Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 257/2013-T
Data da decisão: 2014-03-28  Selo  
Valor do pedido: € 141.421,06
Tema: IS – Terrenos para Construção; Verba 28 da TGIS.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 257/2013 – T

Tema: IS – Terrenos para Construção; Verba 28 da TGIS.

 

Os árbitros, Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa, Martins Alfaro, e Mónica Respício Gonçalves, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 17 de Janeiro de 2014 (despacho do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD de 17 de Janeiro de 2014), acordam no seguinte:

 

A)    Relatório:

 

1.      A, S.A. (doravante designada por “Requerente”), sociedade anónima com sede na Praça …, Nº…, …, pessoa colectiva e contribuinte n.º …, apresentou um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de tribunal arbitral, no dia 18 de Novembro de 2013, ao abrigo do disposto nos n.ºs 2 e 10 do artigo 10.º do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributaria e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

2.      A Requerente pretende, no referido pedido de pronúncia arbitral, que o Tribunal Arbitral declare:

a)      a ilegalidade das decisões de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada pela Requerente em 19/04/2013, onde contestou as liquidações de Imposto do Selo com os n.ºs 2012..., 2012… e 2012.., no valor global de € 47.140,35 (quarenta e sete mil, cento e quarenta euros e trinta e cinco cêntimos), relativas aos prédios inscritos sob os seguintes artigos: (i) …-…, da extinta freguesia de …, actual artigo ..-… da freguesia de União de Freguesias de … e …, (ii) artigo …-… da extinta freguesia da …, actual artigo … da freguesia da União de Freguesias de … e …, e (iii) artigo … da freguesia de … e que deram origem aos processos de reclamação graciosa n.º 182… e n.º 338…;

b)      a ilegalidade das decisões expressas de indeferimento da reclamação graciosa onde a Requerente contestou as liquidações de Imposto do Selo n.º 2013…, n.º 2013… e n.º 2013.., no valor global de € 94.280,71 (noventa e quatro mil, duzentos e oitenta euros e setenta e um cêntimos), relativas aos prédios supra identificados e que deram origem aos processos de reclamação graciosa n.º 182… e n.º 338…;

c)      a anulação das liquidações de Imposto do Selo identificadas nas alíneas a) e b) supra, emitidas em 2012 e em 2013, ao abrigo da verba 28 da Tabela Geral de Imposto do Selo; e

d)     a condenação da Requerida no reembolso das quantias indevidamente pagas e decorrentes das liquidações supra identificadas, no valor total de € 141.421,06 (cento e quarenta e um mil, quatrocentos e vinte e um euros e seis cêntimos), acrescidas dos juros indemnizatórios devidos.     

 

3.      O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e foi notificado à Requerida, em 19 de Novembro de 2013.

 

4.      A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1, do RJAT, os signatários foram designados como árbitros pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

 

5.      Em 17 de Fevereiro de 2014, a Requerida apresentou a sua Resposta.

 

6.      Em 18 de Fevereiro de 2014, e nos termos e para os efeitos previstos no artigo 18.º, do RJAT, e considerando a não oposição das partes, foi emitido despacho pelo árbitro Presidente, em que o Tribunal se dispensou da realização da reunião do Tribunal com as partes.

 

7.      A Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, da seguinte forma:

 

7.1         As liquidações em causa têm por objecto a tributação dos prédios urbanos com afectação habitacional e cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000 (um milhão de euros), nos termos da verba 28.1 da TGIS, na redacção em vigor à data dos factos.

 

7.2.    A Requerente é proprietária de três terrenos para construção, todos eles com valores patrimoniais tributários que excedem o referido montante de € 1.000.000.

 

7.3. Relativamente ao primeiro desses terrenos, inscrito na matriz com o número …-…, sito em …, e com um valor patrimonial tributário de € 1.709.442,70, não foi emitido qualquer alvará de loteamento ou de construção, tendo sido apenas sujeito a um pedido de informação prévia e, posteriormente, aprovado o projecto de arquitectura apresentado, cujo despacho de aprovação expressamente refere que a construção projectada se destina, não exclusivamente a habitação, mas também a comércio.

 

7.4.    No que respeita ao terreno inscrito na matriz com o número …-…, com um valor patrimonial tributário de € 5.414.446,45, sito na freguesia da …, foi emitido, pela Câmara Municipal de …, o alvará de loteamento n.º …/.., nos termos do qual o lote em causa (“Lote 4”) se destina exclusivamente a escritórios, tendo entretanto sido emitido o aditamento n.º .../… ao referido alvará alargando a possibilidade de essa construção se destinar também a habitação, de onde resulta que a construção poderá destinar-se exclusivamente a escritórios, exclusivamente a habitação, ou a escritórios e habitação em simultâneo.

 

7.5. Alega, assim, a Requerente que nenhum dos referidos terrenos para construção se destina à construção de prédios exclusivamente afectos a habitação, não tendo, além disso, sido indicada qualquer afectação dos referidos prédios na correspondente declaração Modelo 1 de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).

 

7.6.    Sustenta, ainda, a Requerente que das cadernetas prediais dos imóveis em causa não consta menção ao respectivo coeficiente de afectação, mas apenas ao coeficiente de localização determinado com base na afectação a habitação.

 

7.7.    Assim, a Requerente considera que é ilegal o entendimento segundo o qual os terrenos para construção se enquadram no conceito de “prédio com afectação habitacional”, previsto na verba 28.1. da TGIS, sendo essa ilegalidade evidente no caso dos terrenos para construção cuja construção prevista ou autorizada nem sequer se destina exclusivamente a habitação.

 

7.8. Com efeito, no que respeita à definição do conceito de “prédio com afectação habitacional”, a Requerente entende que, da remissão que o Código do Imposto do Selo faz para o Código do IMI (adiante, CIMI), resulta que, ainda que este último Código não preveja uma definição expressa daquele conceito, decorre do artigo 6.º do CIMI que aquele conceito corresponde a um prédio edificado e licenciado para habitação, ou, caso não esteja licenciado para esse fim, ao qual corresponda um uso normal de habitação, não podendo, jamais, abranger os terrenos para construção (independentemente da respectiva afectação), na medida em que não se tratam de prédios edificados e não podem estar ou ser afectos a habitação.

 

7.9.    Considera também a Requerente que o facto de o legislador ter proposto, através da Proposta de Lei n.º 178/XII (Proposta de Orçamento do Estado para 2014) a alteração da norma em causa, de forma a passar a abranger os terrenos para construção constitui um indício de que a redacção em vigor à data da ocorrência dos factos, na qual se referia apenas os “prédios com afectação habitacional”, não abrangia os terrenos para construção, conforme decorre, também, das regras de interpretação da lei previstas no artigo 9.º do Código Civil.

 

7.10.    Sustenta a Requerente que, ainda que não fosse possível obter a definição do conceito em causa de “prédio com afectação habitacional” com recurso ao CIMI, resulta das regras constantes do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação que, por definição, nenhum terreno para construção pode ser licenciado para fins habitacionais.

 

7.11.  A Requerente alega, ainda, que a verba 28.1 da TGIS, na redacção em vigor à data dos factos, viola o Princípio da Igualdade Tributária, previsto nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, na medida em que não assegura um tratamento de igualdade entre os cidadãos.

 

7.12. Sustenta também a Requerente, que aquela norma viola o Princípio da Igualdade na sua vertente da igualdade proporcional, nomeadamente o Princípio da Proporcionalidade, consagrado nos artigos 18.º, 19.º e 266.º da Constituição da República Portuguesa, pelo menos no que respeita ao ano de 2012, porquanto, ao invés de repartir pelos contribuintes o esforço financeiro em causa, a verba 28.1. da TGIS acaba por aumentar em mais de um terço a tributação devida no ano de 2012 pelos contribuintes proprietários de imóveis cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000.

 

7.13. Por último, a Requerente alega a falta de autorização para a cobrança do Imposto do Selo sobre a propriedade de imóveis relativamente às liquidações contestadas do ano de 2012, devendo estas ser consideradas ilegais.

 

7.14.  Em suma, a Requerente pretende que sejam anuladas as liquidações contestadas, por ilegais, e por terem sido emitidas nos termos da Lei n.º 55-A/2012 e da verba 28.1. da TGIS, que deverão ser julgadas inconstitucionais, e, bem assim, que a Autoridade Tributária e Aduaneira seja condenada no reembolso do montante pago no âmbito do processo executivo instaurado, acrescido de juros indemnizatórios.

 

8.      A Requerida respondeu sustentando a improcedência do pedido de pronúncia arbitral e alegando, em síntese, que:

 

8.1.    Os lotes dos terrenos para construção em causa têm a natureza jurídica de prédios com afectação habitacional, já que, da consulta das respectivas cadernetas prediais resulta que o coeficiente de localização para imóveis com afectação para habitação foi considerado na determinação do respectivo valor patrimonial tributário. 

 

8.2.    Deverão ser mantidos os actos de liquidação objecto do pedido de pronúncia arbitral, na medida em que se baseiam numa correcta interpretação da verba 28 da TGIS, nos termos da qual o conceito de “prédio com afectação habitacional” aí previsto faz apelo ao coeficiente de afectação para habitação previsto no CIMI.

 

8.3.    O facto de os terrenos para construção em causa não terem, nos termos dos documentos relativos ao respectivo licenciamento para construção, uma vocação exclusivamente habitacional, não impede a aplicação da verba 28 da TGIS, já que a exclusividade da afectação habitacional não constitui requisito para aplicação da referida norma, devendo a Requerente ter identificado as partes dos prédios em causa eventualmente destinadas a comércio e serviços.

 

8.4.    A alteração legislativa introduzida com a Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013 de 31 de Dezembro) apenas vem reforçar que a interpretação sustentada pela Requerida é a correcta, já que o legislador substituiu a expressão “prédio com afectação habitacional” por “prédio habitacional ou terreno para construção”, clarificando, assim, que a expressão anteriormente consagrada na lei compreende estas duas realidades. 

 

8.5.    A verba 28 da TGIS, na interpretação sustentada pela Requerida, não viola os princípios constitucionais da igualdade nem da proporcionalidade.

 

8.6.    A Requerente não logrou provar qualquer violação de normas relativas à disciplina orçamental das receitas do Estado.

 

B) Saneador

 

9.      O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.

 

10.  As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

11.  Não se verificam nulidades, nem questões prévias, que atinjam todo o processo, pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.

 

C) Objecto da pronúncia arbitral

 

12.  Vêm colocadas ao Tribunal as seguintes questões, nos termos atrás descritos:

 

(i)                 Deverão ser declaradas ilegais as decisões de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada pela Requerente, em 19 de Abril de 2013, na qual foram contestadas as liquidações de Imposto do Selo n.º 2012…, n.º 2012… e n.º 2012…, no valor global de € 47.140,35, relativas aos prédios inscritos sob os artigos …-…, da extinta freguesia de …, actual artigo …-.., da freguesia de União de Freguesias de … e …, artigo …-…, da extinta freguesia de …, actual artigo … da freguesia de União de Freguesias de … e … e artigo … da freguesia de …, que deram origem aos processos de reclamação graciosa n.º 182… e n.º 338…?

(ii)               Deverão ser declaradas ilegais as decisões expressas de indeferimento da reclamação graciosa, nos termos da qual a Requerente contestou as liquidações de Imposto do Selo n.º 2013…, n.º 2013… e n.º 2013…, no valor global de € 94.280,71, relativas aos prédios melhor identificados em (i) supra, e que deram origem aos processos de reclamação graciosa n.º 182… e n.º 338…?

(iii)             Deverão ser anuladas as liquidações de Imposto do Selo melhor identificadas em (i) e (ii) supra, emitidas nos termos da verba 28 da TGIS em 2012 e em 2013?

(iv)             Deverá a Requerida ser condenada no reembolso das quantias indevidamente pagas com respeito às liquidações contestadas, no valor total de € 141.421,06, acrescidas dos respectivos juros indemnizatórios?

 

D) Matéria de facto (Factos provados)

 

13.  Consideram-se como provados os seguintes factos, com relevância para a decisão, com base na prova documental junta aos autos:

 

13.1.Nos termos das respectivas cadernetas prediais (cfr. documentos 9 a 11 juntos ao pedido de pronúncia arbitral), a Requerente é a única proprietária do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de e do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de ….

 

13.2. De acordo com as respectivas cadernetas prediais (cfr. documentos 9 a 11 juntos ao pedido de pronúncia arbitral), o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de e o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de … são, todos eles, terrenos para construção.

 

13.3.    De acordo com a respectiva caderneta predial (cfr. documento 11 junto ao pedido de pronúncia arbitral), o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de teve origem nos prédios inscritos na matriz com os números …, … e …, da freguesia de …, tendo o respectivo valor patrimonial tributário, fixado em € 2.304.181,95, sido calculado considerando o coeficiente de localização aplicável aos prédios urbanos destinados a habitação.

 

13.4.    De acordo com a respectiva caderneta predial (cfr. documento 10 junto ao pedido de pronúncia arbitral), com a extinção da freguesia de …, o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de deu origem ao prédio inscrito na matriz com o número …, da União das Freguesias de … e …, tendo o respectivo valor patrimonial tributário, fixado em € 5.414.446,45, sido calculado considerando o coeficiente de localização aplicável aos prédios urbanos destinados a habitação.

 

13.5.    De acordo com a respectiva caderneta predial (cfr. documento 9 junto ao pedido de pronúncia arbitral), com a extinção da freguesia de , o prédio inscrito na matriz com o número …-…., da freguesia de deu origem ao prédio inscrito na matriz com o número ..., da União das Freguesias de …e…, tendo o respectivo valor patrimonial tributário, fixado em € 1.709.442,70, sido calculado considerando o coeficiente de localização aplicável aos prédios urbanos destinados a habitação. 

 

13.6.    Em 14 de Agosto de 1998, foi emitido, pela Câmara Municipal de …, o Aditamento n.º …, relativo à Alteração do Alvará de Loteamento n.º …, que incide sobre o prédio sito na …, freguesia de …, inscrito na matriz predial mista sob os artigos …, …, … e … e inscrito na matriz predial urbana sob os artigos … a …, inclusive, … a …, inclusive, … a …, inclusive, … a …, inclusive, e … – e que originou o prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de … e o prédio inscrito na matriz com o número …, da União das Freguesias de … e … -, aí se prevendo a alteração ao uso dos lotes três, quatro e cinco para usos alternativos, sendo a mudança para os lotes três e quatro de escritórios para escritórios e/ou habitação e para o lote cinco de escritórios e comércio para escritórios e/ou habitação (cfr. documentos 23 e 24 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.7.    Em 12 de Maio de 2001, foi emitido, pela Câmara Municipal de …, o Aditamento n.º …, relativo à Alteração do Alvará de Loteamento n.º …, prevendo, entre outras alterações, a alteração da área de construção do lote 4 e a subdivisão do lote 5 em dois novos lotes (o lote 5, destinado a serviços e o lote 10, destinado a habitação e serviços) e, bem assim, a subdivisão do lote 8 em dois novos lotes (o lote 8, destinado a serviços – hotel – e o lote 11, também destinado a serviços – hotel) (cfr. documento 24 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.8.    Em 12 de Dezembro de 2002, foi emitido, pela Câmara Municipal de …, o Aditamento n.º …, relativo à Alteração do Alvará de Loteamento n.º …, prevendo a alteração da mancha de construção dos lotes 3 e 4 e, bem assim, a alteração e acerto na configuração das rampas de acesso às garagens e das baías de estacionamento (cfr. documento 24 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.9.    Em 11 de Dezembro de 2003, foi emitido, pela Câmara Municipal de …, o Aditamento n.º …, relativo à Alteração do Alvará de Loteamento n.º …, prevendo a rectificação das áreas dos lotes 3 e 4 (cfr. documento 24 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.10. Nos termos do Ofício de 21 de Outubro de 2008, a Directora do Departamento de Gestão Urbanística da Direcção Municipal de Administração do Território, da Câmara Municipal de …, informou a Requerente que o projecto de arquitectura relativo ao prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de e que deu origem ao prédio inscrito na matriz com o número …, da União das Freguesias de … e …, para construção de um edifício de habitação colectiva e comércio, foi aprovado por despacho do Presidente da Câmara Municipal de … de 14 de Outubro de 2008 (cfr. documento 22 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.11.  A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo
n.º 2012…, no valor de € 11.520,91, feita em 07 de Novembro de 2012, com base no artigo 6.º, n.º 1, alínea f), parágrafo i) da Lei n.º 55-A/2012, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , correspondente a € 2.304.181,95 (cfr. documento 3 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.12.  A Requerente efectuou em 20 de Dezembro de 2012 o pagamento do Imposto do Selo resultante daquele mesmo acto de liquidação, no valor de € 11.520,91 (cfr. documento 3 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.13. A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2012…, no valor de € 27.072,23, feita em 08 de Novembro de 2012, com base no artigo 6.º, n.º 1, alínea f), parágrafo i) da Lei n.º 55A/2012, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , correspondente a € 5.414.446,45 (cfr. documento 2 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

                          

13.14.  A Requerente efectuou em 20 de Dezembro de 2012 o pagamento do Imposto do Selo resultante daquele mesmo acto de liquidação, no valor de € 27.072,23 (cfr. documento 2 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.15.  A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2012…, no valor de € 8.547,21, feita em 07 de Novembro de 2012, com base no artigo 6.º, n.º 1, alínea f), parágrafo i) da Lei n.º 55A/2012, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número U-6841 (actual número 7574), da freguesia de (actual União das Freguesias de … e …), correspondente a € 1.709.442,70 (cfr. documento 1 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.16.  A Requerente efectuou em 20 de Dezembro de 2012 o pagamento do Imposto do Selo resultante daquele mesmo acto de liquidação, no valor de € 8.547,21 (cfr. documento 1 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.17. A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 23.041,82, feita em 22 de Março de 2013, relativamente ao ano de 2012, com base na verba 28.1. da TGIS, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número …- .., da freguesia de , correspondente a € 2.304.181,95 (cfr. documento 8 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.18.  A Requerente efectuou em 29 de Abril de 2013 o pagamento da primeira prestação do Imposto do Selo resultante do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, relativo ao prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , no valor de € 7.680,62 (cfr. documento 8 junto ao pedido de pronúncia arbitral). Em 24 de Julho de 2013, a Requerente efectuou o pagamento da segunda prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 7.680,60 (cfr. documento 16 junto ao pedido de pronúncia arbitral). Finalmente, em 01 de Novembro de 2013, a Requerente pagou a terceira prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 7.680,60 (cfr. documento 19 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.19. A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 54.144,46, feita em 22 de Março de 2013, com base na verba 28.1. da TGIS, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número ...-…, da freguesia de , correspondente a € 5.414.446,45 (cfr. documento 7 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.20.  A Requerente efectuou em 29 de Abril de 2013 o pagamento da primeira prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2012…, relativo ao prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de …, no valor de € 18.048,16 (cfr. documento 7 junto ao pedido de pronúncia arbitral). A Requerente efectuou em 24 de Julho de 2013 o pagamento da segunda prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do documento identificado com o n.º 2013…, no valor de € 18.048,15 (cfr. documento 15 junto ao pedido de pronúncia arbitral). Em 01 de Novembro de 2013, a Requerente efectuou o pagamento da terceira prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do documento identificado com o n.º 2013..., no valor de € 18.048,15 (cfr. documento18 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.21.  A Requerente foi notificada do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 17.094,43, feita em 21 de Março de 2013, com base na verba 28.1. da TGIS, calculada sobre o valor patrimonial do prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de , correspondente a € 1.709.442,70 (cfr. documento 6 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.22.  A Requerente efectuou em 29 de Abril de 2013 o pagamento da primeira prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do acto de liquidação de Imposto do Selo n.º 2013…, no valor de € 5.698,15, relativo ao prédio inscrito na matriz com o número …-…, da freguesia de (cfr. documento 6 junto ao pedido de pronúncia arbitral). A Requerente efectuou em 24 de Julho de 2013 o pagamento da segunda prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do documento identificado com o n.º 2013…, no valor de € 5.698,14 (cfr. documento 14 junto ao pedido de pronúncia arbitral). A Requerente efectuou em 01 de Novembro de 2013 o pagamento da terceira prestação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2012, resultante do documento identificado com o n.º 2013…, no valor de € 5.698,14 (cfr. documento 17 junto ao pedido de pronúncia arbitral).   

 

13.23.  A Requerente apresentou, em 19 de Abril de 2013, no Serviço de Finanças de …, reclamação graciosa contra as liquidações n.º 2012…, n.º 2012… e n.º 2012…, relativas a Imposto do Selo, nos valores, respectivamente, de € 11.520,91, € 27.072,23 e de € 8.547,21, correspondendo ao valor total de € 47.140,35, com base na verba 28 da TGIS (cfr. documento 12 junto ao pedido de pronúncia arbitral e páginas 1, 6, 7 e 8 do processo administrativo).

 

13.24. A Requerente foi notificada, através do Ofício de …de 2013, do Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de …, de que, após instauração, o processo de apreciação da reclamação graciosa por si apresentada, a que foi atribuído o número … (relativo à contestação da liquidação n.º 2012… respeitante ao prédio sito na freguesia de e inscrito na matriz sob o número …-…), foi transferido para o Serviço de Finanças do … e, bem assim, que o processo de apreciação da reclamação graciosa por si apresentada, a que foi atribuído o número … (relativo à contestação das liquidações n.º 2012… e n.º 2012…, respeitantes respectivamente ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de …e… e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…) e ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de … e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…)), foi transferido para o Serviço de Finanças de … – 1 (cfr. documento 21 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.25.  O acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada pela Requerente em 19 de Abril de 2013, e a que foram atribuídos os números de processo 182… e 338…, formou-se em 19 de Agosto de 2013 (cfr. processo administrativo).

 

13.26.  A Requerente foi notificada, por fax, através do Ofício de … 2013, da Área da Justiça Tributária, da Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa, da Direcção de Finanças do … do projecto da decisão de indeferimento do pedido relativo ao processo identificado com o número 338… relativo à contestação da liquidação n.º 2012… respeitante ao prédio sito na freguesia de… e inscrito na matriz sob o número …-…, mas onde veio a projectar-se o indeferimento da reclamação graciosa apresentada, por referência também ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de …e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-….) e ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de …e … e inscrito na matriz sob o número ...-… (ex-artigo …-…) (cfr. páginas 105 a 115 do processo administrativo).  

 

13.27.  Assim, a Requerente voltou a ser notificada por fax, através do Ofício de … de 2013, da Área da Justiça Tributária, da Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa, da Direcção de Finanças do … do projecto da decisão de indeferimento do pedido relativo ao processo identificado com o número 338…, relativo à contestação da liquidação n.º 2012…, mencionando, desta vez, apenas o prédio sito na freguesia de e inscrito na matriz sob o número …-… (cfr. páginas 116 a 123 do processo administrativo).

 

13.28.  Em 28 de Novembro de 2013, a Requerente informou a Requerida – concretamente, a Área de Justiça Tributária da Direcção de Finanças do … -, de que impugnou, através do presente pedido de pronúncia arbitral, o indeferimento tácito que se formou a reclamação graciosa por si apresentada e à qual foi atribuído o número de processo 338…, relativa à contestação da liquidação de Imposto do Selo n.º 2012…, respeitante ao terreno para construção identificado na matriz com o número …-… e sito na freguesia de e… (cfr. páginas 124 e 125 do processo administrativo).

 

13.29. Através do Despacho de …de 2013, da Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa da Direcção de Finanças do …, foi a Requerente notificada da decisão de manutenção do despacho proferido em … de 2013, atenta a impugnação, pela Requerente, da decisão de indeferimento tácito relativa à reclamação graciosa à qual foi atribuído o número de processo 338…, relativa à contestação da liquidação de Imposto do Selo n.º 2012…, respeitante ao terreno para construção identificado na matriz com o número …-… e sito na freguesia de (cfr. páginas 127 e 128 do processo administrativo).

 

13.30.  Em 28 de Agosto de 2013, a Requerente apresentou, no Serviço de Finanças de …, reclamação graciosa contra os actos de liquidação n.º 2013…, n.º 2013… e n.º 2013…, relativos a Imposto do Selo, nos valores, respectivamente, de € 23.041,82, € 54.144,46 e de € 17.094,43, correspondendo ao valor total de € 94.280,71, com base na verba 28 da TGIS (cfr. documento 20 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.31.  A Requerente foi notificada, através do Ofício de … 2013, do Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de …, de que, após instauração, o processo de apreciação da reclamação graciosa por si apresentada, a que foi atribuído o número 338… (relativo à contestação da liquidação n.º 2013…respeitante ao prédio sito na freguesia de e inscrito na matriz sob o número …-…), foi transferido para o Serviço de Finanças do … e, bem assim, que o processo de apreciação da reclamação graciosa por si apresentada, a que foi atribuído o número 182… (relativo à contestação das liquidações n.º 2013… e n.º 2013..., respeitantes respectivamente ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de … e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…) e ao prédio sito na actual freguesia de União de … e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…)), foi transferido para o Serviço de Finanças de … – 1 (cfr. documento 13 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.32.  A Requerente foi notificada, através do Ofício n.º .../…, de …  de 2013, do Chefe do Serviço de Finanças do …, do despacho proferido em … de 2013, nos termos do qual foi indeferida a reclamação graciosa a que foi atribuído o n.º de processo 338…, relativo à contestação da liquidação n.º 2013… respeitante ao prédio sito na freguesia de e inscrito na matriz sob o número …-… (cfr. documento 5 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

13.33.  A Requerente foi notificada, através do Ofício n.º …, de ... 2013, do Chefe do Serviço de Finanças de …, de que por despacho proferido em …de 2013, foi indeferida a reclamação graciosa a que foi atribuído o n.º de processo 182…, relativo à contestação das liquidações n.º 2013… e n.º 2013…, respeitantes respectivamente ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de... e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…) e ao prédio sito na actual freguesia de União de Freguesias de … e … e inscrito na matriz sob o número …-… (ex-artigo …-…) (cfr. documento 4 junto ao pedido de pronúncia arbitral).

 

14.  Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e não há factos não provados com interesse para a decisão da causa.

 

E) Do Direito

 

15.  Da apreciação da legalidade dos actos contestados através do presente pedido de pronúncia arbitral:

 

15.1.        A questão subjacente ao presente pedido de pronúncia arbitral prende-se com a correcta interpretação da verba 28.1. da TGIS, na redacção em vigor à data da ocorrência dos factos – isto é, previamente à entrada em vigor da nova redacção decorrente das alterações introduzidas através da Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2014 -, por forma a saber se os terrenos para construção integram o conceito de “prédios com afectação habitacional” e, consequentemente, saber se estão, por isso, sujeitos a Imposto do Selo nos termos que decorrem daquela norma de incidência.

 

15.2.        A verba 28 da TGIS foi aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, passando aí a dispor-se que integram o campo de incidência do imposto “28 — Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do IMI, seja igual ou superior a € 1 000 000 — sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI: 28.1. - Por prédio com afectação habitacional - 1 %;”.

 

15.3.        Acresce que a referida Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro veio, ainda, estabelecer as disposições transitórias para aplicação da referida regra de incidência, ainda no ano de 2012, tendo determinando, entre outros aspectos, que (i) o facto tributário se considerou verificado em 31 de Outubro de 2012, (ii) a Autoridade tributária e Aduaneira deveria efectuar a liquidação do imposto devido até ao final do mês de Novembro desse ano, (iii) os sujeitos passivos deveriam efectuar o pagamento do imposto liquidado nesses termos até ao dia 29 de Dezembro de 2012 e, bem assim, (iv) a taxa aplicável nesse ano era de 0,5% para prédios com afectação habitacional avaliados nos termos do CIMI e de 0,8% para prédios com afectação habitacional ainda não avaliados nos termos do CIMI.

 

15.4.        A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro aditou, também, o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo, nos termos do qual estabeleceu que “Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI”.

 

15.5.        Feito o enquadramento legislativo do problema suscitado e estando em causa a interpretação do conceito de “prédio com afectação habitacional”, cabe indagar, antes de mais, sobre a existência de uma definição legal do referido conceito.

 

15.6.        Constatando que o legislador não definiu o conceito de “prédio com afectação habitacional” na própria Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, nem no Código do Imposto do Selo, nem na TGIS, seremos forçados a procurar a referida definição legal no CIMI, em virtude da remissão constante do n.º 2, do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo.

 

15.7.        O artigo 4.º do CIMI, sob a epígrafe “Prédios urbanos”, define-os como sendo “todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos”.

 

15.8.        Dispõe, ainda, o artigo 6.º, n.º 1 do CIMI que os prédios urbanos se dividem em habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, terrenos para construção e, residualmente, outros.

 

15.9.        O legislador estabeleceu, no artigo 6.º, n.º 2 do CIMI, que os prédios urbanos habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

 

15.10.    No artigo 6.º, n.º 3 do CIMI, o legislador consagrou que os terrenos para construção são “os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos”.

 

15.11.    Ainda nos termos do artigo 6.º, n.º 4 do CIMI, os prédios do tipo “outros” são os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem classificados como prédios rústicos e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não fins habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços e ainda os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos.

 

15.12.    Atento o exposto, o CIMI também não contém uma definição específica do que sejam “prédios com afectação habitacional”.

 

15.13.    Dispõe a norma constante do artigo 11.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária que “Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.”

 

15.14.    Assim, e atendendo ao disposto no artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil, quando refere que “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”, procedemos à análise dos elementos interpretativos possíveis. São eles: o elemento gramatical e o elemento lógico.

 

15.15.    Conforme ensinam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA[1], o elemento gramatical é constituído pelo texto legislativo, pelas palavras da lei, enquanto o segundo dos referidos elementos, o elemento lógico, se refere ao espírito da lei, sendo que os elementos em causa não constituem duas formas distintas de interpretação, antes se complementam, tal como ensinam os Autores: os dois elementos devem, pois, ser utilizados conjuntamente na fixação do sentido decisivo da lei.

 

15.16.    Também SOARES MARTINEZ[2], referindo-se expressamente à problemática da interpretação das normas fiscais, conclui que “Também o intérprete das normas fiscais, como o de quaisquer outras normas jurídicas, terá de fixar o respectivo sentido, conjugando o “elemento gramatical” com o “elemento lógico”, ou “teleológico”, incluindo os aspectos racional, sistemático e histórico (…).”.

 

15.17.    Iremos, assim, em seguida, proceder à tarefa de interpretação da norma constante da verba 28.1. da TGIS, com recurso a cada um dos referidos elementos.

 

15.18.    Recorrendo, no caso concreto, ao elemento gramatical, verificamos que o legislador utilizou a expressão “prédios com afectação habitacional”. Ora, a escolha que o legislador efectuou pela utilização, na expressão em causa, parece indicar que estão em causa os prédios habitacionais, tal como são definidos no artigo 6.º, n.º 2 do CIMI, ou seja, aqueles que são como tal licenciados ou que estão destinados a esse fim, porque apenas estes poderão ter uma verdadeira “afectação habitacional”.

 

15.19.    Já o elemento lógico integra, em si mesmo, três categorias distintas de aspectos ou “sub-elementos” a considerar: o aspecto ou elemento racional, o sistemático e, por último, o histórico, relevando, quanto aos três aspectos, a ratio legis subjacente à introdução da norma em causa no nosso ordenamento jurídico.

 

15.20.    Na “Exposição de Motivos” constante da Proposta de Lei n.º 96/XII/2ª, que esteve subjacente à aprovação da Lei n.º 55-A/2012 que aditou a verba 28 à TGIS, o legislador refere apenas que “é criada uma taxa em sede de Imposto do Selo incidente sobre os prédios urbanos de afectação habitacional cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a um milhão de euros”.

 

15.21.    Também do Parecer da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública sobre a referida Proposta de Lei[3] não consta qualquer esclarecimento expresso sobre o referido conceito de “prédio com afectação habitacional”.

 

15.22.    Não obstante, não podemos deixar de considerar que, no aditamento da verba 28 à TGIS, o legislador considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afectação habitacional, de valor igual ou superior a € 1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir tal tributação, pelo que perfilhamos o entendimento subjacente à decisão arbitral proferida no âmbito do Processo n.º 50/2013, de 29.10.2013, quando aí se refere que “Isso mesmo se conclui da análise da discussão da proposta de lei nº 96/XII na Assembleia da República, disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de Outubro de 2012. A fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as «casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fracção autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, susceptível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal.”.

 

15.23.    Acresce, ainda, que, em nosso entender, a alteração legislativa introduzida com a Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2014 – louvável, porque veio esclarecer o sentido da lei - parece, ao contrário do que sustenta a Administração tributária, constituir um argumento a favor do entendimento segundo o qual o conceito de “prédio com afectação habitacional” não integrava os terrenos para construção.

 

15.24.    Com efeito, se assim não fosse, o legislador não teria necessidade de indicar que, para além dos “prédios habitacionais” – que mais não são, nos termos que iremos expor em seguida, os “prédios com afectação habitacional”, com correspondência com o conceito previsto no artigo 6.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CIMI – passam também a estar abrangidos por aquela regra de incidência os terrenos para construção.

 

15.25.    Atento o exposto, não podemos deixar de perfilhar o entendimento segundo o qual o requisito legal de “prédio de afectação habitacional”, constante da verba 28.1. da TGIS na redacção em vigor à data da ocorrência dos factos, implica uma efectiva afectação de um prédio urbano a esse fim, estando subjacente à criação daquele conceito a correspondência com o conceito de “prédio urbano habitacional” e não, como defende a Requerida, com o conceito de prédio cujo valor patrimonial tributário é determinado de acordo com um coeficiente de localização correspondente à afectação para habitação, interpretação esta que não parece ter qualquer correspondência legal.

 

15.26.    Nesta medida, os terrenos para construção, nunca poderão integrar a expressão “prédios de afectação habitacional”, na medida em que não possuem licença de utilização para habitação e não estão, sequer, edificados.

 

15.27.    Concluímos, pois, que o conceito de “prédio com afectação habitacional” previsto na verba 28.1. da TGIS corresponde ao conceito de “prédio urbano habitacional”, previsto no artigo 6.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CIMI e, também, na primeira parte da actual redacção da verba 28.1. da TGIS.

 

15.28.    Pelo que, estando em causa, no presente pedido de decisão arbitral três terrenos para construção de que é proprietária a Requerente, os mesmos não caíam no âmbito da norma de incidência constante da verba 28.1. da TGIS, na redacção em vigor à data da ocorrência dos factos, o que fere de ilegalidade os actos de liquidação n.º 2012…, n.º 2012…, n.º 2012…, n.º 2013…, n.º 2013… e n.º 2013… e as decisões de indeferimento expresso proferidas no âmbito dos processos de apreciação das reclamações graciosas apresentadas pela Requerente n.º338… e n.º 182…e de indeferimento tácito das reclamações graciosas apresentadas pela Requerente e a cujos processos de apreciação foram atribuídos os números 182… e 338…, todos objecto do presente processo arbitral, tornando procedente, o pedido da Requerente.

 

15.29.    Atento o exposto, deixa de fazer sentido, e de ter utilidade, a apreciação que a Requerente solicitou acerca da autorização para cobrança do imposto, nos termos das regras orçamentais, e, bem assim, acerca da (in)constitucionalidade da interpretação da norma sustentada pela Requerida.

 

16.        Da condenação da Requerida no reembolso das quantias indevidamente pagas com respeito às liquidações contestadas, no valor total de € 141.421,06, acrescidas dos respectivos juros indemnizatórios:

 

16.1.        A Requerente peticionou o pagamento de juros indemnizatórios, por considerar que ocorreu, no caso concreto, pagamento de imposto superior ao devido por erro imputável aos serviços.

16.2.        A Lei Geral Tributária (LGT) prevê no artigo 43.º e o Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) no artigo 61.º que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve um erro imputável aos serviços e do qual resulta um pagamento de divida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

16.3.        Entende-se por erro imputável à administração, o erro que não for imputável ao contribuinte e assentar em errados pressupostos de facto e de direito que, não sejam da responsabilidade do contribuinte.

 

16.4.        Assim, “o direito a juros indemnizatórios abrange apenas uma das causas de responsabilidade da Administração tributária, agindo como tal: a originada pelo pagamento indevido de tributos, que lhe for imputável (...) o direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte provem, em regra geral, de um dever de indemnização da Administração tributária resultante da forçada improdutividade das importâncias desembolsadas pelo contribuinte.” (cfr. António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária Anotada, Editora Rei dos Livros, p. 204 e 205).

 

16.5.        Atento o exposto e a errónea interpretação que a Requerida fez, ao aplicar a norma em causa – verba 28.1. da TGIS – não existem dúvidas de que foi por erro imputável aos serviços que a Requerente efectuou o pagamento de imposto superior aquele que efectivamente seria devido.

 

16.6.        Em face do exposto, considera-se que a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento das liquidações de imposto anuladas até à data da emissão da nota de crédito, nos termos do artigo 61.º, n.ºs 2 a 5, do CPPT.

 

F) Decisão:

 

17.        Termos em que se decide julgar procedente o pedido da Requerente e, assim, anular as decisões de indeferimento expresso e tácito das Reclamações Graciosas apresentadas e, bem assim, as liquidações de imposto e de juros compensatórios impugnadas, com as consequências legais, designadamente com restituição dos valores liquidados e pagos pela Requerente, acrescidos dos juros indemnizatórios calculados nos termos da lei, acima indicados.

 

*

 

18.        Fixa-se o valor da acção em € 141.421,06 (cento e quarenta e um mil quatrocentos e vinte e um euros e seis cêntimos), nos termos do disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável ex vi artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.

 

19.        Fixa-se o valor da Taxa de Arbitragem em € 3.060.00 (três mil e sessenta euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida, nos termos do disposto no artigo 22º, nº4 do RJAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 28 de Março de 2014

 

Os Árbitros

 

Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa

 

Martins Alfaro

 

Mónica Respício Gonçalves

         

 

 

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Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.

 

 

 



[1] In “Noções Fundamentais de Direito Civil I”, 5.ª edição revista e ampliada, Coimbra Editora, 1961, pág. 150.

[2] In “Direito Fiscal”, 9.ª edição (reimpressão), Almedina, 1997, pág. 132.

[3] Disponível em http://app.parlamento.pt/.