Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 573/2022-T
Data da decisão: 2023-09-01  IVA  
Valor do pedido: € 159.140,67
Tema: IVA – direito à dedução; descritivos das faturas
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SUMÁRIO:

 

I.            As consequências do incumprimento da alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA (no caso, descrição da natureza e extensão dos serviços prestados), relativamente ao exercício do direito à dedução, têm que ser determinadas à luz da jurisprudência do TJUE, dado o seu caráter vinculativo para os tribunais nacionais dos estados-membros.

II.           Irrelevam assim precedentes jurisprudenciais nacionais que a contrariem.

III - A jurisprudência do TJUE entende que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. [Vai] no sentido de que se opõe a que as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades dispõem de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos.

IV– As questões da verdade e da suficiência e dos descritivos constantes das faturas terão, assim, que ser apreciados caso a caso.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros Prof. Dr. Rui Duarte Morais, Dra. Cristina Coisinha e Dr. António Pragal Colaço, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar este Tribunal Arbitral Coletivo, decidem o seguinte:

 

 

I - RELATÓRIO

 

A..., LDA, NIPC ..., com sede em ... n.º..., ...-..., ..., ..., veio, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária - “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

1.           O Pedido

 

A Requerente interpôs reclamação graciosa contra liquidações adicionais de IRC e IVA decorrentes de procedimento inspetivo relativo ao ano de 2018 feito ao abrigo da ordem de serviço OI 2020... .

 

As liquidações de IVA, incluindo juros compensatórios, são no valor global de € 159.140,47 (cento e cinquenta e nove mil, cento e quarenta euros e quarenta e sete cêntimos).

 

A Requerente pede a anulação das liquidações de IVA, bem como correspondente parte da decisão de indeferimento da reclamação graciosa e, ainda, a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

2.           O litígio

 

Está em causa a não-aceitação do direito à dedução do imposto titulado por determinadas faturas.

A AT considera que as operações não estão devidamente registadas em termos de exigibilidade do conteúdo descritivo das faturas, verificando-se a impossibilidade de avaliar as operações económicas em si mesmas, por ausência de discriminação dos serviços prestados.

 

2.1         .Posição da Requerente

 

A Requerente entende que as operações em questão ocorreram, pelo que a respetiva materialidade não pode deixar de se sobrepor às formalidades que alegadamente estão em falta, isto é, ao descritivo insuficiente das faturas, que a IT considerou ser o vício que deve determinar a exclusão do direito à dedução.

 

 

2.2         – Posição da Requerida

 

Na sua resposta, a Requerida AT defende-se por impugnação, defendendo a legalidade do indeferimento da reclamação graciosa e do correspetivo ato de liquidação, secundando-se no procedimento inspetivo com os fundamentos vertidos no Relatório de Inspeção Tributária.

 

3- Tramitação processual

 

1.           O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 28.09.2022.

 

3.           Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou os árbitros, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

4.           Em 21/11/2022, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

5.           Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 13/12/2022.

 

6.           Por despacho de 21/12/2022, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 17.º do RJAT, foi ordenada a notificação do dirigente máximo da Administração Tributária para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso queira, solicitar a produção de prova adicional, acrescentando que devia ser remetido ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do mesmo prazo, tendo a mesma vindo a deduzir Resposta por requerimento impetrado em 02/02/2023 e procedido à junção do processo administrativo em 27/02/2023.

 

7.           Por despacho arbitral proferido em 13/02/2023, foram as partes notificadas para a realização da reunião a que se refere o art. 18º do RJAT e audição das testemunhas, para o dia 2/3/2023, reunião que se veio efetivamente a realizar, encontrando-se devidamente gravados os depoimentos no sistema da CAAD e descrita a audiência na respetiva ata.

 

8.           Não tendo sido possível proceder à inquirição de uma testemunha indicada pela Requerida, decidiu-se a continuação da sessão para o dia 22/3/2023, mas, por requerimento impetrado em 10/3/2023, foi prescindida pela Requerida a inquirição da mesma, o que foi devidamente aceite pelo Tribunal através de despacho arbitral desse mesmo dia.

 

9.           Por requerimento impetrado em 21/4/2023, foram juntas as alegações da Requerente, bem como o pagamento da taxa arbitral, tendo por sua vez a Requerida produzido as suas alegações a 27/4/2023 (sendo que a Requerida não se terá apercebido estarem em causa, neste processo arbitral, apenas as liquidações de IVA).

 

10.         Por requerimento impetrado em 28/4/2023, veio a Requerente responder às alegações da Requerida invocando que, existia um lapso na identificação do gerente no art.º 47.º das alegações da Requerida.

 

11.         Por despacho arbitral de 2/6/2023 foi prorrogado por 2 meses o prazo para a prolação da decisão final. Em 02-08-2023 foi decidida nova e igual prorrogação desse prazo.

 

III  - SANEAMENTO

 

O processo não enferma de nulidades ou irregularidades. Não foram deduzidas exceções.

 

 

IV - MATÉRIA DE FACTO:

 

A.           Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

1.           A Requerente tem como atividade principal a realização de análises veterinárias.

 

2.           Em resultado da inspeção tributária acima identificada, foi realizada uma correção à matéria coletável de IRC, que originou uma liquidação adicional deste imposto, e uma correção em IVA, que deu também origem a uma liquidação adicional deste imposto, relativa ao período 1812T e com o n.º ..., no valor de € 142.600,00, acrescidos de juros compensatórios no valor de € 16.540,47, com correção no valor do reporte em sede de conta corrente.

 

3.           A Requerente interpôs reclamação graciosa contestando tais liquidações, de IRC e de IVA e respetivos juros compensatórios, a qual foi indeferida em 22/6/2022.

 

4.           A Requerente interpôs o presente pedido de pronúncia arbitral somente no tocante à liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios.

 

5.           As faturas que, no entendimento da AT, não obedecem aos preceitos legais que permitem a dedução do IVA delas constante são as seguintes:

 

 

 

6.           As faturas emitidas pela B... ,SA., apresentam o seguinte descritivo. “Serv. Prestados Gestão serviços de gestão referente a 2018 conforme contrato” (ou, nuns casos, “conforme n/ acordo”).

 

7.           A B..., SA. tem como objeto social atividades de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas, designadamente quanto a planeamento, organização, controlo, informação e gestão, reorganização de empresas, gestão financeira e objetivos e políticas de marketing; atividades de supervisão e gestão de outras sociedades, sejam ou não do mesmo grupo económico, nomeadamente, nos domínios do planeamento estratégico e organizativo, incluindo a prestação de serviços de carácter administrativo; atividade de compra e venda de bens imobiliários, incluindo as atividades de arrendamento e exploração de bens imobiliários próprios ou arrendados.

 

8.           Do constante do Protocolo de Colaboração celebrado a 01-11-2018 entre a Requerente e a B..., que subjaz à emissão das faturas por esta, releva o seguinte: 

- o seu objeto é a "prestação de serviços de gestão nomeadamente apoio à gestão comercial e a abertura da nova filial da empresa no Alentejo bem como revisão de procedimentos internos e preparação para certificações obrigatórias".

- que os colaboradores da primeira outorgante realizarão a sua prestação de serviços integrados na organização da segunda outorgante, sob as orientações da administração desta.

- que o valor contratado (170.000,00 euros anuais, sujeito a revisões periódicas) seria pago, no decurso de cada ano, mediante a apresentação das respetivas faturas pela segunda outorgante.

 

9.           As faturas emitidas pela C..., SA., têm como descritivo “Serv. Prestados Gestão serviços de gestão referente a 2018 conforme contrato" (duas primeiras) e “Serv. Prestados Gestão serviços de gestão durante o ano de 2018 conforme n/acordo" (duas últimas).

 

10.         As cláusulas aqui relevantes do Protocolo de Colaboração celebrado entre a Requerente e a C..., que subjaz à emissão das faturas por esta, são coincidentes com o constante do protocolo celebrado com a B... .

 

11.         O objeto social da C... é coincidente com o da B... .

 

12.         As faturas emitidas pela D..., SA, têm como descritivos: “Prestação de serviços realizados de Janeiro a Junho de 2018, conforme Contrato” e “Prestação de serviços realizados de Julho a Dezembro de 2018, conforme Contrato”.

 

13.         O objeto constante de tal contrato era a prestação de serviços na área da gestão financeira, cabendo-lhe em exclusivo a preparação, organização e planificação dos serviços.

 

14.         A D..., SA. tem como objeto social a exploração agro-pecuária.

 

15.         As faturas emitidas pela E..., SA, tinham como descritivos “Prestação de serviços de apoio à Gestão” e “Prestação de serviços de apoio à Gestão. Conforme Contrato celebrado entre as partes".

 

16.         Os serviços contratados com a E… eram, também, na área da gestão financeira, sendo a sua descrição contratual idêntica à constante do protocolo celebrado com a D..., SA.

 

17.         A E..., SA, tem como objeto social a produção pecuária e abate, transformação e comércio de produtos de origem animal. Transformação, fabricação e comercialização de produtos de origem animal. Valorização de resíduos de origem animal ou vegetal. Produção de energia.

 

18.         Em 2017 e 2018, a carteira de clientes da Requerente conheceu um aumento substancial (doc.1 junto ao requerimento inicial), devido, em especial, a importantes contratos para análises clínicas implicadas pela exportação de borregos para Israel.

 

19.         Nesse período, todos os funcionários da Requerente, com uma exceção, estavam afetos exclusivamente a funções laboratoriais.

 

20.         A Requerente não dispunha de meio físicos específicos para o exercício de outras tarefas que não as de laboratório/produção, nem de quaisquer meios humanos próprios para a realização de trabalhos ao nível administrativo, marketing, gestão de recursos humanos, departamento financeiro e comercial (vg., quanto às compras, vendas, emissão de faturação, recebimentos, acompanhamento de clientes e fornecedores, recrutamento de pessoal, processamento de salários, contactos com instituições financeiras, etc…).

 

21.         A B... prestou, essencialmente, serviços relativos a questões financeiras e de contabilidade.

 

22.         A C... prestou essencialmente serviços relativos à gestão comercial e coordenação da atividade operacional da Requerente, incluindo o relativo à contratação de pessoal e aquisição de equipamentos laboratoriais.

 

23.         A E... prestou serviços na parte comercial, essencialmente, contactos com os criadores para angariação de clientes, incluindo apoio à celebração de contratos com estes.

 

24.         A D... prestou serviços na área logística, nomeadamente na recolha junto dos criadores das amostras a serem analisadas

 

 

Os factos dados como provados de 1 a 17 resultam de documentos juntos aos autos e não foram objeto de controvérsia.

Os factos dados como provados de 18 a 24 resultaram da audição do depoente e da audição das testemunhas.

No entender do tribunal, quer o depoente quer as testemunhas eram totalmente conhecedoras dos factos sobre que incidiram os seus depoimentos, falaram com verdade e, até, com notável espontaneidade, o que conduziu à prova de factos nem sempre coincidentes com o interesse da Requerente, que as havia arrolado.

 

 

B.           Factos não provados

 

Não se consideraram não provados factos com relevância para a decisão arbitral.

 

 

 

IV - DO DIREITO

 

1-           Temas a decidir

As questões a dirimir nos presentes autos são as seguintes:

a.           A correção efetuada pela Requerida e a consequente liquidação, que não aceitou as facturas como passíveis de dedução em sede de IVA está de acordo com as normas legais?

b.           A ser julgada procedente a primeira questão, o Requerente tem direito à anulação de juros indemnizatórios?

 

2.           O essencial da fundamentação invocada pela AT assenta no seguinte (apenas consideraremos o relativo ao IVA, uma vez que a Requerente só impugna as liquidações adicionais deste imposto):

.

-  “As exigências relativas à emissão de faturas, elencadas no n.º 5 do artigo 36 º do CIVA, visam evitar a fuga e evasão fiscais e dai terem sido estabelecidos, de uma forma pormenorizada, vários requisitos que devem na integra ser respeitados aquando do preenchimento das faturas sob pena de não ser possível a dedução do IVA nelas liquidado.”(…)

-  Na verdade, é reconhecido o caracter formalista do IVA, em ordem nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respetivas formalidades o são “ad substanciam”, que não meramente “ad probationem”.” (in Ac. STA, Processo 902/07 de 31-01-2008)”(…)

 

Contudo, não se perceciona:

             quantos trabalhadores estão envolvidos em cada uma das prestações de serviços incluídas naquelas faturas;

             em que momentos cada um desses trabalhadores esteve afeto aquela prestação de serviços;

             que tarefas efetivamente desenvolveram;

             em que medida (quantidade de horas afetos aquelas tarefas), cada um dos trabalhadores contribuiu para aquela operação económica;

             que categoria/especialização profissional detinham e qual a valorização individual do trabalho desenvolvido por cada um desses colaboradores;

             onde são desenvolvidos os serviços, nas instalações do próprio, do prestador de serviço ou outro?

             Conforme podemos verificar a descrição constante de todos aqueles documentos é parca, não mencionado que funções exatamente estão ali incluídas, não sendo referida a quantidade de horas/dias associadas aos serviços prestados, não sendo possível verificar se foi apenas um trabalhador ou se pelo contrário foram vários os envolvidos na mesma prestação de serviços, nem sequer identificado de forma inequívoca o objeto de cada umas das intervenções/prestações de serviços, impossibilitando a AT de conferir, entre outros aspetos, a capacidade do prestador de serviços para a sua consecução.

             Consequentemente, pela ausência de discriminação conveniente, é também vedada à AT a hipótese e o direito que lhe assiste na tomada de conhecimento dos serviços e respetivos preços individualizados e unitários de cada um dos itens concorrentes para a formação do preço global final.

             Perante as falhas detetadas a AT fica, também neste caso em concreto, impossibilitada de inteligir toda a abrangência do negócio, impedida de avaliar a operação económica em si mesma, não permitindo que a AT avalie da relação da mesma com a atividade do SP, como até a necessária validação da capacidade global do próprio prestador de serviços a efetiva consecução da mesma.

 

3.           Está em causa o cumprimento, pelas entidades emitentes das faturas em causa, do disposto na alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA, segundo o qual as faturas devem conter” A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável”.

 

4.           A jurisprudência mais antiga entendia que a factura ou documento equivalente que não respeite integralmente o artigo 35° n° 5 do CIVA não está passada "em forma legal" e, consequentemente, não permite deduzir o respectivo imposto. No caso que nos ocupa, nas facturas em causa não se mostram cumpridas as exigências formais contidas nas als. b) e c) do citado nº 5 do art. 35º do CIVA, pois não estão discriminados nem os serviços (nem a sua natureza) que em concreto foram prestados e a que se referem aquelas facturas, nem as quantidades unitárias ou totais dos mesmos. (Ac do TCAS de 15 de Outubro de 2002, proc. nº 06153/01). No mesmo sentido, p. ex., ac. do TCAS, Processo 07282/14, datado de10-07-2014, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo 08611/15, datado de 11-01-2018 -  o Ac. do TCAN, Processo 01645/09, de 15-04-2021).

 

5.           Recorremos, agora, à decisão arbitral do CAAD no processo n.º 767/2016-T (reproduzida na recente decisão arbitral que pôs fim ao processo nº 334/2022-T, datada de 2023-03-13) “[s]endo o IVA um imposto de matriz comunitária, impõe-se tecer algumas considerações prévias relativamente à natureza e amplitude do direito à dedução, considerando nesta análise as regras que regem este imposto de acordo com o Direito da União Europeia, com a respetiva transposição a nível interno e com a interpretação administrativa e judicial que sobre as mesmas tem vindo a ser levada a cabo, especialmente pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE). A este respeito importará analisar a questão da dedutibilidade do IVA, tendo em conta a interpretação do disposto nos artigos 168.º da Diretiva IVA (DIVA) e os artigos 19.º n.º 3 do Código do IVA.”

Neste âmbito o “[…] direito à dedução faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado, exercendo-se imediatamente em relação à totalidade do IVA que incidiu sobre as operações a montante.

As situações expressas de exclusão do direito à dedução são excecionais e reportam-se a casos específicos enunciados pelo legislador nacional em termos taxativos, de acordo com o estatuído na DIVA, em função do tipo de despesas em causa.

As regras do exercício do direito à dedução do imposto contemplam requisitos objetivos, mais ligados ao tipo de despesas, subjetivos, relativos ao sujeito passivo, e temporais, atinentes ao período em que é possível exercer o direito à dedução do IVA, os quais se devem verificar em simultâneo para se exercer o direito à dedução.

Como requisitos objetivos do exercício do direito à dedução do IVA temos, nomeadamente, o facto de o imposto suportado dever constar de fatura passada na forma legal (ou seja, deverá obedecer, nos seus requisitos, aos termos gerais previstos no atual artigo 36.º, n.º 5, e artigo 40.º do Código do IVA), de se tratar de IVA português, e de a despesa, por si, conferir o direito à dedução do imposto (isto é, não se deve tratar de uma despesa excluída do direito à dedução, nos termos do disposto no artigo 21.º do Código do IVA).

Como requisitos subjetivos do exercício do direito à dedução do imposto determina-se, nomeadamente, que os bens e serviços deverão estar diretamente relacionados com o desenvolvimento de uma atividade económica. Com efeito, de acordo com a DIVA, no artigo 168.º (transposto, em parte, pelo artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do Código do IVA), o sujeito passivo pode deduzir o IVA suportado no Estado membro em que se encontra estabelecido, nas transmissões de bens e prestações de serviços, assim como operações assimiladas nas aquisições intracomunitárias de bens e nas importações ali localizadas, desde que “os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas (…)”.

Acresce que este normativo, em conformidade com as regras do Direito da União Europeia, vem exigir que exista um nexo de causalidade entre o bem ou serviço adquirido (input) e o output tributado, para que o IVA seja susceptível de ser dedutível. Isto é, o IVA suportado a montante numa determinada operação só é dedutível na medida em que possa estar relacionada a jusante com uma operação efetivamente tributada, devendo a relação ser aferida em função do reporte e inclusão do custo suportado, no preço da operação tributada.

Acresce referir que qualquer limitação do direito à dedução deve observar os princípios da proporcionalidade e da igualdade o que pressupõe uma ponderação equilibrada dos benefícios derivados da medida e do sacrifício que esta implica”.

 

6.           Temos, portanto, um ponto de partida. A recusa do direito à dedução tem que ser assumida como sendo uma verdadeira exceção, apenas podendo ser aceite, à luz do Direito da União e da jurisprudência do TJUE em situações muito restritas.

 

7.           Hoje, a Diretiva 2006/112/CE, de 28 de Novembro de 2006, que procedeu à reformulação global da 6ª Diretiva IVA, determina, no seu art. 226º, que Sem prejuízo das disposições específicas previstas na presente directiva, as únicas menções que devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas facturas emitidas em aplicação do disposto nos artigos 220º e 221º são as seguintes: (…)

6) A quantidade e natureza dos bens entregues ou a extensão e natureza dos serviços prestados;

 

8.           Façamos agora uma breve resenha da jurisprudência do TJUE que, por vincular os tribunais nacionais dos estados-membros, se sobrepõe a quaisquer precedentes jurisprudenciais dos tribunais nacionais.

 

Entre os relativamente numerosos casos apreciados relativos a esta temática, referiremos apenas o acórdão Barlis, 15 de setembro de 2016, no processo C 516/14, por estar em causa um pedido de reenvio prejudicial formulado pelo STA.

Citamos:

 

26 - Em primeiro lugar, o artigo 226.°, n.° 6, da Diretiva 2006/112 exige que a fatura contenha a menção da extensão e natureza dos serviços prestados. A redação desta disposição indica assim que é obrigatório especificar a extensão e natureza dos serviços prestados, sem contudo precisar que é necessário descrever os serviços específicos prestados de forma exaustiva.

   33 -  Por conseguinte, há que considerar que uma fatura que contenha apenas a menção «serviços jurídicos prestados até ao presente» , sem especificar uma data de início do período de faturação, não preenche os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.° 7, da Diretiva 2006/112.

 

Quanto à segunda parte da questão, relativa às consequências de uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, da Diretiva 2006/112 para o exercício do direito a dedução do IVA

 

 42 -  O Tribunal de Justiça declarou que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Por conseguinte, quando a Administração Fiscal dispõe dos dados necessários para saber que os requisitos materiais foram cumpridos, não pode impor condições suplementares ao direito do sujeito passivo de dedução do imposto que possam ter por efeito eliminar esse direito (v., neste sentido, acórdãos de 21 de outubro de 2010, Nidera Handelscompagnie, C 385/09, EU:C:2010:627, n.° 42; de 1 de março de 2012, Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz, C 280/10, EU:C:2012:107, n.° 43; e de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C 183/14, EU:C:2015:454, n.os 58, 59 e jurisprudência aí referida).

 

44- A este respeito, a Administração Fiscal não deve limitar se ao exame da própria fatura. Deve igualmente ter em conta informações complementares prestadas pelo sujeito passivo. Esta constatação é confirmada pelo artigo 219.° da Diretiva 2006/112 que equipara a fatura qualquer documento ou mensagem que altere a fatura inicial e a ela faça referência específica e inequívoca.

 

 49- Decorre das considerações precedentes que há que responder à segunda parte da questão submetida que o artigo 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades dispõem de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos.

 

9- No caso concreto, a AT não invoca, na fundamentação das liquidações impugnadas, a existência de quaisquer indícios de fraude ou evasão fiscal, mas sim que Conclui-se, em face da legislação acima mencionada, que a exigência ao nível dos formalismos dos documentos de suporte das operações económicas intervencionadas pelo SP é idêntica àquela evidenciada para efeitos de tributação em IRC e já abordada no presente relatório. Dessa forma, compilam-se adiante os resumos dos documentos de suporte que não respeitam os normativos legais para o IVA neles liquidado seja fiscalmente aceite nos termos da alínea a) do nº 2 do art.º 19º do CIVA, os quais já constam da análise anterior efetuada em termos de IRC.

E

Em face da insuficiência de informação vertida naqueles documentos com as falhas anteriormente apontadas (…) conclui-se que as mesmas obstam à tomada de conhecimento por parte da AT da génese de cada um daqueles negócios, inviabilizando a correlação dos mesmos com os níveis de atividade exercida e evidenciada pelo SP no ano de 2018, não permitindo a verificação do cumprimento do disposto no art.º 20º do CIVA

 

10. No estrito plano do IVA, há que concluir que as entidades emitentes das faturas em causa nos presentes autos entregaram ao Estado o IVA nelas liquidado, que a Requerente deduziu, uma vez que nada foi alegado ou provado em contrário

 

11. A fundamentação das liquidações impugnadas sofre de uma “entorse inicial”: foi concebida, essencialmente, para justificar as correções operadas em sede de IRC, a não-aceitação como gastos fiscalmente dedutíveis dos montantes titulados pelas faturas em questão.

Ou seja, a não-aceitação da dedução da dedutibilidade do IVA surge, de algum modo, como sendo uma “sequela” de conclusões extraídas por referência ao IRC.

O que dificulta a decisão deste tribunal arbitral, uma vez que lhe foi pedido apenas que apreciasse a legalidade das liquidações de IVA.

Assim, este tribunal está circunscrito à fundamentação constante do RIT relativa às liquidações de IVA (incluindo as remissões nela operadas para a fundamentação das liquidações adicionais de IRC), não podendo apreciar legalidade das liquidações de IRC e, sendo o caso, “projetar” as suas conclusões para as liquidações de IVA.

 

12 – Tudo visto, temos que:

 

Sendo a alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA mera transposição do art.226º 6) da atual Diretiva IVA, há que entender, indo além do teor literal da norma nacional, que as únicas menções que obrigatoriamente devem constar das faturas são a extensão e natureza dos serviços prestados;

 

Segundo a jurisprudência do TJUE :

- a “descrição dos serviços” constantes das faturas pode ser validamente completada através de outros meios de prova;

- a dedução do IVA pago a montante deve, em princípio, ser concedida se os requisitos substanciais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais;

- se o incumprimento das exigências não for suprido por prova certa de que as exigências materiais foram observadas é legítima a recusa do direito à dedução.

 

13- Do que decorre, em primeiro lugar, que não tem qualquer suporte, ao nível do Direito da União e da jurisprudência do TJUE (e do teor da própria alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA) a pretensão da AT de que as faturas  teriam que discriminar quantos trabalhadores estão envolvidos em cada uma das prestações de serviços em que momentos cada um desses trabalhadores esteve afeto aquela prestação de serviços; que tarefas efetivamente desenvolveram em que medida (quantidade de horas afetos aquelas tarefas), cada um dos trabalhadores contribuiu para aquela operação económica; que categoria/especialização profissional detinham e qual a valorização individual do trabalho desenvolvido por cada um desses colaboradores; onde são desenvolvidos os serviços, nas instalações do próprio, do prestador de serviço ou outro?

 

Aliás, uma tal pretensão resulta algo absurda: os sujeitos passivos, ao emitir faturas, teriam que passar a delas fazer constar um verdadeiro relatório de atividades.

Isto sem prejuízo de se reconhecer,- como já afirmado - que esta fundamentação terá sido pensada essencialmente na perspectiva do IRC.

 

15- Há também que frisar que a indicação da extensão dos serviços prestados não significa, necessariamente, uma descrição do preço /hora de cada um dos trabalhadores envolvidos.

No caso, analisando o teor dos contratos para que os descritivos da faturas expressamente remetem, resulta que, pelo menos relativamente à B... e à C..., então em causa contratos ditos de “avença”.

Ou seja, o contratado não foi a prestação de serviços por um número x de trabalhadores, eventualmente com diferentes qualificações profissionais, durante um número Y de horas.

A contratada comprometeu-se a realizar determinados serviços, genericamente definidos, sabendo que o seu volume e dificuldade poderiam ser variáveis, a troco de uma contrapartida previamente fixada.

Contrapartida que, pelo menos num caso, era revista em função do êxito económico da Requerente (e não do volume de trabalho realizado nos períodos anteriores) como, limpidamente, declarou ao tribunal o depoente I…. O que poderá suscitar questões ao nível do IRC, dadas as relações especiais existentes entre as sociedades em causa, mas não ao nível do IVA.

 

Num contrato de avença é faturado não o trabalho efetivamente realizado mas a remuneração previamente acordada, com referência a determinado período de tempo.

Indicação esta que consta das faturas em questão (nuns casos por referência ao ano de 2018, noutros aos semestres desse ano).

 

Mostra-se assim suficientemente cumprida a exigência legal (do artº 226º da Diretiva IVA e, consequentemente, da alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA), ou seja, as faturas em causa respeitam, neste ponto (extensão dos serviços), as exigências legais.

 

16 Analisemos agora a situação relativamente a cada uma das sociedades emitentes das faturas em causa:

 

a)  B...,SA

 

•             O descritivo das faturas identifica os serviços prestados como sendo serviços de gestão

•             A prestação de serviços de gestão corresponde ao essencial do objeto desta sociedade (atividades de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas, designadamente quanto a planeamento, organização, controlo, informação e gestão, reorganização de empresas, gestão financeira e objetivos e políticas de marketing; atividades de supervisão e gestão de outras sociedades, sejam ou não do mesmo grupo económico, nomeadamente, nos domínios do planeamento estratégico e organizativo, incluindo a prestação de serviços de carácter administrativo).

 

•             Como dado por provado,  B... prestou, essencialmente, serviços relativos a questões financeiras e de contabilização.

 

•             O tribunal, atenta a prova produzida, não tem dúvidas quanto à necessidade de a Requerente contratar externamente estes serviços, uma vez que não possuía quaisquer recursos físicos e humanos para os realizar.

 

•             É da experiência comum que uma sociedade comercial não pode atuar no mercado e cumprir com as suas obrigações legais, nomeadamente as declarativas em sede tributária, sem utilizar este tipo de serviços.

 

O que permite a este tribunal concluir:

 

- ficou provado que os serviços  prestados pela B... se enquadram na descrição constante das faturas (serviços de gestão), descritivo que corresponde à designação usual deste tipo  de serviços, muito embora, em rigor, tal descrição seja insuficiente para, sem mais, os identificar.

 

- não existe quaisquer indícios de que a B... não tenha prestado os serviços que faturou, bem antes pelo contrário.

 

Assim sendo, atenta a prova complementar produzida e que a AT, no decurso da ação inspetiva, teve acesso ao contrato para que o descritivo das faturas remete, há que concluir que a B... cumpriu com a obrigação legal imposta pelos referidos dispositivos legais, ainda que de uma forma algo sumária, que a “descrição” constante das suas faturas corresponde à realidade.

 

b) C...

 

A situação é em tudo idêntica à da B..., pelo que se dá aqui por integralmente reproduzido o que se acabou de afirmar no ponto anterior.

Acrescentamos a seguinte observação: nada impede que alguém contrate a duas ou mais empresas o mesmo tipo de serviços. No caso, ficou provado o critério de repartição dos serviços de gestão entre estas duas empresas: a atividade da B... era dirigida para a gestão contabilística e financeira, a da C... para a gestão comercial, coordenação da atividade operacional da Requerente, contratações de pessoal e aquisições de equipamentos.

 

c) E..., SA.

 

As faturas emitidas por esta sociedade têm como descritivo “prestação de serviços”.

 

O que, obviamente, não cumpre com a exigência legal de a fatura conter a designação usual do serviço em causa ou algo que permita identificar, ainda que minimamente, a sua natureza.

 

Como provado, segundo o teor do contrato celebrado entre estas duas empresas, esta sociedade obrigou-se a prestar serviços de gestão financeira.

Ora, como ficou também provado, os serviços prestados a – cuja efetividade não se põe em causa - não foram em áreas que usualmente se designem por gestão, mas sim na área comercial, essencialmente no agenciamento de clientes para a Requerente feito pelo seu gerente G... (em especial, o depoimento de H...). Ou seja, nada relacionado com gestão financeira.

 

Ou seja, mesmo aceitando a remissão que na fatura é feita para o contrato, em ordem à concretização de qual o tipo de serviços prestados, seríamos conduzidos a um resultado não correspondente à verdade. Aliás, em termos de normalidade, sempre seria difícil de compreender que uma sociedade cuja atividade é a exploração agro-pecuária fosse contratada para prestar apoio à gestão financeira de uma sociedade cuja atividade principal é a realização de análises veterinárias.

 

 Há, assim, que concluir que a D... não cumpriu com a obrigação legal imposta pela alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA, mesmo numa interpretação “minimalista” (restritiva) do seu teor.

 

 

d) D..., SA.

 

As faturas emitidas por esta sociedade têm como descritivo “Prestação de serviços de apoio à Gestão” e “Prestação de serviços de apoio à Gestão. Conforme Contrato celebrado entre as partes"

 

Segundo o contrato celebrado com a Requerente esta sociedade obrigou-se a prestar serviços de gestão financeira.

 

Ora, como provado os serviços prestados – cuja efetividade não se põe em causa não foram em áreas que usualmente se designem por gestão, muito menos gestão financeira, mas sim na área logística, essencialmente no relativo à recolha, nas instalações de clientes da Requerente produtores de suínos, das amostras para análise veterinária, incluindo a disponibilização do material para tal necessário (em especial, o depoimento da testemunha F...)

 

Ora, este tipo de serviços não corresponde à designação usual de “serviços de gestão”, o constante destas faturas e do contrato que subjaz à sua emissão não corresponde, não permite identificar, mesmo que minimamente, a natureza dos serviços efetivamente prestados.

 

Aliás, em termos de normalidade, sempre seria difícil de compreender que uma sociedade cujo objeto principal é a produção pecuária fosse contratada para prestar apoio à gestão (financeira) de uma sociedade cuja atividade principal é a realização de análises veterinárias.

 

 

 Há, assim, que concluir que as faturas emitidas por E..., SA. não cumprem, ainda que minimamente,  com os requisitos impostos  pela alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA, , pois o tipo de serviços nelas indicado não corresponde minimamente  aos efetivamente prestados.

 

17- Uma nota final: a Requerente sustenta cada uma das sociedades em causa lhe prestou serviços, que não houve fraude ao imposto.

Este tribunal arbitral não coloca em causa uma tal conclusão.

Mas o que lhe cumpria decidir é se, relativamente às faturas emitidas por cada uma destas sociedades, foram cumpridas as exigências da alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA.

Apreciação que foi feita adotando-se uma interpretação minimalista das exigências formais prescritas por tal norma, no seguimento das pronúncias – obrigatórias para os tribunais nacionais – do TJUE. Ir mais longe seria, pura e simplesmente, ignorar a norma legal.

 

Poder-se-á criticar a obrigatoriedade de tais formalidades quando conduzem à exclusão do direito à dedução – pedra angular do IVA - em situações em que, materialmente, tal não se justificaria por o Estado ter arrecadado o valor de imposto a que tinha direito em razão das operações económicas (das outras operações económicas) realizadas.

O certo é que a obrigação formal em causa é imposta por lei (decorre, mesmo e inequivocamente do Direito da União) e os tribunais tributários, incluindo os arbitrais, são obrigados a decidir com base na aplicação da lei (e não com base em juízos de equidade) como é próprio de um estado-de-direito.

 

 

V.            JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

               Sobre o pedido de juros indemnizatórios deduzido pelo Requerente, é pacífico o reconhecimento da competência dos tribunais arbitrais (CAAD) para proferir pronúncias condenatórias derivadas do reconhecimento do direito a juros indemnizatórios originados em atos tributários ilegais que aí sejam impugnados, ao abrigo do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) e n.º 5 do RJAT e 43.º e 100.º da LGT. 

 

               Esta disciplina deriva do dever, que recai sobre a AT, de reconstituição imediata e plena da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, como resulta do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT e 100.º da LGT, fazendo este último preceito referência expressa ao pagamento de juros indemnizatórios, compreendido nesse efeito repristinatório do status quo ante.

 

               Na situação vertente, os atos de liquidação enfermam, em parte, de errada interpretação e aplicação do direito. Erro que é de imputar à AT por estarem em casa liquidações oficiosas.

Estão, pois, verificados os requisitos legais para a condenação da Requerente no pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

 

VI – DECISÃO ARBITRAL

 

 

a)           É julgado procedente o pedido no tocante ao direito dedução do IVA constante das faturas, melhor identificadas em 5 dos factos provados, emitidas pelas sociedades B... e C..., no valor total de euros 78.200, 00.

Pelo que, nesta medida, se anulam parcialmente as liquidações de IVA impugnadas, de imposto e de juros compensatórios, bem como a decisão que versou sobre a reclamação graciosa.

 

b)           É julgado improcedente o pedido no tocante às faturas emitidas pelas sociedades D... e E..., no valor de Euros 64.400,00, por não se verificarem os requisitos legais (alínea b) do nº 5 do art. 36º do CIVA,) para a dedução do IVA delas constante,

Subsistem, nesta parte, as liquidações, de imposto e de juros compensatórios, impugnadas bem como a decisão da reclamação graciosa.

 

c)            É reconhecido o direito da requerente ao recebimento de juros indemnizatórios relativamente aos montantes que se mostraram ter sido indevidamente pagos, nos termos das alíneas anteriores, a serem calculados, nos termos legais, em execução de sentença.

 

 

Valor do Processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 159.140,67 (cento e cinquenta e nove mil, cento e quarenta euros e sessenta e sete cêntimos).

 

Custas Nos termos dos art.s 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT, e calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 3.672,00 (três mil seiscentos e setenta e dois euros), cabendo 45% ao Requerente e 55% à Requerida.

 

1 de Setembro de 2023

 

 

O Árbitro Presidente

 

 

 

(Rui Duarte Morais)

 

 

O Árbitro Adjunto

 

(Cristina Coisinha)

 

 

 

O Árbitro Adjunto

 

 

 

(António Pragal Colaço)