SUMÁRIO:
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Nos termos do artigo 74.º, n.º 1 e 75.º da LGT, compete à AT provar a existência de indícios sérios de que as faturas não correspondem operações reais.
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Não se apresentam como indícios suficientemente sólidos questionar a falta de capacidade produtiva e, em simultâneo, questionar a falta de prova da diferença entre o custo de uma funcionária e o valor efetivamente cobrado.
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Não pode a AT invocar a falta de requisitos formais das faturas e não apresentar suporte documental que sustente tal afirmação.
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Feita prova indiciária, a lei faz cessar a presunção de boa-fé creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à faturação indiciada.
DECISÃO ARBITRAL
O árbitro do Tribunal Singular Dr. Armando Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 02.08.2022, decide:
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RELATÓRIO
A..., LDA, titular do NIPC ..., com sede social sita na Rua ..., n.º ..., ..., sala ..., união de freguesias de..., ..., ..., ..., ... e ..., ...-... Porto, apresentou pedido de pronuncia arbitral e de constituição de tribunal arbitral singular, ao abrigo do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento expresso do procedimento tributário de reclamação graciosa, bem como, a anulação da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), do exercício fiscal de 2016, titulada pelo n.º 2020..., de 10 de agosto de 2020, e respetiva demonstração de liquidação de juros, bem como ainda da correspondente demonstração de acerto de contas com um saldo final a pagar pela Requerente de € 9.225,59, bem como da liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), identificada sob o n.º 2020..., de 13 de agosto de 2020, do período de 201603T, e respetiva demonstração de liquidação de juros, bem como ainda das correspondentes demonstrações de acerto de contas com um saldo final a pagar pela Requerente de € 34.149,44, sendo a Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”).
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O pedido foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 25 de maio de 2022.
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A Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 6.º do RJAT, foi designado, pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, a 12 de agosto de 2020, o ora signatário como Árbitro a integrar o Tribunal arbitral singular, o qual se constituiu em 2 de agosto de 2022, em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º, do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
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A Requerida, notificada para o efeito a 3 de agosto de 2022, apresentou resposta em 30 de setembro de 2022, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
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Em 03-10-2022, a AT procedeu à junção do processo administrativo.
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Por despacho datado de 07 de outubro de 2022, a diligência de inquirição de testemunhas e declaração de partes foi agendada para o dia 18 de outubro de 2022, data que, por impossibilidade de agenda das partes, foi alterada para o dia 28 de novembro de 2022.
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A 28 de novembro de 2022 realizou-se a diligência de inquirição de testemunhas e declarações de parte, tendo o tribunal notificado a Requerente e Requerida para, por esta ordem e de modo sucessivo, apresentarem alegações escritas no prazo de 15 dias.
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Nessa mesma diligência notificou-se a Requerente para efeitos de pagamento da taxa arbitral subsequente.
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Em 14 de dezembro, a Requerente procedeu à apresentação das suas alegações.
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A 16 de dezembro, a Requerente procedeu à junção do documento comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente.
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Em 17 de janeiro, a Requerida procedeu à apresentação das suas alegações.
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SANEAMENTO
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O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. alínea a) do nº 1 dos artigos 2.º e 5.º do RJAT).
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As partes têm personalidade e capacidade judiciárias e mostram-se legítimas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
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O processo não enferma de qualquer ilegalidade.
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MATÉRIA DE FACTO
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Factos provados
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Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente é uma sociedade por quotas constituída em 30 de janeiro de 2014, sedeada na cidade do Porto, e que tem como objeto social: “Atividades de programação informática, consultoria informática e atividades relacionadas com tecnologia de informação e informática, processamento de dados, base de dados, domiciliação de informação e atividades relacionadas, portais web e outras atividades de serviços de informação, telecomunicações.”, conforme decorre da sua certidão permanente que se junta e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais”.
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O seu código CAE é o 62010 – Atividades de Programação Informática.
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A Requerente integra um grupo de sociedades que, entre si, desenvolvem várias operações com incidência em serviços especializados e cedência de ativos intangíveis.
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Na sequência de uma ação inspetiva de âmbito parcial, em sede de IRC e IVA, que visou o ano de 2016, credenciada sob a ordem de serviço n.º OI2019..., com início em 24 de janeiro de 2020 e conclusão em 15 de junho de 2020, a Inspeção Tributária promoveu correções tributárias em sede de IRC e IVA, em particular:
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As correções acima decorrem, segundo os serviços de inspeção, de (i) gastos que não correspondem a operações reais e titulados por fatura emitida pela empresa B..., S.A.; e (ii) gastos que não correspondem a operações reais titulados por fatura emitida pela empresa. C..., LDA.
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Tais correções foram vertidas no projeto de Relatório de inspeção tributária (de ora em diante RIT), que foi notificado à Requerente bem como ao seu Representante legal, para o respetivo direito de audição, o qual não foi exercido.
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A 4 de maio de 2021, por não concordar com as referidas liquidações adicionais, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa.
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A 29 de dezembro de 2021, foi proferido pela Direção de Finanças do Porto um projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que foi convolado na decisão final de indeferimento do procedimento tributário de Reclamação Graciosa.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos ao PPA, no processo administrativo junto pela AT e, por fim, com as declarações prestadas em sede de inquirição de testemunhas e declarações de parte.
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Factos não provados
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Não ficou provado que as faturas e os elementos constantes dos documentos de suporte, não cumprem com os requisitos de forma previstos nos códigos do IRC e IVA para a aceitação fiscal do gasto incorrido ou suportado e respetiva dedutibilidade do IVA.
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Fundamentação da decisão da matéria de facto
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Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e n.º 3 do artigo 607.ºdo CPC, aplicáveis ex vi alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT).
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Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis das questões de direito (cfr. n.º 1 do anterior artigo 511.º, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º, do RJAT).
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Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º do CPPT, a prova documental apresentada pela Requerente e a prova testemunhal efetuada, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, com base nos elementos documentais aí indicados.
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DO DIREITO E DO MÉRITO
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Questões a decidir
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O presente pedido de pronúncia arbitral tem como questões controvertidas as correções em sede de IRC e de IVA efetuadas pela AT, constantes de relatório de inspeção tributária e refletidas nos atos de liquidação de IRC, de IVA e de Juros Compensatórios aqui em apreço.
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Estão em causa, designadamente, as seguintes correções:
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Gastos correspondentes as faturas emitidas pela empresa B..., SA, que titula serviços de “consultoria de gestão”, “avenças de 2016” e “comissões de sucesso” – está em causa a não dedutibilidade em sede de IRC dos custos suportados com a fatura emitida pela B..., SA referente a prestação de serviços de consultoria de gestão, avenças de 2016 e comissão de sucesso relativo a 2016, bem como a não dedução do IVA associado à respetiva fatura.
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Gastos correspondentes a fatura emitida pela empresa C..., LDA, que titula a cedência de tecnologia à Requerente - está em causa a não dedutibilidade em sede de IRC dos custos suportados com a fatura emitida pela C..., LDA associada à cedência de um ativo fixo tangível, bem como a não dedução do IVA associado à respetiva fatura.
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Posição das Partes
Gastos correspondentes as faturas emitidas pela empresa B..., SA
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Posição da Requerente
Invoca a Requerente que no âmbito da relação de grupo existente entre sociedades – na presente situação, uma um domínio através de uma detenção indireta - a utilização de recursos humanos integrantes da sociedade B..., S.A. é perfeitamente compreensível numa ótica de partilha e de otimização de recursos em sociedades coligadas.
Afirmando que tais serviços advieram da alocação à Requerente da colaboradora F..., enquanto trabalhadora dependente da B..., S.A., e nesta com o cargo profissional de diretora e onde exercia funções de “Business Developer”, pelo que o gasto incorrido pela aqui-Requerente para que beneficiasse com a cedência daquele recurso humano pela B..., S.A. justificava-se plenamente, dado o seu inquestionável contributo para a obtenção de rendimentos sujeitos a IRC por parte da Requerente.
Refere ainda que a Requerente foi criada para o desenvolvimento de negócios, desde a fase da sua conceptualização até à prova do conceito, tendo como objetivo angariar investidores que financiassem o desenvolvimento da empresa nas fases seguintes. O desenvolvimento das ideias seguia um processo de sucesso ou de eliminação, que consistia na validação dos pressupostos do negócio com o mínimo de investimento possível, e apenas com os pressupostos validados se avançaria para as fases seguintes de desenvolvimento.
A condução destes negócios era feita pela equipa da Requerente, constituída pelo gerente e pelas colaboradoras D... (diretora) e E..., a que acrescia ainda a F..., cedida a tempo integral à aqui-Requerente.
Neste sentido, a faturação questionada pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto traduz o colocar em causa da alocação da F... à Requerente, nos custos anuais incorridos pela B..., S.A. com remunerações, despesas de deslocações, comunicações e demais despesas, e sempre com a inerente margem, tal como decorre das regras de mercado emergentes dos princípios subjacentes à disciplina dos preços de transferência.
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Posição da Requerida
Entende a AT que, por um lado, as faturas emitidas pela sociedade B... (sociedade do grupo) foram registadas pela Requerente na conta corrente de fornecedor (221110012) e foram pagas por transferência bancária conforme registos a débito na referida conta; e, por outro, a conta 2782100021 regista a débito vários movimentos financeiros que não evidenciam respeitar a quitação de faturas, porque no período de junho a dezembro não se verifica que tenham sido emitidas faturas pela B... à A... .
Acresce que e o exfluxo financeiro associado ao débito nessa conta (2782100021), assim como noutras contas da 2782 das empresas do “Grupo”, antecede, em regra, um influxo financeiro nas contas da A... por via das empresas G... e H..., concluindo que, tal como os SIT, tais movimentos podem respeitar a levantamento de montantes em dinheiro das contas bancárias da A... que não correspondem a operações comerciais efetivas
Fundamenta ainda que, pelo facto de a B... ter apenas dois funcionários, não se mostra credível que as alegadas prestações de serviços à Requerente, evidenciados nessas faturas tivessem efetivamente ocorrido.
Acrescenta ainda que a descrição das faturas que titulam as operações e os elementos constantes dos documentos de suporte, não cumprem com os requisitos de forma previstos nos códigos do IRC e IVA para a aceitação fiscal do gasto incorrido ou suportado e respetiva dedutibilidade do IVA.
Referindo igualmente que, para além das faturas, não existem na contabilidade quaisquer provas/evidências da realização dos serviços que as mesmas visam titular, inexistindo quaisquer evidências relativamente aos locais em que os serviços foram prestados, e suas datas.
Concluindo que a Requerente não se esforçou sequer por demonstrar em que consistiram concretamente os alegados contratos, bem como, e em que medida a realização dos mesmos se mostraria indispensável na prossecução da atividade por si desenvolvida.
Gastos correspondentes a fatura emitida pela empresa C..., LDA
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Posição da Requerente
Alega a Requerente que os SIT recusam a dedutibilidade fiscal, porquanto consideram que ficou por demonstrar o reconhecimento desses ativos intangíveis e, também, porque entendem que não estão observados os requisitos ínsitos no artigo 23.º, n.ºs 3 e 4, do Código do IRC mas reconhecem que estes ativos intangíveis assentam em projetos de desenvolvimento e assim estavam reconhecidos na contabilidade da Requerente, pelo que, se lhes impunha que retirassem desse reconhecimento todas as consequências fiscais.
Afirma ainda que estes ativos intangíveis foram objeto de cedência à aqui-Requerente em razão da intenção de se liquidar a sociedade titular dos mesmos, i.e. a C..., LDA, sociedade que havia adquirido estes ativos intangíveis às sociedades H... e G....
Referindo igualmente que, a inversão do ónus da prova alegada pela AT é ostensivamente ilegal.
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Posição da Requerida
Alega a Requerida que a fatura em causa, não cumpre com os requisitos de forma estipulados na lei, mormente no n.º 5 do artigo 36º do Código do IVA e nos nºs 3 e 4 do artigo 23º do CIRC, ao apresentar como descritivo “Venda de ativos intangíveis”.
Acrescentando que os esclarecimentos prestados pela Requerente somente identificam a existência de um circuito documental entre empresas, que entre si têm relações especiais, ficando, todavia, por demonstrar os requisitos necessários para os alegados ativos serem reconhecidos como ativos intangíveis, conforme a isso obriga o disposto no §1 da NCRF 6.
Invoca ainda, depois de efetuar um breve resumo das operações realizadas intragrupo associadas à entidades envolvidas no desenvolvimento deste ativos, que (i) ficou por demonstrar o reconhecimento desses ativos como intangíveis, e consequentemente a sua aceitação como gasto fiscal das reintegrações/amortizações contabilizadas no período sobre tais ativos nos termos do n.º 1 do art.º 23° do CIRC; (ii) não são encargos fiscalmente dedutíveis, embora contabilizados como gastos, em virtude da fatura de suporte que os visa titular não cumpre com os requisitos previstos nos n. ºs 3 e 4 do art.º 23° do mesmo código.
Concluindo, afirmando que, por um lado, não ficaram demonstrados os requisitos necessários para os alegados ativos serem reconhecidos como intangíveis, nos termos da NCRF 6, e consequentemente a aceitação como gasto fiscal das reintegrações/amortizações contabilizadas e, por outro, a fatura de suporte cumpre com os requisitos previstos nºs. 3 e 4 do artº 23º do CIRC, pelo que este encargo não pode ser aceite fiscalmente, nos termos da alínea c) do nº 1 do artº 23º-A do mesmo código.
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Apreciação
Ordem de Conhecimento dos Vícios
A Requerente fundamenta o pedido de anulação contenciosa em vício de falta de fundamentação e em vícios de violação de lei relacionados com a dedutibilidade de custos.
Conforme dispõe o Artigo 124.º do CPPT, na sentença a proferir no processo de impugnação (igualmente aplicável no âmbito dos processos arbitrais ex vi Artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT), o Tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação (n.º 1), havendo lugar, no primeiro grupo, à apreciação prioritária dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, e, no segundo grupo, a indicada pela Requerente, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior (n.º 2).
No presente caso, não são arguidos vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado ou outros que resultem do exercício da ação pública, estando apenas em causa vícios que conduzem à anulação do ato administrativo.
Por outro lado, a Requerente não indica uma relação de subsidiariedade entre os vícios, pelo que se afigura haver lugar ao conhecimento prioritário dos vícios de violação de lei por serem estes que conferem mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, visto que o vício de falta de fundamentação – a proceder – não impediria que a AT produzisse, em execução de julgado, um ato de idêntico sentido após inclusão da devida fundamentação.
O Ónus da prova
No essencial, o presente processo versa sobre correções ao IRC e IVA, porquanto a AT considerou que os gastos fiscais (IRC) e o IVA deduzidos pela Requerente estão suportados contabilisticamente por faturas relativamente às quais existem fortes indícios de não titular operações reais.
A título prévio cumpre referir que, conforme se conclui no Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Norte (Proc. n.º 00449/09.3BEVIS, de 25/08/2018), “compete à Administração provar a existência de indícios sérios de que a operação faturada não corresponde à realidade (art.º 74º/1 LGT). Feita esta prova, recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação – vide, entre muitos outros, os acórdãos do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF”.
Significa isto que, de acordo com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Sul, proferido no âmbito do Proc. n.º 1594/09.0BELRA (datado de 25/08/2018):
“Nos termos do n.º 2 alínea a) do referido preceito, a presunção de veracidade não se verifica quando as declarações, contabilidade ou escrita revelem “indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável do sujeito passivo”. No caso dos autos, em que estamos perante situação em que as facturas contabilizadas (títulos de despesa) são emitidas na forma legal, mas que, ao menos na óptica da AT, não têm subjacente a operação económica que reflectem, é à AT que cabe o ónus da prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação, nos termos do n.º1 do art.º74.º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua actuação correctiva, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes enunciadas no n.º1 do art.º75.º da mesma LGT. Para tanto, é suficiente que a AT demonstre a existência de “indícios fundados” (objectivos, sólidos e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais), para fazer cessar a presunção de veracidade estabelecida a favor do contribuinte no n.º1 do art.º75.º da LGT, não se impondo a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam. Quando se verifique cessação da presunção de veracidade dos elementos declarativos e de contabilidade e escrita, passa a caber ao contribuinte – desprovido do escudo protector da presunção legal (artigos 74.º, n.º1 da LGT e 342.º, n.º1 e 344.º do Código Civil) – o ónus de prova da existência dos factos tributários que invoca como fundamento do seu direito à dedução, como custos fiscais, das verbas representadas pelas facturas consideradas falsas”.
Em sentido semelhante, o Acórdão proferido no Proc. n.º 1594/09.0BELRA (datado de 11/10/2018) pelo TCA-Sul defende que:
“Estando em causa indícios de facturação falsa, a AT não tem que provar a falsidade das facturas; basta-lhe demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as facturas são «falsas» para cumprir o seu encargo probatório.
Feita esta prova indiciária, a lei faz cessar a presunção de boa-fé creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à facturação indiciada.
Onerado com o ónus da prova da veracidade das operações materiais subjacentes à «facturação indiciada», os esforços que o contribuinte deve mobilizar para abalar os indícios de falsidade recolhidos não podem deixar de ser exigentes e sem margem para dúvidas.
Não basta ao contribuinte gerar a mera dúvida sobre a falsidade das facturas para conseguir ganho de causa. Estando onerado com a prova da materialidade das operações, se persistir a dúvida, esta resolve-se contra a parte onerada com a prova”.
Ora, face ao exposto a título introdutório cumpre, assim, verificar, em primeiro lugar, se os indícios apurados pela AT consubstanciam “indícios fundados” de que as faturas desconsideradas não têm subjacentes as operações que titulam.
Verificando-se tais indícios, caberá então à Requerente provar (e não apenas gerar “mera dúvida”) que tais faturas (reputadas como falsas) demonstram a realidade económica das operações que titulam.
Note-se, por fim, que para efetuarmos esta análise é, conforme esclarece o TCA-Norte, “essencial conhecer-se a motivação dos atos impugnados, de modo a que o tribunal a possa sindicar, uma vez que é à luz dessa fundamentação (vertida no Relatório da Inspeção Tributária – RIT -, uma vez que é neste que reside toda a factualidade que consubstancia a declaração fundamentadora dos atos de liquidação impugnados) que o tribunal (...) tem de sindicar se a AT demonstrou os pressupostos que legitimam a sua atuação” (Proc. n.º 00543/16.4BEPRT, de 03/03/2022).
Gastos correspondentes as faturas emitidas pela empresa B..., SA
Ora, no que diz respeito a este ponto, entende este Tribunal que a Requerente logrou apresentar justificação plausível e suficiente que justifica a realização das despesas aqui em causa, demonstrando que as mesmas se revelaram essenciais para a manutenção da sua atividade.
Com efeito, da documentação apresentada pela Requerente (documentos 10 a 14, junto ao processo) é evidente a execução de trabalhos por parte da colaboradora da F... na prossecução da atividade da A...– o que, de forma consistente e credível, foi confirmado pelas testemunhas I... e J... .
Acresce que o argumento utilizado pela Requerida referente à falta de capacidade produtiva da B... não colhe, uma vez que, para além de o serviço executado e objeto de faturação ser prestado pela colaborada que a própria AT reconhece integrar a estrutura da B..., é a própria AT que, de forma totalmente discricionária, questiona a falta de prova da diferença entre o custo da funcionária para a B... e o valor efetivamente faturado à Requerente.
Por outro lado, quanto ao facto de os documentos que titulam a respetiva operação não cumprirem os previstos nos códigos do IRC e IVA para a aceitação fiscal do gasto incorrido ou suportado e respetiva dedutibilidade do IVA, não pode a AT invocar a falta de requisitos e não apresentar suporte documental que sustente tal afirmação.
Desta forma, tendo em consideração o exposto no artigo 74.º da LGT “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”, ao não juntar ao processo as faturas que afirma não cumprirem os requisitos legais para a dedutibilidade, não demonstrou a ilegitimidade na dedução dos gastos fiscais (IRC) e do IVA efetuada pela Requerente.
Nesta medida, julga-se procedente o pedido arbitral relativamente às correções referentes à fatura emitida pela B..., determinando-se, na parte correspondente, anulação dos atos de liquidação de IRC, IVA.
Por fim, procedendo o PPA neste ponto fica prejudicada a apreciação do vício de falta de fundamentação.
Gastos correspondentes a fatura emitida pela empresa C...
No que diz respeito a este ponto e relativamente ao argumento da falta de requisitos formais das faturas para consideração fiscal na esfera da Requerente, reitera-se tudo o que foi atrás referido relativamente à aplicação do artigo 74.º da LGT, ou seja, ao não juntar ao processo as faturas que afirma não cumprirem os requisitos legais para a dedutibilidade, não demonstrou a ilegitimidade na dedução dos gastos fiscais (IRC) e do IVA efetuada pela Requerente.
Contudo, para além dos requisitos formais das faturas que titulam a operação a AT alegou que ficou por demonstrar os requisitos necessários para os alegados ativos serem reconhecidos como ativos intangíveis, conforme a isso obriga o disposto no §1 da NCRF 6, e que, como bem refere, são (i) identificabilidade; (ii) controlo por parte da empresa; (iii) obtenção de benefícios económicos futuros.
Para o efeito, e como o intuito enquadrar a relação comercial entre todas as entidades envolvidas, a AT apresenta uma série de indícios fundados, que o tribunal considera como objetivos, sólidos, consistentes e que traduzam, na ótica do tribunal, uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais.
De facto, atendendo ao facto de a sociedade que emite a faturas ter sede em Santarém, a gerência se exercida pelo gerente da aqui Requerente e o contabilista certificado ter a mesma morada profissional do gabinete de contabilidade da A...,
ao que acresce o facto de, em termo declarativos, a C... não entregar a declaração de rendimentos modelo 22 de IRC, não entregar a declaração anual de Informação Empresarial Simplificada, e ainda a inexistência de trabalhadores entre 2014 e 2016, permite formar a convicção de se estar perante indícios de faturação que não titulam qualquer operação real.
Ora, em situações com este recorte, e como bem refere a jurisprudência acima mencionada, a AT não tem que provar a falsidade das faturas, basta-lhe demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as faturas são «falsas» para cumprir o seu encargo probatório.
Feita esta prova indiciária, convicção que o tribunal formou, a lei faz cessar a presunção de boa-fé creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à faturação indiciada.
Ora, como bem refere o Acórdão proferido no Proc. n.º 1594/09.0BELRA pelo TCA-Sul “Onerado com o ónus da prova da veracidade das operações materiais subjacentes à «facturação indiciada», os esforços que o contribuinte deve mobilizar para abalar os indícios de falsidade recolhidos não podem deixar de ser exigentes e sem margem para dúvidas.
O que não sucedeu.
De facto, e como bem refere a Requerida, ficou por demonstrar o reconhecimento desses ativos como intangíveis, e consequentemente a sua aceitação como gasto fiscal das reintegrações/amortizações contabilizadas no período sobre tais ativos nos termos do n.º 1 do art.º 23° do CIRC.
Em face da improcedência dos argumentos materiais, e passando para o argumento formal de falta de fundamentação, não vislumbra este Tribunal, neste ponto em concreto, a existência de falta de fundamentação em nenhuma das fases do procedimento administrativo, tendo em consideração que a AT não só analisou a documentação apresentada, como apresentou os motivos pelos quais divergiu do entendimento da Requerente.
Pelo que se julga improcedente o pedido arbitral relativamente à correção referente às faturas emitidas pela C..., associadas à cedência de tecnologia e reconhecidos na sua totalidade como ativo fixo tangível na contabilidade da A..., determinando-se, em consequência, a manutenção, na parte correspondente, dos atos de liquidação de IRC e IVA em apreço.
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Juros compensatórios
Os atos de liquidação de juros compensatórios têm como pressuposto as respetivas liquidações de IRC e IVA, pelo que enfermam dos mesmos vícios que afetam estas, justificando-se também a sua anulação parcial, nas partes em que estas liquidações devem ser anuladas.
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DECISÃO
De harmonia com o exposto, este Tribunal Arbitral decide:
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Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar a anulação parcial da decisão de indeferimento da Reclamação;
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Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação das liquidações de IRC e IVA, na parte em que desconsiderou a dedução dos gastos fiscais titulados pelas faturas emitidas pela B..., SA, montante este que deverá ser apurado em sede de execução de sentença;
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Julgar improcedente o remanescente do pedido, nos termos atrás descritos.
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VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em 43.375,03 euros, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
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CUSTAS
Ao abrigo do n.º 4 do artigo 22.º do RJAT e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 2.142,00€ (dois mil cento e quarenta e dois euros), repartidas em função do respetivo decaimento na proporção de 66% a cargo da Requerente e de 34% a cargo da Requerida.
Lisboa, 11 de abril de 2023
(Armando Oliveira)