SUMÁRIO
Centrando-se a questão essencial a decidir em torno do conceito de ativos biológicos, face ao normativo contabilístico adotado International Accounting Standards (IAS), conclui-se que, por aplicação conjugada da IAS 41 e IAS 16, nas situações em que seja adotado o modelo de custo na mensuração dos ativos biológicos, o custo do ativo biológico será “o somatório de todos os custos necessários à sua aquisição e colocação em condições e no local pronto a ser usado”. Ou seja, poderão incluir-se custos, como o preço dos pés das videiras a ser implantados no terreno, o trabalho de preparação dos terrenos (não os de melhoramento de terrenos) e colocação desses pés, seja este trabalho subcontratado ou realizado por mão-de-obra da própria empresa, produtos para fertilização das plantas e outros bens e serviços indispensáveis à plantação das plantas (necessidade de uma relação direta dos custos com a colocação da planta no solo para produção), devendo, por exemplo, excluir-se direitos de plantação/produção (ativos intangíveis), muros e reparações de muros, custos de infraestruturas e equipamentos de apoio.
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
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A A..., S.A. (doravante “A...” ou “Requerente), sociedade anónima de direito português, titular do número de identificação de pessoa coletiva ..., com sede na Rua ..., n.º..., ...-... ..., com o capital social de € 83.617,09, entidade que sucedeu, para todos os efeitos legais, por fusão, da B...– SGPS, S.A., titular do número de identificação de pessoa coletiva..., doravante a Requerente, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, visando a declaração de ilegalidade do Despacho do Diretor de Serviços Central, ao abrigo da subdelegação de competências, de 20 de outubro de 2021, que indeferiu o Recurso Hierárquico deduzido do Despacho do Chefe da Divisão da Direção de Finanças do Porto, ao abrigo da subdelegação de competências, de 23 de outubro de 2017, que havia indeferido a Reclamação Graciosa do ato de liquidação adicional n.º 2014..., referente ao ano de 2010, na qual foi apurado um valor a pagar de € 628.383,98, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) no pagamento de indemnização por prestação indevida de garantia bancária.
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No dia 26-01-2022, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT (Autoridade Tributária e Aduaneira).
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Verificada a regularidade formal do pedido apresentado, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT a Requerente procedeu à nomeação como árbitro o Senhor Dr. Óscar Barros, a Requerida designou como árbitro o Senhor Dr. Henrique Fiúza, e na sequência do requerimento apresentado pelos árbitros designados pelas partes foi nomeada como Árbitro Presidente pelo Conselho Deontológico a Senhora Conselheira Maria Fernanda dos Santos Maçãs, que comunicaram a aceitação do cargo no prazo legalmente estipulado.
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Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o tribunal arbitral coletivo foi constituído no dia 17-05-2022, na sede do CAAD- Centro de Arbitragem Administrativa, sita na Av. Duque de Loulé. n.º 72-A, em Lisboa, conforme comunicação que se encontra junta aos presentes autos.
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No dia 22-06-2022, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação, sendo que no dia 23-06-2022 foi junto o processo administrativo.
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No dia 22-09-2022, teve lugar, na sede do CAAD, em Lisboa, uma reunião do tribunal arbitral constituída nos termos do RJAT, para inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente.
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Após inquirição das testemunhas arroladas pelo Requerente, o Tribunal notificou o Requerente e a Requerida para, por esta ordem e de modo sucessivo, apresentarem as suas alegações escritas no prazo de 15 dias, sendo que o prazo para Requerida contar-se-ia a partir da notificação da junção das alegações da Requerente ou do termo do prazo a esta concedido.
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Em alegações, as partes mantiveram as suas anteriores posições.
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Em face do facto de o prazo de seis meses para emitir a decisão arbitral, segundo o estatuído no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT, incluir períodos de férias judiciais e atenta a tramitação e a complexidade do processo, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, o tribunal arbitral prorrogou o prazo da arbitragem tendo designado o dia 17 de março de 2023 para efeito de prolação da decisão arbitral.
II – SANEAMENTO
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O tribunal arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º n.º 1 e alínea a), 5.º e 6.º n.º 2 alínea b), do RJAT.
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
A Requerida, na Resposta, suscitou a questão prévia quanto ao valor a causa.
§1. Valor da causa
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No pedido de constituição de tribunal arbitral e no pedido de pronúncia arbitral, a Requerente indicou como valor da utilidade económica do pedido e, portanto, como valor do processo, € 177.312,15. A este respeito, em resposta ao despacho de 24-06-2022, a Requerente retifica aquele valor, tendo referido que “o valor do imposto correspondente às correções impugnadas é de € 167.862,42 e não de € 177.312,15, como por lapso foi indicado na PI”,
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta na qual, alegou como questão prévia o seguinte: “o valor da presente ação arbitral deduzida no dia 2022-01-24, onde são contestadas as correções à matéria tributável mencionadas supra, determina-se de acordo com a alínea a), do artigo 97.º-A, do CPPT, devendo atender-se ao valor da liquidação que se encontra em dívida desde 2022-01-17, o qual se cifra em € 80.203,64, após as anulações determinadas pela AT”.
Em sede de contraditório sobre a questão prévia suscitada pela Requerida quanto ao valor da ação, refere a Requerente que [sic]: “1. Como refere a AT no ponto 13º da sua Resposta o disposto no artigo 97º-A, nº 1, alínea a) do CPPT estabelece que quando seja impugnada liquidação, o valor da causa corresponde à importância cuja anulação se pretende.
2. É também correto que o valor das correções à matéria coletável impugnadas é de € 581.620,57.
3. Assim sendo o valor da ação corresponderá ao valor do imposto relativo a essas correções à matéria coletável.
4. Sucede que, e ao contrário do que refere a AT o imposto (IRC) relativo às correções impugnadas não é de € 80.203,64.
5. Aliás, tanto quanto se percebe do referido na Contestação a AT também não alega que esse seja o valor do imposto correspondente às correções impugnadas, mas supostamente o “valor da liquidação em dívida, desde 2022-01-17”.
6. Contudo, e como já referido o valor da ação deve corresponder ao valor do IRC que se pretende anular, independentemente de o mesmo estar (total ou parcialmente) pago.
7. Sem prejuízo, sempre que dirá que não que a AT não demonstra que o valor em dívida é de e 80.203,64, já que não traz para o processo qualquer documento explicativo ou de prova.
8. Refira-se que como resulta do quadro infra o valor do imposto correspondente às correções impugnadas é de € 167.862,42 e não de € 177.312,15, como por lapso foi indicado na PI.
”
Como resulta do estatuído no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, o valor da causa é fixado no despacho saneador, salvo nos processos em que não haja lugar a despacho saneador, sendo então fixado na sentença.
Vejamos.
O artigo 296.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT – norma basilar no tangente à determinação do valor da causa em todas as situações às quais seja aplicável, direta ou subsidiariamente, a lei processual civil –, determina que a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido, sendo que, como decorre do artigo 299.º, n.º 1, do mesmo compêndio legal, na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta.
O artigo 31.º, n.º 1, do CPTA, aplicável ex vi artigo 29.º, alínea c), do RJAT, replica o vertido no citado n.º 1 do artigo 296.º do CPC, estatuindo-se no subsequente artigo 32.º que quando pela ação se pretenda obter o pagamento de quantia certa, é esse o valor da causa (n.º 1) e que quando pela ação se pretenda obter um benefício diverso do pagamento de uma quantia, o valor da causa é a quantia equivalente a esse benefício (n.º 2).
Por seu turno, o artigo 97.º-A, n.º 1, do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, estatuindo sobre o valor da causa, também apela (embora implicitamente) ao conceito de utilidade económica do pedido, a qual pode ser resultante da importância de imposto cuja anulação se pretende (alínea a)) ou do valor que poderá servir para determinar concretamente o montante de imposto a pagar (alíneas b) e c)).
Ora, como resulta do disposto no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor da causa é determinado nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário; temos, pois, que para efeitos de determinação do valor da causa do processo arbitral tributário o que releva são as normas de processo tributário atinentes a essa matéria, ou seja, o valor da causa é aqui determinado segundo os critérios vertidos no artigo 97.º-A do CPPT.
A fim de solucionar a questão da determinação do valor da causa no caso concreto, afigura-se que, em face da causa de pedir e do pedido densificado no pedido de pronúncia arbitral, é aplicável à situação sob análise a alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT.
De facto, nas situações em que a causa de pedir está alicerçada na alegada ilegalidade de uma liquidação, o valor da causa corresponderá, por direta aplicação da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, ao valor da liquidação ou ao valor da parte impugnada, conforme se peticione, respetivamente, a sua anulação total ou parcial.
Nesta conformidade, o que nuclearmente é pretendido com o presente pedido de pronúncia arbitral é que seja declarado que as aludidas correções são ilegais e, por consequência, que a situação tributária da Requerente seja alterada por força do impacto que a anulação dessas correções tem em sede de IRC que, dessa forma, se cifrará em valor superior ao reconhecido pela AT. Por isso, entendemos que a utilidade económica imediata é igual ao imposto (incluindo derrama municipal e derrama estadual) correspondente às correções impugnadas.
Nestes termos, no caso concreto, o valor da causa é determinado por aplicação da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, cifrando-se no montante de € 167.862,42.
O processo não enferma de nulidades.
Cumpre apreciar e decidir.
III – FUNDAMENTAÇÃO
A. DE FACTO
A.1. Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
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No exercício de 2010, os Serviços de Inspeção Tributária da AT (“SIT”) efetuaram correções na esfera da C..., S.A. (“C...”) e D..., S.A. (“D...”), as quais integravam o perímetro do RETGS (2010)[1].
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No âmbito de procedimento interno de inspeção credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI2013... à declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC do exercício de 2010 da sociedade C..., resultaram as seguintes correções aos valores declarados:
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Desconsideração dos gastos reconhecidos a título de depreciações e amortizações de ativos biológicos, alegadamente não dedutíveis para efeitos da determinação do resultado fiscal relativo ao período de 2010, no montante global de € 605.563,55; e,
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Desconsideração de benefícios fiscais por dedução à coleta (crédito de imposto), no montante de € 370.692,63.
Do relatório de inspeção tributária consta, além do mais, o seguinte:
(…)
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Ainda, no âmbito de procedimento interno de inspeção credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI2013..., à declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC do exercício de 2010, da sociedade D..., os SIT promoveram uma correção ao prejuízo fiscal declarado por gastos escriturados (considerados para efeitos fiscais) e alegadamente não dedutíveis para efeitos do apuramento do resultado fiscal, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, no montante de € 8.732,70.
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Do relatório de inspeção tributária consta, além do mais, o seguinte:
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Em resultado das sobreditas correções, os Serviços corrigiram o resultado fiscal (lucro tributável) apurado pelo Grupo fiscal tributado através do RETGS, tendo sido emitida a demonstração de liquidação adicional de IRC n.º 2014 ... e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2014 ... da qual resultou uma liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2010, no montante global €628.383,98 (incluindo juros moratório e compensatórios).
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Por não concordar com a argumentação da AT, a Requerente apresentou reclamação graciosa da liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2010, supra identificada, a qual deu execução às correções efetuadas no âmbito da ação de inspeção.
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A Requerente foi primeiramente notificada do projeto de indeferimento dessa reclamação, tendo exercido o correspondente direito de audição em 17 de março de 2016, com o objetivo de apresentar elementos que, alegadamente, visariam comprovar a ilegalidade da liquidação associada à correção referida em a. do artigo 2.º acima (ponto A.1.).
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Em 23 de outubro de 2017, a Requerente foi notificada do despacho do Chefe de Divisão da DF Porto, de indeferimento da referida reclamação graciosa, onde a AT manteve o entendimento/posição anteriormente apresentada.
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O suprarreferido Despacho foi posteriormente anulado e substituído pelo Despacho do Chefe de Divisão da DF do Porto, de 20 de novembro de 2017, por alegadamente o mesmo “não se encontrar devidamente acompanhado da integral fundamentação da decisão notificada”. Desse Despacho consta além do mais a seguinte Informação:
(…)
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Por não concordar com a decisão da AT referente ao indeferimento total da reclamação graciosa, a Requerente interpôs Recurso Hierárquico, o qual foi julgado improcedente por Despacho do Diretor de Serviço Central, de 20 de outubro de 2021, tendo sido mantida, no essencial, a mesma fundamentação do Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada pela Requerente.
Nesse Despacho a AT entendeu, em suma, o seguinte:
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No que se refere concretamente à correção referida em b. do parágrafo 2.º (ponto A.1.), a Requerente refere no que, face ao facto de tal matéria já ter sido apreciada no âmbito de outros procedimentos, nomeadamente no âmbito dos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquicos sob os números ...2011... e ...2012..., resulta que a pretensão da Requerente quanto a esta matéria já se encontra satisfeita.
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Assim, no presente pedido de constituição de tribunal arbitral coloca-se apenas em causa a legalidade do(s) ato(s) tributários (liquidação adicional), na parte em que resulta da correção do lucro tributável da sociedade C..., no montante de € 605.563,55, e na parte em que resulta a correção dos prejuízos fiscais da sociedade D..., no montante de € 8.732,70.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, à face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
O Tribunal não se pronunciou sobre o demais vertido nos articulados das partes por constituírem afirmações conclusivas e/ou juízos de direito – e que, por isso, não podem ser objeto de uma pronúncia em termos de “provado” ou “não provado” – ou por se tratar de factualidade irrelevante à boa decisão da causa.
A convicção do Tribunal fundou-se nos factos relevantes articulados pelas partes, cuja adesão à realidade não foi posta em causa e no acervo probatório documental carreado para os autos (incluindo o processo administrativo), o qual foi objeto de uma análise crítica e de adequada ponderação à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabilidade.
No tocante à prova testemunhal produzida, entende este Tribunal Arbitral que as mesmas, depuseram de forma objetiva e revelando conhecimento direto dos factos sobre os quais foram inquiridas, pelo que o seu depoimento nos mereceu credibilidade. No entanto, quanto ao essencial a decidir, os depoimentos limitaram-se a contextualizar a realidade factual e a corroborar o teor da documentação junta aos autos, bem como a tecer considerações de natureza teórica e técnica sobre o conceito de ativo biológico, que são irrelevantes para o julgamento deste Tribunal. Como melhor será analisado mais adiante, a questão central a decidir sobre a ilegalidade substantiva das correções, efetivadas pela Requerida, assenta na determinação do sentido e o alcance do conceito de ativo biológico em sede do normativo contabilístico aplicável ao caso concreto – International Accounting Standards (IAS), ou seja, sobre matéria de direito.
A posição de ambas as partes quanto às matérias em dissídio nos presentes autos, é como se segue:
A.1.1. Posição da Requerente
Como fundamento da sua pretensão, a Requerente alega que:
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a AT baseou a referida correção num mapa fiscal de depreciações e amortizações (Modelo 32) que, à data da realização do procedimento inspetivo, se encontrava errado por condicionalismos do próprio sistema informático, embora existissem fichas de imobilizado disponíveis, registos na contabilidade e outros elementos de apoio (documentação parcialmente junta com o PA).
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o mapa analisado pela AT encontrava-se a considerar, para além das depreciações dos ativos biológicos, as depreciações e amortizações de equipamentos, infraestruturas, maquinaria e ativos intangíveis (direitos), facto que terá esclarecido à AT no decurso daquele processo de inspeção tributária (Direito de Audição).
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até à revogação do POC, os ativos biológicos eram contabilizados indistintamente nas contas de “Terrenos e Recursos Naturais”, sem ser feita qualquer segregação entre os custos correspondentes ao ativo relativo às plantas e os custos relativos a outras infraestruturas e equipamentos, que de acordo com as regras da IAS 41 não deveriam integrar o custo do ativo biológico.
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muitas das vinhas que constam do ativo da C... têm mais de 40 anos, e muitas foram adquiridas como uma parte de uma Quinta, sendo certo que embora por vezes houvesse valorização autónoma da vinha, no momento da aquisição, não havia uma valorização autónoma da planta em si (videira), por ausência de obrigação legal em o fazer.
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em bom rigor o ativo biológico não é a vinha, mas sim a planta (videira), e que o custo de uma vinha não corresponde unicamente ao custo da videira, já que abrange um conjunto de ativos que vão para além da simples planta (videira).
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nesse pressuposto, face às limitações do sistema informático na segregação do ativo biológico daquilo que era o ativo intangível (direitos associados à vinha) e ativo fixo tangível como é o caso das infraestruturas e equipamentos de apoio, só aquando da apresentação da Reclamação Graciosa é que foi possível à Requerente apresentar um mapa de depreciações “correto” (Modelo 32), preparado com base na informação contabilística disponível à data – exercício de 2010 - (custo histórico).
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nas Conclusões que apresentou nas suas alegações, e que se transcrevem na íntegra, a Requerente entende que:
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“Ficou demonstrado e provado que o valor do ativo biológico nunca poderia ser apurado com base numa mera multiplicação do preço do pé da videira a 2010 pelo número de videiras, pois tal iria gerar uma reavaliação do ativo que fiscalmente nunca seria aceite, pelo que improcede assim o alegado pela AT no ponto 3.2 do Despacho de Indeferimento do Recurso Hierárquico (cfr. doc. 8, pág. 30)”.
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“Ficou demonstrado e provado que a informação com base nas quais a C... apurou os custos de preparação, plantação e exploração, é a melhor possível, já que resulta da sua própria experiência e dos seus registos contabilísticos (cfr. depoimento da testemunha M...)”.
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“Resulta ainda provado que a C... contactou várias entidades no sentido de obter informação de suporte e que tal se veio a mostrar impossível, considerando as muitas variáveis de que podem depender esses custos, como por exemplo: localização, declive, tempo etc… (cfr. depoimento da testemunha M...)”.
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“Pelo depoimento da testemunha M... fica igualmente explicado porque razão o documento produzido pela ATEVA não pode ser utilizado como um termo de referência, a saber, é relativo a uma região diferente da região onde estão localizadas a maior parte das Quintas da C..., e os custos são referentes a vinhas novas, sendo que as vinhas da C... têm mais de 40 anos (cfr. depoimento da testemunha M...)”.
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“Fica também provado que a amostra que a AT considera como “representativa dos bens identificados como Infraestruturas” de facto não o são. Com efeito 5 fichas de imobilizado não podem ser consideradas como representativas de um universo de 212 fichas de imobilizado relacionadas com o ativo biológico (cfr. doc. 8, pág. 34)”.
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“Fica ainda provado que qualquer exercício que a AT fizesse por amostragem iria sempre apurar uma percentagem diferente da apurada pela C..., na medida em que esta considerou a totalidade das fichas de imobilizado e não apenas uma amostra”.
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“Nos Autos fica ainda explicado e demonstrado que o valor de mercado que numa aquisição de uma Quinta venha a ser atribuído à vinha não corresponde ao valor do ativo biológico, já que aquele é influenciado por muitas variáveis, como seja terreno, inclinação, exposição solar, infraestruturas, capacidade de vinificação futura, interesse turístico etc…. que naturalmente não integram o conceito, nem a mensuração dos ativos biológicos de acordo com a IAS 41 (cfr. depoimento da testemunha M... e N...)”.
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“Por último, refira-se que ao contrário do que a AT alega no Despacho de Indeferimento do Recurso Hierárquico, o ativo biológico corresponde à videira e não à “vinha”, e não como considera a AT, como incluindo tudo aquilo que se encontra na vinha, designadamente o conjunto das videiras, muros, arames, excertos, máquinas, direitos de propriedade industrial etc”.
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“É certo que no quadro 4 da IAS 41 é apresentada como exemplo de ativo biológico as “vinhas””.
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“Contudo, tal não poderá ser interpretado de forma descontextualizada, sem ter em consideração a própria definição de ativo biológico constante na IAS 41”.
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“Sendo certo, que no ponto 5, a IAS 41 expressamente dispõe que “Um ativo biológico é um animal ou planta vivos””.
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“Ou seja, apenas a planta viva, entenda-se videira, poderá ser entendida como um ativo biológico”.
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“O facto da IAS 41 dar como exemplo a “vinha” resulta apenas de uma imprecisão na tradução da norma para Português”.
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“Com efeito, se analisarmos o normativo na sua língua original, entenda-se a língua inglesa, verificamos que o exemplo que é dado é “Grape Vines” que em Português corresponde precisamente a Videira”.
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“A tradução para “vinha” só estaria efetivamente correta se o normativo, na língua original, tivesse utilizado a expressão “Vineyard”, o que não é o caso”.
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“Refira-se que na CPC 29, que transpôs a IAS 41 na contabilidade brasileira, a expressão “Grape Vines” está traduzida, não como vinha, mas sim precisamente como “videira””.
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“Assim, não há dúvidas que o ativo biológico é no caso em apreço a “videira” porque esse é o sentido que melhor corresponde à definição de ativo biológico ínsito na IAS 41, bem como à correta tradução da expressão que é utilizada na IAS 41 na sua redação original”.
Do supra exposto conclui a Requerente que:
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“A contabilidade da C..., até 2009, não mensurava de forma autónoma os ativos biológicos”;
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“Essa mensuração passou a ser obrigatória, a partir de 2010, por força da aplicação do normativo contabilístico IAS 41”;
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“Pelas razões expostas não era possível mensurar o ativo biológico com base no justo valor”;
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“Também não havia informação histórica na contabilidade relativamente ao custo dos ativos biológicos”;
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“A metodologia utilizada pela C... permitiu ultrapassar as dificuldades indicadas no ponto c. e d. supra, de modo a que se passasse a cumprir as obrigações impostas pela IAS 41”;
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“As “críticas” apresentadas pela AT em sede de (re)apreciação da Reclamação Graciosa e Recurso Hierárquico, são infundamentadas, resultando de erros de raciocínio e que de modo algum põem em causa a credibilidade da metodologia utilizada pela C...”.
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“Poderá dizer-se que a metodologia seguida pela C... é uma das muitas metodologias que poderiam ser seguidas para a mensuração do ativo biológico, contudo a AT não logrou provar que a mesma não é credível, ou que leva a resultados completamente desajustados da realidade, como inclusive também não foi capaz de apresentar uma metodologia alternativa que no seu entender permitiria apurar valores mais consistentes com a realidade”.
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“Classificar ativos como biológicos tendo como único critério o código de registo e o “descritivo”, sem qualquer verificação contabilística de forma a apurar a real natureza dos bem, parece-nos, com o devido respeito, absurdo”
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“A AT não se pode limitar a recusar aceitar uma metodologia sem demonstrar de forma fundamentada que a mesma não é correta, ou que leva a resultados sem qualquer aderência com a realidade, ou ainda sem apresentar uma metodologia alternativa que permita alcançar resultados mais próximos da realidade”.
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“De igual modo a AT não pode, por discordar da metodologia da Requerente, corrigir o valor dos ativos biológicos sem fazer uma análise casuística da natureza dos ativos que estão a ser corrigidos, limitam-se apenas a ter em consideração o código de registo ou o respetivo descritivo”.
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“Por outro lado, não podemos deixar de salientar o facto da AT, no procedimento de inspeção tributária relativo ao exercício de 2011, onde a dedutibilidade fiscal das amortizações relativas ao ativo biológico também foi analisada, não ter colocado qualquer objeção”.
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“A este propósito refira-se que no Despacho de (re)analise da Reclamação Graciosa é expressamente referido que os serviços de inspeção tributária deveriam recolher a informação necessária para “verificar se os ativos em causa estão igualmente na base das depreciações apuradas no exercício de 2011, as quais não foram objeto de qualquer correção” (cfr- doc 6, pág.1)”.
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“Curiosamente, ou não, desconhecemos quais os resultados decorrentes dessa verificação”.
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“Por tudo o exposto, podemos e devemos concluir pela manifesta ilegalidade da correção efetuada pela AT, devendo a mesma ser anulada nos termos legais”.
A.1.2. Posição da Requerida (AT)
Em contrapartida, a Requerida entendeu, na Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, o seguinte:
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“Ora, a questão de fundo e que importa aqui relevar é: se todos os ativos apurados pela IT, a partir do Modelo oficial – Mapa de amortizações e depreciações apresentado, identificados com o código 0050 vinhas e que constam nas págs. 8 a 10 do relatório da IT (a pág. 20 a 22 do Doc.9 anexo à PI) devem ou não ser considerados, de acordo com o normativo contabilístico em vigor àquela data, como ativos biológicos?
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E a resposta é claramente afirmativa.
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Porquanto, todos os ativos constantes do mapa de amortizações e depreciações, que sustentaram a correção em apreço, devem ser considerados como Ativos biológicos de acordo com o normativo contabilístico e para efeitos fiscais (nos termos da alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º do CIRC), ainda que não se encontrem reconhecidos como tal na contabilidade da C... .
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Não cabe aqui, como pretende a Requerente, dar continuidade à discussão de como foi atribuído, pela C..., o valor de ativos biológicos12 – porquanto TODO o valor identificado pela C... nas diversas rubricas do ativo – ativos biológicos, ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis, cujo código correspondente no mapa de amortizações e depreciações corresponde é 0050 Vinhas - tem de integrar, de acordo com o normativo contabilístico, o conceito de ativo biológico.
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Como bem fundamentou a IT, de acordo com o normativo contabilístico: “o CUSTO de uma plantação de vinha (que não possa ser mensurada ao justo valor) INCLUIRÁ: Custos com aquisição de sementes ou plantas + trabalho de preparação de terrenos e trabalhos de plantação (subcontratado ou mão-de-obra da própria exploração) + produtos para tratamento das plantações (adubos, pesticidas, …) + outros indispensáveis à plantação”.
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Assim, nesses termos, os itens discriminados no Mapa de Amortizações e Depreciações como: Vinhas, plantação da vinha, trabalhos e plantação, bacelos, drenagem – vinhas reestruturação, bacelos e enxertos, reconstituição de vinhas, reconversão de vinhas, associados ao código 0050 Vinhas, só podem estar subsumíveis ao conceito de Ativo Biológico.
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E não estão aqui em causa, “infraestruturas” como muros e/ou poços que a Requerente dá como exemplo de infraestruturas a não integrar o valor do Ativo Biológico, conforme §113.º da PI.
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Ainda que, quase todo o teor da PI seja reconduzido no sentido de inviabilizar a fundamentação apresentada pela IT quanto à consideração da quantificação (segregação) do valor de ativo biológico apurado pela C..., a verdade é que a correção não resulta desse diferencial.
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A Requerente parece olvidar que a correção em apreço resulta do facto de TODO o ativo constante nos mapas de amortização e depreciação identificados com o Código 0050 Vinhas – ainda que segregado, pela C..., para efeitos de reconhecimento nas diversas rubricas contabilísticas (ativos biológicos, ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis) – deve ser reconhecido, nos termos do normativo contabilístico, e consequentemente, nos termos da alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º do CIRC, como um ativo Biológico.
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Não houve qualquer preocupação por parte da Requerente em vir demonstrar que, de facto, o custo dos ativos considerados pela IT como ativos Biológicos não traduziam o custo de aquisição, os custos de conversão e outros custos diretamente relacionados com esse ativo biológico, conforme o §33 da IAS41 (§ 34 da NCRF 17) na parte que refere que o CUSTO deverá ser determinado de acordo com os procedimentos constantes nas IAS 2 - Inventários e IAS 16 - Ativos fixos tangíveis (ou NCRF 18 - Inventários e NCRF 7 - Ativos fixos tangíveis).
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Simplesmente, refere a Requerente não concordar que a AT considere “como base de cálculo das amortizações dos ativos biológicos, montantes associados a equipamentos e infraestruturas e ativos intangíveis que não devem integrar a base amortizável do ativo biológico (planta)” (§132.º da PI).
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A Requerente salienta que a parte dos ativos que fez corresponder a ativos intangíveis corresponde a “direitos de produção” e por isso enquadráveis na IAS38 – Ativos Intangíveis, logo, não ser de aplicar a IAS41 (§§137.º a 140.º da PI).
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Em bom rigor, esses ativos, em qualquer um dos mapas de amortizações e depreciações, têm outra designação: “licença” ou “licença de plantação”.
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Assim, não tendo sido trazida mais informação ao processo não é possível, a partir dessa designação, enquadrar tais ativos como subsumíveis ao disposto na IAS38.
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A Requerente refere que a IT não indicou quais os parágrafos da IAS 41 (ou até mesmo da NCRF 17) que justifiquem quando “o CUSTO de uma plantação de vinha (que não possa ser mensurada ao justo valor) INCLUIRÁ: Custos com aquisição de sementes ou plantas + trabalho de preparação de terrenos e trabalhos de plantação (subcontratado ou mão-de-obra da própria exploração) + produtos para tratamento das plantações (adubos, pesticidas, …) + outros indispensáveis à plantação”.
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Parece ser unânime a relevância, para efeitos de mensuração dos ativos biológicos ao custo, do disposto no §33 da IAS41: “Ao determinar o custo, depreciação acumulada e perdas por imparidade acumuladas, uma entidade toma em consideração a IAS 2 Inventários, a IAS 16 Ativos Fixos Tangíveis e a IAS 36 Imparidade de Ativos” – mencionado no §114.º da PI e na pág.21 do Relatório da IT (pág.33 do Doc.9 anexo à PI).
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Ou seja, quando estamos perante um ativo biológico que é mensurado ao custo deduzido das respetivas depreciações e perdas por imparidade, teremos que encontrar o respetivo enquadramento (por estar fora das regras a aplicar na IAS41) na IAS 2 - Inventários, na IAS 16 - Ativos Fixos Tangíveis e na IAS 36 - Imparidade de Ativos.
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Nesse sentido, bem andou a IT quando entendeu que: “o CUSTO deverá ser determinado de acordo com os procedimentos previstos na NCRF 18 - Inventários [corresponde à IAS 2 – Inventários] e NCRF 7 - Ativos fixos tangíveis [corresponde à IAS16 - Ativos Fixos Tangíveis], considerando o custo de aquisição, os custos de conversão e outros custos diretamente relacionados com esse ativo biológico”.
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(…)
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Tendo ficado demonstrado que os ativos, ainda que reconhecidos contabilisticamente (indevidamente) pela C... em diversas rubricas de ativos (Ativo Fixo Tangível, Ativos Intangíveis e Ativos Biológicos), têm a natureza de ativos biológicos, nos termos da IAS 41 (ou NCRF17) conjugada com a IAS 2 (NCRF 18) e a IAS16 (NCRF7), tratando-se, como bem refere a IT, de custo de aquisição, de custos de conversão e outros custos diretamente relacionados com esse ativo biológico (vinha), a saber, Vinhas, plantação da vinha, trabalhos e plantação, bacelos, drenagem – vinhas reestruturação, bacelos e enxertos, reconstituição de vinhas, reconversão de vinhas, todos associados pela própria C..., para efeitos de apuramento da taxa de depreciação, ao código 0050 Vinhas constante na Tabela I anexa ao Decreto-Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro.
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Pelo que, no âmbito do cumprimento do previsto no artigo 29º do CIRC (redação aplicável ao exercício de 2010) as depreciações dos exercícios referentes a ativos biológico não deverá ser aceite fiscalmente, devendo ser acrescido ao lucro tributável.
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Atendendo a que as depreciações do exercício de 2010, correspondentes ao ativo biológico, se cifraram em €646.514,58 e a IT ter reconhecido que a C... já havia acrescido ao Resultado tributável o valor de €40.951,03, considera-se que a correção no montante €605.563,55 é legal e está devidamente fundamentada, devendo ser mantida.”
Em sede de alegações, e de uma forma genérica, a Requerida corroborou a posição constante da Resposta ao pedido de pronúncia arbitral.
B. DE DIREITO
A Requerente sustenta a propósito da formação do ato de liquidação:
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Violação dos princípios da verdade material e do inquisitório;
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Falta de fundamentação do ato;
E, ainda, a propósito dos atos propriamente ditos:
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ilegalidade da correção efetuada pela AT à matéria coletável da Requerente no montante de € 605.563,55, decorrente da correção no montante de € 605.563,55 ao prejuízo fiscal declarado pela C..., por desconsideração das depreciações e amortizações dos ativos biológicos (vinhas), reconhecidas como gastos no período de tributação de 2010, dado a redação do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IRC e artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009; e,
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ilegalidade da correção no montante de € 8.732,70 ao prejuízo fiscal declarado da sociedade D..., por custos escriturados (considerados para efeitos fiscais) e entendidos como não dedutíveis para efeitos de apuramento do resultado fiscal.
B.1.Questão da violação dos princípios da descoberta da verdade material e do inquisitório
A Requerente alega que a Requerida não procedeu, na inspeção interna que a submeteu, de acordo com o princípio do inquisitório que deve nortear a sua atuação e não respeitou o fim da inspeção, que é a descoberta da verdade material.
Sustenta que essa finalidade foi frustrada quando, em face da impossibilidade informática manifestada pela Requerente no decurso da ação de inspeção em fazer constar no Mapa de depreciações e amortizações (Modelo 32), relativo ao período de tributação de 2010, a desagregação autonomizada dos ativos biológicos que se encontravam indiscriminadamente registados sob o código 0050 – Vinhas, ou seja, refletindo as alterações impostas pela adoção, pela primeira vez, no novo normativo contabilístico (i.e. IAS 41)[2], em obediência ao referido princípio do inquisitório, os SIT não procuraram saber quais os elementos de prova que a Requerente tinha para o enquadramento dos controvertidos ativos, tendo optado simplesmente por considerar que os ativos sob o código 0050 – vinhas eram todos ativos biológicos.
De facto, o procedimento tributário, as regras do ónus da prova não significam que seja sobre a parte à qual ele é imposto que recai o dever de trazer ao processo os meios de prova dos factos relevantes para decisão, dispensando a AT de diligenciar no sentido de obtenção das provas necessárias para adequada aplicação do direito.
Na verdade, por força do artigo 58.º da LGT, vigora no procedimento tributário o princípio do inquisitório, que impõe à AT o dever de realizar «todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido».
Na mesma linha, os artigos 5.ºe 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA) enunciam o princípio da verdade material, estabelecendo que “o procedimento de inspeção visa a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adotar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objetivo”.
O princípio do inquisitório e o dever de diligenciar no sentido da descoberta da verdade material situam-se a montante do ónus de prova (acórdão do STA de 21-10-2009, processo n.º 0583/09), só operando as regras do ónus da prova quando, após o devido cumprimento daquele princípio, se chegar a uma situação de dúvida (non liquet) sobre os factos relevantes para a decisão do procedimento tributário, situação esta em que a matéria de facto é decidida contra a parte a quem é imposto tal ónus.
Assim, “o órgão instrutor pode utilizar para o conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento todos os meios de prova admitidos em direito” (artigo 72.º da LGT) e no procedimento, “o órgão instrutor utilizará todos os meios de prova legalmente previstos que sejam necessários ao correcto apuramento dos factos, podendo designadamente juntar actas e documentos, tomar declarações de qualquer natureza do contribuinte ou outras pessoas e promover a realização de perícias ou inspecções oculares” (artigo 50.º do CPPT), independentemente de o ónus da prova recair ou não sobre o contribuinte.
No caso em apreço, afigura-se manifesto que quanto à correção relativa à desconsideração dos gastos relativos à depreciação dos ativos biológicos não foi observado este dever de prosseguir a descoberta da verdade material, na medida em que a AT se limita a tecer considerações sem adequada objetividade que se impõe, suportadas algumas dessas considerações em informações genéricas e comerciais que não permitiam aferir com objetividade a natureza dos ativos registados sob o código 0050 – Vinhas no Mapa de depreciações e amortizações, do período de tributação de 2010.
Na verdade, como decorre do próprio RIT, relativo ao IRC do período de tributação de 2010, a Requerente, em sede do seu exercício de audição prévia do projeto de correções, informou os SIT que “[n]o exercício de 2010, a C... possuía activos biológicos (vinhas) mensurados ao respetivo histórico, que se encontram registados pelo montante de EUR 735.945,07, tendo naquele exercício sido registadas depreciações no montante de EUR 73.626,44 (conta 6441000000 – Amortizações Activos Biológicos – conforme Doc. n.º 2 [Parte integrante do mapa de amortizações e depreciações da C... referente ao exercício de 2010 e extrato de contas do razão de activos biológicos de produção]” e que “a correção proposta pela TA à matéria coletável da C... corresponde não à totalidade das depreciações dos activos biológicos de produção (vinhas) – que inclui a parte já tributada pela C...! –, mas também as depreciações e amortizações dos ativos fixos tangíveis e intangíveis associados àqueles ativos biológicos, conforme Doc. n.º 2 (...) tais como infraestruturas da vinha, maquinaria e equipamento, direitos de plantação, etc.”.
Face a esse facto, os SIT, nesta fase, sem solicitar qualquer elemento adicional à Requerente, limitam-se a analisar somente dados contabilísticos genéricos, tendo acrescentado dados que retirou do site oficial da C..., os quais transpõem informação genérica e de natureza comercial, e, é com base nesses novos elementos que os SIT concluíram que a C... era proprietária de vinhas e, portanto, os ativos sob o código 0050 – Vinhas eram todos ativos biológicos cujas respetivas depreciações e amortizações não deveriam relevar para efeitos do apuramento do resultado fiscal do período de tributação de 2010.
De facto, os SIT analisam informação que os próprios recolheram relativa a 5 quintas, nomeadamente:
Com referência à análise daquela informação, os SIT concluíram que “[p]odemos assim concluir que, no mínimo, nas quintas supra mencionadas, a C... é proprietária de 410 ha de vinha que têm, no âmbito da NCRF 17 a natureza de Ativos Biológicos de Produção. (…).
Na parte em que os SIT analisam o “Doc. n.º 2” concluem que ““[c]ontudo a análise do referido Doc. nº2, permite verificar que os descritivos utilizados (Vinhas, plantação de vinha, trabalhos e plantação, bacelos, drenagem – vinhas reestruturação, bacelos e enxertos, reconstituição de vinhas, reconversão de vinhas) são comuns às várias classes de imobilizado agora apresentadas, corroborando o critério que deve estar subjacente à mensuração de um Ativo Biológico de Produção, conforme já referido”.
E na sua conclusão pode ler-se que “[d]e acordo com o § 34 da NCRF 17, o CUSTO deverá ser determinado de acordo com os procedimentos previstos na NCRF 18 – Inventários e NCRF 7 – Activos fixos tangíveis, considerando o custo de aquisição, os custos de conversão e outros custos diretamente relacionados com esse ativo biológico.
Ou seja, o CUSTO de uma plantação de vinha (que não possa ser mensurado ao justo valor) INCLUIRÁ: Custos com aquisição de sementes ou plantas + trabalho de preparação de terrenos e trabalhos de plantação (subcontrato ou mão-se-obra da própria exploração) + produtos das plantações (adubo, pesticidas …) + outros indispensáveis à plantação.
A C... com 18 quintas (explorações vinícolas), numa área de 718,33 há de vinha em exploração (580,3 há em 2009), tendo sido produzidas 3.408 toneladas de uvas (2.257 toneladas de uvas em 2009).
Não obstante os elementos apresentados, os argumentos referidos no Direito de Audição, nomeadamente «o valor da correção proposta considera igualmente depreciações e amortizações havidas com os ativos fixos tangíveis e intangíveis conexos à manutenção e exploração dos referidos ativos biológicos (tais como infraestruturas de vinha, maquinaria e equipamento, direitos de plantação, etc…)», são consistentes com a temática subjacente à NCRF, no que respeita à mensuração dos Ativos Biológicos de Produção, que no caso concreto respeitam a plantações devinha, que totaliza 718 ha”.
Ora, o artigo 59.º da LGT estabelece que “os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco” e o artigo 63.º n.º 4, da mesma Lei estabelece, relativamente ao procedimento de inspeção que “os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objetivos a prosseguir”.
A qualificação dos ativos listados no Mapa de depreciações e amortizações sob o código 0050 - Vinhas podia ter sido feita por quaisquer outros meios, nomeadamente por consulta à contabilidade e cadastro do imobilizado dos ativos, não obstante, a Requerente não foi notificada para apresentar outros elementos de prova.
Face à análise que os SIT promoveram, afigura-se-nos que a mesma não foi a mais adequada e suficiente para aferir quanto à tipologia dos ativos listados no Mapa de depreciações e amortizações sob o código 0050, e concluir que esses ativos são (ou não) todos ativos biológicos.
Como foi referido em sede de inquirição das testemunhas, embora a contabilidade estivesse organizada de acordo com as regras impostas pela IAS 41, o sistema informático da C... ainda não permitiria extrair essa informação com o layout imposto pelos novos mapas fiscais, informação que os SIT tiveram conhecimento.
Demonstrativo dessa falta de diligência com que o procedimento tributário foi conduzido pela AT é o facto de no âmbito de uma nova apreciação da Reclamação Graciosa, a AT ter solicitado nova intervenção aos SIT da Direção de Finanças do Porto “por se mostrar necessário validar através da contabilidade e outros elementos de suporte, o montante efetivo dos ativos biológicos e correspondentes depreciações, o exercício de 2010”. No segundo Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa é referido pela AT que “[c]om vista a validar, através da contabilidade e outros elementos de suporte, o montante dos ativos biológicos em causa, solicitamos «fichas de imobilizado» de todos o itens identificados com o código 050 – Vinhas, de forma a apurar a verdadeira natureza dos bens e assim validar a respetiva classificação”.
A respeito das novas diligências efetuadas, tanto no segundo Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa como, mais tarde, no Despacho de indeferimento do Recurso Hierárquico, a AT conclui que “[c]onsiderando os diferentes valores e percentagens que se apuram nas diversas abordagens apresentadas, concluímos não ser possível de forma objetiva definir um valor diferente daquele que constava registado na contabilidade como “Vinhas”, dando-lhe plena equivalência à nomenclatura de “Ativos Biológicos”.
Ora, no que se refere aos valores que se encontravam registados na contabilidade, retira-se dos extratos contabilísticos juntos aos autos que os montantes totais do ativo biológico, bem como as depreciações do exercício (€735.945,07 e €73.626,24, respetivamente), se encontravam evidenciados no Balancete Razão do período de 2010, nas rúbricas “1141000000 – Act. Oper-Vinha” e “644100000-Amortiz-AcBiol.Acti.”. Portanto, não se afigura de acolher como suficientemente válida a sobredita afirmação da AT.
Por outro lado, verifica-se que a própria AT, apesar de considerar existir falta de objetividade da análise efetuada, concluiu, ainda assim, pela manutenção de uma correção que se suporta no Mapa de depreciações e amortizações inicialmente analisado pelos Serviços de Inspeção Tributária, não obstante as diligências adicionais efetuadas. Dito por outras palavras, a AT, apesar de ter concluído de que, com os elementos disponíveis, não conseguia aferir o correto enquadramento dos ativos e que, para tal, seria necessário recolher a outros elementos que revelassem essas caraterísticas, decidiu, sem apurar com objetividade essas características, considerar que todos os ativos sob o código 0050 – vinhas eram ativos biológicos.
Assim, no caso em apreço, a liquidação impugnada enferma de ilegalidade, por violação do princípio da descoberta da verdade material, cuja observância é imposta à AT pelos artigos 58.º da LGT e 5.º e 6.º do RCPITA.
B.2. Questão da falta de fundamentação
No pedido apresentado, a Requerente alega que a liquidação ora impugnada padece do vício de falta de fundamentação.
§1. Alude a Requerente quanto à questão da fundamentação que “o ato de liquidação não se encontra devidamente fundamentado, como reconhece a própria AT”, referindo a este respeito, em sede das suas Alegações escritas, que a “liquidação impugnada não obedeceu às exigências legais e constitucionais de fundamentação, na medida em que não foram observadas as exigências impostas pelos princípios da suficiência, da clareza e da congruência”.
A Requerente entende que essa insuficiência de fundamentação é, alegadamente, reconhecida pela AT no segundo Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa na parte em que refere que “Esta notificação anula e substitui o ofício emitido em 2017/10/24, e notificado ao sujeito passivo ViaCtt, em virtude de o mesmo não se encontrar acompanhado da integral fundamentação da decisão notificada, nos termos do artigo 77º da Lei Geral Tributária (LGT), ora em anexo”.
Por sua vez, a AT refere na sua Resposta que “da leitura do pedido de pronúncia arbitral resulta que a Requerente não demonstrou ter qualquer dificuldade em entender e apreender o itinerário cognoscitivo percorrido pelos serviços de inspeção, tendo formulado um juízo crítico sobre o entendimento que fundamenta as correções ao longo de quase 300 artigos. Mostrando-se evidente, pela leitura do pedido arbitral, que a Requerente teve conhecimento da fundamentação, pois de outra forma não estaria habilitada a discutir, como discute, as correções plasmadas no RIT e que optou por impugnar, em sede administrativa e em sede arbitral.” (...) Assim, resta reforçar o entendimento dos serviços vertido no RIT e nas Informações que sustentam as decisões proferidas nos procedimentos de Reclamação Graciosa e de Recurso Hierárquico, que se dão por integralmente reproduzidas, das quais resulta, indubitavelmente, que as correções em causa estão cabalmente fundamentadas de facto e de direito, devendo manter-se na ordem jurídica.”.
Nos termos do artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”.
Ao nível dos atos tributários, o artigo 77.º, da LGT determina que:
“1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.
Tal fundamentação terá de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do ato, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a atuar como atuou; e congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo, porém, existir contradição entre os fundamentos e a decisão. (Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STA de 11/12/2002, no Rec. n.º 01434/02).
Sendo certo que “não ocorre o vício formal de falta de fundamentação se a própria impugnante expressamente revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do ato e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido” (Ac. STA de 30.01.2013 – Proc. n.º 0105/12).
Ou seja, a melhor ou pior fundamentação é também, e essencialmente, aferida segundo aquilo que o interessado entende e segundo a defesa que conseguirá apresentar. Ora, no caso em apreço, a forma como a Requerente exerceu o seu direito de defesa demonstra que compreendeu perfeitamente todos os pontos do RIT, que, aliás, teve o cuidado de contradizer de forma especificada. Afigura-se-nos ser do senso comum que se, efetivamente, a Requerente não conseguisse entender o que lhe estava a ser apontado, não se conseguiria defender.
Não se afigura, pois, ao Tribunal que tenha havido preterição do dever de fundamentação. A Requerente foi capaz de compreender e de cabalmente reagir contra o RIT, pelo que entendemos dever separar-se, de forma clara, o que constitui falta de fundamentação com aquilo que é, na verdade, a discordância com os fundamentos da liquidação adicional efetuada pela Autoridade Tributária.
§2. Por outro lado, refere ainda a Requerente no PA que “(…) o ato em escrutínio é o ato de liquidação adicional, pelo que, releva apenas a fundamentação contida na referida liquidação, devidamente contextualizada, constante do respetivo processo administrativo, resultante do procedimento de fiscalização instaurado e concluído. As tentativas de fundamentação à posteriori, designadamente, em sede de Reclamação Graciosa e do Recurso Hierárquico são irrelevantes, pois que, como é sabido, é entendimento da doutrina e jurisprudência dos nossos tribunais superiores que não pode haver fundamentação do ato tributário (administrativo) a posteriori.”
Quanto ao entendimento da Requerente, refere a Requerida na sua Resposta que “a AT quando aprecia petições no âmbito de procedimentos administrativos tem necessariamente que se pronunciar sobre a argumentação invocada pelos contribuintes, pois sobre os serviços impende um dever de pronúncia, consagrado no art.º 56.º da LGT. Ora, a pronúncia sobre os argumentos invocados pode, naturalmente, dar origem a novos fundamentos que sustentem a decisão da AT, os quais passam a integrar a fundamentação do ato tributário impugnado, justificando a sua manutenção, total ou parcial, na ordem jurídica, como bem explicita o acórdão arbitral proferido no processo n.º 482/2019-T: «É neste contexto que a impugnante começa por imputar à decisão de indeferimento da reclamação graciosa e à liquidação adicional em IRC, em primeira linha, o vício de fundamentação a posteriori e violação de lei por ofensa dos artigos 69.º, 70.º e 71.º do Código do IRC.
Deve começar por dizer-se que a eventual adopção de um novo ou diferente fundamento na decisão da reclamação graciosa não representa, em si, uma fundamentação a posteriori.
A reclamação graciosa, constituindo uma garantia procedimental do contribuinte, corresponde a um procedimento de segundo grau, visando a reapreaciação da legalidade do acto impugnado, permitindo que a Administração possa ainda tomar uma posição definitiva sobre a questão antes de o interessado poder suscitar um litígio judicial. E, nesse sentido, a argumentação que a entidade competente para decidir venha a adoptar, em caso de indeferimento, passa a integrar a fundamentação do acto tributário impugnado, justificando a sua manutenção na ordem jurídica.
O que se pretende salvaguardar com a proibição da fundamentação a posteriori é que o tribunal baseie a formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado tal como ele ocorreu, em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto, impedindo que possam ser valoradas razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, mormente quando tenham sido invocados na pendência de meio jurisdicional impugnatório (cfr. acórdão do STA de 27 de Junho de 2016, Processo n.º 043/16).
Não é esse o caso quando a adopção de novos fundamentos ocorre ainda na fase procedimental em termos de poder influir na relação jurídica tributária.
Acresce que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa é ela própria objecto de impugnação, cumulativamente com a liquidação adicional de IRC, e a apreciação da sua legalidade não pode deixar de ter em consideração os fundamentos que serviram de base ao indeferimento, ainda que estes pudessem ser distintos daqueles em que se baseou a decisão que manifestou concordância com o relatório de inspecção tributária.»”.
Ora, a este respeito, por concordância com a jurisprudência citada pela Requerida, e sem necessidade de mais delongas e considerações, deverá improceder o pedido de anulação do ato de liquidação que tem por causa a respetiva falta de fundamentação.
B.3. Da questão da ilegalidade da desconsideração dos gastos relativos à depreciação/amortização dos ativos dos ativos listados sob o código 0050 no Mapa de depreciações e amortizações, do período de tributação de 2010.
Apreciados os vícios alegados pela Requerente, importa analisar agora a primeira questão de fundo suscitada pela Requerente relativamente à sobredita correção, a qual repousa em saber, a final, se poderia ou não a AT ter desconsiderado os gastos relativos à depreciação/amortização dos ativos listados sob o código 0050 no Mapa de depreciações e amortizações, do período de tributação de 2010, desde logo se tais gastos correspondem na íntegra a depreciações de ativos biológicos por aplicação dos normativos contabilísticos adotados e aplicados pela Requerente no período de tributação de 2010.
As partes encontram-se alinhadas quanto à fundamentação de direito da correção aqui em causa, na medida em que consideram que as depreciações dos ativos biológicos, não devem relevar para efeitos da determinação do lucro tributável do exercício fiscal de 2010, nos termos do n.º 1 do artigo 29.º do Código do IRC e do artigo 1.º do Decreto Regulamentar 25/2009, de 14 de setembro – apenas discordam quanto ao valor desses ativos biológicos e respetivas depreciações, por possuírem entendimentos diferenciados quanto ao conceito de ativos biológicos.
Com efeito, na ótica do Tribunal impõe-se, como questão prévia a decidir sobre a ilegalidade substantiva das correções efetivadas pela Requerida, determinar o sentido e o alcance do conceito de ativo biológico em sede do normativo contabilístico aplicável ao caso concreto – International Accounting Standards (IAS).
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Da natureza dos ativos sob o código 0050 face aos normativos contabilísticos aplicáveis e em vigor à data dos factos (2010)
Na análise da questão de fundo suscitada pela Requerente impõe-se começar por proceder à análise dos normativos contabilísticos aplicáveis à situação em dissídio entre as partes nos presentes autos.
A AT fundamenta a correção em causa, mormente no que se refere à qualificação dos ativos em crise, com base nas NCRF, concretamente a NCRF 17, a qual não é aplicável ao caso em concreto, pois esse normativo contabilístico não é adotado pela Requerente tal como decorre das Demonstrações Financeiras da Requerente relativas ao exercício de 2010, adotando, sim, as International Accounting Stantards, concretamente a IAS 41 no que respeita aos ativos biológicos. Ainda que se admita a semelhança dos normativos contabilísticos, é facto que o normativo contabilístico aplicável é as IAS e não as NCRF, sendo tal distinção relevante para apreciação do caso em concreto, na medida em que o rigor com que se analisa e aplica a norma contabilística é relevante para a qualificação e quantificação dos ativos biológicos aqui em causa.
Vejamos,
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Normas internacionais de contabilidade (em inglês: International Accounting Standard, IAS, hoje denominadas International Financial Reporting Standards, IFRS)
§1. IAS 41- Agricultura
A partir de 2010, a C... e a Requerente optaram por elaborar as suas contas em conformidade com as normas internacionais de contabilidade, nos termos previsto no n.º 3 e n.º 4 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 158/2009, designadamente aplicando as regras e princípios definidos na IAS 41- Agricultura para contabilizar os seus ativos biológicos.
No que se refere ao seu âmbito a sobredita norma prevê o seguinte:
“ÂMBITO
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Esta Norma deve ser aplicada na contabilização do que se segue quando se relacione com a atividade agrícola:
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activos biológicos;
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produto agrícola no ponto da colheita;
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subsídios governamentais incluídos nos parágrafos 34-35.
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Esta norma não se aplica a:
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terrenos relacionados com a actividade agrícola (ver a IAS 16 Activos Fixos Tangíveis e a IAS 40 Propriedade de Investimento);
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activos intangíveis relacionados com a actividade agrícola (ver a IAS 38 Activos Intangíveis).
-
(…)” (sublinhado nosso)
A este propósito, cumpre, desde já, salientar que, da matéria dada como provada, do conjunto de ativos considerados no Mapa de Reintegrações e Amortizações, do período de tributação de 2010, constata-se a existência de diversos ativos intangíveis, nomeadamente licenças e direitos, considerados sob código 0050, que foram considerados pela Requerida como integrando o valor dos ativos biológicos – a Requerida entendeu que todos os ativos que se encontravam sob o código 0050 no Mapa de depreciações e amortizações relativo ao período de tributação de 2010 eram ativos biológicos, onde se incluíam, por exemplo, neste caso ativos intangíveis.
Por sua vez, a IAS 41 (§4) proporciona exemplos de ativos biológicos, produto agrícola e produtos que são o resultado de processamento após colheita:
Ativos biológicos
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Produtos agrícolas
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Produtos resultantes de processamento após colheita
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Carneiro
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Lã
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Fio de lã, carpetes
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Árvores numa plantação florestal
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Árvores abatidas
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Troncos, madeira serrada
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Plantas
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Algodão
Cana colhida
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Fio de algodão, roupas
Açúcar
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Gado produtor de leite
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Leite
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Queijo
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Porcos
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Carcaças
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Salsichas, presuntos curados
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Arbustos
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Folhas
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Chá, tabaco curado
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Vinhas
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Uvas
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Vinho
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Árvores de frutos
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Frutos colhidos
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Frutos processados
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Dos exemplos proporcionados pela IAS 41 (§4), na sua versão em português, verificamos que apresenta como exemplos de ativos biológicos as “vinhas”. Da consulta à IAS 41 (§4), na sua versão original (em inglês), a expressão utilizada é “vines”, expressão que traduzida para português pode significar “vinha” (menos frequente) e “videira” (mais frequente). Não obstante, a expressão “vineyard” é a mais correta e frequente para designar a “vinha”.
No sentido de corroborar a hipótese de uma tradução imprecisa da IAS 41 da sua versão original (em inglês) para português, verificamos que, por exemplo, na versão da IAS 41 traduzida para espanhol[3], a expressão “vines” mencionada no §4 dessa versão foi traduzida para “vides”, expressão que em espanhol significa “videira” e não “vinha” – para designar vinhas em espanhol é utilizada a expressão “viñedo”.
Por sua vez, a IAS 41 (§44) na sua versão traduzida para português[4], prevê que “[o]s activos biológicos de produção biológicos de produção são os que não sejam ativos biológicos consumíveis; por exemplo, gado do qual pode ser obtido leite, vinhas, árvores de fruto e árvores a partir das quais se obtenha lenha por desbaste enquanto essas árvores permanecem vivas.”.
Na sua versão original (em inglês)[5], a IAS 41 (§44) menciona que “Bearer biological assets are those other than consumable biological assets; for example, livestock from which milk is produced, grape vines, fruit trees, and trees from which firewood is harvested while the tree remains.”. Fazendo a tradução da expressão “grape vines” para português temos “videiras” e não “vinhas”.
Neste contexto, infere-se que as referências a “vinhas” efetuadas no âmbito da IAS 41, constante da versão portuguesa, se referem a videiras e não à vinha – expressão que a AT usou no sentido de abranger não só as plantas (videiras), mas, igualmente, todas as infraestruturas e equipamento instalados ou localizados nas vinhas da C...– de outra forma seria desprovida de sentido a definição de ativo biológico constante na IAS 41, a qual define expressamente que “[u]m activo biológico é um animal ou planta vivos”.
De facto, e retornando à IAS 41 (§4), verificamos que de entre os exemplos ali proporcionados, temos “árvores numa plantação florestal” e não apenas “plantação florestal” (conjunto de árvores) e “árvores de fruto” e não “o pomar” (conjunto de árvores de fruto), pelo que, sendo congruentes com esses exemplos teríamos “videiras” e não as “vinhas” como ativos biológicos.
Também em sentido do exposto, relativamente ao reconhecimento e justo valor dos ativos biológicos, a IAS 41 (§15) dispõe que “[a] determinação do justo valor de um ativo biológico ou produto agrícola pode ser facilitada pelo agrupamento de ativos biológicos ou de produto agrícola de acordo com os atributos significativos; por exemplo, por idade ou qualidade.”.
Por seu turno, na IAS 41 (§25) pode ler-se que “[o]s ativos biológicos estão muitas vezes fisicamente implantados nos terrenos (por exemplo, árvores numa floresta plantada). Pode não haver mercado separado para activos biológicos que estejam implantados no terreno, mas pode ser existir um mercado ativo para os artigos combinados, isto é, para os ativos biológicos, terrenos em bruto e melhoramentos nos terrenos, como um conjunto. Uma entidade pode usar informação relativa a activos combinados para determinar o justo valor de ativos biológicos. Por exemplo, o justo valor de terrenos em bruto e melhoramentos de terrenos, pode ser deduzido do justo valor dos activos combinados para chegar ao justo valor de activos biológicos.”.
Ou seja, da análise ao que se encontra previsto na IAS 41 (§25), conclui-se que os ativos biológicos estão muitas vezes implantados nos terrenos (árvores numa floresta plantada) e que para determinar o justo valor de ativos biológicos, será de deduzir ao justo valor dos ativos combinados tanto o valor do terrenos como também os melhoramentos que possam ter sido efetuados aos mesmos, ou seja, infere-se, portanto, que melhoramentos de terrenos não qualificam no cômputo dos ativos biológicos.
A este respeito, cumpre desde já salientar que, do conjunto de ativos considerados no Mapa de Reintegrações e Amortizações, do período de tributação de 2010, constata-se a existência de melhoramentos nos terrenos, nomeadamente reparação de muros, operações de pré-surriba, surriba, arrasamento, despedrega e rampeamento de taludes, os quais se encontram a ser considerados nesses mapas sob o código 0050, e, por conseguinte, a ser considerados pela Requerida como integrando o valor dos ativos biológicos aqui em causa.
Por outro lado, ainda a respeito desta temática, verificamos que a partir de 2015, as alterações à IAS 16 – Ativos fixos tangíveis e IAS 41 - Agricultura[6] alteraram o âmbito da IAS 16 para nela incluir ativos biológicos que satisfaçam a definição de plantas que geram produto agrícola (por exemplo, árvores de fruto). Em face destas alterações, a produção agrícola que cresce em plantas que geram produto agrícola (por exemplo, a fruta que cresce numa árvore) permanecerá no âmbito da IAS 41.
Em resultado das referidas alterações, as plantas que geram produto agrícola passam a estar sujeitas a todos os requisitos de reconhecimento e mensuração da IAS 16, incluindo a escolha entre o modelo de custo e o modelo de revalorização e os subsídios do governo relativos a estas plantas passam a ser contabilizados de acordo com a IAS 20 e não de acordo com a IAS 41.
A este respeito, refere a IAS 41 (§1) na sua nova redação que “1. Esta norma deve ser aplicada na contabilização do que se segue quando se relacione com a atividade agrícola: a) ativos biológicos, exceto plantas destinadas à produção. (…) 2. Esta norma não se aplica: (…) b) a plantas destinadas à produção relacionadas com a atividade agrícola (ver IAS 16). Contudo, esta norma aplica-se aos produtos obtidos a partir dessas plantas destinadas à produção”.
Nas definições que constam da nova redação da IAS 41 (§5), “[u]ma planta destinada à produção é uma planta viva que: a) é utilizada na produção ou fornecimento de produtos agrícolas; b) irá fornecer produtos agrícolas por um período que se espera ser superior a um ano; c) tem a probabilidade remota de ser vendida como produto agrícola, com exceção de vendas ocasionais de resíduos”.
Ressalta notório que a IAS 41, com as alterações que lhe foram introduzidas exclui do ativo biológico as plantas de produção, as que são utilizadas na produção do produto agrícola – ou seja, é feita referência expressa às plantas de produção e não a outros custos ou ativos/infraestruturas a elas associados. Assim sendo, se não lhes é feita referência, naturalmente que só se poderá concluir que esses custos não se encontravam abrangidos pela IAS 41, na versão que se encontrava em vigor em à data dos factos (2010).
Aliás, além de não se conhecer suporte legal para considerar no cômputo dos ativos biológicos outros ativos/equipamentos/infraestruturas, tal seria desprovido de qualquer sentido face ao disposto na IAS 41 (§44), a qual refere que “os ativos biológicos de produção não são o produto agrícola mas, antes, de regeneração própria.”.
Não se concebe que, por exemplo, o arame, estruturas de canalização em cimento, os postes de madeira, arames e os muros – elementos que integram o lote dos ativos sob o código 0050 –, que a AT considera serem ativos biológicos, tenham capacidades biológicas de regeneração própria – porque de facto não têm.
No contexto do acima referido, conclui-se que a Requerida se funda num conceito de ativo biológico que não encontra assento no normativo contabilístico aplicável e adotado pela C..., sociedade dominada pela Requerente, e, em resultado do qual, procedeu à anulação dos gastos contabilizados pelo sujeito passivo a título de depreciações/amortizações, no montante global de € 605.563,55, por, na sua ótica, as vinhas e outras infraestruturas e equipamentos de apoio respeitarem na sua globalidade a ativos biológicos – entendimento que, como se referiu, resultou na consideração das depreciações e amortizações de outras infraestruturas e equipamentos de apoio e ativos intangíveis, nomeadamente licenças e direitos das vinhas (direitos estes que, à data, estavam regulamentados no Decreto-lei n.º 83/97 de 09 de Abril, nomeadamente no que à sua transferência/transmissão diz respeito).
Por sua vez, como resulta da matéria dada como provada, a Requerente entende que o ativo biológico é apenas a videira (planta per si), no que, cremos, também não assiste razão à Requerente.
Vejamos.
Relativamente ao reconhecimento e justo valor dos ativos biológicos, a IAS 41 (§12) dispõe que “[u]m activo biológico deve ser mensurado no reconhecimento inicial e em cada data de balanço pelo seu justo valor menos os custos estimados no ponto de venda, excepto no caso descrito no parágrafo 30. em que o justo valor não pode ser fiavelmente mensurado.”.
Ora, de acordo com a nota 2.6. “Ativos Biológicos” do Anexo às Demonstrações Financeiras Certificadas para o exercício findo em 31 de dezembro de 2010, “os ativos biológicos da Empresa correspondem fundamentalmente a plantações de vinha. Conforme previsto no IAS 41 – Agricultura, a Empresa regista tais ativos de acordo como seu custo de aquisição deduzido de amortizações acumuladas e perdas de imparidade acumuladas. Os activos biológicos não se encontram mensurados pelo seu justo valor deduzido de custos de colocação em estado de venda tendo em consideração que: (i) não existe um mercado suficientemente activo para as vinhas tendo em consideração que tais ativos não são homogéneos e que os preços não são de conhecimento público; (ii) que as transações existentes incidem sobre o conjunto de activos que constituem a vinha e não apenas sobre o ativo biológico, pelo que existe um conjunto de aspetos de natureza intangível que influenciam o prelo de transação não relacionadas com o ativo biológico em si e que dificultam o processo de determinação do valor deste último; (iii) que o preço da plantação depende de um conjunto vasto de factores como a região em que está localizada, os aspectos climáticos e caraterísticas do terreno. Atentos os factores acima apresentados, é entendimento da Empresa que não é possível mensurar com fiabilidade o justo valor dos seus activos biológicos.”.
As sobreditas limitações na determinação do justo valor foram corroboradas pelos depoimentos das testemunhas arroladas pela Requerente, sendo que a própria Requerida não coloca em causa a aplicação do modelo de custo pela Requerente na mensuração dos ativos biológicos detidos pela C..., pelo que se assume como matéria não controvertida nos presentes autos o modelo de mensuração dos ativos biológicos (custo vs. justo valor).
Assim:
A IAS 41 (§30) prevê que “[h]á um pressuposto de que o justo valor pode ser mensurado com fiabilidade para um activo biológico. Contudo, esse pressuposto pode ser refutado apenas no reconhecimento inicial de um activo biológico relativamente ao qual os preços ou valores determinados pelo mercado não estejam disponíveis e relativamente ao qual as estimativas alternativas do justo valor estão determinadas como sendo claramente pouco fiáveis. Nesse caso, esse activo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada. Quando o justo valor desse activo biológico se tornar fiavelmente mensurável, uma entidade deve mensurá-lo pelo seu justo valor menos os custos estimados do ponto de venda. Quando um activo biológico não corrente satisfizer os critérios de classificação como detido para venda (ou for incluído num grupo para alienação que esteja classificado como detido para venda) de acordo com a IFRS 5 Activos Não Correntes Detidos para Venda e Unidades Operacionais Descontinuadas, presume-se que o justo valor pode ser mensurado com fiabilidade.”.
A IAS 41 (§33) prevê que ao “determinar o custo, depreciação acumulada e perdas por imparidade acumuladas, uma entidade toma em consideração a IAS 2 Inventários, a IAS 16 Ativos Fixos Tangíveis e a IAS 36 Perdas por Imparidade.”.
§2. IAS 16 – Ativos fixos tangíveis
Por sua vez, a IAS 16 (§16), determina que o “custo de um item do activo fixo tangível compreende:
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o seu preço de compra, incluindo os direitos de importação e os impostos de compra não reembolsáveis, após dedução dos descontos comerciais e abatimentos;
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quaisquer custos directamente atribuíveis para colocar o activo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência;
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a estimativa inicial dos custos de desmantelamento e remoção do item e de restauro do local no qual este está localizado, em cuja obrigação uma entidade incorre seja quando o item é adquirido, seja como consequência de ter usado o item durante um determinado período para finalidades diferentes da produção de inventários durante esse período.”.
Sendo que a IAS 16 (§17) prevê que exemplos de custos diretamente atribuíveis ao ativo fixo tangível são:
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“custos de benefícios dos empregados (tal como definidos na IAS 19 Benefícios dos Empregados) decorrentes directamente da construção ou aquisição de um item do activo fixo tangível;
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custos de preparação do local;
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custos iniciais de entrega e de manuseamento;
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custos de instalação e montagem;
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custos de testar se o activo funciona correctamente, após dedução dos proventos líquidos da venda de qualquer item produzido enquanto se coloca o activo nessa localização e condição (tais como amostras produzidas quando se testa o equipamento); e
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honorários profissionais.”.
Para além disso, a IAS 16 (§) determina que “[o] reconhecimento dos custos na quantia escriturada de um item do activo fixo tangível cessa quando o item está na localização e na condição necessárias para que seja capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência.”.
Como é de concluir, por aplicação conjugada da IAS 41 e IAS 16, nas situações em que seja adotado o modelo de custo na mensuração dos ativos biológicos, o custo do ativo biológico será “o somatório de todos os custos necessários à sua aquisição e colocação em condições e no local pronto a ser usado”, ou seja, poderão incluir-se custos, como o preço dos pés a ser implantados no terreno, o trabalho de preparação dos terrenos (não os de melhoramento de terrenos) e colocação desses pés, seja este trabalho subcontratado ou realizado por mão-de-obra da própria empresa, produtos para fertilização das plantas e outros bens e serviços indispensáveis à plantação das plantas (necessidade de uma relação direta dos custos com a colocação da planta no solo para produção)[7] – contrariamente ao que conclui a AT a respeito do suprarreferido, tal não significa que devam integrar o custo do ativo biológico as despesas com infraestruturas, equipamentos e ativos intangíveis.
Assim:
Na linha do que acima se referiu, entende este tribunal arbitral que os custos que as normas contabilísticas aqui aplicáveis preveem como integrando o custo biológico (IAS 41 e, por remissão expressa, a IAS 16), são os custos que se encontrem inteiramente relacionados com a planta per si e a sua colocação no terreno até que se encontrem em condições prontas a produzir.
Da conjugação da IAS 41 e IAS 16, não resulta a integração de custos de infraestruturas, equipamentos de apoio, licenças e direitos no custo do ativo biológico, custos que a Requerida AT considerou como sendo parte dos ativos biológicos aqui em causa, e, também não resulta que, o ativo biológico é apenas o custo da planta per si (videira), entendimento que a Requerente considerou ser o aplicável para a segregação dos ativos biológicos considerados no mapa de depreciações e amortizações sob o código 0050 – Vinhas.
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Da fundada dúvida quanto à qualificação e quantificação do facto tributário
Da matéria dada como provada nos presentes autos, no entender deste coletivo arbitral existe fundada dúvida quanto à qualificação e quantificação do facto tributário, por um lado, face às divergências concetuais e, por outro lado, face à insuficiência dos elementos recolhidos para determinar com exatidão o valor dos ativos biológicos em causa e correspondentes depreciações, no exercício de 2010.
Vejamos.
No caso em apreço, resultou da prova produzida (quer documental, quer testemunhal) que, a partir de 2010, os ativos, que se encontravam até então agregados na rúbrica de “Terrenos e recursos naturais”, passaram a ter de ser desagregados por tipologia de ativos de forma a desagregar os ativos biológicos (que na ótica da Requerente respeita apenas à planta -videira - per si).
Em face de tal situação, o Mapa de depreciações e amortizações, do período de tributação de 2010, carecia de correção por parte da C... com vista a refletir as alterações impostas pela adoção, pela primeira vez, no novo normativo contabilístico, operação que lhe permitiu identificar e desagregar os ativos biológicos que se encontravam considerados no Mapa de Reintegrações e Amortizações, do período de tributação de 2010, sob o código 0050 – Vinhas.
Em sede de ação de inspeção, a C... informou os SIT de tal facto, todavia, ao invés de diligenciarem junto da C... a recolha de novos elementos adicionais que permitissem uma análise objetiva da natureza dos ativos em causa (sob o código 0050), na apreciação do Direito de Audição do Projeto Relatório de inspeção tributária, os SIT socorreram-se da análise de dados contabilísticos de cariz genérico, aos quais acrescentou dados que retirou do website oficial (!) da C..., que transpõem informação genérica e de natureza comercial, e, foi com base nesses novos elementos que os SIT concluíram que a C... era proprietária de vinhas às quais deveria ser-lhe dada plena equivalência à nomenclatura de “ativos biológicos”. De facto, face à prova produzida, afigura-se crível concluir que a informação analisada pelos SIT não era suficiente para uma análise objetiva da natureza dos ativos considerados sob o código 0050 (vinhas). Prova de tal facto é a fundamentação utilizada pelos SIT para concluir pela manutenção da correção inicialmente proposta no Projeto Relatório de inspeção tributária – p.e., no RIT quando os Serviços referem que “Podemos assim concluir que, no mínimo, nas quintas supramencionadas, a C... é proprietária de 410 há de vinha que têm, no âmbito da NCRF 17, a natureza de ativos Biológicos de Produção” – sublinhado e destacado nosso.
Por discordância com os fundamentos da correção efetuada pelos SIT naquela ação de inspeção, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa sustentando a sua discordância com a legalidade das correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária.
Em 07-03-2016, a Requerente foi notificada para se pronunciar em sede de direito de audição prévia sobre o Projeto de despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa.
Pese embora discordar com o indeferimento projetado, em sede de direito de exercício de direito de audição, a Requerente apresentou elementos para comprovar apenas a ilegalidade da correção relativa à depreciação de ativos biológicos, ocorrida em sede da participada C... . Conforme decorre da Informação que integra o Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa do Chefe de Divisão da Direção de Finanças do Porto, a Requerente informou em sede de exercício de audição prévia que “o mapa de depreciações e amortizações que esteve na base das correções reclamadas não se encontra elaborado de acordo com o art.º 29.º e 34.º do CIRC, atendendo a condicionalismos informáticos, dos quais tinha sido dado conhecimento aos serviços de inspeção tributária durante a ação de inspeção. A Reclamante conseguiu obter um novo mapa de depreciações e amortizações relativamente aos ativos biológicos existentes em 2010, que agora se anexa, e do qual resulta a individualização dos ativos biológicos (vinhas) dos demais ativos fixos tangíveis e intangíveis associados, demonstrando que o valor dos ativos biológicos ascende a € 735.945,07 e as respetivas depreciações, a € 73.626,44; Acrescenta que foi objeto de ação de inspeção, com referência ao exercício de 2011, na qual foi questionada a mesma matéria, no entanto, à data já se mostrava possível a extração do sistema informático de um mapa de depreciações e amortizações devidamente individualizado, pelo que não se procedeu a qualquer correção.”. Para efeitos de validar o alegado pela Requerente naquela sede, situação que, conforme já decorre dos autos, já havia sido exposta aos SIT no decurso do procedimento inspetivo, a AT solicitou a intervenção dos SIT da Direção de Finanças do Porto, por se mostrar necessário validar através da contabilidade e outros elementos de suporte, o montante efetivo dos ativos biológicos em causa e correspondentes depreciações, no exercício de 2010.
Também em sede de exercício de direito de audição prévia, a participada C..., apresentou listagem das fichas de imobilizado (212 fichas de imobilizado), na qual foram identificados os ativos sob o código 0050 – Vinhas, agrupados por classe de imobilizado (Infraestruturas de Vinha, no valor de € 15.227.746,60; Ativo Biológico, no valor de € 717.005,47; Propriedade Industrial, no valor de € 190.440,59), num total global de € 16.135.192,67.
Já no âmbito das diligências efetuadas ao abrigo da DI2016..., a C..., apresentou por escrito os seguintes esclarecimentos: “[t]endo em conta que não existia informação histórica disponível que permitisse de forma organizada e sistematizada a realização de uma segregação correta para a generalidade dos Terrenos e Recursos Naturais do custo da planta (videira), a empresa adotou a seguinte metodologia de segregação inicial dos Ativos Biológicos de acordo com os novos normativos; 1. Custos das plantas “Videira” no mercado, à data de 2010; 2. N.º de plantas existentes, nas áreas de vinhas da empresa à data de 01 de Janeiro de 2010, de acordo com os cadastros das vinhas; 3. Valorização dos ativos biológicos planta viva (videira) com base no produto dos dois pontos anteriores, segregados pelas respetivas áreas vitivinícolas oficias nessa data (cadastros das vinhas); 4. Ajustamento pela redução dos Ativos Fixos Tangíveis (Terrenos e Recursos Naturais) das áreas agrícolas ponderado pelo peso do valor do Custo da Planta no total do Ativo.”
Em face da metodologia descrita, é apresentado pela Requerente um quadro preparado para apurar o valor do ativo biológico, tendo por base os seguintes dados:
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A área total da propriedade (quinta) e a área de vinha incluída nessa propriedade;
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O total de pés de videira (planta) e os pés de videira por hectare de vinha;
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Os custos da planta por hectare;
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Os custos por hectare, de preparação de terreno, de plantação do terreno e de exploração anual;
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O valor do ativo por hectare, que resulta do somatório do custo da planta com o custo de preparação do terreno, de plantação do terreno e de exploração anual
Conforme se segue:
Por aplicação da referida metodologia, a Requerente apurou uma percentagem de 6,45%, que segundo esta, representa, em termos médios, o peso dos ativos biológicos (videiras) no total do ativo associado a cada Quinta.
No segundo Despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa do Chefe de Divisão da Direção de Finanças do Porto, a AT alega que as informações apresentadas pela C... nos quadros de apuramento do valor do ativo biológico não se encontram suportados em qualquer documento externo. A este respeito, a Requerente refere no PA que os dados constantes dos quadros supra, “designadamente no que concerne ao custo da planta, custo de preparação, custos de plantação e custo de exploração, todos por há, têm por base as informações obtidas junto do departamento de viticultura e naturalmente da vastíssima experiência que a C..., têm nesta matéria.”, alegando a inexistência de informação oficial disponível que pudesse ser utilizada para efeito da quantificação do ativo biológico face à localização e caraterísticas das suas quintas.
Posto isto, por considerar que a análise à argumentação da Requerente se mostrou inconclusiva, e numa “tentativa” de refutar a metodologia adotada pela C... para efeitos da quantificação do ativo biológico, a AT, numa primeira abordagem, multiplica o custo de cada pé de videira (€0,80), considerado pelo sujeito passivo, pelo número de pés de videiras, tendo apurado um montante total do custo da planta de € 1.871.342,60, situação que se julga estar em confronto com a tese aderida pela própria AT e com os normativos contabilísticos aplicáveis, na medida em que o custo do ativo biológico não se limita unicamente ao custo da planta per si. Numa segunda abordagem, julga-se que com o objetivo de demonstrar a falta de razoabilidade dos valores indicados pela C..., a AT procede à análise por amostragem das fichas de imobilizado relativas aos ativos registados sob o código 0050 - Vinhas.
Da análise das fichas de imobilizado e respetiva documentação de suporte entregue pelo sujeito passivo[8], concretamente das fichas de imobilizado 42020261 e 42020262, relativas à aquisição das denominadas Quintas da “...”, “...” e “...”, a AT concluiu que face aos valores atribuídos à vinha, o ativo biológico seria equivalente a 76% do respetivo total, e, por isso, estaria em crise a percentagem apurada pelo sujeito passivo com base da estimativa efetuada (6,45%).
Entende este coletivo arbitral que o critério adotado pela AT para avaliar a metodologia seguida pela C... não se mostra adequado, por não se evidenciar fiável, na medida em que se suporta numa valorização subjetiva da “vinha” – suportado nas condições de aquisição das “quintas”, as quais incluem ativos e outros fatores influenciadores da sua valorização e que vão muito para além dos ativos biológicos - e, portanto, não pode servir para colocar em crise o procedimento e a estimativa efetuada pelo sujeito passivo face a todas as limitações que alegou existirem na determinação do valor do ativo biológico, nomeadamente, o facto de parte das videiras terem já dezenas de anos (algumas mais de 40 anos), localização do terreno, do declive, da exposição solar, do potencial turístico, etc.
Não obstante, a metodologia de valorização não é matéria controvertida no presente processo.
Adicionalmente, pela análise das fichas de imobilizado e respetiva documentação de suporte entregue pelo sujeito passivo[9], concretamente aas fichas de imobilizado 42020261 e 4202026242021813, 42021814, 42022515, 420225519 e 42022523, a AT identifica a compra dos seguintes ativos, que considera parte integrante da valorimetria dos ativos biológicos face ao entendimento que adota em sede de análise do Recurso Hierárquico:
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“Alocações – trabalhos p/ a própria Empresa (reconversão/reconstituição de vinhas;
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Trabalhos de trator;
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Diversos serviços prestados nas vinhas (poda, limpar cavalo, amontoa, esticar arames;
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Limpar taludes, plantar, abrir e fechar covas, aplicar herbicida, erguida, sulfatação, etc.);
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Enxertos/bacelos;
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Reparação de muros, arames, grampos;
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Plantação e embardamento de excertos/bacelos;
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Operações de pré-surriba, surriba, arrasamento, despedrega e rampeamento de taludes (elevados valores);
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Varas de pinho tratado.”.
Em resultado da análise efetuada pela Requerida para avaliar a metodologia adotada pela C... na quantificação do ativo biológico, esta conclui que “[c]onsiderando os diferentes valores e percentagens que se apuram nas diversas abordagens apresentadas, concluímos não ser possível de forma objetiva definir um valor diferente daquele que constava registado na contabilidade como “Vinhas”, dando-lhe plena equivalência à nova nomenclatura de “Ativos Biológicos” (sublinhado e destacado nosso).
A este respeito, da prova produzida, resulta que em 2010 (i) a contabilidade da C... passou a espelhar de forma desagregada o valor dos ativos biológicos tendo por base a aplicação da metodologia acima descrita, sendo que, (ii) o segundo Mapa de depreciações e amortizações, relativo ao exercício de 2010, espelha igualmente essa alteração/segregação dos ativos sob o código 0050. De facto, contabilisticamente, foi confirmado pelos elementos juntos aos autos, concretamente conforme já acima identificado na matéria dada como provada, que os montantes totais do ativo biológico, bem como as depreciações do exercício (€735.945,07 e €73.626,24, respetivamente), se encontram evidenciados no Balancete Razão, nas rúbricas “1141000000 – Act. Oper-Vinha” e “644100000-Amortiz-AcBiol.Acti.”, ou seja, o ponto de partida para quantificar o montante da correção aqui em causa o Mapa de depreciações e amortizações inicialmente analisado pela AT, o qual foi objeto de correção posterior pela Requerente.
Por outro lado, como resulta de tudo anteriormente referido, a AT procede à avaliação da metodologia aplicada pela C... tendo por base um entendimento que não encontra assento das normas contabilísticas aplicáveis à situação aqui em causa, (IAS 41 e IAS 16), ou seja, considerou que os custos suportados com infraestruturas, equipamentos de apoio, licenças e direitos (intangíveis, portanto) no custo do ativo biológico devem afetar o custo dos ativos biológicos aqui em causa. Ao proceder desta forma, a Requerida incorre em manifesto erro de apreciação de facto e de direito, o que não pode deixar de conduzir à ilegalidade da liquidação impugnada.
Acresce que, no caso em apreço, em face da prova produzida, conclui este Tribunal Arbitral que na situação sob a presente análise existe fundada dúvida quanto à qualificação e quantificação do facto tributário, por um lado, face às divergências concetuais na base da análise efetuadas por ambas as partes para a quantificação do valor dos ativos biológicos e, por outro lado, face à insuficiência dos elementos para determinar com exatidão o valor dos ativos biológicos em causa e correspondentes depreciações tendo por base os normativos contabilísticos aplicáveis.
Assim:
Nos termos do artigo 100º nº 1 do CPPT, “1 - Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado.”.
Conforme afirma Jorge Lopes de Sousa, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário” Anot. e Coment., págs. 131 e ss., a propósito do artigo 100º do CPPT, “No nº 1 do presente artigo estabelece-se o princípio de que as dúvidas sobre a existência e quantificação do facto tributário são valoradas a favor do contribuinte, conduzindo à anulação do acto impugnado. Trata-se da concretização prática da eliminação no domínio do contencioso tributário da presunção de legalidade dos actos da administração tributária, substituída por uma presunção de veracidade dos actos do cidadão-contribuinte, que foi anunciada no ponto 1. do preâmbulo do CPPT. Esta regra consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no art. 74º, nº 1 da LGT, em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Embora esta regra esteja prevista para o procedimento tributário, o seu conteúdo deve ser transposto para o processo judicial (…). Na verdade, a ponderação de interesses, baseada em regras da normalidade, que justifica a repartição do ónus da prova no procedimento tributário, é a mesma que se deve fazer no processo judicial, pelo que o critério de repartição do ónus da prova no procedimento tributário, é a mesma que se deve fazer no processo judicial, pelo que o critério de repartição deverá ser o mesmo, como impõe a coerência valorativa e axiológica imposta pelo princípio a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primordial da interpretação jurídica (art. 9º, nº 1, do CC). Com efeito, não se compreenderia que, com base num determinado critério sobre o ónus da prova, se levasse a administração tributária a praticar um acto de liquidação valorando contra o contribuinte uma situação de dúvida sobre factos por ele invocados (o que, à face do critério do art. 74º, nº 1, da LGT seria legal), para, depois, no processo judicial em que é impugnado esse acto se inverter o ónus da prova sobre os mesmos factos, levando o tribunal a decretar a anulação desse acto, por ilegalidade consubstanciada em erro sobre os pressupostos de facto, sem que sobrevivesse qualquer alteração da matéria de facto. Assim, pelo facto de o impugnante no processo de impugnação judicial surgir processualmente numa posição em que vem invocar vícios de um acto tributário, não se lhe deve imputar o ónus de prova de factos que não tinha de provar no procedimento tributário, designadamente o de provar que não se verificam os factos constitutivos dos direitos da administração tributária, factos estes cuja verificação competia provar a esta no procedimento tributário.”.
Com efeito, tal como afirma Elisabete Louro Martins, in “O Ónus da Prova do Direito Fiscal”; págs. 263 e seguintes, “Não obstante, se a falta de convicção do Tribunal sobre a existência ou sobre a quantificação do facto tributário, resultar da actividade probatória do Sujeito Passivo ou da falta de provas apresentadas pela Administração Fiscal, por aplicação do artigo 100º, nºs 1 e 2, do CPPT, o acto tributário deverá ser anulado, uma vez que os factos constitutivos do direito da Administração Fiscal de tributar não ficaram provados como impõe o artigo 74º, nº 1, da LGT e o princípio da legalidade, que irá igualmente impor que a dúvida seja resolvida contra a Administração Fiscal. Da aplicação do princípio do inquisitório ou da verdade material, bem como da aplicação do princípio da livre apreciação das provas pelo Tribunal, resulta que não valem no processo tributário as regras do “ónus da prova subjectivo” ou formal, que prevalecem nos processos regulados pelo princípio do dispositivo, uma vez que, tal implicaria que o processo judicial (tributário) fosse um processo de partes, e que o Tribunal estivesse vinculado ao pedido apresentado pelo Impugnante, o que conforme temos vindo a defender ao longo do nosso trabalho não acontece, embora só possa conhecer dos factos alegados pelo Impugnante e pela Administração Fiscal, nos termos expostos, considerando que a aplicação do princípio do inquisitório é mitigada pelo princípio do inquisitório, como já tivemos a oportunidade de concluir. As regras do ónus da prova subjectivo ou formal referem-se à parte onerada com a prova do facto que alega, sendo que por aplicação do artigo 342º, nº 1, do CC a parte que alega os factos constitutivos do direito que se arroga (o Autor) está onerada com a prova dos mesmo, cabendo à parte contrária (o Réu) a prova dos factos impeditivos, extintivos ou modificativos do direito da contra-parte. A regra referida é incompatível com o princípio do interesse público que prevalece no Direito Fiscal, e que determina que a própria Administração Fiscal enquanto entidade que visa a protecção do interesse público, deve praticar todas as diligências instrutórias essenciais à descoberta da verdade material antes mesmo de emitir o acto, devendo revogar o mesmo na sequência da notificação para apresentação de contestação caso comprove que o acto é ilegal. Não obstante, mesmo nos processos regulados pelo princípio do dispositivo, o ónus da prova é também entendido em sentido objectivo, o qual respeita às consequências da não realização da prova, isto é, às consequências da falta de convicção do Tribunal sobre os factos carreados para os autos pelas partes “non linquet”. Por aplicação das regras do ónus da prova objectivo, as situações de non liquet são resolvidas contra a parte onerada com a prova, de acordo com as regras do ónus da prova subjectivo dispondo o nº 3 do artigo 342º do CC em caso de dúvida, o facto deve ser considerado constitutivo, o que implicará que a prova deverá ser imposta à parte que alega o direito, nos termos do artigo 342º, nº 1, do Código Civil. Neste sentido, a natureza da ónus da prova que existe no processo judicial tributário é incompatível com as regras do ónus da prova subjectivo, uma vez que embora recaia sobre o Sujeito Passivo o ónus da prova dos factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pela Administração Fiscal, o Tribunal não pode não proferir decisão com base no facto de o Impugnante ou da Administração Fiscal não terem produzido provas sobre determinado facto, cabendo àquele órgão jurisdicional ordenar todos os meios de prova que sejam essenciais para a descoberta da verdade material, tendo o mesmo competência para conhecer de todos os factos com interesse para a causa que sejam conhecidos no âmbito das diligências instrutórias, nos termos expostos nos capítulos anteriores, independentemente de as mesmas terem sido requeridas pelo Impugnante ou pela Administração Fiscal, podendo as provas ser valoradas contra ou a favor de ambos os intervenientes, por aplicação do princípio da aquisição processual. Não obstante, existe no artigo 100º do CPPT uma regra do ónus da prova objectivo, que determina que em caso de dúvida insanável resultante da actividade provatória dos intervenientes no processo, o acto de liquidação deverá ser anulado, o que significa que o Tribunal deverá ficcionar que a Administração Fiscal não demonstrou os factos constitutivos do direito de tributar, regra que é justificada pelo princípio da legalidade e pelo princípio a prossecução do interesse público, que constituem os princípios basilares da actividade da Administração Fiscal, a qual não pode actuar como parte no processo. As regras do ónus da prova previstas no artigo 74º da LGT, as quais estivemos a analisar têm assim a natureza de regras do ónus da prova em sentido objectivo, na medida em que se pressupõe a repartição dos encargos de alegação e de prova nos termos do princípio da legalidade, sendo a Administração Fiscal onerada com a prova da existência e quantificação do facto tributário, e o contribuinte onerado com a prova dos factos extintivos, impeditivos ou modificativos do direito alegado por aquela, ou a prova dos factos constitutivos do seu direito, nas situações em que o mesmo invoque a seu favor um benefício fiscal, ou a existência de facturas usadas na dedução de custos ao lucro tributável ou na dedução do IVA suportado. Por aplicação do artigo 100º do CPPT, sendo o contencioso tributário um contencioso de legalidade e de prossecução do interesse público, o risco da falta de prova da existência e da quantificação do facto tributário tem de ser valorado contra a Administração Fiscal, que só pode actuar com base numa lei expressa, tendo uma margem razoável de certeza sobre a existência do facto tributário. É igualmente o princípio da legalidade e o princípio da prossecução do interesse público que justificam que a Administração Fiscal deva revogar o acto de liquidação na sequência da recepção da impugnação judicial, nas situações em que resulte dos actos que o acto é ilegal. A aplicação das regras do ónus da prova objectivo irá assim depender de valorações normativas das situações em causa na situação concreta, sendo exigível ao Tribunal que aprecie as provas apresentadas de acordo com critérios de normalidade, e com critérios de experiência comum, tendo em consideração as situações concretas e o enquadramento socioeconómico dos Impugnantes, sejam eles pessoas singulares ou pessoas colectivas. Trata-se de apreciar a conformidade legal do acto tributário com o ordenamento jurídico, e o respeito do interesse público, assumindo neste sentido particular importância o princípio da legalidade na vertente de preferência de lei, suportando a Administração Fiscal o risco de falta de convicção sobre a existência ou quantificação do facto tributário. A mesma regra de ónus da prova objectivo deverá valer para as situações de inversão do ónus da prova, uma vez que, ainda que o contribuinte não demonstre o excesso na determinação da matéria colectável ou o cumprimento do princípio de plena concorrência, desde que surjam dúvidas fundadas sobre a existência e quantificação do facto tributário, a mesma deverá ser resolvida contra a Administração Fiscal.”
No mesmo sentido, “a aplicação do artigo 74° da LGT situa-se no âmbito do julgamento de facto e o artigo 100° do CPPT aplica-se no âmbito do julgamento de direito, devendo este ser interpretado no sentido de que para a anulação do acto tributário é suficiente que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a quantificação da matéria tributável (sem que se tenha que fazer a prova directa e cabal da inadmissibilidade do critério utilizado ou do exagero dessa mesma quantificação).” (cfr. Acórdão do STA, 2ª Secção, de 01.06.2011, Proc. 0211/11)[10].
Deste modo, e face a todo o exposto, deverá proceder o pedido arbitral, quer por a Requerida incorrer em erro de apreciação de facto e de direito, quer por fundada dúvida quanto à qualificação e quantificação do facto tributário.
B.4. Questão da ilegalidade da correção ao prejuízo fiscal declarado da sociedade D..., por custos escriturados (considerados para efeitos fiscais) e entendidos como não dedutíveis para efeitos de apuramento do resultado fiscal
A segunda questão de fundo a decidir nos presentes autos prende-se com a correção efetuada pela AT ao sujeito passivo D..., ao gasto contabilizado a título de juros de empréstimos obtidos, no valor de € 8.732,70, alegadamente não dedutível no período de tributação de 2010, porquanto, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, não é comprovadamente indispensável para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a IRC. Portanto, o thema decidendum remete-nos para a interpretação e aplicação, à data do período fiscal aqui em causa, da norma constante do artigo 23.º/1 do CIRC, onde se estabelecia o seguinte:
“Consideram-se gastos os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (…).”
No que respeita à correção ao prejuízo fiscal apurado pela D... os Serviços de Inspeção Tributária no RIT, apresentam a seguinte fundamentação:
“A D... registou, em 2010, na conta 6911500000-Juros-Out. Emp Obt, e considerou fiscalmente um total de € 8.732,70.
O referido valor é relativo à remuneração de dois empréstimos, designado por “Contrato de Suprimento”, outorgado em 2007-03-28 e 2008-09-23, entre a D... (mutuária) e a E... (mutuante), nos valores iniciais de € 490.000,00 e € 150.000,00, respetivamente, e cujos valores em dívida à data de 2010-12-31 são de € 410.000,00 e € 150.000,00, respetivamente.
Ora, conforme referido anteriormente a D... declarou rendimentos operacionais nulos em 2010, resumindo-se os rendimentos do período a € 30,65, relativos a juros de depósitos bancários.
E ainda que se admita que existem certos encargos de natureza administrativa e fiscal que têm que ser satisfeitos, verifica-se uma total desproporcionalidade entre o valor global desses encargos e os montantes dos empréstimos contraídos.
Face ao exposto, o gasto contabilizado a título de juros por empréstimos obtidos, no valor de € 8.732,70, não é dedutível para efeitos de determinação do resultado fiscal do ano de 2010, porquanto, conforme dispõe o nº 1 do art. 23º do CIRC, não é comprovadamente indispensável para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a IRC, pelo que que promoverá à seguinte correção”.
Portanto, a questão que se coloca nos presentes autos é a de saber se o facto da D... ter apresentado rendimentos operacionais nulos, ou existir uma alegada desproporcionalidade entre os valores dos encargos suportados ou empréstimos contraídos é fundamento, tout court, para se concluir pela indispensabilidade do gasto.
Conforme consta dos autos, concretamente do relatório de inspeção tributária ao exercício de 2011, foram efetuadas aos exercícios de 2007 a 2009 correções com base nos mesmos factos e fundamentos em que se baseia a decisão do projeto de correções do relatório de inspeção, elaborado para o exercício de 2010. Nessa altura, isto é, nos exercícios de 2007 a 2009, os SIT concluíram, tal como no presente RIT, pela não aceitação como custo fiscal o montante dos encargos financeiros relativos à remuneração de um empréstimo obtido da empresa E..., S.A..
Relativamente aos exercícios de 2007 e 2008, tal correção foi contestada através de Reclamação Graciosa e Recurso Hierárquico, os quais foram objeto de indeferimento, tendo o sujeito passivo apresentado dois pedidos de constituição de Tribunal Arbitral em matéria tributária e pedidos de pronuncia arbitral sobre as liquidações adicionais de IRC relativas a esses mesmos exercícios, os quais correram os seus termos sob os processos n.º 85/2014-T e processo n.º 466/2017-T.
A propósito da questão que aqui nos ocupa, a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 466/2017-T, concluiu nos seguintes termos:
“(…) não há razão objetiva para não aceitar a dedutibilidade dos juros pagos, nos termos do artigo 23º/1 do CIRC. Não se verifica aqui a concorrência entre finalidades económicas e fiscais que normalmente conduz à aplicação do teste do principal propósito da transação (principle purpose test - PPT).”
Também aqui acompanhamos, por concordância, com os respetivos fundamentos, as decisões proferidas no processo arbitral n.º 85/2014-T, de 17-09-2014 e no processo arbitral n.º 466/2017-T, de 12-03-2018, sobre as quais não se vê razão para ter diferente entendimento.
***
Pelo que fica exposto, conclui-se que a liquidação de imposto em causa carece de base legal, o que tem como consequência a anulação da mesma.
Do pedido de indemnização por garantia indevida
A Requerente prestou garantia para suspender a execução fiscal n.º ...2015..., instaurada para cobrança coerciva das quantias liquidadas e pede indemnização, ao abrigo do disposto no artigo 53.º da LGT.
O artigo 171.º do CPPT estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».
Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação.
O pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.
O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do artigo 53.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 53.º
“Garantia em caso de prestação indevida
1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.
2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.
3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.
4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.”
No caso em apreço, ocorreu revogação do ato impugnado o que tem ínsito o reconhecimento de um vício de violação de lei.
Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pela garantia prestada. Não havendo elementos que permitam determinar o montante exato da indemnização, a condenação terá de ser efetuada com referência ao que vier a ser liquidado em execução do presente acórdão, de harmonia com o preceituado no artigo 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
Demais questões suscitadas nos autos
As Demais questões suscitadas incidentalmente nos autos pela Requerente, designadamente, quanto ao facto de a desconsideração fiscal do gasto na esfera da D... sem que seja efetuada a correspondente correção ao nível da sociedade E..., configurar uma dupla tributação, ficam prejudicadas pela procedência quanto ao mérito do pedido, nos termos mencionados.
IV - DECISÃO
Nos termos expostos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
-
Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, declarar ilegais e anular, por vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito:
-
O ato de indeferimento do Recurso Hierárquico sob o processo n.º ...2017..., com as legais consequências;
-
A liquidação adicional de IRC n.º 2014..., relativa ao ano de 2010;
-
Condenar a Requerida no pagamento de indemnização pela prestação de garantia indevida.
V – VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o acima explanado, é fixado o valor do processo no montante de € 167.862,42.
Notifique-se.
Lisboa, 11 de abril de 2023
O Tribunal Arbitral Coletivo,
Fernanda Maçãs (Presidente)
Óscar Barros (Árbitro Adjunto-relator)
Henrique Fiúza (Árbitro Adjunto)
Com declaração de Voto de Vencido
DECLARAÇÃO DE VOTO DE VENCIDO
A presente declaração de voto de vencido deve-se à minha total discordância com a Decisão Arbitral, não me revendo na fundamentação nem na deliberação tomada, por maioria, emitida no âmbito do Processo nº 38/2022-T, no que respeita à pedida anulação da correcção fiscal acrescida ao lucro tributável no valor de €605.563,55, com referência às depreciações de activos biológicos, correspondentes às vinhas propriedade da C..., cujo gasto não se encontra previsto nas depreciações aceites fiscalmente, referentes ao exercício de 2010.
O Tribunal Arbitral, que teve como Presidente a jurista Conselheira Fernanda Maçãs e que teve como Árbitro Adjunto o contabilista Óscar Barros, que foi também o relator, desconsiderou evidências e provas apresentadas pela Requerida, bem como a sua argumentação jurídica, e valorizou alegações não comprovadas da Requerente, conduzindo a uma decisão que enferma de erro de julgamento.
A principal questão a decidir no presente processo prende-se com os ajustamentos de transição na passagem do sistema de contabilidade baseado nos Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites (PCGA), comummente designado por Plano Oficial de Contabilidade (POC), para o novo Sistema de Normalização Contabilística (SNC) ou para as Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) à data de 1 de Janeiro de 2010, resultantes da valorimetria dos Activos Biológicos de produção designados “Vinhas”.
À data referida, as entidades colectivas de carácter empresarial, deveriam, no balanço de abertura e nas primeiras demonstrações financeiras elaboradas de acordo com as normas do SNC ou as NIC, proceder às necessárias reclassificações e remensurações impostas pela mudança de sistema contabilístico, nomeadamente:
a) Reconhecer todos os activos e passivos cujo reconhecimento seja exigido pelas normas do SNC/NIC;
b) Não reconhecer ou desreconhecer itens como activos e passivos se as normas do SNC/NIC não permitirem esse reconhecimento;
c) Reclassificar itens que reconheça segundo os princípios contabilísticos geralmente aceites anteriores (PCGA) como um tipo de activo, passivo ou componente do capital próprio, mas que são um tipo diferente de activo, passivo ou componente do capital próprio segundo as normas do SNC/NIC; e
d) Aplicar as normas do SNC/NIC na mensuração de todos os activos e passivos reconhecidos.
Assim, à data de 1 de Janeiro de 2010, a Requerente deveria ter procedido à abertura do balanço de acordo com as normas do SNC/NIC, procedendo à reclassificação e remensuração dos itens que eram qualificados e/ou mensurados em SNC/NIC de forma diferente da respectiva qualificação e/ou mensuração de acordo com os PCGA/POC.
Estavam, à data, nesta situação, as vinhas propriedade da C..., sociedade integrante do grupo fiscal da Requerente, activos esses que em conformidade com os PCGA/POC foram tratados contabilística e fiscalmente como Imobilizações, e que em SNC/NIC passaram a ser qualificadas como Activos Biológicos (de Produção).
Esta alteração da nomenclatura foi acompanhada de uma nova qualificação e de alteração do critério de valorimetria aplicável, isto é, enquanto Imobilizações, as vinhas foram valorizadas ao custo de produção menos amortizações e depreciações acumuladas, mas enquanto Activos Biológicos passaram a dever ser mensurados pelo “justo valor”.
Nas operações de transposição do balanço elaborado de acordo com os PCGA/POC para o SNC/NIC a C... deveria ter reclassificado as vinhas de Imobilizações para Activos Biológicos e deveria ter atribuído a cada um dos activos biológicos “vinhas” o valor correspondente ao “justo valor” de cada um desses activos.
As diferenças de transposição do balanço elaborado de acordo com os PCGA /POC para o balanço elaborado de acordo com as normas do SNC/NIC, que fossem equiparáveis a rendimentos e a gastos, deveriam integrar a conta de Resultados Transitados ou outra equivalente, sendo o saldo negativo ou positivo desses ajustamentos integrado no lucro tributável dos exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, em partes iguais, um quinto em cada ano (período de tributação).
Porém, a C... manifestou-se incompetente para apurar o justo valor de cada vinha que faz parte do seu património, alegando falta de mercado e de elementos oficiais sobre transações comparáveis. Também não utilizou nem sequer se pronunciou sobre a solução prevista no §20 da NIC 41 ou “IAS 41 Agricultura”, para ultrapassar as alegadas dificuldades que encontrou na aplicação do “justo valor” na mensuração das suas vinhas.
A IAS 41 Agricultura prevê no seu § 20 o seguinte:
20. Em algumas circunstâncias, os preços ou valores determinados pelo mercado podem não estar disponíveis para um activo biológico na sua condição actual. Nestas circunstâncias, uma entidade usará o valor presente dos fluxos de caixa líquidos esperados do activo descontados a uma taxa antes dos impostos determinada pelo mercado corrente ao determinar o justo valor.
Embora seja pouco credível que a C..., a maior produtora vitivinícola de Portugal, não tivesse sido capaz de determinar o valor das suas vinhas – não tivesse sido capaz de saber quanto valiam as suas vinhas - ainda mais dificilmente se acreditará que ela não seja capaz de determinar o justo valor das mesmas, com base nas receitas que esperaria obter provenientes das colheitas futuras, descontadas de uma taxa de desconto apropriada ao apuramento do valor à data da transição, para assim obter o “valor actual” das vinhas à data de 1 de Janeiro de 2010.
O que é facto é que a C... não valorizou as suas vinhas pelo justo valor dos activos em conformidade com o que lhe era imposto pela IAS 41 Agricultura.
Ao invés de mensurar os activos biológicos “vinhas”, a inscrever no seu balanço de abertura à data de 1 de Janeiro de 2010 pelo modelo do “justo valor” conforme lhe era imposto pela IAS 41 Agricultura, em especial pelo seu § 30, a Requerente entendeu apurar o valor usando uma “metodologia” que não está de acordo com o citado §30 da IAS 41.
Determina o referido parágrafo que um activo biológico deve ser mensurado pelo seu justo valor. Determina ainda esse §30, que sendo refutada a possibilidade de o activo biológico ser mensurado pelo justo valor, nesse caso, esse ativo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada. Não estando prevista na Norma qualquer outra hipótese para a mensuração de um activo biológico.
Ora, não tendo o cálculo efectuado pela Requerente suporte na IAS 41 Agricultura, não correspondendo a uma solução prevista noutra qualquer norma contabilística ou legal, a metodologia e os resultados apresentados pela Requerente teriam de ser rejeitados pelo Tribunal Arbitral por não terem qualquer suporte normativo ou legal.
Não satisfeita com o seu “método” e com o claro o incumprimento das normas estabelecidas, a Requerente veio simultaneamente alegar que o activo biológico a ser inscrito na sua contabilidade em 1 de Janeiro de 2010 era a “videira” e não a “vinha”, era a parte e não o todo.
A C... veio alegar à Inspecção Tributária que no processo de apuramento do valor do activo biológico vinha, era seu entender que o activo biológico em causa não era a vinha mas a videira.
Assim, com referência à data de 1 de Janeiro de 2010, os activos biológicos a inscrever no balanço da sua participada C... eram apenas as videiras e não as vinhas, sendo os restantes custos que compunham o activo imobilizado “vinha” em POC alegadamente referentes a outros activos tangíveis e intangíveis em SNC/NIC.
No seguimento de tal alegação, e tendo-se assumido incapaz de mensurar as vinhas (ou as videiras como defendeu) ao justo valor, seria de esperar que a C... desdobrasse os valores que compunham os custos de produção das suas vinhas apurados de acordo com a sua contabilidade em POC, dividindo os diversos custos suportados até 31 de Dezembro de 2009 pelos alegados activos biológicos videiras e pelos alegados outros activos.
Claro que era também esperado que tudo fosse feito de acordo com os registos contabilísticos e os documentos de suporte da contabilidade da C... .
Porém, não foi isso que aconteceu.
Ao invés de desintegrar o valor do custo de cada vinha à data de 1 de Janeiro de 2010 em duas ou mais parcelas: activo biológico “videiras”; activo fixo tangível, activo intangível e outros eventuais activos, a Requerente resolveu utilizar uma metodologia sem suporte nas normas contabilísticas nem nas fiscais, usando estimativas que, alegadamente, pretendiam apurar o peso relativo das videiras em relação ao custo total das vinhas, mas não tendo em consideração nesse trabalho os alegados ativos fixos tangíveis, e os ativos intangíveis, isto é, as alegadas infraestruturas, equipamentos, licenças e direitos, de que adiante se discutirá.
Ou seja, no processo de cálculo usado pela Requerente para a divisão do custo das vinhas constante na contabilidade em 31 de Dezembro de 2019, não foram incluídos os ativos que alegadamente integravam o valor dessas vinhas na referida data. Não sendo entendível como é que se pode pretender dividir o custo global das vinhas nas várias partes que alegadamente o compõe, quando na equação não entram os valores dos custos referentes aos alegados activos a expurgar do activo biológico vinha.
Não faz sentido.
Para melhor entendimento do exposto, ficam abaixo os quadros apresentados pela Requerente e publicados na página 68 da Decisão Arbitral.
Com base em diversas estimativas, a Requerente construiu um mapa onde apurou que as videiras correspondiam, em média, a 6,45% do custo total das vinhas, concluindo que as videiras, activos biológicos a reconhecer como tal na contabilidade em SNC/NIC, tinham um custo (estimado) de €653.562,26. (ver págs. 24 e 25 da Decisão Arbitral)
Nada dizendo sobre a identificação nem os valores atribuídos aos outros activos alegadamente nascidos da divisão das vinhas em diversos activos, momeadamente, as alegadas infraestruturas, os alegados equipamentos, a alegada maquinaria, assim como as licenças e direitos.
Faz-se notar que o montante do custo das vinhas da C... inscritas na sua contabilidade à data de 31 de Dezembro de 2009 era de €12.047.854,23 e as depreciações acumuladas eram no montante de €3.038.212,68, sendo o custo líquido das vinhas de €9.009.641,52.
Uma enorme diferença entre o valor constante da contabilidade POC e o apurado pela Requerente.
Dado ter trabalhado com valores de proveniência desconhecida, quando perguntado pela Inspecção Tributária sobre a documentação de suporte dos números e realidades inscritas nos quadros, a resposta dada pela Requerente foi que esses valores foram transmitidos de forma verbal pelo departamento de viticultura da C..., sem qualquer base documental. Tal informação foi confirmada no Pedido de Pronúncia Arbitral e pode ser lida na página 69 da Decisão Arbitral.
No exercício dos seus direitos, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa na qual foi referido, conforme transcrição abaixo, que “no exercício de 2010 a C... possuía ativos biológicos (vinhas) mensuradas ao respetivo custo histórico que se encontravam registadas pelo montante de €735.945,07 tendo apurado naquele exercício depreciações no montante de €73.626,44 (conta 6441000000 - Amortizações Ativos Biológicos). (Ver pág. 20 e 21 da Decisão Arbitral - Sublinhado nosso)
No seguimento da afirmação acima, foi apresentado na Reclamação Graciosa um quadro com vários activos (5) cujo total do imobilizado ascendia a €16.871.137,74, conforme transcrição abaixo. (ver pág. 16 e 21 da Decisão Arbitral)
Aquando da recolha de elementos para apreciação da reclamação, a Inspecção Tributária pôde verificar que:
-
“As classes de Activo Fixo identificadas no quadro acima apresentado não estão evidenciadas no Balancete de razão do período de 2010 apenas consta a rubrica contabilística com a referência “SFRM/1102100000 – Infraestrut. Vinha - CH no montante de €16.679.829,08; (Sublinhado e ênfase nosso)
-
Relativamente às contas de depreciação e amortização registadas no Balancete de Razão do período 2010 encontram-se evidenciadas:
“SFRM/6423000000 - Amort – Infra. Vinha CH” - montante de €662.390,05; e
”SFRM/6441000000 - Amortiz AcBiol Acti” - montante de €73.626,44
Assim se tendo verificado que entre as alegações feitas pela Requerente e os registos constantes da sua contabilidade não há correspondência, ficando por demonstrar as alegações por si produzidas.
Ao contrário do que a Requerente afirma, a rubricas que constam do Mapa de Amortizações e Depreciações que integrava o Dossier Fiscal do exercício de 2010 com a referência 0050 – Vinhas do DR n.º 25/2009 não foram, como a Requerente alega “agora imputadas a diversas classes de imobilizado conforme apresentado”, uma vez que aquele Mapa listava vinhas cujo valor total de aquisição/produção ascendeu a €12.047.854,23 e as depreciações do exercício totalizavam €646.514,58, sendo que no novo mapa dos activos alegadamente nascidos da divisão do activo vinhas, esses novos activos totalizam o custo (estimado) de €16.871.137,74 e as amortizações do exercício totalizam €754.152,21, não podendo portanto a Requerente provar que tratou os mesmos activos e os mesmos valores de custos e de depreciações.
No seguimento da discrepância de designações e de valores, a IT solicitou as “fichas de imobilizado” identificadas com o código 050-Vinhas de forma e apurar a verdadeira natureza dos bens e assim validar a respectiva classificação, de modo a identificar se de facto respeitam a vinhas e a custos de preparação das mesmas ou se incluem conforme referido pela C..., equipamentos, infraestruturas e maquinaria.
Em resposta ao solicitado, a Requerente apresentou uma listagem através da qual não seria possível à IT identificar quaisquer activos fixos tangíveis, dado todos os itens registados desde 1974 até 2009 estarem à data em que foram apresentados, identificados como “Infraestruturas de Vinhas” e o grupo de itens classificados como “Ativos Biológicos” serem todos com data de aquisição de 2010. Na descrição de todos os activos constavam descritivos como “vinhas”, “plantação de vinhas”, “trabalhos e plantação”, não constando qualquer termo que pudesse ser considerado como sendo referente a máquinas, equipamentos, infraestruturas ou outros equivalentes. (sublinhado nosso)
Parece claro que o objetivo da IT ao solicitar a informação foi bem sucedida, pois permitiu a verificação de que na descrição dos ativos nos registos contabilísticos não havia referências a quaisquer máquinas, equipamentos ou infraestruturas, apenas havia descritivos como “vinhas”, “plantação de vinhas” e a “trabalhos de plantação”.
Perante a insistência da IT, a C... reconheceu ser impossível efectuar de forma imparcial a separação/discriminação do valor respeitante ao ativo biológico e a outros, tendo apresentado por escrito os seguintes esclarecimentos:
“Tendo em conta que não existia informação histórica disponível que permitisse de forma organizada e sistematizada a realização de uma segregação correta para a generalidade dos Terrenos e Recursos Naturais do custo da planta (videira) a empresa adotou a seguinte metodologia de segregação inicial dos Ativos Biológicos de acordo com os novos normativos:
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custo das plantas Videira no mercado à data de 2010;
-
o total de pés de Videira planta e os pés de Videira por hectare de vinha;
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os custos da planta por hectare;
-
os custos por hectare de preparação do terreno de plantação do terreno e de exploração anual;
-
o valor do ativo total por hectare que resulta do somatório do custo da planta com o custo de preparação do terreno de plantação do terreno e da exploração anual.”
Os esclarecimentos prestados pela Requerente, são o reconhecimento da sua impossibilidade em dividir o custo das vinhas em custos das videiras e em custos de outros alegados activos e também que o exercício que a Requerente fez para tentar dividir o custo da vinha em custo das videiras e custo de outros alegados activos foi realizado com base em estimativas sem qualquer suporte documental ou prova irrefutável, mensuração essa que não tem por base qualquer norma contabilística ou legal que a tivesse permitido.
No seguimento da leitura dos esclarecimentos dados pela Requerente, não pode deixar de ser expressado o espanto com que se fica, quando o Tribunal Arbitral não se pronuncia sobre essa declaração efectuada no âmbito dos esclarecimentos por si prestados à Inspecção Tributária.
Apesar da importância da informação dada e da confissão concedida, assumindo a Requerente que não existia informação histórica disponível que permitisse de forma organizada e sistematizada a realização de uma segregação correta para a generalidade dos Terrenos e Recursos Naturais do custo da planta (videira) e que por esse motivo a Empresa adoptou uma metodologia de segregação inicial dos activos biológicos, espante-se, de acordo com os novos normativos, o Tribunal Arbitral não se pronuncia sobre os esclarecimentos prestados, por escrito, nem sobre a alegação de a metodologia estar de acordo com os novos normativos, (que claramente não está), nem dessa informação o Tribunal tira quaisquer ilações.
Claro que, como em todas as suas alegações, a Requerente alega mas não prova, como é que a alegada metodologia de segregação inicial dos Ativos Biológicos está de acordo com os novos normativos. Nem o Tribunal Arbitral se preocupou em ratificar ou em negar a validade de tal alegação.
Pode, sem a menor dúvida, afirmar-se que a metodologia seguida pela Requerente de segregação inicial dos Ativos Biológicos não está de acordo com os novos normativos, leia-se de acordo com as Normas Internacionais de Contabilidade, em particular com a IAS 41 Agricultura.
E como o Tribunal Arbitral não faz qualquer comentário de ratificação ou condenação dos esclarecimentos prestados à IT aquando da recolha de elementos para a decisão sobre a Reclamação Graciosa, fica sem se saber se os esclarecimentos prestados pela Requerente, apesar de valiosos para o reconhecimento da razão a quem no presente processo a tiver, bem como para o suporte factual e legal da decisão, deve entender-se que o Tribunal Arbitral comete um erro de (não) apreciação de prova, o que implica erro de julgamento.
Porque na IAS 41 Agricultura, nomeadamente no seu §30, ficou determinado que, quando uma entidade refutar a possibilidade de os activos biológicos poderem ser mensurados pelo justo valor, só lhe resta a possibilidade de mensurar esses mesmos activos pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada.
Nunca é demais reler o §30 da IAS 41 Agricultura, que de seguida se reproduz:
30. Há um pressuposto de que o justo valor pode ser mensurado com fiabilidade para um activo biológico. Contudo, esse pressuposto pode ser refutado apenas no reconhecimento inicial de um activo biológico relativamente ao qual os preços ou valores determinados pelo mercado não estejam disponíveis e relativamente ao qual as estimativas alternativas do justo valor estão determinadas como sendo claramente pouco fiáveis. Nesse caso, esse activo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada. (sublinhado nosso)
E, para que não restem dúvidas, o custo, a depreciação acumulada e a imparidade acumulada, são aquelas que constam da contabilidade da Requerente e dos seus documentos de suporte, sendo esta a fonte dos respectivos valores. A “metodologia” e as estimativas feitas pela Requerente não têm qualquer suporte nas normas ou na lei e, por tal motivo, deveria ter sido desconsiderada pelo Tribunal Arbitral.
Continuando,
DEPRECIAÇÕES DOS ACTIVOS BIOLÓGICOS “VINHAS” DE ACORDO COM O CUSTO DAS VIDEIRAS ESTIMADO PELA REQUERENTE
A tudo o que ficou atrás dito, podia ainda afirmar-se que, ainda que a Normalização Contabilística entrada em vigor à data de 1 de Janeiro de 2010 permitisse que o cálculo do activo biológico vinha (ou videira) fosse efectuado da forma defendida pela Requerente, o que não se concede, sendo alegadamente de €73.626,44 o valor da das depreciações correspondentes às videiras, que não são aceites como gasto para efeitos fiscais por falta de previsão legal, haveria de ser acrescido ao Lucro Tributável do exercício de 2010 o valor de €31.675,41, correspondente à diferença entre o valor das depreciações €73.626,44 “apurado” pela Requerente pelo “método estimativo” e que corresponde às depreciações não aceites como gasto para efeitos fiscais no valor de €40.951,03, já acrescido pela Requerente.
DEPRECIAÇÃO DOS “ACTIVOS BIOLÓGICOS EM OPERAÇÃO – VINHAS”
À correcção ao Lucro tributável de 2010 atrás referida, no caso de o modelo de apuramento do valor das “vinhas/videiras” estar conforme as normas contabilísticas e legais em vigor à data, o que não se concede, haveria ainda que acrescer mais €70.639,47 correspondente ao valor das depreciações de “activos biológicos em operação – vinhas”, activos biológicos imaturos ou juvenis (nomenclatura da IAS 41 Agricultura), mensurados pela requerente em €717.006,48. Porque as depreciações dos activos biológicos vinhas não eram um gasto enquadrado nas depreciações aceites como gastos fiscais no exercício de 2010.
E não são aceites como gastos para efeitos ficais por duas razões.
A primeira, porque a eventual contabilização de depreciações dos activos biológicos “vinhas”, no exercício de 2010, não era aceite como gasto para efeitos ficais, por a legislação aplicável à data não prever esse gasto.
A segunda, porque os “activos biológicos em operação – vinhas” são activos que ainda não entraram em funcionamento, ainda não entraram em produção, porque ainda não estão nas condições necessárias para serem capazes de produzir da forma pretendida pela gerência.
Aliás, é a própria C... que nas notas explicativas do Anexo às Demonstrações Financeiras de 2010 que menciona o seguinte: “Os ativos biológicos em desenvolvimento correspondem a plantações recentes de vinha as quais não se encontram em estado de produção (usualmente com menos de 3 anos de vida). A depreciação dos ativos biológicos inicia-se a partir do momento em que a vinha está em condições de produção o que usualmente ocorre no final do terceiro ano de desenvolvimento do ativo sendo depreciado em 20 anos.”
E não tendo entrado em produção nos locais e em condições capazes de produzir da forma pretendida pela gerência, esses bens só podem ser depreciados a partir da sua entrada em funcionamento ou utilização.
Portanto, em conformidade com o racional da normalização contabilística (NIC) a C... diz uma coisa no Anexo às Demonstrações Financeiras, mas faz outra coisa na Reclamação Graciosa quando se trata da sua defesa em procedimento tributário.
Estabelece o Código do IRC, Subsecção III (Depreciações e amortizações), o seguinte:
Artigo 29.º - Elementos depreciáveis ou amortizáveis
1 — São aceites como gastos as depreciações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os activos fixos tangíveis, os activos intangíveis e as propriedades de investimento contabilizadas ao custo histórico que, com carácter sistemático, sofram perdas de valor resultantes da sua utilização ou do decurso do tempo.
Artigo 30.º - Métodos de cálculo das depreciações e amortizações
1 - ...
4 - Salvo em situações devidamente justificadas aceites pela Direcção-Geral dos Impostos, em relação a cada elemento do activo deve ser aplicado o mesmo método de depreciação ou amortização desde a sua entrada em funcionamento ou utilização até à sua depreciação ou amortização total, transmissão ou inutilização.
Artigo 34.º - Gastos não dedutíveis para efeitos fiscais
1 — Não são aceites como gastos:
-
As depreciações e amortizações de elementos do activo não sujeitos a deperecimento;
Por sua vez, o Decreto-Regulamentar n,º 25/2009 de 14 de Setembro, estabelece que:
Artigo 1.º - Condições gerais de aceitação das depreciações e amortizações
1 - Podem ser objecto de depreciação ou amortização os elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os activos fixos tangíveis, os activos intangíveis e as propriedades de investimento contabilizadas ao custo histórico que, com carácter sistemático, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização ou do decurso do tempo.
2 - Salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Direcção-Geral dos Impostos, as depreciações e amortizações só são consideradas:
a) Relativamente a activos fixos tangíveis e a propriedades de investimento, a partir da sua entrada em funcionamento ou utilização;
A ser válida a “metodologia” usada pela Requerente, o que não se concede, haveria de acrescer ao lucro tributável do exercício de 2010 mais €70.639,47 referente a depreciações não aceites como gasto fiscal por serem referentes a activos biológicos cujas depreciações não estavam enquadradas na lista de gastos aceites para efeitos do cálculo do lucro tributável.
Mas também em relação a esse aspecto da avaliação da prova apresentada e da consequente inclusão na Decisão Arbitral, o Tribunal não se pronuncia sobre ela, tendo como consequência o deficiente apuramento do lucro tributável a corrigir no caso de a metodologia da Requerente ser considerada válida (o que não se concede) e consequente erro no cálculo do imposto corrigido, se a tal houvesse lugar.
APURAMENTO DO VALOR DOS ACTIVOS BIOLÓGICOS E DAS RESPECTIVAS DEPRECIAÇÕES: METODOLOGIA DESPROVIDA DE RACIONAL
Ainda que o Tribunal Arbitral entendesse que o activo biológico “vinha" pudesse ser mensurado pelo custo estimado, como a Requerente alega, o que não se concede, as diversas estimativas efetuadas pela requerente são de tal forma desprovidas de racional que não poderiam, em caso algum, ser levadas em consideração, isto é, a “metodologia” e os resultados dela resultantes deveriam necessariamente ter sido desconsiderados pelo Tribunal Arbitral.
Aqui ficam alguns exemplos do irracional da argumentação efectuada e invalidade dos resultados obtidos pela Requerente no processo de apuramento do custo das videiras ao longo da acção de inspeção tributária, da Reclamação Graciosa e do Pedido de Pronúncia Arbitral:
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Apuramento do custo das videiras
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A Requerente acresceu no cálculo do lucro tributável de 2010 depreciações não aceites como gasto no valor de €40.951,03 o que permite pressupor que o activo biológico “vinhas/videiras” teria o valor de €819.020,60, partindo do princípio que a Requerente utilizou a taxa máxima de depreciação das vinhas de 5% (ver pág. 44 da Decisão Arbitral);
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Durante a inspeção tributária a requerente alegou que o ativo biológico “videiras” tinha o valor de €653.562,26 (ver pág. 24 e 25 da Decisão Arbitral);
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Durante a recolha de elementos para apreciação da reclamação Graciosa o ativo biológico “videiras”, constante do mapa apresentado, tinha valor de €735.945,07 (depreciação €73.626,44). (ver pág. 16, 20 e 21 da Decisão Arbitral), valores tão diferentes que retiram todo o crédito ao trabalho realizado pela Requerente;
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No apelidado “Quadro 7 Mapa Resumo” constante da página 14 desta declaração de voto, pode ler-se que todas as vinhas, ou melhor, todas as videiras propriedade da C... acumuladas (compradas e plantadas) ao longo da sua vida, foram mensuradas em €735.945,07, pela metodologia seguida pela Requerente.
Contudo, conforme se pode confirmar nesse mesmo mapa, só as vinhas consideradas activos biológicos imaturos ou juvenis, mencionadas como “Ativos Biológicos em Operação – Vinhas” foram mensuradas em €717.005,48.
Centenas de hectares de vinha adquiridas e plantadas ao longo de décadas pela C... tem um custo estimado de €735.945,07 e as vinhas recentes ainda sem entrarem em produção, tem um custo de €717.005,48.
Perante os valores apresentados, fica claro que o Tribunal Arbitral não poderia ter tido em consideração, isto é, deveria ter desconsiderado quer a metodologia seguida quer os resultados obtidos e apresentados pela Requerente para apurar o valor dos activos biológicos vinha/videiras a inscrever no balanço de abertura de 2010.
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Aquando do apuramento do valor do custo do activo biológico “videiras” no quadro transcrito na página 25 da Decisão Arbitral, a Requerente apura o custo do activo biológico referente a diversas quintas cujos valores são impossíveis de corresponderem à realidade.
Se não, vejamos
Com referência à vinha da Quinta ... foi apurado o custo no valor de €558,27, quando a quinta tem 24,4 ha de vinha e 61.463 pés de videira;
Com referência à vinha da Quinta do ... foi apurado o custo de €812,94, quando a quinta tem 21,84 ha de vinha e 70.041 pés de vinha;
Com referência à Quinta de ...+... foi apurado o custo de €1.088,45, quando a quinta tem 62,31 ha de vinha e 154.273 pés de vinha.
A soma do custo das vinhas das 3 Quintas ascende a €2.459,66.
Se, para se fazerem testes aos resultados apresentados, for utilizado o valor do custo de cada pé de videira usado no mapa elaborado pela Requerente (€0,80), só os pés de videira existentes nestas três quintas teriam o custo de €228.621,60 = (258.777 pés x €0,80 cada = €228.621,60);
Ora, entre o valor apurado pela Requerente (€2.457,66) e o custo dos pés de videira existentes nessas 3 Quintas em 2010 (€228.621,60) vai uma diferença abissal que é por si só demonstrativa a invalidade do trabalho de “apuramento” do custo das videiras que a Requerente realizou.
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Utilizando ainda o valor do custo de cada pé de vinha (€0,80) para a mensuração do custo da vinha implantada em todas as quintas da C..., considerando que, de acordo com o seu mapa, a sociedade tem 2.339.177 pés de vinha (ver quadro pág. 24 da Decisão Arbitral), sem ter em consideração todos os demais custos suportados pela Sociedade com a plantação das vinhas/videiras, este activo biológico teria o custo nunca inferior a €1.871.341,60 = (2.339.177 pés x €0,80 cada).
Como é fácil de ver, este valor está muito longe dos obtidos pela Requerente no seu mapa apresentado aquando da acção de inspecção e da recolha de elementos para a tomada de decisão sobre a Reclamação Graciosa, referidos em 1. acima;
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O Quadro Resumo, transcrito na página 16 da Decisão Arbitral, no qual a Requerente vem alegadamente separar as rubricas que constam do Mapa de Amortizações e Depreciações da C... com o código 0050 do DR nº 25/ 2009 Vinhas, não pode ser considerado pelo Tribunal Arbitral, porque não trata, no antes e no depois, a mesma realidade.
Os totais do Mapa de Amortizações e Depreciações do exercício de 2010, constante do Dossier Fiscal, referente às vinhas, são os a seguir indicados:
Valor de aquisição ----------------------------------- €12.047.854,23
Amortizações de exercícios anteriores ------------ € 2.389.698,10
Amortizações do exercício ------------------------- € 646.614,58
Amortizações acumuladas -------------------------- € 3.036.212,68
Por sua vez, o Quadro Resumo apresentado pela Requerente transcrito na página 16 da Decisão Arbitral, respeitante às Amortizações e Depreciações do exercício de 2010, apresenta os totais os a seguir indicados:
Total imobilizado ------------------------------------ €16.871.137,74
Amortizações do ano -------------------------------- € 754.152,21
Ora, o Quadro Resumo apresentado pela Requerente transcrito na página 16 da Decisão Arbitral não pode ser resultado de um alegado trabalho de “separação das rubricas que constam do Mapa de Amortizações e Depreciações da C...” com referência ao exercício de 2010, dada a divergência dos valores apresentados.
Aqui chegados, não restam dúvidas que deveria o Tribunal Arbitral ter desconsiderado a “metodologia” apresentada pela Requerente para a mensuração dos “activos biológicos vinhas”, por um lado por essa metodologia não estar prevista nem nas normas nem na lei e por outro lado por não ser racional nem ter apurado resultados credíveis, como ficou demonstrado.
E ao levar em consideração o modelo seguido e os resultados apurados pela Requerente, ou ao servir-se deles para alegar “fundada dúvida quanto à qualificação e quantificação do facto tributário”, o Tribunal Arbitral cometeu erro de apreciação de prova e decidindo com base nela, cometeu erro de julgamento.
ACTIVO INTANGÍVEL
O Tribunal Arbitral errou também quando, apoiando-se nas alegações da Requerente, acusa a AT de ter incluído no custo do activo biológico “vinhas/videiras” os activos intangíveis correspondestes a licenças e direitos, respeitantes às licenças de plantação (de vinha) que mais tarde se passaram a chamar direitos de plantação e que actualmente se denominam autorizações de plantação de vinha.(ver pág. 71 da Decisão Arbitral)
No já referido Quadro Resumo referente ao exercício de 2010, apresentado pela Requerente, foi inscrita uma rubrica designada por “Propriedade Industrial e outros direitos” (ver pág. 16 da Decisão Arbitral) à qual foi atribuído o total “Imobilizado” de €190.440,50, a que corresponderam “Amortização do ano” no valor de €14.949,46, montante supostamente referente a direitos de plantação de vinha .
A classe de activos onde se enquadra a alegada “Propriedade Industrial e outros direitos” é regulada pela IAS 38 Activos Intangíveis.
Determina o §4 da IAS 38 que “Ao determinar se um ativo que incorpore tanto elementos intangíveis como tangíveis deve ser tratado segundo a IAS 16 Activos Fixos Tangíveis ou como um ativo intangível segundo esta Norma, a entidade usa o julgamento para avaliar qual o elemento mais significativo.”
A Norma, ao apresentar exemplos refere que “Por exemplo, o software de computador de uma máquina-ferramenta controlada por computador que não funcione sem esse software específico é uma parte integrante do equipamento respectivo e é tratado como ativo fixo tangível. O mesmo se aplica ao sistema operativo de um computador. Quando o software não for uma parte integrante do hardware respectivo, o software de computador é tratado como um ativo intangível.”
Aplicando o referido §4 da IAS 38 (e os exemplos acima) à vinha, porque o elemento mais significativo não é o direito de plantação mas o custo das videiras e de todos os outros custos de implantação da vinha, nos termos do §4 da IAS 38, os custos suportados com a obtenção dos direitos deveriam ter sido incorporados no custo da vinha e não tratados como um activo intangível.
Até porque, de facto não o é.
Assim como o software que é o sistema operativo de um computador é custo de produção do computador, assim como o construtor civil tem de obter uma licença de construção para poder construir um edifício, e capitaliza esse encargo no custo de construção do prédio, também o viticultor tendo à data de suportar um gasto com a obtenção dos direitos de plantação (ou licenças de plantação), deve do mesmo modo incorporar esse gasto no custo de implantação das vinhas.
E não se diga que os gastos com os direitos de plantação são activos incorpóreos autónomos das vinhas que foram instaladas com o exercício dos respectivos direitos de plantação, e que, por isso, a correcção fiscal efectuada pela AT com referência à depreciação das vinhas peca por incumprimento da lei e das normas. O Tribunal Arbitral disse-o e, por isso, cometeu erro.
Se alguém defende, como o Tribunal Arbitral o faz, que os direitos de plantação são Activos Intangíveis, propõe-se, a quem assim entende, a leitura atenta da IAS 38 Activos Intangíveis.
Pese embora o §9 da IAS 38 refira a título de exemplo, entre muitos outros, as licenças como possíveis activos intangíveis, o §10 vem esclarecer que “nem todos os itens descritos no parágrafo 9 satisfazem a definição de um ativo intangível”
Para melhor se poder entender a problemática dos activos intangíveis “direitos de plantação de vinha”, transcreve-se de seguida o §10 da IAS 38:
10. Nem todos os itens descritos no parágrafo 9. satisfazem a definição de um activo intangível, i.e. identificabilidade, controlo sobre um recurso e existência de benefícios económicos futuros. Se um item que esteja dentro do âmbito desta Norma não satisfizer a definição de um activo intangível, o dispêndio para o adquirir ou gerar internamente é reconhecido como um gasto quando for incorrido. (Ênfase e sublinhado nosso)
Vejamos se os direitos de plantação cumprem os três requisitos.
Sendo o “direito de plantação” um recurso à disposição da Requerente, podendo usar o direito parcial ou totalmente, parece fácil de aceitar que ela tem controlo sobre o recurso (direito a plantar).
No caso de a Requerente ter exercido o direito de plantação na totalidade da área concedida e no prazo estabelecido, parece também fácil de aceitar que, já não os direitos mas a vinha instalada pela utilização dos respectivos direitos de plantação, irá proporcionar benefícios económicos futuros.
Quanto à terceira condição, para que o custo suportado com um direito de plantação possa ser considerado um activo intangível, a “identificabilidade”, estabelece o §11 da IAS 38 que “A definição de um ativo intangível exige que um ativo intangível seja identificável para o distinguir do goodwill”.
Por sua vez, o §12 da IAS 38 estabelece o seguinte:
Um activo satisfaz o critério da identificabilidade na definição de um activo intangível quando:
a) for separável, i.e., capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, seja individualmente ou em conjunto com um contrato, activo ou passivo relacionado; ou
b) resultar de direitos contratuais ou de outros direitos legais, quer esses direitos sejam transferíveis quer sejam separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações.
Ora, um direito de plantação de vinha, uma vez que foi usado na instalação de uma vinha, esse direito foi incorporado (foi gasto) na implantação da vinha e não poderá ser separado dela para ser vendido ou poder gerar outros benefícios económicos futuros.
O direito de plantação não cumpre o critério da identificabilidade, não podendo por isso ser qualificados como um activo intangível.
Para que não restem dúvidas sobre o assunto, propõe-se a leitura da seguinte determinação do §10 da IAS 38:
10. (...) Se um item que esteja dentro do âmbito desta norma não satisfizer a definição de um ativo intangível o dispêndio para o adquirir ou gerar internamente é reconhecido como um gasto quando for incorrido.
Concluindo, uma vez mais não se pode concordar com o Tribunal quando acusa a AT de incluir no custo de implantação das vinhas os direitos de plantação, reafirmando a alegação da Requerente no sentido de qualificar esses direitos com activos intangíveis, que se demonstrou não o serem.
RECONHECIMENTO PELA REQUERENTE DA IMPOSSIBILIDADE DE DIVIDIR O CUSTO DE IMPLANTAÇÃO DAS VINHAS ACUMULADO ATÉ 31 DE DEZEMBRO DE 2009 PELOS ACTIVOS BIOLÓGICOS E POR ALEGADOS OUTROS ACTIVOS
Por fim, é de salientar a passagem – transcrita na página 20 da Decisão Arbitral - da informação elaborada pela IT necessária à decisão da AT sobre a Reclamação Graciosa apresentada pela Requerente, que foi transcrita na página 23 da Decisão Arbitral e que abaixo se reproduz e sobre a qual foram já tecidas algumas considerações na parte inicial da presente declaração de voto.
É a própria Requerente que, na visita do inspector tributário aquando da recolha de elementos para a decisão sobre a Reclamação Graciosa, declara por escrito o seguinte:
“Tendo em conta que não existia informação histórica disponível que permitisse de forma organizada e sistematizada a realização de uma segregação correta para a generalidade dos terrenos e recursos naturais do custo da planta (videira) a empresa adotou a seguinte metodologia de segregação inicial dos ativos biológicos de acordo com os novos normativos:
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Custo das plantas de Videira no mercado à data de 2010;
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Nº de plantas existentes, nas áreas de vinhas da empresa à data de 01 de Janeiro de 2010, de acordo com os cadastros das vinhas;
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Valorização dos ativos biológicos planta viva Videira com base no produto dos: anteriores segregados pelas respetivas áreas vitivinícolas oficiais nessa data cadastros das Vinhas;
-
Ajustamento pela redução dos ativos fixos tangíveis terrenos e reforma e recursos naturais das áreas agrícolas ponderadas pelo peso do valor do Custo da Planta no total do Ativo.”
Ora, não querendo ou não podendo a Requerente proceder à transposição dos valores das vinhas no balanço elaborado de acordo com os PCGA/POC para o balanço de acordo com as normas do SNC/NIC, fazendo a reclassificação das vinhas das Imobilizações para os Activos Biológicos, pela mensuração pelo “justo valor” desses activos, restava-lhe fazer essa passagem mensurando esses activos pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada, nos termos do §30 da IAS 41 Agricultura.
Porque, como a Requerente reconheceu, não existia informação histórica disponível na C... que permitisse de forma organizada e sistematizada a realização de uma segregação correta para a generalidade dos terrenos e recursos naturais do custo da planta (videira), restava-lhe utilizar os dados retirados directamente da sua contabilidade e, na falta de melhor, transpor os saldos das contas “Vinhas” das Imobilizações (POC), para as contas (SNC) dos Activos Biológicos “Vinhas”.
A normalização contabilística internacional (NIC) não previa uma qualquer terceira via para a transposição de saldos do POC para o SNC/NIC.
Na mensuração dos activos biológicos, como é o caso das “vinhas/videiras”, ou a Requerente utilizava o justo valor ou utilizava o custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada.
A via escolhida pela Requerente, pela tentativa de apurar o custo das videiras pela utilização de estimativas grosseiras e sem racional, não cabe nos §10 a §30 do capítulo “Reconhecimento e Mensuração” da IAS 41 Agricultura, devendo por isso ser recusada a solução proposta pela Requerente por falta de suporte no normativo contabilístico internacional (NIC) ou na legislação que regulamentou a nova normalização contabilística.
Ao atribuir valor aos resultados apresentados pela Requerente no sentido de considerar como activo biológico as videiras ao custo estimado que apresentou (€735.945,07), quando a AT demonstrou que a simulação do preço das videiras apurado pela Requerente não tinha qualquer racional e que os resultados obtidos não eram indicadores fiáveis das depreciações a considerar como gasto contabilístico (€73.626,44), apresentado provas inequívocas da invalidade dos valores apurados, o Tribunal ao decidir ao contrário, praticou erro que incide sobre a própria actividade judicante do Tribunal, havendo por isso incorrido em erro de julgamento.
IMPOSSIBILIDADE EM MENSURAR AS VINHAS PELO JUSTO VALOR
Tendo-se reconhecido incapaz de proceder à mensuração das vinhas pelo justo valor, por motivos de falta de mercado e de elementos oficiais sobre transações comparáveis e também de não ter utilizado a hipótese prevista no §20 da IAS 41 Agricultura no sentido de usar o valor presente dos fluxos de caixa líquidos esperados do activo descontados a uma taxa antes dos impostos determinada pelo mercado corrente ao determinar o justo valor, restou à Requerente mensurar os activos biológicos pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada.
Para esse fim, estabelece o §33 da IAS 41 que “Ao determinar o custo, depreciação acumulada e perdas por imparidade acumuladas, uma entidade toma em consideração a IAS 2 Inventários, a IAS 16 Activos Fixos Tangíveis e a IAS 36 Imparidade de Activos.”
Dado os activos biológicos de produção serem activos produtores de inventários, a NIC a ter em consideração é a IAS 16 Activos Fixos Tangíveis.
Nos termos desta Norma, o Custo é quantia de caixa ou seus equivalentes paga (...) para adquirir um ativo no momento da sua aquisição ou construção (...)
O §16 da IAS 16 (Elementos do custo) estabelece o seguinte:
O custo de um item do ativo fixo tangível compreende:
-
o seu preço de compra;
-
quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o ativo na localização e condições necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência;
-
...
Por sua vez, o §17 da IAS 16 dá exemplos de custos diretamente atribuíveis, como são:
-
custos de benefícios dos empregados decorrentes diretamente da construção ou aquisição de um item do ativo...;
-
custos de preparação do local
-
custos iniciais de entrega e de manuseamento
-
custos de instalação e montagem
-
custos de testar se o ativo funciona corretamente enquanto se coloca o ativo na localização e condição desejada;
-
honorários profissionais.
Aqui chegados, resta saber se no Plano Oficial de Contabilidade (POC), o critério valorimétrico aplicável previa a mensuração ao custo com a consideração de itens integrantes do custo de produção equivalentes aos previstos no SNC a incluir na mensuração da vinha.
No caso de se concluir que de acordo com as regras do POC o custo de implantação do activo biológico “vinha” era calculado da mesma forma, isto é, de forma a obter-se uma mensuração equivalente, então seríamos forçados a concluir que a transposição do activo vinha do POC para o SNC a realizar em 1 de Janeiro de 2010, seria garantida pela simples passagem de saldos da conta POC “Vinha” para a conta SNC “Vinha”, sem qualquer alteração do seu valor.
Vejamos então
No seu capítulo 5, o POC previa os “Critérios de Valorimetria” aplicáveis a diversos activos, dos quais destacamos o respeitante às “Imobilizações” (5.4 – Imobilizações). Para a melhor compreensão e documentação do presente trabalho, reproduzem-se abaixo os pontos mais relevantes.
5.4 - Imobilizações
5.4.1 - O activo imobilizado deve ser valorizado ao custo de aquisição ou ao custo de produção.
Quando os respectivos elementos tiverem uma vida útil limitada, ficam sujeitos a uma amortização sistemática durante esse período.
5.4.2 - O custo de aquisição e o custo de produção dos elementos do activo imobilizado devem ser determinados de acordo com as definições adoptadas para as existências.
Porque “O custo de aquisição e o custo de produção dos elementos do activo imobilizado devem ser determinados de acordo com as definições adoptadas para as existências”, transcrevem-se de seguida as passagens dos critérios de valorimetria das existências previstos no POC – 5.3 - Existências.
5.3 - Existências
5.3.1 - As existências serão valorizadas ao custo de aquisição ou ao custo de produção, sem prejuízo das excepções adiante consideradas.
5.3.2 - Considera-se como custo de aquisição de um bem a soma do respectivo preço de compra com os gastos suportados directa ou indirectamente para o colocar no seu estado actual e no local de armazenagem.
5.3.3 - Considera-se como custo de produção de um bem a soma dos custos das matérias-primas e outros materiais directos consumidos, da mão-de-obra directa, dos custos industriais variáveis e dos custos industriais fixos necessariamente suportados para o produzir e colocar no estado em que se encontra e no local de armazenagem.
Os custos industriais fixos poderão ser imputados ao custo de produção, tendo em conta a capacidade normal dos meios de produção.
Os custos de distribuição, de administração geral e os financeiros não são incorporáveis no custo de produção.
Fazendo o exercício de transposição dos critérios de valorimetria das existências para serem aplicados como critérios de valorimetria das imobilizações, teríamos:
-
As imobilizações serão valorizadas ao custo de aquisição (se forem adquiridas) ou ao custo de produção (se forem produzidas pela própria empresa);
-
Considera-se como custo de aquisição de um bem a soma do respectivo preço de compra com os gastos suportados directa ou indirectamente para o colocar no seu estado actual e no local pretendido;
-
Considera-se como custo de produção de um bem a soma dos custos das matérias-primas e outros materiais directos consumidos, da mão-de-obra directa, dos custos industriais variáveis e dos custos industriais fixos necessariamente suportados para o produzir e colocar no local de instalação que permita o seu funcionamento da forma pretendida.
Aplicando à vinha os critérios de valorimetria das imobilizações previsto no POC, teríamos: considera-se como custo de produção de um bem (a vinha) a soma dos custos das matérias-primas (as videiras) e outros materiais directos consumidos (químicos, canudos, adubos, fertilizantes, fitofarmacêuticos, estacas, arames, acessórios, tubos, gotejadores), da mão-de-obra directa (gastos com o pessoal, encargos, seguros), dos custos industriais variáveis (trabalho de máquinas e uso de ferramentas e instalações) e dos custos industriais fixos (rendas, depreciações, custos de estrutura) necessariamente suportados para o produzir (a vinha) e a colocar em plena produção nas condições pretendidas.
Embora o POC seja um documento mais pobre que as NIC, uma vez que se baseia em regras, códigos de contas e modelos de demonstrações financeiras, enquanto as NIC se baseiam fundamentalmente em conceitos e em princípios, transpostos para as Normas, os critérios de valorimetria nele previstos são de tal forma abrangentes que permitem facilmente concluir que, no essencial, a valorimetria dos activos fixos tangíveis – e implicitamente dos activos biológicos – em POC e em SNC conduzem a mensurações substancialmente iguais.
Resumidamente, a plantação de uma vinha (ou de um conjunto organizado de videiras), passa pela execução de actividades, gerando os correspondentes custos a elas associados, nomeadamente:
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Preparação e estrumação/adubação da terra;
-
Aquisição das plantas (videiras), enraizantes, canudos e fertilizantes;
-
Plantação das videiras, enraizamento e colocação dos canudos;
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Colocação de estacas e arames para apoiar e guiar o crescimento das videiras;
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Colocação de tubos de rega perfurados para rega no pé da videira;
-
Acompanhamento do desenvolvimento das videiras, com limpezas, podas e demais cuidados garantindo a sua saúde e desenvolvimento ao longo dos arames de suporte;
Tudo efectuado, e todos os custos suportados, com vista à plantação no local escolhido e nas condições necessárias para que a vinha seja capaz de produzir da forma pretendida pela gerência (IAS 16, § 16 – Elementos do custo).
Ou seja, nas NIC, são custos da implantação de uma vinha (ou de um conjunto organizado de videiras), o custo de aquisição das videiras, bem como, quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar a vinha na localização e condições necessárias para que a mesma seja capaz de produzir da forma pretendida pela gerência (NIC: §16 da IAS 16).
Por sua vez, no POC, considera-se como custo de plantação de uma vinha, os custos de aquisição das videiras e dos custos a ela associados, bem como, os custos de produção, ou seja, a soma dos custos necessariamente suportados para a sua implantação no local estabelecido e nas condições que permitam o seu funcionamento da forma pretendida. (POC: 5.3 Existências e 5.4 Imobilizações)
Pela simples leitura do § 30 e do §33 da IAS41 Agricultura e dos §§ 15, 16 e 17 da IAS 16 Activos Fixos Tangíveis, se constata que seja o activo biológico em discussão no presente processo a “vinha” ou o “conjunto organizado de videiras”, o custo pelo qual uma “vinha” deve ser feito constar do balanço da entidade é exactamente o mesmo que o “conjunto organizado de videiras” deve constar nessa mesma contabilidade.
Se a videira para ser plantada precisa de mão de obra, então o custo dessa mão de obra deve ser incorporado no custo da videira plantada. Se a gerência da entidade entender que a vinha precisa de um suporte ou um canudo para não rastejar pelo chão ou para não ser comida pelos animais, então o custo desse suporte ou do canudo é um custo a imputar à videira plantada. Se a gerência entender que uma videira cresce mais e melhor se for arejada e para isso tiver de esticar arames para ela ser suportada e se poder alongar, então o custo das estacas e dos arames é um custo a imputar à videira plantada. Se por falta de pluviosidade ou para melhor poder controlar o crescimento da planta e a maturação das uvas, a gerência decidir colocar tubagem para rega no pé da videira, então o custo dessa tubagem é custo da videira plantada.
Assim, é custo da videira plantada, ou melhor, usando um exemplo para que seja mais fácil de entender: se um viticultor plantar 3.000 videiras num hectare do seu terreno e para pôr a vinha a produzir da forma pretendida por ele, gastar €4.500,00 com a aquisição das videiras, mais €5.000,00 para preparar e adubar a terra, mais €6.000,00 plantar, colocar canudos e enraizar as plantas, mais €6.500,00 para colocar estacas, esticar arames e estender os tubos de rega, mais €2.000,00 para acompanhar o desenvolvimento das videiras, fazer limpeza das folhas, fazer as podas, e garantir o desenvolvimento são da vinha, esse viticultor, a quem lhe perguntar sobre o montante dos custos suportados com a plantação da vinha/videiras, vai dizer que aquela vinha lhe custou €24.000,00 ou que cada videira ali plantada lhe custou €8,00.
E, se o viticultor for um empresário com contabilidade organizada, vai fazer constar da sua contabilidade um activo biológico com o valor (custo) de €24.000,00, independentemente de a esse activo biológico lhe chamar “vinha” ou lhe chamar “videiras plantadas”.
Parece fácil de entender, aqui chegados, que a argumentação utilizada pela Requerente no sentido de considerar o activo biológico como sendo as videiras e não a vinha, é um falso problema.
Porque o Tribunal Arbitral aderiu na plenitude à argumentação da Requerente, entendendo que, embora a Norma Internacional de Contabilidade 41 Agricultura, vulgarmente referida como IAS 41 Agricultura, designe por vinha o activo biológico e não a videira, o Tribunal argumenta que na Norma está escrito vinha mas o correcto seria estar escrito videira, porque foi cometido um erro de tradução da Norma.
Parece o Tribunal não ter percebido que não é uma questão de semântica (ou uma questão de tradução) que vai permitir que num país da União Europeia a norma seja aplicada de uma forma e noutro país seja aplicada de forma diferente.
A realidade é o que é, e deve ser tratada da mesma forma independentemente do nome que lhe for dado. E não é uma palavra que vai mudar todo o sentido da norma.
Ao defender que a “vinha” ou a “plantação organizada de videiras”, não é um activo mas um conjunto de activos, as videiras e os outros, pomposamente apelidados de infraestruturas, equipamentos e maquinaria, que na realidade são apenas canudos, estacas, arames, tubos e pouco mais, que não têm tem vida útil superior à vinha, e que apenas tem a função de dar suporte às videiras e permitir o seu arejamento e a sua rega, ao defender o que defende, o Tribunal Arbitral comete erro de interpretação da lei (a NIC 41 ou IAS 41 Agricultura) e consequentemente erro de julgamento.
Porque, de acordo com o §16 da IAS 16, o custo de um item, no caso a vinha (ou a plantação organizada de videiras), compreende o seu preço de compra e quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o ativo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de produzir da forma pretendida pela gerência. E se a gerência decidiu que com a colocação de canudos a vinha ficava protegida dos animais quando foi plantada e que produzia mais e melhor se as videiras se pudessem alongar nos arames e tivessem rega ao pé, ninguém pode afirmar que os canudos, as estacas, os arames e a rega não são um custo da vinha. Sem eles a vinha (ou as videiras) não funcionava, não produzia da forma pretendida pela gerência.
E se para a vinha produzir faz falta suportar esses custos, então esses custos são custos da vinha (ou da plantação organizada de videiras).
E não se diga que nos custos da vinha estavam incluídos custos com infraestruturas, equipamentos e maquinarias, porque essas alegações nunca foram provadas em Tribunal pela Requerente, tendo a IT demonstrado por análise das “fichas de imobilizado” que na descrição de todos os activos constavam descritivos como “vinhas”, “plantação de vinhas”, “trabalhos e plantação”, não constando qualquer termo que pudesse ser considerado como sendo referente a máquinas, equipamentos, infraestruturas ou outros equivalentes.
Aliás, em momento algum a Requerente apresentou prova de alguma máquina ou algum equipamento cujo custo tivesse sido integrado no custo das vinhas. A Requerente fez apenas alegações genéricas, sem apresentar uma qualquer prova, uma qualquer factura ou documento equivalente de uma máquina ou de um equipamento cujo custo tenha sido integrado no custo de produção de uma qualquer vinha.
Porque se o tivesse feito, que não fez, a correcção a efectuar seria apenas referente à depreciação dessa máquina e/ou desse equipamento, não podendo nunca dar lugar a pôr tudo em causa, anulando a correcção aos gastos de 2010 da C... referentes às depreciações não aceites para efeitos fiscais.
Aqui chegados, em síntese, apenas referindo os aspetos mais importantes para a decisão, deveria o Tribunal Arbitral ter decidido em conformidade, reconhecendo o seguinte:
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A requerente deveria ter realizado a transposição das Imobilizações “Vinhas” em POC para “Vinhas” em SNC/NIC, mensurando-as pelo justo valor desses ativos;
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Tendo a requerente manifestado a sua incapacidade de mensurar as vinhas pelo justo valor, restava-lhe a possibilidade de proceder à sua mensuração em SNC/NIC pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada;
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Dado a normalização contabilística em vigor à data dos factos, nomeadamente a IAS 41 Agricultura, impor a mensuração dos ativos biológicos pelo justo valor ou, em caso de impossibilidade, pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada, não é possível por não se encontrar previsto nas Normas Contabilísticas qualquer outra alternativa de mensuração dos activos biológicos;
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Assim, deveria o Tribunal Arbitral ter rejeitado liminarmente qualquer outra forma de mensuração dos ativos biológicos “vinhas” por falta de cobertura legal para a solução apresentada, no caso, pela Requerente;
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E, consequentemente, determinar a necessária recusa em aceitar a adoção pela Requerente da “metodologia de segregação inicial dos ativos biológicos” por si apresentada, devendo ter como consequência a manutenção da liquidação adicional efetuada pela AT;
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Porque a Requerente não logrou provar que as Imobilizações “Vinhas” constantes do seu Balanço à data de 31/12/2009 tinha um valor diferente do constante da sua contabilidade em 01/01/2010 quando transposto para Ativos Biológicos “Vinhas”;
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Nem conseguiu provar que, seja o activo biológico designado por “vinhas” ou por “videiras”, o valor do activo a inscrever no balanço da Requerente à data de 01/01/2010, era apenas o valor de compra das videiras, com exclusão de todos os outros custos suportados com a sua plantação;
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Dado a opinião da Requerente ser contrariada pela letra e pelo espírito da norma aplicável respeitante à definição dos “Elementos do custo” do capítulo “Mensuração no Reconhecimento” da “IAS 16 Activos Fixos Tangíveis” aplicáveis aos Activos Biológicos de produção mensurados ao custo;
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E, reconhecendo que o custo da implantação de uma vinha (ou a implantação de um conjunto organizado de videiras) inclui a preparação e adubação da terra, a plantação, protecção e enraizamento das videiras, a colocação de estacas e arames para que as videiras possam crescer, alongar-se e arejar e a colocação de tubos de rega para que as videiras se possam desenvolver da forma pretendida pela gerência;
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Deveria o Tribunal ter julgado improcedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, ter declarado legal a liquidação adicional promovida pela AT, na parte respeitante ao valor acrescido ao lucro tributável de 2010 referente às depreciações dos activos biológicos “vinhas”, à excepção do valor de €40.951,03 anteriormente acrescido ao lucro tributável pela Requerente.
Listados os principais aspectos do processo que, a serem observadas as leituras propostas, teriam proporcionado uma decisão arbitral plenamente concordante com as normas e a lei aplicável, entende-se ser ainda necessário produzir alguns comentários críticos ao conteúdo da própria Decisão Arbitral.
Assim,
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DA EXISTÊNCIA DE ACTIVOS INTANGÍVEIS INDEVIDAMENTE INTEGRADOS NO CUSTO DAS VINHAS
Na página 56 da Decisão Arbitral é feita a seguinte afirmação:
Como já se referiu anteriormente, os alegados activos intangíveis referem-se a “direitos de plantação”, no caso, suportados no exercício de 2010. Embora a Decisão Arbitral refira “nomeadamente licenças e direitos”, a verdade é que os gastos em causa são apenas referentes a direitos. Com a publicação do Decreto-lei 83/97, de 9 de Abril deixaram de ser emitidas “licenças de plantação” e passaram a ser concedidos “direitos de plantação”. Porém, na essência são autorizações equivalentes.
Como se explicou atrás, os “direitos de plantação” não são activos intangíveis por não satisfazerem uma das três condições da sua definição: a identificabilidade.
Isto é, para que o custo suportado com um direito de plantação possa ser considerado um ativo intangível ele deve ser identificável. Estabelece o § 11 da IAS 38 Activos Intangíveis, que ”A definição de um ativo intangível exige que um ativo intangível seja identificável para o distinguir do goodwill”.
Por sua vez o §12 da IAS 38 estabelece que: um ativo satisfaz o critério da identificabilidade na definição de um activo intangível quando:
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for separável, i.e., capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido transferido licenciado alugado ou trocado(...)
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Resultar de direitos contratuais ou outros direitos legais(...)
Ora, a Requerente, tendo utilizado os direitos de plantação, eles foram incorporados (foram gastos) na implantação das vinhas e não poderão ser separados dela para serem vendidos ou poderem gerar outros benefícios económicos futuros.
Ainda que os direitos de plantação fossem identificáveis e, por isso, transferíveis, vendíveis, o que não se concede, para a correcção das depreciações em causa no processo, à Requerente bastaria indicar o valor da amortização/depreciação correspondente ao seu valor e requerer a correcção do valor das depreciações acrescidas de acordo com a contabilidade à data de 2010.
Contudo, é claro que, sendo o encargo com o direito de plantação um dos “quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o ativo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência” (IAS 16, §16, al. b)), esse encargo incorpora o custo da vinha (ou da plantação organizada de videiras) e deve ser depreciado na medida em que a vinha seja depreciável, realidade que, contudo, não é aplicável aos exercícios de 2010 e 2011 por falta de cobertura legal.
Erra, por isso, o Tribunal na crítica que faz à AT.
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A PROBLEMÁTICA VINHA VERSUS VIDEIRAS
Na página 57 da Decisão Arbitral é feita a seguinte afirmação:
Embora seja uma discussão desprovida de importância para o caso, a primeira pergunta a fazer ao Tribunal é qual o país dessa versão original (em inglês). Parece o Tribunal desconhecer que são 24 as línguas oficiais da União Europeia, das quais faz parte a língua portuguesa.
Mas se o inglês é a língua original do Regulamento (CE) n.º 1126/2008 da Comissão de 3 de Novembro de 2008, que adopta as normas internacionais de contabilidade nos termos do Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, então onde está escrito “vines” no original, na Norma “traduzida” para a língua portuguesa deveria estar “trepadeiras”.
Porque, num bom dicionário de inglês, por exemplo no Cambridge Dictionary, o termo “vine” significa “any climbing ou trailing plant”, que em português significa trepadeira.
E na língua inglesa, se quisermos dizer “videiras”, dizemos (ou escrevemos) “grape vines”.
Ora, assentando o argumento do Tribunal Arbitral na defesa de que o termo usado na IAS 41 Agricultura (versão em língua portuguesa) se trata de uma deficiente tradução do inglês (vines) para o português (vinhas), fica demonstrado que a teoria por si desenvolvida, no seguimento da argumentação da Requerente, é desprovida de razão e, por isso, ineficaz para fixar jurisprudência.
Tudo o que ficou escrito demonstra que não é o termo usado, ou a sua tradução, que é relevante para o enquadramento de uma realidade nas normas ou na lei. O aplicador da lei, bem como o julgador, deve procurar o espírito, deve procurar o racional, o objectivo procurado pelo legislador, e aplicar a lei numa visão racional e não exclusivamente literal.
O custo de um activo biológico, seja ele uma vinha, seja ele uma plantação organizada de videiras, será sempre o somatório dos custos diretamente atribuíveis para colocar o activo biológico na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de produzir da forma pretendida pela gerência, em conformidade com a IAS 16, §16, al. A) e b).
Dito isto, fica claro para quem quiser entender, que seja o activo biológico chamado de vinha ou chamado de videira, o custo desse activo a fazer constar do balanço de uma entidade é a soma dos custos suportados para produzir, para “construir” esse activo de modo a que ele fique capaz de produzir da forma pretendida pela gerência, isto é, o custo apurado em conformidade com o §16 da IAS 16, por força do §30 e §33 da IAS 41 Agricultura.
Erra o Tribunal quando, desenvolvendo uma teoria de erro na tradução de uma Norma Europeia, interpreta a mesma sem procurar a sua adesão ao espírito da Norma expressa ao longo de todos os seus parágrafos.
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APLICAÇÃO DA NOVA VERSÃO DA IAS 41 AGRICULTURA QUE ENTROU EM VIGOR NO DIA 1 DE JANEIRO DE 2016
Ao longo das páginas 59 e 60 o Tribunal vem adiantar argumentos contrários às posições assumidas no processo pela AT, utilizando para isso passagens ou ideias das IAS 41 e IAS 16 que foram publicadas em Novembro de 2015 e entraram em vigor no dia1 de Janeiro de 2016.
Embora as alegações produzidas pudessem ser contestadas, porque a norma não existia à data de 2010, dispensamo-nos de fazer quaisquer outros comentários.
Parece que o Tribunal se esqueceu que as leis, e as normas transpostas por leis, só valem para o futuro. E o Regulamento (UE) 2015/2113 da Comissão de 23 de novembro de 2015, determinou que as alterações à IAS 16 e à IAS 41 entravam em vigor no dia 1 de Janeiro de 2016.
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A VALORIMETRIA DO ACTIVO BIOLÓGICO DE PRODUÇÃO – VINHAS
Ao longo das páginas 61 a 64 o Tribunal retoma o tema “vinhas versus videiras” para terminar com os seguintes parágrafos:
Começa-se por se dizer que não cabe ao julgador limitar o âmbito de aplicação da Norma.
Determina a Norma que o custo de um item compreende o seu preço de compra e quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o activo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência.
O Tribunal afirma que “são os custos que se encontrem inteiramente relacionados com a planta per si e a sua colocação no terreno até que se encontrem em condições prontas a produzir.”
Parece estar o Tribunal, sem razão, a fazer uma leitura restritiva da Norma. A reforçar essa ideia afirma o Tribunal que “Da conjugação da IAS 41 e IAS 16, não resulta a integração de custos de infraestruturas, equipamentos de apoio, licenças e direitos no custo do ativo biológico (...)”
Porém, o Tribunal nunca esclareceu, nunca especificou a que infraestruturas e equipamentos se refere.
Como a implantação de uma vinha tem diversas actividades, nomeadamente, a preparação e adubação da terra, a plantação das videiras e o seu enraizamento com colocação de protectores (canudos), a colocação de estacas e aramação com provável colocação de tubos de rega, terminando com o acompanhamento do desenvolvimento das videiras, a sua limpeza e poda, cuidando de as guiar pelos arames de suporte, somos levados a crer que as alegadas infraestruturas serão os canudos, as estacas, os arames e os tubos de rega.
Aqui chegados, somos obrigados a perguntar ao Tribunal o seguinte:
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No caso de o plantador da vinha não colocar as estacas e os arames de suporte das videiras para que elas se possam desenvolver, as videiras vão ser capazes de produzir uvas da forma pretendida pela gerência?
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No caso de o plantador não colocar tubos perfurados para rega no pé das videiras para que elas se possam alimentar e a Requerente possa gerir a maturação das uvas, as videiras vão ser capazes de produzir uvas da forma pretendida pela gerência?
No caso de o Tribunal responder que as estacas, os arames e os tubos de rega não fazem falta nenhuma às videiras, então o Tribunal tem razão e os custos com as estacas, os arames e os tubos de rega não são custo das videiras plantadas (ou da vinha).
Caso contrário, os custos suportados com a aquisição e instalação das estacas, dos arames e dos tubos de rega são custos que devem integrar o custo das videiras plantadas (ou da vinha).
E acredita-se que esses custos com canudos, estacas, arames e tubos de rega são necessários para que a vinha (ou videiras plantadas) produza na quantidade e com a qualidade pretendida pela gerência.
Também aqui o Tribunal erra ao fazer uma leitura restritiva da Norma, levando a erro de julgamento.
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DA FUNDADA DÚVIDA QUANTO À QUALIFICAÇÃO E QUANTIFICAÇÃO DO FACTO TRIBUTÁRIO
Escreve o Tribunal na página 64 da Decisão Arbitral o seguinte:
Salvo melhor opinião, as divergências conceptuais não geram dúvidas, muito menos fundadas, cabendo ao Tribunal decidir em conformidade com as normas e as leis aplicáveis ao caso. E no caso de o Tribunal ter opinião diferente das opiniões das partes, deve decidir de acordo com a leitura que faz das normas e da lei.
Quanto à alegada insuficiência dos elementos recolhidos para determinar com exatidão o valor dos ativos biológicos em causa e correspondentes depreciações, no exercício de 2010, não deixa de ser curioso ler uma Decisão Arbitral com dezenas de páginas na qual o Tribunal atacou a Administração Fiscal de não ter realizado “todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”, para agora vir dizer que há insuficiência de elementos recolhidos para o Tribunal poder tomar uma decisão sobre o valor dos activos biológicos e correspondentes depreciações do exercício de 2010, quando o Tribunal não solicitou às partes quaisquer elementos para sanar a alegada insuficiência de elementos, e assim poder julgar em consciência e de acordo com a lei estabelecida.
De acordo com o exposto ao longo da presente Declaração de Voto de Vencido, entende-se que no processo existem os necessários e bastantes elementos para que o Tribunal possa tomar a devida decisão, aplicando a lei.
Aplicando a lei e as normas ao caso, tendo a Requerente contabilizado depreciações das vinhas no valor de €646.514,58 e não tendo demonstrado que esse valor não correspondia à depreciação das vinhas enquanto activo biológico em 2010, o valor da contabilidade (e do mapa de Amortizações e Reintegrações constante do Dossier Fiscal de 2010) deve prevalecer, mantendo-se a correcção fiscal a acrescer ao lucro tributável desse exercício, à excepção do valor de €40.951,03 já acrescido pela Requerente.
Também aplicando a lei e as normas ao caso, o custo do “activo biológico vinhas” compreende o seu preço de compra e quaisquer custos diretamente atribuíveis para colocar o activo na localização e condição necessárias para o mesmo ser capaz de produzir da forma pretendida pela gerência.
Acresce que o custo a apurar pela Requerente, nos termos do §30 da IAS 41, sendo refutada a possibilidade de o activo biológico ser mensurado pelo justo valor, nesse caso, esse ativo biológico deve ser mensurado pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada. Não estando prevista na Norma qualquer terceira via para a mensuração de um activo biológico.
Ora, a Requerente não apurou o valor dos activos biológicos de produção designado vinhas ou videiras plantadas, mensurando-as pelo custo menos qualquer depreciação acumulada e qualquer perda por imparidade acumulada.
Ao não proceder em conformidade com as normas e a lei, a Requerente não provou que o valor das depreciações do exercício a considerar como gasto era diferente do valor das depreciações contabilizadas em 2010 e constantes do mapa de amortizações e depreciações constante do dossier fiscal, valores esses que, salvo prova em contrário, são os únicos válidos para o cálculo dos impostos sobre o rendimento da Requerente.
Devendo por tudo quanto ficou dito, manter-se a correcção ao lucro tributável de 2010, com excepção de €40.951,03 já acrescidos pela Requerente.
Só com essa decisão teria sido feita justiça.
Assim, por não me rever na fundamentação nem na decisão, ou melhor, por me situar em posição diametralmente oposta à maioria vencedora, no que diz respeito à fundamentação e à decisão do Tribunal Arbitral, elaborei a presente declaração de voto de vencido.
Henrique Fiúza
(Economista)
[1] Por referência ao exercício de 2010, o Grupo Fiscal de sociedades tributado em sede de IRC de acordo com o RETGS, dominado pela Requerente, era constituído pelas seguintes sociedades dominadas:
-
E..., S.A.;
-
D... S.A.;
-
F..., S.A.;
-
G..., Lda.;
-
H... SGPS, S.A. (sendo que em 2010 a correspondente denominação social era de “I... SGPS, S.A.;
-
J..., S.A.;
-
C..., S.A.;
-
K..., S.A.; e,
-
L..., S.A..
[2] Segregação que a Requerente provou perante os SIT e perante este Tribunal estar refletida na sua contabilidade, com a disponibilização dos respetivos extratos contabilísticos
[6] Vide Regulamento EU nº 2113/2015, de 23 de novembro.
[8] Pág. 32 e 33 do Despacho de decisão final do Recurso Hierárquico, junto aos presentes autos como doc. 8.
[9] Pág. 32 e 33 do Despacho de decisão final do Recurso Hierárquico, junto aos presentes autos como doc. 8.
[10] A este propósito, veja-se, ainda, Acórdão do TCAS, 2ª Secção, de 01.02.2011, proc. 04417/10 e Acórdão do TCAN, 2ª Secção, proferido em 16.04.2015, no Proc. nº 00215/09.6BEMDL