SUMÁRIO:
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Procedendo a Autoridade Tributária à revogação do ato impugnado através do pedido de pronúncia arbitral no prazo previsto no nº 1 do art.º 13º do RJAT, tem a mesma o dever de notificar, da sua decisão, o presidente residente do Centro de Arbitragem Administrativa e o sujeito passivo, nos termos dos nºs 1 e 2 do mesmo preceito.
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Não o fazendo, é a Autoridade Tributária que dá causa à constituição do Tribunal Arbitral, pelo que sobre a mesma recai a responsabilidade pelas custas processuais.
DECISÃO ARBITRAL
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RELATÓRIO
A…, (doravante, “Requerente”) com o número de identificação fiscal …, residente na Rua … Linda-A-Velha apresentou, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e n.º 1 al. a) do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 Março, pedido de constituição de tribunal arbitral, para se pronunciar sobre a ilegalidade da liquidação de IRS n.º 2022 …, relativa ao período de 2018.
O pedido de constituição do tribunal arbitral (PCTA) foi apresentado em 25.11.2022.
O PCTA foi aceite no dia 28-11-2022.
É Requerida a Autoridade Tributária.
Por decisão do Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, a signatária foi designada árbitro único.
Nestas circunstâncias, e em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 e n.º 8 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 03.02.2023.
No dia 03.02.2023, no próprio dia em que o tribunal arbitral foi constituído, o Requerente submeteu ao Tribunal um requerimento, através do qual informou o Tribunal de que tinha sido notificado, “só agora”, de uma nova liquidação de IRS (nº 2023 …), emitida em 06.01.2023, com uma liquidação de imposto de 00,00 euros.
Notificado o Dirigente máximo da Autoridade Tributária e Aduaneira para apresentar resposta e remeter ao Tribunal o processo administrativo, a AT apresentou a sua resposta no dia 02.03.2023.
Na sua resposta, a AT alega:
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A liquidação sindicada deteve a sua génese na circunstância do Requerente não ter apresentado a declaração modelo 3 do IRS para o ano 2018 a que se encontrava obrigado, nos termos do artigo 57.º, não obstante instado para o efeito em sede de processo de divergências, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 76.º, todos do CIRS, tendo sido emitida em função dos dados que a AT dispunha.
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Todavia, a 21.11.2022, o Requerente apresentou uma declaração de substituição, cuja validação ocorreu a 13.12.2022 e subsequente liquidação a 06.01.2023;
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Da qual adveio a liquidação de IRS n.º 2023 …, no valor de 0,00, em substituição da precedente liquidação oficiosa
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Desse modo, aliás, como o Requerente reconhece no requerimento a fls, a liquidação que constitui o objeto do presente PPA foi revogada, sendo substituída por uma a € 0,00;
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O que ocorreu dentro do prazo de 30 dias, previsto no artigo 13.º, n.º 1, do RJAMT, encontrando-se, nessa conformidade, a pretensão do Requerente satisfeita.
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Nestes termos, existe uma impossibilidade da lide, que ocorreu anteriormente à constituição deste Tribunal Arbitral (constituído a 03.02.2023).
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Pelo que se requer a extinção da instância, sem quaisquer custas a pagar pela Requerida, já que esta impossibilidade é, como antedito, prévia à constituição deste Tribunal, nos termos da alínea e) do artigo 277.º CPC ex vi 29.º do RJAT.
Na mesma data, a AT remeteu ao Tribunal o processo administrativo.
No dia 03.03.2023, o Requerente submeteu ao Tribunal novo requerimento, em que alegou:
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A liquidação sindicada teve a sua génese, não na “circunstância do requerente não ter apresentado a declaração modelo 3 do IRS para o ano de 2018”, mas sim na circunstância de a Requerida não ter cumprido o dever legal a que se encontra adstrita, previsto no artigo 267.º n.º 5 da CRP, nos termos do qual deve, no âmbito do processamento da atividade administrativa, assegurar “a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”, que no procedimento tributário deve ter lugar nos termos previstos no artigo 60º da LGT.
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Além disso, este procedimento foi instaurado porque a Requerida também não cumpriu outro dever procedimental a que se encontra adstrita, este, previsto no artigo 13.º n.º 2 do RJAT, de “proceder à notificação do sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar (artigo 13º, nº 2 do RJAT), do “ato tributário substitutivo” do ato impugnado, praticado “no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral” (artigo 13.º n.º 1 do RJAT).
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Como é evidente, o dever de “proceder à notificação do sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar” relativamente ao ato tributário substitutivo do ato impugnado nestes autos, de modo a permitir-lhe informar os autos sobre se “mantém o seu interesse” sobre o seu prosseguimento, é um ato procedimental, que no âmbito deste tem naturalmente de ser notificado ao mandatário do sujeito passivo, que é quem o representa nestes autos e nessa qualidade deve intervir para os efeitos previstos no artigo 13.º nº 2 do RJAT.
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Não o tendo sido, foi só em 02/02/2023 que o mandatário do Reclamante tomou conhecimento do ato tributário substitutivo do ato impugnado, do que deu de imediato conhecimento a estes autos, e que – não obstante (i) a pendência destes autos onde o signatário está constituído mandatário do Requerente, (ii) não obstante o disposto no artigo 13.º nº 2 do RJAT e ainda (iii) o teor do artigo 40º do CPPT – nunca foram notificados pela Requerida ao mandatário subscritor.
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Face ao exposto, reafirma-se dever declarar-se a inutilidade superveniente da lide (artigo 277º al. e) do CPC), naturalmente considerando-se para efeito de custas ser “imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente” (artigo 536º nº 4 do CPC).
A Requerida foi notificada pelo Tribunal, em 06-03-2023, para, querendo, se pronunciar sobre o requerimento anterior.
Em pronúncia sequente, a Requerida alegou:
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O Requerente vem sustentar a inutilidade superveniente da lide, ao invés da inutilidade originária, no essencial, por duas ordens de razões.
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Primeiramente, advoga que a presente lide deteve a sua génese na suposta circunstância da Requerida não ter respeitado o seu direito de participação, convidando-o a participar no procedimento administrativo tributário, em sede de audiência prévia, precedente à emissão da liquidação sub judice.
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Neste ponto, relembramos, como já firmado em sede de Resposta, que o Requerente foi condignamente notificado, em sede de precedente processo de divergências, para apresentar a declaração de Modelo 3 de IRS em falta, assim como, para as consequências subjacentes à sua falta de apresentação:
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O Requerente, todavia, silenciou-se, não promovendo a obrigação tributária a que estava legalmente adstrito, pelo que a liquidação sindicada foi emitida com base nos dados objetivos que eram do conhecimento da Administração Tributária. Assim; 5. Como resulta cristalinamente da alínea b) do n.º 2 do artigo 60.ºda LGT: “Artigo 60.º Princípio da participação 2 - É dispensada a audição: b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objetivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.” (sublinhado e negrito nosso) 6. Desse modo, nada há a apontar à Requerida nesta particularidade porquanto a realização da audiência prévia não era legalmente exigível no caso em análise.
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O Requerente vem ainda advogar em abono da sua tese que o mandatário que constituiu no presente PPA não foi notificado da revogação do ato de liquidação, ao abrigo do artigo 13.º, n.ºs 1 e 2, do RJAT e 40.º do CPTT.
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Neste pormenor, como resulta manifestamente evidente do PA junto aos autos, a revogação do ato de liquidação sindicado não foi promovida, em sede de reanálise, pelo órgão competente da AT para o efeito, ao abrigo da prerrogativa contida no artigo 13.º, n.º 1, do RJAT (a pronúncia emitida, datada de 13.02.2023, foi no sentido do arquivamento do processo), mas em virtude da precedente declaração de substituição apresentada pelo Requerente no âmbito do procedimento administrativo tributário de liquidação;
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Pelo que, em função dos elementos disponíveis e após validação da declaração de substituição em foque, o Sistema da AT emitiu a liquidação de IRS n.º 2023 …, no valor de 0,00, promovendo a notificação do Requerente, como era devido;
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O que se verificou em momento precedente ao da constituição do Tribunal Arbitral (03.02.2022).
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É igualmente de denotar que o Requerente, através do seu mandatário, veio requerer ao CAAD o decretamento da inutilidade da lide, mediante requerimento enviado aos autos a coberto de email datado de 02.03.2023, ou seja, em momento igualmente precedente ao da constituição do Tribunal Arbitral. 12. Face ao exposto, reitera-se o pedido de extinção da instância, sem quaisquer custas a pagar pela Requerida, já que a impossibilidade da lide é, como antedito, prévia à constituição deste Tribunal, nos termos da alínea e) do artigo 277.º CPC ex vi 29.º do RJAT.
II - SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e encontram-se devidamente representadas.
O processo não padece de vícios que o invalidem.
IV – QUESTÕES A DECIDIR
São as seguintes as questões a decidir:
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Se se verifica exceção de inutilidade superveniente da lide.
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Se se verifica exceção de impossibilidade da lide anterior à constituição do tribunal.
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Verificando-se inutilidade superveniente da lide ou impossibilidade da lide anterior à constituição do tribunal, quais são as consequências processuais dessas exceções.
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No caso de se verificar qualquer uma dessas exceções, devendo ser decretada a extinção da instância, se deve ser imputada a responsabilidade pelas custas do processo a alguma das Partes.
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Não se verificando impossibilidade da lide, se a liquidação de IRS nº 2022 … é ilegal
V – MATÉRIA DE FACTO
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No ano de 2018, o Requerente alienou um conjunto de ações de que era detentor.
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O Requerente não apresentou, no prazo legal, declaração de rendimentos para o ano 2018.
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Por notificação emitida em 25.09.2019, o Requerente foi notificado para entregar declaração de rendimentos referente ao ano 2018 (doc. 2 junto pelo Requerente)
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O Requerente foi notificado da liquidação oficiosa de IRS nº 2022 …, relativa aos rendimentos de 2018, datada de 23.09.2022 (doc. 1 junto pelo Requerente).
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O Requerente dirigiu à AT um pedido de informação sobre os fundamentos da liquidação (doc. 2 junto pelo Requerente).
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Na sequência de tal pedido, foi-lhe passada certidão através da qual se constata que, na liquidação oficiosa, a AT considerou no anexo G (mais-valias e outros incrementos patrimoniais) valores de realização de ações vendidas pelo Requerente no ano de 2018, constando como valores de aquisição de todas elas o montante de 0 (zero) euros.
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Em 15.11.2022, o Requerente obteve junto do B… um documento, contendo os valores de aquisição das ações vendidas. (doc. nº 3 junto pelo Requerente)
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Em 16.11.2022, o Requerente remeteu esse documento à Autoridade Tributária, comprovando os valores das ações alienadas. (doc. nº 4 junto pelo Requerente)
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Entre essa data e a data de 18.11.2022, o Requerente apresentou declaração de IRS, referente ao ano de 2018, em que indicou os valores de aquisição das ações.
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Em 18.11.2022, foi emitida notificação do Requerente, com a informação de que devia corrigir a declaração submetida, corrigindo os erros:
E06 – SPB EXISTE COMO CÔNJUGE NOUTRA DR
Z08 – NIFA OU NIFB ASSINALADO NOUTRA DR COM ESTADO CIVIL E/OU REG. TRIBUTÁRIO DIFERENTE
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Em 21.11.2022, o Requerente submeteu nova declaração de IRS para o ano 2018, em que corrigiu os erros apontados (doc. nº 7 entregue pelo Requerente).
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Em 06.01.2023, a AT procedeu a nova liquidação do IRS do Requerente para o ano de 2018, com base na declaração por esta apresentada, em que apurou o valor de € 00,00 (zero euros) a pagar.
VI – DISCUSSÃO DE DIREITO
Em primeiro lugar, importa afastar uma questão que é discutida pelas Partes, mas em que o Tribunal, com o devido respeito, não vê qualquer relevância para a decisão da causa: a questão de quem deu causa à liquidação.
O art.º 76.º, n.º 1 al. b) do CIRS prevê que, na falta de declaração do sujeito passivo, a AT tem o poder-dever de emitir uma liquidação oficiosa com base nos elementos de que dispuser. Esse procedimento obedece ao princípio da legalidade.
Efetuada a liquidação, esta é impugnável, como foi no presente processo, com base em qualquer ilegalidade, seja esta de conteúdo ou de forma, incluindo a omissão do direito de audição.
A partir do momento em que a liquidação é impugnada, é irrelevante quem deu causa à liquidação, passando apenas a ser relevante se ela é ou não legal.
Através da liquidação efetuada em 06.01.2023, a AT procedeu à revogação da liquidação que é impugnada no presente processo.
O Requerente sustenta que essa revogação, porque apenas lhe foi comunicada após a apresentação do pedido de pronúncia arbitral, gera a inutilidade superveniente da lide.
A AT, por seu turno, sustenta que existe impossibilidade da lide, mas que esta já se verificava em momento anterior à constituição do Tribunal Arbitral.
Nos termos da al. e) do art.º 277.º do CPC e do seu proémio (aplicável ao processo arbitral tributário ex vi o art.º 29º, nº 1, al e) do RJAT), a instância extingue-se com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.
A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando “por um facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida” (Supremo Tribunal de Justiça, ac. de 22 de junho de 2021, 17731/18.1T8PRT.P1.S1, relatora Ana Paula Boularot); (Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1.º, 3.ª ed., Coimbra, 2014, p. 546).
Entendemos que, no caso sub judice, a pretensão do autor não se pode manter por extinção do objeto do processo.
E entendemos que o facto que dá causa a que a pretensão do autor não se possa manter por extinção do objeto do processo é a revogação do ato impugnado, a qual ocorreu em 06.01.2023.
Esse facto ocorreu antes da constituição do tribunal arbitral, a qual se verificou em 03.02.2023.
Portanto, não ocorreu, tal facto, na pendência da instância, uma vez que, nos termos do art.º 15.º do RJAT, o processo arbitral apenas se inicia com a constituição do tribunal arbitral.
Há, assim, que concluir que não se verifica, no caso, impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 277º do CPC, mas antes uma inexistência originária do objeto do processo (Tribunal Central Administrativo Sul, ac. de 08.07.2021, proc. nº 540/09.6BELRS, relator Mário Rebelo).
A falta de objeto constitui exceção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito da causa (art. 576°, n° 2, do CPC.
Assim sendo, a presente impugnação tem de ser declarada sem objeto, verificando-se desta forma uma causa de extinção da instância.
Para efeitos de imputação das custas do processo, há que atender às regras sobre responsabilidade por custas constantes do Código de Processo Civil, aplicáveis a processo arbitral por força do art.º 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT.
No atual processo, em que o Tribunal irá decretar a extinção da instância por inexistência de objeto, pelas razões já expostas, não existe parte vencedora, nem vencimento e decaimento repartidos, não se aplicando, assim, as regras dos artigos 533º e 534º do CPC.
Também não se pode dizer que a Requerida não tenha dado causa à ação (art.º 535º, nº 1 do CPC), pelos seguintes motivos.
O Requerente submeteu a declaração de substituição – que a AT viria a considerar válida e correta do ponto de vista do conteúdo declarado – em 21.11.2022.
Mas, apesar de o conteúdo da declaração estar correto, a AT apenas emitiu a declaração em 06.01.2023, quando o nº 2 do art.º 57º da LGT dispõe que “Os atos do procedimento tributário devem ser praticados no prazo de oito dias, salvo disposição legal em sentido contrário.”
Mas além disso, em 30-11-2022, a AT foi notificada do pedido de constituição do tribunal arbitral. Ou seja, a emissão da nova liquidação, que revogou a liquidação ora impugnada, teve lugar na pendência do pedido – logo, do procedimento – de constituição do tribunal arbitral.
Ora, é precisamente para estes casos que o art.º 13.º do RJAT dispõe que:
1 - Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º
Ao praticar o ato de revogação da liquidação impugnada no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido, como fez, o dirigente máximo do serviço da administração tributária tinha o dever de notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa do seu ato.
Ao notificar o presidente do CAAD, este poderia (a lei não o impõe) efetuar um procedimento de notificação do sujeito passivo para que este declarasse se mantinha ou não o pedido.
Mas a própria AT tinha o dever (art.º 13.º nº 2 do RJAT) de notificar o sujeito passivo para, “no prazo de dez dias, se pronunciar, prosseguindo o procedimento relativamente a esse último ato se o sujeito passivo nada disser ou declarar que mantém o seu interesse.”
Não há dúvida, tratando-se de uma notificação obrigatória e colocada dentro do procedimento de constituição do tribunal arbitral, no qual o sujeito passivo se encontra representando por mandatário, que esta notificação teria de ser efetuada na pessoa do mandatário do Requerente.
Ora, não se provou que a AT tenha notificado o presidente do CAAD, como previsto no nº 1 do 13º do RJAT, nem que tenha notificado o sujeito passivo, como previsto no nº 2 do mesmo preceito.
A AT alega, sobre esta questão, que “o Requerente, através do seu mandatário, veio requerer ao CAAD o decretamento da inutilidade da lide, mediante requerimento enviado aos autos a coberto de email datado de 02.03.2023, ou seja, em momento igualmente precedente ao da constituição do Tribunal.” Não enunciando, contudo, uma consequência jurídico-processual clara deste facto.
Porém, observa-se que o sujeito passivo não desistiu do pedido de constituição do tribunal arbitral, o que poderia ter feito.
Além disso, o requerimento do Requerente foi dirigido ao tribunal, e não ao CAAD, pelo que o CAAD não podia, com base nesse requerimento, deixar de constituir o tribunal.
Consideremos o nº 1 do art.º 536º do CPC que diz: “Quando a demanda do autor ou requerente ou a oposição do réu ou requerido eram fundadas no momento em que foram intentadas ou deduzidas e deixaram de o ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, as custas são repartidas entre aqueles em partes iguais.”
No caso, a demanda do autor era fundada no momento em que foi intentada, e deixou de o ser por circunstâncias supervenientes.
Contudo, essas circunstâncias supervenientes são imputáveis à AT, pela prática do ato de revogação da liquidação impugnada conjugada com o não cumprimento dos deveres que lhe incumbiam visando a não constituição do tribunal arbitral.
Assim, as custas não deverão ser repartidas entre as partes, como disposto no final do nº 1 do art.º 536º CPC.
As custa só poderão ser imputadas à Requerida Autoridade Tributária, uma vez que foi esta que, pelo não cumprimento dos deveres de notificação que lhe impunha o art.º 13.º do RJAT, deu causa à constituição do Tribunal Arbitral.
VII – DECISÃO
Em decorrência do tudo o que ficou exposto, o Tribunal Arbitral decide:
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Decretar a extinção da instância, por falta de objeto.
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Condenar a Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento das custas do processo.
VIII - VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do CPC e 97.ºA do CPPT, e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do pedido é fixado em € 5.166,28 (cinco mil, cento e sessenta e seis euros e vinte e oito cêntimos).
IX- CUSTAS ARBITRAIS
Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00 a cargo da Requerida.
Registe-se e notifique-se.
Porto, 15 de maio de 2023
O Árbitro
(Nina Aguiar)