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DECISÃO ARBITRAL
A árbitra Ana Paula Rocha, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral Singular constituído em 27 de dezembro de 2022, decide o seguinte:
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RELATÓRIO
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Da tramitação processual
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A...– doravante designado como “Requerente” –, com o número de identificação fiscal ... e residente na Rua ..., n.º ..., ..., ...-... Lisboa, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e apresentar Pedido de Pronúncia Arbitral (“PPA”) ao abrigo das disposições conjugadas da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, da alínea a) do artigo 3.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), e da alínea h), do n.º1 do artigo 97º, do artigo 99.º e da alínea a), do n.º1 do artigo 102.º, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tendo em vista a anulação da decisão que negou provimento ao recurso hierárquico n.º ...2022..., mantendo a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2022..., deduzida contra o ato de liquidação de IRS n.º 2021... referente ao ano de 2017, no valor de EUR 21.190,63, cuja anulação igualmente está em causa.
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É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, “Requerida” ou “AT”).
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A Requerente optou por não designar árbitro.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD a 18 de outubro de 2022 e de imediato notificado à AT.
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Ao abrigo do disposto no artigo 6.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o Sr. Dr. Rui Ferreira Rodrigues como Árbitro do Tribunal Arbitral Singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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A 9 de dezembro de 2022 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar nos termos conjugados das alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
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Em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular ficou constituído a 27 de dezembro de 2022.
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Por despacho arbitral proferido a 29 de dezembro de 2022 nos termos do artigo 17.º do RJAT, notificado às Partes a 3 de janeiro de 2023, a Requerida foi notificada para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional, querendo. Mais foi notificada para, no mesmo prazo, apresentar o Processo Administrativo.
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A 2 de fevereiro de 2023, a Requerida apresentou a sua Resposta e o Processo Administrativo.
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A 17 de março de 2023 foi emitido Despacho pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD aceitando a renúncia às funções de árbitro do Sr. Dr. Rui Ferreira Rodrigues e determinando, ao abrigo do n.º 5 do artigo 6.º do Regulamento de Seleção e Designação de Árbitros em Matéria Tributária, a respetiva substituição pela Prof.ª Doutora Ana Paula Marques Rocha, cuja nomeação ocorreu a 11 de abril de 2023.
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Em resposta a despacho arbitral de 13 de abril de 2023, o Requerente veio, a 24 de abril de 2023, indicar os factos sobre os quais entendia dever incidir a inquirição de cada testemunha por si arrolada.
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A 8 de maio de 2023, o Tribunal emitiu Despacho relativamente às diversas diligências de prova requeridas pelo Requerente e consideradas desnecessárias pela Requerida, tendo i) admitido a prestação de declarações de Parte pelo Requerente A... sobre os factos previamente indicados e previstos no artigo 466.º do CPC (aplicável ex vi alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT), ii) admitido a inquirição das testemunhas B..., C..., D... (a apresentar pelo Requerente) e E... (a notificar pelo Tribunal, sem coerção e a expensas do Requerente, conforme por este admitido por requerimento datado de 16 de maio de 2023) e iii) dispensado a inquirição das testemunhas F..., G..., H... e I..., por considerar que os factos sobre os quais incidiria a inquirição de tais testemunhas, mormente no que respeita ao entendimento técnico sufragado no contexto do procedimento tributário em análise, são suscetíveis de se considerar provados por documentos. Mais foram as Partes notificadas de que a reunião do artigo 18.º do RJAT se encontrava agendada para o dia 14 de junho de 2023.
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A 14 de junho de 2023 realizou-se a reunião a que alude o n.º 1 do artigo 18.º do RJAT, na qual foi ouvido o depoimento de Parte, inquiridas as Testemunhas admitidas e fixado prazo para as Partes produzirem alegações escritas e sucessivas, em conformidade com o estatuído na respetiva Ata, a qual faz parte integrante do processo arbitral. Bem assim, e em função da tramitação processual subsequente e do disposto no n.º 2 do art. 21.º do RJAT, mais se determinou a prorrogação do prazo de prolação da decisão arbitral pelo período de 2 meses.
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O Requerente apresentou as suas alegações escritas a 26 de junho de 2023 e a Requerida apresentou as suas contra-alegações escritas a 6 de julho de 2013.
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A 24 de agosto de 2023 foi determinada nova prorrogação do prazo de prolação da decisão arbitral ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, tomando em consideração a complexidade de algumas das questões a decidir nos presentes autos, aliada a dificuldades inesperadas no acesso a bibliografia em período de férias judiciais e à tramitação processual registada no processo.
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Síntese da posição das Partes
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Síntese da posição do Requerente:
Como fundamentos do PPA, o Requerente vem, em síntese, invocar e defender o seguinte:
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O Requerente começa por abordar a questão de saber “qual o valor de reinvestimento a considerar para efeitos da exclusão de tributação, nos casos em que, foi vendido um bem imóvel que era detido na totalidade por um sujeito passivo, para a aquisição de um outro bem imóvel que será da titularidade de um casal”. A este respeito, alega o Requerente que efetivamente reinvestiu na nova habitação própria e permanente do Sujeito Passivo e do seu agregado familiar, de forma direta, o montante de EUR 65.000, tendo tal valor sido suportado somente por si. No seu entendimento, os extratos bancários fornecidos à Requerida AT e que constam do presente processo demonstram que
i) “o Requerente pagou os primeiros €17.500,00 de uma conta só sua” e que
ii) embora os remanescentes €47.500,00 tenham sido pagos a partir de uma conta bancária conjunta titulada por si e pela sua companheira, B..., tal pagamento apenas ocorreu depois de o Requerente ter transferido diretamente para essa conta conjunta, a partir de uma conta bancária titulada no Deustsche Bank apenas por si, “em 24/10/2017 o valor de €5.000,00 e em 15/12/2017 o valor de €34.500,00, tendo também sido transferido em 15/12/2017 o valor de €8.535,65 por C...”.
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Contudo, na “sua declaração de IRS de 2017”, o Requerente “declarou somente ter já reinvestido 32.500,00€ (…) por lhe ter sido dito pela própria AT – na sua repartição de finanças - que não poderia considerar o valor total por si reinvestido por ter adquirido o imóvel em co-propriedade, isto apesar de o SP, aqui Requerente, demonstrar de forma evidente porque documental que pagou o dobro daquele montante com recurso a bens próprios”.
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Para o Requerente, a posição defendida pela AT não pode proceder na medida em que a “presunção de que o valor pago a título de entrada do imóvel em co-propriedade é na proporção de 50/50, como o próprio nome indica, é uma mera presunção que” é “ilidível mediante a prova de que o valor pertence em proporção diferente a um dos co-proprietários, sendo que, não existe obviamente a necessidade de tal ser decidido previamente por um tribunal - como invoca a AT na sua decisão”.
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Ademais, considera o Requerente que “tal entendimento não encontra acolhimento na letra da lei, sendo irrelevante a circunstância de se ser mero comproprietário do imóvel alienado e não proprietário da totalidade”. Para o Requerente, aquilo que releva é que o imóvel reinvestido estivesse afeto “à habitação própria e permanente do sujeito passivo e que o imóvel no qual é realizado o reinvestimento tenha o mesmo destino, sendo a norma expressa ao ponto de estabelecer que o imóvel seja usado para a habitação do «sujeito passivo ou do seu agregado 0familiar»”, uma vez que “o que se pretende com o regime do reinvestimento é eliminar obstáculos da mudança de habitação das famílias”, sobrepondo-se a isenção fiscal “às regras legais civis da percentagem da titularidade do imóvel”, invocando decisão arbitral e doutrina que considera estar em abono do seu entendimento.
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Tudo quanto determina, na ótica do Requerente, que se deva declarar que o valor integral de EUR 65.000 pago por si “deve ser considerado enquanto reinvestimento para efeitos da liquidação do seu IRS de 2017”.
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Para além desse montante, o Requerente refere que “gastou ainda em obras de recuperação e requalificação (tendo para tal requerido odevido licenciamento para as obras) no apartamento adquirido e afecto à sua habitação própria e permanente o valor de 87.790,01€”, “nomeadamente na realização de obras que só terminaram em 2020”. Contudo, o Requerente esclarece que a consideração deste “valor gasto com as obras de melhoramento” não foi admitida pela AT com base em alguns fundamentos que são por si rebatidos.
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Quanto ao argumento da AT de que não “seria possível para efeitos de reinvestimento cumular o valor das obras com o valor despendido com a aquisição do apartamento”, defende o Requerente que do n.º 5 do artigo 10.º do CIRS “não decorre que a exclusão da tributação seja em alternativa sem possibilidade de cumulação”, sendo “por demais óbvio” que, atendendo “ao próprio espírito da lei, ao intuito do legislador ao prever estas possibilidades”, as mesmas “podem e devem ser cumulativas”. Nesta medida, o Requerente defende que a informação concedida pela AT no sentido de que “não podia cumular, com vista à exclusão no pagamento de tributação de mais-valia, as alternativas legais existentes” “apenas se pode ter como contendo um erro grosseiro”, tanto mais por não ser essa “a posição sufragada nem na Lei Geral, nem pela Jurisprudência e sequer pela Doutrina”.
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Refere ainda o Requerente que a consideração do valor gasto em obras não foi também admitido pela AT “porquanto não foi pelo Requerente requerida a inscrição e actualização da matriz no prazo em que o devia ter efectuado” (a saber, no prazo de 48 meses). Contudo, o Requerente defende que “confundir as exigências legais que afectariam o IMI com a admissibilidade das despesas para efeitos de cálculo das mais-valias é sem dúvida questionável em termos de admissibilidade”, sendo ainda contraditória a “alegada exigência de as obras realizadas só poderem ser consideradas como reinvestimento se inscritas as alterações na matriz” numa situação em que, como alega ter ocorrido no presente caso, “a funcionária responsável pelo património informa que se não houve alterações quer à área ou benfeitorias como a colocação de elevadores então a inscrição na matriz não se aplica nem é exigível, motivo pelo qual recusaram receber o Modelo 1 da primeira vez que o SP tentou proceder à entrega”, apesar de, alega o Requerente, as obras realizadas estarem “devidamente densificadas na facturação entregue e claramente eram enquadráveis como sendo susceptíveis de alterar o VPT do imóvel, algo que acabou por ser até agora impedido pela própria AT”.
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Neste contexto, o Requerente alega que tendo procurado substituir o valor pago com a aquisição do imóvel pelo valor das obras” no contexto do procedimento de reclamação graciosa, a AT não o admitiu, o que enferma “uma clara violação do princípio do tratamento mais favorável e legal do Contribuinte, mas choca principalmente porque” o Requerente “foi sempre fazendo exactamente o que lhe foi incorrectamente aconselhado pela própria AT” (alegando a este respeito que “a exigência de inscrição na matriz das obras de melhoramento em causa que só foi informada e invocada pela AT já em sede de decisão da Reclamação”). Bem assim, tendo o Requerente manifestado posteriormente (tanto “em sede de Audiência prévia no âmbito do RH”, como através de e-mail enviado para o SF Lisboa ...) a sua disponibilidade para “requerer a inscrição e actualização da matriz” e entregar o “referido Modelo 1 com efeito retroactivo e correcção do cálculo com a inclusão do valor reinvestido em obras pelo Requerente”, não existiu a este respeito “uma resposta por parte do serviço competente”.
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Em sede de alegações, veio o Requerente reforçar o entendimento vertido no seu PPA, sublinhando que a prova testemunhal produzida “conjugada com a documentação já antes junta com o pedido de constituição do douto Tribunal Arbitral é suficiente à boa decisão, entendendo-se que a mesma não poderá deixar de dar razão ao Requerente que, desde o início deste processo, tem vindo a ser mal informado e prejudicado pela própria AT”.
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Em particular, o Requerente veio nesta sede defender que, no artigo 22.º da sua Resposta, a AT reconheceu estar errado o “entendimento de que não existe a possibilidade de cumulação entre o valor da aquisição e o valor de Obras”, de onde resulta que a AT “diretamente” reconheceu “que o processo está ferido de ilegalidade (logo devendo ser considerado nulo) por estar assente em falsos pressupostos e errado aconselhamento”.
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Síntese da posição da Requerida:
Na sua Resposta, veio a Requerida AT defender-se por impugnação, invocando e defendendo, em síntese, o seguinte:
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Para a Requerida AT, “o nº 5 do art.º 10.º do CIRS prevê” um benefício de exclusão de tributação “face à generalidade dos contribuintes que igualmente aufiram rendimentos de mais valias”. Neste contexto, e referindo-se à questão de saber qual o valor de reinvestimento a considerar para efeitos de exclusão de tributação da mais-valia em causa nos presentes autos, defende a AT que o direito de propriedade do novo imóvel foi adquirido “em regime de compropriedade, pelo que na quota parte de 50%, nada se encontrando nos autos ou na escritura que altere o facto de esta ser uma quota igualitária, com a necessária consequência do reinvestimento ter como baliza a quota parte correspondente ao preço total do bem imóvel, i.é, 50% de 175.000€ (se o Requerente adquire uma parte, o preço será o proporcional a essa titularidade)”.
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Uma vez que a ““nova” aquisição foi concretizada com recurso a empréstimo no valor total de 110.000€, aqui igualmente sendo de atender à quota-parte do direito de propriedade de cada titular”, conclui a Requerida que “um eventual reinvestimento apenas pode ser considerado na parte não coberta por este empréstimo e, portanto, no caso concreto, a aquisição do imóvel sito em Penha de França, na quota parte do direito de propriedade do Requerente, tem como teto máximo o valor de 32.500€ (No sentido acima referido dispôs, inclusive, a AT em informação vinculativa sancionada por despacho proferido em 12.04.2019 (P.DSIRS 3949/18))”.
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Para a Requerida, a ““aplicação” do ganho apenas pode concretizar-se na aquisição efetiva da propriedade por parte do contribuinte ( 50% do imóvel) e no preço correspondente, não sendo de aceitar a eventual extrapolação monetária incidente sobre o titulo de propriedade de outrem (mesmo que seja de alguém que possa ter relação familiar com o Requerente, uma vez que se encontra em causa o direito real e não aferir das situações de índole pessoal do interveniente)”,
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Não deixando a Requerida de sublinhar, contudo, que “se, tal como o contribuinte, ora Requerente, inúmeras vezes salienta, tudo foi realizado com recurso a “meios próprios””, então sempre estaríamos perante “um investimento de um ganho, uma aplicação de rendimentos de mais valias, não tendo sido este o fim visado pelo legislador aquando da elaboração do regime de exclusão por via de reinvestimento em habitação onde se situe o centro de interesses do contribuinte e/ou do seu agregado”.
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Relativamente à questão relativa aos valores despendidos pelo Requerente em obras, a AT vem reconhecer “razão ao Requerente na pretensão de que pode concretizarse o reinvestimento na aquisição do direito de propriedade e em obras de melhoramento/reconstrução ou ampliação, na medida em que este entendimento mostra-se, inclusive, veiculado na informação vinculativa emitida no quadro do processo 1560/2018, com despacho concordante da Diretora de Serviços do IRS em 18.09, encontrando-se também nesta informação vincada a necessidade de cumprimento dos requisitos fixados no nº 6, al. a) e b) deste art.º 10 CIRS, bem como a efetiva comprovação por meios idóneos dos encargos”.
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Contudo, a AT não deixa de sublinhar que “os custo das obras de melhoramento realizadas pelo proprietário no imóvel adquirido igualmente destinado a sua habitação” apenas podem ser consideradas “para efeito de reinvestimento do ganho imobiliário se devidamente comprovadas por meios idóneos à luz do dispositivo do art.º 36 CIVA” e se forem “comunicadas até 48 meses após a data de realização, que na situação do requerente se situa em JUN2021, por forma a que em sede patrimonial se concretize a atualização necessária”, ao abrigo do disposto na al. b), do n.º 6, do artigo 10.º do CIRS e conforme “informação vinculativa sancionada por despacho da Diretora de Serviços do IRS, de 2019-04-11, proferida em razão do 482/2019)”.
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Para a Requerida, tal comunicação permite simultaneamente que possam “ser considerados os gastos suportados em sede de IRS e mais especificamente ao nível do beneficio de exclusão” e, bem assim, que a valorização do imóvel suscitada pela realização das obras seja refletida na respetiva avaliação patrimonial, “nos termos configurados no Código do IMI (CMI), nomeadamente no seu art.º 12.º (matrizes são registos onde constam a caracterização dos prédios, localização, VPT e identidade dos proprietários) e art.º 13.º que dispõe no sentido da atualização da matriz ser efetuada com base na declaração apresentada pelo titulares”, o que no caso dos autos “não foi de todo cumprido, apenas se encontrando um mail/pedido dirigido ao SF datado de AGT2022 em que se solicita essa atualização matricial”,
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Sendo que tal incumprimento não pode ser imputado à AT mas, tão-somente, ao próprio Requerente, na medida em que o beneficio do nº 5 do art.º 10.º do CIRS se encontra “plasmado normativamente, sendo o mesmo do conhecimento do Requerente”, encontrando-se explícitos nessa mesma norma os diversos pressupostos para aquela exclusão, tais “como prazos, possibilidade de deduzir empréstimo ainda vigente à data da alienação geradora do ganho, destino do imóvel alienado e o novo adquirido e outros requisitos materialmente relevantes”, reputando a Requerida de “displicente a alegação de que” a exigência de atualização da matriz “só foi informada e invocada pela AT” já em sede da reclamação”,
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Ao que acresce a circunstância de “o pedido de atualização em sede patrimonial no prazo fixado no nº 6 do art.º 10.º não te[r], efetivamente, relevância para o apuramento da mais valia decorrente da alienação do imóvel sito em Arroios”, podendo antes relevar “para a ponderação, ou não, do beneficio de exclusão que pode ser total ou parcial (nº 9 do art.º 10.º do CIRS)”.
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Nesta senda, conclui a AT que o ato tributário contestado se mostra “legal, respeitando o princípio da igualdade face aos demais contribuintes em idênticas circunstâncias e cumprindo o princípio da justiça”, nada “havendo, por conseguinte, a censurar à liquidação contestada, pelo deve a mesma se manter na ordem jurídica, com o consequente decaimento da pretensão do Requerente”, devendo “o pedido ser julgado improcedente, com as devidas consequências legais”.
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Em sede de contra-alegações, a Requerida veio manter e reproduzir integralmente “o teor da sua Resposta oportunamente apresentada”, considerando que a “prova testemunhal e declarações de parte apresentadas”, “salvo o devido respeito, nada provaram ou acrescentaram aos factos relevantes que a AT entende serem os corretos e indicados em sede de resposta”.
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SANEAMENTO
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As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cfr. o artigo 4.º e o n.º 2 do artigo 10.º do RJAT, bem como o artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
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O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, à face do preceituado na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 5.º, do n.º 1 do artigo 6.º e do n.º 1 do artigo 11.º, todos do RJAT.
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O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado dentro do prazo de 90 dias previsto na alínea a), do n.º 1, do artigo 10.º do RJAT.
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Não existem exceções a apreciar e o processo não enferma de nulidades.
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Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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QUESTÕES A DECIDIR
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Objeto do pedido
O PPA submetido pelo Requerente tem por objeto imediato a decisão que negou provimento ao recurso hierárquico n.º ...2022..., mantendo a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2022..., deduzida contra o ato de liquidação de IRS n.º 2021... referente ao ano de 2017, no valor de EUR 21.190,63. Em termos mediatos, o PPA submetido pelo Requerente tem por objeto aquele ato tributário de liquidação de IRS, cuja anulação igualmente está em causa.
O Sujeito Passivo veio ainda requerer, no Ponto 31 do seu PPA, que “seja ordenada a suspensão das dois processos executivos que se encontram em curso, nomeadamente os processos n.ºs ...2022... e ...2018..., que estão directamente relacionados com a liquidação que aqui se pretende impugnar”, “até que seja emanada decisão neste processo (não obstante ter sido também requerida a suspensão junto do SF Lisboa ... estando igualmente a aguardar-se resposta)”, não tendo sido efetuados outros pedidos.
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Thema decidendum. Ordem de apreciação.
Em face do PPA apresentado pela Requerente e da Resposta apresentada pela AT, as questões a decidir no presente Processo Arbitral são as seguintes:
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A questão de saber se, para efeitos de exclusão da tributação em IRS de uma mais-valia apurada com a venda de um imóvel detido a título individual e destinado a habitação própria e permanente do Sujeito Passivo, o reinvestimento pode ser realizado na aquisição de um novo imóvel que é agora detido em compropriedade e destinado a habitação própria e permanente do Sujeito Passivo e do seu agregado familiar;
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A questão de saber se, igualmente para efeitos de exclusão da tributação em IRS de uma mais-valia apurada nos termos descritos em a), é possível cumular o reinvestimento na aquisição do novo imóvel com a realização de obras no mesmo, ainda que a realização de tais obras não tenha sido comunicada à AT no prazo de 48 meses ou se, caso assim não se entenda, é possível substituir o reinvestimento na aquisição pelo reinvestimento em obras; e
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A questão de saber se o Tribunal Arbitral é materialmente competente para declarar a suspensão dos processos de execução fiscal n.ºs ...2022... e ...2018... .
4. MATÉRIA DE FACTO
4.1 Factos provados
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
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Em junho de 2017, o Requerente alienou, pelo valor de EUR 262.500, um imóvel identificado sob o artigo ... e sito em ..., de sua propriedade plena e destinado à sua habitação própria e permanente (Ponto 4 da Resposta, Ponto 6 do PPA, Declarações de Parte e Modelo 3 junta aos autos pela AT).
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Em dezembro de 2017 foi celebrada a escritura de “Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca”, na qual o Requerente e B... adquiriram, pelo valor de EUR 175.000 e na qualidade de “Parte Compradora”, um imóvel identificado sob o artigo ...-... e sito na ... (cfr. doc. 4).
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O imóvel referido em 2. foi destinado pelo Requerente e por B..., de forma exclusiva, à sua habitação própria e permanente (cfr. doc. 4).
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O valor de EUR 175.000 referido em 2. foi pago da seguinte forma:
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EUR 17.500 por transferência bancária efetuada a 25.10.2017, data de celebração do Contrato Promessa de Compra e Venda, a partir da conta com o IBAN ... (Deutsche Bank AG), titulada pelo Requerente (cfr. doc. 3, 4 e 6, Declarações de Parte e Testemunho de B...);
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EUR 47.500 através do cheque bancário n.º ..., de 22.12.2017, emitido a partir de uma conta bancária conjunta titulada pelo Requerente e por B... com o IBAN PT50 ..., BPI, S.A. (cfr. doc. 4 e 5 e Ponto 12 do PPA);
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EUR 110.000 através do cheque bancário n.º ... do Banco BPI, S.A., de 22.12.2017, na sequência do pedido de empréstimo bancário realizado pelo Requerente e por B... naquele exato montante, do qual se confessaram solidariamente devedores (cfr. doc. 4).
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Entre outubro e dezembro de 2017, verifica-se que:
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Da conta bancária referida em 4.a) para a conta bancária referida em 4.b) foi feita uma transferência no montante de EUR 5.000, a 22.10.2017 e uma transferência no montante de EUR 34.500, a 15.12.2017 (cfr. doc. 5 e doc. 6);
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C... realizou uma transferência para a conta bancária referida em 4.b) no montante de EUR 8.535,65, em dezembro de 2017 (cfr. doc. 5), tendo em vista o pagamento de valores resultantes de um negócio que este cidadão havia estabelecido com o Requerente (cfr. declaração de parte e testemunho de C...).
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No Anexo G da Modelo 3 entregue pelo Requerente por referência ao exercício de 2017, este declarou os seguintes valores de realização e reinvestimento (cfr. Modelo 3 junta pela AT):
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Na sequência da Modelo 3 apresentada pelo Sujeito Passivo nos termos descritos em 6., foi emitida a liquidação de IRS n.º 2018..., com um rendimento global de EUR 39.397,42 e o valor total a pagar de EUR 9.873,31 (cfr. liquidação junta aos autos pela AT).
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A 10.11.2021, foi emitida a liquidação de IRS n.º 2021..., objeto mediato do presente PPA, com um rendimento global de EUR 63.442,40 e o valor total a pagar de EUR 21.190,63 (cfr. doc. n.º 2).
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Em virtude da compensação derivada do acerto de contas realizado a 12.11.2021, com o número 2021..., foi efetuado o estorno do valor de EUR 9.873,31 decorrente da liquidação 2018..., o que resultou num valor em dívida de EUR 11.317,32 (cfr. Processo Administrativo e liquidação junta aos autos pela AT).
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O valor total em dívida de EUR 11.317,32 foi objeto do Processo de Execução Fiscal n.º ...2022... instaurado a 7 de janeiro de 2022, não tendo esta dívida sido paga nem garantida (cfr. o Processo Administrativo e as Declarações de Parte).
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O Requerente interpôs reclamação graciosa contra a liquidação de IRS n.º 2021..., tendo tal reclamação sido autuada com o n.º ...2022..., sendo o seguinte o teor dessa reclamação (cfr. doc. 7 e 7.A):
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Depois de notificado, a 15 de fevereiro de 2022, para o exercício do direito de audição prévia sobre o projeto de decisão da Reclamação Graciosa, o Requerente exerceu esse direito (cfr. doc. n.º 7 e 7.A).
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A 11 de março de 2022 foi elaborada a decisão final do processo de reclamação graciosa na qual, e em suma, se concluiu que (cfr. doc. 7.A):
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A 13 de abril de 2022 deu entrada o Recurso Hierárquico interposto pelo Requerente contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa aludida no Ponto 14., tendo o mesmo sido autuado com o n.º ...2022... (cfr. doc. 9 e o Processo Administrativo).
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O Requerente exerceu o seu direito de audição prévia de forma oral e escrita (cfr. doc. 8).
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A 12 de julho de 2022, foi elaborada a decisão final de recurso hierárquico no Processo n.º ...2022... (cfr. doc. 1).
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O Requerente remeteu um e-mail ao SF... com o Assunto “Requerimento para entrega Modelo 1 com efeitos retroactivos” a 16 de agosto de 2022, tendo enviado novo e-mail a 11 de outubro de 2022 a questionar sobre o andamento do referido requerimento e referindo a intenção de dar entrada de recurso (cfr. doc. 60 e 61).
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A 17 de outubro de 2022 foi apresentado o Pedido de Constituição do Tribunal Arbitral.
4.2 Factos não provados
Não se deu como provado que o Requerente tenha procurado entregar a Modelo 1 de IMI referente a alegadas obras realizadas no edifício adquirido em dezembro de 2017 até ao mês de junho de 2021, uma vez que não foram juntos documentos que o provem nem foram arroladas ou indicadas testemunhas com conhecimento direto dos factos relevantes a esse respeito até essa data (v.g., junho de 2021).
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Motivação da matéria de facto
Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar os factos que importam para a decisão – levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta(m) o pedido formulado pelo autor, conforme o artigo 596.º, n.º 1 e o artigo 607.º, n.º 2 a 4, ambos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT – e consignar se considera tal matéria provada ou não provada, conforme resulta do artigo 123.º, n.º 2 do CPPT.
O Tribunal baseia a decisão à luz das regras da experiência, da normalidade e da racionalidade, inerentes ao princípio processual que rege a arbitragem tributária da “livre apreciação dos factos e [d]a livre determinação das diligências de produção de prova necessárias, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros”, previsto no artigo 16.º, alínea e) do RJAT, bem como no artigo 607.º, n.º 5 do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, onde se determina que o julgador “aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
Em concreto, o probatório acima fixado resultou da análise concatenada i) dos factos invocados nas peças processuais apresentadas pelas partes, ii) do acervo documental junto aos autos pelo Requerente e do Processo Administrativo junto aos autos pela Requerida e ainda iii) das Declarações de Parte e dos depoimentos das testemunhas B... (relativamente à titularidade da conta bancária no Deutsche Bank AG) e C... (relativamente ao motivo inerente à transferência bancária por este realizada), tendo estas testemunhas aparentado depor com isenção e com conhecimento direto dos factos que relataram. Quanto aos demais depoimentos testemunhais, demonstraram-se os mesmos irrelevantes para a apreciação dos factos pertinentes à boa decisão da causa, mormente sobre a tentativa de entrega da Modelo 1 de IMI referente a alegadas obras realizadas no edifício adquirido em dezembro de 2017 até ao mês de junho de 2021 (revelando-se, nessa medida, desnecessárias mais considerações sobre tais depoimentos no contexto do presente processo arbitral).
4. DO DIREITO
4.1. Da exclusão de tributação por via do reinvestimento na aquisição de nova habitação própria e permanente
Considerando a ordem das questões enunciada pelo Requerente no seu PPA e, bem assim, o disposto no artigo 124.º do CPPT, importa começar por perceber se, para efeitos de exclusão da tributação em IRS de uma mais-valia apurada com a venda de um imóvel detido a título individual e destinado a habitação própria e permanente do Sujeito Passivo, o reinvestimento pode ser realizado na aquisição de um novo imóvel que é agora detido em compropriedade e destinado a habitação própria e permanente do Sujeito Passivo e do seu agregado familiar.
Comecemos por atentar na redação da lei.
Ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, na redação em vigor à data dos factos, “são excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, desde que verificadas, cumulativamente, as seguintes condições:
a) O valor de realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, seja reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para construção de imóvel e ou respetiva construção, ou na ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal;
b) O reinvestimento previsto na alínea anterior seja efetuado entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da realização;
c) O sujeito passivo manifeste a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionando o respetivo montante na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação;
(…)” [nosso sublinhado].
A este respeito, e decidindo sobre uma situação semelhante à que está em causa nos presentes autos, pronunciou-se já a 18 de janeiro de 2013 o Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Processo n.º 84/2012-T (no âmbito do qual “o imóvel alienado era propriedade do cônjuge marido e fora construído no estado civil de solteiro e que o direito de propriedade sobre o prédio adquirido foi constituído no estado de casado, em regime de comunhão de adquiridos, em contitularidade com a sua mulher”, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira considerado como reinvestimento apenas “o valor imputável à sua quota-parte (50%), ou seja, metade do valor apurado”).
Nos seus traços fundamentais, decidiu aquele Tribunal Arbitral que o critério utilizado pela AT para reduzir o valor de reinvestimento excluído de tributação não encontra “qualquer suporte no disposto nos nºs 5 e 6 do artigo 10º do CIRS”, tratando-se de um critério restritivo e desproporcional que, enquanto tal, se afigura ilegal. Para o Tribunal, a “não tributação das mais-valias imobiliárias provenientes da alienação de imóvel afeto a habitação própria permanente, quando as mesmas sejam reinvestidas em bens com igual finalidade, é uma solução consagrada no nosso ordenamento jurídico à semelhança de outros, desde logo para proteção da família, por isso a lei se refere, sempre, ao sujeito passivo e seu agregado familiar, e à proteção do direito à habitação”, apenas podendo relevar “as circunstancias consagradas na lei como pressuposto para a exclusão da tributação”.
Lê-se ainda naquela decisão arbitral que “o legislador optou por consagrar a solução de considerar como unidade fiscal em sede de IRS a família ou o agregado familiar e não o indivíduo”, sendo que “a finalidade extrafiscal do disposto nos nºs. 5 e 6 do artigo 10º do CIRS é claramente a de promover o reinvestimento na aquisição, construção ou melhoramento de imóvel afeto à habitação própria e permanente do agregado familiar, sem fazer qualquer alusão a casamento, tipo de regime de casamento ou qualquer outra condição. Se o legislador não estabelece tal distinção, não está o aplicador da norma habilitado a fazê-la. Ora, a lei não contém qualquer exigência quanto à titularidade única do imóvel afeto a habitação própria permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, pelo que a AT parte de uma premissa errada: a de que, para que esta norma de exclusão de incidência da tributação seja aplicável na íntegra, o valor de realização terá de ser aplicado numa habitação própria e permanente de que o sujeito passivo venha a ser único e exclusivo proprietário. Nem a letra da lei nem a sua «ratio legis» nos permitem concluir que exista algum outro requisito para aplicação da exclusão de tributação, para além dos que se encontram enunciados no nº 5 do artigo 10º CIRS. Outro entendimento traduziria clara violação do princípio da tipicidade legal do imposto, o qual não admite qualquer margem de indefinição ou de discricionariedade administrativa nos seus elementos essenciais”.
Neste contexto, chamou ainda o Tribunal Arbitral à colação a recomendação do Senhor Provedor de Justiça, com o nº 18/ A/2012 (proc. nº R – 5515/10), em que se teve “por indubitável que a omissão legal de qualquer referência à titularidade do imóvel que constitui habitação própria e permanente do sujeito passivo e respetivo agregado familiar está em absoluta consonância com os princípios fundamentais do ordenamento jurídico fiscal, no que respeita à proteção do direito à habitação das famílias. (…) deste modo, e salvo melhor opinião, que nada autoriza o intérprete (administração fiscal, no caso) a estabelecer, por recurso às normas interpretativas comuns - tanto mais que por recurso ao direito civil, um dos ramos de direito mais longínquo do direito fiscal–, como pressuposto para exclusão integral da incidência da tributação dos ganhos obtidos, que a propriedade do imóvel alienado houvesse de pertencer a ambos os membros do casal, não se vendo aliás como possa, tão-pouco, «ficcionar» «um reinvestimento na aquisição da propriedade do novo imóvel com uma percentagem correspondente a 50%.» (…)”.
Ora, o entendimento adotado na decisão arbitral acabada de transcrever (e também, mais recentemente, na decisão arbitral proferida a 15 de setembro de 2022 no âmbito do Processo n.º 766/2021-T) é aquele que se afigura mais curial sendo, nessa medida, o entendimento que se adota no âmbito do presente processo arbitral. Considera-se, assim, como ilegal que a AT pretenda restringir a possibilidade de aplicação da norma de exclusão tributária prevista no n.º 5 do artigo 10.º do Código do IRS com base na verificação de um pressuposto negativo que a lei objetivamente não impõe e que a ratio legis da norma não sustenta, por ser amplamente reconhecido que o “propósito do regime de reinvestimento consiste em eliminar os obstáculos, relacionados com a tributação do rendimento, à mudança de habitação por parte dos indivíduos e famílias que disponham de casa própria” – Paula Rosado Pereira, “Manual de IRS”. 4.ª edição, 2022, Almedina, p. 249.
Aqui chegados, importa, contudo, aferir se é possível considerar como reinvestimento efetivo do valor de realização obtido pelo Requerente em 2017 o montante total de EUR 65.000 (que corresponde ao valor de aquisição da nova habitação deduzido dos montantes que resultaram de empréstimo bancário), uma vez que a Requerida, em sede de resposta, vem suscitar subsidiariamente a questão de que “tudo foi realizado com recurso a “meios próprios”, caso em que estaríamos perante “um investimento de um ganho, uma aplicação de rendimentos de mais valias, não tendo sido este o fim visado pelo legislador aquando da elaboração do regime de exclusão por via de reinvestimento em habitação onde se situe o centro de interesses do contribuinte e/ou do seu agregado”.
Sobre este aspeto, tem razão a AT no que se refere especificamente ao montante parcial de EUR 8.000, mas não quanto ao montante parcial de EUR 57.000. Senão, vejamos.
Como resulta do probatório (especificamente, dos factos 2, 4 e 5), e excluindo os valores que resultaram de empréstimo bancário, o pagamento do novo imóvel foi realizado por via de uma transferência de EUR 17.500 realizada diretamente a partir de uma conta bancária titulada pelo Requerente e por via de uma transferência de EUR 47.500 realizada a partir de uma conta bancária titulada pelo Requerente e pela sua companheira (o que totaliza o valor de EUR 65.000). Ora, a circunstância de o pagamento destes EUR 47.500 ter sido realizado a partir de uma conta conjunta não é relevante, por si só, para inquinar a existência de reinvestimento no caso em análise, na medida em que não só estamos perante a aquisição de um imóvel detido pelos dois elementos do agregado familiar (o que não pode resultar num desfavorecimento fiscal, nos termos anteriormente expostos), como se verifica que tal conta bancária foi alimentada em EUR 39.500 a partir de transferências realizadas pelo Requerente a título individual (concretamente em duas tranches de EUR 5.000 e de EUR 34.500, respetivamente).
Sucede que o remanescente (i.e., EUR 8.000, correspondentes a EUR 47.500 – EUR 39.500) não resultou de qualquer transferência bancária realizada diretamente pelo Requerente mas, antes, de uma transferência bancária realizada por C..., no montante de EUR 8.535,65, tendo em vista o pagamento de valores resultantes de um negócio que este cidadão havia estabelecido com o Requerente (cfr. facto 5) – e que, nessa medida, em nada se encontravam relacionados com o reinvestimento do valor de realização por este último obtido em 2017.
A este respeito, importa sublinhar que o “objectivo geral do regime de exclusão de incidência é, pois, não embaraçar a aquisição, imediata ou mediata, de habitação própria e permanente financiada com o produto da alienação de um outro imóvel a que fora dado o mesmo destino”. “Usa-se uma técnica de roll over, que torna não tributáveis essas mais-valias enquanto os valores de realização forem reinvestidos em imóveis também destinados à habitação e situados em território nacional” (José Guilherme Xavier de Basto. “IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos”, 2007, Coimbra Editora, p. 413). Nesta medida, a “efetiva exclusão tributária apenas se verifica se e quando ocorrer o reinvestimento, efetuado nos termos e dentro dos prazos estabelecidos legalmente” (Paula Rosado Pereira, ob. cit., pp. 250 e 251).
No mesmo sentido, pode ler-se na já referida decisão arbitral proferida a 18 de janeiro de 2013 no Processo n.º 84/2012-T, “o artigo 10º, nº5, do CIRS se apresenta como uma norma de delimitação negativa da incidência, teoricamente enquadrada no aspeto quantitativo do elemento objetivo da incidência, sendo que o conceito de reinvestimento é, no essencial, um conceito económico, em que o que releva é que os sujeitos passivos demonstrem que o valor da mais-valia realizada seja efetivamente reinvestida na aquisição do novo imóvel para o mesmo fim, nas condições e prazos previstos na lei”. Portanto, o que “a lei impõe” – e, como tal, importa verificar neste caso – é, por outras palavras, “que o respectivo ganho seja reinvestido, no prazo de 24 meses, na aquisição de um diferente imóvel e que este também tenha como destino a habitação do sujeito passivo ou do seu agregado familiar” (Acórdão do STA proferido a 14 de novembro de 2018 no âmbito do Processo n.º 01077/11.9BESNT).
Ora, no presente processo arbitral, o que se verifica é que: i) o imóvel alienado estava afeto à habitação própria e permanente do Sujeito Passivo (facto 1), ii) o imóvel adquirido foi destinado a habitação própria e permanente do Sujeito Passivo e, bem assim, do seu agregado familiar (facto 3), iii) relativamente ao montante de EUR 57.000 (composto pelos valores parciais de EUR 17.500 + EUR 5.000 + EUR 34.500), foram cumpridos os prazos legalmente previstos para a realização do reinvestimento, o qual foi realizado no próprio ano em que ocorreu a alienação (factos 4 e 5), mas que iv) o montante de EUR 8.000 não consistiu em reinvestimento dos valores de realização obtidos com a alienação do imóvel alienado pelo Requerente, antes resultando de um pagamento realizado ao Requerente na sequência da celebração de um negócio com C... (facto 5).
Como tal, verificam-se os pressupostos legais para a exclusão de tributação, em sede de categoria G do IRS, da mais-valia obtida pelo Requerente em 2017 apenas na proporção do valor de reinvestimento de EUR 57.000. Consequentemente, deverá a liquidação de IRS em apreço ser julgada parcialmente ilegal e, nessa medida, ser anulada na parte em que restringe o valor do reinvestimento a apenas metade do montante reinvestido na aquisição de nova habitação, sem considerar os montantes efetivamente reinvestidos pelo contribuinte (i.e., EUR 57.000), em obediência ao princípio da legalidade consagrado no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa.
4.2. Da exclusão de tributação por via do reinvestimento em obras
Dediquemo-nos agora à segunda questão suscitada nos autos, que consiste em saber se para efeitos de exclusão da tributação em IRS de uma mais-valia apurada com a alienação de uma habitação própria e permanente, é possível cumular o reinvestimento na aquisição do novo imóvel com a realização de obras no mesmo ou, alternativamente, se é possível substituir o reinvestimento na aquisição pelo reinvestimento em obras, ainda que a realização de tais obras não tenha sido comunicada à AT no prazo de 48 meses.
A este respeito, comece desde logo por se referir que apesar de a AT ter vindo, no contexto da sua resposta, a admitir a possibilidade de cumular o reinvestimento na aquisição com o reinvestimento na realização de obras, de tal circunstância não se pode extrair a conclusão, como pretende o Requerente, de “que o processo está ferido de ilegalidade (logo devendo ser considerado nulo) por estar assente em falsos pressupostos e errado aconselhamento”. Isto porque a AT manteve o entendimento (já sufragado em sede das decisões administrativas) de que, nos presentes autos, a exclusão de tributação da mais-valia obtida no ano de 2017 por via do reinvestimento em obras nunca poderia ser admitido por ausência de preenchimento dos pressupostos previstos para o efeito – e, como veremos, com razão para tanto.
Comecemos e este respeito por salientar que, nos termos do n.º 6 do artigo 10.º do CIRS, na redação em vigor à data dos factos, não haverá lugar ao benefício de exclusão de tributação de mais-valias “quando:
a) Tratando-se de reinvestimento na aquisição de outro imóvel, o adquirente o não afete à sua habitação ou do seu agregado familiar, até decorridos doze meses após o reinvestimento;
b) Nos demais casos, o adquirente não requeira a inscrição na matriz do imóvel ou das alterações decorridos 48 meses desde a data da realização, devendo afetar o imóvel à sua habitação ou do seu agregado até ao fim do quinto ano seguinte ao da realização;
(…)” [nosso sublinhado].
Do disposto na norma legal acabada de transcrever resulta expressamente que, no caso de reinvestimento em obras, o benefício de exclusão de tributação de mais-valias não poderá ser aplicado sempre que “o adquirente não requeira a inscrição na matriz do imóvel ou das alterações decorridos 48 meses desde a data da realização”. Assim, e por força desta expressa redação da norma em análise, não tem razão o Requerente quando alega que “confundir as exigências legais que afectariam o IMI com a admissibilidade das despesas para efeitos de cálculo das mais-valias é sem dúvida questionável em termos de admissibilidade”, uma vez que, como refere o TCA Sul no Acórdão proferido a 25 de novembro de 2021 no âmbito do Processo n.º 359/10.1BECTB, é o próprio CIRS que faz depender a exclusão da tributação, “entre outros, da correspondente declaração matricial, impondo, pois, que se trate de obras que impliquem uma alteração do valor matricial. Trata-se de uma exigência constante do CIRS, não se alcançando de que forma se pode considerar que tal entendimento viola o princípio da legalidade, se é a própria disciplina legal que vai no sentido propugnado”.
Verificando-se a admissibilidade legal daquela exigência, da mesma não se pode senão concluir que apenas será elegível para efeitos de exclusão de tributação das mais-valias realizadas o reinvestimento efetuado em obras de melhoramento (se, e na medida em que, o adquirente requeira a inscrição das alterações na matriz nos termos referidos na disposição legal). Com efeito, e conforme sufragado pelo TCA Sul no Acórdão anteriormente referido, a “obrigação de comunicação para efeitos matriciais permite concluir que nem todas as obras que se efetuem num imóvel são obras de melhoramento para efeitos de exclusão de tributação. Veja-se que, nos termos do art.º 13.º, n.º 1, al. d), do CIMI: “1 - A inscrição de prédios na matriz e a atualização desta são efetuadas com base em declaração apresentada pelo sujeito passivo, no prazo de 60 dias contados a partir da ocorrência de qualquer dos seguintes factos: (…) d) Concluírem-se obras de edificação, de melhoramento ou outras alterações que possam determinar variação do valor patrimonial tributário do prédio”. Daqui decorre, numa interpretação conjugadas das várias normas pertinentes in casu, que são, pois, obras elegíveis, para este efeito, aquelas de impliquem uma variação do VPT do prédio, dado serem essas que implicam uma alteração matricial”.
Ora, no caso dos autos, não resultou provado qual o tipo de obras realizadas pelo Requerente no imóvel adquirido (i.e., se se trataram de obras de melhoramento ou se não se trataram de obras de melhoramento). Contudo, tal qualificação não se afigura relevante para a resolução do caso vertente na medida em que, independentemente do tipo de obras em causa, nunca haveria lugar a exclusão de tributação.
Desde logo porque, não se tratando de obras de melhoramento, a respetiva realização não teria cabimento no regime de exclusão de tributação de mais-valias, conforme resulta da letra da lei e da jurisprudência do TCA Sul acima transcrita. E também porque, tratando-se de obras de melhoramento, o Sujeito Passivo não provou o cumprimento dos prazos legalmente exigidos para a inscrição das alterações na matriz, como era sua obrigação ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 74.º da LGT, o que inquina a possibilidade de exclusão de tributação da mais-valia realizada (tal como se decidiu a 13 de maio de 2022 no Processo nº 542/2021-T).
Na verdade, embora o Requerente reiteradamente afirme que a ausência de inscrição na matriz foi imputável à AT (quer por via de um errado aconselhamento, quer por via da recusa de recebimento efetivo da referida declaração), tem razão a Requerida quando observa que no caso dos autos apenas se encontra “um mail/pedido dirigido ao SF datado de AGT2022 em que se solicita essa atualização matricial”, sendo que tal incumprimento não pode ser imputado à AT mas, tão-somente, ao próprio Requerente, na medida em que o beneficio do nº 5 do art.º 10.º do CIRS se encontra “plasmado normativamente, sendo o mesmo do conhecimento do Requerente”, encontrando-se explícitos nessa mesma norma os diversos pressupostos para aquela exclusão, tais “como prazos, possibilidade de deduzir empréstimo ainda vigente à data da alienação geradora do ganho, destino do imóvel alienado e o novo adquirido e outros requisitos materialmente relevantes”, reputando a Requerida de “displicente a alegação de que” a exigência de atualização da matriz “só foi informada e invocada pela AT” já em sede da reclamação”.
Com efeito, considerando que a data de obtenção dos valores de realização a reinvestir ocorreu em junho de 2017, a necessidade de inscrição das obras na matriz para efeitos de exclusão tributária deveria ter sido realizada até ao mês de junho de 2021. Contudo, o Requerente não provou que dentro desse prazo de 48 meses (ainda que tal acontecesse depois de reunir todas as provas relativas ao tipo de obras, que de acordo com o que alega terminaram em 2020) tenha efetivamente procurado entregar a Modelo 1 de IMI, ao contrário do que faz para os pedidos extemporâneos de entrega desse Modelo.
Por outras palavras, não se pode dar como provado nos presentes autos que o Requerente tenha procurado entregar a Modelo 1 de IMI referente a alegadas obras realizadas no edifício adquirido em dezembro de 2017 até ao mês de junho de 2021, data limite para efetivar a entrega da referida Modelo 1, uma vez que não foram juntos documentos que o provem nem foram arroladas ou indicadas testemunhas com conhecimento direto dos factos relevantes a esse respeito até essa data. Na verdade, as testemunhas arroladas ou indicadas pelo contribuinte neste contexto apenas tiveram participação ou conhecimento dos factos sub judice depois do referido prazo de 48 meses, nomeadamente depois de instaurado o procedimento de reclamação graciosa pelo contribuinte.
Ademais, não pode deixar de se sublinhar que era ao Requerente que sempre caberia dar cumprimento ao disposto na lei para efeitos de aproveitamento da exclusão de tributação em causa nos presentes autos, cumprindo os requisitos e prazos aí estabelecidos, não podendo o eventual desconhecimento dos requisitos legais estabelecidos “ser alegado para o seu não cumprimento, tendo em conta o princípio consagrado no artigo 6.º do Código Civil, segundo o qual “A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.”, princípio plenamente aplicável ao direito tributário” (cfr. decisão arbitral proferida a 12 de outubro de 2018 no âmbito do Processo nº 137/2018-T). Bem assim, e no que à eventual admissibilidade dos pedidos extemporâneos de entrega da declaração Modelo 1 de IMI formulados pelo Requerente para efeitos de exclusão de tributação no caso sub judice respeita, importa não esquecer que a AT se encontra subordinada aos princípios da legalidade e da igualdade tributárias (cfr. arts. 5.º, 8.º e 55.º da LGT), não podendo ignorar e/ou ultrapassar os requisitos legais expressamente previstos pelo legislador tributário para a generalidade dos contribuintes nas normas e códigos fiscais (ao que acresce o princípio geral de indisponibilidade do crédito tributário, só podendo a AT fixar “condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária” (cfr. arts. 30.º e 36.º da LGT)). Razão pela qual não releva – nem pode relevar – para a decisão dos presentes autos apreciar se, depois de decorrido o prazo de 48 meses, o Requerente tentou ou não entregar a declaração Modelo 1 de IMI, porque o prazo que o legislador fiscal entendeu expressamente conceder neste contexto foi o prazo de 48 meses, não deixando tal matéria na disponibilidade das Partes.
Nestes termos, não pode ser dado provimento à pretensão do Requerente no que ao reinvestimento em obras respeita, devendo manter-se a liquidação recorrida nesta parte, por ausência de preenchimento dos pressupostos legais previstos para a consideração do reinvestimento em obras para efeitos de exclusão de tributação da mais-valia fiscal obtida em 2017 (quer por via da sua cumulação, como por via da sua substituição face aos valores de reinvestimento na aquisição de nova habitação).
4.3. Do pedido de suspensão dos processos de execução fiscal
Veio o Requerente solicitar, no Ponto 31 do seu PPA, que “seja ordenada a suspensão das dois processos executivos que se encontram em curso, nomeadamente os processos n.ºs ...2022... e ...2018..., que estão directamente relacionados com a liquidação que aqui se pretende impugnar”, “até que seja emanada decisão neste processo (não obstante ter sido também requerida a suspensão junto do SF Lisboa ... estando igualmente a aguardar-se resposta)”.
A este respeito, a Requerida AT nada disse.
Ao contrário da pretensão do Requerente, não pode este Tribunal Arbitral ordenar a suspensão dos referidos processos de execução fiscal, por ser materialmente incompetente para tanto.
Assim é, desde logo, na medida em que a competência dos tribunais arbitrais prevista no RJAT é taxativa, circunscrevendo-se às matérias expressamente previstas no art. 2.º daquele Regime Jurídico (nas quais não se inclui a competência em matéria de execução fiscal, nomeadamente para apreciação de eventuais oposições à execução).
E assim é, também, porque os efeitos do PPA ao nível da suspensão dos processos de execução fiscal correspondem aos efeitos da impugnação judicial nesse contexto (conforme resulta do disposto no n.º 5 do art. 13.º do RJAT), o que significa que a apresentação de um PPA apenas poderá conduzir à suspensão de um processo de execução se e na medida em que se encontrem cumpridos os requisitos legais para tanto, designadamente a prestação de garantia idónea nos termos dos artigos 169.º e 199.º do CPPT ou a atribuição de dispensa de prestação de garantia nos termos do artigo 52.º n.º 4 da LGT e do artigo 170.º do CPPT. Ora, esta suspensão do processo de execução fiscal deve ser invocada pelo Requerente junto do órgão de execução fiscal previsto no artigo 149.º do CPPT, o qual procederá à respetiva análise (sendo que, no contexto do presente PPA, o Requerente assumiu já ter sido “requerida a suspensão junto do SF Lisboa ...”). Na verdade, e como se pode ler no Ac. do TCA Sul proferido a 14.01.2021 no âmbito do Proc. n.º 34/20.9BELRA, “a suspenção da excução constitui matéria da competência da Administração Tributária nos termos previstos na lei do processo tributário nomeadamente nos artigos artigo 52.º, n.ºs 1, 2 e 4, da Lei Geral Tributária (LGT) e 169.º e 199.º do CPPT”, referindo-se também no Acórdão proferido pelo STA a 21 de novembro de 2019 no âmbito do Processo n.º 0892/19.0BEBRG que “se a Executada pretendia que a execução fiscal fosse suspensa, teria de endereçar o pedido de suspensão ao órgão da execução fiscal e não ao tribunal tributário”.
Termos em que é o Tribunal Arbitral materialmente incompetente para determinar a suspensão dos processos de execução fiscal supra identificados.
5. DECISÃO
Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados, decide-se:
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Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação do ato de liquidação de IRS n.º 2021... referente ao ano de 2017 e a decisão que negou provimento ao recurso hierárquico n.º ...2022..., na parte em que não reconhecem o reinvestimento de EUR 57.000 efetuado pelo Requerente na aquisição do novo imóvel;
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Condenar a Requerente e a Requerida no pagamento das custas, na proporção do respetivo decaimento; e
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Julgar o Tribunal Arbitral materialmente incompetente para determinar a suspensão dos processos de execução fiscal n.º ...2022... e n.º ...2018... .
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Valor: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do CPC, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e no artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de EUR 21.190,63 (vinte e um mil, cento e noventa euros e sessenta e três cêntimos).
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Custas: Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em EUR 1.224. Ao abrigo do disposto nos artigos 12.º n.º 2 e 22.º n.º 4 do RJAT e no artigo 527.º n.º 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo do Requerente e da Requerida AT, na proporção do respetivo decaimento, sendo EUR 974,67 da responsabilidade do Requerente (em função da proporção de 79,63%) e EUR 249,33 da responsabilidade da Requerida AT (em função da proporção de 20,37%).
As proporções foram calculadas tomando por base o decaimento de cada uma das partes em função dos valores de reinvestimento em causa nos autos, no montante total de EUR 120.290,01 (correspondentes a EUR 32.500 de reinvestimento em aquisição e EUR 87.790,01 de reinvestimento em obras), tendo a AT obtido vencimento relativamente a 79,63% desse montante (EUR 8.000 + EUR 87.790,01).
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Notifique-se.
Lisboa, 8 de setembro de 2023.
A Árbitra,
Ana Paula Rocha
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