

II - Fundamentação

Matéria de facto

 

  1. Os factos relevantes para a decisão da causa são os seguintes:
  1. A Requerente é proprietária de um terreno para construção sito na Rua ..., ...-... Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o registo n.º ... – conforme artigo 17º do PPA, Documento nº 14 em anexo ao PPA e artigo 11º da Resposta da AT.
  2. O valor patrimonial tributário (VPT) originário do bem imóvel atrás referido, de € 4 108 780,00, subjacente às liquidações aqui impugnadas, foi determinado por avaliação realizada em 09.12.2013 (ficha n.º ...), em consequência da entrega, pelo então sujeito passivo, da declaração modelo 1 do IMI n.º ... em 02.12.2013, a título de reclamação da matriz por desatualização do valor patrimonial, e foram tidos em consideração na sua determinação, os coeficientes de afetação, localização e qualidade e conforto, em desconformidade com a fórmula de cálculo prevista no artigo 45.º do Código do IMI (na redação em vigor à data) - conforme artigos 27º, 34º e 35º do PPA e artigo 19º da Resposta da AT.
  3. O VPT do imóvel atrás referido foi sucessivamente atualizado: (1) para o montante de Euro 4.201.227,55 em 31 de Dezembro de 2017 e de 2018, (2) e para o montante de Euro 4.264.245,96 em 31 de Dezembro de 2019, mantendo-se inalterado até 31 de dezembro de 2020 – conforme artigo 28º do PPA.
  4. Em 2020.12.30 a Requerente, para o prédio em causa, apresentou a declaração Modelo 1 do IMI n.º..., por considerar que o VPT se encontrava desatualizado, a qual originou a avaliação efetuada em 24.01.2021 (ficha n.º ...), da qual resultou o VPT € 1.464.680,00, que produziu efeitos à data da respetiva entrega – conforme artigos 139º e 140º do PPA e artigos 20º e 21º da Resposta da AT e Documentos nºs 15 e 16 juntos com o PPA.
  5. A Requerida considera que quanto ao AIMI de 2020 “há lugar à promoção da correção da liquidação ..., considerando o novo VPT de € 1.464.680,00 que se fixou na matriz com efeitos nas liquidações desse ano” - conforme artigo 28º da Resposta ao PPA;
  6.  A Requerente, quanto ao IMI de 2017 a 2019 e quanto ao AIMI de 2018 a 2020, foi, em datas não apuradas, notificada dos seguintes actos tributários de liquidação de IMI e AIMI:

 

- conforme parte inicial do PPA, artigos 18º, 19º, 21º, 22º, 24º, 25º do PPA, Documentos 2 a 13 em anexo ao PPA e artigo 13º da Resposta da AT;

  1. A Requerente, em data não apurada, pagou os valores que lhe foram liquidados – conforme artigos 20º, 21º, 22º, 24º e 152º do PPA
  2. As diferenças entre os valores de IMI e AIMI que foram liquidados e os que seriam liquidados se não tivessem sido considerados nas avaliações os coeficientes de localização, de afectação e/ou de qualidade e conforto são de € 58 797,86, valor assim apurado:

 

 – conforme artigo 36º e não impugnação especificada apreciada nos termos do nº 7 do artigo 110º do CPPT;

  1. Em 2021.11.05 a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa parcial (ao abrigo do nº 1 do artigo 78º da LGT e subsidiariamente ao abrigo do nº 4 do artigo 78º da LGT) das liquidações de IMI e AIMI referidas em F) que veio a ser indeferida por despacho de 2022.12.26, com a seguinte fundamentação:

“1.    Não foram trazidos aos autos, em sede de direito de audição, quaisquer novos elementos probatórios passíveis de inverter a posição por nós expressa em sede de projeto de decisão.

2.        Quanto às inúmeras decisões jurisprudenciais e do CAAD invocadas pela requerente, as mesmas não vinculam a administração fiscal senão nos casos em concreto que foram objeto de apreciação.

3.        Não obstante, tal como foi por nós referido na informação que acompanhou o projeto de decisão, por parte da Direção de Serviços de Justiça Tributária, foi emanada a Instrução de Serviço n.º 60 318/2021 Série I – DSJT, à qual os serviços da AT estão vinculados nos termos do art. 68º-A LGT, de acordo com a qual e atendendo à consolidação da jurisprudência quanto ao sentido das decisões relativas à matéria da determinação do VPT dos terrenos para construção, foi acolhido o entendimento de que, na determinação do VPT dos terrenos para construção, releva a regra específica constante do artigo 45.º do CIMI e não outra, pelo que não podem ser considerados os coeficientes previstos na expressão matemática do artigo 38.º do CIMI, tais como os coeficientes de localização, de afetação, de qualidade e conforto.

4.        Porém, refere a mesma instrução que, para que a revisão ocorra (seja no âmbito de reclamações graciosas, recursos hierárquicos e revisões oficiosas, ou qualquer outro procedimento administrativo tributário em que esta questão jurídica constitua o seu objeto imediato ou mediato), terá de ser observado um requisito prévio, que é a correção do ato de avaliação do qual resulta a fixação do VPT, determinando-o à luz da regra específica constante do supra referido art. 45.º CIMI.

5.        Assim, há que ter em consideração que “a anulação do ato administrativo de avaliação do terreno em construção, e a consequente determinação do VPT, pode ter lugar no prazo de seis meses contados desde a data do conhecimento do órgão competente (cf. artigo 169.º CPA), DESDE QUE, se contenha no prazo de cinco anos da sua emissão, isto é, no prazo de cinco anos contados da data em que foi realizada a determinação do VPT pela respetiva avaliação. (cf. Artigo 168.º, n.º 1 do CPA, aplicável ex vi alínea c) do artigo 2.º da LGT).”

6.        “O conhecimento da ilegalidade pelo órgão competente só ocorre quando, em face do caso material, no âmbito do concreto processo ou procedimento em que se vai analisar da legalidade do(s) ato(s) de liquidação, se apure que o VPT do concreto terreno em construção, sobre o qual incidiu o imposto, foi determinado em contradição com o entendimento da jurisprudência que se agora entendeu acolher.”

7.        Tal como também havíamos referido naquela informação, no caso concreto aqui em análise, verificou-se que o ato administrativo de avaliação a coberto do qual foi fixado o VPT e que esteve na base das liquidações aqui contestadas, data de 09/12/2013, tendo sido notificado à requerente em 07/01/2014, pelo que a AT não o poderá anular, uma vez que o prazo de seis meses após o conhecimento pelo órgão competente já não se contém dentro do prazo limite concedido pelo legislador para esse efeito, ou seja, nos cinco anos da sua emissão, encontrando-se esgotado, nos termos conjugados do artigo 79.º da LGT e artigo 168.º, n.º 1, do CPA, aplicável ex vi alínea c) do artigo 2.º da LGT.

8.        Relativamente à possibilidade invocada pela requerente de viabilidade da impugnação dos atos de liquidação de IMI e AIMI, tendo por base o erróneo e ilegal apuramento do VPT, ainda que não tenham sido impugnados os atos de avaliação subjacentes, não acompanhamos esta posição.

9.        Efetivamente, as liquidações, tanto de IMI como de AIMI assentam nos valores patrimoniais fixados por meio de avaliação direta dos prédios nos termos do art. 15º, nº 2 CIMI, sendo que, nos termos do nº 2 do art. 86º LGT, a impugnação da avaliação direta depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão, nos termos do artigo 134.º do CPPT.

10.      De acordo com este artigo, ao ser fixado um prazo especial de três meses para impugnação de atos de fixação de valores patrimoniais e exigindo o seu nº 7 o esgotamento dos meios graciosos, está afastada a possibilidade de essa impugnação se fazer, por via indireta, na sequência da notificação de atos de liquidação que os tenham como pressuposto, como são os de IMI ou AIMI e sem observância do prazo de impugnação referido ou o esgotamento dos meios de revisão previstos no procedimento de avaliação.

11.      Quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação direta de prédios urbanos, pode sempre requerer ou promover uma segunda avaliação, sendo que apenas do resultado das segundas avaliações (que esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação) cabe impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77.º, n.º 1 do CIMI).

12.      Daqui decorre que os atos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são atos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objeto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos atos de liquidação que com base neles sejam efetuadas discutir-se a legalidade daqueles atos que, entretanto, se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios de reação legalmente previstos, e que serviram de base àqueles atos de liquidação.

13.      Quanto à invocação da requerente de que a prévia fixação do VPT é suscetível de avaliação em sede de revisão oficiosa, há que referir que, das várias situações de revisão oficiosa previstas no artigo 78.º da LGT, as dos n.ºs 1 e 6 reportam-se a atos de sendo que apenas as situações previstas nos seus n.ºs 4 e 5 deste artigo 78.º se reportam a atos de fixação da matéria tributável, categoria a que se reconduzem os atos de fixação de valores patrimoniais.

14.      Assim, só dentro do condicionalismo previsto nestes n.ºs 4 e 5 se poderia considerar a possibilidade revisão oficiosa. No entanto, é manifesto que não foi observado pela requerente o prazo de três anos fixado no n.º 4 deste artigo 78.º.

15.      De tudo o que antecede e tal como havíamos referido, todas a liquidações aqui em causa se baseiam nos valores inscritos na matriz respetiva em 21/02/2014, após avaliação ocorrida em 2013, sendo que quando a Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa, há muito que havia expirado o prazo em que podia ser autorizada a revisão dos atos de fixação de valores patrimoniais.

16.      Relativamente ao não provimento do pedido de juros indemnizatórios formulado pela requerente, mantemos o informado em sede de projeto de decisão, sendo que o nº 1 do art 43º LGT se refere a situações em que exista o reconhecimento de erro imputável aos serviços em sede de reclamação graciosa ou impugnação judicial, que não é o presente caso.

17.      De tudo o que antecede, dado não terem sido juntos aos autos quaisquer elementos passíveis de fazer alterar a posição expressa em sede de projeto de decisão, deverá este ser convolado em definitivo.

III – Conclusão

Face ao exposto, atendendo a que a requerente não apresentou elementos suscetíveis de alterar o sentido da decisão projetada, propõe-se sua convolação em definitiva, no sentido do indeferimento do pedido”.

- conforme artigo 37º do PPA, Documento nº 1 m anexo ao PPA e artigo 14º da resposta da AT;

  1. O Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral em 24 de Abril de 2023 – conforme registo no SGP do CAAD.

 

Factos não provados

 

Não há factos não provados que possam ser considerados relevantes para a decisão da causa.

Motivação da fixação da matéria de facto

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos factos articulados no PPA e na Resposta da AT que estão em conformidade com a posição assumida por ambas as partes (considerando ainda a não impugnação especificada dos factos articulados no PPA quanto à alínea H) dos factos assentes) e bem assim com base nos documentos juntos com o PPA que não mereceram reparo pela AT e que estão na sua posse.

 

Matéria de direito

 

 

  1. Sobre a questão de fundo existe, pelo menos, o acórdão do TCA Sul de 31.10.2019, prolactado no âmbito do Processo 2765/12.8BELRS.

No acórdão uniformizador de jurisprudência do STA de 23.02.2023 P. 102/22.2BALSB discutiu-se a questão de saber se ao abrigo do nº 1 do artigo 78º da LGT era possível ou não a revisão das liquidações de IMI e AIMI com fundamento em errada fixação do valor patrimonial tributário (VPT) de prédio urbano que se consolidou por falta de oportuna impugnação.

Não parece ter sido objecto de debate a questão de apurar se a mesma era possível ao abrigo do º 4 do artigo 78º da LGT com fundamento em “injustiça grave ou notória”, muito embora a páginas 25/30 da versão do acórdão do STA publicada em www.dgsi.pt se fale na decisão CAAD Processo nº 487/2020-T que seguiu esse entendimento.

Conclusão a que se chega pela exposição da “decisão fundamento” expressa a páginas 26/30 da mesma publicação do acórdão do STA em www.dgsi.pt.

Por último, é de constatar que a AT não indica sequer que o acórdão transitou em julgado, pelo que nunca poderá aqui considerar-se ter ocorrido um trânsito em julgado presumido.

No caso, provou-se que o pedido de revisão apresentado pela Requerente foi subsidiariamente deduzido ao abrigo do nº 4 do artigo 78º da LGT, tal como a AT parece reconhecer no ponto 13 da fundamentação da decisão de indeferimento da revisão.

O signatário desta decisão integrou o colectivo de árbitros que formou o Tribunal Arbitral no âmbito do Processo nº 254/2021-T, presidido pelo Exmo. Senhor Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, onde se tratou uma situação em tudo idêntica àquela que se coloca neste processo.

Naturalmente, não poderá aqui adoptar-se uma decisão que não esteja em conformidade com o que aí se decidiu.

 

  1. Poderá afirmar-se, em termos genéricos, que a Requerente estruturou o PPA (e o pedido de revisão oficiosa) de forma idêntica ao raciocínio expendido no acórdão do TCA Sul de 31.10.2019 prolactado no âmbito do Processo 2765/12.8BELRS.

 

A AT defende que os vícios dos actos de avaliação de valores patrimoniais não podem servir de fundamento à anulação de actos de IMI que os tenham como pressuposto.

Este obstáculo à pretensão do Requerente não constitui uma excepção processual (obstáculo ao conhecimento do mérito) mas sim um fundamento de improcedência.

 

  1. Vamos seguir o que foi decidido no Processo CAAD nº 254/2021-T, onde se tratou um caso similar ao deste processo.

Vejamos o que aí se escreveu (intercalando-se alguns aspectos referentes ao caso concreto aqui em discussão):

 

“3.1. Questão da possibilidade de conhecer vícios de actos de avaliação em impugnação de actos de liquidação que neles se basearam.

 

São meios processuais diferentes, com efeitos distintos a impugnabilidade directa de actos de liquidação, com os efeitos retroactivos próprios da declaração de anulabilidade e direito a juros indemnizatórios, e a possibilidade de revisão oficiosa, com os fundamentos previstos no artigo 78º da LGT, com efeitos mais limitados, designadamente a nível de direito a juros indemnizatórios, como resulta do disposto no artigo 43º, nºs 1 e 3 da LGT. (Sobre os diferentes efeitos da impugnação judicial ou reclamação graciosa nos prazos respectivos e os efeitos da revisão oficiosa pedida para além desses prazos, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-07-2006, processo nº 0402/06.)

No caso em apreço, não foi apresentada reclamação graciosa ou impugnação judicial dos actos de liquidação de IMI nos prazos respectivos (previstos nos artigos 70º, nº 1, e 102º n.º 1, do CPPT), mas foi pedida a revisão oficiosa que, nos termos do artigo 78º da LGT, além de outros casos, pode ser pedida no prazo de quatro anos a contar dos actos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços nos termos do seu nº 1, ou no prazo de três anos com fundamento em injustiça grave e notória, nos termos dos seus nºs 4 e 5.

Da revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista nos nºs 4 e 5 do artigo 78º LGT, decorre a anulação dos actos de liquidação que se tenham baseado nessa matéria tributável, pois são actos consequentes.

Em qualquer caso, a revisão ou iniciativa da administração tributária (dita oficiosa), tanto da liquidação (nº 1) como da matéria tributável (nºs 4 e 5), é admitida também a pedido do contribuinte, como se conclui do teor expresso do nº7 do artigo 78º ao referir que «interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização».

Esta questão da invocação de vícios de actos de avaliação em procedimento de revisão oficiosa foi apreciada no acórdão proferido em 10-05-2021, no processo arbitral CAAD nº 487/2020T, cuja jurisprudência aqui se reafirma, no essencial.

Por força do preceituado no artigo 15º do CIMI a avaliação dos prédios urbanos é directa e, por isso, ela é «susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa» (artigo 86º, nº 1, da LGT).

Nos termos do nº 2 do mesmo artigo 86.º da LGT, «a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão».

Os termos da impugnação da avaliação directa de valores patrimoniais constam do artigo 134º do CPPT, em que se estabelece que: 

- «os atos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de três meses após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade» (nº 1); e

- «a impugnação referida neste artigo não tem efeito suspensivo e só poderá ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação» (nº 7).

 

Como decorre do nº 1 do artigo 134º, ao fixar um prazo especial de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais,  “com fundamento em qualquer ilegalidade”, e do nº 7 do mesmo artigo, ao exigir o esgotamento dos meios graciosos, está afastada a possibilidade de essa impugnação com fundamento em ilegalidade se fazer, por via indirecta, na sequência da notificação de actos de liquidação que a tenham como pressuposto, como são os de IMI, sem observância do prazo de impugnação referido e sem esgotamento dos meios de revisão previstos no procedimento de avaliação.

No âmbito do IMI e do AIMI, quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação directa de prédios urbanos, pode requerer ou promover uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias contados da data em que o primeiro tenha sido notificado (artigo 76º, nº 1, do CIMI).

Só do resultado das segundas avaliações (que esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação) cabe impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77º, nº 1 do CIMI).

Isto significa que os actos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI são actos destacáveis, para efeitos de impugnação contenciosa, sendo objecto de impugnação autónoma, não podendo na impugnação dos actos de liquidação que com base neles sejam efectuadas discutir-se a legalidade daqueles actos.

Assim, o sujeito passivo de IMI ou de AIMI pode impugnar as liquidações, mas não são relevantes como fundamentos de anulação eventuais ilegalidades dos antecedentes actos de fixação de valores patrimoniais, que se firmaram na ordem jurídica, por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos previstos nos procedimentos de avaliações e de subsequente impugnação autónoma a deduzir no prazo de três meses, nos termos dos nºs 1 e 7 do artigo 134º do CPPT.

Na verdade, não sendo impugnado tempestivamente o acto de fixação de valores patrimoniais, forma-se caso decidido ou resolvido sobre a avaliação, que se impõe em sede de liquidação de IMI, sendo que «o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita» (artigo 113º do CIMI).

Este regime de impugnação autónoma justifica-se por razões de coerência do sistema jurídico tributário inerentes ao facto de cada acto de avaliação poder servir de suporte a uma pluralidade de actos de liquidação de impostos (liquidações anuais de IMI e eventuais liquidações de IMT) e ser relevante para vários efeitos a nível de IRS (artigos 10º nº 6, alínea d), 31º nº 13, alínea d), 41º nº 4, 43º nº 2 alínea d), 46º nº 3, e 51º nº 2 do CIRS), IRC (artigos 56º nº 2, 64º nºs 2 e 3, alínea a) e b), 4 e 5, 139º nº 1, 2, do CIRC) e Imposto do Selo (artigos 13º nºs 1, 6 e 7, 31º nº 2 e 32º do CIS) , o que não se compagina com a possibilidade de plúrima avaliação incidental que se reconduzisse à fixação de diferentes valores patrimoniais tributários para o mesmo prédio, no mesmo momento.

Por outro lado, a caducidade do direito de acção derivada da inércia do lesado por actos administrativos durante um prazo razoável, é generalizadamente justificada por razões de segurança jurídica, necessária para adequado funcionamento da administração pública, que é um valor constitucional ínsito no princípio do Estado de Direito democrático e é reconhecida generalizadamente em matéria administrativa e tributária.

O prazo de impugnação de três meses para impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais é perfeitamente razoável, sendo o prazo geral previsto a lei para a impugnação da generalidade dos actos administrativos com fundamentos geradores de vícios de anulabilidade (artigo 58º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 102º do CPPT).

A natureza de actos destacáveis que é atribuída aos actos de avaliação de valores patrimoniais é, há muito, reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, desde o tempo em que regime idêntico ao do artigo 134º, nºs 1 e 7 do CPPT, previsto nos nºs 1 e 6 do artigo 155º do Código de Processo Tributário de 1991, quer em sede de Sisa, quer de contribuição autárquica, quer de IMI quer de IMT, como pode ver-se pelos seguintes acórdãos:

  • De 30-06-1999, processo nº 023160 (publicado em https://dre.pt/web/guest/pesquisa/3997226/details/normal?q=23160)
  • de 02-04-2003, processo nº 02007/02;
  • de 06-02-201 1, processo nº 037/11;
  • de 19-09-2012, processo n 0659/12 (Refere-se neste aresto: “Na verdade, em sede de IMI, a lei prevê um procedimento de determinação da matéria tributável — a avaliação do prédio (art. 14º do CIMI) — que termina com o acto de fixação do VPT que serve de base à liquidação do imposto. Este acto, como é sabido, é um acto destacável para efeitos de impugnação contenciosa, pelo que é autonomamente impugnável, numa excepção ao princípio da impugnação unitária que, em regra, vigora no processo tributário (conforme art. 134º do CPPT) e que se encontra «em sintonia com o preceituado no art. 86º, nº 1, da LGT, em que se estabelece que os actos da avaliação directa são directamente impugnáveis»

(...) tratando-se de actos destacáveis e inexistindo qualquer restrição relativa às ilegalidades que podem ser objecto de impugnação contenciosa, os vícios de que enferme o referido acto de avaliação apenas poderão ser arguidos em impugnação do acto de avaliação e não do acto de liquidação que seja praticado com base naquele, já que a atribuição da natureza de acto destacável tem por fim, precisamente, autonomizar os vícios deste acto para efeitos de impugnação contenciosa»

  • de 5-2-2015, processo nº 08/13;
  • de 13-7-2016, processo n 0173/16;
  • de 10-05-2017, processo nº 0885/16.

Pelo exposto, as ilegalidades dos actos de avaliação invocados pela Requerente, que não foram objecto de impugnação tempestiva autónoma, não podem considerar-se ilegalidades dos actos de liquidação de (IMI) AIMI, susceptíveis de serem invocadas em processo impugnatório destes actos.

Por outro lado, o pedido de revisão não foi efectuado no prazo a reclamação administrativa a que se refere a primeira parte do nº 1 do artigo 78.º da LGT, pelo que só poderia ser feita a revisão com fundamento em erro imputável aos serviços, nos termos da segunda parte daquele número.

Ora, os actos de liquidação de IMI, em si mesmos, não enfermam de qualquer erro imputável aos serviços, pois, por força do disposto no ... artigo 113º nº 1 do CIMI o “imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Direcção-Geral dos Impostos, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita”.

Assim, tendo as liquidações sido efectuadas com base nos valores patrimoniais dos prédios que constavam das matrizes a 31 de Dezembro dos anos a que respeita o IMI, não há erro da Administração Tributária ao efectuar as liquidações e, por isso, o pedido de revisão oficiosa não podia ser deferido ao abrigo do nº 1 do artigo 78º da LGT.

 

3.2. Questão da admissibilidade de revisão oficiosa dos actos com fundamento em injustiça grave ou notória

 

Diferente da questão da impugnabilidade dos actos de liquidação de IMI com fundamento em ilegalidade, ao abrigo do nº 1 do artigo 78º da LGT, é a da possibilidade da revisão da matéria tributável com fundamento em injustiça grave ou notória, prevista no nº 4 do artigo 78º da LGT ...”

“Na verdade, a utilidade prática da revisão com fundamento em injustiça grave ou notória verifica-se apenas após o decurso do prazo da reclamação administrativa, precisamente quanto a actos que não podem ser impugnados com fundamento em qualquer ilegalidade ou em erro imputável aos serviços.

A possibilidade de revisão oficiosa de actos de avaliação de valores patrimoniais não está prevista no CIMI. Designadamente, o artigo 115º do CIMI reporta-se a actos de liquidação e não a actos de fixação de valores patrimoniais.

Assim, só à face do regime geral da revisão oficiosa, previsto no artigo 78º da LGT, se pode aventar a possibilidade de revisão, nos termos dos seus nºs 4 e 5, que estabelecem o seguinte:

4-O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.

5-Para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional”.

Da revisão da matéria tributável prevista no nº 4 do artigo 78.º decorrerá a anulação dos actos consequentes que a tenham como pressuposto, como são os actos de liquidação de IMI.

Apesar de neste nº 4 do artigo 78º da LGT se referir que «o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente» a «revisão da matéria tributável», trata-se de um poder-dever, estritamente vinculado, cujo cumprimento é sujeito a controle jurisdicional, como tem entendido o Supremo Tribunal Administrativo:

  • «o facto de a lei determinar que "o dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, "a revisão, não obsta à possibilidade de convolação da reclamação graciosa em pedido de revisão com fundamento em injustiça grave ou notória pois tal poder de autorização não é mera faculdade mas, antes, um verdadeiro poder-dever»; trata-se de «um poder estritamente vinculado»; (acórdão do STA de 07.10.2009, processo nº 0476/09. No mesmo sentido os acórdãos do STA de 02.11.2011, processo nº 329/11 e de 14.12.2011, processo nº 366/11)
  • «a previsão constante do dito artigo 78º nº 4, como excepcional, é de entender como correspondendo a um poder-dever que implica a sua aplicação a todos os casos, verificados que sejam os referidos requisitos». (Neste sentido o acórdão do STA de 17.02.2021, processo nº 39/14.9BEPDL de 0578/18)

Por outro lado, como decorre do nº 7 do artigo 78º das LGT, esta revisão com fundamento em injustiça grave ou notória pode ser efectuada a pedido do contribuinte e, neste caso, pode ser efectuada após o prazo de três anos, pois o pedido do contribuinte interrompe o prazo inicial, contando-se um novo prazo a partir da apresentação do pedido. (como está ínsito no conceito de “interrupção”, explicitado no artigo 326º do Código Civil).

Nestas situações em que o erro está na fixação da matéria tributável e não propriamente nos subsequentes actos de liquidação, a revisão não depende da existência de erro imputável aos serviços ou de ilegalidade desses actos, mas apenas que se esteja perante «injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte».

Por outro lado, como entendeu o Supremo Tribunal Administrativo no citado acórdão de 17-02-2021, a previsão da autorização como excepcional, não afasta o «poder-dever que implica a sua aplicação a todos os casos, verificados que sejam os referidos requisitos».

 

3.2.1. Tempestividade do pedido de revisão oficiosa para efeitos do nº 4 do artigo 78º da LGT

 

O prazo para ser autorizada a revisão da matéria tributável pelo dirigente máximo do serviço não é o previsto no nº 1, mas sim o prazo reduzido aos «três anos posteriores ao do acto tributário», previsto no nº 4 do artigo 78º” da LGT.

Os «três anos posteriores ao do acto tributário» terminam no dia 31 de Dezembro do terceiro ano posterior àquele em que foi praticado o acto tributário”.

 

O pedido de revisão foi apresentado em 2021.11.05.

Todas as liquidações aqui em discussão foram emitidas entre 08.03.2018 e até 30.06.2020 (alínea F) dos factos provados), pelo que é de concluir que o pedido foi apresentado tempestivamente quanto a todas elas.

 

3.2.2. Exigência de que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte

 

A fixação da matéria tributável foi efectuada pela Administração, com base numa fórmula prevista na lei, sem que se tenha demonstrado que a Requerente tenha fornecido qualquer informação errada quanto à natureza dos prédios, pelo que o eventual erro na aplicação na fórmula de avaliação invocado pela Requerente não pode ser considerado imputável a um seu comportamento negligente.

 

3.2.3. O erro imputado pela Requerente à fixação de valores patrimoniais relativo à aplicação de coeficientes aplicáveis a prédios edificados

 

O erro que a Requerente imputa à fixação de valores patrimoniais é o de ter aplicado à avaliação de terrenos para construção, normas legais relativas às avaliações dos prédios edificados.

Os artigos 39º, 41º, 42º e 45º do CIMI, nas redacções da Lei n.0 64-B/2011, de 30 de Dezembro (vigente até à Lei nº 75-B/2020, de 31 de Dezembro), estabelecem o seguinte, no que aqui interessa:

Artigo 39º

Valor base dos prédios edificados

I - O valor base dos prédios edificados (Vc) corresponde ao valor médio de construção, por metro quadrado, adicionado do valor do metro quadrado do terreno de implantação fixado em 25% daquele valor.

Artigo 41º

Coeficiente de afectação

 O coeficiente de afectação (Ca) depende do tipo de utilização dos prédios edificados, de acordo com o seguinte quadro:

Artigo 42º

Coeficiente de localização

3-Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:

a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;

b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;

c) Serviços de transportes públicos;

d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.

4-O zonamento consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização do município e as percentagens a que se refere o nº 2 do artigo 45º

Artigo 45º

Valor patrimonial tributário dos terrenos para construção

I - O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.

2 - O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.

3- Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no nº 3 do artigo 42º

4- O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do nº 4 do artigo 40.º.

5 - Quando o documento comprovativo de viabilidade construtiva a que se refere o artigo 37º apenas faça referência aos índices do PDM, devem os peritos avaliadores estimar, fundamentadamente, a respectiva área de construção, tendo em consideração, designadamente, as áreas médias de construção da zona envolvente. (aditado pela Lei nº 64-B/2011, de 30-12)

 

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a decidir, uniformemente, na esteira Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 23-10-2019, processo nº 170/16.6BELRS 0684/17, que

I- Na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção há que observar o disposto no artigo 45º do Código do IMI, não havendo lugar à consideração do coeficiente de qualidade e conforto (cq).

II-O artigo 45º do CIMI é a norma específica que regula a determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção.

III-O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38º do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não pode ser aplicado analogicamente por ser susceptível de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto.

 

Na fundamentação deste acórdão refere-se o seguinte:

 O terreno em causa nos autos integra uma das espécies de prédios urbanos na categoria de terreno para construção. E, tratando-se de uma das espécies de prédio urbano o valor patrimonial deverá ser determinado por avaliação directa (nº 2 do artigo 15º do CIMI) devendo ser avaliado de acordo com o disposto no artigo 45º do mesmo compêndio normativo pois que a fórmula prevista no nº 1 do artigo 38º do CIMI (Vt= vc x A x CA x CL x Cq x cv) apenas tem aplicação aos prédios urbanos aí discriminados ou seja àqueles que já edificados estão para habitação, comércio, indústria e serviços (assim se decidiu no ac. deste STA de 20/04/2016 tirado no recurso 0824/15 disponível no site da DGSI - Jurisprudência do STA) onde se expendeu:

Todavia o legislador não incluiu aí os terrenos para construção que também classifica de prédios urbanos no artigo 6º do CIMI.

Para a determinação do valor patrimonial tributário dos mesmos há a norma do artigo 45º já referida onde apenas é relevada a área de implantação do edifício a construir e o terreno adjacente e as características do nº 3 do artigo 42º.

Os restantes coeficientes não estão aí incluídos porquanto apenas podem respeitar aos edifícios, como tal.

O coeficiente de afectação só pode relevar face à comprovada utilização do prédio edificado e bem assim o de conforto e qualidade.

Tais coeficientes multiplicadores do valor patrimonial tributário apenas respeitam ao edificado, mas não têm base real de sustentação na potencialidade que o terreno para construção oferece.

A aplicação destes factores valorizadores na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos de construção só poderia ser levada a cabo por analogia com o disposto no artigo 38º do CIMI.

Mas porque a aplicação desses factores tem influência na base tributável tal analogia está proibida por força do disposto no nº 4 do artigo 11º da LGT por se reflectir na norma de incidência na medida em que é susceptível de alterar o valor patrimonial tributário.

A aplicação desses coeficientes na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção seria violadora do princípio da legalidade e da reserva de lei consagrado no artigo 103º nº 2 da CRP.

A própria remissão para os artigos 42º e 40º do CIMI constante do artigo 45º e mesmo a redacção dada ao artigo 46º relativo ao valor patrimonial tributário dos prédios da espécie "outros " em que expressamente se refere que "o valor patrimonial tributário é determinado nos termos do artigo 38º com as necessárias adaptações "é demonstrativo de que na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não entram outros factores que não sejam o valor da área da implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação.

E que mesmo a remissão feita para os artigos 42º e 40º do CIMI não consagra a aplicação dos coeficientes aí referidos, mas apenas acolhe, respectivamente as características que hão-de determinar o valor do coeficiente a utilizar e o modo de cálculo.

O que se compreende face à definição de terrenos para construção do nº 3 do artigo 6º do C.I.M.I. (...)

Concordando e não olvidando a doutrina expressa por José Maria Fernandes Pires in Lições de Impostos Sobre o Património e do Selo 2012, 2ª edição pp 104 de que "o valor de um terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio ou prédios com determinadas características e com determinado valor, "e que para a avaliação de terrenos para construção a lei manda separar duas partes do terreno (uma primeira parte a do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir) e uma segunda parte a restante constituída pelo terreno que fica livre no lote de terreno para construção expressando que para alcançar o valor da primeira parte é necessário proceder à avaliação do edifício a construir como se ele já estivesse construído.

Com o devido respeito, não se acolhe integralmente esta doutrina pelas dúvidas e imprecisões que pode acarretar e que em matéria fiscal devem ser evitadas. Desde logo a lei, no art o 6º nº 3 do CIMI classifica de terrenos para construção realidades que não têm aprovado qualquer projecto de construção pelo que a sua inexistência determina por si só a inviabilidade de efectuar o cálculo da chamada área de implantação do edifício porque inexistente mesmo em projecto e por outro lado, nos casos em que existe esse projecto ... cumpre salientar que a qualidade e o conforto têm de ser efectivos o que se compreende porque o direito tributário se preocupa com realidades e verdades materiais não podendo a expectativa ou potencial construção de um edifício com anunciados/programados índices de qualidade e conforto integrar um conceito que objectivamente, só é palpável e medível se efectivada a construção e se, realizada sem desvios ao constante da comummente conhecida "memória descritiva" que acompanha cada proiecto de construção. Também é certo que a valorização imediata do prédio por efeito da atribuição do alvará de terreno para construção não deixará de ser levada em conta para efeitos de tributação, em caso de alienação, com a tributação noutra sede tributária.

 

Como se expressou no acórdão deste STA a que supra fizemos referência (...) Efectivamente o coeficiente de afectação tem a ver com o tipo de utilização do prédio já edificado e o mesmo se diga do coeficiente de qualidade e conforto.

Nos terrenos em construção as edificações aprovadas são meramente potenciais e é o valor dessa capacidade construtiva, geradora de acréscimo de valor patrimonial ou riqueza para o seu proprietário que se procura taxar. E não factores ainda não materializados

Tendo em conta a realidade o legislador consagrou para a determinação do valor patrimonial tributário desta espécie de prédios a regra específica constante do supra referido artigo 45º do CIMI e não outra, onde reitera-se se tem em conta o valor da área de implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação bem como as características de acessibilidade, proximidade, serviços e localização descritas no nº 3 do artigo 42º, tendo em conta o projecto de construção aprovado, quando exista, e o disposto no nº 2 do artigo 45º do C.I.M.I, mas não outras características ou coeficientes.

Isto só pode significar que na determinação do seu valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tem aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38º do CIMI onde expressamente se prevê, entre outros o coeficiente, aqui discutido, de qualidade e conforto relacionado com o prédio a construir. O que, faz todo o sentido e dá coerência ao sistema de tributação do IMI uma vez que os coeficientes previstos nesta fórmula só podem ter a ver com o que já está edificado, o que não é o caso dos terrenos para construção alvo de tributação específica, sim, mas na qual não podem ser considerados para efeitos de avaliação patrimonial factores ainda não materializados. E, sendo verdade que para calcular o 'valor da área de implantação do edifício a construir a lei prevê que se pondere o valor das edificações autorizadas ou previstas (artº 45º nº 2 do CIMI) para tal desiderato, salvo melhor opinião não necessitamos/devemos entrar em linha de conta, necessariamente, com o coeficiente de qualidade e conforto pois que não estando materializado não é medível/quantificável, sendo consabido da experiência comum que um projecto de edificação contemplando possibilidades modernas de inserção acessória de equipamentos vulgarmente associados ao conceito de conforto tais como ar condicionado, videovigilância robótica doméstica, luzes inteligentes etc, se edificado/realizado com defeitos pode não se traduzir em qualquer comodidade ou bem estar, antes pelo contrário ser fonte de problemas/insatisfações e dispêndios financeiros.

 

Esta jurisprudência foi posteriormente reafirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se, entre vários outros, pelos acórdãos seguintes acórdãos:

  • de 05-04-2017, processo nº 01107/16 («Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»);
  • de 28-06-2017, processo nº 0897/16 («II— Os coeficientes de afectação e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38º do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto. III— Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»).
  • de 16-05-2018, processo nº 0986/16 («O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38º do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI)»;  
  • de 14-11-2018, processo n.º 0133/18 («No cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse fator de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»;
  • de 23-10-2019, processo nº 170/16.6BELRS 0684/17 («os coeficientes de localização, qualidade e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38º do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI).»  
  • de 13-01-2021, processo nº 0732/12.0BEALM 01348/17 («Re1ativamente à avaliação de terrenos para construção, sobre o que regula o art. 45.º do C.I.M.I., não são de aplicar os coeficientes ou características não especificamente previstos, entre os quais o coeficiente de qualidade e conforto».

 

Na linha desta jurisprudência, é de entender que a avaliação dos terrenos para construção devia ser efectuada sem aplicação dos coeficientes não especificamente previstos, entre os quais os coeficientes de localização, de qualidade e conforto e de afectação.”

 

No caso em apreço, como resulta da alínea B) dos factos assentes, na avaliação do prédio em causa, foram aplicados os coeficientes de localização, afectação e qualidade e conforto, o que determinou o apuramento do VPT que esteve na base das liquidações de IMI e AIMI relativas aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020.

Assim, à face da jurisprudência referida, tem de se concluir que a fixação do valor patrimonial do prédio aqui em causa, enferma dos erros que a Requerente lhes imputa, que são exclusivamente imputáveis à Administração Tributária que praticou os actos de avaliação.

 

“3.2.4. Injustiça grave ou notória

 

O último requisito da revisão oficiosa ao abrigo do nº 4 do artigo 78º da LGT é o de o apuramento da matéria tributável consubstanciar «injustiça grave ou notória».

O nº 5 do artigo 78º esclarece o alcance destes conceitos, estabelecendo que «para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional».

 Aquele requisito é exigido em alternativa, como se depreende do uso da conjunção «ou».”

 

No caso em apreço, afigura-se ser manifesta a natureza «grave» da injustiça gerada com a errada avaliação, pois a tributação em IMI e AIMI do prédio aqui em causa foi consideravelmente superior ao devido, em cerca de 200%, uma vez que, em Janeiro de 2021, foi apurado um VPT de € 1 464 680,00 sendo que o VPT originário fixado em 2013 (8 anos antes) foi de € 4 108 780,00.

 

“3.2.5. Conclusão

 

Verificam-se, assim, todos os requisitos de que depende a revisão da matéria tributável prevista nos nºs 4 e 5 do artigo 78º da LGT, pelo que em vez do indeferimento do pedido de revisão oficiosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter efectuado a revisão e anulado parcialmente as liquidações de AIMI e IMI relativas aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020”.

Aliás é a própria AT que reconhece, pelo menos quanto ao AIMI de 2020, a necessidade de promoção da correcção, ainda que com fundamento diferente.

Pelo exposto, justifica-se a anulação do acto de indeferimento do pedido de revisão, quanto à revisão da matéria tributável, bem como as anulações parciais das consequentes liquidações de IMI e AIMI, nas partes em que excederam o que seria devido se tivessem tido como pressupostos avaliações realizadas nos termos legais [artigo 163º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2º, alínea c), da LGT]”.

 

  1. Reembolso de quantias pagas e juros indemnizatórios

 

A Requerente pede o reembolso do imposto indevidamente pago (€ 58 797,85) acrescido de juros indemnizatórios.

Como consequência da anulação parcial das liquidações há lugar a reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de € 58 797,85, valor que a Autoridade Tributária e Aduaneira não contestou especificadamente.

O nº 1 do artigo 43º da LGT reconhece o direito a juros quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços.

O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, a que se alude no nº 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo nº 402/06.

Como também se refere no mesmo acórdão, «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º, nº 3 da LGT».

No caso em apreço, a norma à face da qual tem de ser aferida a existência de direito a juros indemnizatórios é a alínea c) deste nº 3 do artigo 43º da LGT, que estabelece que eles são devidos «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária».

Como decorre da matéria de facto fixada, o pedido de revisão foi apresentado em 2021.11.05, pelo que apenas a partir de 2022.11.06 haveria direito a direito a juros indemnizatórios, se a decisão sobre aquele pedido não tivesse sido apreciada.

No entanto, a AT veio a indeferir expressamente o pedido de revisão por despacho de 2022.12.26, pelo que a Requerente tem direito a juros indemnizatórios a contar de 2022.11.06, por força da alínea c) deste nº 3 do artigo 43º da LGT.

 

  1. Decisão

 

De harmonia com o exposto, este TAS decide:

 

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, pelo que consequentemente:
  2. Anula parcialmente a liquidação IMI - Ano de 2017, nº..., na parte de € 8 295,38;
  3. Anula parcialmente a liquidação IMI - Ano de 2018, nº ... e a de AIMI - Ano de 2018, nº ... na parte de € 19 959,32;
  4. Anula parcialmente a liquidação IMI - Ano de 2019, nº ..., e a de AIMI - Ano de 2019, nº ..., na parte de € 19 344,89;
  5. Anula parcialmente a liquidação AIMI - Ano de 2020, nº ..., na parte de € 11 198,26;
  6. Julga procedente o pedido de reembolso de € 58 797,85;
  1. Julga procedente o pedido de juros indemnizatórios contados desde 2022.11.06 e até cumprimento do julgado.

 

Valor da causa

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 58 797,85, que não foi contestado pela Requerida, pelo que nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 97ºA do CPPT, fixa-se em € 58 797,85 o valor da causa.

Custas

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 3, do RJAT, e 5.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela II anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 2 142,00, fica a cargo da Requerida em função do decaimento.

 

Notifique.

 

Lisboa, 19 de Outubro de 2023

Tribunal Arbitral Singular (TAS), 

 

Augusto Vieira