Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 153/2023-T
Data da decisão: 2023-10-27  IMI  
Valor do pedido: € 48.409,36
Tema: IMI e AIMI - terreno para construção – valor patrimonial tributário.
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Sumário

  1. Não é possível invocar na impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação, vícios inerentes ao ato de fixação do valor patrimonial do imóvel que lhe serviu de base tributável.
  2. Deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

O árbitro Paulo Ferreira Alves designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 23-05-2023, decide o seguinte:

 

            I.         Relatório

 

A... LDA., com o número de identificação fiscal português..., com sede em Rua do..., nº ..., ... - ... Lisboa, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral (“ppa”), nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e no artigo 10.º, ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação vigente.

A Requerente pretende a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos atos tributários do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), n.º 2017..., 2017..., 2017..., 2018..., 2018... e 2018... referentes aos anos de 2017, 2018, e do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”) n.º 2018 ... e 2019 ..., referentes aos anos de 2017, 2018, no montante global de € 48.409,36, bem como a anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa n.º ...2021... deduzida contra estes atos tributários.

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.

Em 14 de Março de 2023, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e notificada a AT.

De acordo com o preceituado nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o ora árbitro para formar o Tribunal Arbitral Singular, que comunicou a aceitação do encargo. As Partes, notificadas dessa designação não manifestaram vontade de a recusar.

O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 23 de Maio de 2023.

Em 3 de Julho de 2023, a Requerida foi notificada para apresentação da sua Resposta, não tendo apresentado resposta no prazo de 30 dias previsto no artigo 17.º do RJAT,  defendendo-se por impugnação, e juntou aos autos o processo administrativo (“PA”).

Por despacho de 12 de Setembro de 2023, foi dispensada a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, as Partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, bem como foi fixado o prazo para a prolação da decisão. A Requerente apresentou as suas alegações em 15-09-2023.

Posição da Requerente

A Requerente formula a sua pretensão arbitral da seguinte forma:

  1. Na determinação do valor patrimonial tributário (VPT) do terreno para construção inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...da freguesia ... ..., ... e ..., foi aplicada integralmente a fórmula matemática consagrada no artigo 382 do CIMI e a majoração prevista no artigo 392 do mesmo código, resultando no VPT de 5.449.770,00€.
  2. No regime legal vigente (2017 a 2020), na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tinha aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38Q do CIMI nem a majoração prevista no artigo 39.º do mesmo código, por existirem regras especificas, previstas no artigo 45.º do CIMI
  3. Por seu lado, o artigo 38.º do código do IMI estabelece uma fórmula geral de avaliação dos prédios urbanos, na qual são especificamente considerados, designadamente, os coeficientes de afetação, de localização, de qualidade e conforto, que contribuem, em regra, para um aumento do VPT.
  4. Para a determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção o legislador consagrou a regra especifica constante do supra referido artigo 45 do CIMI e não outra, onde se tem em conta o valor da área de implantação do edifício a  construir e o valor do terreno adjacente a implantação bem como as características de acessibilidade, proximidade, serviços e localização descritas no n.º 3 do artigo 42, tendo em conta o projeto de construção aprovado, quando exista, e o disposto no n2 do artigo 45 do CIMI, mas não outras características ou coeficientes.
  5. Mais sustenta a Requerente, que por outro lado, há, ainda, que considerar o disposto no artigo 392 do CIMI, então com a epígrafe "valor base dos prédios edificados" o qual, na redação vigente à data dos fatos, dispunha: 1 - 0 valor base dos prédios edificados {Ve) corresponde ao valor medio de construção, por metro quadrado, adicionado do valor do metro quadrado do terreno de implantação fixado em 25% daquele valor.
  6. É inequívoco que, ao tempo, esta norma apenas abrangia prédios edificados, sendo que o artigo 45.2 do CIMI, que estabelece as regras da determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, na redação então vigente, não remetia para o artigo 39.2 nem continha qualquer alusão ao «valor base dos prédios edificados», pelo que resulta ilegal a consideracao da "majoração" prevista no artigo 392 do CIMI no calculo dos VPT ora em causa.
  7. Assim, o VPT do terreno para construção, determinado de acordo com a jurisprudência referida e já aceite pela AT, reduziu-se em cerca de 62%, conforme quadro:

 

  1. Sustenta a Requerente, que verificando-se injustiça grave e not6ria nas liquidações referidas no Pedido de Revisão Oficiosa, pedido este indeferido pela AT, há que determinar a revisão da matéria tributável com fundamento em injustiça grave ou not6ria, nos termos dos n.º4 e 5 do artigo 78.º da LGT, uma vez que, estão verificados todos os requisites de que depende a revisão da matéria tributável, pelo que em vez do indeferimento do Pedido de Revisão Oficiosa, a AT deveria ter efetuado a revisão e anulado parcialmente as liquidações de IMI e AIMI, integradas pelas 6 prestações de IMI referidas no ponto 2 e, pelas 2 prestações de AIMI referidas no ponto 4 constantes das respetivas notas de cobrança.
  2. Termina a Requerente Nestes termos e nos melhores de direito aplicável, requer-se a que seja declarada a ilegalidade da decisão de indeferimento do Pedido de Revisão Oficiosa proferida pela Autoridade Tributaria, que teve como objeto os actos de liquidação de IMI referentes ao ano de 2017 e 2018 e de AIMI respeitante aos anos de 2018 e 2019 e, consequentemente, deverão os actos tributários das respetivas liquidações ser anulados parcialmente com base no supra alegado e julgados procedentes por provados os aludidos pedidos de revisão oficiosa, decretando-se a sua revisão oficiosa, com todas as legais  consequências. Mais requer que a Administração Tributaria restitua parcialmente as Liquidações tributarias supra indicadas, cujo imposto foi pago indevidamente em excesso pelo SP, calculado no montante global de €48.409,63

 

Posição da Requerida

A Requerida apresentou a sua Resposta, sustentando o seguinte:

  1. A Requerente pretende a anulação do ato impugnado com fundamento em vícios, não do ato de liquidação, mas sim dos atos que fixaram o  VPT.
  2. A presente ação não é nem fundamentada em qualquer vício dos atos de liquidação ou da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
  3. Aos atos impugnados não é imputado qualquer vício específico da operação de liquidação ou do seu procedimento,
  4. O que está em causa, ou seja, o que a Requerente contesta é, apenas e só, o ato destacável de fixação do VPT e não o ato de liquidação.
  5. Acontece que os vícios do ato que definiu o valor patrimonial tributário (VPT) não são suscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo.
  6. Nos termos da mais recente jurisprudência consolidada   do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 23.02.2023 no processo n.º 102/22.2BALSB   eventuais vícios próprios e exclusivos do VPT são insuscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo.
  7. Uma vez que os vícios do ato que definiu o valor patrimonial tributário (VPT) não são suscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo, pois têm a força jurídica de caso julgado.
  8. A Requerida, impugna por infundado todo o aduzido no pedido de pronúncia arbitral que contrarie todo o exposto, devendo decidir-se a final que os atos impugnados não padecem dos víciosque lhe foram assacados nem de nenhuns outros.
  9. Conclui a Requerida, que deve presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos.

 

  1. Saneamento

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo dirigido à anulação parcial dos atos tributários do Imposto Municipal sobre Imóveis (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do CPPT, a contar do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa deduzida contra os atos tributários impugnados, apresentado em 17 de Dezembro de 2021 e foi a Requerente notificada da decisão final de indeferimento do pedido de revisão oficiosa em 17 de Janeiro de 2023.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

É admissível a cumulação de pedidos relativos a diferentes atos, anos e Impostos, tendo em conta que estão em discussão as mesmas circunstâncias de facto e a interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito, conforme previsto no artigo 3.º, n.º 1 do RJAT.

Não foram identificadas nulidades ou questões que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

 

  1. Fundamentação de Facto
  1. Factos  Provados

Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam por provados:

  1. A Requerente foi notificada dos seguintes atos tributários de liquidação de IMI (cf. Documento 2 da PPA):

 

  1. A Requerente foi notificada dos seguintes atos tributários de liquidação de AIMI (cf. Documento 2 da PPA):

 

  1. A Requerente procedeu ao pagamento integral do imposto. (cf. Documento 2 da PPA.)
  2. As liquidações de IMI e AIMI tiveram por base, para efeitos de determinação do valor tributável e do correspondente montante de IMI e AIMI a pagar pela Requerente, o valor patrimonial tributário de um terreno para construção detido pela Requerente, a qual considerava a aplicação de coeficientes de (i) localização, (ii) de afetação e / ou (iii) de qualidade e conforto, bem como a aplicação da majoração de 25% relativa ao valor do metro quadrado do terreno de implantação constante no n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI. cf. Documentos 2 a 4  da PPA.
  3. A Requerente submeteu em 17 de Dezembro de 2021, o pedido de revisão oficiosa contra os atos de liquidação referidos, ao qual foi atribuído o n.º ...2021... . cf. Documento 1 da PPA.
  4. Foi a Requerente notificada da decisão final de indeferimento do pedido de revisão oficiosa em 17 de Janeiro de 2023. cf. Documento 1 da PPA.

 

2.         Motivação da Decisão da Matéria de Facto

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do Código de Processo e Procedimento Tributário (“CPPT”), 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre todas as alegações das Partes, mas apenas sobre as questões de facto necessárias para a decisão a proferir.

No que se refere aos factos provados, a convicção do árbitro fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos pelas Partes e nas posições por estas assumidas em relação aos factos, que é consensual. A questão a decidir é, pois, unicamente de direito.

Não existem factos alegados com relevância para a apreciação da causa que devam considerar-se não provados.

 

  1. Do Mérito

O PPA tem por objeto imediato os atos de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentada pela Requerente em 17 de Dezembro de 2021, ao abrigo dos artigos.º 78.º e seguintes do LGT, e por objeto mediato as Liquidações Contestadas.

A Requerente, alega em suma que as liquidações de IMI e AMI, para efeitos de determinação do valor tributável, foi fixado segundo a fórmula erroneamente adotada à data pela AT, a qual considerava a aplicação de coeficientes de (i) localização, (ii) de afetação e / ou (iii) de qualidade e conforto, bem como a aplicação da majoração de 25% relativa ao valor do metro quadrado do terreno de implantação constante no n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI.

A Requerida, contra-alegou, no sentido de que a Requerente pretende a anulação do ato impugnado com fundamento em vícios, não do ato de liquidação, mas sim dos atos que fixaram o Valor patrimonial Tributário (VPT), e que os vícios do ato que definiu o valor patrimonial tributário (VPT) não são suscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo.

Assim, passando a apreciar as questões suscitadas.

 Em primeiro lugar, atentemos, se deixando um contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o VPT no momento da sua fixação, poderá ainda assim arguir a ilegalidade das liquidações de IMI com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo dos VPT’s que serviram de base às liquidações, e em segundo lugar, se podendo fazê-lo, existe um erro na avaliação do VPTs.

Neste contexto, foi recentemente, proferido o acórdão pelo STA, no âmbito de um recurso para uniformização de jurisprudência, o qual se pronunciou sobre a questão de saber se se poder arguir a ilegalidade das liquidações de AIMI com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo dos VPT’s que serviram de base às liquidações.

No acórdão de 23.02.2023, proferido no processo 0102/22.2BALSB, o STA decidiu, no mesmo sentido em que já se tinha pronunciado anteriormente, de que não é possível invocar, na impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação, vícios inerentes ao ato de fixação do valor patrimonial do imóvel que lhe serviu de base tributável (cf. entre outros, acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13/07/2016, proferido no processo 0173/16, consultável em www.dgsi.pt).

Neste sentido, por ser de relevo para os autos, veja-se a decisão Arbitral proferida no processo 512/2022-T, designadamente o resumo da posição do STA, que subscrevemos e merece ser aqui transcrito:

“- vigora no contencioso tributário o princípio da impugnação unitária, segundo o qual só há lugar a impugnação contenciosa do ato final do procedimento (cf. artigos 66.º da LGT e 54.º do CPPT).

- o princípio da impugnação unitária tem duas exceções, referentes a casos em que é admitida a impugnação imediata dos atos interlocutórios. Tal sucede (i) “quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte”, e (ii) quando “exista disposição expressa em sentido diferente”, ou seja, quando exista lei que admita expressamente a impugnação imediata do ato interlocutório;

- a avaliação direta é um dos casos em que o legislador afastou o princípio da impugnação unitária e admitiu a impugnação imediata do ato de avaliação;
- no que respeita, em particular, aos atos de fixação de valores patrimoniais, rege o artigo 134.º do CPPT, em consonância com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 86.º da LGT, que admite a sua impugnação com fundamento em qualquer ilegalidade (n.º 1), não tendo a impugnação efeito suspensivo, e só podendo ter lugar depois de esgotados os meios graciosos previstos no procedimento de avaliação (n.º 7);

- o procedimento de determinação do valor patrimonial tributário (ato de fixação de valores patrimoniais – artigos 37.º a 46.º e 71.º a 77.º, do Código do IMI) é uma espécie de procedimento de avaliação direta, prevendo o Código do IMI um expediente especial de reação contra as ilegalidades da avaliação: quando o sujeito passivo não concorda com o resultado da primeira avaliação, pode requerer uma segunda avaliação, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 76.º do Código do IMI. E do resultado desta segunda avaliação cabe impugnação judicial, tal como prevê o artigo 77.º do mesmo Código.

- o disposto nestes dois artigos 76.º e 77.º do Código do IMI deve ser interpretado em conjugação com o disposto no artigo 134.º do CPPT e no artigo 86.º, n.º 2, da LGT: a necessidade de esgotamento dos meios graciosos como condição de impugnação do valor fixado através de avaliação direta, reiterada nas diferentes disposições legais, evidencia que a segunda avaliação não é, para efeitos de impugnação, uma mera faculdade.
- prevendo a lei um modo especial de reação contra as ilegalidades do ato de fixação do valor patrimonial tributário, proferido em procedimento tributário autónomo, as mesmas não podem servir de fundamento à impugnação da liquidação do imposto que tiver por base o resultado dessa avaliação.

 - o ato que fixa o valor patrimonial tributário encerra um procedimento autónomo de avaliação que servirá de base a uma pluralidade de atos de liquidação que venham a ser praticados enquanto o valor dela resultante se mantiver, designadamente às liquidações de impostos sobre o património (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14/10/2020, proferido no processo 050/11.1BEAVR, consultável em www.dgsi.pt).

- o mesmo é dizer que para além de a impugnação judicial do ato de fixação do valor patrimonial depender do esgotamento dos meios graciosos, a não impugnação do ato preclude que, em sede de impugnação judicial do ato de liquidação do imposto, possa ser questionada a quantificação do valor fixado. Não tendo sido impugnado judicialmente o resultado da segunda avaliação, nos termos previstos na lei, forma-se caso decidido ou resolvido sobre o valor da avaliação, pelo que esta não pode voltar a ser discutida (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12/01/2011, proferido no processo 0758/10).”

Seguindo esta fundamentação, refira-se a conclusão proferida no Acórdão Uniformizado suprarreferido, bastante esclarecedor para a apreciação da questão submetida a este processo: 

Em face do que fica dito é de concluir que deixando o contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o valor patrimonial tributário nos termos previstos nos artigos 76.º e 77.º do Código do IMI, não pode arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável.”.

Face à jurisprudência citada, entende o Tribunal Arbitral que a Requerente ao não ter arguido a ilegalidade do VPT no momento da sua fixação, não lhe é lícito posteriormente vir arguir a ilegalidade da liquidação com base em fundamentos que se relacionam com a avaliação e posterior fixação do VPT.

Pelo anteriormente exposto, para as liquidações in casu não se verifica qualquer erro no ato de liquidação, porquanto foram calculados com base no VPT constante na matriz predial.

Em consequência, improcede o pedido da Requerente.

Do reembolso do IMI indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios

Peticiona ainda a Requerente, o reembolso do IMI indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

Ora, atendendo à improcedência do pedido principal, improcede igualmente o presente pedido.

Questões de conhecimento prejudicado

Na sentença a proferir deve o juiz pronunciar-se sobre todas as questões que deva apreciar, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT). Contudo as questões sobre que recaem os poderes de cognição do tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.

Em face da solução dada, de improcedência do pedido da Requerente, de arguir a ilegalidade da liquidação com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo do valor patrimonial tributário que lhe serviu de matéria coletável, fica assim prejudicado o conhecimento das restantes questões incluídas no pedido de pronúncia arbitral quanto aos vícios na avaliação e determinação dos VPTs dos terrenos para construção, concretamente, se a AT aplicou uma fórmula de cálculo ilegal na qual foram considerados, indevidamente, os coeficientes multiplicadores do VPT e a majoração constante do artigo 39.º, n.º 1, do Código do IMI.

  1. Decisão

De harmonia com o supra exposto, o Tribunal Arbitral decide julgar totalmente improcedente o pedido de pronuncia arbitral e, em consequência:

  1. Absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido;
  2. Condenar a Requente no pagamento integral das custas do processo.

VI.      Valor do Processo

            Fixa-se ao processo o valor de 48.409,36 (quarenta e oito mil, quatrocentos e nove euros e trinta e seis cêntimos), indicado pela Requerente, respeitante ao montante das liquidações cuja anulação pretende (valor da utilidade económica do pedido), e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

VII.     Custas

            Custas no montante de € 2.142.00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), a suportar integralmente pela Requerente, por decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT.

Notifiquem-se as Partes e, bem assim, o Ministério Público para efeitos do disposto no artigo 280.º, n.º 3 da CRP e no artigo 72.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei Orgânica do Tribunal Constitucional).

Lisboa, 27 de Setembro de 2023

O árbitro,

 

 

Paulo Ferreira Alves