SUMÁRIO:
1. A revisão oficiosa de actos tributários deve ser concedida, quando exista erro imputável aos serviços e é solicitada no prazo de 4 anos, após a retenção ilegal de IRC.
2. Existe erro imputável aos serviços, quando não é deferida a revisão de acto tributário, que consistiu na retenção de IRC pelos dividendos distribuídos a um Organismo de Investimento Colectivo (OIC) luxemburguês, quando essa retenção não é feita a OIC português, em aplicação do artº. 22º. do EBF, em violação do princípio da livre circulação de capitais, previsto no artº. 63º. do TFUE e entendimento unanime do TJUE.
3. São devidos juros compensatórios com a devolução das quantias retidas, mas a sua contagem só começa no dia em que se completa um ano sobre o pedido de revisão oficiosa, nos termos do artº. 43º., nº. 3, al. c) da LGT.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Fernando Borges de Araújo, como Presidente, Marta Vicente e José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora, como vogais, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 2 de Novembro de 2022, proferem a presente decisão arbitral, nos termos seguintes:
1. Relatório:
A..., organismo de investimento colectivo em valores mobiliários (“OIC”) constituído e a operar no Grão-Ducado do Luxemburgo sob supervisão da Commission de Surveillance du Secteur Financier com o n.º ... e com o número de Registo Comercial no Grão-Ducado do Luxemburgo..., contribuinte fiscal português n.º ... (doravante “Requerente”), representado por B... GMBH, na qualidade de entidade gestora, sociedade de direito alemão com sede em ..., ..., ... ..., República Federal da Alemanha, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa por si apresentado a 30 de Dezembro de 2021,
Veio, ao abrigo do disposto nos artigos 57.º, n.ºs 1 e 5, e 95.º, n.º 2, alínea d), da Lei Geral Tributária (“LGT”), 97.º, n.º 1, alínea a), 99.º, alínea a), e 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 137.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“CIRC”), 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), requerer a Constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa em referência e, bem assim, das liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”) por retenção na fonte ocorridas em 2018, 2019 e 2020, aquando da colocação à disposição do Requerente de dividendos decorrentes de participações detidas em sociedades residentes em território português.
1.1 Tramitação e constituição do Tribunal Arbitral:
O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 26/08/22 e aceite no mesmo dia, nos termos regulamentares aplicáveis, tendo o Requerente optado pela não designação de árbitro
Por despacho de 14/10/2022 do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou para árbitros os ora subscritores, tendo comunicado essa designação no mesmo dia às partes e não tendo havido reclamação da mesma, em 02/11/2022, foi comunicada às partes a constituição do Tribunal Arbitral;
A 9/12/2022, a Requerida apresentou a sua Resposta, mas não fez juntar o processo administrativo (PA). tendo nessa mesma data, o CAAD notificado o Requerente da Resposta da AT.
Por despacho arbitral de 17/12/22, foi dispensada a reunião a que se refere o artº. 18º. do RJAT e notificadas as partes para alegações no prazo de 10 dias sucessivos, o que ambas as partes fizeram, tendo apresentado as suas alegações.
Mais foi o Requerente notificado para proceder ao pagamento do remanescente da taxa de arbitragem até à data de ser proferida a decisão final, o que já fez em 6/3/2023, bem como foram as partes convidadas a enviar ao CAAD as suas peças processuais em formato editável (Word), com vista a facilitar e abreviar a elaboração da decisão final.
Por despacho de 19/4/23 foi prorrogado o prazo para proferir a decisão por mais 2 meses a partir do fim do prazo em curso ao tempo e até 2 de Julho de 2023.
1.2 – Posição do Requerente
O Requerente, alegando ser um OIC (organismo de investimento colectivo), constituído e a operar no Grão-Ducado do Luxemburgo entende que, ao abrigo da Loi de 17 décembre 2010 concernant les organismes de placement collectif, que transpõe para a ordem jurídica luxemburguesa a Directiva 2009/65/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, recebeu recebido em 2018, 2019 e 2020, dividendos no montante total de EUR 617.894,05, através dos sub-fundos C... e D... FUND, os quais foram distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português e aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 154.473,51.
Assim, em 2018, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 105.812,90, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante de EUR 26.453,23, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
E… SGPS SA
|
30-05-2018
|
20.370,00
|
5.092,50
|
15.277,50
|
F…
|
19-06-2018
|
22.599,00
|
5.649,75
|
16.949,25
|
G…
|
20-06-2018
|
62.843,90
|
15.710,98
|
47.132,93
|
|
TOTAL:
|
105.812,90
|
26.453,23
|
79.359,68
|
Do mesmo modo, em 2019, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 330.707,83, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 82.676,96, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
F…
|
24-04-2019
|
34.397,83
|
8.599,46
|
25.798,37
|
SG…
|
29-04-2019
|
122.880,00
|
30.720,00
|
92.160,00
|
E… SGPS SA
|
30-05-2019
|
24.255,00
|
6.063,75
|
18.191,25
|
E… SGPS SA
|
30-05-2019
|
77.175,00
|
19.293,75
|
57.881,25
|
H… SGPS SA
|
26-06-2019
|
72.000,00
|
18.000,00
|
54.000,00
|
|
TOTAL:
|
330.707,83
|
82.676,96
|
248.030,87
|
Também em 2020, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 181.373,32, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 136.029,99, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
F…
|
09-01-2020
|
21.174,86
|
5.293,72
|
15.881,15
|
F…
|
09-01-2020
|
55.760,00
|
13.940,00
|
41.820,00
|
H… SGPS SA
|
15-05-2020
|
21.000,00
|
5.250,00
|
15.750,00
|
E… SGPS SA
|
15-05-2020
|
26.622,50
|
6.655,63
|
19.966,88
|
G…
|
15-06-2020
|
31.250,00
|
7.812,50
|
23.437,50
|
F…
|
10-12-2020
|
25.565,96
|
6.391,49
|
19.174,47
|
|
TOTAL:
|
181.373,32
|
45.343,33
|
136.029,99
|
Apesar das retenções na fonte de IRC referentes aos dividendos auferidos pelo Requerente em 2018, 2019 e 2020 terem sido efectuadas e entregues junto dos cofres da Fazenda Pública, o Requerente não obteve qualquer crédito de imposto no seu Estado de residência relativo às retenções na fonte objecto do presente pedido de pronúncia arbitral, seja ao abrigo da Convenção para Evitar a Dupla Tributação (CEDT) entre Portugal e o Luxemburgo, seja ao abrigo da lei interna do Grão-Ducado do Luxemburgo
Entendendo que é ilegal a tributação por retenção na fonte de IRC que incidiu sobre os dividendos decorrentes de participações detidas em sociedades residentes em território português, no dia 30 de Dezembro de 2021, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC acima identificadas, referentes aos períodos de 2018, 2019 e 2020, abrigo do disposto nos artigos 78.º, n.º 1, da LGT e 137.º do CIRC, sustentando que os dividendos de fonte portuguesa por si auferidos não devem ser tributados em sede de IRC, ao abrigo do disposto no artigo 22.º, n.os 1, 3 e 10, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), sob pena de haver uma discriminação injustificada entre OIC residentes e não residentes em Portugal, contrária ao princípio da livre circulação de capitais ínsito no artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) e, consequentemente, ao princípio do primado do Direito da União Europeia consagrado no artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”).
Por isso, pretende, pelo presente PPA, que seja declarada a ilegalidade das liquidações de IRC por retenção na fonte em referência, por vício de violação de lei, com a restituição das importâncias indevidamente retidas na fonte a título de IRC, nos anos de 2018, de 2019 e de 2020, acrescidas de juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, a computar sobre o montante de EUR 154.473,51, desde o indeferimento tácito da revisão oficiosa que antecedeu os presentes autos – i.e. 30 de Abril de 2022 –, até efectivo e integral pagamento, com custas pela Requerida.
1.3 – Posição da Requerida
Na sua resposta, a Requerida entende que o Requerente descreve o regime fiscal dos organismos de investimento coletivo (OIC), que se constituem e operam de acordo com a legislação nacional, só recorrendo para o efeito, aos normativos do Código do IRC e artigo 22.º do EBF, mas que tal não pode ser assim.
E isto, porque essa norma do artº. 22º. do EBF, que indubitavelmente impede as retenções na fonte dos OIC não residentes, deve ser interpretada em conjunto com as restantes normas que oneram os OIC residentes, para se evitar discriminação.
Assim, aponta dois aspetos de grande relevância para a definição completa do quadro fiscal dos OIC, a que, no seu entender, importa dar o devido relevo.
Por um lado, a opção legislativa de “aliviar” estes sujeitos passivos da tributação em IRC, mediante a subtração à base tributável dos rendimentos típicos dos OIC, isto é, dos rendimentos de capitais (artigo 5.º do Código do IRS), dos rendimentos prediais (artigo 8.º do Código do IRS) e das mais-valias (artigo 10.º do Código do IRS) conforme previsto no n.º 3 do artigo 22.º do EBF, e ainda prevendo a isenção de derrama municipal e de derrama estadual, nos termos do n.º 6 do artigo 22.º do EBF, deslocando a tributação para a esfera do Imposto do Selo, a que estão sujeitos apenas as OIC residentes e constantes da TGIS, a Verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa 0,0125%, sobre o valor líquido global dos restantes OIC, sendo que, neste caso, a base tributável pode incluir dividendos distribuídos.
Por outro lado, a tributação incidente sobre os dividendos, porquanto, além de não integrarem a matéria coletável do IRC, também beneficiam da isenção de retenção na fonte (cf. n.º 10 do artigo 22.º do EBF), mas as OIC residentes estão sujeitas a taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC, prevista no n.º 8 do artigo 22.º do EBF,
Conclui a Requerida que não é possível concluir que os regimes fiscais aplicáveis aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional e dos OIC constituídos em Luxemburgo, não são genericamente comparáveis, pois que a tributação dos primeiros compreende uma tributação em IRC sobre um lucro tributável que integra rendimentos marginais e repousa sobretudo no Imposto do Selo, ao passo que, aparentemente, os segundos estavam isentos de tributação no imposto sobre o rendimento e, aparentemente, também de outros impostos.
Por isso, entende a Requerida que não compete à Administração Tributária avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, não podendo aceitar de forma directa e automática as orientações interpretativas do TJUE, quando estas não têm, na sua origem, a apreciação de compatibilidade entre as disposições do direito interno português e o direito europeu, estando a administração tributária não pode deixar de aplicar as normas legais que a vinculam, porquanto está a mesma adstrita ao princípio da legalidade positivada.
E se é certo que se encontra consagrada no artigo 63.º do TFUE, a liberdade de circulação de capitais em relação íntima com as demais liberdades fundamentais, a saber, de circulação de pessoas, de estabelecimento e de prestação de serviços, diferenciando-se delas na medida em que sem estende a terceiros Estados, entende a Requerida que a liberdade de circulação de capitais implica a proibição de discriminação entre capitais do Estado-Membro e capitais provenientes de fora, pois Estados-Membros podem regular em alguma medida a circulação de capitais, mas não podem discriminar.
Por isso, para se avaliar se o tratamento fiscal aplicado aos dividendos obtidos em Portugal é menos vantajoso do que o tratamento fiscal atribuído aos dividendos obtidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e se tal diferenciação é suscetível de afetar o investimento em ações emitidas por sociedades residentes, teria de ser colocado em confronto o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, à taxa de 15%, e os impostos – IRC e Imposto do Selo - que incidem sobre os segundos, e que, em conjunto, podem, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos.
Acresce, segundo a Requerida, que a jurisprudência do TJUE não autoriza o intérprete a extrair a conclusão, em abstrato, de que a mera existência de uma retenção na fonte de IRC incidindo apenas sobre os dividendos pagos por uma sociedade residente a um Fundo de Investimento estabelecido noutro Estado-Membro constitui por si só uma restrição à livre circulação dos fluxos de capital no espaço europeu, sem que seja feita uma apreciação global do regime fiscal aplicável aos Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos em Portugal.
Torna-se necessário, segundo a Requerida, comparar a carga fiscal que onera uns e outros em relação ao mesmo tipo de investimentos e não basta olhar apenas o n.º 10 do artigo 22.º do EBF.
Porque, segundo a Requerida, para avaliar se da legislação nacional resulta um tratamento discriminatório dos fundos de investimento de outros Estados-Membros contrário ao TFUE, por constituir uma restrição à liberdade de circulação de capitais, a análise não pode cingir-se à consideração estrita das regras de retenção na fonte, há que atender à carga fiscal a que estão sujeitos os OIC’s abrangidos pelo artigo 22.º do EBF relativamente aos dividendos e às correspondentes ações, pois, só com esta visão global pode concluir-se com um mínimo de segurança que os fundos estrangeiros que investem em ações de sociedades residentes em Portugal são colocados numa situação mais desfavorável, pelo que defende que deve ser indeferido o presente PPA, com a improcedência do pedido de juros indemnizatórios.
2. Despacho saneador:
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são as legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
Não existem excepções, nulidades ou outras questões prévias de conhecimento oficioso, que cumpra conhecer.
3. Fundamentação de facto.
Considerando os articulados das partes, os documentos juntos e o processo administrativo, são considerados provados os factos que a seguir se indicam.
3.1 - Factos provados:
De acordo com a alegação das partes e dos documentos juntos e com interesse para a decisão final dos presentes autos, estão provados os seguintes factos:
a) O Requerente é um OIC, constituído e a operar no Grão-Ducado do Luxemburgo sob supervisão da Commission de Surveillance du Secteur Financier com o n.º ... e com o número de Registo Comercial no Grão- Ducado do Luxemburgo ..., ao abrigo da Loi du 17 décembre 2010 concernant les organismes de placement collectif, que transpõe para a ordem jurídica luxemburguesa a Directiva 2009/65/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns OIC – cfr. cópias da certidão emitida pela Commission de Surveillance du Secteur Financier ao abrigo do artigo 2.º do Regulamento UE n.º 584/2010, da Comissão, de 1 de Julho de 2010, dos estatutos do Requerente e dos prospectos do Requerente referentes a 2020 e 2021, juntas como documentos n.os 2, 3 e 4 respectivamente, e publicação do referido acto legislativo luxemburguês, disponível no sítio oficial na internet do Journal Officiel du Grand-Duché de Luxembourg, em http://legilux.public.lu/eli/etat/leg/loi/2010/12/17/n9/jo. (provado por acordo das partes)
b) Tendo sido constituído e operando ao abrigo da Directiva 2009/65/CE, o Requerente cumpre no seu Estado de residência e constituição exigências equivalentes às estabelecidas na legislação portuguesa que regula a actividade dos OIC, também em transposição da referida Directiva – i.e. a Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro. (provado por acordo das partes)
c) O Requerente é administrado pela sociedade de direito alemão B... GMBH. (provado pelos documentos 2 e 5 juntos com o PPA).
d) O Requerente encontra-se organizado em sub-fundos ou compartimentos patrimoniais autónomos, entre os quais, com relevância para os presentes autos, se encontram os seguintes:
-
C…;
-
D… (provado por acordo das partes)
e) Em 2018, 2019 e 2020, o Requerente recebeu dividendos no montante total de EUR 617.894,05, através dos sub-fundos C... e D..., os quais foram distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português e aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 154.473,51. (provado pelo documento 6 junto com o PPA)
f) Em 2018, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 105.812,90, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante de EUR 26.453,23, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
E… SGPS SA
|
30-05-2018
|
20.370,00
|
5.092,50
|
15.277,50
|
F…
|
19-06-2018
|
22.599,00
|
5.649,75
|
16.949,25
|
G…
|
20-06-2018
|
62.843,90
|
15.710,98
|
47.132,93
|
|
TOTAL:
|
105.812,90
|
26.453,23
|
79.359,68
|
– provado pelo documento n.º 6 junto pela PPA.
g) Em 2019, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 330.707,83, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 82.676,96, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
F…
|
24-04-2019
|
34.397,83
|
8.599,46
|
25.798,37
|
G…
|
29-04-2019
|
122.880,00
|
30.720,00
|
92.160,00
|
E… SGPS SA
|
30-05-2019
|
24.255,00
|
6.063,75
|
18.191,25
|
E… SGPS SA
|
30-05-2019
|
77.175,00
|
19.293,75
|
57.881,25
|
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
H… SGPS SA
|
26-06-2019
|
72.000,00
|
18.000,00
|
54.000,00
|
|
TOTAL:
|
330.707,83
|
82.676,96
|
248.030,87
|
– provado pelo documento n.º 6.
h) Em 2020, o Requerente auferiu dividendos distribuídos por sociedades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 181.373,32, os quais foram aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 136.029,99, nos seguintes termos:
Valores em EUR
ENTIDADE
|
DATA
|
DIVIDENDO BRUTO
|
RETENÇÃO NA FONTE
|
DIVIDENDO LÍQUIDO
|
F…
|
09-01-2020
|
21.174,86
|
5.293,72
|
15.881,15
|
F…
|
09-01-2020
|
55.760,00
|
13.940,00
|
41.820,00
|
H… SGPS SA
|
15-05-2020
|
21.000,00
|
5.250,00
|
15.750,00
|
E… SGPS SA
|
15-05-2020
|
26.622,50
|
6.655,63
|
19.966,88
|
G…
|
15-06-2020
|
31.250,00
|
7.812,50
|
23.437,50
|
F…
|
10-12-2020
|
25.565,96
|
6.391,49
|
19.174,47
|
|
TOTAL:
|
181.373,32
|
45.343,33
|
136.029,99
|
– provado pelo documento n.º 6.
i) As retenções na fonte de IRC referentes aos dividendos auferidos pelo Requerente em 2018, 2019 e 2020 foram efectuadas e entregues junto dos cofres da Fazenda Pública através das guias de retenção na fonte n.os ..., ..., ..., ..., ... e ..., pelo I..., pessoa colectiva com o número de identificação fiscal português ..., e, bem assim, através das guias de retenção na fonte n.os ..., ... e..., pelo J... PLC, pessoa colectiva com o número de identificação fiscal português ..., ambas na qualidade de entidades registadoras e depositárias de valores mobiliários, ao abrigo do artigo 94.º, n.º 7, do CIRC. – provado pelos documentos 7, 8 e 9 juntos com o PPA.
j) A 30 de Dezembro de 2021, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC por retenção na fonte ocorridas em 2018, 2019 e 2020, aquando da colocação à disposição do Requerente de dividendos decorrentes de participações detidas em sociedades residentes em território português.(provado pelo documento n.º 1 junto com o PPA).
k) Decorridos 4 meses sobre a data referida na alínea anterior, a Requerida não respondeu ao referido pedido de revisão oficiosa. (provado por acordo das partes).
l) O Requerente apresentou a 27-07-2022, o presente pedido de pronúncia no Tribunal Arbitral.
3.2 Factos não provados e fundamentação da matéria de facto considerada provada.
Não existem outros factos não provados com interesse para a decisão deste processo.
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente e no que consta do processo administrativo e também os factos que as partes estão de acordo em considerar provados, conforme resulta do por si alegado em sede de requerimento inicial e da resposta que lhe sucedeu.
4. Matéria de direito
4.1 - Questões a resolver:
Como questão a resolver temos o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa dos actos tributários referidos pelo Requerente.
Como questão atinente a esse pedido teremos antes de analisar a questão de fundo, ou seja, averiguar da legalidade das retenções na fonte de IRC feitas ao ora Requerente, caso se entenda como legítimo o recurso pelo Requerente à figura do pedido de revisão oficiosa dessas retenções que ele apelida de ilegais, se a mesma é tempestiva.
Com efeito, o Requerente podia ter impugnado essas retenções, nos prazos do artº. 102º. do CPPT, mas não o fez, vindo mais tarde a requerer a revisão dos diversos actos tributários das retenções na fonte de IRC.
4.2 – Da tempestividade do pedido de revisão oficiosa
Nos termos do artº. 78.º da Lei Geral Tributária (LGT) e sob a epígrafe “revisão dos actos tributários”, determina-se que:
|
1 - A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
2 - (Revogado.)
3 - A revisão dos actos tributários nos termos do n.º 1, independentemente de se tratar de erro material ou de direito, implica o respectivo reconhecimento devidamente fundamentado nos termos do n.º 1 do artigo anterior.
4 - O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.
5 - Para efeitos do número anterior, apenas se considera notória a injustiça ostensiva e inequívoca e grave a resultante de tributação manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade ou de que tenha resultado elevado prejuízo para a Fazenda Nacional.
6 - A revisão do acto tributário por motivo de duplicação de colecta pode efectuar-se, seja qual for o fundamento, no prazo de quatro anos.
7 - Interrompe o prazo da revisão oficiosa do acto tributário ou da matéria tributável o pedido do contribuinte dirigido ao órgão competente da administração tributária para a sua realização.
|
Deste modo, decorridos que estão os prazos de impugnação directa das liquidações por retenção na fonte de IRC feitas ao ora Requerente, veio este requerer a revisão desses actos tributários, ao abrigo do artº. 78º. da LGT.
Esse pedido de revisão ocorreu no prazo de 4 anos após as retenções na fonte consideradas ilegais, sendo que com essas retenções, o ora Requerente procedeu ainda que por meio de acção de terceiro ao pagamento do imposto exigido com essas retenções.
Acresce que essa revisão, ainda que só possa ocorrer por iniciativa da administração tributária, “embora o art. 78.° da LGT, no que concerne a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, se refira apenas à que tem lugar dentro do «prazo de reclamação administrativa» no n.º 6 do mesmo artigo (na redacção inicial, que é o n.º 7 na redacção vigente) faz-se referência a «pedido do contribuinte», para a realização da revisão oficiosa, o que revela que esta, apesar da impropriedade da designação como «oficiosa» pode ter subjacente também a iniciativa do contribuinte.
Idêntica referência é feita no n.º 1 do art. 49.° da LGT, que fala em «pedido de revisão oficiosa», e na alínea a) do n.º 4 do art. 86.° do CPPT, que refere a apresentação de «pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, com fundamento em erro imputável aos serviços»”. – Cfr. Diogo Leite Campos Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Comentada e anotada, 4ª. Edição, Lisboa, 2012, pág. 705.
Portanto, para se decidir da tempestividade do pedido de revisão oficiosa dos actos tributários impugnados, tem de haver a pronúncia sobre a legalidade dos mesmos e, no caso de serem ilegais, se se pode atribuir essa ilegalidade a erro imputável aos serviços.
4.3 – Da eventual ilegalidade das retenções realizadas:
1. O Requerente, alegando ser um OIC (organismo de investimento colectivo), constituído e a operar no Grão-Ducado do Luxemburgo fez investimentos em várias sociedades comerciais com residência fiscal em território português e aí sujeitos a tributação em sede de IRC, através de retenção na fonte liberatória, no montante total de EUR 154.473,51, conforme quadros e documentos que apresentou e que não foram impugnados
Também ficou demonstrado que essas retenções na fonte de IRC referentes aos dividendos auferidos pelo Requerente em 2018, 2019 e 2020, uma vez efectuadas, o seu valor foi entregue nos cofres da Fazenda Pública, não se tendo provado se obteve ou não qualquer crédito de imposto no seu Estado de residência relativo às retenções na fonte objecto do presente pedido de pronúncia arbitral, o que se revela irrelevante.
É que o Requerente entende que é ilegal a tributação por retenção na fonte de IRC que incidiu sobre os dividendos decorrentes de participações detidas em sociedades residentes em território português, referentes aos períodos de 2018, 2019 e 2020, pelo que, no dia 30 de Dezembro de 2021, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC acima identificadas abrigo do disposto nos artigos 78.º, n.º 1, da LGT e 137.º do CIRC, sustentando que os dividendos de fonte portuguesa por si auferidos não devem ser tributados em sede de IRC, ao abrigo do disposto no artigo 22.º, n.os 1, 3 e 10, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), sob pena de haver uma discriminação injustificada entre OIC residentes e não residentes em Portugal, contrária ao princípio da livre circulação de capitais ínsito no artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) e, consequentemente, ao princípio do primado do Direito da União Europeia consagrado no artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”).
Por isso, pretende, pelo presente PPA, que seja declarada a ilegalidade das liquidações de IRC por retenção na fonte em referência, por vício de violação de lei, com a restituição das importâncias indevidamente retidas na fonte a título de IRC, nos anos de 2018, de 2019 e de 2020, acrescidas de juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, a computar sobre o montante de EUR 154.473,51, desde o indeferimento tácito da revisão oficiosa que antecedeu os presentes autos – i.e., 30 de Abril de 2022 –, até efectivo e integral pagamento, com custas pela Requerida
Por sua vez, a Requerida pugna pela improcedência da pretensão do Requerente na sua totalidade, pois entende que o Requerente restringe o regime fiscal dos organismos de investimento coletivo (OIC), que se constituem e operam de acordo com a legislação nacional, só recorrendo para o efeito, aos normativos do Código do IRC e artigo 22.º do EBF, mas que tal não pode ser assim.
E isto, porque essa norma do artº. 22º. do EBF, que, mesmo na opinião da Requerida, indubitavelmente impede as retenções na fonte dos OIC não residentes, deve ser interpretada em conjunto com as restantes normas que oneram os OIC residentes, para se evitar discriminação.
Assim, aponta dois aspetos de grande relevância para a definição completa do quadro fiscal dos OIC, a que, no seu entender, importa dar o devido relevo.
Por um lado, a opção legislativa de “aliviar” estes sujeitos passivos da tributação em IRC, mediante a subtração à base tributável dos rendimentos típicos dos OIC, isto é, dos rendimentos de capitais (artigo 5.º do Código do IRS), dos rendimentos prediais (artigo 8.º do Código do IRS) e das mais-valias (artigo 10.º do Código do IRS) conforme previsto no n.º 3 do artigo 22.º do EBF, e ainda prevendo a isenção de derrama municipal e de derrama estadual, nos termos do n.º 6 do artigo 22.º do EBF, deslocando a tributação para a esfera do Imposto do Selo, a que estão sujeitos apenas as OIC residentes e constantes da TGIS, a Verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa 0,0125%, sobre o valor líquido global dos restantes OIC, sendo que, neste caso, a base tributável pode incluir dividendos distribuídos.
Por outro lado, a tributação incidente sobre os dividendos, porquanto, além de não integrarem a matéria coletável do IRC, também beneficiam da isenção de retenção na fonte (cf. n.º 10 do artigo 22.º do EBF), mas as OIC residentes estão sujeitas a taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC, prevista no n.º 8 do artigo 22.º do EBF,
Conclui a Requerida que não é possível concluir que os regimes fiscais aplicáveis aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional e dos OIC constituídos em Luxemburgo, não são genericamente comparáveis, pois que a tributação dos primeiros compreende uma tributação em IRC sobre um lucro tributável que integra rendimentos marginais e repousa sobretudo no Imposto do Selo, ao passo que, aparentemente, os segundos estavam isentos de tributação no imposto sobre o rendimento e, aparentemente, também de outros impostos.
Além disso, entende a Requerida que não compete à Administração Tributária avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, não podendo aceitar de forma directa e automática as orientações interpretativas do TJUE, quando estas não têm, na sua origem, a apreciação de compatibilidade entre as disposições do direito interno português e o direito europeu, estando a administração tributária não pode deixar de aplicar as normas legais que a vinculam, porquanto está a mesma adstrita ao princípio da legalidade positivada.
E se é certo que se encontra consagrada no artigo 63.º do TFUE, a liberdade de circulação de capitais em relação íntima com as demais liberdades fundamentais, a saber, de circulação de pessoas, de estabelecimento e de prestação de serviços, diferenciando-se delas na medida em que sem estende a terceiros Estados, entende a Requerida que a liberdade de circulação de capitais implica a proibição de discriminação entre capitais do Estado-Membro e capitais provenientes de fora, pois Estados-Membros podem regular em alguma medida a circulação de capitais, mas não podem discriminar.
Por isso, para se avaliar se o tratamento fiscal aplicado aos dividendos obtidos em Portugal é menos vantajoso do que o tratamento fiscal atribuído aos dividendos obtidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e se tal diferenciação é suscetível de afetar o investimento em ações emitidas por sociedades residentes, teria de ser colocado em confronto o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, à taxa de 15%, e os impostos – IRC e Imposto do Selo - que incidem sobre os segundos, e que, em conjunto, podem, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos.
Acresce, segundo a Requerida, que a jurisprudência do TJUE não autoriza o intérprete a extrair a conclusão, em abstrato, de que a mera existência de uma retenção na fonte de IRC incidindo apenas sobre os dividendos pagos por uma sociedade residente a um Fundo de Investimento estabelecido noutro Estado-Membro constitui por si só uma restrição à livre circulação dos fluxos de capital no espaço europeu, sem que seja feita uma apreciação global do regime fiscal aplicável aos Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos em Portugal.
Torna-se necessário, segundo a Requerida, comparar a carga fiscal que onera uns e outros em relação ao mesmo tipo de investimentos e não basta olhar apenas o n.º 10 do artigo 22.º do EBF.
Porque, ainda segundo a Requerida, para avaliar se da legislação nacional resulta um tratamento discriminatório dos fundos de investimento de outros Estados-Membros contrário ao TFUE, por constituir uma restrição à liberdade de circulação de capitais, a análise não pode cingir-se à consideração estrita das regras de retenção na fonte, há que atender à carga fiscal a que estão sujeitos os OIC’s abrangidos pelo artigo 22.º do EBF relativamente aos dividendos e às correspondentes ações, pois, só com esta visão global pode concluir-se com um mínimo de segurança que os fundos estrangeiros que investem em ações de sociedades residentes em Portugal são colocados numa situação mais desfavorável, pelo que defende que deve ser indeferido o presente PPA, com a improcedência do pedido de juros indemnizatórios.
2. É a seguinte a redacção do artº. 22º., nºs. 1, 3 e 10 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF):
Artigo 22.º
Organismos de Investimento Coletivo
1 - São tributados em IRC, nos termos previstos neste artigo, os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional. (Redação do Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, em vigor a partir de 1 de julho de 2015)
3 - Para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do Código do IRS, exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada em portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.º-A do Código do IRC, bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para as entidades referidas no n.º 1. (Redação do Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, em vigor a partir de 1 de julho de 2015)
10 - Não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC relativamente aos rendimentos obtidos pelos sujeitos passivos referidos no n.º 1. (Redação do Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, em vigor a partir de 1 de julho de 2015)
Daqui conclui a Requerida que há lugar à retenção na fonte do IRC devido pelos OIC não residentes, pois o nº. 10 apenas isenta de retenção na fonte os OIC residentes.
Tal norma insere-se no entendimento legislativo de que os rendimentos obtidos em Portugal por entidades estrangeiras, devem aqui ser tributados (artº. 4º., nº. 2), por meio de retenção na fonte com carácter definitivo (artº. 94º., nº. 1, al. c) e nº. 3, al. b) e nº. 5), com as taxas especiais definidas no artº. 87º., nº. 4 especialmente para entidades não residente, sendo todas as normas do CIRC.
Ora, é por demais evidente que todas estas normas promovem uma discriminação evidente entre os OIC residentes, no sentido de constituídos segundo a lei nacional e os OIC não residentes, tributando estes de forma mais gravosa e essa discriminação viola o disposto no artº. 63º. do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que tem primazia sobre a legislação nacional, nos termos previstos de forma clara e expressa no artº. 8º., nº. 4 da Constituição da República Portuguesa.
Por isso, não devendo os mesmos ser tributados em IRC em Portugal, não o podem ser por qualquer das vias de tributação, ou directamente por liquidação ou indirectamente por acção de terceiro, por meio de retenção na fonte.
Aliás, como se referiu a Requerida também está de acordo neste ponto e na referida interpretação.
Por isso, dúvidas não há de que o Requerente goza de isenção do IRC sobre os dividendos que receber das sociedades portuguesas em que detém participações sociais,
3. Mas será aceitável que a Requerida possa desconsiderar esta isenção, com o fundamento em que o mesmo cria uma situação de desigualdade e mais que isso de discriminação com os OIC residentes, no sentido de constituídos e actuar em Portugal?
A resposta tem de ser naturalmente negativa.
Em primeiro lugar, porque a Requerida sabe quais os impostos que os OIC residentes têm de pagar, mas não sabe, nem explicita quais os impostos que os OIC não residentes têm ainda de pagar nos respectivos países.
Em segundo lugar, porque tem sido esta a jurisprudência firme e uniforme do Tribunal de Justiça da União Europeia, de que nos permitimos citar o Acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, proferido em 17/3/2022, exactamente sobre a comparabilidade entre as tributações dos OIC residentes em território nacional e os OIC residentes noutro Estado-Membro da União Europeia, que se refere a um caso ocorrido em território nacional, que concluiu, apesar do disposto no artº. 65º. do TFUE,
73. Por conseguinte, o critério de distinção a que se refere a legislação nacional em causa no processo principal, que tem por objeto unicamente o lugar de residência dos OIC, não permite concluir pela existência de uma diferença objetiva de situações entre os organismos residentes e os organismos não residentes.
74. Atendendo a todos os elementos precedentes, há que concluir que, no caso em apreço, a diferença de tratamento entre os OIC residentes e os OIC não residentes diz respeito a situações objetivamente comparáveis»
Ora, dado que o artigo 22.º, n.os 1, 3 e 10, do EBF, faz depender a dispensa de retenção na fonte e tributação em sede de IRC dos dividendos de fonte portuguesa auferidos por um OIC da respectiva residência em território português, os OIC não residentes constituídos e a operar em condições equivalentes, mas ao abrigo da Directiva 2009/65/CE, encontram-se numa situação objectivamente comparável à dos OIC residentes em território português, pelo que as liquidações de IRC por retenção na fonte objecto dos presentes autos constituem uma discriminação que viola o princípio da livre circulação de capitais previsto no artigo 63.º do TFUE.
4.4. A liberdade de circulação de capitais
1. Nos termos do art. 26º do TFUE, estabelece-se uma conexão substantiva entre a criação do mercado interno e a liberdade de circulação de capitais, elevada esta, pelo art. 63º do TFUE, ao estatuto de liberdade fundamental do mercado interno, dotada de relevância constitucional no âmbito do Direito da União Europeia.
Em consequência, a mesma goza da primazia normativa sobre o direito interno dos Estados-Membros, cabendo aos tribunais nacionais, na sua qualidade de tribunais europeus em sentido amplo, assegurar a primazia de aplicação do direito da União Europeia, desaplicando o direito nacional de sentido contrário.
É que a criação de um mercado interno supõe, por definição, a gradual e efectiva abolição dos diferentes mercados nacionais, em favor de um único mercado interno, de forma a potenciar o crescimento económico à escala europeia, através da mais fácil disponibilização de capital. O objectivo dos OIC, cujo enquadramento jurídico é definido pela Directiva 2009/65/CE, consiste em facilitar a participação dos investidores privados num mercado de valores mobiliários, idealmente integrado a nível da UE.
2. Por sua vez, o TJUE desempenha uma função interpretativa decisiva, nomeadamente em sede de acções por incumprimento e de reenvios prejudiciais, devendo os tribunais nacionais conformar-se com o entendimento sobre as normas dos Tratados que venha a ser vertido na jurisprudência daquele tribunal, sob pena de incumprimento do direito da União Europeia e de responsabilidade por parte do Estado-Membro.
A liberdade de circulação de capitais consagrada no art. 63º do TFUE implica a proibição de discriminação entre capitais de um dado Estado-Membro, e capitais provenientes de fora deste, mas de outros Estados-Membros da União.
Consequentemente, trata-se de uma norma directamente aplicável aos Estados-Membros, que devem abster-se de restringir o seu alcance por via legislativa, administrativa ou jurisdicional, embora isso não impeça os Estados-Membros de regularem em alguma medida a circulação de capitais, desde que o façam em termos compatíveis com o direito da União Europeia.
3. Acresce que a autonomia fiscal permite aos Estados‑Membros regularem soberanamente as condições de tributação aplicáveis, desde que o tratamento das situações transfronteiriças não seja discriminatório em comparação com o das situações nacionais. Não obstante a fiscalidade directa ser da competência dos Estados‑Membros, o respectivo regime jurídico deve respeitar o direito da União Europeia, sem qualquer discriminação em razão da nacionalidade ou da residência e o TJUE tem sustentado que a existência de meras “divergências” entre os sistemas fiscais nacionais não é suficiente para declarar a existência de uma tal restrição.
Ora, na ausência de harmonização no plano da União Europeia, as desvantagens que podem resultar do exercício paralelo de competências dos diferentes Estados‑Membros, desde que o exercício não seja discriminatório, não constituem restrições às liberdades de circulação e um dos domínios do âmbito e do programa normativo da liberdade de circulação de capitais do art. 63º do TFUE diz especificamente respeito ao tratamento fiscal dos movimentos de capitais.
4. A densificação do âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais tem sido levada a cabo pelo TJUE, acolhendo e sublinhando o valor enumerativo, mas não exaustivo, da Directiva n.º 88/361/CEE, de 24 de Junho de 1988, incluindo o respectivo Anexo I número IV, no qual se integra, no conceito de liberdade de circulação, um amplo conjunto de operações e transacções transfronteiriças sobre certificados de participação em organismos de investimento colectivo, nas quais se incluem as que estão em causa nos presentes autos: razão pela qual a distribuição de dividendos efectuada ao Requerente por sociedades residentes em Portugal deve ser qualificada como movimento de capital, na acepção do art. 63º do TFUE e da própria Directiva 88/361/CEE.
Aproveitando a fundamentação da Decisão do Processo (CAAD) nº 505/2022-T, de 9 de Março de 2023, esclareçamos que a questão do tratamento fiscal da distribuição de dividendos tem ocupado um lugar central na jurisprudência europeia, incluindo não apenas o TJUE, mas também o Tribunal EFTA[1].
Este último órgão, no caso Focus Bank[2], e o TJUE, em casos como, entre outros,
ACT GLO[3],
Denkavit[4],
Amurta[5],
Truck Center[6],
Aberdeen Property[7],
Comissão v. Países Baixos[8],
Comissão v. Portugal[9],
Santander Asset Management[10] e
Sofina SA[11], a despeito das diferenças factuais e jurídicas nas respectivas decisões, apontam globalmente no sentido de dever considerar-se que o tratamento fiscal diferenciado de residentes e não-residentes – por exemplo imputando aos investidores residentes um crédito de imposto e sujeitando as entidades não-residentes a retenção de imposto sem imputação; retendo imposto sobre dividendos pagos a não-residentes e não retendo no caso de dividendos pagos a residentes – configura, em princípio, uma violação da liberdade de circulação de capitais, e nalguns casos também da liberdade de estabelecimento, pondo em causa o funcionamento do mercado interno.
4.5. A decisão do caso AllianzGI-Fonds AEVN no TJUE
1. Os argumentos sustentados pela AT foram rebatidos na decisão do Processo (CAAD) n.º 166/2021-T, tendo sido posteriormente rejeitados pelo TJUE, na sua decisão do caso AllianzGI-Fonds AEVN, de 17 de Março de 2022 (Processo n.º C-545/19), que entendeu que “o artigo 63.º do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.”
Como esta decisão considerou expressamente o regime fiscal em causa no presente processo, e estando os tribunais nacionais juridicamente obrigados a seguir a jurisprudência do TJUE, impõe-se seguir a sua argumentação, e é o que faremos a partir daqui.
No caso AllianzGI-Fonds AEVN, o TJUE reiterou o seu entendimento de que, embora não estejam sempre numa situação comparável, residentes e não-residentes são colocados nessa posição a partir do momento em que um Estado-Membro, unilateralmente ou por convenção, opte por tributar os accionistas não-residentes de maneira menos favorável do que os residentes, relativamente aos dividendos que uns e outros recebam de sociedades residentes.
Especialmente relevante, em sede das liberdades de estabelecimento e de circulação de capitais – a liberdade que o TJUE entendeu ser pertinente neste caso –, é o facto de o tratamento fiscal menos favorável dos não-residentes os dissuadir, na qualidade de accionistas, de investirem no Estado da residência das empresas distribuidoras de dividendos, e constituir, igualmente, um obstáculo à obtenção de capital no exterior, por parte dessas empresas.
Para o TJUE, é significativo o facto de que a isenção fiscal prevista pela legislação nacional em causa nestes autos ser concedida aos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa, ao passo que os dividendos pagos a OIC estabelecidos noutro Estado‑Membro não podem beneficiar dessa isenção.
No entender do TJUE, ao proceder a uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OIC não-residentes e ao reservar aos OIC residentes a possibilidade de obter a isenção dessa retenção na fonte, a legislação nacional em causa procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OIC não-residentes, susceptível de dissuadir, por um lado, os OIC não-residentes de investirem em sociedades estabelecidas em Portugal, e, por outro, os investidores residentes em Portugal de adquirirem participações sociais em OIC, constituindo, por conseguinte, uma restrição à livre circulação de capitais – proibida, em princípio, pelo art. 63º do TFUE.
No entendimento do TJUE, o facto de o art. 65º, 1, a) do TFUE estabelecer que o disposto no art. 63º do TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência, ou ao lugar em que o seu capital é investido, não isenta um Estado-Membro de cumprir as suas obrigações jurídicas decorrentes das liberdades fundamentais do mercado interno, nem o exonera pela simples circunstância de esse Estado poder pensar que outro Estado-Membro se encarregará de compensar, de alguma maneira, o tratamento desfavorável gerado pela sua própria legislação[12].
É entendimento do TJUE, portanto, que as liberdades de circulação de capitais e de estabelecimento requerem a igualdade de tratamento fiscal dos dividendos pagos a residentes e não-residentes pelo Estado-Membro anfitrião, no caso de ambos estarem sujeitos a tributação de dividendos.
O TJUE tem sustentado que, quando se trata de interpretar e aplicar as liberdades fundamentais do mercado interno, prevalece o entendimento segundo o qual a liberdade é a regra, e as restrições à liberdade são a excepção: pelo que o art. 65º, 1, a) do TFUE, enquanto derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, é de interpretação estrita.
Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre contribuintes, em função do lugar em que residam, ou do Estado‑Membro onde invistam os seus capitais, é automaticamente compatível com o TFUE.
Com efeito, a derrogação prevista no art. 65º, 1, a) do TFUE é, ela própria, limitada pelo disposto no nº 3 do mesmo artigo, que prevê que as disposições nacionais a que se refere o nº 1 desse artigo não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos: ou seja, as restrições têm como limite a garantia da própria liberdade de circulação de capitais[13].
2. No caso de fundos de investimento residentes no Luxemburgo, o artigo 10.º, n.º 2, da CEDT, permite que o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, seja limitado à taxa de 15% sobre o montante bruto dos dividendos se a pessoa que os recebe for o seu beneficiário efectivo[14].
No entanto, como o regime fiscal aplicável ao OIC luxemburguês se aproxima de um regime de transparência fiscal, e, aparentemente, não há incidência de outros impostos – visto que a base tributável é constituída pelos rendimentos não distribuídos ou imputados aos titulares do capital, desde que estes se manifestem nesse sentido –, o OIC não pode deduzir o imposto pago.
Numa primeira análise, poder-se-ia dizer que essa impossibilidade resulta do facto de gozarem de uma vantagem fiscal, a isenção, de que os seus congéneres portugueses não usufruem. Estes beneficiam da isenção de retenção, ao mesmo tempo que estão sujeitos a dois impostos – tributação autónoma de IRC e IS – cujo efeito cumulativo pode, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos, como assinalou a Requerida na sua resposta.
Por outro lado, o imposto retido ao Requerente poderá eventualmente dar lugar a um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera dos investidores individualmente considerados, o que, segundo a Requerida, não terá sido devidamente esclarecido nos autos.
Num caso e noutro, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC residentes abrangidos pelo artigo 22.º do EBF possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pelos fundos não-residentes, no caso luxemburgueses, embora estas diferenças podem ser invocadas, prima facie, para sustentar que se trata de situações não-comparáveis.
No entender do TJUE, na decisão AllianzGI-Fonds AEVN, há que distinguir as diferenças de tratamento permitidas pelo art. 65º, 1, a) do TFUE, das discriminações proibidas pelo nº 3 do mesmo artigo e para que o regime fiscal nacional possa ser considerado compatível com as disposições do TFUE relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento daí decorrente diga respeito a situações que não sejam objectivamente comparáveis, ou que ela se justifique por uma razão imperiosa de interesse geral.
3. Sobre a questão de saber se a situação dos fundos de investimento residentes e não residentes em Portugal é objetivamente comparável, o TJUE, depois de ponderados os argumentos do Estado Português (em tudo idênticos aos aqui expostos pela AT), reiterou o seu entendimento segundo o qual, a partir do momento em que um Estado, de modo unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só os contribuintes residentes mas também os contribuintes não-residentes, relativamente aos dividendos que auferem de uma sociedade residente, a situação dos referidos contribuintes não-residentes assemelha‑se à dos contribuintes residentes.
No caso AllianzGI-Fonds AEVN, o TJUE considerou que a legislação nacional em causa no processo principal – o mesmo regime fiscal aqui em análise – não se limita a prever diferentes modalidades de cobrança de imposto em função do local de residência do OIC beneficiário de dividendos de origem nacional, mas prevê, na realidade, uma tributação sistemática dos referidos dividendos que onera apenas os OIC não-residentes.
Por exemplo, no que respeita ao IS, o TJUE entendeu serem decisivos o facto de, por um lado, a sua matéria colectável ser constituída pelo valor líquido contabilístico dos OIC, sendo esse IS um imposto sobre o património, que não pode ser equiparado a um imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas; e, por outro lado, a legislação fiscal portuguesa distinguir, no caso dos OIC residentes, entre o rendimento do capital acumulado e o que é imediatamente redistribuído, apenas o primeiro sendo englobado na matéria coletável do referido Imposto do Selo.
Com efeito, observa o TJUE, mesmo considerando que esse mesmo IS possa ser equiparado a um imposto sobre os dividendos, um OIC residente pode escapar a tal tributação dos dividendos procedendo à sua distribuição imediata, ao passo que esta possibilidade não está aberta a um OIC não-residente.
Quanto ao imposto específico previsto no art. 88º, 11 do CIRC, o TJUE, na decisão do caso AllianzGI-Fonds AEVN, considerou significativo o facto de este imposto só incidir sobre os dividendos recebidos por OIC residentes quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição, e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.
Assim, o imposto previsto pela referida disposição só incide sobre os dividendos de origem nacional recebidos por um OIC residente em casos limitados, pelo que não pode ser equiparado ao imposto geral de que são objecto os dividendos de origem nacional recebidos pelos OIC não-residentes.
Por conseguinte, a circunstância de os OIC não-residentes não estarem sujeitos ao IS e ao imposto específico previsto no art. 88º, 11 do CIRC não os coloca numa situação objectivamente diferente da situação dos OIC residentes, no que se refere à tributação dos dividendos de origem portuguesa.
4. Quanto à alegada necessidade de ter em conta a situação dos detentores de participações sociais, o TJUE, na decisão do caso AllianzGI-Fonds AEVN, entendeu que a comparabilidade de uma situação transfronteiriça com uma situação interna do Estado‑Membro em causa deve ser examinada tendo em conta o objectivo prosseguido pelas disposições nacionais controvertidas.
No caso em apreço, no que diz respeito ao objecto, ao conteúdo e ao objectivo do regime português em matéria de tributação dos dividendos, seja ao nível dos próprios OIC ou dos seus detentores de participações sociais, o TJUE entendeu que o referido regime foi concebido numa lógica de “tributação à saída”, ou seja, os OIC que são constituídos e operam de acordo com a legislação portuguesa estão isentos do imposto sobre o rendimento, sendo o encargo que este último representa transferido para os detentores de participações sociais que têm a qualidade de residentes, estando dele isentos os detentores de participações sociais não-residentes.
Para o TJUE, se se concluir que o regime português em matéria de tributação dos dividendos visa transferir essa tributação para a esfera dos detentores de participações sociais dos OIC, no intuito de não renunciar pura e simplesmente à tributação dos dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal, deve entender-se que, se o objectivo da legislação nacional em causa é comprovadamente o de deslocar o nível de tributação do veículo de investimento para o accionista desse veículo, são, em princípio, as condições materiais do poder de tributação sobre os rendimentos dos accionistas que devem ser consideradas determinantes, e não a técnica de tributação utilizada.
Por isso, os fundos do Requerente, residente no Luxemburgo, podem ter investidores estrangeiros, incluindo portugueses, e os fundos fiscalmente residentes em Portugal podem ter investidores estrangeiros, incluindo luxemburgueses.
Ora, a presente acção não foi intentada pelos investidores, nem os mesmos são partes nela, nem é lícito chamar à colação a posição dos referidos investidores.
5. Por seu lado, o art. 22º do EBF não estabelece nenhuma ligação entre o tratamento fiscal dos dividendos de origem nacional recebidos pelos OIC, residentes ou não residentes, e a situação fiscal dos seus detentores de participações.
Da mesma forma, a AT não afere da posição dos investidores em OIC residentes para efeitos fiscais em Portugal, para reconhecer a estes o regime fiscal previsto no art. 22º do EBF.
Seria administrativamente impraticável, excessivamente oneroso, proceder-se a uma determinação caso a caso, totalmente particularizada, para cada OIC não-residente, ou investidor individual, com o único fito de aumentar as receitas tributárias dos Estados-Membros, pois, tanto os fundos residentes em Portugal, como os não-residentes, podem ter accionistas institucionais e individuais de todos os Estados da União Europeia e de terceiros Estados.
Será, portanto, administrativamente praticável, muito menos oneroso, circunscrever a análise ao nível da situação fiscal dos fundos residentes e não-residentes a quem são distribuídos dividendos, obtendo-se a informação relevante numa única determinação, sem necessidade de particularizar as situações de benefício económico último.
Por outras palavras: considerando que o único critério de distinção estabelecido pela legislação nacional se baseia no lugar de residência dos OIC, sujeitando apenas os organismos não-residentes a uma retenção na fonte dos dividendos que recebem, o que deve relevar é o impacto directo que as normas tributárias têm na atividade dos fundos, e não na situação fiscal dos investidores individualmente considerados. Estes não têm necessariamente a mesma nacionalidade dos fundos, o que deve ser considerado normal, até porque os investimentos transfronteiriços são um dos objetivos do mercado interno e da liberdade de circulação de capitais no âmbito da União Europeia.
Em suma, o rastreamento de investidores individuais espalhados por todo o mundo, e a aplicação de um conjunto diferente de regras a cada um deles, dependendo de seu país de domicílio, apresentaria uma situação impraticável para os tribunais que, no futuro, fossem chamados a analisar a conformidade da legislação fiscal nacional em causa com as liberdades de estabelecimento e de circulação de capitais.
Regressando ao plano dos Fundos: a situação de um OIC residente que beneficia de uma distribuição de dividendos é comparável à de um OIC beneficiário não-residente, na medida em que, em ambos os casos, os lucros realizados podem, em princípio, ser objeto de dupla tributação económica ou de tributação em cadeia, pelo que o critério de distinção a que se refere a legislação nacional em causa, que tem por critério o lugar de residência dos OIC, não permite concluir pela existência de uma diferença objectiva de situações entre os organismos residentes e os organismos não-residentes.
Logo, a diferença de tratamento entre os OIC residentes e os OIC não-residentes diz respeito a situações objetivamente comparáveis.
6. Por outro lado, como reconheceu o TJUE no caso AllianzGI-Fonds AEVN, uma restrição à livre circulação de capitais pode ser admitida se se justificar por razões imperiosas de interesse geral, for adequada a garantir a realização do objectivo que prossegue e não for além do que é necessário para alcançar esse objectivo, sendo tais razões, por um lado, a necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional, e, por outro, a de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributar entre Portugal e outro Estado-Membro da EU, como o Luxemburgo.
Quanto à primeira razão, sempre se poderia alegar que essa coerência só seria garantida se a entidade gestora do OIC não-residente operasse em Portugal através de um estabelecimento estável, de modo a que essa entidade pudesse concretizar as retenções na fonte necessárias junto dos detentores de participações sociais residentes, bem como, em certos casos excepcionais, orientados por considerações ligadas ao facto de evitar o planeamento fiscal, junto dos detentores de participações sociais não-residentes.
Contudo, para que um argumento baseado nessa justificação pudesse ser acolhido, seria necessário que estivesse demonstrada a existência de uma relação directa entre o benefício fiscal em causa e a compensação desse benefício por uma determinada imposição fiscal.
Ora, a garantia da coerência do sistema fiscal português também não pode ser invocada para justificar a diferenciação de regime da retenção, visto que a isenção da retenção na fonte dos dividendos em benefício dos OIC residentes não está sujeita à condição de os dividendos recebidos pelos organismos serem redistribuídos por estes, e de a sua tributação na esfera dos detentores de participações sociais permitir compensar a isenção da retenção na fonte; não se podendo, pois, falar de uma relação directa, na acepção da jurisprudência do TJUE, entre a isenção da retenção na fonte dos dividendos de origem nacional auferidos por um OIC residente e a tributação dos referidos dividendos enquanto rendimentos dos detentores de participações sociais nesse organismo.
No tocante ao objectivo de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributar entre Portugal e outro Estado-Membro da EU, como o Luxemburgo, o mesmo só pode ser admitido quando o regime em causa vise prevenir comportamentos susceptíveis de comprometer o direito de um Estado‑Membro exercer a sua competência fiscal em relação às actividades realizadas no seu próprio território, pelo que, se Portugal optou por não tributar os OIC residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados‑Membros para justificar a tributação dos OIC não-residentes beneficiários desses rendimentos.
A esta luz, o art. 63º do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro que estabeleça que os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não-residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção – sendo esta a principal conclusão que, com firmeza, se alcança na decisão do TJUE no caso AllianzGI-Fonds AEVN, de 17 de Março de 2022 (Processo n.º C-545/19).
4.5 – Do erro imputável aos serviços
Aqui chegados, temos de averiguar da existência do pressuposto de admissibilidade do recurso ao meio de impugnação da revisão dos actos tributários e das respectiva tempestividade, qual seja, o de existir um erro imputável aos serviços.
Como já deixámos dito, o Requerente só poderia recorrer ao processo de revisão de actos tributários, depois de decorridos os prazos legais de impugnação judicial e de reclamação graciosa das retenções efectuadas e dado que se encontram pagas à AT com a sua entrega, se ainda não tivessem decorrido 4 anos sobre essas retenções e se houvesse erro imputável aos serviços.
Ora, face à ilegalidade das retenções na fonte ora impugnadas, como se demonstrou no ponto anterior da presente decisão e pelas razões elencadas no número 6 imediatamente anterior, não pode deixar de concluir-se que essas retenções são ilegais por erro claramente imputável aos serviços, por violação da lei, nos pressupostos de direito.
Com efeito, quer os tribunais judiciais, quer os tribunais arbitrais haviam quase unanimemente decidido de forma contrária à orientação perfilhada pela Requerida AT, sendo que esta não curou de utilizar os critérios legais de interpretação da lei para definir a orientação aplicável.
Ora, como se decidiu Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14 de Março de 2012, proferido no processo 01007/11 (Relatora: Cons. Dulce Neto) “o “erro imputável aos serviços” a que alude o artigo 78.º, nº 1, in fine, da LGT compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como, também, o erro de direito, e essa imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na emissão da liquidação afectada pelo erro.
Por isso, entendemos que as ilegalidades apontadas pelo Requerente às liquidações adicionais ora postas em crise resultam de forma clara e inequívoca de erro imputável aos serviços tributários.
5. Do Pedido de revisão dos actos tributários
Face ao que se referiu, o Requerente só poderia recorrer ao processo de revisão de actos tributários, uma vez que estavam ultrapassados os prazos legais de impugnação judicial e de reclamação graciosa das retenções na fonte realizadas, se ainda não tivessem decorrido decorridos 4 anos sobre essas retenções e se houvesse erro imputável aos serviços.
Verificámos já no ponto 4.5, imediatamente anterior, que houve erro imputável aos serviços.
Acontece que está provado que “as retenções na fonte de IRC referentes aos dividendos auferidos pelo Requerente em 2018, 2019 e 2020 foram efectuadas e entregues junto dos cofres da Fazenda Pública através das guias de retenção na fonte n.os..., ..., ..., ..., ... e ..., pelo I..., pessoa colectiva com o número de identificação fiscal português ..., e, bem assim, através das guias de retenção na fonte n.os ..., ... e ..., pelo J... PLC, pessoa colectiva com o número de identificação fiscal português ..., ambas na qualidade de entidades registadoras e depositárias de valores mobiliários, ao abrigo do artigo 94.º, n.º 7, do CIRC.” (facto i) e que “a 30 de Dezembro de 2021, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC por retenção na fonte ocorridas em 2018, 2019 e 2020” (facto j) que não foi decidido, pelo que se presumiu indeferido tacitamente e se encontra ora em análise, portanto menos de 4 anos após a realização dessas retenções na fonte.
E o prazo é relevante pois que o ora Requerente, como também está provado, pois para todos os efeitos e atento o facto de a retenção na fonte ter carácter definitivo (artº. 94º., nº. 1, al. c) e nº. 3, al. b) e nº. 5 do CIRC), pode entender-se que o Requerente já procedeu ao pagamento do imposto liquidado.
Ora, face ao que se deixa exposto, e dado que há erro imputável aos serviços e por ter sido apresentado no prazo fixado no artº. 78º., nº.1 da LGT, o pedido de revisão dos actos tributários é tempestivo.
Consequentemente tem de ser anulada a decisão de rejeição liminar desse pedido de revisão de actos tributários apresentado pelo ora Requerente, pois o mesmo é tempestivo.
Conhecendo em seguida do pedido formulado na sequência da dessa anulação, declara-se a nulidade das retenções na fonte de IRC objecto do pedido de revisão, melhor identificadas nos factos provados, com os fundamentos de ilegalidade, por erro manifesto nos pressupostos de direito, com a consequente devolução do imposto retido.
6. Devolução do imposto pago, juros e custas, acrescido de juros indemnizatórios.
Conforme vem provado na al. j) dos factos provados, o Requerente viu retido a título de imposto de IRC, a quantia de € 154.473,51, cuja restituição o ora Requerente agora peticiona.
Além da restituição dessa quantia retida por força da anulação das respectivas retenções na fonte, pede ainda o Requerente a condenação da Requerida no pagamento dos juros indemnizatórios, calculados desde a data do indeferimento cito da revisão oficiosa que antecedeu os presentes autos – i.e. 30 de Abril de 2022 – até efectivo e integral pagamento.
A propósito dos juros indemnizatórios, prescreve o artigo 43º nº 1 da LGT que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”
No caso ora em apreciação, o erro que afecta a não devolução das retenções na fonte ora impugnadas é exclusivamente imputável à Requerida AT como se demonstrou em 4.5, pelo que tem o ora Requerente direito ao recebimento dos juros indemnizatórios.
É que, nos termos da alínea b) do artigo 24º do RJAT, 35º nº 10 e 43º nº 1 da Lei Geral Tributária e 61º nº 5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a Requerida incorreu em erro que lhe é imputável ao não ter deferido a restituição do imposto de IRC indevidamente retido pelas retenções na fonte ora anuladas, pelo que deve pagar ao Requerente juros indemnizatórios sobre a quantia paga indevidamente, contados à taxa legal, desde o indeferimento tácito da restituição das quantia indevidamente retidas até à sua restituição.
Portanto, tem o ora Requerente direito a ser reembolsado relativamente à quantia que peticiona e, ainda, a ser indemnizada por esse pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios por parte da Requerida.
Mas desde quando?
Pretende o Requerente que esses juros sejam devidos desde a data do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, até reembolso, ou seja, desde 30 de Abril de 2022.
Não é esse, porém, o entendimento da lei, como resulta do artº. 43º., nº. 3, al. c) da LGT na interpretação que tem sido seguida pelos Tribunais e por este Tribunal Arbitral.
Com efeito, como se escreveu, no Acórdão de 7/11/2022, proferido no processo 117/2022-T, "no que se refere aos juros indemnizatórios, e em face do disposto no art. 43º, 3, c) da LGT, nos casos de pedido de revisão oficiosa esses juros apenas são devidos depois de decorrido um ano após a iniciativa do contribuinte, e não desde a data do desembolso da quantia liquidada, constituindo esse o entendimento jurisprudencial corrente (cfr., entre outros, os acórdãos do STA de 6-07-2005, processo n.º 0560/05; de 02-11-2005, processo n.º 0562/05; de 17-05-2006, processo n.º 016/06; de 24-05-2006, processo n.º 01155/05; de 02-11-2006, processo n.º 0604/06; de 15-11-2006, processo n.º 028/06; de 10-01-2007, processo n.º 523/06; de 17-01-2007, processo n.º 01040/06; de 12-12-2006, processo n.º 0918/06; de 15-02-2007, processo n.º 01041/06; de 06-06-2007, processo n.º 0606/06; de 10-07-2013, processo n.º 390/13; de 18-01-2017, processo n.º 0890/16; de 10-5-2017, processo n.º 01159/14. Como se lê num acórdão do Pleno do STA proferido em 27 de Fevereiro de 2019 no processo n.o 22/18.5BALSB: “O legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte. Impondo a lei constitucional ao Estado a obrigação de reparar os danos causados pelos seus actos ilegais, tem vindo a lei ordinária a estabelecer limites a essa reparação, sejam os decorrentes da valorização da maior ou menor diligência do lesado, seja do tempo que faculta para a Administração Tributária decidir.”)”
Dado que o pedido de revisão dos actos tributários só foi apresentado pelo Requerente em 30 de Dezembro de 2021 (al. j) dos factos provados), só são devidos juros compensatórios desde 31 de Dezembro de 2022, juros esses calculados à taxa legal supletiva, nos termos dos n.ºs 1 e 4 do artigo 43.º e n.º 10 do artigo 35.º da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
7. Decisão
Nestes termos, decide-se julgar procedente o presente pedido de pronúncia arbitral e consequentemente:
a) anular a decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão de actos tributários apresentado pelo ora Requerente,
b) anular em consequência, as retenções na fonte de IRC relativas as 2018, 2019 e 2020, no valor total de € 154.473,51,
c) julgar procedente o pedido de condenação da Requerida na restituição de imposto relativo a essas notas de liquidação anuladas, no valor de € 154.473,51, acrescido de juros indemnizatórios, por parte da Requerida, desde 31 de Dezembro de 2022, até efectivo reembolso, calculados à taxa legal supletiva que é actualmente de 4% ao ano.
8. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 154.473,51, indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
9. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante total das custas a pagar em € 3.672,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Lisboa, 26-06-2023
Os Árbitros
Fernando Araújo (Presidente)
Marta Vicente (vogal)
José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora (Relator)
Texto elaborado segundo a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990
[1] Cfr., sobre esta matéria, Christiana Hji Panayi, European Union Corporate Tax Law, Cambridge, 2013, 253 ss.
[2] Case E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004, sobre dividendos pagos por uma empresa norueguesa a acionistas residentes e não residentes na Noruega, beneficiando os primeiros (e não os segundos) de um crédito de imposto sobre a retenção feita na empresa.
[3] C-374/04 - Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, 12.12.2006, sobre o tratamento diferenciado de dividendos pagos por sociedades britânicas a sociedades mãe residentes ou não residentes no Reino Unido, sofrendo as mesmas uma desvantagem no fluxo de caixa, considerando-se que quando o Reino Unido exerce a sua jurisdição fiscal sobre rendimento obtido na fonte deve fazê-lo de forma a garantir a igualdade de tratamento em matéria de crédito de imposto relativamente a residentes e não residentes, considerando-se que uns e outros estão em situação comparável.
[4] C-170/05, Denkavit, 14.12.2006, relativamente à retenção de imposto, pela França, sobre dividendos pagos por filiais residentes a sociedades mães não residentes, ficando os dividendos pagos a sociedades mães residentes quase isentos de impostos, tendo o TJUE estabelecido que a partir do momento em que a França, unilateralmente ou mediante tratado, decide impor uma retenção sobre pagamentos a não residentes, os mesmos ficam colocados em situação comparável aos residentes.
[5] C-379/05, Amurta SGPS, 08.11.2007, relativamente retenção de imposto de 25%, pela Holanda, sobre dividendos pagos a sociedades mães não residentes, sendo os dividendos pagos a residentes isentos de imposto, considerando-se que ambos estão em situação comparável, devendo qualquer mitigação da dupla tributação ser abranger residentes e não residentes.
[6] C-282/07, Belgian State - SPF Finances v Truck Center SA., 22.12.2008, relativamente à retenção de imposto sobre pagamentos de juros ao exterior, tendo o Tribunal considerado que residentes e não residentes não estavam em situação comparável, na medida em que quando a sociedade distribuidora de juros e a sociedade beneficiária desses juros residem na Finlândia, esta atua na sua qualidade de Estado da residência, ao passo que quando uma sociedade residente nesse Estado paga juros a uma sociedade não residente, a Finlândia atua na sua qualidade de Estado de origem dos juros.
[7] C-282/07, Aberdeen Property Fininvest Alpha, 18.06.2009, sustentando que a diferença de tratamento fiscal dos dividendos entre as sociedades‑mãe, em função do local da sua sede, é suscetível de constituir uma restrição à liberdade de estabelecimento, em princípio proibida pelo TFUE, uma vez que torna menos atraente o exercício da liberdade de estabelecimento por sociedades estabelecidas noutros Estados‑Membros, as quais poderiam, consequentemente, renunciar à aquisição, à criação ou à manutenção de uma filial no Estado‑Membro que aplica esta diferença de tratamento.
[8]C-521/07, Comissão v. Países Baixos, 11.06.2009, a não isenção de retenção de imposto a dividendos pagos a sociedades não residentes, diferentemente do que sucedia relativamente a sociedades residentes com participações iguais ou superiores a 5% constitui uma restrição da liberdade de circulação de capitais no EEE.
[9] C- 493/09, Comissão v. Portugal, 06.10.2011, sustentando que não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 63.° TFUE e 40.° do Acordo Espaço Económico Europeu, o Estado‑Membro que reserva o benefício da isenção de imposto sobre as sociedades apenas aos fundos de pensões residentes no seu território. Esta diferença de tratamento tem por efeito dissuadir os fundos de pensões não residentes de investir em sociedades portuguesas e os aforradores residentes de investir nesses fundos de pensões.
[10] C‑338/11 a C‑347/11, Santander Asset Management SGIIC SA, 10.05.2012, num caso de retenção de 25% sobre dividendos distribuídos a OIC (valores mobiliários) não residentes, considerando que quando um Estado‑Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos OIC beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do caráter discriminatório ou não da referida regulamentação.
[11] C-575/17, Sofina, Rebelco e Sidro, 22.11.2018, sustentando, num caso de uma retenção na fonte de 25% sobre dividendos distribuídos a não residentes, reduzida a 15% por CDT, que uma vez que os dividendos recebidos por uma sociedade não residente são tributados aquando da sua distribuição, há que ter em conta o exercício fiscal de distribuição dos dividendos para comparar a carga fiscal que incide sobre esses dividendos e a que incide sobre os dividendos distribuídos a uma sociedade residente.
[12] Case E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004.
[13] C-358/93, C-416/93, Bordessa, 23-02-1995.
[14] Convenção entre a República Portuguesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo para Evitar as Duplas Tributações e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e o Património, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 56/2000, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 29/2000, publicada em Diário da República I-A, n.º 149, de 30/06/2000.
(https://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/documentos/instrumentos/rar56-2000.pdf)