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CAAD: Arbitragem Tributária CAAD: Arbitragem Tributária
Processo n.º: 139/2020-T
Tema: IVA – Liquidações julho a março de 2019 - Artigo 18.º do Código Verba 1.11 da Lista I e verba 3.1 da Lista II, ambas as li
ACÓRDÃO
Sumário: I – A pendência de discussão sobre a inscrição do contribuinte como residente não habitual, independente da fase em que se encontre (administrativa ou judicial), permite a impugnação direta do ato de liquidação de IRS com fundamento na não aplicação do regime fiscal dos residentes não habituais, inexistindo qualquer incompatibilidade com o Acórdão n.º 718/2017, de 15 de Novembro, do Tribunal Constitucional. II - No domínio do regime fiscal aplicável aos residentes não habituais, a inscrição a que se refere o n.º 10 do artigo 16º do Código do IRS assume natureza meramente declarativa e não constitutiva do direito a ser tributado nos termos de tal regime. III – Daí que, no caso de não formalização tempestiva de pedido de inscrição dessa qualidade no cadastro (residente não habitual), o respetivo benefício fiscal opera automaticamente desde que comprovados os respetivos pressupostos.
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Acordam os árbitros que integram este Tribunal Coletivo, José Poças Falcão (Presidente), Raquel Franco e Tomás Castro Tavares (Adjuntos):
I – RELATÓRIO
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A..., titular do número de identificação fiscal (NIF)..., residente em ..., ..., França (doravante “Requerente”), abrangido pela área de competência do Serviço de Finanças de Lisboa ..., alegadamente fundamentado no disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 95.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), no n.º 1 do artigo 140.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), no artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”) e na alínea a) do n.º 3 do artigo 5.º, na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e nos artigos 10.º e seguintes, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral, pedindo a declaração de ilegalidade e consequente anulação dos seguintes atos:
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Ato tributário de liquidação de IRS n.º 2019..., referente ao ano de 2015, no montante de EUR 63.580,79 – cfr. Anexo n.º 1 – e respetiva liquidação de juros compensatórios;
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Ato tributário de liquidação de IRS n.ºs 2020..., referente ao ano de 2016, no montante de EUR 64.408,05, – cfr. Anexo n.º 2 – e respetiva liquidação de juros compensatórios;
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Ato tributário de liquidação de IRS n.º 2021..., referente ao ano de 2017, no montante de EUR 63.809,99 – cfr. Anexo n.º 3 – e respetiva liquidação de juros compensatórios.
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Decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa[1] a que foi atribuído o n.º de processo n.º ...2022..., submetido no dia 19.08.2022 junto dos Serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”), tendo por objeto os sobreditos [atos de liquidação e que constitui um ato de segundo grau em relação aos mesmos, fazendo suas as ilegalidades do ato de liquidação] - cfr. cópia do pedido de revisão de ato tributário e respetivo comprovativo de entrega que junta como Anexos n.ºs 4 e 5.
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Em causa e em síntese, segundo alega, o facto de, estando reunidos os respetivos pressupostos de facto e de direito, não ter sido aplicado ao Requerente e aos rendimentos tributáveis o regime dos “Residentes Não Habituais”, nos termos do artigo 16.º e 81.º do Código do IRS.
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À luz do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou os signatários como árbitros deste Tribunal coletivo, tendo estes comunicado a aceitação do encargo no prazo aplicável.[2]
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Ulterior e oportunamente, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral coletivo ficou constituído em 16-1-2023 e reconstituído em 11-5-2023 após designação e aceitação de novo árbitro adjunto nos termos do despacho de 21-4-2023 do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD (cfr nota 2, em rodapé)
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Para o efeito notificada, a Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu ao requerimento inicial apresentado, contestando-o, concluindo pela sua total improcedência.
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A reunião do Tribunal com as partes prevista no artº 18º, do RJAT, foi dispensada sem oposição das partes, por ser reconhecida a sua inutilidade no caso.
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Ambas as partes foram notificadas para apresentarem alegações finais escritas, de facto e de direito, mas apenas a Requerente as apresentou, concluindo, no essencial, pelo modo que o havia feito no requerimento inicial.
Posição da Requerente
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No essencial, alega o Requerente, a fundamentar o pedido, que:
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Tem nacionalidade francesa;
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Transferiu a sua residência fiscal para Portugal em 17.12.2013;
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Até essa data, o Requerente residia em França, tendo apenas residido em Portugal no período compreendido entre 1992 e 1995;
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Em dezembro de 2013, o Requerente comunicou à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) a alteração de morada para Portugal;
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Não residiu em Portugal nos 5 anos anteriores a essa data;
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Pretendia e ainda pretende beneficiar do regime dos residentes não habituais, uma vez que preenche e preenchia todos os requisitos para usufruir do mesmo.
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Aquando da sua transferência para Portugal, o Requerente assumiu que, por cumprir todos os pressupostos, estaria automaticamente abrangido pelo regime dos residentes não habituais.
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Devido a esse facto, o Requerente não efetuou o pedido de inscrição como residente não habitual no ano de chegada, nem até ao dia 31 de março do ano seguinte.
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Também devido a esse facto, o Requerente não entregou declaração Modelo 3, por assumir que estaria automaticamente isento de tributação e, portanto, dispensado da entrega de qualquer declaração.
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Em 11.09.2019, a Autoridade Tributária (“AT”) emitiu a liquidação de IRS n.ºs 2019..., referente aos rendimentos auferidos durante o ano de 2015, no montante de EUR 63.580,79;
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Em 07.10.2019 o Requerente requereu a passagem de certidão de fundamentação daquela liquidação, nos termos dos artigos 24.º e 37.º do CPPT;
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Em 08.01.2020, foi o Requerente notificado da certidão que junta como anexo n.º 9;
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Daquela certidão resulta que a AT “tomou conhecimento, através da troca de informações fiscais internacionais prevista na Diretiva 2011/16/EU, transposta para a ordem jurídica nacional pelo Decreto-Lei 61/2013 que, para o ano de 2015, obteve rendimentos de pensões na França”.
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Da análise dessa informação, constaria, em nome do Requerente:
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Sem renunciar ao direito de reação, o Requerente pagou o imposto liquidado;
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Assim, apenas em 2019, após aconselhamento correto, o Requerente se apercebeu de que não estava, em termos cadastrais, abrangido pelo regime dos residentes não habituais;
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A não apresentação da informação para inscrição como residente não habitual até ao dia 31 de março de 2014 tratou-se de um lapso, decorrente do manifesto desconhecimento da lei e dos procedimentos associados a estas matérias;
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O Requerente sempre pautou o seu comportamento pela atuação de boa-fé.
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Pretendendo adquirir o estatuto de residente não habitual desde a data de chegada a território nacional, o Requerente tentou, em 28-1-2020, apresentar o respetivo pedido de inscrição, por via eletrónica, indicando como data de início de tributação, ao abrigo deste regime, o ano de 2013;
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Contudo, o sistema informático da AT recusou a submissão do pedido com a indicação: “O ano de início de estatuto tem de ser superior a 2015”;
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Não sendo possível indicar como ano de início da tributação ao abrigo do regime dos residentes não habituais o período de 2013, e de forma a proceder à submissão eletrónica, o Requerente tentou indicar a data mais aproximada de chegada admitida pelo sistema segundo aquela indicação, ou seja, o ano de 2016;
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Todavia, o sistema informático recusou a submissão do pedido com a indicação: “O ano de início de estatuto não pode ser o indicado. Apenas poderá ser indicado o ano atual ou o ano anterior (neste último caso apenas durante os três primeiros meses do ano)”;
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Em face do exposto, e pretendendo o Requerente cumprir com a forma eletrónica de submissão do pedido, viu-se obrigado a proceder à submissão do pedido de inscrição ao abrigo do regime dos residentes não habituais indicando como ano de início de tributação o ano de 2019 – data errada e que o Requerente requereu que fosse corrigida para 2013;
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Ao pedido apresentado foi atribuído o número de documento IRNH...;
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Em paralelo, como forma de retificar esse vício formal, e com o propósito de se considerar que aquele estatuto deverá produzir efeitos desde 2013, em 31.01.2020, o Requerente apresentou um pedido de inscrição como residente não habitual por escrito, na impossibilidade de cumprir com a respetiva submissão eletrónica, pelos motivos anteriormente indicados;
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A AT notificou o Requerente do projeto de decisão de indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual submetido eletronicamente (com indicação, portanto, do início de aplicação do regime em 2019), e para exercer, querendo, o respetivo direito de audição,
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Não se conformando com o sentido do projeto de indeferimento do pedido de inscrição apresentado, o ora Requerente exerceu o seu direito de audição em 14.02.2020;
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Em sede de direito de audição, argumentou o ora Requerente que, tendo em consideração que permaneceu em Portugal mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, desde a sua chegada a Portugal no final de 2013, possuindo neste país a sua habitação permanente, considera-se residente em Portugal desde 17.12.2013;
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Sendo ainda certo que não foi residente em Portugal em qualquer dos 5 anos anteriores a essa data, estão reunidos os dois requisitos do n.º 6 (atual n.º 8) do artigo16.º do Código do IRS para que pudesse ser inscrito no regime dos residentes não habituais, com início em 2013;
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Em face do exposto, requereu, mais uma vez, a sua inscrição no cadastro de contribuintes na qualidade de “residente não habitual”, com efeitos ao ano de 2013;
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Por decisão datada de 08.06.2020, foi o Requerente notificado da decisão final de indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual com o n.º IRNH...;
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No dia 22.06.2020, na sequência do requerimento apresentado em janeiro de 2020 foi o Requerente notificado do despacho do Senhor diretor de Serviços de Registo de Contribuintes no sentido do indeferimento liminar do pedido de inscrição como residente não habitual desde 2013, por extemporaneidade, ao abrigo do n.º 8 do artigo 16.º do Código do IRS, mantendo-se ainda o indeferimento do pedido para o ano de 2019;
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As duas decisões foram objeto de reação pelo Requerente, através da propositura de ação administrativa especial que corre os seus termos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, Juíz Teresa Jordão Pessoa, Processo 619/20.3BESNT (da qual protestou juntar certidão do estado do processo);
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Em 04.12.2020, a AT emitiu a liquidação de IRS n.ºs 2020..., referente aos rendimentos auferidos durante o ano de 2016, no montante de EUR 64.408,05;
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O Requerente não foi notificado para exercer qualquer direito de audição antes da emitida essa liquidação;
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Sem renunciar ao direito de reação, o Requerente pagou o imposto liquidado;
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Em 12.11.2021, a AT emitiu a liquidação de IRS n.ºs 2021..., referente aos rendimentos auferidos durante o ano de 2017, no montante de EUR 63.809,99;
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O Requerente não foi notificado para exercer qualquer direito de audição antes da emitida essa liquidação;
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Sem renunciar ao direito de reação, o Requerente pagou o imposto liquidado;
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Através da análise às liquidações, é possível concluir que a totalidade dos rendimentos alegadamente apurados pela AT (rendimento global) foi sujeita ao regime normal de tributação de residentes em Portugal, às taxas progressivas gerais;
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Em 19.08.2022, o Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRS relativas aos anos de 2015, 2016 e 2017;
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Até ao dia 01.02.2023 – e, portanto, decorridos mais de 4 meses desde a apresentação do pedido -, o Requerente ainda não tinha sido notificado de decisão final no âmbito daquele procedimento.
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O Requerente reitera o seu desejo de beneficiar do regime dos residentes não habituais, motivo pelo qual não concorda com as liquidações anteriormente descritas e solicita a sua revisão pelos fundamentos de Direito melhor descritos de seguida.
Violação do direito de audição
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Alega o Requerente que, até à notificação das referidas liquidações, não teve oportunidade para se pronunciar sobre as mesmas, quer em relação à legalidade, quer em termos de valores, quer em termos de períodos de tributação, extraindo desta omissão a violação do direito de audição prévia (artigos 60º, da LGT e 135º, do CPA)
Falta de fundamentação
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Concomitantemente, invoca o Requerente a falta de fundamentação não só das liquidações como do ato de indeferimento.
Posição da Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
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Na resposta, a Autoridade Tributária e Aduaneira, depois de suscitar a exceção de incompetência material do Tribunal e de litispendência alega, no essencial e em síntese:
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O Requerente não apresentou as declarações modelo 3 de IRS referente aos anos de 2015, 2016 e 2017.
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Pelo que, os serviços competentes da AT procederam à emissão de ordem de serviço – nº OS 2019... provenientes de DSRI – Rendimentos não declarados auferidos no estrangeiro – Anexo J com e sem declaração modelo 3. Foi elaborada a seguinte informação:
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Para cumprimento dessa obrigação declarativa, foi o contribuinte notificado, nos termos do nº 3 do artigo 76º do CIRS, para proceder no prazo de 30 dias, à submissão da declaração modelo 3 de IRS com o respetivo anexo J (obrigação decorrente do disposto nos art. 13º e 15º nº 1, amos do CIRS). Esta notificação foi feita ao abrigo do n/ primeiro ofício (...) de 17/07/2019 (carta devolvida), seguido do n/ofício ... de 31/07/2019 (carta devolvida). Desta apenas constava (por ser esta a informação recebida da autoridade fiscal de origem do contribuinte) o rendimento, nada se sabendo quanto ao eventual imposto pago no estrangeiro.Passados os 30 dias da notificação, não foi submetida qualquer declaração.Nestes termos julgo ser de elaborar o DCU, em conformidade com os elementos disponíveis na base de dados da AT, e devidamente notificados ao contribuinte…”.
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Assim, em 2019-09-06, 2020-12-03 e 2021-11-12, foram emitidas as declarações modelo 3, oficiosas e vigentes, nº ...- 2015 -...– ...; ...- 2016 - ...– ... e ... - 2017 - ...– ..., respeitantes ao IRS de 2015, 2016 2017, respetivamente, incluindo o Anexo L.
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As declarações originaram as liquidações, oficiosas e vigentes, nº 2019...; 2020... e 2021..., datadas 2019-09-11, 2020-12-04 e 2021-11-12, que apuraram valores de imposto de € 63.580,79, € 64.408,05 e € 63.809,99, respetivamente, tendo sido efetuado o pagamento em 02/10/2019, 08/01/2021 e 01/12/2021.
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Em 20/12/2019 foi passada certidão, a pedido do requerente, sobre a fundamentação referente ao ano de 2015 – liquidação nº 2019... .
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Em 2020 o Requerente apresentou pedido de inscrição de residente não habitual – IRNH nº ... – que foi indeferido através de despacho de 08/06/2020 do Sr. Diretor de Serviços de Registo de Contribuintes (DSRC) com efeitos ao ano de 2019 por seguintes motivos: a) por se encontrar registado no cadastro da AT como residente em território português nos anos de 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018; b) consta como residente fiscal, em declaração de rendimentos de IRS, referente ao ano de 2015.
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A 2022-08-19, foi requerido pedido de revisão tendo como objeto as liquidações acima mencionadas.
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Por despacho de 15/12/2022 foi emitido o projeto de indeferimento.
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Através de despacho de 20/04/2023, a DSIRS remeteu o processo a esta DS, a fim de ser anexo ao pedido de pronuncia arbitral.
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A Ação Administrativa (Processo nº 619/20.3 BESNT) – aguarda que seja proferida sentença, tendo decorrido o prazo para a Ré, AT, ter apresentado a contestação. Esta ação foi intentada no seguimento do indeferimento do IRNH de 08/06/2020.
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O Requerente, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito da Revisão Oficiosa (nº ...2022...) decide recorrer administrativamente com a apresentação de um pedido de constituição de tribunal arbitral no CAAD nº 67/2023-T em 2023.02.02, solicitando com o presente pedido arbitral ser admitido, nos termos e para os efeitos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária e ser julgado procedente, por provado e fundado e, consequentemente, serem anulados os atos de liquidação de IRS dos anos de 2015, 2016 e 2017, bem assim como o ato de indeferimento tácito da Revisão Oficiosa, com as necessárias consequências legais, designadamente o reembolso do montante de imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios calculados à taxa legal em vigor, com os fundamentos constantes na petição apresentada e aqui integralmente reproduzida.
Alegações finais
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Apesar de notificadas ambas as Partes para o efeito, apenas a Requerente apresentou alegações finais escritas em que concluiu, no essencial, pela forma que o havia feito no pedido de pronúncia arbitral.
Saneamento
As exceções invocadas: incompetência material do Tribunal e litispendência
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Tendo em conta que o âmbito de competência material do tribunal é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria [art. 13.º do CPTA aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT)] e que a infração das regras de competência em razão da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal, que é de conhecimento oficioso [art. 16.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT], importa apreciar, primacialmente, a exceção dilatória suscitada pela Requerida sobre a incompetência do tribunal arbitral.
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A Requerida fundamenta as exceções alegando, no essencial, que, citando, “(...)resulta manifesto, que está em causa um pedido de reconhecimento do estatuto de residente não habitual, tendo como fundamento a ilegalidade da decisão administrativa, mesmo que a Requerente no PPA insista em sentido contrário (...)”, sendo que a invocada ilegalidade foi contestada ou impugnada na acção administrativa especial “(...) intentada pelo Requerente e que corre termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (Processo 619/20.3BESNT (...)”
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A defesa, por exceção, não tem, porém fundamento pela simples e cristalina razão de que o que o autor ou requerente pede é, na verdade, a anulação das liquidações de IRS de 2015 a 2017, embora estas tenham óbvia conexão com indeferimento tácito de pedido de revisão oficiosa desses atos de liquidação.
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Ou seja: o pedido insere-se claramente no âmbito da competência do Tribunal Arbitral conforme disposto no artigo 2º-1/a), do RJAT.
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Por outro lado, a ilegalidade apontada às liquidações de IRS impugnadas por não aplicação do regime fiscal dos residentes não habituais encontra-se entre o leque de fundamentos suscetíveis de, em caso de provimento, determinar a errada quantificação dos rendimentos e consequentemente, a ilegalidade do ato tributário de liquidação correspondente.
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O pedido arbitral no caso sub juditio tem, assim, como objecto as liquidações de IRS dos anos de 2015 a 2017 e como objecto imediato as decisões de indeferimento tácito de pedidos de revisão ofíciosa.
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Ou seja: não está, pois, em causa conhecer de qualquer outra decisão, nomeadamente, de caráter administrativo, maxime sindicar o ato de indeferimento do pedido de inscrição do Requerente como residente não habitual, como parece pretender a AT.
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Tem sido este também o enquadramento jurisprudencial em casos análogos conforme se verifica, v. g., nas decisões proferidas nos processos CAAD nºs 777/2020-T, 188/2020-T, 815/2021-T, 319/2022-T e 581/2022-T.
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Certo que o Requerente impugnou a decisão de indeferimento da sua inscrição como residente não habitual, encontrando-se pendente – tal como reconhecido pela Requerida – a ação administrativa especial a que corresponde o processo nº 619/20.3BESNT, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.
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Acontece que a pendência de discussão sobre a inscrição do contribuinte como residente não habitual, independentemente da fase em que se encontre (administrativa ou judicial), permite a impugnação direta do ato de liquidação de IRS com fundamento na não aplicação do regime fiscal dos residentes não habituais, inexistindo (ao contrário do pretendido pela AT) qualquer incompatibilidade com o Acórdão nº718/2017, de 15 de Novembro, do Tribunal Constitucional[3], em recurso interposto pela AT no processo do CAAD nº 723/17, onde, depois de considerações várias sobre a interpretação do artigo 54º, do CPPT e respetivo âmbito de aplicação, se decidiu “(...)não julgar inconstitucional a interpretação normativa retirada do artigo 54º do CPPT, com o sentido de que a não impugnação judicial de actos de indeferimento de pedidos de reconhecimento do estatuto de residente não habitual impede a impugnação judicial das decisões finais de liquidação do imposto com fundamento em vícios daqueles”.
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Na verdade, estava em causa no citado processo - era esse o objeto do recurso para o Tribunal Constitucional - o artigo 54º, do CPPT, quando interpretado no sentido de “(...)impedir que a impugnação do ato de liquidação do imposto se funde em vícios próprios do ato de cessação do benefício fiscal”.
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Mais concretamente: a questão reconduzia-se a saber se o contribuinte, como condição para lhe ser aberta a via da impugnação arbitral dos atos de liquidação consequentes, teria de previamente impugnar, através de ação administrativa especial, o ato administrativo que denegara a sua inscrição como residente não habitual em Portugal no ano de 2010, na consideração de que o sobredito ato era lesivo e, consequentemente suscetível de impugnação autónoma, configurando assim, como ato imediatamente lesivo dos direitos do contribuinte, uma exceção ao princípio da impugnação unitária e, como tal subsumível à previsão do artigo 54º, do CPPT.
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Pois bem, não é esta manifestamente a situação dos presentes autos na medida em que, como está alegado e assente, o indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual, foi objeto de ação administrativa especial que se encontra pendente.
A alegada litispendência
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Não estão claramente reunidos os pressupostos para a verificação deste figura processual prevista nos artigos 580º e 581º, do CPC, desde logo porque na ação administrativa especial citada a causa de pedir é o ato de indeferimento do pedido de reconhecimento do estatuto de residente habitual e no presente pedido arbitral sindicam-se atos de liquidação de impostos (atos de segundo grau) e o ato de indeferimento tácito de pedido de revisão oficiosa (ato de primeiro grau relativamente àqueles).
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Não têm assim fundamento as exceções invocadas que, em consequência, improcedem totalmente.
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Este Tribunal arbitral é assim materialmente competente.
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As partes são legítimas e capazes e estão legalmente representadas.
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À luz do sumariamente exposto, não se revela, manifestamente, fundamentada, a alegação pela AT de erro na forma de processo.
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O processo é, assim, o próprio e está isento de nulidades.
Apreciando o mérito do pedido
II. FUNDAMENTAÇÃO
De facto
Factos provados
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Com base nos elementos que constam do processo (processo administrativo, factos consensualizados pelas partes e documentos incorporados nos autos e que não foram impugnados), consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:
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O Requerente não apresentou as declarações modelo 3 de IRS referente aos anos de 2015, 2016 e 2017...
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... tendo, em consequência, os serviços competentes da AT procedido à emissão de ordem de serviço – nº OS 2019... provenientes de DSRI – Rendimentos não declarados auferidos no estrangeiro – Anexo J com e sem declaração modelo 3 e elaborada a seguinte informação:
Para cumprimento dessa obrigação declarativa, foi o contribuinte notificado, nos termos do nº 3 do artigo 76º do CIRS, para proceder no prazo de 30 dias, à submissão da declaração modelo 3 de IRS com o respetivo anexo J (obrigação decorrente do disposto nos art. 13º e 15º nº 1, amos do CIRS).Esta notificação foi feita ao abrigo do n/ primeiro ofício (...) de 17/07/2019 (carta devolvida), seguido do n/ofício ... de 31/07/2019 (carta devolvida). Desta apenas constava (por ser esta a informação recebida da autoridade fiscal de origem do contribuinte) o rendimento, nada se sabendo quanto ao eventual imposto pago no estrangeiro. Passados os 30 dias da notificação, não foi submetida qualquer declaração. Nestes termos julgo ser de elaborar o DCU, em conformidade com os elementos disponíveis na base de dados da AT, e devidamente notificados ao contribuinte…”:
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Em 2019-09-06, 2020-12-03 e 2021-11-12, foram emitidas as declarações modelo 3, oficiosas, nºs ... - 2015 -...– ...; ...- 2016 - ...– ... e ... - 2017 - ... – ..., respeitantes ao IRS de 2015, 2016 2017, respetivamente, incluindo o Anexo L ...
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... que originaram as liquidações, oficiosas nº 2019...; 2020... e 2021..., datadas 2019-09-11, 2020-12-04 e 2021-11-12 ...
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... e que apuraram valores de imposto (mais juros compensatórios) de € 63.580,79, € 64.408,05 e € 63.809,99, respetivamente, que foram pagos em 02/10/2019, 08/01/2021 e 01/12/2021;
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O Requerente tem nacionalidade francesa;
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Transferiu a sua residência fiscal para Portugal em 17.12.2013;
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Até esta data, o Requerente residia em França, salvo no período compreendido entre 1992 e 1995 em que residiu em Portugal;
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Em dezembro de 2013, o Requerente comunicou à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) a alteração de morada para Portugal;
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Não residiu em Portugal nos 5 anos anteriores a essa data (2013);
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Aquando da sua transferência para Portugal, o Requerente assumiu que, por cumprir todos os pressupostos necessários, estaria automaticamente abrangido pelo regime dos residentes não habituais;
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Devido a esse facto, o Requerente não efetuou o pedido de inscrição como residente não habitual no ano de chegada, nem até ao dia 31 de março do ano seguinte;
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Também devido a esse facto, o Requerente não entregou declaração Modelo 3, por assumir que estaria automaticamente isento de tributação e, portanto, dispensado da entrega de qualquer declaração;
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A AT “tomou conhecimento, através da troca de informações fiscais internacionais prevista na Diretiva 2011/16/EU, transposta para a ordem jurídica nacional pelo Decreto-Lei 61/2013 que, para o ano de 2015, obteve rendimentos de pensões na França” e...
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...que constaria, em nome do Requerente:
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Sem renunciar ao direito de reação, o Requerente pagou o imposto liquidado;
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Em 2019, após aconselhamento correto, é que o Requerente se apercebeu de que não estava, em termos cadastrais, abrangido pelo regime dos residentes não habituais;
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A não apresentação pelo Requerente da informação para inscrição como residente não habitual até ao dia 31 de março de 2014 terá sido um lapso decorrente do manifesto desconhecimento da lei e dos procedimentos associados a estas matérias.
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Pretendendo adquirir o estatuto de residente não habitual desde a data de chegada a território nacional, em 28.01.2020, o Requerente tentou apresentar o respetivo pedido de inscrição, por via eletrónica, indicando como data de início de tributação ao abrigo deste regime o ano de 2013...
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... mas o sistema informático da AT recusou a submissão do pedido com a indicação: “O ano de início de estatuto tem de ser superior a 2015”;
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Tentou indicar a data mais aproximada de chegada admitida pelo sistema segundo aquela indicação, ou seja, o ano de 2016;
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Todavia, o sistema informático recusou a submissão do pedido com a indicação: “O ano de início de estatuto não pode ser o indicado. Apenas poderá ser indicado o ano atual ou o ano anterior (neste último caso apenas durante os três primeiros meses do ano)”;
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Pretendendo o Requerente cumprir com a forma eletrónica de submissão do pedido, viu-se obrigado a proceder à submissão do pedido de inscrição ao abrigo do regime dos residentes não habituais indicando como ano de início de tributação o ano de 2019...
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...data errada e que o Requerente pediu que fosse corrigida para 2013;
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Ao pedido apresentado foi atribuído o número de documento IRNH...;
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Em paralelo, como forma de retificar vício formal, e com o propósito de se considerar que aquele estatuto deverá produzir efeitos desde 2013, em 31.01.2020, o Requerente apresentou um pedido escrito de inscrição como residente não habitual, na impossibilidade da sua submissão por via eletrónica;
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A AT notificou o ora Requerente do projeto de decisão de indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual submetido eletronicamente (com indicação, portanto, do início de aplicação do regime em 2019), e para exercer, querendo, o respetivo direito de audição;
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Não se conformando com o sentido do projeto de indeferimento do pedido de inscrição apresentado, o ora Requerente exerceu o seu direito de audição em 14.02.2020;
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Em sede de direito de audição, argumentou que, tendo em consideração que permaneceu em Portugal mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, desde a sua chegada a Portugal no final de 2013, possuindo neste país a sua habitação permanente, considera-se residente em Portugal desde 17.12.2013;
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Por decisão datada de 08.06.2020, foi o Requerente notificado da decisão final de indeferimento do pedido de inscrição como residente não habitual desde 17-12-2013;
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No dia 22.06.2020, na sequência do requerimento apresentado em janeiro de 2020 foi o Requerente notificado do despacho do Senhor diretor de Serviços de Registo de Contribuintes no sentido do indeferimento liminar do pedido de inscrição como residente não habitual desde 2013, por extemporaneidade, ao abrigo do n.º 8 do artigo 16.º do Código do IRS, mantendo-se ainda o indeferimento do pedido para o ano de 2019;
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As duas decisões foram objeto de reação pelo Requerente, através da propositura de ação administrativa especial que corre os seus termos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (Processo 619/20.3BESNT);
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A totalidade dos rendimentos apurados pela AT (rendimento global) foi sujeita ao regime normal de tributação de residentes em Portugal, às taxas progressivas gerais;
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Em 19.08.2022, o Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRS relativas aos anos de 2015, 2016 e 2017;.
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Até ao dia 01.02.2023 (e, portanto, decorridos mais de 4 meses desde a apresentação do pedido), o Requerente ainda não tinha sido notificado de decisão final no âmbito daquele procedimento;
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O presente pedido de pronúncia arbitral (PPA) foi apresentado no CAAD em 2-2-2023.
Factos não provados
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Não se surpreendem quaisquer outros factos de entre os alegados que se revelem relevantes ou essenciais para o objeto do litígio, provados e/ou não provados.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
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Relembra-se preliminarmente que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada [cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 659.º, n.º 2 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT].
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Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito [cfr. artigo 511.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
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À luz do exposto, o quadro factual relevante no caso sub juditio é o que se deixou descrito.
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Para o estabelecer, ponderou o Tribunal, conjugadamente, as posições das partes nos respetivos articulados bem como todo o acervo documental incorporado no processo, incluindo cópia do processo administrativo instrutor e relatório inspetivo, com o valor probatório decorrente da não impugnação das asserções e conclusões que dele constam (Cfr. v. g., Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 26-06- 2014, proferido no processo 07148/13: “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (..) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas".
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Ponderou ainda o Tribunal que no âmbito do direito fiscal, o ónus probatório não tem a dimensão subjetiva doutros ramos do direito, mas sim objetiva, no sentido de que o que interessa para a decisão do mérito da causa, quer no procedimento administrativo quer no processo judicial, é o que relevar da verdade dos factos alcançada, independentemente da parte que tenha o ónus de tal prova, atenta a predominância do princípio do inquisitório constante dos art.ºs 99.º da LGT e 13.º do CPPT.
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Ponderou final e igualmente o Tribunal que, pese embora não estar legalmente estabelecido o efeito cominatório decorrente da não impugnação específica e/ou especificada de factos alegados, a verdade é que, não contestados, os mencionados consideram-se provados, especialmente se não estiverem em contradição com a defesa como um todo, como acontece no caso sub juditio.
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É a esta luz que, em conjugação com a mencionada prova documental, o Tribunal considerou provados os factos supra elencados, alegados pelas Requerentes e não contestados, impugnados ou postos de algum modo em causa pela Requerida.
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Ou, dito doutro modo: tendo em consideração o exposto e as posições assumidas pelas partes e a prova documental apresentada e não reciprocamente impugnada, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, sendo que as questões controvertidas são essencialmente jurídicas ou de direito adentro dum quadro factual apresentado como pacífico.
II. FUNDAMENTAÇÃO (cont.)
O Direito
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Como abordagem preliminar para a fundamentação jurídica, recorde-se o que há muito vem sendo o entendimento da Jurisprudência quanto ao dever de apreciação dos argumentos apresentados pelas partes e que se traduz na não obrigatoriedade de os Tribunais os apreciarem (Cfr., inter alia, Ac do Pleno da 2.ª Secção do STA, de 7-6-1995 (Recurso nº 5239, in DR – Apêndice, de 31 de Março de 1997, pgs. 36-40 e Ac do STA – 2ª Sec – de 23 -4-1997, in Diário da República – Apêndice, de 9-10-1997, p. 1094). O Tribunal tem tão só apenas o dever de decidir o litígio de harmonia com o pedido e à luz da Lei e do Direito, após julgamento da matéria de facto.
O objeto do pedido
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O objeto destes autos reconduz-se a sindicar a invocada (i)legalidade do indeferimento tácito de pedido de revisão oficiosa, tendo por objeto os sobreditos atos de liquidação oficiosa de IRS em alegada ilegal desconsideração da circunstância do Requerente reunir os pressupostos, de facto e de direito, para lhe ser aplicado o denominado regime fiscal dos “Residentes Não Habituais” (RNH).
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A questão ora em discussão tem patente analogia com a discutida no processo do CAAD nº 319/2022-T, por Tribunal Coletivo presidido pelo mesmo árbitro presidente (cfr publicação no site do CAAD, www.caad.org.pt) e passa, no essencial, por aferir se o Requerente, a despeito de não ter, no prazo previsto na lei, requerido o seu registo como residente não habitual, ao abrigo do nº 10 do art.º 16 CIRS, tem ou não direito a ser tributado ao abrigo do regime denominado dos “residentes não habituais” no tocante aos ano de 2015 a 2017 a que respeitam as liquidação sub juditio.
Vejamos:
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Dispõe o artigo 16º, do CIRS em vigor à data dos factos:
(...) (...)
8 - Consideram-se residentes não habituais em território português os sujeitos passivos que, tornando-se fiscalmente residentes nos termos dos nºs 1 ou 2, não tenham sido residentes em território português em qualquer dos cinco anos anteriores.
9 - O sujeito passivo que seja considerado residente não habitual adquire o direito a ser tributado como tal pelo período de 10 anos consecutivos a partir do ano, inclusive, da sua inscrição como residente em território português.
10 - O sujeito passivo deve solicitar a inscrição como residente não habitual, por via eletrónica, no Portal das Finanças, posteriormente ao ato da inscrição como residente em território português e até 31 de março, inclusive, do ano seguinte àquele em que se torne residente nesse território.
11 - O direito a ser tributado como residente não habitual em cada ano do período referido no n.º 9 depende de o sujeito passivo ser considerado residente em território português, em qualquer momento desse ano. (sublinhados nossos)
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Do cotejo dos n.ºs 8 a 11 do artigo 16º do Código do IRS é possível apreender que os pressupostos para a aplicação deste regime são os seguintes: (i) O sujeito passivo se torne fiscalmente residente em Portugal, em conformidade com qualquer dos critérios estabelecidos nos n.º 1 e 2 do artigo 16º do CIRS e (ii) o sujeito passivo não tenha sido considerado residente em território nacional em qualquer dos cinco anos anteriores ao ano em que se deva considerar residente nos termos do n.º 1 e 2 da referida norma.
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Daqui resulta que o legislador fez depender, para efeitos da aplicação deste benefício fiscal, do preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 16º, n.º 8, do CIRS, e não da inscrição formal como residente não habitual.
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O n.º 11 do artigo 16º do CIRS é, a este propósito, lapidar ao fazer depender para a aplicação de tal regime da circunstância factual de o sujeito passivo se ter inscrito (e assim ser considerado) como residente em território português e não da sua inscrição formal enquanto residente não habitual.
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Destarte, a inscrição formal enquanto residente não habitual não poderá deixar de se ter como uma mera obrigação declarativa, obrigação essa que, quando eventualmente não cumprida no prazo definido no n.º 10 do artigo 16º do CIRS constituirá infração a esse mesmo comando legislativo, que, suscetível de ser punida nos termos do artigo 116º, do RGIT, será todavia neutra quanto à suscetibilidade do sujeito passivo poder ou não beneficiar desse mesmo regime, porquanto, como supra exposto, os pressupostos dos quais a lei faz depender a aplicação do regime em causa não compreendem o atempado cumprimento de tal procedimento de inscrição enquanto residente não habitual.
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Tal como se decidiu ou entendeu também no processo CAAD nº 188/2020-T, “…como por regra ocorre, a interpretação da lei fiscal não pode, nem deve, ficar-se pelo teor literal dos normativos imediatamente aplicáveis, devendo, antes, e mais não seja pela imposição da realização dos princípios da tributação da capacidade contributiva e da justiça material, decorrentes dos artigos 4.º, n.º 1, e 5.º, n.º 2, da LGT, identificar-se a finalidade material do regime a aplicar, através da compreensão da natureza das normas convocáveis, das finalidades por si visadas, e do contexto sistemático das mesmas. Sob esta perspectiva, a norma do n.º 10 do artigo 16.º do CIRS, que disciplina a data limite até à qual os sujeitos passivos que reúnam os pressupostos materiais de que depende a tributação de acordo com o regime dos residentes não habituais podem requerer a inscrição como residente não habitual - até 31 de Março, inclusive, do ano seguinte àquele em que se torne residente em território nacional -, deverá entender-se como uma norma essencialmente procedimental, de organização do sistema operacional de tributação, que visa assegurar sua efectividade e o seu normal funcionamento, sendo, especialmente e desde logo de notar que a norma em causa, não tem subjacentes quaisquer finalidades de evitar a fraude ou a evasão fiscal.E, nem se diga, como faz a AT, que não tendo o Requerente respeitado o prazo previsto no n.º 10 do artigo 16.º do Código do IRS para requerer a sua inscrição como residente não habitual, não pode beneficiar desse regime em qualquer um dos dez anos a que teria direito se tivesse apresentado o pedido dentro do prazo. Tratando-se a obrigação de apresentar o pedido de inscrição como residente não habitual, de uma obrigação meramente declarativa e, portanto não constitutiva do direito a beneficiar daquele regime, o atraso na entrega de declarações constitui uma contraordenação tributária prevista e punida nos termos do artigo 116.º do RGIT, e não deverá ter como consequência, sem mais, o não enquadramento no regime do residente não habitual. Do exposto resulta – em suma – que o pedido de inscrição como residente não habitual não tem efeito constitutivo, mas meramente, declarativo, tudo o que, como adiante se verá, será de relevar na solução jurídica a formular no caso concreto”.
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E em sentido idêntico se orientou também a decisão proferida no processo arbitral nº 777/2020-T quando aí se conclui que “(...) para que o sujeito passivo possa “ser considerado residente não habitual”, a lei não exige o registo. Pelo contrário, o n.º 6 é perfeitamente expresso e inequívoco ao dizer que “Consideram-se residentes não habituais em território português os sujeitos passivos que, tornando-se fiscalmente residentes nos termos dos nºs 1 ou 2, não tenham sido residentes em território português em qualquer dos cinco anos anteriores.”Ou seja, para que o sujeito passivo possa “ser considerado residente não habitual”, basta que se verifiquem dois requisitos, não sendo nenhum deles o registo como residente não habitual. São esses requisitos: Ter-se o sujeito passivo tornado fiscalmente residente num determinado ano; não ter o sujeito passivo sido residente em território português em qualquer dos cinco anos anteriores. Afigura-se assim evidente que a letra das disposições relevantes não permite a conclusão de que o registo como residente habitual é requisito para a aplicação do regime.”
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Acompanham-se, no essencial, estas posições para igualmente concluir que o pedido de inscrição como residente não habitual no prazo a que se alude no n.º 10 do artigo 16º do CIRS encerra um efeito meramente declarativo e não constitutivo do direito a ser tributado em tal regime fiscal. (sublinhado nosso).
Subsumindo os factos provados nos autos a este regime e interpretação:
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O Requerente, que obteve rendimentos de pensões me França na importância global de € 128.245,00 (cfr 25.15, dos factos provados) passou a ser residente para efeitos fiscais em Portugal a partir de 17-12-2013, sendo que igualmente se provou que o mesmo não estava inscrito como residente fiscal em Portugal nos cinco anos imediatamente anteriores ao ano de 2013.
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Ou seja: o Requerente cumpre ou cumpria os necessários e legais requisitos, previstos no nº 8, do artigo 16.º, do CIRS e que são os únicos exigidos pela lei para que o possa beneficiar do regime dos residentes não habituais.
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O que significa que, por falta de preenchimento dos respetivos pressupostos, de facto e de direito, os atos de indeferimento tácito e as liquidações objeto deste litígio, são ilegais.
Questões de conhecimento prejudicado:
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Resultando do exposto a declaração de ilegalidade das liquidações objeto do presente processo, por vício que impede a renovação do ato, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento dos restantes vícios que lhes são imputados pelo Requerente.
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Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, desnecessário se torna conhecer dos demais, porquanto, solução contrária esvaziaria de relevância a ordem do seu conhecimento.
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Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente ao ato tributário, a saber, preterição do direito ao exercício da audição prévia e falta de fundamentação.
Juros indemnizatórios
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O Requerente pede o reembolso do imposto indevidamente pago, no montante global de de € 191.798,83, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal.
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O Requerente pagou as quantias liquidadas, como ficou demonstrado.
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De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários (ou arbitrais), “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.
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Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.
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O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
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Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
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No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, há lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”, na parte correspondente à correção que foi considerada ilegal.
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No que concerne aos juros indemnizatórios, será que que a ilegalidade dos atos é imputável à AT?
Vejamos:
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É clara a existência de vícios de violação de lei substantiva, consubstanciado em erro nos pressupostos de direito e de facto.
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Todavia, tal ocorre apenas quando se revela admissível um juízo de imputação à AT de erro dos respetivos serviços – artigo 43º, da LGT.
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Pois bem, não pode afirmar-se que esse momento coincida com o momento das liquidações sob impugnação porquanto estas ocorreram com base no registo cadastral do Requerente como contribuinte sujeito ao regime normal de tributação.
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Ou seja: só quando, perante o pedido de revisão oficiosa das liquidações com a alegação e prova da verificação dos pressupostos do estatuto de residente não habitual, a AT indefere, tacitamente, o pedido formulado é que se pode afirmar a existência de erro dos serviços, gerador do início da contagem de juros indemnizatórios a favor do contribuinte.
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Sobre a questão do termo inicial determinante para a contagem dos juros indemnizatórios e, concretamente, na sequência – como é o caso dos autos – de pedido de revisão oficiosa já se pronunciou por diversas vezes o Supremos Tribunal Administrativo (STA), incluindo em acórdãos uniformizadores de jurisprudência (cfr., entre outros, os acórdãos nos processos nºs 0890/16, de 18-1-2017, 099/18.3BALSB (Pleno), de 24-10-2018, 04/19.0BALSB (Pleno) de 3-7-2019 e 21/19.0BALSB, de 23-10-2019.
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Dessa jurisprudência resulta o sentido uniforme de que, pedida a revisão oficiosa do ato de liquidação (artigo 78º-1, da LGT) e vindo o ato a ser anulado, mesmo que em impugnação judicial de indeferimento daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido e não desde a data do pagamento da quantia liquidada [cfr artigo 43º-1 e 3/c), da LGT].
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Aplicando esta Jurisprudência ao caso dos autos, o pedido de juros indemnizatórios procede apenas parcialmente na medida em que os juros deverão ser contados desde 19-8-2023, ou seja, um ano após a apresentação do pedido de revisão, em 19.08.2022.
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Assim é que deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução ao presente acórdão, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do RJAT, determinando o montante a restituir ao Requerente e calcular os respetivos juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva das dívidas cíveis, nos termos dos arts. 35.º, n.º 10, e 43.º, n.ºs 1 e 5, da LGT, 61.º, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).
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Os juros indemnizatórios são assim devidos desde 29-8-2023 até à do processamento da nota de crédito em que serão incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT).
DECISÃO
De harmonia com o acima exposto, decide este Tribunal Arbitral:
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Julgar improcedentes as exceções de incompetência material de litispendência suscitadas pela Requerida;
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Indeferir o pedido de suspensão da instância formulado pela Requerida;
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Julgar procedente o pedido de anulação do ato de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRS dos anos de 2015, 2016 e 2017;
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Declarar ilegais e igualmente anular, por erro nos pressupostos de facto e de direito, as liquidações de IRS e juros compensatórios dos anos de 2015 a 2017, identificadas e documentadas nos autos [liquidações, oficiosas nºs 2019..., 2020... e 2021..., datadas 2019-09-11, 2020-12-04 e 2021-11-12 e que apuraram valores de imposto (mais juros compensatórios) de € 63.580,79, € 64.408,05 e € 63.809,99];
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Condenar a Requerida na devolução nas importâncias pagas pelo Requerente, acrescidas de juros indemnizatórios nos termos expostos supra;
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Julgar prejudicada, pelos fundamentos expostos, a apreciação das demais questões suscitadas nos autos e
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Condenar a Requerida nas custas do processo, em face do seu decaimento.
VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 191.798,83, atribuído pela Requerente, sem contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira.
CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, totalmente a cargo da Requerida.
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Notifique-se, incluindo também o Ministério Público.
Lisboa, 4 de outubro de 2023
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão
(Presidente)
Raquel Franco
(Árbitra Adjunta)
Tomás Castro Tavares
(Árbitro Adjunto, com voto de vencido anexo)
Voto de vencido no processo arbitral n.º 67/2023-T
1. Votei vencido por duas razões: entendo que o regime dos residentes não habituais (RNH) é um benefício fiscal sujeito a opção pelo sujeito passivo, por interpretação do art. 16.º, n.º 8 a 10, do CIRS; e caso as liquidações fossem ilegais, o contribuinte não teria direito a juros indemnizatórios, por interpretação do art. 43.º, n.º 1 e 3, da LGT.
2. Na minha opinião, o regime do RNH é um benefício fiscal generoso (entre outras, com extensas isenções), submetido a requisitos legais objetivos (não tenha sido residente fiscal em Portugal e nos últimos 5 anos e passe a aqui residir [art. 16.º, n.º 8, do CIRS]), mas sujeito a opção, por parte do sujeito que os preenche: de querer ou não usufruir desses benefícios. É esse o sentido do art. 16.º, n.º 10, do CIRS: se pretende o estatuto, “solicita a inscrição como residente não habitual” junto da AT, em ato autónomo à sua inscrição como residente fiscal em Portugal.
3. A Sentença nega esta opção e advoga que é automático e necessário. Mas a opção está descrita no art. 16.º, n.º 10, do CIRS: e tal pode ocorrer – pessoas singulares que passam a residir em Portugal, mas que, por algum motivo, não pretendem aceder a estes benefícios fiscais apesar de preencherem os requisitos legais, nem que seja por razões de ética pessoal, por benefício desproporcionado face aos demais residentes. A lei não assume que todas as pessoas que passam a residir em Portugal (preenchendo os requisitos do RNH), o fazem, como conditio sine qua non, apenas ou substancialmente por razões fiscais, para acederem a esse estatuto tributário.
4. Para a Sentença, o impulso do contribuinte descrito no art. 16.º, n.º 10, do CIRS seria algo meramente declarativo, no limite apenas para efeitos estatísticos. Mas isso não quadra com a autonomia dessa declaração face à prévia inscrição como residente. Se a lei fiscal exige duas declarações autónomas (como residente fiscal e como RNH), não pode o intérprete chegar a um resultado que retira qualquer efeito útil a uma delas; para isso, o legislador teria apenas indicado a necessidade de uma só declaração, que conteria a ulterior – sendo automáticos os efeitos.
5. Na minha opinião, o requerente enganou-se ao não exercer a opção para se assumir como RNH, como aliás confessa nas suas peças processuais: julgava que esse estatuto decorreria automaticamente da sua inscrição como residente fiscal em Portugal. Logo, os atos impugnados são legais pois ele não é um RNH. Questão diversa, mas conexa, é a de saber se poderia contestar o erro na sua opção, cometido aquando da sua entrada em Portugal – mas isso é um tema a ser decidido na ação administrativa especial (em curso), que não interfere com os atos impugnados, pois até essa decisão, o sujeito não é um RNH e por isso são legais os atos impugnados. Mas, evidentemente, se a ação administrativa especial viesse a aceitar a inscrição como RNH desde a entrada em Portugal, então a AT, em execução dessa sentença, devolveria as quantias liquidadas em excesso (fruto desse caso julgado).
6. Por fim, entendo que o sujeito passivo nunca teria direito a juros indemnizatórios, pois deu causa à ação (não preencheu as declarações de IRS [foi um incumpridor] e não solicitou a sua inscrição como RNH) e a AT atuou com base numa interpretação legal (na minha opinião), mas pelo menos plausível e coerente da lei fiscal, neste enquadramento de incumprimento do sujeito passivo – e por isso, entendo que não existe, neste caso, um erro imputável aos serviços da AT de que tenha resultado o pagamento de imposto superior ao devido.
4 de outubro de 2023
Tomás Cantista Tavares
[1] Para efeitos de impugnação contenciosa, é equiparável à decisão da reclamação graciosa ou do pedido de revisão oficiosa o respetivo indeferimento tácito formado pelo decurso do prazo de 4 meses sem ser proferida a decisão final, nos termos dos n.ºs 1 e 5 do artigo 57.º da LGT, sendo esse indeferimento tácito também suscetível de impugnação, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT.
Assim, resulta do artigo 10.º n.º 1, alínea a) do RJAT e da sua remissão para o artigo 102.º do CPPT que o prazo de 90 dias para impugnar atos de liquidação, nos casos em que é apresentada reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa, se conta da notificação da respetiva decisão ou da formação de indeferimento tácito.
[2] Por despacho do Presidente do Conselho Deontológico de 21-4-2023 (junto aos autos) o árbitro adjunto Tomás Cantista Tavares substituiu o árbitro inicialmente designado que, fundadamente, renunciou às funções.
[3] O Tribunal Constitucional decidiu “não julgar inconstitucional a interpretação normativa retirada do artigo 54º, CPPT, com o sentido de que a não impugnação judicial de atos de indeferimento de pedidos de reconhecimento do estatuto de residente não habitual impede a impugnação judicial das decisões finais de liquidação do imposto com fundamento em vícios daqueles (...)”
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