Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 565/2022-T
Data da decisão: 2023-04-11  IRC  
Valor do pedido: € 40.325,03
Tema: IRC – Reembolso de retenção na fonte – Entidade não residente – Ónus da prova
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SUMÁRIO:

 

I – Tratando-se de rendimento referentes à cedência de direitos de propriedade industrial, os mesmos são passíveis de ser qualificados como royalties à luz da legislação interna e do Acordo para Evitar a Dupla Tributação (“ADT”) entre Portugal e a Suécia (cf. artigo 4.º, n.º 3, al. c), do CIR e artigo 12.º do ADT). 

II – Nos termos dos números 1 e 2, do citado artigo, do ADT, ambos os Estados (Português e Sueco) podem exercer o respetivo poder tributário, pese embora a tributação pelo Estado da fonte dos rendimentos, ou seja, Portugal, esteja limitado a 10% do montante bruto do rendimento auferido.

III – Tendo o sujeito passivo carreado aos autos elementos probatórios que permitiram concluir que as retenções na fonte, à taxa de 10%, foram realizadas em excesso, o mesmo terá direito a ser reembolsado da respetiva coleta de IRC retida na fonte em excesso.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

A árbitra, Susana Mercês, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o presente Tribunal Arbitral Singular, constituído a 07.12.2022, decide o seguinte:

  1. RELATÓRIO
  1. A... AB, sociedade constituída segundo as leis da Suécia, com o número de identificação fiscal SE ..., NIPC..., com sede sita em ... Estocolmo, (doravante “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) e 10.º, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante “RJAT”), requerer a constituição do Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à declaração de ilegalidade e anulação parcial dos atos de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), incidentes sobre o pagamento de royalties relativos ao ano de 2020, bem como da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que teve como objeto os ditos atos.
  2. A Requerente peticionou, ainda, o reembolso da quantia de €40.325,03 (quarenta mil e trezentos e vinte cinco euros e três cêntimos), relativa a retenções na fonte de IRC suportadas em Portugal (alegadamente, em excesso), sobre os royalties referentes ao ano de 2020 e juntou 15 (quinze) documentos.
  3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à Requerida em 26.09.2022.
  4. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 6.º e da alínea a), do n.º 1, do artigo 11.º, do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitra do Tribunal Arbitral Singular, a qual comunicou a aceitação do cargo no prazo aplicável.
  5. Em 18.11.2022, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação de árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.
  6. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1, do artigo 11.º, do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 07.12.2022.
  7. No dia 23.01.2023, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual se defendeu por impugnação e juntou aos autos o processo administrativo.
  8. Em 25.01.2023, o Tribunal proferiu o seguinte despacho:

Não sendo requerida prova testemunhal, não se vê utilidade na realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.

Assim, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2; 29.º, n.º 2, do RJAT) dispensa-se a realização da reunião prevista no artigo 18.º, n.º 1, do RJAT.

Mais, notifica-se as Partes para, querendo, apresentarem alegações escritas, no prazo de 30 dias, nos termos do artigo 18.º, n.º 3, do RJAT.

Indica-se o dia 07 de Junho de 2023, como prazo limite para prolação da decisão arbitral.

Até esta data deverá o Sujeito Passivo pagar a taxa arbitral subsequente.

  1. A Requerente e a Requerida apresentaram as suas alegações finais, em 01.03.2023, reiterando a argumentação anteriormente expendida.

I.1. POSIÇÃO DAS PARTES

  1. A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, em síntese, com vista à declaração de ilegalidade e anulação parcial dos atos de retenção na fonte de IRC aqui sindicados, o seguinte:
  1. Contratou com a B... S.A., sociedade de direito português, de quem é detentora de 100% do capital, o pagamento de um fee (license fees/support fees), referente à cedência do direito de utilização da marca, serviços de assistência técnica, pesquisa, desenvolvimento, entre outros, remuneração esta, calculada com base numa percentagem de 35% do lucro incremental da B... S.A. (sobre a margem do EBITDA) e com base numa percentagem dos custos comuns suportados, sendo de natureza variável, cujo quantitativo é apurado no final do ano.
  2. Estes rendimentos são enquadrados como royalties, à taxa de 10%, uma vez que tinha na sua posse o certificado de residência fiscal e o formulário 21-RFI para o ano de 2020, nos termos do artigo 4.º, n.º 3, al. c), parágrafo 1), do CIRC e no artigo 12.º do Acordo para evitar a Dupla Tributação (doravante “ADT”) celebrado entre Portugal e a Suécia.
  3. Emitia, por regra, à B... S.A., em janeiro de cada ano civil, uma fatura do valor estimado/provisional de fees que expectavelmente seriam devidos no período de janeiro a novembro. Posteriormente, no final de cada ano, emitia um novo documento, cujo objetivo é apurar o quantitativo final dos fees a cobrar à B... S.A., o que pode originar acertos nas faturas emitidas anteriormente ao longo do ano.
  4. Contudo, no ano de 2020 – período aqui sindicado – as faturas emitidas no decurso do ano correspondem a uma estimativa trimestral do valor dos fees a cobrar relativamente àquele período (4 trimestres de 2020). Não obstante a existência de faturas trimestrais em 2020 para cobrança do fee anual – as faturas previsionais emitidas no decurso do ano de 2020 – a B... S.A. efetua os pagamentos dos fees numa base mensal, correspondente ao valor mensal proporcional do total da fatura respeitante ao período para o qual corresponde o montante faturado (i.e, ao valor do fee relativo a cada mês).
  5. Caso existam acertos a efetuar no valor dos aludidos fees anuais, originando montantes a pagar, os mesmos são efetuados no final do ano. Excecionalmente, poderão existir acertos a efetuar no ano subsequente, respeitante a fees do ano anterior que se qualificam como acerto à estimativa inicial e que são registados no exercício (como sucedeu com a fatura correspondente ao período de outubro a dezembro de 2019).
  6. O valor total de license fees pagos em 2020 e neste ano sujeitos a retenção na fonte de IRC foram de €1.407.000,00 (€123.916,66 – total de license fees relativos a dezembro de 2019, faturados e sujeitos a retenção na fonte de IRC em 2020; €371.750,00 – relativo ao período de janeiro a março de 2020; €371.750,00 – relativo ao período de abril a junho de 2020; €371.750,00 – relativo ao período de julho a setembro de 2020; €123.916,67 – relativo a outubro de 2020 e €123.916,67 – relativo a novembro de 2020).
  7. Face à fórmula de cálculo e apuramento dos resultados anuais da B... S.A., efetuou, a Requerente, o apuramento dos fees devidos, o que determinou uma redução do valor anual de honorários devidos para o final do ano de 2019 e do ano de 2020 e, motivou a emissão de duas notas de crédito (AR10:8162 – a qual incorpora o montante a crédito de €27.000,00, relativo ao acerto do license fee do ano de 2029 e, AR10:8122 – no montante de €720.250,00, que procedeu ao recálculo do suport fee e license fee do ano de 2020).  
  8. O valor dos license fees relativos ao ano de 2019 foi, assim, corrigido em baixa em dezembro de 2020, no montante de €27.000,00 e, o total de license fees auferidos relativamente ao ano de 2020 ascendeu a €739.000,00 (1.363.083,34 – 624.083,34);
  9. O valor total de license fees efetivamente pagos e devidos no decurso do ano de 2020 foram de €835.916,00, o que originou a entrega de um valor em excesso de IRC, a título de retenção na fonte de €40.325,03.
  1. Por sua vez a AT contra-argumentou com base nos seguintes argumentos:
  1. As faturas juntas aos autos não fazem referência expressa ao contrato que lhes subjaz;
  2. As notas de crédito que a Requerente alega ter reduzido o valor dos fees cobrados em finais de 2019 e no decurso do ano de 2020, bem como a redução/anulação dos rendimentos sujeitos a imposto em Portugal, não fazem menção às faturas, não evidenciando, assim o valor corrigido;
  3. Não foi feita prova de como foi efetuado o cálculo do montante efetivo de fees a receber pela Requerente, tendo em conta as cláusulas VII e Anexo B do contrato junto aos autos;
  4. Não foi apresentada qualquer documentação contabilística que permita aferir da realização da operação e da sua influência nos resultados da B... S.A., pelo que não está assim documentalmente provado que as mencionadas quantias digam respeito a pagamentos de royalties;
  1. SANEAMENTO
  1. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.
  2. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
  3. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
  4. Não foram suscitadas exceções de que deva conhecer-se.
  5. O processo não enferma de nulidades.
  6. Inexiste, deste modo, quaisquer obstáculos à apreciação do mérito da causa.

 

III. MATÉRIA DE FACTO

III.1. FACTOS PROVADOS

Com relevo para a apreciação e decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

  1. A Requerente é uma sociedade de direito sueco, não residente em Portugal, para efeitos fiscais.
  2. A Requerente detém a 100% a sociedade de direito português,  B..., S.A. (doravante “B...”).
  3. A Requerente e a B... S.A. fazem parte de um grupo multinacional – o Grupo C...–, especializado na prestação de serviços de segurança.
  4. A Requerente é legítima proprietária das Marcas e logotipos da B... .
  5. A Requerente e a B... S.A. celebraram, em 2009, um contrato de concessão de marca e assistência técnica, bem como um contrato de prestação de serviços de suporte, no âmbito dos quais a segunda paga à ora Requerente honorários/remuneração (license fees/support fees), referentes à cedência dos direitos de utilização da marca, serviços de assistência técnica, pesquisa, desenvolvimento, entre outros (Cf. Documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  6. De acordo com o ponto VII do aludido contrato celebrado entre as partes, denominado “License Fee” (Taxa de licenciamento), a B... S.A. (“licenciado”) pagará à Requerente (“licenciador”) uma taxa de licenciamento variável relativamente à utilização: (i) da marca, (ii) do logótipo da B... S.A. e (iii) de todos os ativos incorpóreos (Cf. Documento n.º 1, ponto VII, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  7. A denominada taxa de licenciamento é variável e fixada em 35% da margem do lucro, caso exista, sendo a remuneração da Requerente calculada com base numa percentagem de 35% do lucro incremental da B... S.A. (calculado sobre a margem do EBITDA) e com base numa percentagem dos custos comuns suportados, ou seja, uma remuneração variável cujo quantitativo final é apurado no final de cada ano económico (Cf. Documento n.º 1, pontos III e VII, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  8. Atendendo à natureza variável da remuneração acordada, a Requerente emitia, por regra, à B... S.A., em janeiro de cada ano civil, uma fatura do valor estimado/provisional de fees que expectavelmente seriam devidos no período de janeiro a novembro.
  9. Posteriormente, no final de cada ano, a Requerente emite um novo documento, cujo objetivo é apurar o quantitativo final dos fees a cobrar à B... S.A., o que pode originar acertos nas faturas emitidas anteriormente ao longo do ano.
  10. Contudo, no ano de 2020 – período aqui sindicado – as faturas emitidas no decurso do ano correspondem a uma estimativa trimestral do valor dos fees a cobrar relativamente àquele período (4 trimestres de 2020).
  11. Não obstante a existência de faturas trimestrais em 2020 para cobrança do fee anual – as faturas previsionais emitidas no decurso do ano de 2020 – a B... S.A. efetua os pagamentos dos fees à Requerente numa base mensal, correspondente ao valor mensal proporcional do total da fatura respeitante ao período para o qual corresponde o montante faturado (i.e, ao valor do fee relativo a cada mês).
  12. Sobre os rendimentos pagos à Requerente, a B... S.A. efetua mensalmente a correspondente retenção na fonte de IRC, à taxa de 10%, prevista no ADT celebrado entre Portugal e a Suécia (Cf. Documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  13. Caso existam acertos a efetuar no valor dos aludidos fees anuais, originando montantes a pagar à Requerente, os mesmos são efetuados no final do ano.
  14. Excecionalmente, poderão existir acertos a efetuar no ano subsequente, respeitante a fees do ano anterior que se qualificam como acerto à estimativa inicial e que são registados no exercício.
  15. Os movimentos financeiros entre as duas entidades no âmbito dos contratos acima referidos são efetuados através do sistema de gestão centralizada de tesouraria (“cash pooling”), aplicável às relações comerciais entre as sociedades do Grupo C... a nível mundial.
  16. Nos anos de 2019 e 2020, a Requerente emitiu as seguintes faturas à B... S.A., para cobrança dos fees contratuais (“license e support fees”):
  1. Fatura AR10:7456, datada de 01.10.2019; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Markets” de €371.750,00, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de outubro a dezembro de 2019 (sendo que €123.916,66 respeitam, apenas, ao mês de dezembro de 2019); resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €4.500,00 (Mobile), €34.000,00 (New Market) e €500,00 (Tech), sendo o valor total da fatura de €410.750,00  (Cf. Documento n.º 3, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  2. Fatura AR10:7718, datada de 27.01.2020; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Markets” de €371.750,00, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de janeiro a março de 2020; resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €6.750,00 (Mobile), €54.000,00 (New Market) e €1.750,00 (Tech), sendo o valor total da fatura de €434.250,00 (Cf. Documento n.º 4, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  3. Fatura AR10:7962, datada de 01.04.2020; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Markets” de €371.750,00, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de abril a junho de 2020; resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €6.750,00 (Mobile), €54.000,00 (New Market) e €1.750,00 (Tech), sendo o valor total da fatura de €434.250,00 (Cf. Documento n.º 5, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  4. Fatura AR10:8018, datada de 01.07.2020; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Markets” de €371.750,00, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de julho a setembro de 2020; resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €6.750,00 (Mobile), €54.000,00 (New Market) e €1.750,00 (Tech), sendo o valor total da fatura de €434.250,00 (Cf. Documento n.º 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  5. Fatura AR10:8067, datada de 01.10.2020; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Market” de €123.916,67, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de outubro de 2020; resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €2.250,00 (Mobile), €18.000,00 (New Market) e €583,33 (Tech), sendo o valor total da fatura de €144.750,00 (Cf. Documento n.º 7, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  6. Fatura AR10:8080, datada de 01.11.2020; a Requerente faturou à B... S.A, o total de “Business Model License Fee New Market” de €123.916,67, valor esse, que nos termos da mesma fatura, corresponde ao período de novembro de 2020; resulta ainda do referido documento que foram faturados “Support Fees”, no montante de €2.250,00 (Mobile), €18.000,00 (New Market) e €583,33 (Tech), sendo o valor total da fatura de €144.750,00 (Cf. Documento n.º 8, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  1. O descritivo nas faturas corresponde aos fees cobrados nos termos do contrato de concessão de marca, o que está em conformidade com a terminologia utilizada no ponto VII do aludido contrato, que na versão em língua inglesa refere a expressão “Licensee shall pay do Licensor a variable license fee in respect of using the B... Business Model and all related intangibles under this Agreement” (Cf. Documento n.º 1, ponto VII, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).  
  2. O valor total de license fees pagos à Requerente em 2020 e neste ano sujeitos a retenção na fonte de IRC foram os seguintes:

NÚMERO FATURA

PERÍODO

VALOR

Fatura 7456

dezembro de 2019

123.916,66

 

TOTAL license fees relativos a 2019 faturados e sujeitos a retenção na fonte de IRC em 2020

123.916,66

Fatura 7718

janeiro a março de 2020

371.750,00

Fatura 7962

abril a junho de 2020

371.750,00

Fatura 8018

julho a setembro de 2020

371.750,00

Fatura 8067

outubro de 2020

123.916,67

Fatura 8080

novembro de 2020

123.916,67

 

TOTAL license fees relativos a 2020 faturados e sujeitos a retenção na fonte de IRC em 2020

1.363.083,34

 

  1. Face à forma de cálculo e apuramento dos resultados anuais da B... S.A., a Requerente procedeu ao apuramento final dos fees a si devidos, o que determinou uma redução do valor anual da remuneração/honorários devidos para os anos de 2019 e 2020, tendo emitido, em dezembro de 2020, com vista a refletir na contabilidade de ambas o apuramento do quantitativo final de license fees dos dois exercícios, as seguintes notas de crédito:
  1. Nota de crédito AR10:8122, datada de 04.12.2020, no montante de €720.250,00, que procedeu ao recálculo do suport fees e license fees do ano de 2020, a qual refere, para o que aqui revela, “Business License Fees – N Market - Dec” no valor de €61.583,33 (que respeita aos fees estimados para dezembro de 2020) e identifica o montante negativo de €685.666,67, com o descritivo “Businees license – Difference between total fee minus already paid amount and the fee for dec N Maket (...)”(Cf. Documento n.º 9, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  2. Nota de crédito AR10:8162, datada de 11.12.2020, que incorpora o montante a crédito de €27.000,00, relativo ao acerto do license fee do ano de 2019 (Cf. Documento n.º 10, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido);
  1. O valor dos license fees relativos ao ano de 2019 foi corrigido em baixa em dezembro de 2020, no montante de €27.000,00 e, o total de license fees auferidos pela Requerente relativamente ao ano de 2020 ascendeu a €739.000,00 (1.363.083,34 – 624.083,34):

Descrição

 Montante (€)

Acerto license fee 2019

-27.000,00

Support Fee

- 51.000,00

Total

-78.000,00

 

Descrição

 Montante (€)

Recálculo license fees 2020

- 685.666,67

License fee estimado p/ dez 2020

61.583,33

Total

- 624.083,34

 

Descrição Recálculo license fees 2020

 Montante (€)

License fees devidos em 2020

739.000

license fees estimados p/ 2020

- 1.363.083,34

License fee estimado p/ dez 2020

- 61.583,33

Total

- 685.666,67

 

  1. O valor total de license fees efetivamente pagos e devidos à Requerente no decurso do ano de 2020 foi de:

Descrição

Valor

 

Retenção na

Fonte (RF) 10%

License fee dez 2019

€ 123.916,7

 

€ 12.391,67

License fee final 2020 (€ 739.000) subtraído do acerto do licence fee 2019 (- €27.000)

712.000

 

€ 71.200

Total sujeito a IRC

€ 835.916

Total RF devida

€ 83.591,67

 

  1. A retenção na fonte de IRC suportada pela Requerente no decurso do ano de 2020 foi apurada com base nas faturas juntas ao pedido de pronúncia arbitral e emitidas ao longo do referido exercício, no total de €1.239.166,70, tendo a substituta tributária, B... S.A., procedido à entrega das respetivas declarações Modelo 30  (Cf. Documentos n.ºs 11 e 12, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. A Requerente não entregou a retenção na fonte de IRC referentes às faturas de license fees dos meses de outubro e novembro de 2020, no valor total de €24.783,34.
  3. A 06.10.2021, a Requerente apresentou junto da Direção de Finanças de Lisboa (“DFL”) reclamação graciosa, ao abrigo do artigo 132.º do CPPT, nos termos do qual solicitou a restituição do imposto suportado em excesso por retenção na fonte no decurso do ano de 2020 (Cf. Documento n.º 13, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido). 
  4. A 30.05.2022, a Requerente foi notificada do projeto de indeferimento da reclamação, no qual a DFL alega o não cumprimento por parte da Requerente do ónus de prova dos factos que sustentam o seu pedido, uma vez que: (i) a documentação junta não faria referência expressa ao contrato que lhe subjaz (mas apenas a “License Fees”) e as notas de crédito apresentadas não fariam referência às faturas que alegadamente visam corrigir; (ii) pelo que não seria possível fazer a correspondência/evidenciar os valores corrigidos, alegando ainda (iii) que não foi efetuada qualquer demonstração da forma de cálculo do montante efetivo de fees a receber pela Requerente, o que condicionaria a validade do pedido de anulação e consequente restituição parcial do valor de IRC suportado em Portugal em 2020 (Cf. Documento n.º 14, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  5. A Requerente não exerceu o direito de audição, tendo sido, em 27.06.2022, notificada da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, que veio reiterar o anteriormente referido em sede de projeto de decisão (Cf. Documento n.º 15, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  6. Em 22.09.2022, a Requerente apresentou o presente pedido de constituição de tribunal arbitral.

III.2 FACTOS NÃO PROVADOS

Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.

 

III.3. FUNDAMENTAÇÃO DA FIXAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão, discriminar a matéria que julga provada e declarar, se for o caso, a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (doravante “CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (doravante “CPC”), aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram assim selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é definida tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como resulta do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

O Tribunal arbitral considera provados, com relevo para a decisão da causa, os factos acima elencados e dados como assentes, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, dos factos alegados pelas partes que não foram impugnados e, a adequada ponderação dos mesmos à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum, e segundo juízos de normalidade e razoabilidade.

  1. MATÉRIA DE DIREITO

IV.1 APRECIAÇÃO

Conforme resulta da factualidade exposta, a questão controvertida prende-se, em exclusivo, com o direito da Requerente ao reembolso de IRC retido na fonte em excesso no decurso do ano de 2020, face à redução do quantitativo de royalties efetivamente recebido em Portugal no aludido período de tributação, e se a Requerente logrou demonstrar os factos subjacentes para se chegar a tal conclusão.

Nos presentes autos, a Requerente procedeu à junção dos seguintes elementos de prova:

  1. O certificado 21 RFI, que comprova a residência fiscal da Requerente (entidade que recebe os rendimentos), bem como, a aplicação do Acordo para Evitar a Dupla Tributação celebrado entre Portugal e a Suécia;
  2. O contrato de concessão de marca que serviu de base ao pagamento dos rendimentos pela B... S.A à Requerente;
  3. As faturas emitidas pela Requerente à B... S.A. para cobrança dos fees contratuais (license fees e support fees);
  4. As guias e os documentos de pagamento, que comprovam a entrega ao Estado do IRC retido na fonte;
  5. As notas de crédito que legitimaram o acerto de contas realizado no que respeita aos rendimentos pagos em finais de 2019 e no decorrer do ano de 2020.

Esta matéria, tanto quanto aos factos como quanto ao direito, já foi objeto de pronúncia arbitral nos processos n.ºs 226/2019-T; 903/2019-T e 905/2019-T, respeitantes a rendimentos dos exercícios de 2011, 2012 e 2016, respetivamente, tendo o Tribunal considerado que se encontravam reunidas as condições para julgar o pedido totalmente procedente.

Em bom rigor, a matéria de facto e de direito constante dos aludidos processos é idêntica à dos presentes autos e, por concordarmos com as decisões proferidas, acompanhamos a respetiva fundamentação.

Ora, quanto ao facto de as faturas aqui sindicadas não fazerem referência expressa ao contrato que lhe subjaz, subscrevemos o entendimento perfilhado no processo arbitral n.º 226/2019-T, de que, efetivamente, “(...) o contrato de concessão de marca não está explicitamente identificado no descritivo das mesmas faturas, pelo respetivo nome e data. Mas o descritivo das referidas faturas permite-nos fazer uma ligação clara entre o contrato de concessão de marca e as faturas, uma vez que no descritivo das faturas consta a informação “Bussiness Model License Fee New Markets”, (vide tradução certificada – Taxa de Licenciamento do modelo empresarial) o que está em conformidade com a terminologia utilizada no ponto VII do contrato de concessão de marca que na versão inglesa refere expressamente: “Licensee shall pay do Licensor a variable license fee in respect of using the B... Bussiness Model and all related intangibles under this Agreement” tradução: O licenciado pagará ao licenciador uma taxa de licenciamento variável relativamente à utilização da Marca e o Logótipo... e a todos os ativos incorpóreos conexos nos termos do contrato”

Como é bom de ver, a Requerida não pôs em causa, em momento algum, a existência do contrato de concessão de marca, nem a respetiva validade, pelo que se presume que aceita que o mesmo é fonte de obrigações com relevância para efeitos fiscais, que são os que aqui estão em causa.

As terminologias utilizadas, quer nas faturas, quer no aludido contrato, são coincidentes, o que permite estabelecer um nexo causal entre ambos os documentos e concluir que estes dizem respeito à mesma realidade.

Mais, as faturas, que são emitidas de acordo com legislação estrangeira, fazem sempre referência ao dito contrato, já que por discriminarem as verbas em relação às quais são debitados os valores de “license fee” e “suport fee”, é perfeitamente evidente que identificam o contrato a que respeitam.

Na verdade, são estas as referências que constam do contrato e das faturas, bem como o período a que respeitam, pelo que é manifesta a relação direta entre ambos os documentos.

Assim, os elementos de prova juntos aos autos pela Requerente permitiram ao Tribunal concluir de forma segura que as faturas correspondem, efetivamente, a pagamentos efetuados em cumprimento do contrato de concessão de marca, não sendo de aceitar o argumento invocado pela Requerida.

Por outro lado, e não obstante as notas de crédito não façam menção às faturas juntas aos autos pela Requerente, sempre se dirá que o descritivo daquelas permite fazer a relação direta entre as notas de crédito e o contrato de concessão de marca e, por conseguinte, entre as notas de crédito e as faturas melhor acima identificadas; porquanto, quer nas faturas como nas notas de créditos são discriminadas as verbas em relação às quais são debitados e creditados os valores de “license fee” e “suport fee”, bem como os períodos a que respeitam, tudo isto de acordo com o contrato de concessão de marca.

Note-se que o descritivo da nota de crédito AR10:8122, datada de 04.12.2020, no montante de €720.250,00, da qual consta “Year 2020”, refere expressamente a existência de uma diferença entre os “Business License Fees” efetivamente pagos até à data (incluindo os valores de dezembro) e os “Business License Fees” efetivamente devidos, considerando a nota de crédito um valor negativo de €685.666,67, pelo que os meios probatórios carreados aos autos pela Requerente permitem ao Tribunal formar convicção segura de que tal nota de crédito corresponde ao documento através do qual foi feito o acerto de contas dos license fees referente ao exercício de 2020 pagos pela B... S.A. à Requerente, acerto de contas esse efetuado no final do ano e em conformidade com o presente modelo de negócio, conforme alega a Requerente.

Também o descritivo da nota de crédito AR10:8162, datada de 11.12.2020, que incorpora o montante a crédito de €27.000,00 e refere expressamente “recalculation of group fees based on the final 2019 results”, coincide com o explicitado pela Requerente de que “Excecionalmente, poderão existir acertos a efetuar no ano subsequente, respeitantes a fees do ano anterior que qualificam como acerto à estimativa inicial e que são registados no exercício, tal como se verificou no ano de 2020, no qual foi necessário efetuar acertos finais ao fees do ano de 2019”.

Mais, das faturas e das notas de crédito juntas aos autos, conjugadas com o alegado pela Requerente, resulta claro o conteúdo negocial aqui em causa: (i) no decurso do ano aqui sindicado foram emitidas faturas que correspondem a uma estimativa trimestral do valor dos fees a cobrar relativamente aquele período (4 trimestres de 2020); (ii) no final de cada ano, a Requerente emite um novo documento, cujo objetivo é apurar o quantitativo final dos fees a cobrar à B... S.A.; (iii) não obstante, a existência de faturas trimestrais em 2020 para cobrança dos fees anuais – as faturas previsionais emitidas no decurso do ano de 2020 – a B... S.A efetua os pagamentos dos fees à Requerente numa base mensal, correspondente ao valor mensal proporcional do total da fatura respeitante ao período para o qual corresponde o montante faturado (i.e., ao valor do fees relativo a cada mês); (iv) caso existam acertos a efetuar no valor do referidos fees anuais, os mesmos são efetuados no final do ano e; (v) excecionalmente, poderão existir acertos a efetuar no ano subsequente, respeitantes a fees do ano anterior que qualificam como acerto à estimativa inicial e que são registados no exercício.

Face ao exposto, improcede, mais uma vez, o argumento deduzido pela Requerida.

Por sua vez, veio a Requerida, igualmente, pôr em causa a falta de prova sobre como é efetuado o cálculo do montante efetivo dos fees a receber pela casa mãe.

Ora, salvo melhor opinião, o cálculo do montante efetivo de fees tem em consideração a forma de cálculo prevista no contrato, tendo por base os resultados obtidos pela B... S.A. nesse exercício, pois é isso que resulta da cláusula VII daquele documento, documento esse, que, conforme já se referiu anteriormente, não foi impugnado, em momento algum, pela Requerida, o que significa que esta o aceitou nos seus exatos termos.

Para além de que as notas de crédito contêm a descrição dos passos seguidos para apurar o montante em cada um dos itens que a B... S.A. deve contabilizar como pagamento em excesso.

De qualquer modo, é manifesto que, se o contrato está estruturado por forma a cobrar royalties durante determinado exercício e se o pagamento tem como base inicial o orçamento da B... S.A. para esse ano (no caso do exercício de 2019) ou as faturas emitidas trimestralmente (que indicam os fees estimados a cobrar relativamente aos quatro trimestres, no caso do exercício de 2020), e que no final do ano (ou, excecionalmente, no ano subsequente), em face dos resultados reais obtidos, se efetuam acertos, não há como não aceitar a demonstração que consta das notas de crédito.

As notas de crédito indicam-nos os valores corrigidos relativamente às faturas apresentadas nos autos pela Requerente e que respeitam aos resultados já definitivos considerados até aquele momento.

Com efeito, não é de repudiar este tipo de procedimento, não só porque se trata de empresas do mesmo grupo, como dessa forma se reduzem os custos administrativos ao longo do ano.

E, ainda que se pusesse em causa o valor dos acertos efetuados, a conferência das importâncias devidas é sempre possível depois do apuramento do resultado definitivo, pelo que tanto a Requerida como a B... S.A., enquanto entidade pagadora, podem conferir, a final, o rigor dos cálculos e dos valores devidos ou cobrados.

Como o contrato fixa, como base de cálculo, o resultado do exercício sobre o qual é aplicada uma determinada percentagem, a Requerida terá sempre meios de conferir os valores em causa e proceder em conformidade.

Dito isto, não é de aceitar, novamente, a argumentação expendida pela Requerida no que toca a esta questão.   

Por último, considera a Requerida que não foi apresentada qualquer documentação contabilística que permitisse apurar a realização da operação e da sua influência nos resultados da B... S.A.

Aqui acompanhamos na integra o entendimento proferido no processo arbitral n.º 905/2019-T, cuja fundamentação transcrevemos:

Primeiramente temos de considerar que o pedido de pronúncia tem como objeto um pedido de reembolso de retenções na fonte de IRC que estão devidamente documentadas com cópia das guias de entrega do imposto retido. Por seu turno, que se colha dos autos, a Requerida não colocou em crise nem o contrato, nem as guias nem outros documentos apresentados para documentar o pedido, bem pelo contrário, a AT entende que “... a situação tributária da Requerente encontrar-se-ia, à partida, correta e regularizada (n.º 15 da Resposta).

Foram também juntas aos autos as provas contratuais subjacentes às operações justificativas: quer as regras para o apuramento do valor dos rendimentos sujeitos, quer as fontes obrigacionais que deram origem tanto aos movimentos a crédito como dos movimentos a débito, e também aí a AT não contrapôs qualquer dúvida.

Face a este quadro de declarações e documentos emitidos nos termos legais, estamos perante uma situação de presunção de veracidade das declarações da Requerente e da contabilidade da empresa devedora dos rendimentos, que igualmente não foi posta em causa.

Perante tal presunção de legalidade, o sujeito passivo fica dispensado de produzir outras provas comprovativas do seu direito e tem de se aceitar que tanto o rendimento como as retenções declaradas correspondem ao realmente obtido e ao imposto retido e entregue.

De conformidade com a Lei Geral Tributária, no seu artigo 74.º o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca. Ao contribuinte cabe produzir prova dos factos constitutivos do seu direito, partindo, sempre, de que se presumem verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estes estiverem organizados de acordo com a legislação comercial e fiscal. À Administração Tributária, perante a prova produzida, cabe infirmá-la através dos meios legais ao seu dispor, que não com meras dúvidas formais não baseadas, nem em nenhum procedimento de inspeção, nem em qualquer outro facto ou documento que abale a credibilidade conferida às declarações da Requerente entregues segundo a lei aplicável, e, contrariamente ao que afirma, não pode impor, por falta de apoio legal, a obrigação de “... a comprovar através da sua documentação contabilística, um facto que alega em sede de reclamação por si peticionada à AT, e não sendo este provado através de meios idóneos, não se pode aferir pela presunção de veracidade dos registos contabilísticos relativamente a esse ato”.

Aqui chegados, consideramos que a Requerente produziu prova dos factos constitutivos do direito que se arroga, ou seja, ser reembolsada da coleta de IRC retida na fonte em excesso, já que carreou aos autos elementos que permitiram concluir que as retenções na fonte foram realizadas e entregues ao Estado, que o rendimento sobre o qual incidiram as retenções foi corrigido, através da emissão das notas de crédito acima identificadas, e que os documentos de suporte aos pagamentos (faturas) e os documentos de acerto (notas de crédito), além de serem emitidos nos termos legais, permitem, por meio dos respetivos descritivos, estabelecer um nexo causal entre tais documentos e o contrato que lhes subjaz.

Concomitantemente, à luz da presunção de verdade de que gozam a contabilidade e os documentos que a integram, ao abrigo do disposto no artigo 75.º da LGT, estão preenchidos os requisitos legais para atender ao pedido de reembolso das quantias em excesso entregues nos cofres do Estado, pelo que também esta pretensão da AT improcede.

Assim, considerando que o valor final dos royalties auferidos pela Requerente em território Português ascendeu a €835.916,00 (License Fee de dezembro de 2019 e License Fee de 2020) e que estão verificados os pressupostos para aplicação da taxa reduzida prevista no ADT celebrado entre Portugal e a Suécia, conforme prova efetuada nos presentes autos (e que não foi causa de dissenso entre as partes), é manifesto que a Requerente só teria de entregar nos cofres do Estado, IRC no montante de €83.591,67, correspondente à aplicação da taxa reduzida de 10% prevista no ADT.

Face à prova documental junta (contrato de concessão de marca, faturas e notas de crédito), é inequívoco que a Requerente fez prova da redução do valor dos royalties recebidos no decurso de 2020 (e no final de 2019), o que motivará a anulação parcial dos atos de retenção na fonte em apreço.

Tudo resumido, podemos concluir que a Requerente suportou IRC em montante superior ao valor dos rendimentos auferidos em território português no ano de 2020 e pagos pela B... S.A. o que não poderá subsistir, sob pena de violação do princípio da legalidade e da capacidade contributiva, o que determinará a procedência dos presentes autos – anulação parcial dos atos de retenção aqui sindicados e o reembolso à Requerente do valor de €40.325,03 –.

*

A Requerente peticionou, ainda, o pagamento de juros indemnizatórios.

Ora, face a declaração de ilegalidade dos atos de retenção na fonte a título definitivo, considera-se serem devidos juros indemnizatórios à Requerente, desde a data do indeferimento expresso da reclamação graciosa até à data do processamento da respetiva nota de crédito nos termos do artigo 61.º, n.º 5, do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. a), do RJAT, calculados sobre a quantia indevidamente paga pela Requerente, à taxa de juros legais em conformidade com o disposto nos artigos 43.º, n.º 4 e 35.º, n.º 10, ambos da LGT. 

 

V. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, anular a decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa e os atos tributários impugnados;
  2. Julgar procedente o pedido de reembolso e condenar a Requerida no seu pagamento, acrescido de juros indemnizatórios contados, nos termos legais, da data do indeferimento expresso da reclamação graciosa;
  3. Condenar a Requerida ao pagamento das custas do processo.

 

 

VI. VALOR DA CAUSA

Fixa-se ao processo o valor de €40.325,03, nos termos do artigo 97.º-A do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VII. CUSTAS

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €2.142,00, nos termos da tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 11 de abril de 2023

 

(Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT)

 

A Árbitra,

 

Susana Cristina Nascimento das Mercês de Carvalho