SUMÁRIO
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Resulta do quadro legal aplicável que as SGOIC têm natureza de instituições financeiras.
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As comissões de gestão auferidas por tais sociedades estão abrangidas pela verba 17.3.4 da TGIS, não obstante as alterações operadas pelo DL 144/2019 no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, (DL 298/92).
DECISÃO ARBITRAL
I – Relatório
1.A...– Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, SA, sociedade comercial com sede na Rua ..., ..., ..., ...-... Lisboa, titular do Número Único de Identificação de Pessoa Colectiva e de matrícula na Conservatória do Registo Comercial..., adiante identificada como Requerente, veio requerer, ao abrigo do disposto nos art.os 95.º/1 e 2 a) e d) da Lei Geral Tributária (LGT), 99.º a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 2.º/1 a), 5.º/3 a), 6.º/2 a) e 10.º/1 a) e 2 do DL 10/2011, de 20.1 (Regime da Arbitragem em Matéria Tributária) a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir o respectivo pedido de pronúncia sobre a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2022... do Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Unidade de Grandes Contribuintes e bem assim, sobre as autoliquidações de Imposto de Selo no montante de 581.277,35 € relativas a comissões de gestão cobradas aos Organismos de Investimento Colectivos por si geridos, efectuadas entre Janeiro de 2020 e Dezembro de 2021.
2.É requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por AT ou Requerida.
3.Em 28 de Outubro de 2022 o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação com a notificação da AT.
4.De acordo com o preceituado nos art.os 5.º/3 a), 6.º/2 a) e 11.º/1 a) do RJAT, o Ex.mo Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral colectivo, os quais comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.
5.O Tribunal Arbitral ficou constituído em 3 de Janeiro de 2023.
6.Em 7 de Fevereiro de 2023 a Requerida apresentou Resposta, com defesa por impugnação, juntando o processo administrativo.
7.Em 22 de Fevereiro de 2023 foi proferido despacho dispensando a reunião prevista no art. 18.º do RJAT, facultando às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem, alegações escritas, sendo, para o efeito, concedido um prazo de 15 dias simultâneos.
8.A Requerida apresentou as suas alegações em 28 de Fevereiro de 2023 e a Requerente em 15 de Março seguinte.
9.Tendo a Requerente junto 8 documentos, foi notificada a Requerida para se pronunciar sobre essa junção, a qual se opôs, por considerar não haver fundamento justificativo. Em 28 de Abril de 2023 a Requerente veio justificar o requerimento anterior e solicitar a junção de mais 22 documentos. Por despacho de 5 de Maio do mesmo ano, o tribunal considerou inadmissível a exposição apresentada, bem como a junção extemporânea e injustificada dos documentos, ordenando o respectivo desentranhamento.
Posição da Requerente
10.A Requerente explica que, relativamente aos anos de 2020 e 2021, cobrou comissões de gestão aos fundos de investimento por si geridos, tendo, à cautela, liquidado o Imposto de Selo (IS) sobre tais comissões.
11.Entendendo, todavia, que tal imposto não era devido – por os serviços prestados não preencherem os requisitos de incidência subjectiva e objectiva da verba 17.3.4 da Tabela Geral do IS (TGIS), contrariando também o disposto na Directiva 2008/7 de 12.2.2008 –, a Requerente apresentou reclamação graciosa, solicitando a anulação das liquidações em causa e o reembolso do IS indevidamente pago. Essa reclamação foi indeferida pela AT.
12.Insiste agora a Requerente, em sede arbitral que, enquanto sociedade gestora de organismos de investimento colectivo (SGOIC) tem como actividade principal a gestão, administração e comercialização de OIC, podendo, a título complementar, prestar serviços necessários ao cumprimento das obrigações fiduciárias dos seus clientes administrar imóveis, gerir instalações, supervisionar projectos de promoção imobiliária e prestar outros serviços relacionados com a gestão dos OIC - nos termos do art. 66.º do Regime Geral dos OIC (RGOIC).
13.A remuneração dos seus serviços faz-se através da cobrança de comissões de gestão (art. 67.º RGOIC), sendo que, no caso da Requerente, a comercialização das unidades de participação é efectuada por bancos intermediários que lhe debitam as respectivas comissões, as quais são posteriormente incorporadas nas referidas comissões de gestão.
14.A actividade económica da Requerente está registada sob o CAE 66300 – relativo a actividades desenvolvidas pelas sociedades gestoras de fundos de investimento – o qual integra o CAE geral 66, relativo à prestação de serviços auxiliares de actividade financeira, excluindo serviços financeiros.
15.Desde Janeiro de 2019 que as sociedades gestoras – entre as quais se inclui a Requerente – liquidam e pagam IS sobre as comissões de gestão cobradas, por aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4 da TGIS.
16.Assim sendo, relativamente aos anos de 2020 e 2021 foram liquidadas e entregues pela Requerente à AT as quantias de IS que se demonstram nas tabelas seguintes.
17.Resulta destas tabelas que nos anos de 2020 e 2021 foi liquidado e entregue à AT um montante total de 584.277,35 €.
18.A Requerente não aceita a argumentação da AT, constante da fundamentação do indeferimento da reclamação graciosa, nos termos da qual as SGOIC exercem actividades financeiras e são instituições financeiras e, por isso, estão sujeitas ao IS nos termos da verba 17.3.4 da TGIS.
19.O principal argumento por si aduzido prende-se com o facto de o DL 144/2019 ter excluído as SGOIC da categoria de instituição/sociedade financeira, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2020.
20.No regime anterior entendia-se que a generalidade das comissões cobradas aos fundos de investimento estava sujeita a IS, mas eram isentadas pelos DL 20/86 de 13.2 e 1/87 de 3.1.
21.Essas isenções foram, todavia, revogadas pela L 71/2018 de 31.12 (Orçamento de Estado para 2019), passando, por isso, a liquidar-se o IS sobre as comissões de gestão.
22.A Requerente, embora tenha efectuado tais liquidações, nunca com elas concordou, por entender que a sujeição a IS nos termos da verba 17.3 da TGIS obedece a um elemento subjectivo (ser a operação realizada por uma sociedade ou instituição financeira) e um elemento objectivo (tratar-se de comissões ou contraprestações por serviços financeiros).
23.Ora, na falta de definição da figura de sociedade ou instituição financeira pelo CIS deverá recorrer-se ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), tal como defende a doutrina e a jurisprudência (nomeadamente o acórdão STA 5.4.2017, proc. 01391/16).
24.Ora, nos termos do RGICSF, embora as sociedades gestoras de investimentos fossem expressamente qualificadas como instituições de crédito (nos termos dos art.os 2.º-A z) iv. e 6.º/1 b) vi. do dito regime), perderam essa qualificação a partir de 1 de Janeiro de 2020, por força do citado DL 144/2019.
25.Tendo perdido tal qualificação, desapareceu, no entendimento da Requerente, a incidência subjectiva para aplicação do IS.
26.O referido DL 144/2019 retirou da supervisão do Banco de Portugal as SGOIC, passando essa tutela a ser exercida pela Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), visando conferir mais competitividade a estas sociedades, face às suas congéneres europeias. Mas esse não deverá ser considerado o único efeito jurídico, já que tal ressalva não consta desse diploma (ao contrário do que acontece noutros casos em que se mantém a qualificação como instituição financeira).
27.A situação da exclusão das SGOIC tem paralelo com as Sociedades de Capital de Risco (SCR) que, tendo deixado de estar submetidas ao RGICSF por força do DL 319/2002 de 28.12, deixaram de preencher o elemento subjectivo de incidência de IS. Tal como tem sido reconhecido na jurisprudência arbitral (proc. 266/2018-T, 399/2019-T, 791/2019-T e 757/2019-T).
28.Por outro lado, tratando-se de uma norma de incidência, esta está sujeita ao princípio da legalidade (art. 103.º CRP e 8.º LGT) que impõe um carácter preciso e um elevado grau de determinação.
29.Entende ainda a Requerente, não poder acolher-se o argumento (constante na decisão arbitral do processo 68/2022-T) de que o Direito da União Europeia – nomeadamente os Regulamentos 2013/575 e 2010/1095 e a Directiva 2013/36 – justificaria essa classificação das SGOIC como sociedades financeiras.
30.Insiste ainda a Requerente de que, além da não verificação do elemento subjectivo, não se verificará o elemento objectivo, ou seja, as comissões de gestão sobre as quais foi liquidado o IS não respeitarão a serviços financeiros.
31.Desde logo, porque nem todo o serviço prestado por instituições de crédito configura um serviço financeiro, pois, se assim fosse, não seria necessária a referência ao elemento objectivo na lei.
32.Também não deverão considerar-se serviços financeiros os prestados no âmbito de actividades permitidas às instituições de crédito e sociedades financeiras nos termos do RGICSF e/ou da Directiva 2013/36, já que as referidas listas de actividades constam serviços de prestação de informações comerciais, aluguer de cofres, etc. que em nada configuram serviços financeiros.
33.Pelo contrário, dever-se-á considerar como serviço financeiro qualquer serviço bancário, de crédito, de seguros, de investimento ou de pagamento e os relacionados com a adesão individual a fundos de pensões abertos (DL 95/2006 de 29.5).
34.Assim, ao fazer-se referência no normativo em questão, aos serviços de investimento, têm-se em conta as actividades de investimento permitidas às instituições de crédito e sociedades financeiras nos termos do art. 199.º-A do RGICSF, que não inclui a gestão, administração e comercialização de OIC.
35.De facto, este âmbito de actividades (gestão, administração e comercialização) inclui serviços jurídicos e de contabilidade que não podem ser considerados serviços financeiros.
36.O próprio descritivo do CAE geral 66 (no qual se inclui o 66300 relativo às sociedades gestoras de fundos de investimento) exclui o fornecimento de serviço financeiros na sua Ver 3.
37.Defende ainda a Requerente que a verba 17.3.4 da TGIS deve ser interpretada restritivamente, em conformidade com as limitações impostas pela Directiva da Reunião de Capitais que proíbe qualquer tributação indirecta (incluindo, portanto, o IS) sobre as comissões de gestão dos OIC, por serem passíveis de originarem discriminações, duplas tributações e disparidades que dificultam o princípio da livre circulação de capitais (considerando 2), expressamente proibindo a sujeição a impostos indirectos da colocação em circulação ou negociação de acções ou títulos com a mesma natureza (art. 5.º/2 a).
38.Assim, nos termos da referida directiva, os fundos de investimento são enquadrados nas sociedades de capitais e os seus serviços são essenciais à reunião de capitais sob a forma de OIC.
39.Entende, por isso, a Requerente que o legislador ao excluir as SGOIC do RGICSF pretendeu desonerar fiscalmente estas, deixando, portanto, de se aplicar o IS às comissões por elas cobradas.
40.E se assim não fosse, o não enquadramento das comissões de gestão na exclusão de tributação prevista no art. 5.º/2 a) da Directiva conduziria a uma dupla tributação injustificada e violadora do DUE.
41.Considera, por fim, a Requerente que, por ter aplicação a jurisprudência do TJUE nos acórdãos Com/Bélgica C-415/02, Isabelle Gielen C-299/13, Albert Reiss C-466/03 e HSBC, C-569/07, deverá a mesma ser seguida nos termos do acórdão CILFIT, C-283/81, dispensando-se o reenvio prejudicial, tal como reconhece a jurisprudência nacional.
42.Admitindo, todavia, que se considere insuficiente ou inaplicável tal jurisprudência, a Requerente sugere o reenvio prejudicial (art. 267.º TFUE), que considera obrigatório, já que o TJUE nunca se terá pronunciado sobre a questão em apreciação, devendo ser suscitadas as dúvidas sobre a interpretação e aplicação da verba 17.3.4 da TGIS.
43.A questão foi, aliás, objecto de dois reenvios que deram origem aos processos C-335/22 e C-656/21, no TJUE, sendo que, em relação a este último processo, o tribunal já se pronunciou declarando que o art. 5.º/2 a) da Directiva 2008/7, relativa aos impostos que incidem sobre as reuniões de capitais deve ser interpretado no sentido que se opõe a uma legislação nacional que prevê a incidência de um imposto do selo, por um lado, sobre a remuneração que uma instituição financeira recebe de uma sociedade de gestão de fundos comuns de investimento pela prestação de serviços de comercialização para efeitos de novas entradas de capital destinadas à subscrição de participações de fundos recentemente emitidas e, por outro, sobre os montantes que essa sociedade de gestão recebe dos fundos comuns de investimento na medida em que esses montantes incluam a remuneração que a referida sociedade de gestão pagou às instituições financeiras por esses serviços de comercialização.
44.Almejando a procedência do seu pedido, a Requerente pede ainda que seja a Requerida condenada no pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º/1 da LGT.
Posição da Requerida
45.A Requerida não impugna a factualidade referida pela Requerente, discordando, todavia da análise jurídica produzida por esta.
46.Assim, reconhece a AT que o que está em causa é, em suma, aferir se as comissões de gestão cobradas pela Requerente aos OIC por si geridos devem, ou não, ser sujeitas a Imposto do Selo por aplicação da norma de incidência consagrada na verba 17.3.4 da TGIS.
47.Recorda que a questão não é nova, tendo já sido decidida em favor da AT em diversas ocasiões, de que são exemplo as decisões arbitrais proferidas nos processos 742/2021-T, 741/2021-T (este apresentado pela Requerente) e 68/2022-T, os quais, com as devidas adaptações, na parte que para aqui interessa, se consideram aplicáveis à situação em apreço.
48.Nos sumários destas decisões consta que:
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A actividade das Sociedades Gestoras de Organismos de Investimento Colectivo (SGOIC), encontra-se regulada pela L 16/2015, de 24.2, que aprovou o Regime Geral dos Organismos de Investimento Colectivo;
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As SGOIC prosseguem funções respeitantes à gestão de organismo de investimento colectivo (OIC), competindo-lhes prosseguir as tarefas elencadas no artigo 66.º, n.º 1 do Regime dos OIC;
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A differentia specifica das SGOIC face a outras sociedades financeiras – como, por exemplo, uma sociedade financeira de corretagem, uma sociedade de locação financeira ou uma sociedade de garantia mútua - reside na circunstância de as primeiras serem responsáveis pela gestão de OIC;
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A remuneração das SGOIC baseia-se, nos termos do artigo 67.º do RGOIC, na cobrança de comissões de gestão, estabelecidas no regulamento de gestão, que podem assumir uma componente fixa e outra variável;
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As SGOIC cobram aos OIC comissões de gestão reflectindo, dessa forma, o essencial da actividade de gestão dos OIC: a realização de um conjunto de tarefas que, globalmente consideradas, devem ser tidas como serviços financeiros prestados aos OIC;
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As comissões de gestão cobradas pelas SGOIC aos OIC, por si geridos, estão sujeitas a IS por aplicação da norma de incidência consagrada na verba 17.3.4 da TGIS;
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Resulta do quadro legal aplicável que as SGOIC têm natureza de instituições financeiras;
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As comissões de gestão auferidas por tais sociedades estão abrangidas pela verba 17.3.4 da TGIS, não obstante as alterações operadas pelo DL 144/2019 no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, (DL 298/92).
49.Desenvolvendo a perspectiva da AT, esta começa por salientar que a verba 17.3.4 da TGIS, conjugada com o art. 1.º/1 do CIS sujeita a IS, a uma taxa de 4%, as operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras, sobre o valor cobrado, estando, portanto, sujeitas ao referido IS as comissões, e bem assim, as contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões, desde que cobradas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras.
50.Diverge, depois a Requerida quando à suposta não verificação do elemento subjectivo da dita verba 17.3.4 da TGIS, ou seja, da pretensão da Requerente de que as sociedades gestoras de fundos de investimento não se enquadram na categoria de instituição/sociedade financeira, ficando, assim, excluídas da previsão da norma de incidência.
51.Assim, não havendo definição legal no CIS do conceito de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras, terá de recorrer-se ao disposto no art. 11.º/2 da LGT, aplicando ao IS o conteúdo próprio que esses conceitos têm no ramo do direito correspondente.
52.Não deve, todavia, entender-se que a revogação dos normativos do RGICSF que definiam as SGOIC como sociedades financeiras ou que a afirmação no art. 6.º/5 deste mesmo diploma que [n]ão são sociedades financeiras as entidades reguladas (…) no Regime Geral dos Organismos de Investimento Colectivo, aprovado em anexo à Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro, na sua redacção actual (…)”, operadas pelo DL 144/2019, implicam a desqualificação destas sociedades como instituições/sociedades financeiras para efeitos de aplicação da norma de incidência.
53.Aquele DL 144/2019 apenas veio atribuir à CMVM, que já era responsável pela supervisão dos OIC, a competência para a supervisão prudencial das SGOIC, retirando-as da esfera do Banco de Portugal, alinhando-se, assim, o regime português dos OIC, com o regime vigente noutros estados da União Europeia, eliminando-se a sobreposição regulatória existente.
54.Na verdade, no entendimento da AT, ao contrário do que pretende a Requerente, as SGOIC são entidades financeiras, porquanto são empresas legalmente habilitadas a gerir veículos de investimento colectivo, actividade que, por ser de relevante ordem pública, se encontra sob a alçada da CMVM – supervisor financeiro encarregue em Portugal da supervisão dos mercados de instrumentos financeiros, bem como das entidades que neles actuam.
55.Por outro lado, mesmo após as alterações operadas ao DL 222/99 de 22.6, as SGOIC continuam a qualificar-se como sociedades financeiras à luz do RGICSF, já que o art. 2.º z) ii) dispunha, à data dos factos, que são instituições financeiras, com excepção das instituições de crédito e as empresas de investimento, as sociedades cuja actividade principal consista no exercício de uma ou mais das actividades enumeradas nos pontos 2 a 12 e 15 da lista constante do anexo I à Directiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho de 2013,
56.E a alínea kk) do mesmo preceito define como Sociedades financeiras, as empresas, com excepção das instituições de crédito, cuja actividade principal consista em exercer pelo menos uma das actividades permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos ou outros fundos reembolsáveis do público, incluindo as empresas de investimento e as instituições financeiras referidas na subalínea ii) da alínea z).
57.Releva ainda o disposto no art. 30.º/1 d) e f) do CVM que considera investidores profissionais as instituições de investimento colectivo e respectivas sociedades gestoras, bem como outras instituições financeiras autorizadas ou reguladas.
58.De facto, é a sujeição permanente à supervisão financeira, que resulta do facto de serem entidades reguladas e autorizadas a prestar ou exercer a nível profissional serviços de investimento ou actividades de investimento, que determina a qualidade de instituição financeira.
59.Assim sendo, a mudança da supervisão imposta pelo DL 144/2019 não afecta a natureza de investidores profissionais das SGOIC, as quais, enquanto tal, integram o conceito de instituições financeiras.
60.É, de facto, manifesto que estas praticam a nível profissional actividades materialmente financeiras, relacionadas com serviços e actividades de investimento em instrumentos financeiros, em tudo similares às exercidas a título profissional por instituições de crédito e empresas de investimento quando actuam como intermediários financeiros e, por isso, a sua actividade está expressamente sujeita aos princípios, condições, termos, requisitos e deveres previstos no CMVM para os intermediários financeiros, bem como à regulamentação da legislação da União Europeia relativa aos mercados de instrumentos financeiros, conforme estipula o art. 71.º-D.
61.Estão sujeitas à supervisão prudencial da CMVM, conforme determina o art. 79.º-P do RGOIC e relativamente aos fundos próprios, podem ter de aplicar o disposto no Regulamento 2013/575. Por outro lado, sendo autorizadas a exercer as actividades adicionais ou acessórias referidas no art. 71.º-B/4 e 5 do RGOIC, têm também de respeitar o capital inicial mínimo indicado no título IV da Directiva 2013/36 (cf. art. 71.º-M/1 a) e art. 71.º-L/2 do RGOIC, na redacção em vigor à data dos factos).
61. Quando exerçam a actividade de gestão discricionária e individualizada de carteiras por conta de outrem, as SGOIC estão também sujeitas ao mesmo regime das empresas de investimento (art. 2.º/2 DL 222/99).
62.Todas estas exigências convergem no sentido de que as SGOIC são, atendendo à sua natureza, verdadeiras instituições financeiras.
63.Também o Direito da União Europeia concorre claramente para a qualificação das SGOIC como instituições financeiras, em especial os Regulamentos 2010/1092 (relativo à supervisão macro prudencial do sistema financeiro na UE e que cria o Comité Europeu do Risco Sistémico) e 2013/575 (relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento).
64.Refere o art. 2.º a) do dito Regulamento 2010/1092 que uma instituição financeira é qualquer empresa abrangida pela legislação referida no art. 1.º/2 do Regulamento 2010/1093, do Regulamento 2010/1094 e do Regulamento 2010/1095, bem como qualquer outra empresa ou entidade que opere na União, cuja actividade principal seja de natureza semelhante.
65.Por outro lado, o próprio RGOIC reflecte a transposição das Directivas 2009/65 e 2011/61 que determinam, entre outros actos, o âmbito de acção da Autoridade Europeia dos Valores Imobiliários e dos Mercados, nos termos do art. 1.º/2 do Regulamento 2010/1095.
66.A Requerente é uma SGOIC, uma empresa cujo objecto principal e exclusivo é o exercício profissional da actividade de gestão de OIC, sejam eles sob a forma de OICVM ou OIA (FIAs), que enquadra o âmbito da Directiva 2011/61, cuja actividade dentro do sistema financeiro, no mercado dos serviços e produtos financeiros, se encontra sujeita a um rigoroso quadro regulamentar e de supervisão financeira, conforme decorre da legislação europeia.
67.Assim, à luz da legislação europeia aplicável, será forçoso reconhecer que as SGOIC, enquanto empresas supervisionadas, regulamentadas e autorizadas a gerir profissionalmente OIC, são instituições financeiras.
68.À mesma conclusão se chegará por aplicação do Regulamento 2013/575 quando define sociedade de gestão de activos (que constitui a actividade essencial da Requerente), ou quando qualifica como instituições financeiras as entidades pertencentes ao sistema financeiro cuja actividade principal integre o elenco do anexo i, pontos 12 e 15 da Directiva 2013/36, já que ali se encontram identificadas as transacções efectuadas por conta própria ou por conta de clientes que tenham por objecto a participação em emissões e a gestão de carteiras.
69.A AT afasta ainda o caso paralelo, invocado pela Requerente, das sociedades de capital de risco (SCR) cujas comissões cobradas não estão sujeitas a IS, por se tratar de uma situação não análoga, já que estas não integram o regime europeu regulador do sistema financeiro pós crise de 2008.
70.(Embora a AT defenda que mesmo essas sociedades deveriam integrar o conceito de instituições financeiras).
71.Relativamente ao requisito objectivo (as comissões de gestão sobre as quais foi liquidado o IS respeitarem a serviços financeiros) discorda a AT da afirmação da Requerente no sentido de que o mesmo estaria em falta,
72.Por considerar que, por aplicação da verba 17.3.4 da TGIS, estão o sujeitas a IS todas as comissões e, bem assim, todas as contraprestações por serviços financeiros, cobradas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras.
73.A introdução da redacção da expressão outras comissões e contraprestações por serviços financeiros (através da L 150/99 de 11.9) ficou claro que a intenção do legislador foi alargar a sujeição de IS a quaisquer comissões cobradas ou contraprestações obtidas pela prestação de serviços financeiros pelas entidades financeiras elencadas na norma de incidência, independentemente da denominação que lhes fosse atribuída.
74.Na inexistência de definição de serviços financeiros, estes devem entender-se como todos os serviços prestados ou intermediados por instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras, que de alguma forma estejam conexos e sejam necessários ao estabelecimento, manutenção e desenvolvimento de uma relação comercial, ocasional ou permanente, com os seus clientes.
75.A definição que a Requerente invoca, constante no art. 2.º c) do DL 95/2009, deve ser entendida apenas no contexto em que se insere (contratos à distância relativos a serviços financeiros).
76.Para efeitos da actividade de Requerente releva o facto de se tratar de uma instituição/sociedade financeira encarregada da gestão de diversos fundos de investimento (OIC), os quais são organismos cuja finalidade é o investimento colectivo das poupanças de investidores (designados participantes), cujo funcionamento se encontra sujeito ao princípio da diversificação de riscos e à prossecução do exclusivo interesse dos participantes – conforme refere o Glossário de termos relativos a Instrumentos Financeiros instrumentos financeiros.
77. A actividade de uma SGOIC, como a Requerente, envolve, portanto, sempre a prestação de serviços financeiros conexos com os OIC que por si são geridos.
78.No mesmo sentido, o disposto nos art, 66.º e 71.º-B do RGOIC quando se definem as funções das entidades gestoras, as quais estão sujeitas aos princípios, condições, termos, requisitos e deveres previstos no CVM para os intermediários financeiros, bem como à regulamentação da legislação da União Europeia relativa aos mercados de instrumentos financeiros, conforme estipula o artigo n.º 71.º-D.
79.E, também no mesmo sentido, a noção de intermediação financeira, constante no art. 289.º do CVM, ou a definição de actividades de investimento, que figura no art. 199.º-A do RGICSF (ambas as disposições, na redacção em vigor à data dos factos).
80.A conclusão, não poderá, portanto, ser outra senão a de que as SGOIC prestam serviços materialmente financeiros aos OIC por si geridos - isto é, serviços e actividades de investimento, serviços auxiliares dos serviços e actividades de investimento, serviços de consultoria para investimento - serviços esses qualificados como actividades de intermediação financeira e de investimento.
81.Afinal, conforme decorre do próprio regime, toda a actividade das SGOIC está orientada para esse fim.
82.O próprio objecto das comissões de gestão – definido no art. 66.º/1 RGOIC – torna isso claro, sendo que quaisquer outros que sejam prestados, enquanto complementares destes, mantêm a natureza de serviços financeiros.
83.Ao contrário do que pretende a Requerente a gestão de OIC não comporta três funções distintas ou incomunicáveis entre si, divididas em três grandes blocos, já que essa diferenciação não tem acolhimento legal e todas elas convergem no âmbito dos serviços financeiros, cuja remuneração se traduz numa comissão de gestão que integra o elemento objectivo da verba 17.3.4 da TGIS.
84.Não aceita também a AT o argumento de que a verba 17.3.4 da TGIS deva ser interpretada restritivamente, em conformidade com as limitações impostas pela Directiva que proíbe a aplicação de qualquer tributação indirecta sobre as operações de reunião de capitais, nas quais entende incluírem-se as comissões de gestão suportadas por OIC.
85.Isto por não existir qualquer paralelismo entre a tributação de entradas de capital numa sociedade de capitais, operações de reestruturação ou a emissão de determinados títulos e obrigações (que é aquilo que é vedado pela Directiva) e a tributação das comissões cobradas pela gestão de OIC, isto é, por um serviço de intermediação financeira.
86.O elenco das operações não sujeitas a impostos indirectos que consta no art. 5.º/2 não incluem os serviços prestados pelas SGOIC.
87.Não aceita a AT, por não demonstrada, a pretensa dupla tributação (injustificada) das comissões de gestão, sendo certo que o disposto na Directiva relativa a reunião de capitais não tem cabimento em matéria de prestação de serviços.
88.Relativamente ao pedido de reenvio a AT começa por considerar que a jurisprudência invocada não tem aplicação ao caso sub judice na medida em que reporta a factualidades diversas. Assim, o acórdão Comissão/Bélgica, no processo C-415/02 refere-se a um imposto sobre a subscrição de títulos, o acórdão Isabelle Gielen, no processo C.299/13 refere-se à cobrança de um imposto sobre a conversão obrigatória de títulos ao portador em títulos nominativos ou em títulos escriturais, o acórdão Albert Reiss, no processo C-466/03, refere-se a impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais e o acórdão HSBC Holdings, no processo C-569/07, sobre a mesma matéria, proíbe a cobrança de impostos aquando da emissão de acções no âmbito de um serviço de compensação.
89.Ora, na situação em causa, o imposto não incide sobre qualquer emissão/subscrição, conversão ou transferência de títulos, mas, pura e simplesmente, sobre uma actividade de intermediação financeira, realizada por SGOIC.
90.Discorda, por outro lado, a Requerida da obrigatoriedade do reenvio, o qual deve ser apreciado pelo tribunal.
91.Termina a AT impugnando o pedido de juros indemnizatórios.
II. Saneamento
92.O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objecto do processo dirigido à anulação de actos de liquidação de impostos (v. art.os 2.º e 5.º do RJAT).
93.O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no art. 10.º, do RJAT.
94.As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. art.os 4.º e 10.º/2 do RJAT e art. 1.º da Portaria 112-A/2011, de 22.3).
95.Não foram identificadas nulidades ou questões que obstem ao conhecimento do mérito.
III. Matéria de facto
Factos provados
96.Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:
-
A Requerente é uma sociedade gestora de organismos de investimento colectivo (SGOIC), tendo como actividade principal a gestão, a administração e comercialização de OIC, registada sob o Código de Actividade Económica (CAE) n.º 66300 (que compreende as actividades desenvolvidas pelas sociedades gestoras de fundos de investimento, sociedades de investimento em valores mobiliários, sociedades gestoras de patrimónios, sociedades gestoras de fundos de pensões, sociedades gestoras de fundos de capital de risco e sociedades de fundos mutualistas);
-
Este CAE está inserido no CAE geral n.º 66 que, de acordo com o referido documento do INE, compreende um conjunto de actividades de prestação de serviços auxiliares da actividade financeira, mas sem fornecer serviços financeiros;
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No decurso da sua actividade (que envolve, entre outras, as funções de gestão, administração e comercialização), a Requerente cobrou comissões de gestão e liquidou IS sobre as mesmas, nos anos de 2020 e 2021, num montante total de IS de 584.277,35 €, que entregou nos cofres do Estado;
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A 19 de Abril de 2022, estando convicta de não ser devido qualquer IS relativamente às comissões de gestão cobradas aos fundos de investimento por si geridos, a Requerente apresentou reclamação graciosa, no âmbito da qual peticionou o reembolso do IS, pedido que foi indeferido em 1 de Agosto de 2022.
Factos não provados
97.Não ficou provado que a função de comercialização de unidades de participação de OIC seja desempenhada pela Requerente de forma indirecta, mediante o recurso à colaboração de intermediários financeiros (mormente, bancos), os quais debitam as comissões de comercialização à Requerente, a qual, por seu turno, incorpora-as nas comissões de gestão.
98.O tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada ou não provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo remetido pela AT.
III. Matéria de Direito
99.Tal como decorre da própria exiguidade da matéria provada, a questão jurídica, embora não seja simples, é evidente. Trata-se, no essencial, de saber se o imposto de selo deve aplicar-se às comissões de gestão cobradas pelas Sociedades Gestoras de Organismos de Investimento Colectivo.
100.A Requerente defende que não, por considerar que não é uma instituição financeira, nem os serviços por si prestados serem de natureza financeira.
101. O argumento essencial - relativo à natureza (não) financeira das instituições - é, todavia, meramente formal, ao considerar que o legislador, ao revogar as alíneas vi e ix do art. 6.º/1 do RGICSF (que qualificavam as SGOIC como instituições financeiras), pretendeu excluir essas sociedades desse âmbito.
102.Parece, no entanto, que tem razão a AT ao afirmar que, no sentido da decisão do CAAD no processo 68/2022-T (para o qual se remete no tocante ao enquadramento da questão, por se seguir a mesma orientação), essa alteração não teve em vista uma modificação da classificação ou natureza das sociedades em causa, mas, tão-só, a alteração da sua supervisão (que passou a fazer-se pela CMVM).
103.Não colhe, também o argumento acessório de que a noção de instituição financeira constante da alínea z) do art. 2.º-A do RGICSF não englobará as SGOIC, na medida em que a mesma alínea remete nomeadamente para a alínea h) do art. 4.º/1 do mesmo diploma que se refere a sociedades de administração e gestão de carteiras de bens imobiliários.
104.Não se afiguram consistentes os argumentos da Requerente segundo os quais, (a) o DUE proibirá a tributação indirecta sobre comissões, e (b) não se considerando as SRC (sociedades de capital de risco) como sociedades financeiras, forçoso seja excluir também as SGOIC.
105.No primeiro caso – a suposta proibição da tributação indirecta sobre comissões – não pode retirar-se, enquanto regra geral, de uma ou outra situação específica.
106.É certo que, tal como a Requerente salientou nas suas alegações, o TJUE veio a declarar incompatível com o Direito da União uma legislação nacional que prevê a incidência de um imposto do selo […] sobre os montantes que essa sociedade de gestão recebe dos fundos comuns de investimento na medida em que esses montantes incluam a remuneração que a referida sociedade de gestão pagou às instituições financeiras por esses serviços de comercialização,
107.Sendo também verdade que a Requerente invocou a circunstância de a sua função de comercialização de unidades de participação de OIC ser desempenhada mediante o recurso à colaboração de intermediários financeiros (bancos), os quais lhe debitavam as comissões de comercialização que seriam posteriormente incorporadas nas comissões de gestão cobradas aos OIC,
108.Mas, essa circunstância não ficou provada, não podendo, por isso, beneficiar da doutrina decorrente do referido acórdão.
109.Quanto ao argumento de que, não se considerando as SRC (sociedades de capital de risco) como sociedades financeiras, forçoso seja excluir também as SGOIC, importará ter presente que se trata de regimes jurídicos muito distantes no tempo sobre situações que, não sendo idênticas, não pode pretender-se, pura e simplesmente, uma aplicação analógica.
110.Não colhe também o argumento relativo àquilo que a Requerente designa como o requisito objectivo (de que os serviços prestados não tenham natureza financeira).
111.Parece claro que, com a reforma do CIS de 1999, a intenção do legislador foi alargar a sujeição de Imposto do Selo a quaisquer comissões cobradas ou contraprestações obtidas pela prestação de serviços pelas entidades financeiras elencadas na norma de incidência, devendo, portanto, considerar-se que as comissões de gestão remuneram genericamente serviços de natureza financeira (já que prestados por instituições com essa natureza no exercício da sua actividade própria).
112.A Requerente introduz ainda uma interpretação de Direito da União que entende ser-lhe favorável (a jurisprudência nos acórdãos Comissão/Bélgica, proc. C-415/02, Isabelle Gielen, proc. C-299/13, Albert Reiss, proc. C-466/03 e HSBC, proc. C-569/07) para indiciar do cabimento da sua pretensão ou, sendo caso disso, justificar o reenvio prejudicial para o TJUE.
113.Tal como salienta a AT, a pertinência dos acórdãos é questionável, desde logo porque o primeiro se refere a um imposto sobre a subscrição de títulos, o segundo a um imposto sobre a conversão obrigatória de títulos ao portador em títulos nominativos ou em títulos escriturais, o terceiro a impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais e último, sobre a mesma matéria, proíbe a cobrança de impostos aquando da emissão de acções no âmbito de um serviço de compensação.
114.Não havendo identidade na questão, não pode considerar-se haver uma orientação jurisprudencial, muito menos obrigatória.
115.Já quanto ao pedido de reenvio, sempre se referirá que, nos termos do art. 267.º do TFUE, não se tratando de uma decisão em última instância, esse reenvio não é obrigatório, pelo que entende este tribunal não sujeitar as partes às delongas que esse procedimento implicaria.
116.Assim sendo, seguindo-se a jurisprudência da decisão anterior (proc. 68/2022-T),
117.Considera-se que as SGOIC são instituições financeiras à luz do Direito da União que regula essa mesma actividade financeira (nomeadamente o Regulamento 2013/575 de 26.6.2013, a Directiva 2013/63 de 26.6 2013).
118.Acrescendo o facto de, no âmbito do direito interno, a actividade própria das SGOIC ser regulada pela L 16/2015, de 24.2 cujo art. 71º-D expressamente sujeita as sociedades gestoras aos princípios, condições, termos, requisitos e deveres previstos no Código dos Valores Mobiliários para os intermediários financeiros.
119.Assim sendo, as comissões de gestão auferidas por tais sociedades estão abrangidas pela verba 17.3.4 da TGIS, não obstante as alterações operadas pelo Decreto-Lei n.º 144/2019 no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, (Decreto-Lei n.º 298/92).
IV. Decisão
Em face do supra exposto, decide-se:
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Julgar improcedente o pedido de declaração de ilegalidade dos actos de liquidação do imposto de selo;
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Condenar a Requerente no pagamento integral das custas do presente processo.
V. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em 584.277,35 € (quinhentos e oitenta e quatro mil, duzentos e setenta e sete euros e trinta e cinco cêntimos) nos termos do disposto no art. 32.º do CPTA e no art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º/1 a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º/2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
VI. Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de 8.874 € (oito mil oitocentos e setenta e quatro euros), a pagar pela Requerente, nos termos dos artigos 12.º/2, e 22.º/4, do RJAT, e artigo 4.º/5, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 25 Maio de 2023
Os Árbitros
José Poças Falcão (Presidente)
Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho
Rui M. Marrana (Relator)
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto
no art. 131.º/5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º/1 e), do RJAT.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.