SUMÁRIO:
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A substituição de um ativo fixo tangível já existente por um novo ativo fixo tangível não impede que o investimento realizado neste possa ser qualificado como “investimento inicial”.
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Não existe enquadramento normativo para considerar os “trabalhos para a própria empresa” como elegíveis para a atribuição do benefício do RFAI.
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O investimento realizado em equipamento básico e administrativo que, de forma complementar a outros investimentos, contribua para a transformação e atualização tecnológica do modelo de produção, bem como para o incremento da eficiência do processo produtivo, é apto a promover o aumento da capacidade produtiva da empresa.
IV. O regime jurídico do RFAI não exige a criação líquida de postos de trabalho, bastando, para a atribuição do benefício fiscal RFAI, que tenham sido efetivamente criados postos de trabalho em resultado do investimento inicial realizado.
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
1. A... SGPS, S.A., sociedade anónima, com sede no ..., ..., ..., em ... (...-...), com o número único de matrícula e de pessoa coletiva ..., veio, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR com vista à declaração de ilegalidade do ato tributário consubstanciado no ato de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2022..., de 10.01.2022, na demonstração de liquidação de juros n.º 2022..., 2022..., 2022..., de 24.03.2022 e na demonstração de acerto de contas n.º 2022..., de 2022.03.24, respeitante ao exercício de 2018, no montante total de € 59.185,40.
2. É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante designada somente por “Requerida” ou “AT”).
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 10-08-2022.
4. A Requerida foi notificada da apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral em 16-08-2022.
5. Dado que os Requerentes não procederam à nomeação de árbitro, foi o signatário designado como árbitro, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1, do RJAT, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
6. Em 28-09-2022 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
7. Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 18-10-2022.
8. Os Requerentes sustentam, em síntese, que a AT, ao entender que não estavam verificados os pressupostos necessários à elegibilidade dos investimentos feitos pela Requerente, melhor descritos infra, para efeitos do RFAI, com o fundamento de que os investimentos realizados não podem ser qualificados como “investimento inicial” e de que não está preenchido o requisito de criação de postos de trabalho, exigido pela alínea f) do n.º 4 do artigo 22.° do CFI, incorreu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pelo que sustenta a Requerente que deve a correção relativa ao RFAI ser anulada, considerando-se os investimentos realizados dedutíveis à coleta do IRC da Requerente, nos termos por esta declarados na Declaração Modelo 22 de IRC do Grupo, com as demais consequências legais.
9. Em sede de Resposta, a Requerida apresentou defesa por impugnação, na qual, concordando com o teor do Relatório de Inspeção Tributária (RIT), sustenta que a Requerente não reúne os pressupostos para beneficiar do RFAI, por, em suma, entender existir (i) incumprimento da condição de o investimento realizado respeitar a um investimento inicial [artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro] e (ii) incumprimento da condição de criação e manutenção de postos de trabalho [artigo 22.º, n.º 4, alínea f), do CFI], rejeitando os argumentos apresentados pela Requerente, a qual, em seu entender, não consegue demonstrar hipotética conclusão diversa daquela a que chegaram os Serviços de Inspeção Tributária (SIT), pelo que entende que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos.
10. Por despacho arbitral de 28/11/2022, a Requerente foi convidada pelo Tribunal a dizer se mantinha o interesse na realização da diligência de prova, dada a sua aparente desnecessidade e considerando a oposição manifestada pela Requerida, e, em caso afirmativo, identificasse os factos sobre os quais pretendia que incidisse a inquirição.
11. A Requerente não se pronunciou.
12. Por despacho arbitral de 07/02/2023, o Tribunal, ao abrigo dos princípios da autonomia na condução do processo, da celeridade e da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT), decidiu dispensar a produção de prova testemunhal, dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e conceder às Partes o prazo simultâneo de 10 dias para a produção de alegações escritas facultativas, conforme previsto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
13. A Requerente e a Requerida apresentaram alegações em 22/02/2022, nas quais mantiveram, no essencial, respetivamente, o teor do pedido de pronúncia arbitral e da resposta.
II – SANEADOR
14. A apresentação do pedido de pronúncia arbitral foi tempestiva.
15. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
16. Não foram alegadas exceções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
17. Não se verificam nulidades, pelo que se impõe conhecer do mérito.
III. MÉRITO
III. 1. MATÉRIA DE FACTO
§1. Factos provados
18. Consideram-se provados os seguintes factos:
a) A Requerente é, à data dos factos, a sociedade dominante do Grupo de sociedades que se encontra abrangido pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), de cujo perímetro faz parte a B..., S.A. (“B...” ou “sociedade”), com o número único de matrícula e pessoa coletiva ..., com sede no ..., ..., em ... (...-...);
b) A B... exerce a sua atividade principal na área da fabricação de motores, geradores e transformadores elétricos (CAE principal 27110);
c) Relativamente ao período de tributação de 2018, a Requerente apurou o lucro tributável do Grupo, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao mesmo;
d) Na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 2018, submetida a 11.05.2020, com a identificação n.º ...-2020-..., a Requerente inscreveu deduções à coleta, a título de benefícios fiscais, no montante de € 54.918,71, conforme campo 355 do quadro 10 abaixo:
e) O valor de tais deduções decorre dos benefícios fiscais inscritos na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC individual, relativa ao período de 2018, respeitante à B...;
f) A B... foi objeto de uma ação inspetiva externa e de âmbito parcial, realizada para efeito de controlo de benefícios fiscais, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2021...;
g) A Requerente foi notificada do Projeto de Relatório da Inspeção Tributária, cujo teor se dá como reproduzido;
h) A Requerente não exerceu o direito de audição sobre o Projeto de Relatório da Inspeção Tributária;
i) Posteriormente, foi elaborado o Relatório da Inspeção Tributária, que manteve as correções propostas em sede de projeto de relatório, cujo teor se dá como integralmente reproduzido, do qual resultou uma correção ao valor total da dotação do benefício fiscal associado ao RFAI da B... e à respetiva dedução efetuada pela empresa em sede de IRC no exercício de 2018;
j) A AT entendeu deverem estar excluídos da elegibilidade do RFAI os investimentos efetuados com a Linha de Pintura Wagner, com a Banca de Ensaios de Média Tensão ISO e com diverso equipamento básico e administrativo, que ascenderam ao valor global de € 219.674,88, tendo, consequentemente, a AT desconsiderado o valor da dotação do benefício fiscal associado ao RFAI da B..., no montante de € 54.918,71;
k) O Relatório da Inspeção Tributária refere, designadamente, o seguinte:
[…]
l) A “Linha de Pintura Wagner” foi adquirida à empresa C..., Lda., e corresponde à “Cabina de troca de cor rápida Wagner modelo SUPERCUBE, Sistema completo automático com eliminação de extração para o exterior, de aplicação de pó electroestático, marca Wagner, composto por: - Cabina em PVC; Sistema de aplicação automático, com deteção e trigger das pistolas; - Sistema de aspiração e filtração de pó de alta eficiência, para otimização da exaustão da cabina; - Powdercenter de alto rendimento, modelo supercenter para redução de desperdícios”;
m) O equipamento tem associado a nota de encomenda da B... n.º 2015..., de 09 de maio de 2018, que menciona uma “data de receção esperada” em 03/09/2018;
n) O transporte/a receção das mercadorias ocorreu no dia 30/11/2018 (cf. anexo 33 ao relatório final de inspeção tributária);
o) O auto de receção dos equipamentos indica que a montagem do equipamento foi concluída em 12 de dezembro de 2018;
p) A alteração e legalização da tubagem de gás da linha de pintura foi faturada em 24 de dezembro de 2018;
q) A ficha de imobilizado da “Linha de Pintura Wagner” e o mapa modelo 32 de Reintegrações e Amortizações indica que o início de utilização do equipamento foi janeiro de 2019;
r) No dossier dos benefícios fiscais, a B... justifica a aquisição do equipamento com os seguintes argumentos, conforme consta do RIT:
s) Relativamente à “Linha de Pintura Wagner”, o Relatório de Inspeção Tributária refere ainda, designadamente o seguinte:
t) Relativamente à “Banca de Ensaios de Média Tensão ISO 20”, o relatório de Inspeção Tributária refere, designadamente o seguinte:
u) No que diz respeito ao diverso equipamento básico e administrativo adquirido, o Relatório de Inspeção Tributária refere, designadamente, o seguinte:
[…]
[…]
v) No que diz respeito à criação de postos de trabalho na B..., o Relatório de Inspeção Tributária refere o seguinte:
w) O Relatório de Inspeção Tributária apresenta a seguinte síntese de correções efetuadas:
x) O investimento na Linha de Pintura Wagner, na Banca de Ensaios de Média Tensão ISO, bem como em diverso equipamento básico e administrativo, resultou numa dotação no montante de € 54.918,71;
y) O investimento realizado na Linha de Pintura Wagner, no montante de € 153.357,81, enquadrou-se na estratégia de longo prazo da empresa, no sentido do aumento da sua capacidade produtiva, e teve como objetivos reduzir o tempo de execução, aumentar a qualidade da pintura e reduzir o desperdício;
z) A “Linha de Pintura Wagner” tem uma eficiência superior ao equipamento que existia anteriormente nas instalações fabris, permitindo aumentar a capacidade produtiva da B...;
aa) No seguimento das conclusões alcançadas em sede de inspeção tributária, a administração tributária procedeu à correção do valor inscrito do campo 355 do quadro 10 da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, do período de 2018, entregue pela Requerente, a título de deduções à coleta por via de benefícios fiscais;
bb) O investimento na Banca de Ensaios de Média Tensão ISO ascendeu a € 42.389,66;
cc) A Banca de Ensaios de Média Tensão ISO foi contruída pela própria empresa (B...);
dd) Este investimento permitiu que a B... passasse a ter uma banca de ensaios com a amplitude de KVAs necessária ao aumento da capacidade produtiva desejado;
ee) A Banca de Ensaios de Média Tensão ISO permitiu aumentar a eficiência produtiva da empresa, em harmonia com a estratégia de aumento da capacidade produtiva;
ff) O investimento em equipamento básico e administrativo englobou a aquisição de máquinas e ferramentas diversas, computadores, discos, processadores, monitores, telemóveis e acessórios e impressora, no montante total de € 23.927,41;
gg) O investimento realizado em equipamento básico e administrativo contribuiu para a transformação e atualização tecnológica do modelo de produção da B..., bem como para o incremento da eficiência dos processos e a redução dos consumos de energia e minimização dos desperdícios na sua produção, revelando-se apro, em conjunto com os outros investimentos realizados, para o aumento da capacidade produtiva da empresa;
hh) O montante das aquisições das aplicações relevantes desta tipologia de investimento inicial foi de €23.927,41, ultrapassando, assim, o montante das amortizações e depreciações dos ativos associados à modernização da sua atividade, contabilizadas nos três períodos de tributação anteriores ao do início da realização do projeto de investimento;
ii) Os investimentos realizados motivaram a contratação de dois colaboradores pela B...– D... (Chefe de equipa do departamento de produção) e E... (Comercial – Ásia e Europa de Leste);
jj) O trabalhador D... foi contratado para assegurar a supervisão direta das atividades desenvolvidas na nova linha de pintura e na nova banca de ensaios, assim que estas entrassem em funcionamento;
kk) O trabalhador E... foi contratado para a área comercial, com o objetivo de aumento das vendas para os mercados Asiáticos e da Europa de Leste;
ll) A correção feita pela AT traduziu-se na redução do montante de € 54.918,71 constante do campo 355 do quadro 10 da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do período de 2018, de forma a corrigir o total da dedução inscrita no campo 355 para o montante de € 0,00 e a dedução inscrita no campo 357 para o montante de € 2.179,16;
mm) A Requerente foi notificada do ato tributário identificado supra, tendo procedido ao pagamento das quantias liquidadas no dia 03/05/2022;
nn) Em 08-08-2022, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
§2. Factos não provados
19. Com relevo para a decisão, não existem factos essenciais não provados.
§3. Motivação quanto à matéria de facto
20. Cabe ao Tribunal selecionar os factos relevantes para a decisão e discriminar a matéria provada e não provada [artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT].
21. Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos em função da sua relevância jurídica, considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito (cfr. artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].
22. Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo por base a prova documental junta aos autos, e considerando as posições assumidas pelas partes, e não contestadas, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT.
III.2. MATÉRIA DE DIREITO
§1. Questão decidenda
23. A questão material controvertida nos presentes autos é a de saber se os investimentos realizados pela Requerente na “Linha de Pintura Wagner”, na “Banca de Ensaios de Média Tensão ISO” e em diverso “equipamento básico e administrativo”, descritos supra, se encontram abrangidos pelo Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI).
§2. Enquadramento jurídico
24. A análise da questão material controvertida requer a interpretação e a aplicação aos factos das normas contidas no artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, no artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, e no artigo 2.º, n.º 49, alínea a), do Regulamento Geral de Isenção por Categoria (RGIC) – Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014.
25. O artigo 22.º do CFI, referente ao Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), estabelece o seguinte:
“Artigo 22.º
Âmbito de aplicação e definições
1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.
2 - Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:
a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;
ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;
iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;
iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
v) Equipamentos sociais;
vi) Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;
b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.
3 - No caso de sujeitos passivos de IRC que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, as aplicações relevantes a que se refere a alínea b) do número anterior não podem exceder 50 % das aplicações relevantes.
4 - Podem beneficiar dos incentivos fiscais previstos no presente capítulo os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:
a) Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
b) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis n.os 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;
d) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer contribuições, impostos ou quotizações ou tenham o pagamento dos seus débitos devidamente assegurado;
e) Não sejam consideradas empresas em dificuldade nos termos da comunicação da Comissão - Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 249, de 31 de julho de 2014;
f) Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).
5 - Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos.
7 - Nas regiões elegíveis para auxílios nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia constantes da tabela do artigo 43.º, no caso de empresas que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, apenas podem beneficiar do RFAI os investimentos que respeitem a uma nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento”.
26. O artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, que densifica os requisitos subjacentes ao RFAI, estabelece o seguinte:
“d) Os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.
27. O artigo 2.º, n.º 49, alínea a), do Regulamento Geral de Isenção por Categoria –Regulamento (UE) n.º 651/2014, determina, por seu lado, que configura “investimento inicial” um “investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”.
§3. Apreciação da questão controvertida
A) Quanto à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado com a “Linha de Pintura Wagner”
i) Posição das Partes
28. Relativamente ao investimento realizado na “Linha de Pintura Wagner”, entende a Requerente, em síntese, o seguinte:
a) O investimento na “Linha de Pintura Wagner” não configurou uma mera substituição de uma antiga Cabina de pintura, mas sim da aquisição de um novo equipamento, com maior capacidade produtiva, mais adequado ao aumento da capacidade de produção;
b) Este investimento configura um investimento num ativo corpóreo relacionado com um processo e uma estratégia delineada de aumento da capacidade de um estabelecimento existente, sendo tal equipamento suscetível de contribuir para o aumento da capacidade produtiva, em linha com o que a aplicação do benefício fiscal demanda;
c) Este investimento visou a adaptação do processo produtivo da tendo em vista o aumento da capacidade de produção da mesma e a readequação do mesmo à dimensão produtiva almejada por aquela empresa, tendo permitido, reduzir consideravelmente o tempo de execução do processo de pintura, bem como melhorar assinalavelmente a qualidade da pintura dos produtos;
d) A “Linha de Pintura Wagner” revelou-se crucial para a melhoria da performance refletida nos indicadores económico-financeiros, permitindo incrementar a modernização e a competitividade, com as inerentes consequências na sua afirmação no mercado, e fabricar, em maior quantidade, os seus produtos, respondendo à procura e às necessidades dos clientes;
e) Não faz sentido, no entender da Requerente, a qualificação do investimento aqui em causa como sendo de substituição;
f) A correção feita pela AT enferma de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, ao considerar que o mesmo é de mera substituição;
g) Ainda que assim não se entendesse, a Requerente sustenta que nunca o enquadramento feito pela AT se coadunaria com a definição de “investimento inicial”, ínsita no artigo 2.º, n.º 49), do Regulamento de Execução n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, enfermando o mesmo de erro sobre os pressupostos de direito;
h) O legislador europeu não efetua qualquer referência ou especificação, na definição que adota, da obrigação de o investimento consubstanciar-se em “investimento pela primeira vez num determinado tipo de ativo fixo tangível”, tal como defende a administração tributária no seu relatório de inspeção;
i) Acresce que, segundo as Orientações relativas a auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, da Comissão Europeia, nas quais o CFI se baseia, tal como resulta do preâmbulo, é referido, especificamente, que se devem considerar “Ativos Corpóreos”, os “ativos como terrenos, edifícios e instalações, máquinas e equipamentos”;
j) Entende a Requerente que a AT procede a uma interpretação restritiva do conceito de “investimento inicial”, desconsiderando, por um lado, as orientações emanadas pela Comissão Europeia nesta matéria, e estabelecendo, por outro lado, um requisito adicional de obrigação de o investimento ser efetuado em novos tipos de ativos fixos tangíveis, quando tal exigência não consta de qualquer diploma, comunitário ou nacional, que regule esta matéria;
k) A lei não impõe como requisito que os bens adquiridos tenham de produzir imediata e diretamente qualquer produto final, conquanto os mesmos possibilitem ou permitam aumentar a capacidade produtiva dos contribuintes;
l) É bastante a natureza planeada e prospetiva do investimento que contribua estrategicamente para o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” – a qual configura a real condição legalmente exigida para que se possa considerar estarmos na presença de um investimento inicial, elegível para efeitos de aplicação do benefício do RFAI aqui em causa;
m) No caso vertente, não só o aumento da capacidade produtiva se verifica no ano da aquisição do equipamento e realização do investimento – 2018 – em virtude do ganho de capacidade produtiva, como a passagem do tempo confirma e consolida tal incremento produtivo;
n) Não há suporte legal para restringir a aplicação do benefício fiscal aqui em causa a investimentos que produzam resultados imediatos, nem sequer para o afastar quando, contra a vontade do investidor, os investimentos acabarem por não produzir os resultados pretendidos.
29. Relativamente ao investimento realizado pela Requerente na “Linha de Pintura Wagner”, entende a Requerida, em síntese, que:
a) Não existiu qualquer alteração na tecnologia de pintura utilizada pela B...– a tecnologia da Cabine de Pintura Wagner “pintura electroestática a pó” é exatamente a mesma que era utilizada até à data;
b) Não existiu qualquer aumento da qualidade e durabilidade da pintura;
c) A Requerente admite que ocorreram investimentos direcionados para uma mera melhoria da eficiência da produção, que conduzissem a uma redução de desperdícios e por inerência, de custos;
d) Esses investimentos não poderão ser considerados enquadráveis na tipologia de “aumento de capacidade de um estabelecimento existente”;
e) Os investimentos direcionados para a melhoria do desempenho/eficiência operacional e organizacional e que reduzem a poluição não conduzem a um aumento da capacidade instalada, quedando-se por permitirem alcançar níveis de eficiência e de redução de custos com base na mesma capacidade já existente;
f) Não é verosímil a afirmação da Requerente de que, por pintar com a mesma tecnologia, as peças metálicas que revestem o gerador (canópias) e os chassis, com uma máquina mais eficiente, aumentou a capacidade instalada de produzir geradores e a sua qualidade;
g) O objeto social da Requerente não é a pintura de peças metálicas que protegem geradores, mas sim a produção de geradores;
h) Os geradores da B... podem trabalhar sem as canópias, ou seja, o produto principal produzido pela empresa (GERADOR) apenas utiliza estas peças metálicas pintadas para estar protegido das condições atmosféricas e insonorizar os espaços onde é colocado, podendo funcionar normalmente sem esta proteção;
i) Não é percetível como a Requerente extrapolou, o alegado desempenho de uma cabine de pintura, de peças metálicas de proteção de geradores, para a capacidade de produção de geradores e capacidade produtivo diária;
j) Não basta existirem supostos “acréscimos de eficiência e produtividade”, conforme defende a Requerente, uma vez que se tratam de meros investimentos de substituição, que não são elegíveis, ainda que tenham uma melhor performance, uma vez que apenas permitem manter a capacidade de produção previamente instalada e o RFAI exige uma expansão dessa capacidade instalada;
k) O investimento na cabine de cor Wagner, dirigido para a “diminuição da poluição” e para a “eficiência produtiva”, não pode ser qualificado como investimento inicial, em sede de RFAI, uma vez que não se enquadra no âmbito de qualquer uma das tipologias definidas pelo n.º 49 do artigo 2.º do RGIC;
l) Segundo a Requerida, improcedem, por falta de fundamento legal e factual, as alegações de que o investimento realizado na “Linha de Pintura Wagner” é elegível para efeitos de RFAI, pelo que são de manter as correções, em sede de IRC do exercício de 2018, efetuadas pelos Serviços de Inspeção da Autoridade Tributária.
30. A Requerida, embora entenda que não existem quaisquer dúvidas de que estamos perante uma substituição, e de que, consequentemente, o pedido deverá ser julgador totalmente improcedente, solicita que, na hipótese de substituir alguma dúvida no julgador, se proceda ao reenvio prejudicial ao TJUE, com a seguinte questão: “A simples substituição de activos individuais sem alterar fundamentalmente o processo de produção global constituindo um investimento de substituição e não qualificando como uma alteração fundamental de um processo de produção global é elegível para auxílios regionais ao investimento, uma vez que não é considerado um investimento inicial?”
ii) Apreciação da questão referente à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado com a “Linha de Pintura Wagner”
31. A elegibilidade dos investimentos ora em causa, para efeitos do benefício do RFAI, terá de consistir num investimento inicial (por contraposição a investimento de substituição), atendendo ao disposto nos artigos 2.º, n.º 49, al. a), do RGIC, e 2.º, n.º 2, al. d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro.
32. O fundamento adotado pela Requerida para a desconsideração dos investimentos realizados pela Requerente com a “Linha de Pintura Wagner” para efeitos de RFAI resulta do entendimento de que os mesmos configuram meros investimentos de substituição, que contribuíram apenas para a melhoria da eficiência da produção, e que não poderão, consequentemente, ser considerados enquadráveis na tipologia de “aumento de capacidade de um estabelecimento existente”.
33. Resulta da matéria de facto dada como provada que o investimento realizado pela Requerente na “Linha de Pintura Wagner”, no montante de € 153.357,81, se enquadrou na estratégia de aumento da sua capacidade produtiva da B... possibilitando a redução do tempo de execução, o aumento da qualidade da pintura e a redução do desperdício, face ao equipamento que existia anteriormente.
34. O aumento da eficiência do processo produtivo possibilita, assim, que se produza mais quantidade com o mesmo número de horas de produção, traduzindo-se na aptidão para prosseguir o objetivo de aumento da capacidade produtiva da empresa.
35. O facto de a “Linha de Pintura Wagner” vir substituir o equipamento anteriormente existente não impede que o investimento realizado possa ser qualificado como “investimento inicial”.
36. Conforme é referido na decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 567/2021-T, “[r]elativamente a ‘equipamentos de substituição’, ‘beneficiações de equipamentos Preexistentes’ e a ‘equipamentos complementares’, temos que o respetivo enquadramento no conceito de ‘investimento inicial’ depende, não da sua natureza, mas da sua relação com uma das finalidades referidas no artigo 2.º, n.º 2, al. d), da Portaria n.º 297/2015”.
37. Com efeito, do disposto na alínea a) do n.º 49 do artigo 2.º do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho, não resulta a exigência de “investimento pela primeira vez num determinado tipo de ativo fixo tangível” (veja-se, neste sentido, o acórdão proferido no âmbito do processo n.º 574/2020-T).
38. Considerando a definição contida na alínea a) do n.º 49 do artigo 2.º do RGIC e da alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, e conforme é afirmado no acórdão arbitral proferido no âmbito do processo 726/2020-T, “não é de excluir deste conceito de «investimento inicial» o que é feito na actividade de exploração corrente da Requerente, desde que o investimento esteja relacionado com «aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente». O artigo 22.º, n.º 2, alínea a), do CFI, ao referir os activos «afectos à exploração da empresa», corrobora esta interpretação no sentido de que o que releva à a afectação dos activos à produção da empresa”.
39. Refira-se que para que um investimento possa beneficiar do RFAI não é condição que haja um aumento efetivo da capacidade produtiva, bastando que o investimento seja apto a atingir esse objetivo, como sucede in casu.
40. Este sentido encontra-se expresso no acórdão arbitral proferido no âmbito do processo n.º 546/2020-T, ao qual se adere, nos seguintes termos: “o pressuposto de extensão da capacidade de um estabelecimento existente tem naturalmente subjacente a finalidade de aumento da produção, ou seja, do número de unidades produzidas, em regra, conducente ao acréscimo do volume de negócios. Contudo, esta finalidade não constitui em si mesma uma condição de aplicação do regime, mas a sua teleologia. Dito por outras palavras, o aumento de capacidade do estabelecimento aponta para o aumento da produção, mas não é imposta uma obrigação de resultado. O aumento efetivo da produção depende de diversos fatores, não controláveis pelos sujeitos passivos, que não constam da previsão legal como pressupostos de aplicação do RFAI”.
41. O entendimento deste tribunal encontra-se em linha com a jurisprudência arbitral citada, não se suscitando dúvidas de interpretação do direito da União Europeia que justifiquem o reenvio prejudicial solicitado, a título subsidiário, pela Requerida.
42. Nestes termos, julga-se que a Requerente demonstrou que os ativos fixos tangíveis referentes à “Linha de Pintura Wagner” foram adquiridos no âmbito de um investimento inicial apto a aumentar a capacidade produtiva instalada, estando assim cumprido este requisito para poderem beneficiar do RFAI.
B) Quanto à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado na “Banca de Ensaios ISO”
i) Posição das Partes
43. Relativamente ao investimento realizado na “Banca de Ensaios ISO”, entende a Requerente, em síntese, o seguinte:
a) A potência da referida Banca de Ensaios revelou-se fulcral para o projeto de investimento realizado pela sociedade, afigurando-se o insuficiente dimensionamento da potência da fonte de energia aspeto de suma importância para o desenvolvimento da atividade da empresa e suscetível de o prejudicar;
b) A “Banca de Ensaios de Média Tensão ISO” teve um impacto decisivo no setor produtivo da sociedade, pois passou a ser possível testar integralmente e com uma rapidez assinalável (em apenas alguns minutos) todos os geradores produzidos, de um modo mais completo, o que incrementou a fiabilidade dos produtos produzidos pela sociedade, tendo sido determinante na redução da taxa de reclamações e devoluções dos equipamentos daquela empresa, com o inerente reforço de posicionamento da marca;
c) Enquanto anteriormente os ensaios eram realizados por amostragem e demoravam, por cada gerador, em média entre 8 a 12 minutos, com a Banca de Ensaios de Média Tensão ISO todos os geradores passaram a ser ensaiados, com um tempo de teste inferior a 2 minutos por unidade;
d) Com a testagem realizada pela “Banca de Ensaios de Média Tensão ISO”, passaram a ser emitidos relatórios individuais que são arquivados digitalmente, assim se permitindo a identificação do controlo de qualidade realizado, contribuindo tal aspeto igualmente para o reforço do posicionamento da marca no mercado;
e) Para um efetivo aumento da capacidade produtiva há que se considerar a melhoria da qualidade dos processos e dos produtos, que a Banca de Ensaios claramente propiciou e que se revela determinante para o aumento da capacidade produtiva da sociedade, na medida em que a mesma se interliga com a irreversibilidade da busca da qualidade, como fator que determinará o futuro daquela empresa, no sentido da sua sobrevivência no mercado;
f) Este investimento representou uma melhoria no processo produtivo com impacto no aumento da satisfação do cliente final, não se afigurando de mera manutenção da fonte produtora;
g) Segundo a Requerente, é de afastar o entendimento segundo o qual este investimento concreto configuraria mero investimento na manutenção da fonte produtora;
h) A Requerente discorda do entendimento segundo o qual os equipamentos construídos por uma entidade – como a AT considerou ser o caso da Banca de Ensaios de Média Tensão IS0 – devam ver-se afastados da aplicação do benefício fiscal do RFAI;
i) Não se compreende em que medida o interesse público extrafiscal regulado pelo RFAI saia reforçado com a necessidade de aquisição de um ativo a terceiro, assim se justificando que tal aquisição seja condicionante necessária e impreterível da sua aplicação;
j) Se tal exigência em nada reforça o interesse público, deve, do mesmo modo, concluir-se que em nada melhora a satisfação das necessidades ou finalidades coletivas e, portanto, nesta medida, tal requisito acha-se desprovido de qualquer fundamento, não podendo ser admitido;
k) Sendo embora verdade que a letra da lei delimite os investimentos elegíveis para efeitos de RFAI ao referir que os mesmos têm que ser “adquiridos”, não podem perder-se de vista as razões de interesse geral em que tal benefício radica, quais sejam as relevantes motivações públicas em que a concessão daquele benefício tem fundamento;
l) Afigura-se à Requerente que se limitou a dar cumprimento ao critério finalístico e claro que preside à atribuição do benefício aqui em causa à conduta incentivada – a realização do investimento para aumento da sua capacidade produtiva ou para a alteração fundamental dos seus processos – não procurando de nenhum modo obviar-se à prossecução das finalidades próprias daquele regime, nem se tendo em vista a obtenção de qualquer vantagem fiscal indevida, antes estando alinhada com a finalidade da despesa pública correspondente ao uso daquele benefício de modo ponderado e racionalizado;
m) Segundo a Requerente, o que é relevante para efeitos de elegibilidade do RFAI é que esteja em causa a realização de um investimento que, neste caso, tenha a potencialidade de aumentar a sua capacidade produtiva ou de alterar fundamentalmente os seus processos sendo, por seu turno, absolutamente irrelevante que tenha sido a própria sociedade a montar/construir o referido equipamento ou o tivesse adquirido a uma entidade terceira;
n) Não demonstrando a AT que o investimento em causa foi empolado, não será a mera circunstância de tal abstratamente ser possível que poderá servir, sem mais, de impedimento ou de racional à não elegibilidade desse investimento para efeitos de RFAI;
o) No que se refere ao pressuposto de qualificação deste investimento como “investimento inicial” deve entender-se que o mesmo foi preenchido pela Requerente, sendo de anular a correção à dedutibilidade deste investimento em sede de RFAI.
44. Relativamente ao investimento realizado pela Requerente na “Banca de Ensaios ISO”, entende a Requerida, em síntese, que:
a) Os investimentos direcionados para a melhoria do desempenho/eficiência operacional e organizacional não conduzem a um aumento da capacidade instalada, quedando-se por permitirem alcançar níveis de eficiência e de redução de custos com base na mesma capacidade já existente;
b) Todos os geradores já eram objeto de ensaio e não existiu qualquer aumento da capacidade produtiva da empresa com este investimento;
c) A empresa não tem como objeto social a “testagem” de geradores, mas sim a construção de geradores, pelo que para aumentar a capacidade de produção de geradores, num contexto de “investimento inicial” enquadrado no RFAI, apenas serão elegíveis os investimentos produtivos que conduzam à aquisição de equipamento de produção;
d) Não existe enquadramento legal para considerar os “trabalhos para a própria empresa” como elegíveis;
e) A “ratio legis” do apoio estatal no âmbito do RFAI é semelhante ao apoio estatal no âmbito dos fundos comunitários do Portugal 2020, pelo que não tem qualquer fundamento a alegação da Requerente de que se trata de uma questão de semântica a desconsideração dos trabalhos para a própria empresa no âmbito do RFAI;
f) Improcedem, por falta de fundamento legal e factual, as alegações da Requerente de que o investimento realizado na Banca de Ensaios ISO é elegível para efeitos de RFAI, pelo que são de manter as correções, em sede de IRC do exercício de 2018, efetuadas pelos Serviços de Inspeção da Autoridade Tributária.
ii) Apreciação da questão referente à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado na “Banca de Ensaios ISO”
45. Tal como sucede com o investimento na “Linha de Pintura Wagner”, a elegibilidade do investimento na “Banca de Ensaios ISO” terá, para efeitos do benefício do RFAI, de consistir num investimento inicial, atendendo ao disposto nos artigos 2.º, n.º 49, al. a), do RGIC, e 2.º, n.º 2, al. d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro.
46. Resulta da factualidade assente que o investimento na “Banca de Ensaios ISO” permitiu à B... passar a ter uma banca de ensaios com a amplitude de KVAs necessária ao aumento da capacidade produtiva desejado, possibilitando o aumento da eficiência produtiva da empresa, em harmonia com a estratégia de aumento da capacidade produtiva.
47. Todavia, contrariamente ao que sucedeu com o investimento na “Linha de Pintura Wagner”, a B... não adquiriu os ativos, tendo sido a própria a produzir a “Banca de Ensaios ISO”.
48. A alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI determina que, para efeitos do RFAI, se consideram aplicações relevantes os investimentos nos “ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo”, desde que afetos à exploração da empresa.
49. Contrariamente ao que sustenta a Requerente, esta referência a “ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo”não se trata de mera semântica, que possa ser desconsiderada pelo intérprete.
50. Essa referência evidencia uma intencionalidade do legislador em limitar a elegibilidade para efeitos de RFAI às condições aí rigorosamente definidas.
51. Note-se que o legislador não se limita a uma mera referência a “ativos adquiridos”, acrescentando que essa aquisição deve ter objetivo ativos em “estado de novo”.
52. Não se compreenderia, pois, essa referência se a palavra “adquiridos” fosse utilizada num sentido muito abrangente, que pudesse incluir a sua “produção”, como sustenta a Requerente.
53. Subscreve-se o acórdão proferido no âmbito do processo n.º 488/2019-T, quando nele se afirma que “[a]dquirir ‘em estado de novo’ só pode significar que se obteve algo, se alcançou a sua posse, como bem acabado, como um produto oferecido pela primeira vez através de uma transacção entre alienante/vendedor e adquirente/comprador; sair disto, sustentar que aquele que produz também “adquire” o seu próprio produto, não é só ignorar conceitos básicos de Economia (como a divisão do trabalho e o mecanismo das trocas): é forçar a semântica da língua portuguesa, transgredindo os limites impostos pelos artigos 11.º da LGT e 9.º do Código Civil.”
54. Resulta do n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil que o texto não é o único elemento da interpretação, mas, conforme determina o n.º 2 do mesmo artigo, não pode o intérprete chegar a um resultado interpretativo que não tenha no texto um mínimo de correspondência verbal.
55. Recorde-se, além do mais, que, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, “[n]a fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
56. A produção da “Banca de Ensaios ISO” pela B... não equivale, portanto, a uma aquisição de ativos fixos tangíveis em estado de novo.
57. Neste ponto, assiste razão à Requerida quando sustenta que os investimentos feitos pela Requerente na “Banca de Ensaios ISO” configuram “trabalhos para a própria empresa”, e não uma aquisição de ativos fixos tangíveis em estado de novo, pelo que não são elegíveis para efeitos de RFAI.
C) Quanto à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado em diverso Equipamento Básico e Administrativo
i) Posição das Partes
58. Relativamente ao investimento realizado em diverso Equipamento Básico e Administrativo, entende a Requerente, em síntese, o seguinte:
a) Todo o investimento realizado tem como justificação uma estratégica necessária à sobrevivência, crescimento e perpetuidade da marca nos mercados de África, Ásia, América Latina e Península Arábica, cuja concretização dependia da resposta que os equipamentos aqui em causa vieram dar à necessidade de se garantir a interligação de máquinas, sistemas de produção e equipamentos;
b) Tal resposta veio a ser dada mediante a aquisição de computadores de elevada capacidade, o estabelecimento de redes de comunicação abrangentes e de baixo custo e a utilização de elementos de armazenamento digital para a informação cujo processamento com assinalável rapidez se tornava (e se perspetivava que se tornasse ainda com mais premência) fundamental, os quais alteraram fundamentalmente os processos de produção da sociedade;
c) Mediante a aquisição de equipamentos básicos e administrativos, a Requerente criou redes inteligentes ao longo de toda a sua cadeia de valor, aumentado a transformação e atualização tecnológica do seu modelo de produção, logrado tornar os seus processos mais eficientes, reduzido os seus consumos de energia e minimizado os desperdícios, o que representou uma alteração fundamental do seu processo de produção global tendo potenciado a produção de produtos de elevada customização e adaptados ao cliente;
d) Tal investimento veio permitir uma adaptação mais rápida às solicitações dos seus clientes, contribuindo para um melhor posicionamento da marca no mercado e diferenciação dos demais concorrentes, em vista do desenvolvimento dos seus produtos com a mais elevada qualidade, fiabilidade, customização e a um preço competitivo;
e) Longe de consubstanciarem aquisições pontuais, os equipamentos básicos e administrativos cujo investimento foi desconsiderado pela AT fazem parte de uma estratégia de investimento inicial global em equipamentos e tecnologias considerados relevantes e imprescindíveis para o desenvolvimento da atividade da sociedade e que redundaram numa alteração fundamental do seu processo produtivo;
f) Com estes investimentos foi possível à sociedade assegurar os mais elevados padrões de controlo, fiabilidade, automação e produtividade do seu processo produtivo, existindo uma verdadeira conexão entre as aquisições realizadas e um investimento para a alteração fundamental do processo produtivo;
g) Segundo a Requerente, caso se entendesse que o investimento aqui em causa não se subsume à tipologia indicada pela sociedade na documentação de suporte das deduções à coleta de IRC efetuadas a título de RFAI (alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente), o mesmo enquadrar-se-ia na categoria de aumento da capacidade de um estabelecimento existente, analisado de um ponto de vista global;
h) O investimento em equipamento básico, no montante de € 11.107,49 (incluindo investimento em máquina de rebitar; manga para saída de gazes; lixadeira; máquina de retração; terminal Happy or Not; purificadora de ar; aspirador pó/líquidos; aparafusadora impacto e pistola de retração, entre outros) deve ser encarado como uno com os equipamentos relativos ao investimento feito na Linha de Pintura Wagner e na Banca de Ensaios ISSO;
i) No que diz respeito ao investimento realizado em equipamento administrativo, no montante total de € 12.819,92 (incluindo: computadores, discos, processadores, monitores, telemóveis e acessórios e impressora), foram investimentos realizados tendo em vista a “(…) prossecução do negócio numa lógica de interligação permanente”;
j) Entende a Requerente que o aumento da capacidade produtiva da sociedade tal como projetado encontrava-se dependente da criação de redes inteligentes ao longo de toda a cadeia de valor, do aumento da transformação e da atualização tecnológica do modelo de produção, da adoção de processos mais eficientes, da redução dos consumos de energia e da minimização dos desperdícios, acompanhada de elevada customização dos produtos comercializados, o que motivou a realização deste investimento, tendo em vista garantir que a sociedade tinha a capacidade instalada suficiente para não correr o risco de limitação futura da capacidade produtiva em face dos ativos até então existentes.
k) Segundo a Requerente, impõe-se a conclusão de que o investimento no equipamento básico e administrativo reveste a natureza de investimento estratégico, não só pela duração temporal que cumpre, como também porque, não impondo a lei como requisito que os bens adquiridos tenham de produzir diretamente o produto final, a aquisição de bens que (como sucedeu no caso destes autos) possibilitem ou permitam aumentar a capacidade produtiva da sociedade tem uma natureza planeada e prospetiva, contribuindo, estrategicamente, para o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” – que é a condição exigida legalmente para que se possa considerar estarmos na presença de um investimento inicial, elegível para efeitos de aplicação do benefício fiscal aqui em causa.
59. Relativamente ao investimento realizado pela Requerente em diverso Equipamento Básico e Administrativo, entende a Requerida, em síntese, que:
a) A simples substituição individual de ativos sem alterar fundamentalmente o processo de produção global constitui um investimento de substituição que não é elegível para auxílios ao investimento regional, como tal não se qualifica como uma alteração fundamental de um processo de produção global e, portanto, não é considerado um investimento inicial;
b) O facto de ter substituído itens individuais de equipamentos por outros que têm melhor desempenho (a menos que isso leve a uma mudança fundamental no processo de produção global) também seria considerado um investimento de substituição não elegível;
c) As alegações apresentadas pela Requerente procuram dar uma capa de credibilidade ao racional de considerar estes investimentos como investimento inicial na “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”, no entanto, estes investimentos não estão relacionados com o seu processo de produção de geradores, tratam-se de despesas correntes, que são transversais a todo o tecido empresarial;
d) Todos os equipamentos básicos em causa são essenciais para o bom funcionamento de todos os equipamentos da empresa, de tal forma básicos que são utilizados para o exercício corrente de todas as atividades da empresa não sendo possível associá-los a “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”;
e) Improcedem por falta de fundamento as alegações que o investimento em Equipamento Básico permitiu “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”;
f) O detalhe/racional do investimento em equipamento administrativo efetuado pela Requerente não pode ser qualificável como fundamento que permita o seu enquadramento na tipologia de “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”;
g) A Requerente alega que mesmo que não seja considerado investimento em “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente” deverá ser considerado “aumento da capacidade instalada”, embora sem apresentar qualquer demonstração de aumento de capacidade instalada;
h) Improcedem, por falta de fundamento legal e factual, as alegações da Requerente de que os investimentos realizados em equipamento básico e administrativo são elegíveis para efeitos de RFAI, pelo que são de manter as correções, em sede de IRC do exercício de 2018, efetuadas pelos Serviços de Inspeção da Autoridade Tributária.
ii) Apreciação da questão referente à elegibilidade para efeitos de RFAI do investimento realizado em diverso Equipamento Básico e Administrativo
60. O montante das aquisições de equipamento básico e administrativo consideradas elegíveis para efeitos de RFAI pela Requerente ascendeu a €23.927,41, ultrapassando, assim, o montante das amortizações e depreciações dos ativos associados à modernização da sua atividade, contabilizadas nos três períodos de tributação anteriores ao do início da realização do projeto de investimento.
61. Consta da matéria de facto dada como assente que o investimento realizado em equipamento básico e administrativo adquirido contribuiu para a transformação e atualização tecnológica do modelo de produção da B..., bem como para o incremento da eficiência dos processos e a redução dos consumos de energia e minimização dos desperdícios na sua produção, revelando-se apto, em conjunto com os outros investimentos realizados, ao aumento da capacidade produtiva da empresa.
62. Deste modo, estes investimentos são elegíveis para efeitos do RFAI, na medida em que se enquadram numa das situações previstas no artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, e na alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC.
63. Conforme é afirmado no acórdão proferido no âmbito do processo n.º 574/2020-T, que se subscreve, “a aferição dos requisitos de que depende a aplicação deve fazer-se globalmente, tendo em conta a globalidade dos investimentos a que se referem as aquisições, não havendo, assim, em princípio, ativos fixos tangíveis que «pela sua natureza, não se enquadram no âmbito de qualquer projeto de expansão da capacidade produtiva da A..., nem são proporcionadores da criação de postos de trabalho.
De qualquer modo, mesmo que haja algum tipo de activos que, pela sua natureza, não se possa enquadrar num projecto de expansão da capacidade produtiva nem possa proporcionar a criação de postos de trabalho, não é esse o caso, seguramente, dos equipamentos informáticos, designadamente os computadores portáteis, que se destinam a ser utilizados por trabalhadores e são susceptíveis de utilização na generalidade dos projectos industriais”.
64. Verifica-se, in casu, que os equipamentos básicos e administrativos adquiridos são complementares dos outros investimentos realizados, inseridos numa estratégia global de longo prazo de aumento da capacidade produtiva da empresa.
65. Ou seja, eles não correspondem a meras despesas correntes associadas ao normal funcionamento da unidade fabril, que a Requerente teria de assumir independentemente do investimento inicial feito.
66. Para este Tribunal é verosímil que a aquisição dos mencionados equipamentos, considerados na sua globalidade, complemente os demais investimentos realizados (designadamente na “Linha de Pintura Wagner”), existindo uma interdependência e relação de causalidade entre ambos relativamente ao objetivo de expansão da capacidade produtiva.
67. Nestes termos, julga-se que a Requerente demonstrou que os equipamentos básicos e administrativos em causa se inserem no âmbito de um investimento inicial apto a aumentar a capacidade produtiva instalada, sendo, assim, elegíveis para efeitos de RFAI.
D) Quanto ao pressuposto da criação de postos de trabalho
i) Posição das Partes
68. Quanto ao pressuposto da criação de postos de trabalho entende a Requerente, em síntese, o seguinte:
a) A nova linha de pintura e a nova banca de ensaios, bastante mais exigente em termos de gestão da capacidade disponível, tornou importante e necessária a supervisão direta destas atividades, tendo sido contratado um colaborador especificamente para este efeito;
b) Com a melhoria de produto que foi possível obter, após a implementação dos investimentos objeto deste processo, tornou-se oportuna a contratação de um comercial que tivesse como missão incrementar as vendas para os mercados Asiáticos e Europa de Leste;
c) A contratação de dois trabalhadores esteve em linha com a natureza planeada e prospetiva dos investimentos realizados tendo em vista o aumento da capacidade produtiva da sociedade e a alteração fundamental dos seus processos de produção;
d) A sociedade concluiu que os ativos nos quais investiu se afiguravam de maior exigência em termos de gestão demandando a contratação de um profissional que supervisionasse as atividades nas quais tais ativos se inseriam;
e) Considerou também que, face ao previsível e expectável aumento da sua qualidade e capacidade de produção que resultariam da implementação dos investimentos realizados naquele ano, e a consequente consolidação que tal permitiria na aposta que vem traçando a longo prazo nos mercados internacionais, se revelaria oportuna a contratação de um comercial que tivesse como missão incrementar as vendas para os mercados Asiáticos e Europa de Leste;
f) O facto de os resultados de determinado investimento estarem ainda curso não pode afastar a possibilidade de contratação de profissionais que pressupõem que os mesmos ocorrerão e com isso gerar o afastamento da aplicação do benefício fiscal aqui em causa, bastando a relação desses investimentos com o aumento da capacidade produtiva para assegurar o direito da Requerente a dele usufruir, independentemente do dia do ano em que tais resultados sejam produzidos por tais investimentos;
g) Afigura-se à Requerente desprovido de suporte legal o entendimento da administração tributária no sentido de selecionar determinados ativos fixos tangíveis e considerá-los, autonomamente e pela sua natureza, como insuscetíveis de poder vir a proporcionar a criação daqueles postos de trabalho.
69. Quanto ao pressuposto da criação de postos de trabalho entende a Requerida, em síntese, o seguinte:
a) Um pressuposto essencial da acessibilidade ao benefício do RFAI refere-se ao nexo de causalidade entre a realização de investimentos com relevância e elegíveis para o benefício do RFAI e a criação de postos de trabalho;
b) A alegação da Requerente segundo a qual “os ativos nos quais investiu se afiguravam de maior exigência em termos de gestão demandando a contratação de um profissional que supervisionasse as atividades nas quais tais ativos se inseriam” é contraditória com as alegações efetuadas no dossier dos benefícios fiscais do exercício de 2018, onde afirma que a cabine de pintura que substituiu a anterior permitiu reduzir o erro humano;
c) Tem de ser a realidade factual a suportar o nexo causal entre o projeto de investimento e os postos de trabalho especificamente criados para esse efeito, o que, no caso sub judice, não se verifica.
iii) Apreciação da questão referente à verificação do pressuposto da criação de postos de trabalho
70. Conforme a matéria de facto dada como assente, os investimentos realizados motivaram a contratação de dois colaboradores pela B..., tendo um deles sido contratado para assegurar a supervisão direta das atividades desenvolvidas na nova linha de pintura e na nova banca de ensaios, assim que estas entrassem em funcionamento, e tendo o outro colaborador sido contratado para a área comercial, com o objetivo de aumento das vendas para os mercados Asiáticos e da Europa de Leste.
71. A gestão da capacidade disponível decorrente dos novos equipamentos justificou a contratação de um trabalhador para a supervisão direta das atividades respetivas.
72. Também a estratégia delineada pela empresa de conquista de novos mercados, aliada ao aumento da capacidade de produção, justificaram a contratação de um trabalhador para a área comercial, tendo em vista o aumento das vendas nos mercados Asiáticos e da Europa de Leste.
73. Sustenta a Requerida que é contraditória a alegação da Requerente quando afirma que os novos equipamentos possibilitaram uma maior eficiência no processo produtivo, com redução do erro humano, e, simultaneamente, afirma que esses equipamentos têm uma maior exigência em termos de gestão, o que justificaria a contratação de um trabalhador para o exercício de uma função de supervisão.
74. Todavia, não tem razão a Requerida, uma vez que é possível que um determinado investimento permita alcançar ganhos de eficiência, possibilitando, até, eventualmente, que sejam necessários menos trabalhadores para certa função e, simultaneamente, requerer a contratação de um ou mais trabalhadores especializado para exercer funções que passaram a ter de ser desempenhadas com o equipamento instalado, nomeadamente em virtude da formação técnica exigida.
75. Esta circunstância remete-nos para a questão que se prende com saber se o RFAI exige que os investimentos feitos gerem um acréscimo líquido do número de trabalhadores.
76. Sobre esta questão, subscreve-se o teor do acórdão arbitral proferido no âmbito do processo 544/2022-T, no qual se afirma, designadamente, o seguinte:
“Apreciando a questão à luz dos diplomas legislativos invocados no RIT, tem de se constatar que não há suporte textual para concluir que o investimento relevante tem de proporcionar um aumento líquido de postos de trabalho.
Na verdade, na alínea f) do n.º 4 do artigo 21.º do CFI não se faz referência a aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento, mas apenas a «criação de postos de trabalho» e sua manutenção, o que constitui um elemento interpretativo de acentuada relevância no âmbito de benefícios fiscais, pois, como é jurisprudência pacífica, as normas sobre benefícios fiscais devem ser interpretadas em termos estritos, o que, se é certo que não afasta a necessidade de interpretação, designadamente teleológica, não viabiliza a exigência de requisitos para que não há qualquer suporte textual.
Por outro lado, se é certo que o n.º 9 do artigo 14.º do RGIC, refere que «o projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período», também o é que ele apenas aplicável, como nele se refere expressamente, «quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados», o que não sucede no caso, pois está-se perante benefício fiscal baseado em investimento em activos fixos tangíveis e intangíveis (artigo 21.º, n.º 2, do CFI)”.
77. Em sentido convergente, no acórdão arbitral proferido no âmbito processo n.º 307/2019-T afirma-se o seguinte:
“Tendo em conta que, pelos fundamentos expostos, não se deverá equiparar a expressão “criação de postos de trabalho” a “criação líquida de postos de trabalho”, dever-se-á, em obediência ao princípio hermenêutico do legislador razoável, obter um resultado interpretativo que seja coerente com a teleologia do benefício fiscal em questão e que tenha um efectivo conteúdo prático.
Nessa perspectiva, a única interpretação que não se reconduza à “criação líquida de
postos de trabalho”, será, julga-se, a de que a “criação de postos de trabalho” pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.
Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção”.
78. O que é relevante é que exista uma causalidade adequada entre o investimento inicial realizado, considerado elegível para efeitos de RFAI, e os postos de trabalho criados, o que se verifica no caso em apreço.
79. Refira-se, ainda, que não é relevante o facto de a contratação dos trabalhadores anteceder a entrada em funcionamento dos novos equipamentos, uma vez que tal se pode justificar pela necessidade de adaptação dos trabalhadores aos novos postos de trabalho e a eventual formação de que necessitem para o desempenho das respetivas funções.
80. Deste modo, conclui-se que na correção efetuada a AT incorreu em erro sobre os pressupostos de direito quanto à interpretação da alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.
§4. Do direito da Requerente ao reembolso do imposto indevidamente pago e a juros indemnizatórios
81. A Requerente pagou a quantia ora em causa, relativa à liquidação de IRC n.º 2022..., de 10.01.2022, e respetivas liquidações de juros compensatórios n.º 2022..., n.º 2022... e n.º 2022 ..., de 24.03.2022, refletidas na demonstração de acerto de contas n.º 2022..., de 2022.03.24.
82. Entende a Requerente que a procedência do pedido de pronúncia arbitral implica o direito da Requerente ao reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, nos termos do disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT, em virtude da constatação de erro imputável aos serviços do qual resultou o pagamento da dívida tributária em montante superior ao efetivamente devido.
83. Em sentido contrário, a Requerida entende que não há qualquer erro que lhe possa ser imputado quanto à correção efetuada, pelo que sustenta a improcedência do pedido de anulação do ato de liquidação de IRC formulado pela Requerente e, consequentemente, a improcedência do pedido de reembolso.
84. De acordo com o disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 24.º do RJAT, “[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários […] [r]estabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.
85. Esta norma do RJAT é coerente com a previsão contida no artigo 100.º da Lei Geral Tributária, cujo texto é o seguinte:
“A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
86. Quanto à possibilidade de o tribunal arbitral reconhecer o direito a juros indemnizatórios, prevê o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
87. E, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, “[s]ão devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
88. Face à procedência parcial do pedido de pronúncia arbitral, e tendo ficado provado que a Requerente procedeu ao pagamento integral do montante em causa, reconhece-se à Requerente o direito ao reembolsado do montante de imposto pago, na parte correspondente à liquidação de IRC, e respetivos juros compensatórios, que teve como pressuposto a correção efetuada pela Requerida com base na desconsideração do benefício fiscal referente a RFAI pelos investimentos feitos na “Linha de Pintura Wagner” e em “equipamento básico e administrativo”.
89. Tal reembolso é essencial para o restabelecimento da situação que existiria se o ato tributário objeto da presente decisão arbitral não tivesse sido praticado.
90. Este tribunal reconhece, igualmente, que a ilegalidade da liquidação em causa nos presentes autos resultou de erro imputável aos serviços da Administração Tributária, de acordo com os fundamentos expressos supra, pelo que são devidos juros indemnizatórios, conforme determinado pelo n.º 1 do artigo 43.º da LGT.
91. Os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento do imposto pela Requerente até ao integral reembolso, por aplicação da taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril.
IV – DECISÃO
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto ao pedido de anulação da liquidação de IRC n.º 2022 ... na parte que tem como pressuposto a correção efetuada com base na desconsideração do benefício fiscal referente a RFAI pelos investimentos feitos pela Requerente na “Linha de Pintura Wagner” e em “equipamento básico e administrativo”;
b) Anular parcialmente a liquidação de IRC n.º 2022 ... e as respetivas liquidações de juros compensatórios n.º 2022..., n.º 2022 ... e n.º 2022 ... e demonstração de acerto de contas n.º 2022..., na parte que tem como pressuposto a correção efetuada com base na desconsideração do benefício fiscal referente a RFAI pelos investimentos feitos pela Requerente na “Linha de Pintura Wagner” e em “equipamento básico e administrativo”;
c) Julgar parcialmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto ao pedido de anulação da liquidação de IRC n.º 2022 ..., na parte que tem como pressuposto a correção efetuada com base na desconsideração do benefício fiscal referente a RFAI pelo investimento na “Banca de Ensaios ISO”;
d) Absolver parcialmente da instância a Requerida quanto ao pedido de anulação da liquidação de IRC n.º 2022 ..., na parte que tem como pressuposto a correção efetuada com base na desconsideração do benefício fiscal referente a RFAI pelo investimento na “Banca de Ensaios ISO”;
e) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao reembolso da quantia paga, na parte correspondente à liquidação anulada;
f) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao pedido de juros indemnizatórios, calculados com base na quantia a reembolsar, contados desde a data em que a Requerente efetuou o pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso;
g) Condenar ambas as partes no pagamento das custas do presente processo, na proporção dos respetivos decaimentos, que se fixa em 80,7% para a Requerida e em 19,3% para o Requerente.
V- VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 59.185,40.
VI – CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, sendo a parte a suportar pela Requerida de € 1.728,59 e a parte a suportar pelo Requerente de € 413,41, conforme o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 29 de março de 2023
O Árbitro
(Paulo Nogueira da Costa)