DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
1. A, contribuinte fiscal n.º ..., e B, contribuinte fiscal n.º ...;
C, contribuinte fiscal n.º ..., e D, contribuinte fiscal n.º ...;
E, contribuinte fiscal n.º ...;
F, contribuinte fiscal n.º ...;
G, contribuinte fiscal n.º ...;
H, contribuinte fiscal n.º ..., e I, contribuinte fiscal n.º ...;
J, contribuinte fiscal n.º ..., e K, contribuinte fiscal n.º ...;
L, contribuinte fiscal n.º ..., e M, contribuinte fiscal n.º ...;
N, contribuinte fiscal n.º ..., e O, contribuinte fiscal n.º ...;
P, contribuinte fiscal n.º ..., e Q, contribuinte fiscal n.º ...;
Adiante identificados, em conjunto, por Requerentes, apresentaram em ………… de 2013 um pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2º nº 1 alínea a), 5º nº 2 alínea b) e 6º nº 1 todos do Decreto-Lei 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, de ora em diante identificado apenas pelas iniciais RJAT).
2. Na Petição Inicial apresentada, os Requerentes solicitaram a Declaração de Ilegalidade das Ordens de Pagamento de IMT referidas no número seguinte e dos Actos de Revogação das Decisões de Anulação de Liquidações de Imposto Municipal sobre as Transacções Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto do Selo (IS) proferidas em Processo de Revisão Oficiosa que estiveram na origem das ordens de pagamento.
3. As ordens de pagamento cuja ilegalidade é suscitada são as ordens de pagamento constantes dos ofícios nºs ... e ..., de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº 546 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e 5540 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, proferidos pelo Chefe de Serviço de Finanças de ...e Despachos de Revogação das Decisões de Deferimento dos Pedidos de Revisão Oficiosa que estiveram na origem dos referidos ofícios.
4. No pedido de pronúncia arbitral, os Requerentes não designaram árbitros.
5. Nos termos do nº 1 do artigo 6º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou os Juízes Árbitros, considerando-se, na sequência dessa designação e a partir de 31 de Outubro de 2013, por despacho proferido pelo Exmº Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o Tribunal Arbitral devida e regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.
6. Os Requerentes, nos termos do artigo 3º do Decreto-Lei nº 10/2011 de 20 de Janeiro, requereram a constituição do Tribunal Arbitral de forma coligada e apresentaram os seus pedidos de forma cumulada, por considerarem que a procedência do seu pedido depende, essencialmente, da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios e regras de direito.
7. Em resumo, o pretendido pelos Requerentes é a declaração de ilegalidade dos actos identificados nos números anteriores com base nos seguintes argumentos: (i) Ilegalidade da Revogação de Actos Revogatórios com eficácia retroactiva; (ii) Falta de fundamentação do despacho de revogação; (iii) Inverificação dos pressupostos do direito à isenção.
8. Para sustentar este pedido de ilegalidade, os Requerentes apresentaram, basicamente, os seguintes factos:
(i) Os 1.ºs, 4.º., 6.ºs, 7.ºs, 8.ºs e 10.ºs Requerentes. celebraram com a R, S.A., pessoa colectiva ..., um Contrato Promessa de Compra e Venda respeitante aos seguintes imóveis, devidamente mobilados e equipados de acordo com uma unidade de cinco estrelas, na seguinte data:
No caso dos 1.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 26 de Dezembro de 2003;
No caso do 4.º Requerente, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 24 de Maio de 2004;
No caso dos 6.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 17 de Julho de 2006;
No caso dos 7.ºs Requerentes, uma unidade independente designada por …, na data de 27 de Abril de 2006;
No caso dos 8.ºs Requerentes, uma unidade independente designada por …, na data de 30 de Outubro de 2006;
No caso dos 10.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 8 de Junho de 2004.
(ii) Os Imóveis identificados integram o Empreendimento Turístico designado “S”, ao qual havia sido atribuído o Alvará de Obras de Urbanização do Conjunto Turístico …, emitido pela Câmara Municipal de …, e sobre o qual recaiu a decisão do Director Geral do Turismo de 23 de Setembro de 2002, atribuindo-lhe utilidade turística a título prévio, e que é constituído por fracções autónomas constituídas em propriedade horizontal tratando-se de empreendimento turístico em propriedade plural, nos termos do artigo 52.º do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, situação já prevista no anterior regime jurídico constante do Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho.
(iii) Nos termos destes contratos, os 1.ºs, 4.º., 6.ºs, 7.ºs, 8.ºs e 10.ºs Requerentes assumiram o compromisso de celebrar com a sociedade R, S.A. um contrato de gestão turística a que ficaria afecta a unidade independente prometida adquirir.
(iv) De acordo com a minuta do contrato exploração turística, designada “…”, em anexo aos Contratos-Promessa de Compra e Venda, os 1.ºs, 4.º., 6.ºs, 7.ºs, 8.ºs e 10.ºs os Requerentes comprometeram-se a afectar as unidades independentes que prometeram adquirir, por um período de cinco anos, à disponibilização a hóspedes do S, entrando assim no que chamaram de “…” e ainda a subscrever o Regulamento de Administração do referido Empreendimento.
(v) Posteriormente, todos os Requerentes celebraram com a T, S.A., pessoa colectiva ... (anteriormente designada por R, S.A.), um Contrato de Compra e Venda respeitante a uma fracção autónoma do empreendimento turístico em causa, nas seguintes datas:
No caso dos 1.ºs Requerentes, em 11 de Dezembro de 2008;
No caso dos 2.ºs Requerentes, em 13 de Fevereiro de 2009;
No caso do 3.º Requerente, em 1 de Julho de 2008;
No caso do 4.º Requerente, em 1 de Julho de 2008;
No caso do 5.º Requerente, em 19 de Dezembro de 2008;
No caso dos 6.ºs REQUERENTES, 19 de Dezembro de 2008;
No caso dos 7.ºs Requerentes, em 25 de Novembro de 2008;
No caso dos 8.ºs Requerentes, em 17 de Outubro de 2008;
No caso dos 9.ºs Requerentes, em 11 de Dezembro de 2008;
No caso dos 10.ºs Requerentes, em 17 de Outubro de 2008.
(vi) Sendo que, antes da celebração destas escrituras, os Requerentes liquidaram e pagaram IMT e IS, nos seguintes valores:
No caso dos 1.ºs Requerentes, € 33.000,00 e € 3.520,00;
No caso dos 2.ºs Requerentes, € 25.688,00 e € 2.912,00;
No caso do 3.º Requerente, € 12.270,00 e € 1.837,60;
No caso do 4.º Requerente, € 12.478,00 e € 1834,24;
No caso do 5.º Requerente, € 20.750,00 e € 2.496,00;
No caso dos 6.ºs Requerentes, € 28.350,00 e € 3.104,00;
No caso dos 7.ºs Requerentes, € 16.750,00 e € 2.176,00;
No caso dos 8.ºs Requerentes, € 26.750,00 e € 2.976,00;
No caso dos 9.ºs Requerentes, € 26.210,00 e € 2.932,00;
No caso dos 10.ºs Requerentes, € 15.150,00 e € 2.058,00.
(vii) Nessas escrituras ficou referido que “a fracção adquirida no presente acto se destina a habitação secundária, e que a mesma é objecto de contrato de exploração turística, conforme contrato de gestão e exploração particular, assinado na presente data.”, contratos esses que foram efectivamente celebrados entre os Requerentes e as sociedades T, S.A. e T, S.A. tendo estas sociedades feito a respectiva exploração turística dos imóveis adquiridos, os quais continuam, nestes termos, disponíveis para utilização dos hóspedes do Aldeamento Turístico S.
(viii) Por despacho do Secretário de Estado do Turismo, de 23 de Setembro de 2002, publicado por Aviso do Ministério da Economia, Direcção-Geral do Turismo, Comissão de Utilidade Turística, Sector de Utilidade Turística, no Diário da República – III Série, de 24 de Outubro de 2002, “foi atribuída utilidade turística, a título prévio, a um conjunto turístico […] na …, freguesia do …, concelho de …, distrito de Lisboa”, sendo que pelo Despacho n.º 29671/2007, do Secretário de Estado do Turismo, publicado no Diário da República, 2.ª Série – n.º 248, de 26 de Dezembro de 2007, foi prorrogada por três anos a validade da utilidade turística prévia ao Conjunto Turístico S.
(ix) Em face da atribuição de utilidade turística ao empreendimento em causa, e à possibilidade de aplicação dos benefícios fiscais decorrentes deste regime, os Requerentes pediram a revisão oficiosa das liquidações de IMT e de IS.
(x) Sendo que, nas datas que a seguir se indicam, foram proferidos os despachos referentes a estes pedidos de revisão oficiosa das liquidações, com o seguinte conteúdo “Fica por este meio notificado(a) de que o pedido de reembolso acima identificado foi DEFERIDO”:
No caso dos 1.ºs Requerentes, em 12 de Julho de 2012;
No caso dos 2.ºs Requerentes, em 14 de Agosto de 2012;
No caso do 3.º Requerente, em 17 de Agosto de 2012;
No caso do 4.º Requerente, em 14 de Agosto de 2012;
No caso do 5.º Requerente, em 22 de Agosto de 2012;
No caso dos 6.ºs Requerentes, em 22 de Agosto de 2012;
No caso dos 7.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
No caso dos 8.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
No caso dos 9.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
No caso dos 10.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012.
(xi) O que deu lugar à restituição dos montantes pagos pelos Requerentes a título de IMT.
(xii) Não tendo, porém, sido restituídos os valores que haviam sido pagos a título de IS.
(xiii) Em 17 de Abril de 013, os Requerentes foram notificados da revogação das decisões de deferimento referidas no item (x) supra,
(xiv) De acordo com o artigo 30º do requerimento inicial, a revogação das decisões de deferimento funda-se numa diferente interpretação da Direcção de Serviços de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, do Imposto do Selo, dos Impostos Rodoviários e das Contribuições Especiais que entende ser de restringir a aplicação do benefício fiscal de IMT/IS apenas às aquisições de imóveis com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, excluindo as transmissões de fracções autónomas integradas em empreendimentos já instalados.
(xv) Assim, o Chefe do Serviço de Finanças de ..., depois de deferir os pedidos de revisão oficiosa de liquidações de IMT e de IS apresentados pelos Requerentes, vem revogar a sua decisão, com fundamento no “entendimento invariavelmente firmado pela Direcção de Serviços do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis”, segundo o qual “da hermenêutica literal do artº 20º do D.L. nº 423/83 de 05/12, resulta a aplicação do benefício de isenção de IMT/IS apenas às aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio”, excluindo, portanto, a sua aplicação às transmissões onerosas de fracções autónomas integradas em empreendimentos qualificados de utilidade turística já instalados, que não sejam objecto de obras de remodelação, beneficiação, reequipamento ou ampliação e, ainda à que se destinarem a habitação”.
(xvi) Mais se referindo nesse despacho que “Consequentemente, a aquisição onerosa da fracção autónoma por parte do requerente, por não se destinar à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística nos termos supra expostos, é insusceptível de obter o reconhecimento do benefício da isenção de IMT e consequente restituição do valor de IMT pago, por manifesta inverificação dos respectivos pressupostos legais, sendo o respectivo contrato de exploração turística tributariamente inconsequente para efeitos de reconhecimento de isenção de IMT prevista no artº 20º do D.L. nº 423/83, de 5/12”.
(xvii) O referido Chefe do Serviço de Finanças justificou a faculdade revogatória com base do disposto no n.º 4 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e no artigo 141.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).
(xviii) Depois de terem exercido o seu direito de audição prévia relativamente a este despacho do Chefe do Serviço de Finanças de ..., os Requerentes foram notificados, por ofício de 22 de Julho de 2013, da demonstração da liquidação definitiva, nos termos do n.º 9 do artigo 36.º do CIMT, sendo nele referido que “nada foi alterado ou acrescentado aos elementos invocados no Despacho de revogação” e que, por consequência, os Requerentes. se consideravam notificados para, no prazo de trinta dias contados da data da assinatura do aviso de recepção, procederem ao pagamento do IMT devido, explicando que o pretendido é a reposição do imposto restituído indevidamente, não se tratando de uma liquidação adicional ou de uma nova liquidação: “Não estamos a liquidar o tributo pela aquisição da fracção autónoma, essa liquidação já foi efectuada em 2008, antes da realização da escritura, deverá é ser reposto o valor restituído indevidamente, em consequência da revogação do despacho da revogação do despacho datado de […]”.
9. Em face dos factos apresentados pelos Requerentes, vieram estes solicitar a anulação dos despachos de revogação e as ordens de pagamento consequentes, com os seguintes fundamentos:
(i) Ilegalidade da revogação dos actos revogatórios
(ii) Extemporaneidade da Revogação,
(iii) Falta de fundamentação do despacho de revogação;
(iv) Do Direito à isenção.
10. Assim, é entendimento dos Requerentes que a revogação dos despachos de deferimento dos pedidos de revisão oficiosa de liquidações de IMT, viola expressamente o disposto no artigo 139º nº 1 al. c) do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
11. Sustentam os Requerentes que a AT ao deferir os pedidos de revisão oficiosa apresentados pelos Requerentes, extinguiu a obrigação de pagamento do imposto, eliminando-os, dessa forma, da sua esfera jurídica e destruindo-os os seus efeitos “ab initio”, com a consequente restituição dos impostos pagos.
12. Dessa forma, não sendo os actos de liquidação válidos, os actos revogatórios adquiriram, nos termos do artigo 145º nº 2 do CPA, eficácia retroactiva plena, pelo que tendo sido destruídos os efeitos jurídicos dos actos de liquidação, já não existem efeitos susceptíveis de ser alvo de extinção por um qualquer acto revogatório.
13. Os despachos de deferimento são, pois, na opinião dos Requerentes insusceptíveis de revogação, pelo que os respectivos despachos de revogação devem ser anulados.
14. Quanto à extemporaneidade da revogação sustentam os Requerentes que, não se aplicando o disposto no artigo 141º do CPA, a revogação sempre seria extemporânea, por não ter sido executada dentro do prazo previsto no artigo 79º da Lei Geral Tributária, ou seja, dentro do prazo de quatro anos após a revisão da liquidação.
15. Em terceiro lugar, os Requerentes defendem no seu pedido de anulação da revogação do despacho de deferimento que este acto não está devidamente fundamentado, por não conter as razões de facto que o sustentam, pois a AT, depois de num primeiro momento ter considerado que estavam verificados os pressupostos de isenção previstos no artigo 20º do DL 423/83, veio, num segundo momento, considerar, sem que tivesse ocorrido qualquer alteração da situação de facto, que esses pressupostos já não se verificavam.
16. Limitando-se, dessa forma, à invocação de uma interpretação alternativa sobre a norma aplicável.
17. Entendem os Requerentes que, tendo, com a revogação dos despachos de deferimento, sido dada uma resposta contrária ao seu interesse, este acto de revogação estava sujeito ao dever de fundamentação, fundamentação essa que estava sujeita aos requisitos elencados no artigo 125º do CPA.
18. Ora, na opinião dos Requerentes a fundamentação constante do acto ou actos de revogação em causa é manifestamente insuficiente, pois limita-se a remeter para uma diferente interpretação das normas legais, sem “explicitação da subsunção operada e sem especificação do preenchimento dos respectivos pressupostos de facto.”, violando, de forma evidente, o dever legal e constitucional de fundamentação, devendo, por isso, ser anulados.
19. Por fim, consideram ainda os Requerentes que tinham direito à isenção prevista no artigo 20º do DL 423/83, ou seja, direito à isenção de IMT e à redução de IS na aquisição das fracções já acima identificadas.
20. O despacho de revogação proferido pela AT refere que, quer a hermenêutica literal quer a teleológica daquela norma, apontam para a exclusão da aplicação do benefício aos casos em que os imóveis já estejam instalados e não sejam objecto de remodelação, beneficiação, reequipamento ou ampliação, atendendo à expressão “destino à instalação de empreendimentos” e tendo como objectivo “fomento da melhoria qualitativa de novos empreendimentos turísticos de acordo com padrões da realidade turística portuguesa.”
21. Entendem os Requerentes que não devem colher estes argumentos deduzidos pela AT, fundamentalmente porque, para este efeito, a fase de instalação de um empreendimento turístico só termina quando se possa iniciar a sua exploração e funcionamento, i.e., quando o imóvel esteja apto à exploração turística, o que só acontece no momento em que a fracção é entregue para exploração turística.
22. Assim sendo, os Requerentes sustentam que a aquisição da fracção (unidade de alojamento) pelos ora Requerentes deve constituir o momento relevante para a determinação da regra constante do artigo 20º do DL 423/83, porque esse foi o momento em que essas unidades de alojamento ficaram aptas a desenvolver a finalidade para a qual foram construídas, ou seja, para a exploração turística.
23. Na sua contestação, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), vem considerar que os actos de liquidação de IMT impugnados no pedido apresentado pelos Requerentes foram praticados conforme a lei, e que devem ser mantidos.
24. A AT sustenta a sua posição com os seguintes argumentos:
(i) O acto do Chefe de Serviço de Finanças, na parte em que revoga o reconhecimento da isenção conferida aos Requerentes, não é autonomanente impugnável, por se configurar como um acto meramente preparatório das liquidações impugnadas;
(ii) Assim, tratando-se de um acto preparatório e tendo natureza meramente provisória, não alteram “a se” a esfera jurídica dos contribuintes, carecendo, dessa forma, de efeitos lesivos na esfera destes;
(iii) Sendo os benefícios fiscais previstos no artigo 20º do DL 423/83 de natureza automática, as liquidações impugnadas no presente pedido de pronúncia arbitral não tinham de assentar em qualquer revogação de benefícios fiscais anteriormente concedida que fosse automaticamente impugnável;
(iv) Caso contrário, o Tribunal Arbitral não teria, por força do estipulado no artigo 2º do RJAT, competência para apreciar a legalidade da concessão ou revogação do benefício fiscal, sob pena de violação do princípio constitucional de Estado de Direito e da Separação de Poderes, consagrado nos artigos 2º e 111º da Constituição da Republica Portuguesa (CRP) e do princípio da legalidade previsto nos artigos 3º nº 2 e 266º nº 2 da CRP, enquanto corolário da indisponibilidade dos créditos tributários do artigo 30º nº 2 da LGT e que vinculam o legislador e toda a actividade da AT;
(v) O facto de ter sido revogada a liquidação não faz caso julgado, porque a AT tem o direito de reapreciar, ainda que com os mesmos fundamentos, dentro do prazo de caducidade, os pressupostos da liquidação de imposto;
(vi) Entende a AT que pode, desde que se respeite as formalidades procedimentais exigidas aplicáveis, alterar até à decisão final a interpretação e a qualificação dos factos tributáveis, podendo essa alteração ocorrer mesmo após a conclusão do procedimento tributário, tendo apenas como limite temporal, o prazo de caducidade do direito à liquidação;
(vii) Tal significa que, no âmbito de uma reclamação graciosa que tenha sido objecto de deferimento, e dentro do prazo de caducidade, a AT pode liquidar o imposto devido ainda que essa decisão seja incompatível com a decisão proferida em sede dessa reclamação;
(viii) Por identidade de razão, entende a AT, que o mesmo entendimento deve ser prosseguido no caso de revisão oficiosa da liquidação a pedido do contribuinte, porque este pedido deve, materialmente, entender-se como uma verdadeira reclamação graciosa, ainda que com carácter extraordinário;
(ix) Fosse outro o entendimento, estar-se-ia, na opinião da AT, a admitir que esta ficasse irremediável e definitivamente vinculada a um acto contrário à lei, praticado por um subalterno, sem possibilidade de repor administrativamente a legalidade do mesmo, independentemente da maior ou menos dimensão das suas consequências financeiras;
(x) Esta tese da AT veio, no seu entendimento, a ser sufragada no Acórdão do STA de 02/10/2002, proferido no processo nº 01091/02, que considerou que no quadro actual do artigo 45º da LGT não é requisito da liquidação adicional a ocorrência de factos novos não considerados na liquidação anterior, bastando, para tal, uma nova qualificação jurídica dos mesmos factos;
(xi) Segundo a AT, este entendimento do STA, a propósito da liquidação adicional, afigura-se inteiramente transponível para o caso dos presentes autos onde se questiona, em substância, os pressupostos dos actos de liquidação de IMT objecto de impugnação;
(xii) Pelo que a questão a considerar nos presentes autos deverá cingir-se às liquidações de IMT devidas, ex novo, pelas aquisições efectuadas pelos Requerentes dos imóveis acima identificados;
(xiii) Quanto à legalidade das liquidações de IMT, entende a AT, em síntese, que os benefícios fiscais previstos no artigo 20º, nº 1, do DL 423/83 só poderiam ser atribuídos aos Requerentes se as fracções por eles adquiridas se tivessem “destinado à instalação de empreendimento turístico”.
(xiv) A AT considera que, nos casos em apreço, os Requerentes se limitaram a adquirir fracções autónomas integradas num empreendimento turístico, pelo que tal aquisição não se destina a nenhuma instalação desse empreendimento turístico, até porque essas fracções não são a mesma realidade que o “Aldeamento Turístico S”, sobre o qual recaiu o despacho de atribuição de utilidade turística proferido pelo Secretário de Estado do Turismo.
(xv) Sustenta a AT que o legislador fiscal, ao estabelecer expressamente como pressuposto da isenção de IMT e IS prevista no nº 1, do art. 20º do DL 423/83, que as transmissões onerosas de imóveis urbanos se destinassem à instalação de empreendimentos turísticos, teve em vista beneficiar o esforço de investimento de empresas proprietárias que instalem estabelecimentos turísticos de qualidade, no âmbito de uma política de fomento e incentivo ao investimento no sector do turismo, e não a quem se limitaria a vender fracções pertencentes a empreendimentos já instalados.
(xvi) Por fim, refere a AT que este entendimento tem sido sufragado pelo STA em diversas decisões, como, por exemplo, os Acórdãos de 23/01/2013, proferidos nos recursos nºs 969/12, 1001/12 e 1005/12; de 30/01/2013, recursos nºs 971/12, 972/12, 999/12, 1003/12 e 1193/12; de 06/02/2013, recursos nºs 1000/12 e 1168/12; de 17/04/2013, recursos nºs 1023/12, 1070/12 e 1002/12, e de 30/04/2013, recurso nº 973/12.
(xvii) Transcrevendo, de seguida, parte do Acordão proferido no primeiro dos referidos processos (968/12)
(xviii) Concluindo, desta forma, que as liquidações objecto de impugnação assentam numa correcta interpretação da norma de isenção do nº 1 do artigo 20º do DL 423/83, não sendo de acolher os argumentos invocados pelos Requerentes no alegado direito à isenção de IMT e redução do IS.
(xix) Devendo, em conformidade, ser mantidas essas liquidações.
25. Notificadas para o efeito no decurso da reunião a que se refere o artigo 18º do RJAT, Requerentes e Requerida apresentaram, por escrito, as suas alegações.
26. Nas suas alegações os Requerentes mantiveram os argumentos já deduzidos no seu requerimento inicial e rebateram os argumentos suscitados pela AT na sua contestação, tendo, em defesa dos seus pedidos, apresentado as seguintes conclusões:
(i) O deferimento dos pedidos de Revisão Oficiosa das Liquidações de IMT e IS consubstancia um acto de revogação das referidas liquidações, determinando a sua anulação.
(ii) A anulação das Liquidações de IMT e IS tem eficácia retroactiva.
(iii) A anulação das Liquidações de IMT e IS foi praticada pela autoridade fiscal competente em razão da matéria.
(iv) Assim, nos termos do disposto nos artigos 139.º, n.º 1, alínea c) do CPA e do artigo 60.º do CPPT, a anulação das Liquidações de IMT e IS são actos definitivos quanto à fixação dos direitos dos contribuintes, sem prejuízo da sua eventual revisão ou impugnação nos termos da lei.
(v) A anulação de uma liquidação determina a perda dos seus efeitos, por essa razão a sua revisão não é possível.
(vi) Neste enquadramento, é ilegal a revogação da decisão de deferimento dos pedidos de Revisão Oficiosa das Liquidações de IMT e IS, nos termos do disposto no artigo 139.º, n.º 1, alínea c) do CPA, e a emissão de novas liquidações, nos termos do disposto no artigo 60.º do CPPT.
(vii) A revogação do acto de anulação da liquidação produz efeitos sobre a liquidação, pelo que o prazo para a revisão se deve contar desde a data da liquidação.
(viii) Assim, a revogação do acto de anulação das liquidações sempre seria extemporânea, por não ter sido realizada no prazo definido no artigo 79.º da LGT, i.e., prazo de quatro anos para a revisão da liquidação.
(ix) A fundamentação deduzida nos despachos de revogação da decisão de anulação, é insuficiente, na medida em que não indica as razões de facto que estiveram na base da decisão.
(x) O referido despacho apenas remete para uma diferente interpretação das mesmas normas legais, sem explicitação da subsunção operada e sem especificação do preenchimento dos respectivos pressupostos de facto.
(xi) As decisões de revogação em causa enfermam de vício de forma, por falta de fundamentação.
(xii) Por violação dos termos das alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 123.º do CPA, as decisões de revogação em causa são omissas relativamente a elementos que lhe seriam essenciais, pelo que, nos termos artigo 135.º do mesmo diploma legal, as decisões são anuláveis.
(xiii) A isenção em causa refere-se a imóveis que se destinam à instalação de empreendimentos turísticos;
(xiv) As fracções autónomas adquiridas pelos REQUERENTES constituem unidades de alojamento de um Aldeamento Turístico, em regime de propriedade plural;
(xv) A exploração turística apenas é possível a partir do momento em que a unidade esteja plenamente instalada, i.e., após a sua venda e a celebração do contrato de exploração;
(xvi) Então, a isenção é aplicável a todos as fracções autónomas que constituam uma unidade de alojamento integrada num Aldeamento Turístico que sejam adquiridas e, dessa forma, se tornem aptas à exploração turística.
27. Também as alegações deduzidas pela AT mantiveram os argumentos que já tinham sido anteriormente invocados, tendo, em defesa desses argumentos apresentado as seguintes conclusões:
(i) “O objecto do presente pedido de pronúncia arbitral é a declaração de ilegalidade e consequente anulação, de um conjunto de liquidações de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT).
(ii) Os actos de liquidação de IMT impugnados no presente pedido de pronúncia arbitral foram praticados conforme a lei e devem ser mantidos.
(iii) O acto do Chefe do Serviço de Finanças não é autonomamente impugnável na parte em que revoga o reconhecimento anteriormente efectuado aos Requerentes, da isenção prevista no art. 20º do Decreto-Lei 423/83, de 05 de Dezembro, por se configurar como um acto interno meramente preparatório das liquidações impugnadas.
(iv) Com efeito, o benefício fiscal previsto no nº 1, do art. 20º do DL 423/83, de 05 de Dezembro, tem natureza automática, não estando dependente de qualquer acto administrativo de reconhecimento.
(v) Pelo que as liquidações impugnadas no presente pedido de pronúncia arbitral não teriam de assentar em qualquer revogação de benefícios fiscais anteriormente concedida que fosse autonomamente impugnável.
(vi) Se assim fosse, não seria o Tribunal Arbitral competente para apreciar a legalidade da concessão ou revogação do benefício fiscal, por força do estipulado no art. 2º do R.J.A.T., sob pena de violação do princípio constitucional de Estado de Direito e da Separação de Poderes, consagrado nos arts. 2º e 111º da Constituição da República (R.C.P.), bem como do princípio da legalidade, cfr. arts. 3º, nº 2, e 266º, nº 2, também da C.R.P., enquanto corolário da indisponibilidade dos créditos tributários do art. 30º, nº 2, da Lei Geral Tributaria (L.G.T.), que vinculam o legislador e toda a actividade da AT.
(vii) Por outro lado, o facto de ter sido revogada a liquidação não faz caso resolvido.
(viii) Na verdade, a AT tem o direito de reapreciar, ainda que com os mesmos fundamentos, os pressupostos da liquidação de imposto dentro do período de caducidade.
(ix) Essa interpretação e qualificação dos factos tributários poderão inclusivamente ser alteradas após a conclusão do procedimento tributário, desde que observado o prazo de caducidade do direito de liquidação.
(x) De outro modo, aliás, não teria sentido, por não necessária, a norma do art. 64º, nº 1, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (R.C.P.I.T., a aprovado pelo art. 1º do Decreto-lei nº 416/98, de 31 de Dezembro), que declara os sujeitos passivos ou outros obrigados tributários poderem, por razões de certeza e segurança, solicitar ao director - geral dos Impostos que sancionem as conclusões do relatório de inspecção.
(xi) “A contrario”, resulta, assim, dessa disposição legal que, na ausência de sancionamento do Director-Geral dos Impostos ou actualmente do Director-Geral da A.T., as conclusões do relatório de inspecção não vinculam futuras actuações da administração tributária.
(xii) Essa doutrina seria confirmada no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 02/10/2002, proferido no processo nº 01091/02, a propósito da liquidação adicional, que se afigura inteiramente transponível para o caso dos presentes autos em que o que se questiona, em substância, são os pressupostos dos actos de liquidação de IMT sob impugnação.
(xiii) A decisão de reclamação graciosa não prejudicaria, assim, o direito de liquidar adicionalmente o imposto, se estiverem preenchidos, como é o caso, os respectivos requisitos legais.
(xiv) Tal entendimento a propósito da liquidação adicional subsequente à decisão de reclamação adicional é inteiramente transponível para a revisão oficiosa da liquidação, configurável do ponto de vista material, como uma reclamação graciosa extraordinária.
(xv) Constituindo o objecto do presente de pedido arbitral as liquidações de IMT devidas pela aquisição dos imóveis em 2008 e 2009, relevará apenas o prazo de caducidade de liquidação do imposto previsto no art. 35º do C.I.M.T., dado as primitivas liquidações terem sido anuladas, ainda que erroneamente, e deixarem de existir ipso facto na esfera jurídica dos contribuintes.
(xvi) Tal entendimento não põe em causa o prazo de quatro anos para a revisão dos actos tributários constante do nº 1 do art. 78º da L.G.T., sob pena de se entender que este prazo prevalece sobre o prazo de caducidade da liquidação de imposto previsto no CIMT.
(xvii) Na verdade, a Administração Tributária está constitucionalmente sujeita em toda a sua actividade aos princípios da legalidade, da justiça, da igualdade e da imparcialidade, nos termos do art. 266º, nº 2 da C.R.P., não podendo eximir-se a liquidar os impostos quando se mostram verificados os respectivos pressupostos de tributação ou a promover as competentes liquidações adicionais quando as liquidações anteriores tenham sido feitas com base em erro de facto ou de direito de que resulte prejuízo para o Estado.
(xviii) É entendimento da administração fiscal que os benefícios fiscais previstos no art. 20°, nº 1, do DL nº 423/83, de 5 de Dezembro, só poderão ser atribuídos aos Requerentes se as fracções por eles adquiridas se destinarem à instalação do empreendimento turístico, o que não é manifestamente o caso dos presentes autos, como resulta da prova carreada.
(xix) As liquidações ora impugnadas assentam numa correcta interpretação e aplicação da norma de isenção nº 1, do art. 20º do DL 423/83, não colhendo os argumentos aduzidos pelos Requerentes no alegado direito à isenção de IMT e redução de IS.
(xx) Aliás, a interpretação da Administração Tributária viria a ser acolhida pelo Supremo Tribunal Administrativo, firmando-se como orientação jurisprudencial consolidada, citando-se, por todos e em conclusão, o Acórdão de 23/01/2013, proferido em julgamento ampliado, nos termos do art. 148º do C.P.T.A., no processo nº 968/12, e que deu origem ao Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 3/2013, publicado no D.R., 1ª S., nº 44, de 04/03/2013.”
II – FACTOS PROVADOS
1. Os 1.ºs, 4.º., 6.ºs, 7.ºs, 8.ºs e 10.ºs Requerentes. celebraram com a R, S.A., pessoa colectiva ..., um Contrato Promessa de Compra e Venda respeitante aos seguintes imóveis, devidamente mobilados e equipados de acordo com uma unidade de cinco estrelas, na seguinte data:
No caso dos 1.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 26 de Dezembro de 2003;
No caso do 4.º Requerente, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 24 de Maio de 2004;
No caso dos 6.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 17 de Julho de 2006;
No caso dos 7.ºs Requerentes, uma unidade independente designada por …, na data de 27 de Abril de 2006;
No caso dos 8.ºs Requerentes, uma unidade independente designada por …, na data de 30 de Outubro de 2006;
No caso dos 10.ºs Requerentes, uma unidade independente, a construir, designada por …, na data de 8 de Junho de 2004.
2. Posteriormente, todos os Requerentes celebraram com a T, S.A., pessoa colectiva ... (e anteriormente denominada R, S.A.), um Contrato de Compra e Venda respeitante a uma fracção autónoma do empreendimento turístico em causa, nas seguintes datas:
No caso dos 1.ºs Requerentes, em 11 de Dezembro de 2008;
No caso dos 2.ºs Requerentes, em 13 de Fevereiro de 2009;
No caso do 3.º Requerente, em 1 de Julho de 2008;
No caso do 4.º Requerente, em 1 de Julho de 2008;
No caso do 5.º Requerente, em 19 de Dezembro de 2008;
No caso dos 6.ºs Requerentes, 19 de Dezembro de 2008;
No caso dos 7.ºs Requerentes, em 25 de Novembro de 2008;
No caso dos 8.ºs Requerentes, em 17 de Outubro de 2008;
No caso dos 9.ºs Requerentes, em 11 de Dezembro de 2008;
No caso dos 10.ºs Requerentes, em 17 de Outubro de 2008.
3. Antes da celebração destas escrituras, os Requerentes liquidaram e pagaram IMT e IS, nos seguintes valores:
No caso dos 1.ºs Requerentes, € 33.000,00 e € 3.520,00;
No caso dos 2.ºs Requerentes, € 25.688,00 e € 2.912,00;
No caso do 3.º Requerente, € 12.270,00 e € 1.837,60;
No caso do 4.º Requerente, € 12.478,00 e € 1834,24;
No caso do 5.º Requerente, € 20.750,00 e € 2.496,00;
No caso dos 6.ºs Requerentes, € 28.350,00 e € 3.104,00;
No caso dos 7.ºs Requerentes, € 16.750,00 e € 2.176,00;
No caso dos 8.ºs Requerentes, € 26.750,00 e € 2.976,00;
No caso dos 9.ºs Requerentes, € 26.210,00 e € 2.932,00;
No caso dos 10.ºs Requerentes, € 15.150,00 e € 2.058,00.
4. Nessas escrituras ficou referido que “a fracção adquirida no presente acto se destina a habitação secundária, e que a mesma é objecto de contrato de exploração turística, conforme contrato de gestão e exploração particular, assinado na presente data.”, contratos esses que foram efectivamente celebrados entre os Requerentes e as sociedades T e U, S.A. e V, S.A. tendo estas sociedades feito a respectiva exploração turística dos imóveis adquiridos, os quais continuam, nestes termos, disponíveis para utilização dos hóspedes do Aldeamento Turístico S.
5. Por despacho do Secretário de Estado do Turismo, de 23 de Setembro de 2002, publicado por Aviso do Ministério da Economia, Direcção-Geral do Turismo, Comissão de Utilidade Turística, Sector de Utilidade Turística, no Diário da República – III Série, de 24 de Outubro de 2002, “foi atribuída utilidade turística, a título prévio, a um conjunto turístico […] na Quinta da Ribeira, freguesia do Turcifal, concelho de ..., distrito de Lisboa”.
6. Posteriormente, pelo Despacho n.º 29671/2007, do Secretário de Estado do Turismo, publicado no Diário da República, 2.ª Série – n.º 248, de 26 de Dezembro de 2007, foi prorrogada por três anos a validade da utilidade turística prévia atribuída ao Conjunto Turístico S.
7. Em face da atribuição de utilidade turística ao empreendimento em causa, e à possibilidade de aplicação dos benefícios fiscais previstos no DL 423/83, os Requerentes pediram a revisão oficiosa das liquidações de IMT e de IS.
8. Nas datas que a seguir se indicam, foram proferidos pelo Director do Serviço de Finanças de ..., o qual tinha competência funcional para o efeito, os despachos referentes a estes pedidos de revisão oficiosa das liquidações, com o seguinte conteúdo “Fica por este meio notificado(a) de que o pedido de reembolso acima identificado foi DEFERIDO”:
No caso dos 1.ºs Requerentes, em 12 de Julho de 2012;
No caso dos 2.ºs Requerentes, em 14 de Agosto de 2012;
No caso do 3.º Requerente, em 17 de Agosto de 2012;
No caso do 4.º Requerente, em 14 de Agosto de 2012;
No caso do 5.º Requerente, em 22 de Agosto de 2012;
No caso dos 6.ºs Requerentes, em 22 de Agosto de 2012;
No caso dos 7.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
No caso dos 8.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
No caso dos 9.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012;
o caso dos 10.ºs Requerentes, em 31 de Outubro de 2012.
9. Estes despachos de deferimento deram lugar à restituição dos montantes pagos pelos Requerentes a título de IMT, não tendo, porém, sido restituídos os valores que haviam sido pagos a título de IS.
10. Em 17 de Abril de 013, os Requerentes foram notificados da revogação das decisões de deferimento referidas no ponto 8, revogação essa fundada numa diferente interpretação da Direcção de Serviços de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, do Imposto do Selo, dos Impostos Rodoviários e das Contribuições Especiais que entendeu ser de restringir a aplicação do benefício fiscal de IMT/IS apenas às aquisições de imóveis com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, excluindo as transmissões de fracções autónomas integradas em empreendimentos já instalados.
11. Os Requerentes exerceram o seu direito de audição prévia relativamente a este despacho do Chefe do Serviço de Finanças de ....
12. Por ofício de 22 de Julho de 2013, os Requerentes foram notificados da demonstração da liquidação definitiva, nos termos do n.º 9 do artigo 36.º do CIMT, sendo nela referido que “nada foi alterado ou acrescentado aos elementos invocados no Despacho de revogação” e que, por consequência, os Requerentes. se consideravam notificados para, no prazo de trinta dias contados da data da assinatura do aviso de recepção, procederem ao pagamento do IMT devido.
Cumpre, agora, apreciar e decidir.
III – DECISÃO
1. Conforme referido no ponto I.3 supra, os Requerentes na sua petição inicial solicitaram a declaração de ilegalidade das ordens de pagamento constantes dos ofícios nºs ... e ..., de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº 546 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e 5540 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, proferidos pelo Director do Serviço de Finanças de ...(no âmbito da sua competência funcional) e Despachos de Revogação das Decisões de Deferimento dos Pedidos de Revisão Oficiosa que estiveram na origem dos referidos ofícios.
Este pedido está sustentado com os seguintes argumentos:
(i) Ilegalidade da revogação de actos revogatórios
(ii) Extemporaneidade da revogação
(iii) Falta de fundamentação do despacho de revogação
(iv) Direito aos benefícios fiscais previstos no artigo 20º do DL 423/83 – isenção de IMT e redução de IS.
2. Analisemos, pois, pela ordem indicada, os argumentos apresentados pelos Requerentes.
2.1.Da Ilegalidade da revogação dos actos revogatórios
Na sua argumentação sustentam os Requerentes que a AT, ao deferir os pedidos de revisão oficiosa da liquidação por eles apresentados, anulou, de forma definitiva, as liquidações de IMT e de IS, por invalidade, na medida em que vem expressamente reconhecer, com esse deferimento, não terem sido considerados os benefícios previstos no artigo 20º do DL 423/83 de 5 de Dezembro.
Assim sendo, a AT extinguiu a obrigação de pagamento dos referidos impostos, eliminando-os da esfera jurídica dos Requerentes, destruindo, “ab initio”, os seus efeitos e, por conseguinte, ordenando a restituição integral do IMT e parcial (4/5) do IS.
Atendendo à invalidade dos actos de liquidação, entendem os Requerentes que os actos que os revogaram adquiriram, nos termos do artigo 145º nº 2 do CPA, eficácia retroactiva plena.
Assim sendo, tendo sido destruídos os efeitos jurídicos dos actos de liquidação de IMT e de IS através de uma decisão da própria AT (ao deferir os pedidos de revisão oficiosa) deixaram de se verificar os efeitos jurídicos susceptíveis de vir a ser alvo de extinção por força do acto revogatório.
Nestes termos, os despachos de deferimento dos pedidos de revisão oficiosa são insusceptíveis de revogação.
Os Requerentes sustentam esta tese no que vem disposto nos artigos 145º nº 2 e 139º nº 1 alínea c) do CPA.
Dispõem estes artigos:
Artigo 145º nº 2 – “A revogação tem feito retroactivo, quando se fundamente na invalidade do acto revogado”
Artigo 139º nº 1 alínea c) – “Não são susceptíveis de revogação – Os actos revogados com eficácia retroactiva”.
A primeira questão a apreciar, em face desta argumentação, é a de determinar se o acto de deferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado pelos Requerentes tem como efeito a anulação das liquidações cuja revisão é solicitada, deixando estas de produzir efeitos “ab initio”, isto é, com efeitos retroactivos.
A este propósito há que apurar qual a fundamentação da AT para deferir os referidos pedidos.
O despacho de deferimento do Director do Serviço de Finanças foi produzido no pressuposto que estavam verificadas as condições que permitiam a aplicação dos benefícios fiscais previstos no DL 423/83, ou seja, que ao empreendimento em causa tinha sido atribuído o estatuto de utilidade turística e que as aquisições geradoras de imposto se destinavam à instalação desse empreendimento, pelo que as liquidações de IMT e de IS tinham sido ilegais.
Sendo ilegais, essas liquidações de IMT e de IS, eram, pois, manifestamente inválidas.
Assim, ao abrigo do artigo 145º nº 2 do CPA, deve considerar-se que a revogação do acto de liquidação produzida pelo despacho de deferimento tem efeito retroactivo, o que tem como consequência directa e imediata, a anulação dessas liquidações com a não produção de efeitos na esfera dos Requerentes.
Ou seja, como sustentam os Requerentes nas suas alegações, “As liquidações realizadas em 2008 perderam todos os seus efeitos no momento em que foi proferido o despacho sobre os pedidos de revisão oficiosa das Liquidações de IMT e IS, não podendo mais produzir efeitos.”
Considerando-se, desta forma, que os efeitos do acto revogado pela AT devem operar retroactivamente, ter-se-á que concluir, à semelhança do que vem defendido, quer na petição inicial, quer nas alegações, pelos Requerentes, que deve ser aplicável o regime previsto no já citado (e acima) transcrito artigo 139º nº 1 alínea c) do CPA.
Ou seja, pela insusceptibilidade de revogação do acto revogado pela AT.
E pela consequente ilegalidade do pedido de devolução do IMT reembolsado aos Requerentes com o despacho de deferimento dos pedidos de revisão oficiosa.
Conforme sustenta o Prof. Diogo Freitas do Amaral, no Volume II do seu Curso de Direito Administrativo (cf. páginas 436 e 437), “Existem casos em que a revogação não pode ter lugar, nem lógica, nem juridicamente, porque, pura e simplesmente, faltam os efeitos jurídicos a extinguir.”
Mais adiante, diz o citado Professor que “São fundamentalmente três os casos de impossibilidade de revogação:
1) ……….
2) Em segundo lugar, é impossível a revogação de actos cujos efeitos já tenham sido destruídos, seja através de anulação contenciosa, seja através de revogação anulatória (CPA, artigo 139º, nº 1, alíneas b) e c)).
Nestes casos, faltam também os efeitos jurídicos sobre os quais possam recair os efeitos do acto revogatório; e, assim, no caso de acto anteriormente anulado contenciosamente ou já extinto por revogação com eficácia ex tunc, também não há possibilidade de revogação.
3) ……………….”
Ora, conforme já se referiu, no caso em apreço, a revogação também é impossível, porque os efeitos dos actos revogados – liquidações de IMT e IS – já se extinguiram com o acto de deferimento dos pedidos de revisão oficiosa deduzidos pelos Requerentes.
Aceitar a possibilidade da emissão de uma nova liquidação com base no mesmo facto tributário que deu origem à liquidação revogada corresponderia, na prática, a possibilitar a revogação de actos revogatórios com eficácia retroactiva, o que, como vimos, é, nos termos do artigo 139º nº 1 c) do CPA, manifestamente impossível.
Em face do exposto, com fundamento na ilegalidade da revogação dos actos revogatórios, entende o Tribunal dar provimento ao pedido de anulação das das ordens de pagamento constantes dos ofícios nºs ... e ..., de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº 546 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e 5540 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, proferidos pelo Chefe de Serviço de Finanças de ...e Despachos de Revogação das Decisões de Deferimento dos Pedidos de Revisão Oficiosa que estiveram na origem dos referidos ofícios.
Desta forma, mostrando-se procedente o entendimento dos Requerentes quanto à questão da ilegalidade da revogação dos actos revogatórios, torna-se desnecessário verificar da procedência da alegação de outros vícios das liquidações ora impugnadas.
IV - CONCLUSÃO
Face ao exposto, com fundamento na ilegalidade da revogação dos actos revogatórios, entende o Tribunal dar provimento ao pedido de anulação das ordens de pagamento constantes dos ofícios nºs ... e ..., de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº ... de 22 de Julho de 2013, nº … de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e 5540 de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, nºs ... e ... de 22 de Julho de 2013, proferidos pelo Chefe de Serviço de Finanças de ...e Despachos de Revogação das Decisões de Deferimento dos Pedidos de Revisão Oficiosa que estiveram na origem dos referidos ofícios, condenando-se a AT a anular essas liquidações e a restituir o Imposto do Selo liquidado pelos Requerentes e nunca restituído pela AT, acrescido dos respectivos juros compensatórios desde a data do seu pagamento (19 de Dezembro de 2008).
Custas calculadas em conformidade com a Tabela I do regulamento de custas dos processos de arbitragem tributária em função do valor do pedido, a cabo da Requerida e que fixo em 4.284,00 (quatro mil duzentos e oitenta e quatro euros)
Notifique-se
Lisboa, 29 de Julho de 2014
OS ÁRBITROS
(Manuel Luis Macaista Malheiros)
(Carlos Lobo)
(João Marques Pinto)
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga, com excepção das transcrições efectuadas.