DECISÃO ARBITRAL
Na sequência e em execução do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul que, em recurso interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira, decretou por acórdão de 04/06/2015, comunicado ao CAAD em 15/02/2018, a nulidade da decisão arbitral proferida neste processo em 17/11/2014, profere-se a seguinte nova decisão:
I – RELATÓRIO
A. – PARTES
A…, SA., a seguir designada por Requerente, pessoa colectiva nº…, com sede na Rua…, Lote…, …-… Lisboa, veio requerer em 24 de Fevereiro de 2014 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito nos art. 2º, nº 1, alínea a) do Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária -RJAT) e nos arts. 1º, alínea a) e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.
B. – CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL
1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 26/02/2014 e automaticamente notificado à Requerente e à Autoridade Tributária e Aduaneira em 27/02/2014, tendo o Presidente do respectivo Conselho Deontológico designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 1, do RJAT, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.
2. Em 11/04/2014, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11º, nº 1, alínea b) do RJAT, nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.
3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 30/04/2014, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11º do Decreto – Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.
C. – PRETENSÃO
A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade e a consequente anulação das liquidações de Imposto Único de Circulação, respeitantes aos veículos identificados nos autos, no valor de 7.739,91 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência,
Determine a restituição do imposto que foi pago pela Requerente, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, contados desde a data do respectivo pagamento até integral reembolso.
D. – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 30/04/2014, seguiram-se os posteriores termos processuais na forma seguinte:
- Em 02/05/2014 – Foi notificada a Requerida para, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 17º do RJAT, apresentar resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e remeter ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo, por via electrónica.
- Em 27/05/2014 – A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral, remeteu despacho de designação dos juristas representantes da Requerida e inseriu na “Plataforma” on line do CAAD o processo administrativo, tendo sido, de tudo, notificada a Requerente.
- Em 02/06/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de cópia de procuração forense certificada por entidade terceira, por forma a suprir a irregularidade da certificação da primitiva procuração, requerimento esse que o Tribunal admitiu em 05/06/2014, tendo ordenado a sua notificação à Requerida.
- Em 03/06/2014 – A Requerente apresentou resposta à excepção invocada pela Requerida, que foi admitida em 08/06/2014, e notificada à Requerida.
- Em 04/06/2014 – O Tribunal designou o dia 23/06/2014 para a reunião prevista no art. 18º do RJAT.
- Em 06/06/2014 – A Requerida apresentou um requerimento para que, na reunião prevista no art. 18º do RJAT, marcada para o dia 23/06/2014, não fossem ouvidas as Partes quanto à matéria das excepções, em consequência da Requerente já se ter pronunciado por escrito, o qual foi admitido pelo Tribunal em 08/06/2014 e notificado à Requerente, sendo, também, confirmada a data da reunião prevista no art. 18º do RJAT para 23/06/2014.
- Em 23/06/2014 – Realizou-se a reunião prevista no art. 18º do RJAT, de que resultou, o seguinte:
- O Tribunal deferiu o requerimento da Requerida de 12/06/2014, e, consequentemente, supriu a irregularidade da procuração do mandatário da Requerente, com a junção aos autos de nova procuração forense certificada por entidade terceira, sem oposição da Requerida.
- Foram ouvidas as Partes sobre as excepções invocadas.
- A Requerida requereu a junção de um documento para contraprova do art. 11º do Pedido de Pronúncia do Tribunal Arbitral e dos docs. 2 a 70 juntos a este. A Requerente não se opôs à junção do documento e requereu um prazo de dez dias para se pronunciar sobre o mesmo. O Tribunal deferiu.
- O Tribunal ordenou a suspensão da Reunião, face ao que antecede, para ser retomada no dia 14/07/2014.
- Em 30/06/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de um requerimento de resposta ao apresentado na reunião de 23/06/2014 pela Requerida, que foi admitido pelo Tribunal em 03/07/2014, com conhecimento à Requerida.
- Em 14/07/2014 – Continuação da Reunião prevista no art. 18º do RJAT, que tinha sido suspensa em 23/06/2014, de que resultou o seguinte:
- A Requerente requereu a produção de prova adicional, o que foi deferido pelo Tribunal ao abrigo do disposto no art. 16º, alínea a) do RJAT, com oposição da Requerida.
- O Tribunal fixou um prazo de 10 dias para a Requerente produzir prova adicional e de 20 dias para a Requerida se pronunciar sobre a mesma.
- O Tribunal fixou um prazo de 10 dias a contar da pronúncia da Requerida sobre a prova adicional para produção de alegações escritas pela Requerente.
- O Tribunal fixou, também, um prazo de 10 dias a contar da apresentação das alegações escritas pela Requerente, para a apresentação de alegações escritas pela Requerida.
- Em 16/07/2014 – A Requerida requereu a junção aos autos de uma decisão arbitral, requerimento que foi deferido em 18/07/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 13/08/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de duas decisões arbitrais, o que foi deferido pelo Tribunal em 18/08/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 01/09/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de 38 documentos, o que foi deferido pelo Tribunal em 24/09/2014, com notificação à Requerida.
- Em 18/09/2014 – A Requerida requereu a junção aos autos de duas decisões arbitrais, o que o Tribunal deferiu, em 19/09/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 30/09/2014 – O Tribunal, face à impossibilidade de ser proferida decisão final no prazo fixado no nº 1 do art. 21º do RJAT, prorrogou esse prazo por dois meses, ao abrigo do nº 2 deste normativo e fixou a data da prolação da decisão em 17/11/2014.
- Em 17/10/2014 – A Requerida apresentou requerimento de pronúncia sobre os documentos juntos pela Requerente em 01/09/2014, tendo o requerimento sido deferido em 18/10/2014 e notificado à Requerente.
- Em 22/10/2014 – A Requerente apresentou alegações escritas, e a Requerida, de acordo com os registos do SPG do CAAD, não teria apresentado alegações escritas.
- Em 15/11/2014 – Prolação da decisão arbitral.
- Em 15/02/2018 – Comunicação ao CAAD do acórdão de 04/06/2015, do Tribunal Central Administrativo Sul (autos de impugnação n.º…/14).
- Em 01/03/2018 – Junção aos autos (SPG) das alegações escritas da Requerida de 03/11/2014.
- Em 12/03/2018 – Prolação da decisão arbitral em cumprimento do acórdão de 04/06/2015, do Tribunal Central Administrativo Sul.
E. – PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS
A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente, alegou, em síntese, o seguinte:
- A Requerente A…, SA., também identificada como “B…”, é uma instituição financeira que tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, dispondo, para o efeito, de todas as autorizações legalmente exigíveis.
- No âmbito da sua actividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de Aluguer de Longa Duração e Contratos de Locação Financeira, de veículos automóveis, findos os quais transmite a propriedade dos mesmos aos respectivos locatários ou a terceiros.
- Entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, foi a Requerente notificada de Liquidações Oficiosas de IUC relativas às viaturas identificadas no presente pedido de pronúncia arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012.
- Tendo a Requerente procedido ao pagamento voluntário do referido IUC.
- A Requerente discorda dos referidos actos de liquidação, na medida em que os veículos, relativamente aos quais impendia o pagamento do IUC, não eram sua propriedade à data identificada pela Requerida como data da ocorrência do facto gerador do imposto.
- Pois, no seu entender, de acordo com o disposto no artigo 3.º, n.º 1 do Código do IUC, “são sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.”
- O recurso ao registo automóvel como elemento estruturante do funcionamento do IUC evidencia-se ao longo de todo o Código.
- Referindo, a título meramente exemplificativo, o teor do artigo 6.º do Código do IUC, relativo à definição do facto gerador da obrigação de imposto, nos termos do qual, este “(…) é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional.”
- Decorrendo igualmente deste preceito que os veículos que não estejam, nem devam estar, sujeitos a registo em território português, apenas ficam sujeitos a este imposto se permanecerem no mesmo por um período superior a 183 dias.
- Trata-se, no seu entender, de uma norma que, recorrendo ao elemento registral, estabelece, simultaneamente, o facto gerador do imposto e a respectiva conexão fiscal.
- Sendo, também, dos elementos do registo automóvel que se extrai o momento do início do período de tributação, bem como, de uma maneira geral, todos os elementos necessários à liquidação do imposto em causa, como é, designadamente, o caso da cilindrada, antiguidade da matrícula, tipo de combustível e nível de emissão de dióxido de carbono.
- A Requerente entende que, da dependência do regime de tributação do IUC em relação ao registo automóvel, não se pode deixar de concluir que a norma de incidência subjectiva na parte em que considera como proprietário a pessoa em nome do qual o veículo se encontre registado constitui uma mera presunção (legal) de incidência.
- De acordo com outros elementos interpretativos, em especial, da respectiva noção legal.
- Atendendo ao teor literal do artigo 3.º, n.º 1 do Código do IUC, diz que importa analisar, em especial, a expressão “considerando-se como tais”, em especial na perspectiva do disposto no artigo 9.º, n.º 2 do Código Civil, quando estabelece não poder ser compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo que não tenha na respectiva letra um mínimo de correspondência verbal ainda que imperfeitamente expresso.
- E que o actual texto não usou o termo “presumem-se”, ao contrário do que constava do extinto Regulamento do Imposto Sobre Veículos, mas examinando o ordenamento jurídico português, encontram-se diversos exemplos de normas que consagram presunções utilizando o verbo “considerar”, muitas das quais empregues no gerúndio (“considerando” ou mesmo “considerando-se”).
- Sendo disso exemplo as normas que a seguir apresenta. No Código Civil, entre outras, os artigos 314.º, 369.º, n.º 2, 374.º, n.º 1, 376.º, n.º 2 e 1629.º. No Código da Propriedade Industrial, a título meramente exemplificativo, o artigo 98.º onde também o termo “considerando” é usado num contexto presuntivo.
- Também no ordenamento jurídico tributário encontra-se o verbo “considerar” com um sentido presuntivo.
- Referindo a Requerente a este propósito, o disposto no artigo 89-A.º, n.º 4 da LGT, no qual está, igualmente, consagrada uma presunção, sem que tenha sido usado o termo “presume-se”, mas sim “considera-se”.
- Concluindo, alega que, tendo em conta que o sistema jurídico deve formar um todo coerente, os exemplos que deixou referidos, acompanhados pela doutrina e jurisprudência, por apelo ao elemento sistemático, não é só quando é usado o verbo “presumir” que estamos perante uma presunção, mas também o uso de outros termos ou expressões podem, igualmente, servir de base a presunções, nomeadamente o termo “considera-se”, mostrando-se desta forma cumprida a condição estabelecida no artigo 9.º, n.º 2 do Código Civil.
- Se é certo, porém, que o elemento literal, por si só, não pode ser considerado inteiramente decisivo, quando acompanhado de outros elementos é bastante relevante e indicador do verdadeiro sentido da norma em análise, apontando para que a expressão “considerando-se como tais” seja equivalente à expressão “presumindo-se como tais”.
- A Requerente socorre-se do elemento racional ou teleológico o qual, no seu entender, se reveste da maior importância para determinar o sentido da norma em apreço.
- Cita o art. 1º do CIUC que, sob a epígrafe “princípio da equivalência” estabelece que “O imposto único de circulação obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida do custo ambiental e viário que estes provocam, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
- Sendo este princípio da equivalência, na sua opinião, um princípio estruturante do IUC.
- Pelo que os veículos devem ser tributados em função, nomeadamente, do seu potencial poluidor e dos níveis de segurança apresentados.
- Assim sendo, alega a Requerente que, atendendo, por um lado, ao lugar sistemático que o princípio da equivalência ocupa no Código do IUC, ao elemento histórico corporizado na Proposta de Lei n.º 118/X e, bem assim, ao elemento racional subjacente à reforma da tributação automóvel, só faz sentido conceber a expressão “considerando-se como tais”, no contexto do artigo 3.º do Código do IUC, como reveladora da presença de uma presunção ilidível.
- Razão pela qual, não será legítimo concluir que os sujeitos passivos deste imposto são apenas os proprietários ou equiparados dos veículos, em nome dos quais os mesmos se encontrem registados.
- Pois, a ratio legis do IUC antes aponta no sentido de serem tributados os utilizadores dos veículos, os efectivos proprietários ou, ainda, os locatários financeiros, pois são estes que têm o potencial poluidor causador dos custos ambientais à comunidade.
- Acrescenta que, à luz do disposto no artigo 349.º do Código Civil, as “presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido”.
- As presunções constituem, pois, meios de prova, tendo esta por função a demonstração da realidade dos factos.
- Assim, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que a ela conduz.
- Não obstante “as presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei o proibir”.
- Tratando-se de presunções de incidência tributária, estas são sempre ilidíveis.
- Assim, não poderá deixar de entender-se que a expressão “considerando-se como tais” utilizada no n.º 1 do artigo 3.º do Código do IUC, configura uma presunção legal, a qual é ilidível, nos termos gerais e, em especial, por força do disposto no artigo 73.º da LGT.
- As presunções de incidência tributária podem ser ilididas através do procedimento contraditório próprio previsto no artigo 64.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário ou, em alternativa, por via da reclamação graciosa ou da impugnação judicial dos actos tributários que nelas se baseiem.
- No caso em apreço, a Requerente alega que não utilizou o referido procedimento próprio, pelo que o presente pedido de pronúncia arbitral consubstancia o meio próprio para ilidir a presunção de incidência subjectiva do IUC que suporta as liquidações tributárias cuja anulação constitui o objecto do presente pedido.
- Nesta medida, e por forma a ilidir a presunção decorrente da inscrição no registo automóvel, a Requerente apresenta cópias das facturas/recibos de vendas dos veículos para demonstrar que os mesmos foram vendidos e que a respectiva venda se efectuou em data anterior àquela a que o imposto respeita.
- Mais alega a Requerente que o IUC é um imposto de periodicidade anual, sendo que, para o efeito e com referência a viaturas automóveis, o período de tributação corresponde ao ano que se inicia na data da matrícula ou em cada um dos seus aniversários.
- Sendo que, à excepção das situações previstas no n.º 2 do artigo 3.º do Código do IUC, está vinculado ao pagamento do imposto a pessoa que, nessa data, detenha a respectiva propriedade.
- Concluindo a Requerente que à data da exigibilidade do imposto a que respeitam as liquidações em apreço, não era a proprietária dos veículos naquelas identificados, por se ter já anteriormente operado as respectivas transferências, nos termos da lei civil.
- De acordo com o disposto no artigo 874.º do Código Civil, define-se por compra e venda “(…) o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”.
- E, por sua vez, o artigo 879.º do Código Civil prevê que “(…) a compra e venda tem como efeitos essenciais: (a) a transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito; (b) a obrigação de entregar a coisa; (c) a obrigação de pagar o preço”.
- Por outro lado, e no que respeita aos contratos com eficácia real, dispõe o artigo 408.º do Código Civil que “(…) a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as excepções previstas na lei.”
- Invoca a Requerente jurisprudência onde se pode ler o seguinte: “O contrato de compra e venda de veículo automóvel não está sujeito a qualquer formalidade especial, produzindo-se a transferência da propriedade por mero efeito do contrato, nos termos do art. 408, nº1, 874º e 879º, al. a) do C.C.”
- Alega que, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, o direito de propriedade dos veículos automóveis está sujeito a registo.
- De acordo com o disposto no artigo 1.º, n.º 1 do referido Decreto-Lei n.º 54/75, “o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”, sendo omisso quanto ao valor jurídico do registo de propriedade automóvel.
- Importando, pois, recorrer às disposições relativas ao registo predial conforme aponta o artigo 29.º daquele diploma.
- Assim, e de acordo com o disposto no artigo 7.º do Código do Registo Predial, “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.”.
- Da leitura conjugada de ambas as disposições legais, resulta que a função essencial do registo é, precisamente, dar publicidade à situação dos veículos, isto é, ao acto registado, não surtindo o registo, de acordo com jurisprudência que invoca, eficácia constitutiva funcionando (apenas) como mera presunção, ilidível, (presunção juris tantum) da existência do direito (art.s 1º, nº1 e 7º, do CRP84 e 350º,nº 2, do C. Civil) bem como da respectiva titularidade, tudo nos termos dele constantes”.
- Não contendo o Código do Registo Predial qualquer disposição no sentido de considerar o registo uma condição de validade dos contratos a ele sujeitos conclui a Requerente que, para adquirir a qualidade de proprietário basta que este figure no contrato de compra e venda como comprador, independentemente do registo.
- Pois o registo não tem valor constitutivo mas apenas declarativo, não afectando a ausência de registo de propriedade a qualidade de proprietário, nem impedindo a eficácia plena dos contratos de compra e venda de um veículo automóvel.
- Alega, ainda, a Requerente que, à luz do n.º 1 do artigo 5.º do Código do Registo Predial “os factos sujeitos a registo só produzem efeito contra terceiros depois da data do respectivo registo.”
- O conceito de terceiro para efeitos do registo predial (e concomitantemente do registo da propriedade automóvel), tem consagração legal no nº 4 do artigo 5º do Código do Registo Predial, nos termos do qual “terceiros, para efeitos de registo, são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si”.
- Atenta a noção legal e jurisprudencial de “terceiro”, segundo a Requerente, a conclusão é que a Requerida não preenche os requisitos da referida noção de “terceiro” não podendo, desta forma, invocar a ausência de registo para justificar a ineficácia dos contratos de compra e venda de veículos automóveis.
- Na opinião da Requerente, a interpretação que melhor salvaguarda a unidade do 15/10/2018 do acórdão de 04/06/2015, do Tribunal Central Administrativo Sul 15/10/2018 sistema jurídico é a de que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção.
- Assim, caso o comprador (novo proprietário do veículo) não providencie o registo do seu direito de propriedade, presume-se que este direito continua a ser do vendedor podendo, todavia, esta presunção ser ilidida mediante prova em contrário.
- Pelo que, segundo a Requerente, a Requerida não poderá prevalecer-se da ausência de actualização do registo do direito de propriedade, para exigir o pagamento do imposto ao anterior proprietário em nome do qual o veículo se encontra registado se e quando, por qualquer meio, lhe for apresentada prova bastante da respectiva venda.
- Do que alegou, a Requerente extrai as seguintes conclusões:
-
A norma constante do artigo 3.º, n.º 1, do Código do IUC, consagra uma presunção, que, dizendo respeito a uma norma de incidência tributária, admite sempre prova em contrário;
-
O contrato de compra e venda tem natureza real, sendo o efeito real, face ao disposto no n.º 1 do artigo 408.º do Código Civil, efeito do próprio contrato não ficando dependente de qualquer acto posterior, como é, designadamente, o caso do registo;
-
A função essencial do registo automóvel é dar publicidade à situação jurídica dos veículos não surtindo o registo eficácia constitutiva, funcionando (apenas) como mera presunção ilidível da existência do direito, bem como da respectiva titularidade, tudo nos termos dele constante. A presunção de que o direito registado pertence à pessoa em cujo nome está inscrito, pode ser ilidida mediante apresentação de prova em contrário;
-
Não preenchendo a Requerida os requisitos da noção de “terceiro” para efeitos de registo, não pode prevalecer-se da ausência de actualização do registo do direito de propriedade para pôr em causa a eficácia plena do contrato de compra e venda e para exigir ao vendedor (anterior proprietário) o pagamento do IUC devido pelo comprador (novo proprietário) desde que a presunção da respectiva titularidade seja ilidida através de prova bastante da venda.
-
Se nos termos de um contrato de compra e venda que tem por objecto um automóvel, na data da ocorrência do facto gerador do imposto, o veículo já tiver sido anteriormente alienado embora o direito de propriedade deste continue registado em nome do seu anterior proprietário, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1, do Código do IUC, o sujeito passivo do IUC é o novo proprietário, desde que seja apresentada prova bastante da venda que ilida a presunção do registo.
- Pelo que, no seu entender, resulta que as liquidações de IUC em causa, relativas aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012, padecem de vício material de violação de lei, devendo:
-
Ser declarada a ilegalidade destes actos de liquidação (e ser consequentemente anulados), no montante de € 7.739,91;
-
Ser, consequentemente, reconhecido o direito ao reembolso deste montante e, bem assim, o direito a juros indemnizatórios pelo pagamento de imposto indevidamente liquidado.
F. – RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta, na qual, em síntese, alegou o seguinte:
QUESTÕES INICIAIS
- Ao iniciar a sua Resposta, alega a Requerida que o pedido de pronúncia arbitral encontra-se subscrito por mandatário judicial, cuja procuração forense junta aos autos se encontra certificada pelo próprio, a quem foram conferidos poderes forenses, o que contraria o parecer do Conselho Geral da Ordem dos Advogados nº 15/PP/2008-G, de 2008/07/30.
- Por outro lado, relativamente aos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-…, constata que a propriedade dos mesmos se encontra registada em nome de outrem que não o da Requerente, desde 13/01/2010 e 14/08/2006, respectivamente, ou seja, desde ocasião anterior à data da exigibilidade do imposto em causa, pelo que, quanto a estes, a Requerida irá proceder à revogação das pretensas “liquidações oficiosas” em causa.
POR EXCEPÇÃO
Da falta de objecto e da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria.
- Alega a Requerida que, por via do seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente reagiu contra aquilo que ela própria apelida de “liquidações oficiosas” de IUC.
- Entende a Requerida que todos os documentos juntos pela Requerente não constituem quaisquer liquidações oficiosas, por não terem sido gerados e enviados pela Requerida à Requerente, constituindo meras notas de cobrança, geradas e extraídas pela própria Requerente no Portal das Finanças através da Internet.
- Portanto, que relativamente aos veículos automóveis sub judice, a Requerida não gerou nem enviou à Requerente quaisquer liquidações oficiosas com vista ao IUC referente aos anos de 2009 a 2012.
- Foi, no dizer da Requerida, a Requerente que, sem ter sido notificada para o efeito, procedeu à emissão das notas de cobrança aqui em causa relativamente a cada uma das viaturas e para os anos de 2009 a 2012.
- Pelo que, o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral não se escora sobre actos de “liquidação oficiosa” emitidos pela Requerida, mas sim sobre notas de cobrança que a Requerente de forma totalmente voluntária extraiu do Portal das Finanças e sob os quais procedeu ao pagamento.
- Entende a Requerida que a liquidação e a nota de cobrança são duas realidades distintas.
- A liquidação constitui um acto tributário e, consequentemente, passível de reacção mediante a dedução de pedido de pronúncia arbitral.
- Diferentemente, a nota de cobrança não constitui um acto tributário, nem possui sequer natureza complementar face àquele, configurando um mero acto de publicidade.
- Daí que, não constituindo a nota de cobrança um acto tributário, naturalmente, se verifica no caso vertente uma situação de falta de objecto, a qual constitui uma excepção peremptória, a qual invoca para todos os efeitos legais, nos termos do disposto no artigo 577º/3 do CPC, na redacção dada pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 29º/1 - e) do RJAT, a qual dá lugar à absolvição da Requerida do pedido, nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 576º/3 do CPC.
- Conclui a Requerida que o Tribunal Arbitral Singular constituído é materialmente incompetente para apreciar e decidir o pedido objecto do litígio sub judice, atendendo à inexistência de actos de liquidação oficiosa de IUC emitidos pela Requerida, o que consubstancia uma excepção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576º, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT e do artigo 29º/1 – a) e e) do RJAT.
Da preterição da prévia Reclamação Graciosa
- Entende a Requerida que, ainda que assim não se julgue, e se entenda que, na realidade, se está perante auto-liquidações geradas pela própria Requerente no Portal das Finanças e, configurando as auto-liquidações actos tributários, à luz do já referido artigo 2º/1 – a) do RJAT, o pedido de pronúncia arbitral constituiria um dos possíveis meios de reacção por banda da Requerente, que depende de prévia e necessária dedução de Reclamação Graciosa no prazo de 2 anos a contar da apresentação da declaração, confirme estatui o artigo 131º/1 do CPPT.
- Dado que, se a Requerente não apresentou qualquer Reclamação Graciosa relativamente aos actos de auto-liquidação sub judice, também por esta via não são susceptíveis de serem sindicados tais actos.
POR IMPUGNAÇÃO
- Impugna a alegada ilegitimidade da Requerente como sujeito passivo do IUC, nas situações em apreço, porquanto, no seu entender:
- A Requerente faz uma leitura enviesada da letra da lei, dado que o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que os sujeitos passivos do IUC são os proprietários, ou os que se encontram nas situações indicadas no nº 2 do art. 3º do CIUC, considerando-os como tal as pessoas em cujo nome se encontram os veículos registados, razão pela qual não foi utilizada neste dispositivo legal a expressão “presumem-se”, mas sim “considerando-se”.
- O normativo fiscal está repleto de previsões análogas à consagrada na parte final do nº 1 do artigo 3º, em que o legislador fiscal, dentro da sua liberdade de conformação legislativa, expressa e intencionalmente, consagra o que deve considerar-se legalmente, para efeitos de incidência, de rendimento, de isenção, de determinação e de periodização do lucro tributável, para efeitos de residência, de localização, entre muitos outros, como, por exemplo, nos artigos 2º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), 2º, 3º e 4º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e 4º, 17º, 18º e 20º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).
- Conclui, afirmando que a interpretação feita pela Requerente de que o legislador consagrou no art. 3º, nº 1 uma presunção é uma interpretação contra legem.
- Aduz, também, a Requerida, que não é pela impugnação das liquidações de IUC que se ilide a presunção registal.
- Alega, ainda, a Requerida que aquela interpretação não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime que impõe a obrigatoriedade do registo automóvel, de modo a evitar que a Autoridade Tributária caia em absoluta incerteza relativamente ao sujeito passivo do IUC, colocando até em risco o decurso do prazo de caducidade, razão pela qual o legislador quis intencional e expressamente que fossem considerados como proprietários, locatários, adquirentes com reserva de propriedade ou titulares do direito de opção de compra no aluguer de longa duração, para os mencionados efeitos tributários, as pessoas em nome das quais os veículos se encontram registados.
- No entender da Requerida, a mencionada interpretação da Requerente ignora o elemento teleológico da interpretação da lei: a ratio do regime consagrado não só no dispositivo legal em apreço, mas também em todo o CIUC.
- Considera a Requerida que o CIUC procedeu a uma reforma do regime de tributação dos veículos em Portugal, alterando de forma substancial o regime de tributação automóvel, passando os sujeitos passivos do imposto a ser os proprietários constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação dos veículos na via pública. Isto é, o Imposto Único de Circulação passou a ser devido pelas pessoas que figuram no registo como proprietárias dos veículos.
- Resulta tal conclusão do teor dos debates parlamentares em torno da aprovação do Decreto-Lei nº 20/2008, de 31 de Janeiro, da Recomendação nº 6-B/2012 do Provedor de Justiça e do espírito do CIUC que, tendo sido motivado, no essencial, por uma preocupação ambiental a sua “ratio” é a de tributar os utilizadores dos veículos, os quais, por força da respectiva utilização provocam um custo ambiental.
- Alega, ainda, que a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à Constituição, na medida em que viola o princípio da confiança e segurança jurídica, o princípio da eficiência do sistema tributário e o princípio da proporcionalidade.
- Entende a Requerida que a interpretação proposta pela Requerente, uma interpretação que no fundo desvaloriza a realidade registal em detrimento de uma “realidade informal” e insusceptível de um controlo mínimo por parte da Requerida, é ofensiva do basilar princípio da confiança e segurança jurídica que deve enformar qualquer relação jurídica, aqui se incluindo a relação tributária.
- Paralelamente, a interpretação dada pela Requerente é ofensiva do princípio da eficiência do sistema tributário, na medida em que se traduz num entorpecimento e encarecimento das competências atribuídas à Requerida, com óbvio prejuízo para os interesses do Estado Português, de que quer a Requerente quer a Requerida fazem parte.
- Constituindo um entendimento que está nas antípodas daquele princípio e da própria reforma da tributação automóvel, na medida em que, ao pretender desconsiderar a realidade registal, uma realidade que constitui a pedra angular na qual assenta todo o edifício do IUC, gera para a Requerida, e em última instância para o Estado Português, custos administrativos adicionais, entorpecimento do desempenho dos seus serviços, ausência de controlo do tributo e inutilidade dos sistemas de informação registal.
- Finalmente, a argumentação veiculada pela Requerente representa uma violação do princípio da proporcionalidade, na medida em que o desconsidera totalmente no confronto com o princípio da capacidade contributiva, quando na realidade a Requerente dispõe dos mecanismos legais necessários e adequados à salvaguarda daquela sua capacidade (v.g., o registo automóvel), sem que, contudo, os tenha exercitado em devido tempo.
- Acresce que a Requerente teria que fazer prova idónea dos factos constitutivos do direito que alega em juízo arbitral, o que, segundo a Requerida, não ocorre, por a prova apresentada pela Requerente não ser por si só, bastante para efectuar prova concludente da transmissão dos veículos em causa.
- Com efeito, apresenta 30 cópias das facturas de vendas, as quais, na óptica da Requerida, não constituem documento idóneo para comprovar a venda dos veículos em causa, uma vez que as mesmas não são mais do que um documento unilateralmente emitido pela Requerente.
- Segundo a Requerida, as facturas não são aptas a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático como é a compra e venda, pois aquele documento não revela por si só uma imprescindível e inequívoca declaração de vontade (i.e., a aceitação) por parte do pretenso adquirente, mormente neste processo em que a Requerente não juntou prova documental dos meios de pagamento do preço, ou os recibos de quitação da dívida.
- Não faltando casos de emissão de facturas referentes a transmissão de bens e/ou de prestações de serviços que nunca chegaram a concretizar-se.
- Segundo a Requerida, uma factura unilateralmente emitida pelo Requerente não pode substituir o Requerimento de Registo Automóvel, que é um documento aprovado por modelo oficial, quando a Requerente reconhece a necessidade de um contrato de compra e venda como meio adequado para ilidir a presunção registal.
- Entende a Requerida que uma pretensa factura não constitui um contrato de compra e venda e que a Requerente não provou a transmissão da propriedade dos veículos sub judice.
- Relativamente ao veículo com a matrícula …-…-… aduz a Requerida que a Requerente não juntou qualquer suposto elemento de prova.
- Assim sendo, a Requerida conclui que os actos tributários em crise não enfermam do alegado erro sobre os pressupostos de facto, na medida em que à luz do disposto no artigo 3º, nº 1 do CIUC e do artigo 6º do mesmo código, era a Requerente, na qualidade de proprietária, o sujeito passivo do IUC, uma vez que o IUC visa tributar o proprietário do automóvel, sendo que a propriedade é revelada através do seu registo.
- Pelo que a Requerente é responsável pelas custas arbitrais relativas ao presente pedido de pronúncia arbitral, dado que a falta do fornecimento dos dados deu inexoravelmente azo à emissão das liquidações sub judice.
- Na verdade, segundo a Requerida, se o IUC é liquidado de acordo com a informação registal oportunamente transmitida pelo Instituto dos Registos e Notariado, e não de acordo com informação gerada pela própria Requerida, e se a Requerente não procedeu oportunamente à sua actualização no Registo Automóvel, a Requerida não é responsável por esse pagamento, pois a transmissão da propriedade não é controlada pela Requerida.
- Aplicando-se o mesmo raciocínio relativamente ao pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios, não estando reunidos os pressupostos legais que conferem direito a serem peticionados.
- À luz dos artigos 43º da LGT e 61º do CPPT, o direito a juros indemnizatórios depende da verificação dos seguintes pressupostos: Estar pago o imposto, ter a respectiva liquidação sido anulada, total ou parcialmente, em processo gracioso ou judicial, determinação, em processo gracioso ou judicial, que a anulação se funda em erro imputável aos serviços, o que não ocorreria no caso, uma vez que os actos tributários em crise são válidos e legais, porque conformes ao regime legal em vigor à data dos factos tributários, razão pela qual não ocorreu qualquer erro imputável aos serviços.
- Conclui a Requerida, requerendo que devem ser julgadas parcialmente procedentes, por provadas as excepções peremptória de falta de objecto e dilatórias de incompetência do Tribunal Arbitral Singular e de preterição da necessária Reclamação Graciosa e, caso assim não se entenda, deve ser julgado parcialmente improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a entidade Requerida do pedido.
RESPOSTA DA REQUERENTE ÀS EXCEPÇÕES
Na resposta às excepções invocadas pela Requerida, alega a Requerente o seguinte:
- A Requerente foi confrontada na sua parte privativa do Portal das Finanças com uma série de dívidas de IUC, documentadas naquilo a que a AT chama de notas de cobrança (documentos de cobrança).
- Para efeitos da sua situação fiscal, as dívidas de IUC documentadas pelas referidas notas de cobrança eram já passíveis de pagamento, e foram pagas pela Requerente conforme consta da documentação anexa ao pedido de constituição de Tribunal Arbitral.
- Segundo diz, foi uma prioridade para a Requerente proceder ao pagamento daquelas dívidas de IUC aparecidas no sistema, uma vez que lesividade decorrente da impossibilidade de obter, para os mais variados efeitos da sua actividade comercial, uma certidão negativa de dívidas (certidão de situação contributiva regularizada), ultrapassava em muito a lesividade das concretas liquidações de imposto, pressupostas naquelas dívidas e que lhe são logicamente antecedentes.
- A Requerente alega que desconhecia as situações de dívida de IUC constantes do sistema informático da AT em estado que permitia e permitiu o seu pagamento.
- As dívidas de IUC aparecidas no sistema informático da AT (na área de acesso reservado à Requerente), são um facto indesmentível da criação da AT, a possibilidade do seu pagamento é também um facto indesmentível da responsabilidade da AT, e a quantificação dos seus montantes muito concretos, ano e matrícula do imposto, é também da inteira responsabilidade da AT e respectivo sistema informático.
- Estas dívidas de IUC pressupõem lógica e necessariamente uma série de liquidações de IUC, sendo irrelevante para o caso o meio pelo qual a Requerente tomou delas conhecimento.
- O facto é que tomou conhecimento das dívidas de IUC e que contra elas reagiu via pedido de constituição de Tribunal Arbitral.
G. – QUESTÕES A DECIDIR
Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:
1 – Excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do Tribunal Arbitral.
2 – Quanto ao mérito:
2.1 - Interpretação do nº 1 do art. 3º CIUC, de forma a ser determinado se a norma de incidência subjectiva nela inscrita, consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ilição, isto é, admite, ou não, que o contribuinte, em nome do qual se encontre o veículo registado na Conservatória do Registo Automóvel, possa demonstrar, através de meios de prova em Direito permitidos, que não é, no período a que o imposto respeita, o seu proprietário, afastando, assim, a presunção de sujeito subjectivo do imposto que sobre ele recai.
2.2 – Juros indemnizatórios – Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43º da LGT, no caso de serem anuladas as liquidações e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga.
3 – Responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.
H. – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
-
O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).
-
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas (vidé nesta Decisão o início de J. – MATÉRIA DE DIREITO), nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.
-
Considerada a identidade do facto tributado, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados, o Tribunal admite a cumulação de pedidos de declaração de ilegalidade dos actos tributários que são objecto deste processo, uma vez que estão cumpridos os requisitos estabelecidos no art. 3º, nº 1 do RJAT.
4. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.
I. – MATÉRIA DE FACTO
I. 1 – FACTOS PROVADOS
Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provado os seguintes factos:
1 – A Requerente A…, SA., também identificada como “B…”, é uma instituição financeira que tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, dispondo, para o efeito, de todas as autorizações legalmente exigíveis.
2 – No âmbito da sua actividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de aluguer de longa duração e contratos de locação financeira, de veículos automóveis, findos os quais transmite a propriedade dos mesmos aos respectivos locatários ou a terceiros.
3 – Entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, verificou a Requerente, na área de acesso reservada à Requerente do Portal das Finanças, a existência das dívidas de IUC constantes dos autos, relativas às viaturas identificadas no Pedido de Pronúncia Arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012.
4 – A Requerente procedeu ao pagamento voluntário do referido IUC.
5 – A Requerente não era proprietária dos veículos sub judice, nas datas da ocorrência dos factos geradores do imposto em apreço, embora a propriedade de todos se encontrasse registada em nome da Requerente, com excepção dos veículos com as matrículas …-… -…e …-…-…, em que a propriedade se encontrava registada em nome de outrem.
6 – A Requerida, no decorrer deste processo, determinou a revogação da documentação da AT da exigibilidade do IUC relativamente aos veículos com as matrículas …-… -… e …-…-… .
7 – Em 12 de Fevereiro de 2014, o Requerente apresentou o Pedido de Pronúncia Arbitral, que deu origem aos presentes autos.
I. 2 – FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.
Relativamente às facturas e aos documentos de venda referentes aos veículos, que foram ulteriormente juntos ao processo, o Tribunal decidiu que os mesmos constituem meio de prova com força bastante para titular a transmissão da sua propriedade, por gozarem da presunção de veracidade estabelecida no art. 75º, nº 1 da LGT, e com base nos restantes fundamentos que melhor constam da Decisão
I. 3 – FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos não provados com relevância para a apreciação das questões a decidir.
J. – MATÉRIA DE DIREITO
Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.
Antes de mais e relativamente às questões prévias suscitadas pela Requerida cumpre dizer o seguinte:
Foi suprida a irregularidade da procuração forense, que inicialmente a Requerente juntou aos autos, e que era certificada pelo próprio mandatário, através da junção de uma nova procuração certificada por entidade terceira.
O Tribunal, face ao reconhecimento pela Requerida de que a propriedade dos veículos com as matrículas …-… -… e …-…-… encontrava-se registada em nome de outrem, que não o da Requerente, em data anterior à da exigibilidade do imposto em causa e à sua declarada intenção de proceder à revogação daquilo que chama “pretensas liquidações oficiosas” e, perante o silêncio da Requerida, deu tais factos como provados, deixando de considerar na presente decisão os IUC referentes aos mencionados veículos.
A questão a decidir a seguir respeita às excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do Tribunal Arbitral.
Apenas, caso as mesmas sejam julgadas improcedentes, se apreciará a pretensão sobre a ilegalidade e a consequente anulação dos actos de liquidação relativos a IUC, respeitantes aos veículos, cujas matrículas estão identificados nos autos, com excepção dos referidos …-… -… e …-…-…, e sobre o reconhecimento do direito à restituição do imposto, bem como o eventual direito a juros indemnizatórios.
Analisemos, pois, a questão relativa às excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do tribunal arbitral.
Conforme ficou provado, a Requerente entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, verificou na área de acesso reservada à Requerente do Portal das Finanças, a existência das dívidas de IUC constantes dos autos, relativas às viaturas identificadas no Pedido de Pronúncia Arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012, tendo procedido ao pagamento voluntário deste referido IUC.
Verifica-se, assim, estarmos perante actos de autoliquidação, uma vez que a liquidação do imposto foi efectuada pela Requerente, tomando em conta as notas de cobrança que o sistema informático da Requerida lhe apresentou na sua área privativa.
Incorre em erro a Requerente quando titula tais actos como liquidações oficiosas, quando na verdade, e como bem diz a Requerida, os mesmos não têm essa natureza jurídica, constituindo isso sim autoliquidações de tributos, conforme decorre dos autos.
No entanto, para o caso, torna-se irrelevante a qualificação dos mencionados actos, uma vez que o conhecimento dos mesmos cai no âmbito da competência material deste Tribunal Arbitral, nos termos do nº 1, alínea a) do RJAT, o qual preceitua que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação de pretensões visando a declaração de ilegalidade não só de actos de liquidação de tributos, mas também de actos de autoliquidação, para além de outros.
Chegados a este ponto, coloca-se a questão suscitada pela Requerida da necessidade de prévia dedução de reclamação graciosa, como condição para a impugnação que foi interposta.
Com efeito, dispõe o art. 131º, nº 1 do CPPT, que se transcreve:
“Artigo 131º
Impugnação em caso de autoliquidação
1 – Em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao dirigente do órgão periférico regional da administração tributária, no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração.
…………………………………………………………………………………………………………………………………”
Resulta, assim, do normativo transcrito que a regra é a da necessidade da reclamação graciosa prévia à impugnação.
No entanto, há que ter em conta o disposto do nº 3, do referido art. 131º do CPPT, que também se transcreve:
Artigo 131º
Impugnação em caso de autoliquidação
“…………………………………………………………………………………………………………………………………..
3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o prazo para a impugnação não depende de reclamação prévia, devendo a impugnação ser apresentada no prazo do nº 1 do artigo 102º.”
Ora, da análise da situação em apreço, resulta claro que as autoliquidações geradas pela Requerente pressupõem necessariamente liquidações efectuadas pela Administração Tributária, que estão expressas nas referidas notas de cobrança colocadas pela Requerida no Portal das Finanças, na zona privativa da Requerente.
Assim sendo, as liquidações foram efectuadas por meios informáticos, estando vedado à Requerente alterar os elementos constantes das notas de cobrança, em que figuram os elementos relativos ao pagamento e a demonstração da respectiva liquidação ( art. 16º, nº 4 do CIUC).
Ora, a Requerente efectuou o pagamento das quantias respeitantes a IUC, que se apresentavam no Portal das Finanças estarem em dívida, e deduziu a presente impugnação com fundamento numa divergência com a Requerida relativamente à interpretação do nº 1 do art. 3º do IUC, no ponto em que consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ser ilidida.
Assim sendo, face ao teor do nº 3 do art. 131º do CPPT, o Tribunal entende que, no caso dos autos, em que existiram actos de autoliquidação, com a natureza que se deixou referida, sendo, como é, o fundamento de impugnação matéria exclusivamente de direito e esses actos sido efectuados de acordo com orientações genéricas emitidas pela Administração Tributária, não é obrigatória a reclamação graciosa prévia.
Carecem, assim, de fundamento as excepções invocadas pela Requerida, porquanto não existe falta de objecto, uma vez que o objecto consiste nos actos de autoliquidação que ficaram provados nos autos, sendo os mesmos passíveis de conhecimento por este Tribunal Arbitral, nos termos do nº 1, alínea a), do art. 2º do RJAT, independentemente de ter sido deduzida previamente reclamação graciosa.
Passemos, então, à análise da questão de mérito a decidir.
Alega a Requerente que não era proprietária dos veículos que identifica à data em que ocorreram os factos tributários que originaram as liquidações de IUC, e, consequentemente, não era sujeito passivo do imposto que lhe foi liquidado.
A Requerida Autoridade Tributária assume uma posição oposta relativamente a esta questão da incidência subjectiva do IUC, defendendo que, nos termos do art. 3º, nº 1 do CIUC, é sujeito passivo do IUC a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado na Conservatória do Registo Automóvel, facto este que ocorria com a Requerente, no período em causa.
O art. 3º, nº 1 do CIUC dispõe relativamente a esta matéria controvertida, o seguinte:
“Art. 3º - Incidência subjectiva
1. São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares e colectivas, de direito público ou privado, em nome dos quais os mesmos se encontrem registados.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------“
Das posições assumidas pelas Partes no presente processo, resulta claro que no fundo esta questão se resume a saber se a norma de incidência subjectiva acima transcrita, constante do nº 1 do art. 3º do CIUC, estabelece uma presunção legal, susceptível de ilisão, como pretende a Requerente ou, expressa e intencionalmente, considera as pessoas em nome de quem os veículos estão registados como proprietários para efeito de incidência subjectiva do IUC, como entende a Requerida.
As orientações arrogadas pela Requerente e pela Requerida quanto a esta matéria e a sua fundamentação estão expostas em síntese, ou com parcial transcrição, em E. e F. do Relatório desta Decisão.
Cumpre, então, decidir:
Um ponto preliminar para se apreciar a questão do valor jurídico do registo automóvel.
O nº 1 do art. 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro, que disciplina o registo de veículos automóveis, dispõe que o registo de veículos “tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos… tendo em vista a segurança do comércio jurídico”.
Por seu lado, estabelece o art. 7º do Código do Registo Predial, aplicável ao registo automóvel por força do disposto no art. 29º do referido Decreto-Lei nº 54/75, que “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos precisos termos em que o registo define”.
Verifica-se, assim, que o registo definitivo é tão-só uma presunção da existência do direito, que admite prova em contrário, constituindo, portanto, presunção ilidível, conforme, aliás, tem sido reconhecido na jurisprudência.
Dado que não existe neste Código qualquer disposição que exija o registo como condição de validade dos contratos, conclui-se que, para se adquirir a qualidade de proprietário de um veículo, basta figurar como comprador num contrato de compra e venda.
Relativamente ao teor da norma em apreço – art. 3º, nº 1 do CIUC -, há que dizer que, conforme reconhecido unanimemente e se encontra consagrado no art. 11º da LGT, as leis fiscais devem ser interpretadas de acordo com os princípios gerais de interpretação, avultando, assim, para o efeito, o preceito fundamental de interpretação que é o art. 9º do Código Civil, o qual fornece as regras e os elementos para a interpretação das normas.
Significa isto que se devem utilizar os instrumentos tradicionais de hermenêutica jurídica, com vista a ser determinado o pensamento legislativo, de acordo com o disposto no art. 9º do Código Civil.
Nesta conformidade, comecemos a interpretação do art. 3º, nº 1 do CIUC, pelo elemento literal, aquele em que se visa detectar o pensamento legislativo que se encontra objectivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo.
A questão que se coloca é saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.
A nosso ver, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que, da análise do nosso ordenamento jurídico, se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.
Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo considerar, de que se indicam, meramente a título de exemplo, as seguintes:
No âmbito do direito civil - o nº 3 do art. 243º do Código Civil, quando estabelece que “considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar”;
também no âmbito do direito da propriedade industrial o mesmo se passa, quando o art. 59º, nº 1 do Código da Propriedade Industrial dispõe que “As invenções cuja patente tenha sido pedida durante o ano seguinte à data em que o inventor deixar a empresa, consideram-se feitas durante a execução do contrato de trabalho”;
e, também, no âmbito do direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo;
Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.
Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.
Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC, foi consagrada a presunção dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.
Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objectivo de tributar o verdadeiro e efectivo proprietário e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.
O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.
Com efeito, o actual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.
Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem.
Esta interpretação tem assento no disposto no nº 1, do art. 9º do Código Civil, que preceitua que a busca do pensamento legislativo deverá ter sobretudo em conta “a unidade do sistema jurídico e as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”.
Assim, também, da interpretação efectuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efectivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.
Ora, estabelece o art. 73º da LGT que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis”.
Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum, portanto, ilidível, a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
Analisados os elementos carreados para o processo pela Requerente, extrai-se a conclusão que esta não era proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço, por, entretanto, já ter transferido a propriedade dos mesmos, nos termos da lei civil.
Esta transmissão de propriedade é oponível à Requerida Autoridade Tributária, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos contra terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial, a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do CRP, isto é, não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Relativamente à questão suscitada pela Requerida sobre a idoneidade probatória das facturas, que a Requerida põe em causa em termos genéricos, o Tribunal não tem dúvidas em aceitá-las como meio de prova da transmissão da propriedade dos veículos, mormente quando acompanhadas de documentos de venda, posteriormente juntos pela Requerente, pelas razões seguintes:
Na situação dos autos, estamos perante um contrato de compra e venda de coisas móveis, o qual, por aplicação do disposto no art. 219º do CC, não está sujeito a nenhum formalismo especial.
Embora se reconheça que a titulação destes contratos, por terem por objecto veículos automóveis, em que o registo é obrigatório, beneficia com a emissão de declaração de venda, que é necessária para a inscrição no registo, isso não impede que o contrato seja provado de outra forma, pois esta declaração não constitui o único e exclusivo meio de prova da venda.
Para o caso, reveste especial importância o facto de, uma vez que a Requerente tem natureza empresarial, as facturas, que foram juntas aos autos pela Requerente, estão subordinadas a rigorosas regras legais de ordem contabilística e fiscal, com implicações, também, na cobrança de outros tributos.
Na verdade, a legislação tributária atribui-lhes uma relevância muito especial, que não pode deixar de lhe conferir credibilidade probatória, e que se encontra bem expressa no disposto nos seguintes normativos legais que, a título de exemplo, se citam: arts. 29º, nº 1, alínea b) e 19º, nº 2 do CIVA e arts. 23º, nº 6 e 123º, nº 2 do CIRC.
Ora, desde que essas facturas tenham sido emitidas de acordo com a legislação comercial e fiscal, questão que a Requerida não suscita, e o que não põe em causa, as mesmas gozam da presunção de veracidade, que lhe é atribuída pelo art. 75º, nº 1 da LGT.
Caberia à Requerida apresentar e demonstrar indícios concretos e fundamentados de que as operações tituladas pelas mencionadas facturas não correspondiam à realidade, face ao disposto no nº 2 do art. 75º da LGT, o que não ocorreu.
Nesta conformidade, atenta a relevância muito especial que a legislação tributária atribui às facturas na situação vertente e a que estas gozam da presunção de veracidade, que lhes é concedida pelo disposto no art. 75º, nº 1 da LGT, e, também, aos documentos de venda juntos aos autos, concluímos que constituem meio de prova suficiente para ilidir a presunção que decorre do art. 3º, nº 1 do CIUC, uma vez que comprovam que a Requerente não era proprietária dos veículos ao tempo a que diz respeito a liquidação do IUC.
Razão pela qual, as mencionadas liquidações devem ser anuladas e, consequentemente restituído à Requerente pela Autoridade Tributária o imposto que indevidamente lhe foi cobrado.
Quanto aos juros indemnizatórios, esta matéria está regulada no art. 24º do RJAT, o qual expressamente determina no seu nº 1, alínea b) que a decisão arbitral obriga a administração tributária, nos casos aí consignados, a “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias, para o efeito”, e preceitua, ainda, no seu nº 5, que “É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
Também o art. 100º da LGT, cuja aplicação é autorizada pelo disposto no art. 29º, nº 1, alínea a) do RJAT, preceitua de modo idêntico, no sentido da imediata reconstituição da legalidade, compreendendo a mesma o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso.
Por seu lado, o art. 43º, nº 1 da LGT condiciona o direito a juros indemnizatórios aos casos em que “houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Nesta conformidade, a questão que se coloca é a de se saber se, face ao circunstancialismo demonstrado e ao teor do disposto no art. 3º, nº 1 do CIUC, se pode considerar ter havido, ou não, um erro imputável aos serviços na situação vertente.
Analisada a situação, verifica-se que a Autoridade Tributária ao liquidar o IUC nos termos em que o fez, deu cumprimento ao ditame legal de ordem geral estabelecido no referido normativo, no ponto em que o sujeito passivo do imposto é o proprietário do veículo, atribuindo essa qualidade de proprietário, para os referidos efeitos, ao contribuinte em nome do qual se encontra registado o veículo na Conservatória do Registo Automóvel, sem necessidade de efectuar qualquer prova.
Só após o reconhecimento por este tribunal arbitral que o dispositivo em apreço tem a natureza de presunção juris tantum, é que a Requerente está em condições de ilidir a referida presunção, o que veio a fazer e a provar, deixando a partir de agora de ser sujeito passivo do referido imposto, razão pela qual se conclui pela inexistência de erro imputável aos serviços.
Quanto à responsabilidade pelas custas arbitrais, alega a Requerida que não é responsável pelo seu pagamento, por ter procedido às liquidações do imposto com os elementos de que dispunha, não podendo ser responsabilizada por o que apelida de “falta de zelo” da Requerente.
Este argumento não pode ser considerado, porquanto a lei é taxativa na imputação da responsabilidade pelo pagamento das custas à parte que for condenada, face ao disposto nos nºs 1 e 2, do art. 527 do Código do Processo Civil, aplicável por força do art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
Assim sendo, a responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais é da Requerida.
L. – DECISÃO
Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:
-
Julgar improcedentes as excepções invocadas pela requerida.
-
Julgar procedente, com fundamento em vício de violação de lei, o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação de IUC, relativamente a todos os veículos cujas matrículas estão identificadas nos autos, respeitantes aos anos aí referidos, com excepção dos veículos com as matrículas …-… -… e …-…-…, e, em consequência
-
Anular os actos tributários de liquidação correspondentes, ainda não revogados pela Requerida.
-
E reconhecer o direito ao reembolso do montante que lhes respeita.
-
Julgar improcedente o pedido do reconhecimento do direito a juros indemnizatórios a favor da Requerente.
-
Condenar a Requerida a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).
Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315º, nº 2) e 97º - A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 7.739,91 euros.
Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Notifique-se.
Lisboa, 12 de Março de 2018
O Árbitro
José Nunes Barata
(Redacção pela ortografia antiga)
Decisão Arbitral substituída pela decisão de 12 de março de 2018.
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
A. – PARTES
A…, SA., a seguir designada por Requerente, pessoa colectiva nº …, com sede na Rua … Lisboa, veio requerer em 24 de Fevereiro de 2014 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito nos art. 2º, nº 1, alínea a) do Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária -RJAT) e nos arts. 1º, alínea a) e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.
B. – CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL
1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 26/02/2014 e automaticamente notificado à Requerente e à Autoridade Tributária e Aduaneira em 27/02/2014, tendo o Presidente do respectivo Conselho Deontológico designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 1, do RJAT, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.
2. Em 11/04/2014, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11º, nº 1, alínea b) do RJAT, nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.
3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 30/04/2014, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11º do Decreto – Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.
C. – PRETENSÃO
A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade e a consequente anulação das liquidações de Imposto Único de Circulação, respeitantes aos veículos identificados nos autos, no valor de 7.739,91 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência.
Determine a restituição do imposto que foi pago pela Requerente, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, contados desde a data do respectivo pagamento até integral reembolso.
D. – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 30/04/2014, seguiram-se os posteriores termos processuais na forma seguinte:
- Em 02/05/2014 – Foi notificada a Requerida para, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 17º do RJAT, apresentar resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e remeter ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo, por via electrónica.
- Em 27/05/2014 – A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral, remeteu despacho de designação dos juristas representantes da Requerida e inseriu na “Plataforma” online do CAAD o processo administrativo, tendo sido, de tudo, notificada a Requerente.
- Em 02/06/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de cópia de procuração forense certificada por entidade terceira, por forma a suprir a irregularidade da certificação da primitiva procuração, requerimento esse que o Tribunal admitiu em 05/06/2014, tendo ordenado a sua notificação à Requerida.
- Em 03/06/2014 – A Requerente apresentou resposta à excepção invocada pela Requerida, que foi admitida em 08/06/2014, e notificada à Requerida.
- Em 04/06/2014 – O Tribunal designou o dia 23/06/2014 para a reunião prevista no art. 18º do RJAT.
- Em 06/06/2014 – A Requerida apresentou um requerimento para que, na reunião prevista no art. 18º do RJAT, marcada para o dia 23/06/2014, não fossem ouvidas as Partes quanto à matéria das excepções, em consequência da Requerente já se ter pronunciado por escrito, o qual foi admitido pelo Tribunal em 08/06/2014 e notificado à Requerente, sendo, também, confirmada a data da reunião prevista no art. 18º do RJAT para 23/06/2014.
- Em 23/06/2014 – Realizou-se a reunião prevista no art. 18º do RJAT, de que resultou, o seguinte:
- O Tribunal deferiu o requerimento da Requerida de 12/06/2014, e,
consequentemente, supriu a irregularidade da procuração do mandatário da
Requerente, com a junção aos autos de nova procuração forense certificada
por entidade terceira, sem oposição da Requerida.
- Foram ouvidas as Partes sobre as excepções invocadas.
- A Requerida requereu a junção de um documento para contraprova do art.
11º do Pedido de Pronúncia do Tribunal Arbitral e dos docs. 2 a 70 juntos a
este. A Requerente não se opôs à junção do documento e requereu um prazo
de dez dias para se pronunciar sobre o mesmo. O Tribunal deferiu.
- O Tribunal ordenou a suspensão da Reunião, face ao que antecede, para ser
retomada no dia 14/07/2014.
- Em 30/06/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de um requerimento de resposta ao apresentado na reunião de 23/06/2014 pela Requerida, que foi admitido pelo Tribunal em 03/07/2014, com conhecimento à Requerida.
- Em 14/07/2014 – Continuação da Reunião prevista no art. 18º do RJAT, que tinha sido suspensa em 23/06/2014, de que resultou o seguinte:
- A Requerente requereu a produção de prova adicional, o que foi deferido pelo
Tribunal ao abrigo do disposto no art. 16º, alínea a) do RJAT, com oposição da
Requerida.
- O Tribunal fixou um prazo de 10 dias para a Requerente produzir prova
adicional e de 20 dias para a Requerida se pronunciar sobre a mesma.
- O Tribunal fixou um prazo de 10 dias a contar da pronúncia da Requerida
sobre a prova adicional para produção de alegações escritas pela Requerente.
- O Tribunal fixou, também, um prazo de 10 dias a contar da apresentação das
alegações escritas pela Requerente, para a apresentação de alegações
escritas pela Requerida.
- Em 16/07/2014 – A Requerida requereu a junção aos autos de uma decisão arbitral, requerimento que foi deferido em 18/07/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 13/08/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de duas decisões arbitrais, o que foi deferido pelo Tribunal em 18/08/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 01/09/2014 – A Requerente requereu a junção aos autos de 38 documentos, o que foi deferido pelo Tribunal em 24/09/2014, com notificação à Requerida.
- Em 18/09/2014 – A Requerida requereu a junção aos autos de duas decisões arbitrais, o que o Tribunal deferiu, em 19/09/2014, com notificação à parte contrária.
- Em 30/09/2014 – O Tribunal, face à impossibilidade de ser proferida decisão final no prazo fixado no nº 1 do art. 21º do RJAT, prorrogou esse prazo por dois meses, ao abrigo do nº 2 deste normativo e fixou a data da prolação da decisão em 17/11/2014.
- Em 17/10/2014 – A Requerida apresentou requerimento de pronúncia sobre os documentos juntos pela Requerente em 01/09/2014, tendo o requerimento sido deferido em 18/10/2014 e notificado à Requerente.
- Em 22/10/2014 – A Requerente apresentou alegações escritas.
- A Requerida não apresentou alegações escritas.
- Em 15/11/2014 – Prolação da decisão arbitral.
E. – PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS
A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente, alegou, em síntese, o seguinte:
- A Requerente A…, SA., também identificada como “B…”, é uma instituição financeira que tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, dispondo, para o efeito, de todas as autorizações legalmente exigíveis.
- No âmbito da sua actividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de Aluguer de Longa Duração e Contratos de Locação Financeira, de veículos automóveis, findos os quais transmite a propriedade dos mesmos aos respectivos locatários ou a terceiros.
- Entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, foi a Requerente notificada de Liquidações Oficiosas de IUC relativas às viaturas identificadas no presente pedido de pronúncia arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012.
- Tendo a Requerente procedido ao pagamento voluntário do referido IUC.
- A Requerente discorda dos referidos actos de liquidação, na medida em que os veículos, relativamente aos quais impendia o pagamento do IUC, não eram sua propriedade à data identificada pela Requerida como data da ocorrência do facto gerador do imposto.
- Pois, no seu entender, de acordo com o disposto no artigo 3.º, n.º 1 do Código do IUC, “são sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.”
- O recurso ao registo automóvel como elemento estruturante do funcionamento do IUC evidencia-se ao longo de todo o Código.
- Referindo, a título meramente exemplificativo, o teor do artigo 6.º do Código do IUC, relativo à definição do facto gerador da obrigação de imposto, nos termos do qual, este “(…) é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional.”
- Decorrendo igualmente deste preceito que os veículos que não estejam, nem devam estar, sujeitos a registo em território português, apenas ficam sujeitos a este imposto se permanecerem no mesmo por um período superior a 183 dias.
- Trata-se, no seu entender, de uma norma que, recorrendo ao elemento registral, estabelece, simultaneamente, o facto gerador do imposto e a respectiva conexão fiscal.
- Sendo, também, dos elementos do registo automóvel que se extrai o momento do início do período de tributação, bem como, de uma maneira geral, todos os elementos necessários à liquidação do imposto em causa, como é, designadamente, o caso da cilindrada, antiguidade da matrícula, tipo de combustível e nível de emissão de dióxido de carbono.
- A Requerente entende que, da dependência do regime de tributação do IUC em relação ao registo automóvel, não se pode deixar de concluir que a norma de incidência subjectiva na parte em que considera como proprietário a pessoa em nome do qual o veículo se encontre registado constitui uma mera presunção (legal) de incidência.
- De acordo com outros elementos interpretativos, em especial, da respectiva noção legal.
- Atendendo ao teor literal do artigo 3.º, n.º 1 do Código do IUC, diz que importa analisar, em especial, a expressão “considerando-se como tais”, em especial na perspectiva do disposto no artigo 9.º, n.º 2 do Código Civil, quando estabelece não poder ser compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo que não tenha na respectiva letra um mínimo de correspondência verbal ainda que imperfeitamente expresso.
- E que o actual texto não usou o termo “presumem-se”, ao contrário do que constava do extinto Regulamento do Imposto Sobre Veículos, mas examinando o ordenamento jurídico português, encontram-se diversos exemplos de normas que consagram presunções utilizando o verbo “considerar”, muitas das quais empregues no gerúndio (“considerando” ou mesmo “considerando-se”).
- Sendo disso exemplo as normas que a seguir apresenta. No Código Civil, entre outras, os artigos 314.º, 369.º, n.º 2, 374.º, n.º 1, 376.º, n.º 2 e 1629.º. No Código da Propriedade Industrial, a título meramente exemplificativo, o artigo 98.º onde também o termo “considerando” é usado num contexto presuntivo.
- Também no ordenamento jurídico tributário encontra-se o verbo “considerar” com um sentido presuntivo.
- Referindo a Requerente a este propósito, o disposto no artigo 89-A.º, n.º 4 da LGT, no qual está, igualmente, consagrada uma presunção, sem que tenha sido usado o termo “presume-se”, mas sim “considera-se”.
- Concluindo, alega que, tendo em conta que o sistema jurídico deve formar um todo coerente, os exemplos que deixou referidos, acompanhados pela doutrina e jurisprudência, por apelo ao elemento sistemático, não é só quando é usado o verbo “presumir” que estamos perante uma presunção, mas também o uso de outros termos ou expressões podem, igualmente, servir de base a presunções, nomeadamente o termo “considera-se”, mostrando-se desta forma cumprida a condição estabelecida no artigo 9.º, n.º 2 do Código Civil.
- Se é certo, porém, que o elemento literal, por si só, não pode ser considerado inteiramente decisivo, quando acompanhado de outros elementos é bastante relevante e indicador do verdadeiro sentido da norma em análise, apontando para que a expressão “considerando-se como tais” seja equivalente à expressão “presumindo-se como tais”.
- A Requerente socorre-se do elemento racional ou teleológico o qual, no seu entender, se reveste da maior importância para determinar o sentido da norma em apreço.
- Cita o art. 1º do CIUC que, sob a epígrafe “princípio da equivalência” estabelece que “O imposto único de circulação obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida do custo ambiental e viário que estes provocam, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
- Sendo este princípio da equivalência, na sua opinião, um princípio estruturante do IUC.
- Pelo que os veículos devem ser tributados em função, nomeadamente, do seu potencial poluidor e dos níveis de segurança apresentados.
- Assim sendo, alega a Requerente que, atendendo, por um lado, ao lugar sistemático que o princípio da equivalência ocupa no Código do IUC, ao elemento histórico corporizado na Proposta de Lei n.º 118/X e, bem assim, ao elemento racional subjacente à reforma da tributação automóvel, só faz sentido conceber a expressão “considerando-se como tais”, no contexto do artigo 3.º do Código do IUC, como reveladora da presença de uma presunção ilidível.
- Razão pela qual, não será legítimo concluir que os sujeitos passivos deste imposto são apenas os proprietários ou equiparados dos veículos, em nome dos quais os mesmos se encontrem registados.
- Pois, a ratio legis do IUC antes aponta no sentido de serem tributados os utilizadores dos veículos, os efectivos proprietários ou, ainda, os locatários financeiros, pois são estes que têm o potencial poluidor causador dos custos ambientais à comunidade.
- Acrescenta que, à luz do disposto no artigo 349.º do Código Civil, as “presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido”.
- As presunções constituem, pois, meios de prova, tendo esta por função a demonstração da realidade dos factos.
- Assim, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que a ela conduz.
- Não obstante “as presunções legais podem, todavia, ser ilididas mediante prova em contrário, excepto nos casos em que a lei o proibir”.
- Tratando-se de presunções de incidência tributária, estas são sempre ilidíveis.
- Assim, não poderá deixar de entender-se que a expressão “considerando-se como tais” utilizada no n.º 1 do artigo 3.º do Código do IUC, configura uma presunção legal, a qual é ilidível, nos termos gerais e, em especial, por força do disposto no artigo 73.º da LGT.
- As presunções de incidência tributária podem ser ilididas através do procedimento contraditório próprio previsto no artigo 64.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário ou, em alternativa, por via da reclamação graciosa ou da impugnação judicial dos actos tributários que nelas se baseiem.
- No caso em apreço, a Requerente alega que não utilizou o referido procedimento próprio, pelo que o presente pedido de pronúncia arbitral consubstancia o meio próprio para ilidir a presunção de incidência subjectiva do IUC que suporta as liquidações tributárias cuja anulação constitui o objecto do presente pedido.
- Nesta medida, e por forma a ilidir a presunção decorrente da inscrição no registo automóvel, a Requerente apresenta cópias das facturas/recibos de vendas dos veículos para demonstrar que os mesmos foram vendidos e que a respectiva venda se efectuou em data anterior àquela a que o imposto respeita.
- Mais alega a Requerente que o IUC é um imposto de periodicidade anual, sendo que, para o efeito e com referência a viaturas automóveis, o período de tributação corresponde ao ano que se inicia na data da matrícula ou em cada um dos seus aniversários.
- Sendo que, à excepção das situações previstas no n.º 2 do artigo 3.º do Código do IUC, está vinculado ao pagamento do imposto a pessoa que, nessa data, detenha a respectiva propriedade.
- Concluindo a Requerente que à data da exigibilidade do imposto a que respeitam as liquidações em apreço, não era a proprietária dos veículos naquelas identificados, por se ter já anteriormente operado as respectivas transferências, nos termos da lei civil.
- De acordo com o disposto no artigo 874.º do Código Civil, define-se por compra e venda “(…) o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”.
- E, por sua vez, o artigo 879.º do Código Civil prevê que “(…) a compra e venda tem como efeitos essenciais: (a) a transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito; (b) a obrigação de entregar a coisa; (c) a obrigação de pagar o preço”.
- Por outro lado, e no que respeita aos contratos com eficácia real, dispõe o artigo 408.º do Código Civil que “(…) a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as excepções previstas na lei.”
- Invoca a Requerente jurisprudência onde se pode ler o seguinte: “O contrato de compra e venda de veículo automóvel não está sujeito a qualquer formalidade especial, produzindo-se a transferência da propriedade por mero efeito do contrato, nos termos do art. 408, nº1, 874º e 879º, al. a) do C.C.”
- Alega que, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, o direito de propriedade dos veículos automóveis está sujeito a registo.
- De acordo com o disposto no artigo 1.º, n.º 1 do referido Decreto-Lei n.º 54/75, “o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”, sendo omisso quanto ao valor jurídico do registo de propriedade automóvel.
- Importando, pois, recorrer às disposições relativas ao registo predial conforme aponta o artigo 29.º daquele diploma.
- Assim, e de acordo com o disposto no artigo 7.º do Código do Registo Predial, “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.”.
- Da leitura conjugada de ambas as disposições legais, resulta que a função essencial do registo é, precisamente, dar publicidade à situação dos veículos, isto é, ao acto registado, não surtindo o registo, de acordo com jurisprudência que invoca, eficácia constitutiva funcionando (apenas) como mera presunção, ilidível, (presunção juris tantum) da existência do direito (art.s 1º, nº1 e 7º, do CRP84 e 350º,nº 2, do C. Civil) bem como da respectiva titularidade, tudo nos termos dele constantes”.
- Não contendo o Código do Registo Predial qualquer disposição no sentido de considerar o registo uma condição de validade dos contratos a ele sujeitos conclui a Requerente que, para adquirir a qualidade de proprietário basta que este figure no contrato de compra e venda como comprador, independentemente do registo.
- Pois o registo não tem valor constitutivo mas apenas declarativo, não afectando a ausência de registo de propriedade a qualidade de proprietário, nem impedindo a eficácia plena dos contratos de compra e venda de um veículo automóvel.
- Alega, ainda, a Requerente que, à luz do n.º 1 do artigo 5.º do Código do Registo Predial “os factos sujeitos a registo só produzem efeito contra terceiros depois da data do respectivo registo.”
- O conceito de terceiro para efeitos do registo predial (e concomitantemente do registo da propriedade automóvel), tem consagração legal no nº 4 do artigo 5º do Código do Registo Predial, nos termos do qual “terceiros, para efeitos de registo, são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si”.
- Atenta a noção legal e jurisprudencial de “terceiro”, segundo a Requerente, a conclusão é que a Requerida não preenche os requisitos da referida noção de “terceiro” não podendo, desta forma, invocar a ausência de registo para justificar a ineficácia dos contratos de compra e venda de veículos automóveis.
- Na opinião da Requerente, a interpretação que melhor salvaguarda a unidade do sistema jurídico é a de que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção.
- Assim, caso o comprador (novo proprietário do veículo) não providencie o registo do seu direito de propriedade, presume-se que este direito continua a ser do vendedor podendo, todavia, esta presunção ser ilidida mediante prova em contrário.
- Pelo que, segundo a Requerente, a Requerida não poderá prevalecer-se da ausência de actualização do registo do direito de propriedade, para exigir o pagamento do imposto ao anterior proprietário em nome do qual o veículo se encontra registado se e quando, por qualquer meio, lhe for apresentada prova bastante da respectiva venda.
- Do que alegou, a Requerente extrai as seguintes conclusões:
-
A norma constante do artigo 3.º, n.º 1, do Código do IUC, consagra uma presunção, que, dizendo respeito a uma norma de incidência tributária, admite sempre prova em contrário;
-
O contrato de compra e venda tem natureza real, sendo o efeito real, face ao disposto no n.º 1 do artigo 408.º do Código Civil, efeito do próprio contrato não ficando dependente de qualquer acto posterior, como é, designadamente, o caso do registo;
-
A função essencial do registo automóvel é dar publicidade à situação jurídica dos veículos não surtindo o registo eficácia constitutiva, funcionando (apenas) como mera presunção ilidível da existência do direito, bem como da respectiva titularidade, tudo nos termos dele constante. A presunção de que o direito registado pertence à pessoa em cujo nome está inscrito, pode ser ilidida mediante apresentação de prova em contrário;
-
Não preenchendo a Requerida os requisitos da noção de “terceiro” para efeitos de registo, não pode prevalecer-se da ausência de actualização do registo do direito de propriedade para pôr em causa a eficácia plena do contrato de compra e venda e para exigir ao vendedor (anterior proprietário) o pagamento do IUC devido pelo comprador (novo proprietário) desde que a presunção da respectiva titularidade seja ilidida através de prova bastante da venda.
-
Se nos termos de um contrato de compra e venda que tem por objecto um automóvel, na data da ocorrência do facto gerador do imposto, o veículo já tiver sido anteriormente alienado embora o direito de propriedade deste continue registado em nome do seu anterior proprietário, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1, do Código do IUC, o sujeito passivo do IUC é o novo proprietário, desde que seja apresentada prova bastante da venda que ilida a presunção do registo.
- Pelo que, no seu entender, resulta que as liquidações de IUC em causa, relativas aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012, padecem de vício material de violação de lei, devendo:
-
Ser declarada a ilegalidade destes actos de liquidação (e ser consequentemente anulados), no montante de € 7.739,91;
-
Ser, consequentemente, reconhecido o direito ao reembolso deste montante e, bem assim, o direito a juros indemnizatórios pelo pagamento de imposto indevidamente liquidado.
F. – RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta, na qual, em síntese, alegou o seguinte:
QUESTÕES INICIAIS
- Ao iniciar a sua Resposta, alega a Requerida que o pedido de pronúncia arbitral encontra-se subscrito por mandatário judicial, cuja procuração forense junta aos autos se encontra certificada pelo próprio, a quem foram conferidos poderes forenses, o que contraria o parecer do Conselho Geral da Ordem dos Advogados nº 15/PP/2008-G, de 2008/07/30.
- Por outro lado, relativamente aos veículos com as matrículas …-…-… e…-…-…, constata que a propriedade dos mesmos se encontra registada em nome de outrem que não o da Requerente, desde 13/01/2010 e 14/08/2006, respectivamente, ou seja, desde ocasião anterior à data da exigibilidade do imposto em causa, pelo que, quanto a estes, a Requerida irá proceder à revogação das pretensas “liquidações oficiosas” em causa.
POR EXCEPÇÃO
Da falta de objecto e da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria.
- Alega a Requerida que, por via do seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente reagiu contra aquilo que ela própria apelida de “liquidações oficiosas” de IUC.
- Entende a Requerida que todos os documentos juntos pela Requerente não constituem quaisquer liquidações oficiosas, por não terem sido gerados e enviados pela Requerida à Requerente, constituindo meras notas de cobrança, geradas e extraídas pela própria Requerente no Portal das Finanças através da Internet.
- Portanto, que relativamente aos veículos automóveis sub judice, a Requerida não gerou nem enviou à Requerente quaisquer liquidações oficiosas com vista ao IUC referente aos anos de 2009 a 2012.
- Foi, no dizer da Requerida, a Requerente que, sem ter sido notificada para o efeito, procedeu à emissão das notas de cobrança aqui em causa relativamente a cada uma das viaturas e para os anos de 2009 a 2012.
- Pelo que, o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral não se escora sobre actos de “liquidação oficiosa” emitidos pela Requerida, mas sim sobre notas de cobrança que a Requerente de forma totalmente voluntária extraiu do Portal das Finanças e sob os quais procedeu ao pagamento.
- Entende a Requerida que a liquidação e a nota de cobrança são duas realidades distintas.
- A liquidação constitui um acto tributário e, consequentemente, passível de reacção mediante a dedução de pedido de pronúncia arbitral.
- Diferentemente, a nota de cobrança não constitui um acto tributário, nem possui sequer natureza complementar face àquele, configurando um mero acto de publicidade.
- Daí que, não constituindo a nota de cobrança um acto tributário, naturalmente, se verifica no caso vertente uma situação de falta de objecto, a qual constitui uma excepção peremptória, a qual invoca para todos os efeitos legais, nos termos do disposto no artigo 577º/3 do CPC, na redacção dada pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 29º/1 - e) do RJAT, a qual dá lugar à absolvição da Requerida do pedido, nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 576º/3 do CPC.
- Conclui a Requerida que o Tribunal Arbitral Singular constituído é materialmente incompetente para apreciar e decidir o pedido objecto do litígio sub judice, atendendo à inexistência de actos de liquidação oficiosa de IUC emitidos pela Requerida, o que consubstancia uma excepção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576º, nºs 1 e 2 do CPC, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT e do artigo 29º/1 – a) e e) do RJAT.
Da preterição da prévia Reclamação Graciosa
- Entende a Requerida que, ainda que assim não se julgue, e se entenda que, na realidade, se está perante autoliquidações geradas pela própria Requerente no Portal das Finanças e, configurando as autoliquidações actos tributários, à luz do já referido artigo 2º/1 – a) do RJAT, o pedido de pronúncia arbitral constituiria um dos possíveis meios de reacção por banda da Requerente, que depende de prévia e necessária dedução de Reclamação Graciosa no prazo de 2 anos a contar da apresentação da declaração, confirme estatui o artigo 131º/1 do CPPT.
- Dado que, se a Requerente não apresentou qualquer Reclamação Graciosa relativamente aos actos de auto-liquidação sub judice, também por esta via não são susceptíveis de serem sindicados tais actos.
POR IMPUGNAÇÃO
- Impugna a alegada ilegitimidade da Requerente como sujeito passivo do IUC, nas situações em apreço, porquanto, no seu entender:
- A Requerente faz uma leitura enviesada da letra da lei, dado que o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que os sujeitos passivos do IUC são os proprietários, ou os que se encontram nas situações indicadas no nº 2 do art. 3º do CIUC, considerando-os como tal as pessoas em cujo nome se encontram os veículos registados, razão pela qual não foi utilizada neste dispositivo legal a expressão “presumem-se”, mas sim “considerando-se”.
- O normativo fiscal está repleto de previsões análogas à consagrada na parte final do nº 1 do artigo 3º, em que o legislador fiscal, dentro da sua liberdade de conformação legislativa, expressa e intencionalmente, consagra o que deve considerar-se legalmente, para efeitos de incidência, de rendimento, de isenção, de determinação e de periodização do lucro tributável, para efeitos de residência, de localização, entre muitos outros, como, por exemplo, nos artigos 2º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), 2º, 3º e 4º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e 4º, 17º, 18º e 20º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).
- Conclui, afirmando que a interpretação feita pela Requerente de que o legislador consagrou no art. 3º, nº 1 uma presunção é uma interpretação contra legem.
- Aduz, também, a Requerida, que não é pela impugnação das liquidações de IUC que se ilide a presunção registal.
- Alega, ainda, a Requerida que aquela interpretação não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime que impõe a obrigatoriedade do registo automóvel, de modo a evitar que a Autoridade Tributária caia em absoluta incerteza relativamente ao sujeito passivo do IUC, colocando até em risco o decurso do prazo de caducidade, razão pela qual o legislador quis intencional e expressamente que fossem considerados como proprietários, locatários, adquirentes com reserva de propriedade ou titulares do direito de opção de compra no aluguer de longa duração, para os mencionados efeitos tributários, as pessoas em nome das quais os veículos se encontram registados.
- No entender da Requerida, a mencionada interpretação da Requerente ignora o elemento teleológico da interpretação da lei: a ratio do regime consagrado não só no dispositivo legal em apreço, mas também em todo o CIUC.
- Considera a Requerida que o CIUC procedeu a uma reforma do regime de tributação dos veículos em Portugal, alterando de forma substancial o regime de tributação automóvel, passando os sujeitos passivos do imposto a ser os proprietários constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação dos veículos na via pública. Isto é, o Imposto Único de Circulação passou a ser devido pelas pessoas que figuram no registo como proprietárias dos veículos.
- Resulta tal conclusão do teor dos debates parlamentares em torno da aprovação do Decreto-Lei nº 20/2008, de 31 de Janeiro, da Recomendação nº 6-B/2012 do Provedor de Justiça e do espírito do CIUC que, tendo sido motivado, no essencial, por uma preocupação ambiental a sua “ratio” é a de tributar os utilizadores dos veículos, os quais, por força da respectiva utilização provocam um custo ambiental.
- Alega, ainda, que a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à Constituição, na medida em que viola o princípio da confiança e segurança jurídica, o princípio da eficiência do sistema tributário e o princípio da proporcionalidade.
- Entende a Requerida que a interpretação proposta pela Requerente, uma interpretação que no fundo desvaloriza a realidade registal em detrimento de uma “realidade informal” e insusceptível de um controlo mínimo por parte da Requerida, é ofensiva do basilar princípio da confiança e segurança jurídica que deve enformar qualquer relação jurídica, aqui se incluindo a relação tributária.
- Paralelamente, a interpretação dada pela Requerente é ofensiva do princípio da eficiência do sistema tributário, na medida em que se traduz num entorpecimento e encarecimento das competências atribuídas à Requerida, com óbvio prejuízo para os interesses do Estado Português, de que quer a Requerente quer a Requerida fazem parte.
- Constituindo um entendimento que está nas antípodas daquele princípio e da própria reforma da tributação automóvel, na medida em que, ao pretender desconsiderar a realidade registal, uma realidade que constitui a pedra angular na qual assenta todo o edifício do IUC, gera para a Requerida, e em última instância para o Estado Português, custos administrativos adicionais, entorpecimento do desempenho dos seus serviços, ausência de controlo do tributo e inutilidade dos sistemas de informação registal.
- Finalmente, a argumentação veiculada pela Requerente representa uma violação do princípio da proporcionalidade, na medida em que o desconsidera totalmente no confronto com o princípio da capacidade contributiva, quando na realidade a Requerente dispõe dos mecanismos legais necessários e adequados à salvaguarda daquela sua capacidade (v.g., o registo automóvel), sem que, contudo, os tenha exercitado em devido tempo.
- Acresce que a Requerente teria que fazer prova idónea dos factos constitutivos do direito que alega em juízo arbitral, o que, segundo a Requerida, não ocorre, por a prova apresentada pela Requerente não ser por si só, bastante para efectuar prova concludente da transmissão dos veículos em causa.
- Com efeito, apresenta 30 cópias das facturas de vendas, as quais, na óptica da Requerida, não constituem documento idóneo para comprovar a venda dos veículos em causa, uma vez que as mesmas não são mais do que um documento unilateralmente emitido pela Requerente.
- Segundo a Requerida, as facturas não são aptas a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático como é a compra e venda, pois aquele documento não revela por si só uma imprescindível e inequívoca declaração de vontade (i.e., a aceitação) por parte do pretenso adquirente, mormente neste processo em que a Requerente não juntou prova documental dos meios de pagamento do preço, ou os recibos de quitação da dívida.
- Não faltando casos de emissão de facturas referentes a transmissão de bens e/ou de prestações de serviços que nunca chegaram a concretizar-se.
- Segundo a Requerida, uma factura unilateralmente emitida pelo Requerente não pode substituir o Requerimento de Registo Automóvel, que é um documento aprovado por modelo oficial, quando a Requerente reconhece a necessidade de um contrato de compra e venda como meio adequado para ilidir a presunção registal.
- Entende a Requerida que uma pretensa factura não constitui um contrato de compra e venda e que a Requerente não provou a transmissão da propriedade dos veículos sub judice.
- Relativamente ao veículo com a matrícula …-…-… aduz a Requerida que a Requerente não juntou qualquer suposto elemento de prova.
- Assim sendo, a Requerida conclui que os actos tributários em crise não enfermam do alegado erro sobre os pressupostos de facto, na medida em que à luz do disposto no artigo 3º, nº 1 do CIUC e do artigo 6º do mesmo código, era a Requerente, na qualidade de proprietária, o sujeito passivo do IUC, uma vez que o IUC visa tributar o proprietário do automóvel, sendo que a propriedade é revelada através do seu registo.
- Pelo que a Requerente é responsável pelas custas arbitrais relativas ao presente pedido de pronúncia arbitral, dado que a falta do fornecimento dos dados deu inexoravelmente azo à emissão das liquidações sub judice.
- Na verdade, segundo a Requerida, se o IUC é liquidado de acordo com a informação registal oportunamente transmitida pelo Instituto dos Registos e Notariado, e não de acordo com informação gerada pela própria Requerida, e se a Requerente não procedeu oportunamente à sua actualização no Registo Automóvel, a Requerida não é responsável por esse pagamento, pois a transmissão da propriedade não é controlada pela Requerida.
- Aplicando-se o mesmo raciocínio relativamente ao pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios, não estando reunidos os pressupostos legais que conferem direito a serem peticionados.
- À luz dos artigos 43º da LGT e 61º do CPPT, o direito a juros indemnizatórios depende da verificação dos seguintes pressupostos: Estar pago o imposto, ter a respectiva liquidação sido anulada, total ou parcialmente, em processo gracioso ou judicial, determinação, em processo gracioso ou judicial, que a anulação se funda em erro imputável aos serviços, o que não ocorreria no caso, uma vez que os actos tributários em crise são válidos e legais, porque conformes ao regime legal em vigor à data dos factos tributários, razão pela qual não ocorreu qualquer erro imputável aos serviços.
- Conclui a Requerida, requerendo que devem ser julgadas parcialmente procedentes, por provadas as excepções peremptória de falta de objecto e dilatórias de incompetência do Tribunal Arbitral Singular e de preterição da necessária Reclamação Graciosa e, caso assim não se entenda, deve ser julgado parcialmente improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a entidade Requerida do pedido.
RESPOSTA DA REQUERENTE ÀS EXCEPÇÕES
Na resposta às excepções invocadas pela Requerida, alega a Requerente o seguinte:
- A Requerente foi confrontada na sua parte privativa do Portal das Finanças com uma série de dívidas de IUC, documentadas naquilo a que a AT chama de notas de cobrança (documentos de cobrança).
- Para efeitos da sua situação fiscal, as dívidas de IUC documentadas pelas referidas notas de cobrança eram já passíveis de pagamento, e foram pagas pela Requerente conforme consta da documentação anexa ao pedido de constituição de Tribunal Arbitral.
- Segundo diz, foi uma prioridade para a Requerente proceder ao pagamento daquelas dívidas de IUC aparecidas no sistema, uma vez que lesividade decorrente da impossibilidade de obter, para os mais variados efeitos da sua actividade comercial, uma certidão negativa de dívidas (certidão de situação contributiva regularizada), ultrapassava em muito a lesividade das concretas liquidações de imposto, pressupostas naquelas dívidas e que lhe são logicamente antecedentes.
- A Requerente alega que desconhecia as situações de dívida de IUC constantes do sistema informático da AT em estado que permitia e permitiu o seu pagamento.
- As dívidas de IUC aparecidas no sistema informático da AT (na área de acesso reservado à Requerente), são um facto indesmentível da criação da AT, a possibilidade do seu pagamento é também um facto indesmentível da responsabilidade da AT, e a quantificação dos seus montantes muito concretos, ano e matrícula do imposto, é também da inteira responsabilidade da AT e respectivo sistema informático.
- Estas dívidas de IUC pressupõem lógica e necessariamente uma série de liquidações de IUC, sendo irrelevante para o caso o meio pelo qual a Requerente tomou delas conhecimento.
- O facto é que tomou conhecimento das dívidas de IUC e que contra elas reagiu via pedido de constituição de Tribunal Arbitral.
G. – QUESTÕES A DECIDIR
Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:
1 – Excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do Tribunal Arbitral.
2 – Quanto ao mérito:
2.1 - Interpretação do nº 1 do art. 3º CIUC, de forma a ser determinado se a norma de incidência subjectiva nela inscrita, consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de elisão, isto é, admite, ou não, que o contribuinte, em nome do qual se encontre o veículo registado na Conservatória do Registo Automóvel, possa demonstrar, através de meios de prova em Direito permitidos, que não é, no período a que o imposto respeita, o seu proprietário, afastando, assim, a presunção de sujeito subjectivo do imposto que sobre ele recai.
2.2 – Juros indemnizatórios – Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43º da LGT, no caso de serem anuladas as liquidações e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga.
3 – Responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.
H. – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
-
O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).
-
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas (vide nesta Decisão o início de J. –
MATÉRIA DE DIREITO), nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da
Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.
-
Considerada a identidade do facto tributado, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados, o Tribunal admite a cumulação de pedidos de declaração de ilegalidade dos actos tributários que são objecto deste processo, uma vez que estão cumpridos os requisitos estabelecidos no art. 3º, nº 1 do RJAT.
4. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.
I. – MATÉRIA DE FACTO
I. 1 – FACTOS PROVADOS
Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provado os seguintes factos:
1 – A Requerente A…, SA., também identificada como “B…”, é uma instituição financeira que tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, dispondo, para o efeito, de todas as autorizações legalmente exigíveis.
2 – No âmbito da sua actividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de aluguer de longa duração e contratos de locação financeira, de veículos automóveis, findos os quais transmite a propriedade dos mesmos aos respectivos locatários ou a terceiros.
3 – Entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, verificou a Requerente, na área de acesso reservada à Requerente do Portal das Finanças, a existência das dívidas de IUC constantes dos autos, relativas às viaturas identificadas no Pedido de Pronúncia Arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012.
4 – A Requerente procedeu ao pagamento voluntário do referido IUC.
5 – A Requerente não era proprietária dos veículos sub judice, nas datas da ocorrência dos factos geradores do imposto em apreço, embora a propriedade de todos se encontrasse registada em nome da Requerente, com excepção dos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-…, em que a propriedade se encontrava registada em nome de outrem.
6 – A Requerida, no decorrer deste processo, determinou a revogação da documentação da AT da exigibilidade do IUC relativamente aos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-… .
7 – Em 12 de Fevereiro de 2014, o Requerente apresentou o Pedido de Pronúncia Arbitral, que deu origem aos presentes autos.
I. 2 – FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.
Relativamente às facturas e aos documentos de venda referentes aos veículos, que foram ulteriormente juntos ao processo, o Tribunal decidiu que os mesmos constituem meio de prova com força bastante para titular a transmissão da sua propriedade, por gozarem da presunção de veracidade estabelecida no art. 75º, nº 1 da LGT, e com base nos restantes fundamentos que melhor constam da Decisão
I. 3 – FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos não provados com relevância para a apreciação das questões a decidir.
J. – MATÉRIA DE DIREITO
Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.
Antes de mais e relativamente às questões prévias suscitadas pela Requerida cumpre dizer o seguinte:
Foi suprida a irregularidade da procuração forense, que inicialmente a Requerente juntou aos autos, e que era certificada pelo próprio mandatário, através da junção de uma nova procuração certificada por entidade terceira.
O Tribunal, face ao reconhecimento pela Requerida de que a propriedade dos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-… encontrava-se registada em nome de outrem, que não o da Requerente, em data anterior à da exigibilidade do imposto em causa e à sua declarada intenção de proceder à revogação daquilo que chama “pretensas liquidações oficiosas” e, perante o silêncio da Requerida, deu tais factos como provados, deixando de considerar na presente decisão os IUC referentes aos mencionados veículos.
A questão a decidir a seguir respeita às excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do Tribunal Arbitral.
Apenas, caso as mesmas sejam julgadas improcedentes, se apreciará a pretensão sobre a ilegalidade e a consequente anulação dos actos de liquidação relativos a IUC, respeitantes aos veículos, cujas matrículas estão identificados nos autos, com excepção dos referidos …-…-… e …-…-…, e sobre o reconhecimento do direito à restituição do imposto, bem como o eventual direito a juros indemnizatórios.
Analisemos, pois, a questão relativa às excepções invocadas pela Requerida de falta de objecto e de incompetência do tribunal arbitral.
Conforme ficou provado, a Requerente entre 10 de Dezembro de 2013 e 20 de Dezembro de 2013, verificou na área de acesso reservada à Requerente do Portal das Finanças, a existência das dívidas de IUC constantes dos autos, relativas às viaturas identificadas no Pedido de Pronúncia Arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012, tendo procedido ao pagamento voluntário deste referido IUC.
Verifica-se, assim, estarmos perante actos de autoliquidação, uma vez que a liquidação do imposto foi efectuada pela Requerente, tomando em conta as notas de cobrança que o sistema informático da Requerida lhe apresentou na sua área privativa.
Incorre em erro a Requerente quando titula tais actos como liquidações oficiosas, quando na verdade, e como bem diz a Requerida, os mesmos não têm essa natureza jurídica, constituindo isso sim autoliquidações de tributos, conforme decorre dos autos.
No entanto, para o caso, torna-se irrelevante a qualificação dos mencionados actos, uma vez que o conhecimento dos mesmos cai no âmbito da competência material deste Tribunal Arbitral, nos termos do nº 1, alínea a) do RJAT, o qual preceitua que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação de pretensões visando a declaração de ilegalidade não só de actos de liquidação de tributos, mas também de actos de autoliquidação, para além de outros.
Chegados a este ponto, coloca-se a questão suscitada pela Requerida da necessidade de prévia dedução de reclamação graciosa, como condição para a impugnação que foi interposta.
Com efeito, dispõe o art. 131º, nº 1 do CPPT, que se transcreve:
“Artigo 131º
Impugnação em caso de autoliquidação
1 – Em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao dirigente do órgão periférico regional da administração tributária, no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração.
……………………………………………………………………………………………………………………………………”
Resulta, assim, do normativo transcrito que a regra é a da necessidade da reclamação graciosa prévia à impugnação.
No entanto, há que ter em conta o disposto do nº 3, do referido art. 131º do CPPT, que também se transcreve:
Artigo 131º
Impugnação em caso de autoliquidação
“…………………………………………………………………………………………………………………………………..
3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o prazo para a impugnação não depende de reclamação prévia, devendo a impugnação ser apresentada no prazo do nº 1 do artigo 102º.”
Ora, da análise da situação em apreço, resulta claro que as autoliquidações geradas pela Requerente pressupõem necessariamente liquidações efectuadas pela Administração Tributária, que estão expressas nas referidas notas de cobrança colocadas pela Requerida no Portal das Finanças, na zona privativa da Requerente.
Assim sendo, as liquidações foram efectuadas por meios informáticos, estando vedado à Requerente alterar os elementos constantes das notas de cobrança, em que figuram os elementos relativos ao pagamento e a demonstração da respectiva liquidação ( art. 16º, nº 4 do CIUC).
Ora, a Requerente efectuou o pagamento das quantias respeitantes a IUC, que se apresentavam no Portal das Finanças estarem em dívida, e deduziu a presente impugnação com fundamento numa divergência com a Requerida relativamente à interpretação do nº 1 do art. 3º do IUC, no ponto em que consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ser ilidida.
Assim sendo, face ao teor do nº 3 do art. 131º do CPPT, o Tribunal entende que, no caso dos autos, em que existiram actos de autoliquidação, com a natureza que se deixou referida, sendo, como é, o fundamento de impugnação matéria exclusivamente de direito e esses actos sido efectuados de acordo com orientações genéricas emitidas pela Administração Tributária, não é obrigatória a reclamação graciosa prévia.
Carecem, assim, de fundamento as excepções invocadas pela Requerida, porquanto não existe falta de objecto, uma vez que o objecto consiste nos actos de autoliquidação que ficaram provados nos autos, sendo os mesmos passíveis de conhecimento por este Tribunal Arbitral, nos termos do nº 1, alínea a), do art. 2º do RJAT , independentemente de ter sido deduzida previamente reclamação graciosa.
Passemos, então, à análise da questão de mérito a decidir.
Alega a Requerente que não era proprietária dos veículos que identifica à data em que ocorreram os factos tributários que originaram as liquidações de IUC, e, consequentemente, não era sujeito passivo do imposto que lhe foi liquidado.
A Requerida Autoridade Tributária assume uma posição oposta relativamente a esta questão da incidência subjectiva do IUC, defendendo que, nos termos do art. 3º, nº 1 do CIUC, é sujeito passivo do IUC a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado na Conservatória do Registo Automóvel, facto este que ocorria com a Requerente, no período em causa.
O art. 3º, nº 1 do CIUC dispõe relativamente a esta matéria controvertida, o seguinte:
“Art. 3º - Incidência subjectiva
1. São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares e colectivas, de direito público ou privado, em nome dos quais os mesmos se encontrem registados
------------------------------------------------------------------------------------------“
Das posições assumidas pelas Partes no presente processo, resulta claro que no fundo esta questão se resume a saber se a norma de incidência subjectiva acima transcrita, constante do nº 1 do art. 3º do CIUC, estabelece uma presunção legal, susceptível de ilisão, como pretende a Requerente ou, expressa e intencionalmente, considera as pessoas em nome de quem os veículos estão registados como proprietários para efeito de incidência subjectiva do IUC, como entende a Requerida.
As orientações arrogadas pela Requerente e pela Requerida quanto a esta matéria e a sua fundamentação estão expostas em síntese, ou com parcial transcrição, em E. e F. do Relatório desta Decisão.
Cumpre, então, decidir:
Um ponto preliminar para se apreciar a questão do valor jurídico do registo automóvel.
O nº 1 do art. 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro, que disciplina o registo de veículos automóveis, dispõe que o registo de veículos “tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos… tendo em vista a segurança do comércio jurídico”.
Por seu lado, estabelece o art. 7º do Código do Registo Predial, aplicável ao registo automóvel por força do disposto no art. 29º do referido Decreto-Lei nº 54/75, que “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos precisos termos em que o registo define”.
Verifica-se, assim, que o registo definitivo é tão-só uma presunção da existência do direito, que admite prova em contrário, constituindo, portanto, presunção ilidível, conforme, aliás, tem sido reconhecido na jurisprudência.
Dado que não existe neste Código qualquer disposição que exija o registo como condição de validade dos contratos, conclui-se que, para se adquirir a qualidade de proprietário de um veículo, basta figurar como comprador num contrato de compra e venda.
Relativamente ao teor da norma em apreço – art. 3º, nº 1 do CIUC -, há que dizer que, conforme reconhecido unanimemente e se encontra consagrado no art. 11º da LGT, as leis fiscais devem ser interpretadas de acordo com os princípios gerais de interpretação, avultando, assim, para o efeito, o preceito fundamental de interpretação que é o art. 9º do Código Civil, o qual fornece as regras e os elementos para a interpretação das normas.
Significa isto que se devem utilizar os instrumentos tradicionais de hermenêutica jurídica, com vista a ser determinado o pensamento legislativo, de acordo com o disposto no art. 9º do Código Civil.
Nesta conformidade, comecemos a interpretação do art. 3º, nº 1 do CIUC, pelo elemento literal, aquele em que se visa detectar o pensamento legislativo que se encontra objectivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo.
A questão que se coloca é saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.
A nosso ver, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que, da análise do nosso ordenamento jurídico, se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.
Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo considerar, de que se indicam, meramente a título de exemplo, as seguintes:
No âmbito do direito civil - o nº 3 do art. 243º do Código Civil, quando estabelece que “considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar”;
também no âmbito do direito da propriedade industrial o mesmo se passa, quando o art. 59º, nº 1 do Código da Propriedade Industrial dispõe que “As invenções cuja patente tenha sido pedida durante o ano seguinte à data em que o inventor deixar a empresa, consideram-se feitas durante a execução do contrato de trabalho”;
e, também, no âmbito do direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo;
Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.
Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.
Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC, foi consagrada a presunção dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.
Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objectivo de tributar o verdadeiro e efectivo proprietário e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.
O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.
Com efeito, o actual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.
Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem.
Esta interpretação tem assento no disposto no nº 1, do art. 9º do Código Civil, que preceitua que a busca do pensamento legislativo deverá ter sobretudo em conta “a unidade do sistema jurídico e as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”.
Assim, também, da interpretação efectuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efectivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.
Ora, estabelece o art. 73º da LGT que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis”.
Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum, portanto, ilidível, a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
Analisados os elementos carreados para o processo pela Requerente, extrai-se a conclusão que esta não era proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço, por, entretanto, já ter transferido a propriedade dos mesmos, nos termos da lei civil.
Esta transmissão de propriedade é oponível à Requerida Autoridade Tributária, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos contra terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial, a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do CRP, isto é, não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Relativamente à questão suscitada pela Requerida sobre a idoneidade probatória das facturas, que a Requerida põe em causa em termos genéricos, o Tribunal não tem dúvidas em aceitá-las como meio de prova da transmissão da propriedade dos veículos, mormente quando acompanhadas de documentos de venda, posteriormente juntos pela Requerente, pelas razões seguintes:
Na situação dos autos, estamos perante um contrato de compra e venda de coisas móveis, o qual, por aplicação do disposto no art. 219º do CC, não está sujeito a nenhum formalismo especial.
Embora se reconheça que a titulação destes contratos, por terem por objecto veículos automóveis, em que o registo é obrigatório, beneficia com a emissão de declaração de venda, que é necessária para a inscrição no registo, isso não impede que o contrato seja provado de outra forma, pois esta declaração não constitui o único e exclusivo meio de prova da venda.
Para o caso, reveste especial importância o facto de, uma vez que a Requerente tem natureza empresarial, as facturas, que foram juntas aos autos pela Requerente, estão subordinadas a rigorosas regras legais de ordem contabilística e fiscal, com implicações, também, na cobrança de outros tributos.
Na verdade, a legislação tributária atribui-lhes uma relevância muito especial, que não pode deixar de lhe conferir credibilidade probatória, e que se encontra bem expressa no disposto nos seguintes normativos legais que, a título de exemplo, se citam: arts. 29º, nº 1, alínea b) e 19º, nº 2 do CIVA e arts. 23º, nº 6 e 123º, nº 2 do CIRC.
Ora, desde que essas facturas tenham sido emitidas de acordo com a legislação comercial e fiscal, questão que a Requerida não suscita, e o que não põe em causa, as mesmas gozam da presunção de veracidade, que lhe é atribuída pelo art. 75º, nº 1 da LGT.
Caberia à Requerida apresentar e demonstrar indícios concretos e fundamentados de que as operações tituladas pelas mencionadas facturas não correspondiam à realidade, face ao disposto no nº 2 do art. 75º da LGT, o que não ocorreu.
Nesta conformidade, atenta a relevância muito especial que a legislação tributária atribui às facturas na situação vertente e a que estas gozam da presunção de veracidade, que lhes é concedida pelo disposto no art. 75º, nº 1 da LGT, e, também, aos documentos de venda juntos aos autos, concluímos que constituem meio de prova suficiente para ilidir a presunção que decorre do art. 3º, nº 1 do CIUC, uma vez que comprovam que a Requerente não era proprietária dos veículos ao tempo a que diz respeito a liquidação do IUC.
Razão pela qual, as mencionadas liquidações devem ser anuladas e, consequentemente restituído à Requerente pela Autoridade Tributária o imposto que indevidamente lhe foi cobrado.
Quanto aos juros indemnizatórios, esta matéria está regulada no art. 24º do RJAT, o qual expressamente determina no seu nº 1, alínea b) que a decisão arbitral obriga a administração tributária, nos casos aí consignados, a “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias, para o efeito”, e preceitua, ainda, no seu nº 5, que “É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo
Tributário”.
Também o art. 100º da LGT, cuja aplicação é autorizada pelo disposto no art. 29º, nº 1, alínea a) do RJAT, preceitua de modo idêntico, no sentido da imediata reconstituição da legalidade, compreendendo a mesma o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso.
Por seu lado, o art. 43º, nº 1 da LGT condiciona o direito a juros indemnizatórios aos casos em que “houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Nesta conformidade, a questão que se coloca é a de se saber se, face ao circunstancialismo demonstrado e ao teor do disposto no art. 3º, nº 1 do CIUC, se pode considerar ter havido, ou não, um erro imputável aos serviços na situação vertente.
Analisada a situação, verifica-se que a Autoridade Tributária ao liquidar o IUC nos termos em que o fez, deu cumprimento ao ditame legal de ordem geral estabelecido no referido normativo, no ponto em que o sujeito passivo do imposto é o proprietário do veículo, atribuindo essa qualidade de proprietário, para os referidos efeitos, ao contribuinte em nome do qual se encontra registado o veículo na Conservatória do Registo Automóvel, sem necessidade de efectuar qualquer prova.
Só após o reconhecimento por este tribunal arbitral que o dispositivo em apreço tem a natureza de presunção juris tantum, é que a Requerente está em condições de ilidir a referida presunção, o que veio a fazer e a provar, deixando a partir de agora de ser sujeito passivo do referido imposto, razão pela qual se conclui pela inexistência de erro imputável aos serviços.
Quanto à responsabilidade pelas custas arbitrais, alega a Requerida que não é responsável pelo seu pagamento, por ter procedido às liquidações do imposto com os elementos de que dispunha, não podendo ser responsabilizada por o que apelida de “falta de zelo” da Requerente.
Este argumento não pode ser considerado, porquanto a lei é taxativa na imputação da responsabilidade pelo pagamento das custas à parte que for condenada, face ao disposto nos nºs 1 e 2, do art. 527 do Código do Processo Civil, aplicável por força do art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
Assim sendo, a responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais é da Requerida.
L. – DECISÃO
Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:
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Julgar improcedentes as excepções invocadas pela Requerida.
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Julgar procedente, com fundamento em vício de violação de lei, o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação de IUC, relativamente a todos os veículos cujas matrículas estão identificadas nos autos, respeitantes aos anos aí referidos, com excepção dos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-…, e, em consequência
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Anular os actos tributários de liquidação correspondentes, ainda não revogados pela Requerida.
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E reconhecer o direito ao reembolso do montante que lhes respeita.
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Julgar improcedente o pedido do reconhecimento do direito a juros indemnizatórios a favor da Requerente.
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Condenar a Requerida a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).
Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315º, nº 2) e 97º - A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 1.349,76 euros.
Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Notifique-se.
Lisboa, 17 de Novembro de 2014
O Árbitro
José Nunes Barata
(Redacção pela ortografia antiga)