SUMÁRIO:
I – A atividade de investigação e desenvolvimento, visando a produção e comercialização de bens e prestação de serviços, utilizando bens de investimento, inclusivamente adquiridos com subsídios, e visando retirar deles receitas com carácter de permanência independentemente dos resultados imediatos, enquadra-se no conceito de atividade económica.
II. A relação direta e imediata entre as despesas suportadas a montante e as operações tributáveis a jusante que devem ser uma manifestação da atividade económica do sujeito passivo, exigida pelos artigos 19.º e 20.º Código do IVA, para efeitos do exercício do direito à dedução, não tem de se verificar operação a operação, nem indicar à partida, a identificação dos respetivos destinatários, bastando que tais despesas possam ser consideradas despesas gerais que irão originar operações tributáveis.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Manuel Luís Macaísta Malheiros (Árbitro-presidente), Fernando Miranda Ferreira (Árbitro vogal) e Álvaro Caneira (Árbitro relator), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 10.10.2022, acordam no seguinte:
I. Relatório
1. A..., doravante abreviadamente designado por A..., pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ... n.º ..., ...-... Lisboa, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, apresentar pedido de constituição de Tribunal Arbitral, em que figura como Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
2.O pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 01-08-2022, tem como objeto os atos de liquidação adicional de IVA considerado deduzido em excesso nos 4 trimestres do ano de 2017, e bem assim de correção de alegado excesso de IVA deduzido e reportado para períodos de imposto seguintes, no montante global de € 100.027,20, conforme notas de demonstração de liquidação de IVA n.º 2022 ... - 201703T(doc. 1), 2022 ... – 201706T (doc. 2), 2022 ... – 201709T (doc. 3) e 2022 ... – 201712T (doc. 4).
3.O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo senhor presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
4. A Requerida apresentou Resposta alegando que a mesma “se respalda nas conclusões do Relatório Final de Inspeção, para cuja leitura se remete, no resto oferecendo o merecimento dos autos.”
5. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro.
6.Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, tendo, oportunamente, notificado as Partes.
7.Devidamente notificadas dessa designação, as Partes não manifestaram vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
8.Pelo que em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o tribunal arbitral foi constituído em 10-10-2022.
9.O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.
10.A Requerente goza de personalidade e capacidade judiciárias, é legítima e encontra-se legalmente representada (cfr. art.º 4.º e n.º 2 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 e art.º 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22/03).
11.Atento o conhecimento que decorre das peças processuais juntas pelas Partes, que se julga suficiente para a decisão, o Tribunal, considerando o disposto no artigo 130.º do Código de Processo Civil, aplicável na jurisdição arbitral por remissão expressa do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, decidiu dispensar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT. Para inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente foi designado o dia 24-01-2023.
12. Nessa data, o Tribunal procedeu à inquirição das testemunhas arroladas pelo Requerente, que, no essencial, confirmaram a factualidade referida na petição. Na mesma data, foram notificados o Requerente e a Requerida para, por esta ordem e de modo sucessivo, apresentarem alegações escritas no prazo de 15 dias, sendo que o prazo para a Requerida começará a contar com a notificação da junção das alegações do Requerente ou do termo do prazo a este concedido.
13. Dentro do prazo referido no ponto anterior, o Requerente apresentou alegações reafirmando o anteriormente alegado na petição inicial. A Requerida não apresentou alegações.
14. O processo não enferma de nulidades.
III. Matéria de facto
15.Com base nos documentos que integram o presente processo, quer os apresentados pelo Requerente quer os constantes do processo administrativo, bem como se extrai da prova testemunhal produzida, destacam-se os seguintes elementos factuais que, não sendo contestados, se consideram inteiramente provados:
15.1. O A... é uma associação de direito privado constituído por escritura pública de 26 de julho de 1999, que tem por objeto, desde o início, no ano de 2000, o exercício da atividade de investigação científica de desenvolvimento tecnológico e bem assim a prestação de serviços económicos concretos nas áreas do desenvolvimento e utilização das tecnologias de informação, telecomunicações, eletrónica e computadores para a satisfação das mais diversas necessidades comerciais dos agentes económicos e dos consumidores em geral.
15.2. O A... tem como associados fundadores, o B... (entidade jurídica completamente autónoma) e o C..., tendo como escopo essencial a promoção da investigação científica aplicada ao desenvolvimento tecnológico para a produção de bens económicos, suscetíveis de comercialização em mercado aberto e concorrencial, e bem assim a prestação de serviços nas áreas das tecnologias de informação, telecomunicações, eletrónica e computadores (Cf. art.2º dos seus estatutos – Doc.18).
15.3. O A... é um sujeito passivo misto que adota desde 2008 o método da afetação real para efeitos de IVA, encontrando-se enquadrado no regime normal trimestral.
15.4. O A... possui como objeto social principal a realização de investigação científica e desenvolvimento tecnológico (I&D) que, de acordo com o Relatório e Contas (R&C), abrangeu em 2017 cinco eixos principais - Sistemas Inteligentes Interativos; Sistemas Computacionais e Redes de comunicação; Sistemas de Informação e Suporte à Decisão; SistemasEletrónicos Embebidos; e Sistemas de Energia, no âmbito dos quais foram executados 45 projetos de I&D (Anexo 2 do RIT) pelos investigadores do A..., na sua maioria docentes universitários ou bolseiros, que realizam os seus trabalhos de mestrado e doutoramento nos campus da entidade na Rua ..., no C... - ... e no C... – Alameda.
15.5. De acordo com o explanado no RIT, o total dos rendimentos obtidos no exercício de 2017 foi de 3,27 milhões de Euros (Me), proveniente das seguintes fontes:
- Financiamentos, no montante total de 2,6 Me, associados à atividade de I&D do A..., dos quais 1,312Me referentes asubsídios à exploração, de instituições nacionais (Fundação Ciência e Tecnologia), 1,214 Me da União Europeia (através do 7º Programa Quadro de Investigação e do Programa-Quadro Comunitário de Investigação & Inovação - Horizonte 2020) para projetos de investigação internacionais e subsídios ao investimento, no montante de 0,076 Me.
- Prestação de serviços nas áreas das tecnologias de informação, telecomunicações, eletrónica, computadores e energia, que gerou uma receita total de 0,512 Me:
– Realização de conferências (ex: Eurograp 16, Summer School, entre outras) e de manifestações análogas de natureza científica, educativa ou técnica, tendo obtido outros rendimentos que globalmente totalizaram um montante de 0,09 Me.
15.6. O Requerente foi destinatário de uma ação de inspeção externa ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2019..., emitida em 18-06-2019 e sancionada por despacho de 24-06-2019 do chefe da Divisão VI do Departamento B da Área da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa.
15.7. Iniciado em 18-11-2021, o procedimento inspetivo, com natureza externa e âmbito parcial circunscrito ao IRC e IVA, incidiu sobre o (s) período (s) de tributação de 2017.
15.8. A Requerente foi notificada do projeto de Relatório da Inspeção Tributária não tendo exercido o direito de audição prévia.
15.9. Posteriormente, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária, junto ao processo pela Requerida, de que, com relevo para a apreciação do presente pedido de pronúncia arbitral, se destaca o seguinte:
“III- DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS- IVADEDUZIDO
Da análise às declarações periódicas (DP) de IVA do A..., verificou-se que 20% das operações passivas desenvolvidas no período em análise são relativas à aquisição de imobilizado, registadas no campo 20, pelo valor total de 28.267,44€ e os restantes 80% relativas à dedução de imposto relativo à aquisição de outros bens e serviços, registada nos campos 22 e 24, no valor total de 111.350,91€.
Tendo em consideração os valores inscritos nas DP IVA, foi o sujeito passivo notificado em 18.11.2021 (Anexo 3) para apresentar, entre outros elementos, o suporte documental dos 15 registos de valor mais relevante registados nas DP IVAde 2017, bem como dos 3 de maior valor da DP1702T, tendo -se obtido, em resposta de 09.12.2021 (Anexo 4), uma amostra constituída por 19 documentos de suporte aos valores deduzidos inscritos nos campos 20 e 24.
Após verificação de que todos os registos estavam suportados por faturas emitidas na forma legal e exame da documentação associada a essas despesas, procedeu-se à análise da sua contabilização na conta-corrente de IVA, constatando-se a necessidade de saber, em concreto, a que operações ou atividades estas aquisições de bens e serviços estão associadas: prestações de serviços nas áreas das tecnologias de informação, telecomunicações, eletrónica, computadores e energia; realização de conferências e manifestações análogas de natureza cientifica, educativa outécnica; projetos de I&D com fito exclusivamente científico; ou, ainda, projetos de I&D que preveem, durante a sua execução ou no seu termo, a criação de bens e/ou serviços com intenção de subsequente comercialização pelo A... .
Assim, foi efetuado um novo pedido de elementos e esclarecimentos adicionais em 10.12.2021 (Anexo 5) visando, especificamente, colmatar a falta de informação identificativa dos fins do projetos de I&D desenvolvidos em 2017, com base nos respetivos contratos de financiamento.
Da informação prestada em resposta pelo sujeito passivo (Anexo 6), realça-se que o “A... é um sujeito passivo misto queadota desde 2008 o método da afetação real para efeitos de IVA, encontrando- se no regime normal trimestral, que realiza operações tributáveis nos termos gerais, pelas quais liquida o respetivo imposto, de acordo com essas mesmas regras gerais, exercendo igualmente, desde início da sua atividade, o correspondente direito à dedução do IVA contido nos seus inputs que tenham uma relação direta e imediata com a atividade económica geral, de venda de bens e serviços que conferem esse direito, como qualquer outro sujeito passivo de IVA. A sua atividade económica consiste na realização de investigação científica aplicada às realidades da vida, com o objetivo de desenvolvimento e de produção / criação denovos produtos, de aprimoramento ou desenvolvimento de tecnologias ou de ferramentas operacionais de trabalho, bem como na criação de bens e produtos patenteados e de protótipos que ao longo dos anos têm sido objeto de transmissão onerosa, no todo ou em parte, para diversos operadores económicos, sujeitos passivos do tecido industrial, mediante o pagamento de uma contrapartida (preço).”
No entanto, o sujeito passivo considerou não fazer sentido responder ao solicitado, ou seja, identificar, para cada projeto de I&D em curso no ano de 2017, os serviços resultantes que foram prestados a terceiros, as receitas daí decorrentes ejuntar os documentos comprovativos da conexão entre os projetos de I&D em execução e os respetivos resultados com intuitos comerciais (tais como cópia(s) da(s) página(s) dos respetivos contratos de financiamento, onde estarão fixados os fins do projeto e, entre os quais, os bens e serviços perspetivados e a intenção da subsequente comercialização), limitando-se a apresentar, genericamente, alguns projetos de investigação e desenvolvimento, descrevendo os objetivos magnos dos mesmos e os respetivos parceiros, para aludir a existência, em abstrato, de uma finalidade comercial/económica nos mesmos para o A... .
Atendendo que na análise da conta-corrente de IVA foram identificados mais 12 documentos de despesas contabilizados na conta-corrente de IVA (num total de 31 documentos) de valor igualmente relevante que importa correlacionar com as operações/atividades a que estão associadas e à necessidade de colmatar as lacunas na informação prestada quanto à finalidade comercial dos projetos de I&D, foi o A... novamente notificado para prestar elementos e esclarecimentoscomplementares (Anexo 7), em 11.02.2022.
Em 03.03.2022, o A... respondeu à notificação (Anexo 8), associando o registo de 31 documentos de despesas de aquisição de bens e serviços na conta-corrente de IVA com imposto deduzido às respetivas operações/atividades:
De acordo com a informação prestada, verifica-se que
A. Documentos 1, 4, 5 e 9 – são referentes a faturas de aquisição de bens do imobilizado (doc. 5) e deserviços (docs. 1, 4 e 9) utilizados na execução de projetos I&D no âmbito de contratos bilaterais (designadamente, o Programa de investigação colaborativo 9ºW da D... com a academia portuguesa, Projeto E..., Projeto M... e Projeto G...) que o A... indicou estarem associados à faturação de prestações de serviços a terceiros, nomeadamente, à D..., S.A – NIPC..., E...- NIPC ..., F...- NIPC ... e G..., SA – NIPC ... (Anexo 9).
De acordo com a Informação Vinculativa A419 2008041, com o despacho do SDG dos Impostos, substituto legal do Director - Geral, em 02-02-2009, os projetos de I&D que têm fixada nos respetivos contratos de financiamento uma finalidade comercial imediata, com destinatário concreto, no seu termo ou durante a sua execução inserem-se nas atividades de produção, comércio ou prestação de serviços, em que se baseia o conceito atividade económica, definido na alínea a) do n.º 1 do Artigo 2.º do CIVA.
Caso contrário, não estando contratualmente estabelecidos objetivos comerciais imediatos, com destinatários concretos para os resultados dos projetos de I&D, não permite que se afirme que estes constituam operações que visem a realização de serviços ou transmissões de bens sujeitas a imposto.
No sentido de verificar-se a reunião destes pressupostos, foram solicitados todos contratos de financiamento dos projetos de I&D executados com finalidade comercial pelo A..., não tendo sido obtidos estes documentos, pelo que não foi possível verificar e validar que na conceção dos projetos de I&D estas prestações de serviços estavam previstas, devendo por isso ser consideradas independentes daqueles.
Assim, não foi demonstrado que os projetos de I&D Programa de investigação 9ºW, Projeto E..., Projeto M... e Projeto G... têm uma finalidade comercial imediata, no seu termo ou durante a sua execução, com destinatário concreto, de acordo com a Informação Vinculativa A419 2008041, pelo que estes projetos de investigação estão fora do âmbito desujeição do imposto, nos termos da alínea a) do n.º 1 do Artigo 2.º do CIVA.
Consequentemente, é excluído o direito de dedução, na totalidade, do imposto suportado nas aquisições a que respeitam os documentos 1, 4, 5 e 9, no montante total de 3.978,34€, pelo que o mesmo foi indevidamente deduzido no Campo 20 da DP1703T, de acordo com o Artigo 19º do CIVA a contrário.
B. Documentos 2, 7, 8, 10,11 e 12 – respeitam a aquisições de bens do imobilizado para a execução de projetos I&D, relativamente aos quais não foi apresentada evidência de estarem ligados à prestação de serviços a terceiros ou à criação de produtos comercializáveis pelo A... .
Tendo sido notificado para identificar quais os projetos de I&D que têm como objetivo a comercialização de bens ou serviços concretos para o A..., juntando documentos comprovativos da conexão entre o projeto I&D+I em execução e a intenção comercial do mesmo (tais como, por exemplo, cópia(s) da(s) página(s) dos respetivos contratos de financiamento, onde estarão fixados os fins do projeto e, em concreto, os bens e serviços perspetivados e a intenção da subsequente comercialização), o A..., apesar de indicar no Ponto 4 da resposta à notificação que “todos os projetosdesenvolvidos pelo A... têm como objetivo a comercialização de bens ou serviços concretos”, juntou os termos contratuaisde apenas 5 dos 45 projetos I&D executados: Projetos Contextwa, Birds, Rage, Rethink e Safecloud.
Da análise à informação prestada verifica-se o projeto de I&D Contextwa resulta de um protocolo de colaboração, que não define nenhum objetivo de criar um produto ou serviço a comercializar pelos parceiros.
Relativamente aos contratos dos projetos de I&D Birds, Rage, Rethink e Safecloud, verificam-se que os mesmos integram no programa de financiamento H2020, estipulando, no seu Artigo 28º (Anexo 10), que as instituições beneficiárias do financiamento devem, entre outras medidas, proceder à exploração dos resultados obtidos no prazo de 4 anos após a sua conclusão, ou seja, devem diligenciar no sentido de criar ou comercializar um produto, ou uma técnica ou um processo.
No entanto, nenhum destes quatro contratos de financiamento demonstra que os respetivos projetos de I&D têm umintuito comercial para o A..., uma vez que não identifica, em concreto, que produto(s), técnica(s) ou processos(s) poderão ter fins comerciais, pelo que não estão estabelecidos objetivos comerciais imediatos nem destinatários concretos para os resultados dos projetos executados.
Foi solicitado, ainda, que o A... descrevesse o modo como se processa a avaliação do conhecimento adquirido na atividade de investigação e a mensuração do seu valor económico para o A... (mencionando as métricas e indicadores utilizados na avaliação desse conhecimento e na determinação do seu valor económico) e que quantificasse, fundamentando, as receitas de caráter permanente que o A... visa obter através de valores a faturar a clientes, com os projetos de investigação, desenvolvimento e inovação (I&D+I) executados em 2017, não tendo sido obtido em resposta ocálculo de apuramento do valor económico para o A... dos projetos de I&D em execução nem a quantificação das receitas de carater permanente que o A... perspetiva obter através de valores a faturar a clientes com os projetos STOCA, Precise, Motiv, Abyss, Saturn e Rethink.
Assim, não foram apresentadas quaisquer evidências pelo sujeito passivo que suportem que decorra dos projetos de investigação científica e tecnológica a que estas despesas estão direta e exclusivamente associadas, um intuito comercialconcreto para o A..., uma vez os seus contratos de financiamento não determinam ou tornam previsível que, no âmbito dasua execução ou na fase direta e imediatamente subsequentemente à sua conclusão, os conhecimentos obtidos se materializem em prestação de serviços especificadas ou transmissão de produtos comercializáveis por este sujeito passivo, os quais são adquiridos pela fixação de um preço por destinatário(s) direto(s) e concreto(s), com reflexos diretos na faturação do A..., constituindo assim, projetos de I&D que visam proporcionar receitas de caráter permanente para esta instituição. Também não foi obtida evidencia que possibilitasse identificar os projetos de I&D realizados pelo A... que têm um fito exclusivamente científico, sem valor económico relevante, em que não sejam obtidos rendimentos com os resultados da investigação.
E, neste sentindo, refere a Informação Vinculativa A419 2008041, com o despacho do SDG dos Impostos, substituto legal do Director - Geral, em 02-02-2009, no §24 que “Ainda que tendencialmente os resultados dessa investigação tenham aplicações comerciais ou industriais, a realização de uma actividade de investigação e desenvolvimento sem que existam objectivos comerciais imediatos, nem exista um destinatário concreto para os resultados dos projectos em desenvolvimento, não permite que se afirme com rigor estar-se perante a realização de serviços ou transmissões de bens sujeitas a imposto”, pelo que, não havendo claramente identificado um nexo direto, concreto e imediato entre um projetoI&D e eventuais serviços prestados ou bens transmitidos pelo A..., aqueles não constituirão operações tributáveis para efeitos de IVA.
Em consequência, não foi verificado que os bens adquiridos nos documentos 2, 7, 8, 10,11 e 12 estão associados aprojetos I&D reúnam os requisitos definidos na Informação Vinculativa A419 2008041 para serem considerados como operações sujeitas imposto.
Face ao exposto, não se tendo demonstrado que os bens adquiridos nos documentos 2, 7, 8, 10,11 e 12 estão associados a projetos I&D com finalidade comercial para o A... constituindo dessa forma uma atividade económica, nos termos da alínea a) do n.º 1 do Artigo 2.º do CIVA, considera-se excluído do direito de dedução o imposto suportado nas aquisições a que respeitam os documentos 2, 7, 8, 10, 11 e 12, no montante total de 10.792,73€, de acordo com o Artigo 19º do CIVA a contrário.
C. Documentos 3, 6 e 13 a 31 – correspondem a aquisições de bens do imobilizado e serviços de utilização mista (documentos 3 e 6 e de 13 a 31, respetivamente), o que significa que estão afetos a operações que conferem direito dededução e operações que não conferem esse direito, nas quais foi suportado e deduzido imposto no montante total de101.495,44€;
Conforme se refere na informação prestada em 17.12.2021 (Anexo 6), o A... adotou no exercício de 2017 o método da afetação real, estabelecido no Artigo 23.º do CIVA para determinação do IVA dedutível respeitante aos bens ou serviços parcialmente utilizados na realização de operações com direito a dedução deste imposto.
Este método pressupõe que o sujeito passivo efetue uma clara distinção das operações/atividades que realiza em sede deIVA e, que, relativamente ao imposto suportado nas aquisições de bens e serviços de utilização mista, recorre a critérios objetivos, para determinar o grau, proporção ou intensidade de utilização dos bens e serviços afetos à realização das operações que conferem direito de dedução.
Face ao que antecede, foi o sujeito passivo notificado em 18.11.2021 para apresentar o cálculo e descrição detalhada da metodologia de apuramento do imposto deduzido relativo aos bens e serviços de utilização mista adquiridos, tendo informado em resposta (Anexo 5), que “o instituto deduziu genericamente o IVA das despesas comuns”, não tendoconcretizado qual ou quais os critérios objetivos utilizados, justificado a respetiva adequação nem apresentado o cálculo de apuramento.
Com vista a suprir a informação em falta, o A... foi novamente notificado em 11.02.2022 (Anexo 7), para, entre outroselementos, discriminar as operações/atividades desenvolvidas no exercício de 2017:
I. que não conferem direito a dedução de IVA, identificando as faturas de aquisição de bens e serviços para estas operações/atividades e o respetivo imposto suportado;
II. que conferem direito a dedução de IVA, por terem uma relação direta e imediata com a venda de bens e serviços, identificando as faturas de aquisição de bens e serviços para estas operações/atividades e o respetivo imposto suportado e deduzido;
Na informação prestada em resposta, de 03.03.2022 (Anexo 8), relativamente às operações/atividades desenvolvidas que não conferem direito a dedução de IVA apresentou uma listagem de despesas que totalizam um montante de imposto suportado 17.993,78€ e no que concerne operações/atividades que conferem direito a dedução de IVA, listou aquisições de bens e serviços que totalizam um montante de imposto dedutível de 142.163, 54€ (Anexo 12).
Face ao exposto, não obstante o A... assumir que realiza operações que conferem direito de dedução de imposto bem como operações que não conferem esse direito, que efetuou aquisições de bens e serviços de utilização mista e declarar que aplica o método de afetação real - o que implica, necessariamente, separar as atividades e identificar cada um dos tipos de operações que pratica -, reconhece que relativamente “aos casos de serviços adquiridos de utilização mista, oA... deduziu a totalidade do imposto”.
Sempre que esteja em causa a determinação do IVA dedutível respeitante a bens ou serviços parcialmente afetos à realização de operações não decorrentes do exercício de uma atividade económica, é obrigatório o recurso à afetação real dos bens utilizados, segundo o previsto na alínea a) do n.º 1 do Artigo 23º do CIVA, com base em critérios objetivos que permitam determinar o grau da efetiva utilização desses bens ou serviços nessas e nas restantes operações, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo.
Verifica-se que no âmbito da sua atividade, o A... realiza:
1 - Prestações de serviços de consultoria, nas áreas das tecnologias da informação, eletrónica, comunicações e energia, que, de acordo com o artigo 1º e n.º 1 do Artigo 4.º do CIVA, se consideram operações sujeitas e não isentas de IVA, pelo que conferem direito à dedução do imposto comprovadamente suportado na aquisição de bens e serviços parasua realização, nos termos do artigo 20° do CIVA, com exceção das situações enunciadas no artigo 21° do CIVA;
2 - Prestações de serviços, como a realização de conferências e manifestações análogas de natureza científica, educativa ou técnica, efetuadas ao abrigo da isenção estabelecida no n.º 14 do art.º 9º do CIVA, pelo que, sendo operações sujeitas, mas isentas de IVA, não conferem direito à dedução do imposto comprovadamente suportado na aquisição de bens e serviços para sua realização, nos termos da alínea a) do n.º 1 do Artigo 20º do CIVA, a contrário.
3 - Projetos de I&D que assumem um fito puramente científico ou natureza de investigação aplicada, que não preveem ou têm inerente como resultado imediato a produção de um bem ou serviço concreto com uma vertente comercial para o A..., que necessariamente se traduzirá na existência de um destinatário direto para os mesmos. Estes projetos I&D que não têm qualquer conexão com operações tributáveis a jusante, não estão abrangidas pelo conceito de atividade económica, nos termos do n.º 1 do Artigo 2º do CIVA, pelo que não confere direito à dedução o imposto suportado naaquisição de bens e serviços para sua realização, nos termos da alínea a) do n.º 1 do Artigo 20º do CIVA, a contrário.
4 - Projetos de I&D que têm fixada uma finalidade comercial imediata, durante a sua execução ou após a sua conclusão com um destinatário concreto, através da prestação de serviços a terceiros ou da transmissão de bens, com contraprestação definida (preço e que por isso consubstanciam operações que se inserem nas atividades de produção,comércio ou prestação de serviços que integram o conceito atividade económica, definido na alínea a) do n.º 1 do Artigo 2.º do CIVA, e que por isso que conferem direito à dedução do imposto comprovadamente suportado na aquisição de bens e serviços para sua realização, nos termos dos Artigos 19º e 20° do CIVA, com exceção das situações enunciadas noartigo 21° do CIVA.
Em face do exposto, verificou-se que relativamente ao imposto suportado nas aquisições de bens e serviços de utilização mista (documentos 3 e 6 e de 13 a 31, respetivamente) foi deduzido na totalidade o imposto suportado, no montante global de 101.495,44€, respetivamente, não tendo sido aplicados os critérios objetivos inerentes ao método de afetação real que decorre do enquadramento cadastral do A..., em sede de IVA e do Artigo 23º do CIVA, para determinação doimposto diretamente suportado com as operações que a jusante conferem direito de dedução.
Em face da falta de apresentação de qualquer critério objetivo que pudesse ser utilizado para aplicação do método da afetação real, apesar de para tal ter sido notificado em 18.11.2021 e em 11.02.2022 e verificando-se que importa corrigir o imposto indevidamente deduzido nestas aquisições de utilização mista, foi decidido pelos Serviço de Inspeção Tribuária,em conformidade com o estabelecido no n.º 2 do Artigo 23.º do CIVA, utilizar como critério para determinação do imposto dedutível nos bens e serviços de utilização mista adquiridos, o peso das operações sujeitas a imposto e dele não isentas (prestações de serviço de consultoria) no total dos rendimentos obtidos em todas as atividades desenvolvidas pelo A..., de que resulta o apuramento do valor de 16%, para o exercício de 2017:
Em consequência da aplicação deste critério ao imposto suportado nos bens e serviços de utilização mista adquiridos referidos, resulta no apuramento de um imposto dedutível no valor de 16.239,31€ e de um montante de imposto deduzido em excesso num montante total de 85.256,13€, conforme se apresenta no quadro seguinte:
Observações:
1 IVA indevidamente deduzido no doc. 3 ; 2 IVA indevidamente deduzido no doc. 20;
3 IVA indevidamente deduzido nos docs. 14, 16, 19, 21 e 22: 29.084,45€ = 26.428,33€ + 980,17€ + 917,70€ + 172,97€ + 585,28€;
4 IVA indevidamente deduzido no doc. 6;
5 IVA indevidamente deduzido nos docs. 15, 25, 26 e 30: 16.112, 16€ = 4.404,72€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 2.898€;
6 IVA indevidamente deduzido nos docs. 13, 17, 18, 23, 24, 27, 28, 29 e 31: 35.190,96€ = 4.820,34€ + 8.683,18€ + 4.404,72€ + 585,28€ + 585,28€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 2.898€.
ce ao exposto, verifica-se que relativamente à amostra documental recolhida foi deduzido imposto em excesso nos Campos 20 e 24 num montante total de 85.256,13€ (3.902,56€ + 81.353,57€), que foi repercutido nos campos 20 das DP1703T e DP1709T, nos montantes de 994,90€ (doc. 3) e 2.907,66€ (doc.6), respetivamente, e nos campos 24 das DP1703T, DP1706T, DP1709T e DP1712T, nos montantes de 184€ (doc. 20), 5.539,90€ (docs. 14, 16, 19, 21 e 22), 3.069,00€ (docs. 15, 25, 26 e 30) e 6.708,06€ (docs.13, 17, 18, 23, 24, 27, 28, 29 e 31), respetivamente, por infração ao disposto no Artigo 23 n.º 1 do CIVA.
iii.2 – TOTAL DE IVA PROPOSTO PARA CORREÇÃO
Face ao exposto no ponto III.1. do presente Capítulo, o conjunto das correções relativas ao IVA dedutível totaliza omontante de 100.027,20€, refletindo-se nas declarações periódicas de 2017 conforme a seguir se discrimina:
Observações:
1 IVA indevidamente deduzido nos docs. 1, 4, 5, 7, 9 e 3: 8.307,85€ = 920,00€ + 1.223,60€ + 766,62€+ 4140€ + 1.068,12 + 994,90€ 2 IVA indevidamente deduzido no doc. 20: 966,00€;
3 IVA indevidamente deduzido nos docs. 10, 11 e 12: 1.459,12€ = 392,18€ + 515,63€ + 551,31€;
4 IVA indevidamente deduzido nos docs. 14, 16, 19, 21 e 22: 29.084,45€ = 26.428,33€ + 980,17€ + 917,70€ + 172,97€ + 585,28€; 5 IVA indevidamente deduzido no doc. 6: 2.907,66€;
6 IVA indevidamente deduzido nos docs. 15, 25, 26 e 30: 16.112, 16€ = 4.404,72€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 2.898€; 7 IVA indevidamente deduzido nos docs. 2 e 8: 5.193,61€ = 4.535,60€ + 658,01€;
8 IVA indevidamente deduzido nos docs. 13, 17, 18, 23, 24, 27, 28, 29 e 31: 35.190,96€ = 4.820,34€ + 8.683,18€ + 4.404,72€ + 585,28€ + 585,28€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 4.404,72€ + 2.898€.
15.10. Foi dado cumprimento ao disposto nos artigos 60.º da LGT e 60.º do RCPITA através do envio ao sujeito passivo, a coberto do oficio n.º ..., de 8-4-2022, do projecto de correções propostas no RIT acompanhado de notificação para, querendo, exercer o direito de audição no prazo de 15 dias.
15.11. O referido ofício, bem como os documentos nele referidos, foi remetido sob registo postal. Rececionado pelo Requente em 11-04-2022, este optou por não exercer o direito de audição.
15.12. Assim, foi o projeto de Relatório de Inspeção Tributária convertido em definitivo, concluindo-se a ação inspetiva com o despacho da Chefe de Divisão da Direção de Finanças de Lisboa, de 2 de maio de 2022, proferido no uso de delegação de competências, concordando com as correções técnicas propostas naquele Relatório, respetiva qualificação, quantificação e fundamentação.
15.13.A decisão referida no ponto anterior foi notificada ao Requerente nos termos do artigo 62.º do RCPITA através de ofício de 04-05-2022, dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa.
15.14.Com base nas correções constantes do RIT foram efetuadas as liquidações adicionais de IVA, identificadas na PI e documentos a ela anexos: liquidação adicional n.º ..., período 201703T (doc. 10); n.º... 2017/06T (doc. 11); n.º ... 2017/09T (doc. 12) e ... 2017/12T (doc. 13), tudo no valor total de € 100.027,20 (cem mil e vinte sete euros e vinte sete cêntimos).
15.15. Mais detalhadamente, conforme refere o Requerente, àquele valor total das correções corresponde € 98 009,24 respeitante a valor reporte a 31/12/21, e “em que o valor da diferença, 2 017,96€, foi declarado no campo 41 da declaração do 1º trimestre de 2022, o que deu origem a pagamento de imposto no valor de € 27 110,10, conforme se prova pela Declaração Periódica 202112 (em 2021 era mensal) (doc. 15), pela Declaração Periódica 202203T (doc. 16), que corresponde ao Documento pagamento cuja cópia se junta e ao comprovativo de Transferência Bancária junto (doc. 17).”
15.16. Em 06-05-2022, o Requerente foi notificado dos atos de liquidação adicional de IVA, através da caixa postal eletrónica.
15.17. O presente pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 01.08.2022. Assim, considerando o disposto n.º 9 do artigo 38.º e no n.º 10 do artigo 39.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) corre uma dilação temporal de 15 dias até que se inicie a contagem do prazo de três meses previsto na al. a) do nº 1 do art.º 10.º do Dec. Lei nº 10/2011 e art.º 102.º do CPPT, pelo que o presente pedido de constituição de tribunal arbitral é tempestivo.
16.Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham por provados por via da documentação junta ao processo e depoimento das testemunhas arroladas pelo Requerente.
IV. Matéria de direito
17.Na sequência de ação inspetiva e com base nos elementos e propostas constantes do respetivo Relatório, a Administração Tributária efetuou correções relativas ao IVA dedutível refletido das diversas declarações periódicas do ano de 2017, totalizando o montante de € 100 027,20.
18. Conforme detalhadamente referido no RIT, as correções em causa incidiram sobre um conjunto de documentos em que se suportaram as deduções efetuadas pelo sujeito passivo nos diversos períodos daquele ano. Da amostragem recolhida conclui-se, naquele relatório, que:
- uma parte dos referidos documentos se refere a bens adquiridos relativamente aos quais se não demonstrou estarem associadas a projetos de I&D com finalidade comercial; e
- outros respeitam à aquisição de bens do imobilizado afetos a operações que conferem direito a dedução e a operações que não conferem esse direito. Relativamente a estes bens de utilização mista a correção operada é determinada com base numa percentagem de dedução de 16%.
19. Em ambos os casos, o Requerente, operando com base no método de afetação real, deduziu a totalidade do imposto suportado nas aquisições tituladas pelos referidos documentos no entendimento de que os bens adquiridos se destinam exclusivamente ao exercício da sua atividade económica sujeita e não isenta de IVA.
20. As correções operadas pela AT de que resultam as liquidações impugnadas fundamentam-se em entendimento firmado pelo despacho n.º 672/2002, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, proferido sobre a Informação de 25.03.2002 do respetivo Gabinete, relativo à dedução do IVA nas aquisições feitas no âmbito de projetos de investigação e desenvolvimento.
21. Na referida informação, na parte respeitante à extensão do direito à dedução das entidades que realizam operações de investigação e desenvolvimento, a questão é equacionada nos seguintes termos: “ O essencial da questão em jogo gira em torno do conceito de operação tributável para efeitos de IVA e, portanto, da delimitação da incidência objectiva deste imposto.
É sabido que nem a Sexta Directiva IVA nem o nosso Código fixam o conceito de operação tributável, definindo tão só os conceitos menores de transmissão de bens e de prestação de serviços. Ainda assim, e por interpretação destes textos, pode dizer-se que constitui operação tributável todo o comportamento activo ou omissivo que apresente valor económico e que por isso mesmo constitua objecto de uma transacção.(1)
A operação em causa poderá revestir natureza gratuita ou onerosa, mas para que seja tributável é necessário que tal comportamento mostre valor económico para outrem e venha a ser realizado em seu benefício - o propósito do IVA está em tributar o consumo intermediado pelo mercado e materializado nas transacções que nele se realizem, ficando fora da incidência do imposto os comportamentos sem valor económico ou que apresentando-o embora, esgotem a sua utilidade na esfera de quem os realiza.
É esta a doutrina que se extrai também da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades, nomeadamente dos Acórdãos Jurgen Mohr (Processo C-215/94) e Landboden-Agrardienst (Processo C- 384/95) em que o Tribunal recusou a natureza de prestação de serviços à actividade desenvolvida por agricultores em contrapartida de financiamentos comunitários.(2)
Fixado este ponto está encontrada a chave de leitura dos artigos 3º e 4º do Código do IVA, que definem, respectivamente, as transmissões de bens e as prestações de serviços tributáveis.
Assim:
a) Quando a investigação constitua uma actividade com fito comercial consubstancia uma operação tributável nos termos gerais do Código do IVA. Assim sucederá sempre que (i) a actividade de investigação revista valor económico e (ii) esse valor reverta, directa ou indirectamente, em benefício do financiador.
b) Quando a investigação constitua uma actividade com fito científico ela não consubstancia uma operação tributável nos termos do Código do IVA. Assim sucederá sempre que a actividade de investigação não revista valor económico relevante ou quando, mesmo revestindo-o, ele não reverta em benefício directo ou indirecto do financiador. Nestes casos é alheia à incidência do IVA a actividade de investigação, como o é a operação de financiamento. Com efeito, as entregas de dinheiro não são tributáveis em si mesmas, escapando à noção de transmissão de bens constante do art. 3º do Código do IVA - isto, ainda que as subvenções sejam relevantes para efeitos de determinação do pro rata nos termos do art. 23º do Código. (3)
Sempre que se pergunte pelo tratamento em sede de IVA de uma qualquer actividade de investigação e desenvolvimento haverá, portanto, que enquadrá-la na primeira ou na segunda hipóteses enunciadas - seja qual for a natureza da entidade investigadora ou da entidade financiadora.
Pelos elementos que se juntam ao processo, parece concluir-se com alguma segurança que os projectos de investigação e desenvolvimento financiados pela Comunidade Europeia e pelo quadro Comunitário de Apoio se enquadram na segunda. Com efeito, os objectivos da investigação assim financiada parecem ser essencialmente científicos e, ainda que se admita poder haver aproveitamento económico dos resultados obtidos - como sucederá na generalidade da actividade científica - esse aproveitamento não reverte em benefício, directo ou indirecto, da entidade financiadora, não constituindo por isso a razão de ser do financiamento prestado.
Parecendo esta a solução mais conforme à Sexta Directiva IVA é certo que ela não constitui solução uniforme no âmbito da Comunidade, razão pela qual se deve promover de imediato o esclarecimento dá questão junto do Comité IVA, por modo a que o cumprimento escrupuloso das Directivas comunitárias na matéria que o Estado português tem mantido não reverta em desvantagem injustificada para a comunidade científica nacional.
...
(1) - Veja-se Johann Bunjes/Reinhold Geist (1997) Umsatzsteurgesetz, 5ª ed. 146.
(2) - Veja-se Bem Terra/Julie Kajus (2000) A Guide the European VAT Directives Vol. II.
(3) - Razão pela qual é frequente apontar-se como hipótese típica de pagamento em dinheiro não tributável para efeitos de IVA o financiamento voluntário ou a 'fundo perdido' efectuado por entidades públicas - veja-se Mario Mandó/Giancarlo Mandó (2001) Manuale dell'Imposta sul Valore Aggiunto, 20ª ed., 34.
22. A este propósito, releva igualmente o entendimento expresso na informação Vinculativa A419 200S041, de 2009-02-02, com despacho do Subdiretor Geral dos Impostos, substituto legal do Diretor-Geral, expressamente citada no RIT como sendo inteiramente aplicável ao caso em apreço, no sentido de que "quando a investigação constitua uma atividade com fito científico ela não consubstancia uma operação tributável nos termos do Código do IVA. Tal ocorre quando uma atividade de investigação não revista valor económico relevante ou quando, mesmo revestindo-o, ele não reverta em benefício direto ou indireto do financiador, sendo, nestes casos, alheia à incidência do IVA a atividade de investigação, como o é a operação de financiamento.
23. Conclui-se na referida Informação Vinculativa que “ A Direcção de Serviços do IVA tem entendido que, se uma entidade realiza uma actividade de investigação e desenvolvimento que não tem intuitos comerciais, não sendo portanto vendido o resultado dessa investigação, não existem operações tributáveis, pelo que essa actividade é classificada fora do campo de IVA, e não confere qualquer direito à dedução do imposto suportado. Pelo que, “ Ainda que tendencialmente os resultados dessa investigação tenham aplicações comerciais ou industriais, a realização de uma actividade de investigação e desenvolvimento sem que existam objectivos comerciais imediatos, nem exista um destinatário concreto para os resultados dos projectos em desenvolvimento, não permite que se afirme com rigor estar-se perante a realização de sAerviços ou transmissões de bens sujeitas a imposto.”
Posição do Requerente
24. A posição do Requerente, detalhadamente descrita ao longo da petição inicial, vem sintetizada nas respetivas Conclusões nos seguintes termos:
- O A... é um sujeito passivo misto, face ao IVA, que optou, desde 2008, pelo método de afetação real, cuja aplicação prática pressupõe, como é o seu caso, a existência de uma relação inequívoca entre as aquisições de bens e serviços efetuadas pelo sujeito passivo e as operações ativas correspondentes;
- tal afetação real tem por base critérios objetivos que lhe permitem determinar concreta e precisamente o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito à dedução e em operações que não conferem esse direito;
- Sendo o A... um sujeito passivo misto, e considerando o universo das operações por si desenvolvidas, procedeu à identificação das respetivas áreas de negócio e, do ponto de vista contabilístico, constituiu centros de custos para cada uma das referidas áreas, procedendo ao registo contabilístico segregado das operações ativas e passivas consoante o setor a que respeitavam;
- o impugnante não só exerce uma regular atividade económica, tanto na aceção do disposto na n.º 2 da anterior 6.ª Diretiva n.º 77/388/CEE, como na do art.º 9.º n.º 1 da atual Diretiva IVA 2006/112/CE, e segundo o conceito amplo adotado na inúmera e constante a Doutrina, na jurisprudência do CAAD e do TJUE, desde logo nos acórdãos de 04.12.1990, Van Tiem, processo C186/89, nº 18; de 11.07.1996, Régie Dauphinoise, processo C‑306/94, nº 15; de 29.04.2004, EDM, processo C-77/01, nº 48; de 21.10.2004, BBL, processo C‑8/03, nº 64 36; e de 26.06.2007, T‑Mobile Austria GmbH, processo C-284/04, nº 38, atividade que exerce como um qualquer outro sujeito passivo de IVA, como se prova pela faturação que realizada em todos os exercícios, de serviços prestados, que nos anos de 2015, 2016 e 2017 ascendem a cerca de um milhão e meio de euros;
- Tal atividade constitui o resultado da combinação dos fatores produtivos (mão de obra, matérias-primas, equipamento, etc.), com vista à produção de bens e serviços, sendo irrelevante para este efeito o modo como é (parcialmente) financiada;
- O A... espera sempre alcançar resultados traduzidos em conhecimento tecnológico concreto, que pode tanto ser diretamente utilizável para a realização de operações económicas gerais, como pode ser apto a integrar novo processo de investigação subsequente, ou a ser integrado em processo de fabrico sob a forma de produto ou conhecimento integrado, sem o qual o produto ou o componente em causa não funcionaria, como se prova através dos casos acima enunciados como meio de prova de tudo quanto se afirmar;
- a investigação e o desenvolvimento científico realizada pelo A... constituem uma atividade económica, onerosa, porque se estabelecem contrapartidas entre as partes, porque é realizada com a finalidade de obtenção de resultados económicos palpáveis, sendo normalmente remunerada;
- os financiamentos que obtém requerem a celebração de Termos de Aceitação e Contratos de Consórcio, verdadeiros contratos comerciais onde se fixam os objetivos científicos a atingir, sob pena de recusa da transferência dos fundos, visando sempre a sustentação do crescimento económico; novo conhecimento ou nova tecnologia; protótipos, testes, demonstrações, atividades-piloto, validação de produção, visado produzir produtos ou serviços novos ou melhorados;
- O que neles se visa é, assim, estimular a difusão do conhecimento, dando uma contribuição para a sociedade e para o tecido produtivo, como é o caso dos projetos financiados, pela FCT, pela Comissão Europeia ou qualquer outra agência financiadora;
- a atividade económica desenvolvida pelo A... se deve considerar abrangida pela Diretiva IVA e, dentro destas, as atividades isentas e não isentas ou tributadas em IVA, à luz das leis comunitárias e da vasta e uniforme jurisprudência do TJUE;
- toda a investigação realizada pelo A... é aplicada, sendo uma mera sofismação ilegal da AT a sua distinção de “investigação dita pura”, pois o A... tem sempre em vista a produção de resultados que tenham valor económico ou aptidão comercial, visando a realização de proveitos tributáveis em sede de IRC que constituem, do mesmo modo, operações tributáveis em sede de IVA;
- o A... utiliza os direitos de propriedade intelectual, os direitos de autor ou de propriedade industrial que obtém, bem como o conhecimento constituído como resultado das atividades por si desenvolvidas para a realização de operações tributáveis enquadradas em IVA e, ainda, para adquirir participações no capital social de empresas, o que revela o valor económico desse conhecimento adquirido;
- a sua atividade de investigação e desenvolvimento reveste valor económico, possui objetivos comerciais imediatos, como o provam os contratos de consórcio por si celebrados, integrando empresas privadas, com a consequente realização de serviços ou transmissões de bens sujeitas a imposto, tal como resulta dos citérios fixados na inúmera jurisprudência comunitária;
- a sua atividade de investigação e desenvolvimento aplicado revertem em benefício direto ou indireto do financiador, por terem um destinatário concreto dos resultados obtidos através dos projetos de I&D, mediante operações tributáveis onerosas, sujeitas a IVA, incluindo as operações de spin-off, supra identificadas;
- O A... prova cabalmente que o conhecimento científico que produz, quando dele não resulta de forma imediata e direta a prestação de serviços tributados, ainda constitui um bem económico que lhe permite, realizar estas operações de spin-off, participando através desses bens corpóreos ou incorpóreos, que resultam da sua atividade de investigação (aplicada) e do valor comercial que eles materializam, para subscrever capital social em sociedades de capital (start-ups), como é o caso das operações seguintes, em cujo capital social o A... participa, como é o caso da sociedade comercial H... SA; da sociedade anónima A I..., SA; da 66 sociedade anónima J... SA; da sociedade por quotas E... LDA; da sociedade K..., Lda; a sociedade anónima L..., SA, entre várias outras;
- Pelo que tal atividade cumpre os critérios enunciadas da Diretiva IVA, na lei interna e na doutrina administrativa, ao contrário do erradamente alegado pelos serviços de inspeção no Relatório que serve de fundamento às correções e às liquidações impugnadas;
- Com claro benefício direto e / ou indireto dos financiadores, provados ou públicos, estando como estão em causa fundos públicos, isto é, despesa pública sujeita aos critérios de legalidade, economicidade, eficácia e eficiência, para tutela de interesses públicos relevantes;
- todas as operações económicas que realiza configuram operações tributáveis, nos termos e para efeitos do disposto na alínea a) do nº 1 do art.º 1º do CIVA, sendo sujeitas a imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços por si efetuadas no território nacional, a título oneroso, agindo na qualidade de sujeito passivo, englobando-se no conceito de prestação de serviços, todas as operações decorrentes da atividade económica que não sejam definidas como transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens;
- Como consequência, é ilegal o estabelecimento por mera via administrativa de critérios autónomos e isolados para a atividade de I&D - (1) valor económico específico; (2) objetivos comerciais imediatos contratualmente definidos ab initio, durante a execução no termo do contrato ou a realização de serviços ou transmissões de bens concretos, sujeitas a imposto; (3) destinatários concretos dos resultados dos projetos de I&D (4) benefício direto ou indireto do financiador – que não impostos à atividade de prestação de serviços, uma vez que tais critérios não resultam nem do Código do IVA nem de lei europeia, nem alguma vez foram sugeridos ou acolhidos na Doutrina ou na Jurisprudência dos Tribunais nacionais superiores ou do próprio TJUE, pelo que são ilegais, até porque configuram uma restrição ao funcionamento da união económica da UE, sendo encargos de efeito equivalente a tributos, por dificultarem a atividade dos sujeitos passivos de IVA;
- o estabelecimento desta causalidade estrita constitui uma tese inovadora da AT que o TJUE tem rechaçado por completo, ao decidir sempre no sentido de que não é exigível estabelecer uma relação direta e imediata relativamente a cada output individualmente considerado, admitindo ser suficiente que tal conexão se verifique relativamente à atividade do sujeito passivo globalmente considerada, desvalorizando a exigência de uso direto da aquisição dos bens ou serviços, concluindo que somente atendendo ao propósito último da aquisição se logrará atingir a racionalidade e a neutralidade do sistema do IVA (acórdãos SKF (de 29 de outubro de 2009, no processo C-29/08) e Midland Bank (de 8 de junho de 2000, no processo C-98/98e acórdão Sveda, de 22 de outubro de 2015, no processo C126/14); v) Fica provado que tais novas (e ilegais) exigências da autoridade tributária nacional visam exatamente gerar um duplo efeito, limitador e ilegal, sobre a estrutura de funcionamento fundamental da mecânica do próprio IVA, como verdadeiras barreiras artificiais de segmentação dessa atividade, cujo fito é, especificamente, impedir a recuperação de IVA suportado a montante, pois constituem não apenas restrições ao conceito de atividade económica que está plasmado no Código do IVA e na Diretiva IVA, que tem, precisamente, sido alargadamente consolidado pelo TJUE através de inúmera jurisprudência;
- Tanto mais quanto é certo que o direito à dedução constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA que não pode, em princípio, ser limitado e que se exerce imediatamente em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante;
- Acresce que os incentivos atribuídos ao A... para a realização dos projetos de I&D têm como contrapartida, pela sua natureza, a geração de valores ativos de investimento, constituídos pelo conhecimento gerado, que fica na posse do A... . É esse conhecimento que lhe permite desenvolver a sua atividade de transferência de tecnologia ou de consultoria de I&D para o tecido económico, materializada em prestações de serviços, que, nos exercícios de 2015, 2016 e 2017 ascenderam a cerca de um milhão e meio de euros!
- Acresce ser ilegal a artificial partição ou segmentação por projetos da atividade económica desenvolvida pelo impugnante para alcance do resultado ínvio de considerar fora do campo do IVA a atividade desenvolvida nos projetos de I&D, não só porque a atividade económica flui como um todo, ainda possa ser isenta ou sujeita a IVA, mas também porque dos projetos de I&D resultou (ou deles resultará) conhecimento que já foi objeto de serviços sujeitos a IVA nos termos gerais, como se provou;
- não resulta da lei a necessidade de segmentar a atividade do A..., entre projetos de investigação que já deram lugar à venda de bens e serviços produzidos, e os projetos de investigação que não deram (ainda) lugar a essas operações, caso em que o exercício do direito à dedução em IVA está a ser negado pela AT;
- Acresce que a AT incorre em erro sobre os factos, ao considerar os docs. 1, 4, 5 e 9, como respeitando a projetos de I&D, quando se trata de bens adquiridos para a execução de contratos de prestação de serviços, integrados na sua atividade económica, que deram lugar à emissão de diversas faturas por serviços prestados, nas quais liquidou IVA a jusante, pelo que não lhe pode ser negada a dedução a montante de IVA suportado (arts. 19.º a 21.º do CIVA);
- Tanto mais que o A... prova que tais aquisições foram efetuadas no âmbito de contratos autónomos de fornecimento de serviços, celebrados entre o A... e um conjunto de empresas / entidades, ao abrigo dos quais o A... prestou serviços, emitindo as correspondentes faturas sobre os serviços prestados, sobre cujo valor liquidou IVA nos termos gerais;
- Incorre ainda a AT em erro gerador de erro material de cálculo e violação de lei, ao qualificar erradamente os subsídios percebidos como sendo ao preço ou a financiar a sua atividade, quando, como se prova, o A... recebeu igualmente subsídios destinados ao investimento em equipamento, os quais devem ser excluídos do denominador do pro rata, nos termos do art.º 23.º n.º 4 do CIVA;
- Este erro material, resulta de um erro de qualificação prévio, consubstanciado no facto de terem erradamente sido integrados pela AT, no denominador da fração, valores relativos a alegados subsídios à exploração que, de facto, têm a natureza material de subsídios ao investimento em equipamento (ativo fixo) envolvendo operações comerciais com três sujeitos económicos (o financiador, o A... e a empresa a quem adquire o bem) os quais a AT, nos seus cálculos, não deveria fazer constar da fração – art.º 23.º n.º 4 do CIVA in fine;
- Tendo parte desses subsídios, alegadamente à exploração, a natureza material de subsídios ao investimento em equipamento (ativo fixo) envolvendo operações comerciais com três ou mais sujeitos económicos distintos e independentes (o financiador, o A... e as empresas adquirentes) os mesmos não deveriam constar da fração – art.º 23.º n.º 4 do CIVA in fine;
Não estando, como de facto não estão, tais subsídios diretamente conexos com o preço de cada operação, nem se destinam a compensar défices de exploração, e não sendo estabelecidos em função do número de unidades transmitidas ou do volume de serviços prestados, nem sendo fixados anteriormente à realização de operações, são materialmente subsídios ao investimento / equipamento (ver Ficha doutrinária n.º proc. 2336/ de 10.8.2017) pelo que devem ser expurgados do denominador do pro rata, como se prova, o que aqui desde já se requer;
- Assim se provando o mal fundado da sua pretensão, uma vez que o TJUE vem considerando frontalmente contrária ao direito comunitário a limitação da dedutibilidade do IVA suportado no investimento em bens de equipamento, financiados por subvenções, por contrariar os artigos 17.º e 19.º da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio, relativa ao sistema comum IVA – por todos, Acórdão de 6.9.2005, proferido no Proc. n.º C-243/03, sobre bens de equipamento financiados;
- O TJCE (proc. C-204/03) defende que o estabelecimento de um pro rata de dedução do IVA suportado pelos sujeitos passivos que apenas efetuem operações tributáveis e bem assim de uma regra especial que limita a dedutibilidade do IVA incidente sobre a aquisição de bens e serviços financiados por subvenções, violam os artigos 17.º n.º 2 e 5 e 19.º da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio, relativa ao sistema comum IVA, o que torna ilegal o método de apuramento do pro rata a que procedeu a AT, por erro sobre os pressupostos de facto, violação de lei imperativa e afetação dos princípios da neutralidade do imposto, da igualdade de tratamento, e da justiça, pelo que tal cálculo carece de ser corrigido;
- Pelo que prova que ocorre a violação do disposto no n.º 4 do art.º 23.º do CIVA e na vasta Doutrina citada e na Jurisprudência do TJUE, abundantemente citada nesta p. i., para onde se remete e ora dá reproduzida para todos os efeitos legais;
- Fica, assim, claro que a AT viola a lei ao calcular tal pro rata incluindo o montante anual desses subsídios, sendo o respetivo cálculo ilegal por erro nos pressupostos de facto, violação de lei imperativa e afetação dos princípios da neutralidade do imposto, da igualdade de tratamento, e da justiça, pelo que tal cálculo carece de ser corrigido. Pelo que se requer ainda que seja mantida na íntegra a segregação das operações que realizou através do método da afetação real, considerando como boa a afetação por si realizada entre operações isentas que conferem direito integral à dedução do IVA a montante, das operações isentas sem direito a tal dedução, aceitando-se como bons os critérios objetivos utilizados pelo Requerente, em virtude de tais critérios permitirem determinar com precisão o grau de utilização desses bens e serviços, conforme previsto nos art.ºs 1.º e 2.º, 16.º e 23.º do CIVA. Requer-se ainda que, de todos os modos, o cálculo do pro rataefetuado pela AT a fls.16 e segs (docs. 3 e 6 e de 13 a 31), seja igualmente revisto, dele se expurgando do denominador os valores relativos aos subsídios ao investimento / equipamento, com fundamento em clara e inequívoca violação de lei e erro nos pressupostos, como se demonstrou.
Posição da Requerida
25. A Requerida, na sua Resposta, alega, simplesmente, que a mesma “ se respalda nas conclusões do Relatório Final de Inspeção, para cuja leitura se remete, no resto oferecendo o merecimento dos autos.”
Do mérito do pedido
26. A questão que se suscita no presente processo centra-se na qualificação, em sede de IVA, da atividade de investigação e desenvolvimento desenvolvida pelo Requerente, em larga medida financiada por subsídios de entidades nacionais e internacionais a par da contrapartida de serviços prestados a diversos adquirentes. Trata-se, pois, de saber se a atividade em causa constitui, ou não, atividade económica, na aceção do regime do IVA, com o consequente reflexo no tocante dedução do imposto incidente sobre os gastos incorridos na mesma.
27. A abordagem desta questão remete-nos, desde logo, para o princípio da dedução enquanto princípio estruturante do sistema comum do IVA. Com efeito, vem este princípio enunciado no artigo 2.º da 1.ª Diretiva IVA – Diretiva 67/227/CEE, do Conselho, de 11.4.1967 – encontrando-se, presentemente, inscrito no artigo 1.º da Diretiva 2006/112/CE, nos seguintes termos:
“ 2. O princípio do sistema comum do IVA consiste em aplicar aos bens e serviços um imposto geral sobre o consumo exactamente proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação.
Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.”
28. No quadro do processo legislativo previsto no artigo 113.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) – anterior artigo 93º do Tratado que Institui a Comunidade Europeia – relativo à harmonização das legislações dos Estados-Membros relativas aos impostos indiretos, designadamente impostos sobre o volume de negócios, a Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, 28 de novembro de 2006, estabelece, presentemente, o sistema comum do IVA.
29. De acordo com o artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições são aplicáveis na ordem interna. No caso do IVA prevalecem, assim, as normas, incondicionais e precisas, da Diretiva bem como a interpretação que delas faz o Tribunal de Justiça da União Europeia.
30. No essencial, o regime das deduções encontra-se vertido nos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA, que transpõem para o direito interno os artigos 167.º a 172.º daquela Diretiva. Em consonância com o princípio enunciado no seu artigo 1.º, o artigo 168.º da mesma estabelece, como regra geral do direito à dedução, a de que “quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, o sujeito passivo tem direito, no Estado-Membro em que efectua essas operações, a deduzir do montante do imposto de que é devedor.” No direito interno, este princípio consta do artigo 20.º do Código do IVA.
31.Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça o direito à dedução do IVA, conforme previsto nos artigos 167.º e seguintes da Diretiva IVA, constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que oneraram as operações efetuadas a montante (TJUE, Despacho de 12.01.2017, MVM, Proc. C.63/16, n.º 26, Acs. de 5.7.2018, Marle Participations, Proc. C-320/17, n.º 24 e 8.09.2022, W GmbH, Proc. C-98/21, n.º 37N ).
32. Conforme reiterada jurisprudência daquele Tribunal, “No que se refere às exigências ou aos requisitos materiais, resulta do artigo 168.º, alínea a), da Diretiva IVA que, para poder beneficiar do direito à dedução, é necessário, por um lado, que o interessado seja um «sujeito passivo», na aceção desta diretiva, e, por outro, que os bens ou os serviços invocados para basear esse direito sejam utilizados a jusante pelo sujeito passivo para os fins das suas próprias operações tributadas e que, a montante, esses bens sejam entregues ou esses serviços sejam prestados por outro sujeito passivo” “(TJUE,Acs. de 6.9.2012, Toth, Proc. C-324/11, n.º 26, de 22-10.2015, PPUH Stehcemp, Proc. C-277/14, n.º 28 e de 19.10.2017, SC Paper Consult, Proc. C.101/16, n.º 39)
33. No quadro do direito da União Europeia, os conceitos de “sujeito passivo” e de “atividade económica” encontram-se enunciados no artigo 9.º, n.º 1, daquela Diretiva nos seguintes termos: “ 1. Entende-se por «sujeito passivo» qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma actividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa actividade.
Entende-se por «actividade económica» qualquer actividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada actividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência.”
34. Esta norma é transposta para o direito interno pelo artigo 2.º, n.º1, alínea a), do Código do IVA, com a seguinte redação: “São sujeitos passivos do imposto: a) As pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livres, e, bem assim, as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos de incidência real do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) ou do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC);”
35. O conceito de “atividade económica”, relevante para efeitos do IVA, é o que expressamente se encontra estabelecido no segundo parágrafo do artigo 9.º da Diretiva 2006/112/CE, acima transcrito. Segundo o Tribunal de Justiça neste conceito englobam-se “todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, nomeadamente as operações relativas à exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência” (TJUE, Acs. de 26.06.2003, KapHag, Proc. C-442/01, n.º 36 e de 26.05.2005, Kretztechnik AG. Proc. C-465/03, n.º 13). O mesmo Tribunal precisou que a definição de “exploração” expressa naquele conceito “se refere, em conformidade com as exigências do princípio da neutralidade do sistema do IVA, a todas as operações, seja qual for a sua forma jurídica, que visem retirar do bem em questão receitas com carácter de permanência.”(TJUE, Ac. de 26.6.2003, KapHag, Proc. C-442/10, n.º 36).
36. Segundo o TJUE, “a análise destes conceitos põe em evidência a extensão do âmbito de aplicação abrangido pelo conceito de actividades económicas e o seu carácter objectivo, no sentido de que a actividade é considerada em si mesma, independentemente dos seus objectivos e dos seus resultados” (TJUE, Ac. de 12.09.2000, Comissão/Grécia, Proc. C-260/98, n.º 26 e de 21.02.2006, University of Huddersfield, Proc. C-223/03). “Assim, uma actividade é, de modo geral, qualificada de económica quando tem carácter permanente e é realizada contra uma remuneração recebida pelo autor da operação” (TJUE, Acs. de 13.12.2007, Gotz, n.º19, de 26.10.2009, Comissão/Finlândia, Proc. C-246/08. N.º 37 e de 5.7.2018, Marle Participations, Proc. C-320/17, n.º22).
37. Constitui também reiterado entendimento do Tribunal de Justiça que o direito à dedução não depende da imediata realização de operações ativas tributáveis, sendo este direito desde logo exercido com referência ao imposto suportado na aquisição de bens e/ou serviços para a realização de operações tributáveis. Assim, declara aquele Tribunal que “Uma interpretação diferente da directiva seria, aliás, contrária ao princípio da neutralidade do IVA quanto à carga fiscal suportada pela empresa. Seria susceptível de criar, aquando do tratamento fiscal de actividades de investimento idênticas, diferenças não justificadas entre empresas que já realizam operações tributáveis e outras que procuram, através dos investimentos, iniciar actividades que serão fonte de operações tributáveis. Do mesmo modo, seriam estabelecidas diferenças arbitrárias entre essas últimas empresas, na medida em que a aceitação definitiva das deduções dependesse da questão de saber se esses investimentos conduzem ou não a operações tributáveis “ TJUE, Ac. de 29.02.1996, Proc. C-110/94, Inzo, n. 22). Pelo que “as actividades preparatórias devem ser consideradas actividades económicas na acepção da Sexta Directiva. Consequentemente, qualquer pessoa que realize actos preparatórios é considerada sujeito passivo na acepção do artigo 4.° desta directiva e tem direito à dedução” (TJUE, Acs. de 14.2.1985. Rompelman, Proc. 268/83, n.º 23, de 29.02.1995, Inzo, Proc. C-110/94, n.º 18). “Esse direito à dedução subsiste mesmo que, posteriormente, seja decidido, perante os resultados de um estudo de rentabilidade, não passar à fase operacional e colocar a sociedade em liquidação, de modo que a actividade económica projectada não dê origem a operações tributáveis” (TJUE, Ac. de 29.02.1996, INZO, Proc. C-110/94, n.º 20).
38. Sobre a relação existente entre operações com direito a dedução, tem o Tribunal de Justiça declarado que “Segundo jurisprudência assente, a existência de uma relação directa e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução é, em princípio, necessária para que o direito à dedução do IVA pago a montante seja reconhecido ao sujeito passivo e para determinar a extensão de tal direito (v. acórdão de 8 de Junho de 2000, Midland Bank, C-98/98, Colect., p. I-4177, nº 24, bem como acórdãos, já referidos, Abbey National, nº 26, e Inverstrand, nº 23). O direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efectuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito à dedução (v. acórdãos já referidos Cibo Participations, nº 31, Kretztechnik, nº 35, Inverstrand, nº 23, e Securenta, nº 27).
58. Porém, admite-se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação directa e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo (v., designadamente, acórdãos, já citados, Midland Bank, nºs 23 e 31; Abbey National, nº 35; Kretztechnik, nº 36, e Inverstrand, nº 24).(TJUE, Ac. de 22.10.2015, Sveda, Proc. C-126/14, n.º 28).
39. Do quadro acima sumariamente referido ao regime comum do IVA em matéria de deduções, conforme entendimento do Tribunal de Justiça, extrai-se, com clareza, que o exercício deste direito não se encontra condicionado à existência de uma relação direta e imediata entre operações a montante e a jusante, e muito menos subordinado à condição de os bens transmitidos e/ou dos serviços prestados serem efetuados sob encomenda, isto é, que, desde logo, tenham como destinatário um adquirente identificado.
40. Do exposto, decorre poder concluir-se, com segurança, que o entendimento expendido pela AT como fundamento das liquidações impugnadas carece inteiramente de base legal.
41. Refira-se que a questão que se suscita no presente processo não é nova, tendo-se firmado jurisprudência referida a situações factuais substancialmente idênticas à que se evidencia nos autos, que, unanimemente, vai no sentido do que acima se expõe.
42. Pode, assim, citar-se a decisão proferida no Processo 83/2020-T, em que se decidiu que “Não é exigível, ao contrário do que refere a Requerida, que a Requerente tenha à partida encomendas e destinatários definidos e contratados para os seus projetos, para que se constate uma atividade económica. A maior parte das atividades desenvolvidas pelos operadores económicos, sujeitos passivos de IVA, não têm um cliente ou comprador assegurado num momento inicial, nem tal condição figura nas normas de incidência do Código deste imposto ou da Diretiva IVA, sendo desprovida de suporte legal.”
43. No mesmo sentido, se conclui no Processo 343/2021-T “Como se refere no acórdão arbitral de 04-02-2021, proferido no processo n.º 83/202-T: «não é exigível, ao contrário do que refere a Requerida, que a Requerente tenha à partida encomendas e destinatários definidos e contratados para os seus projetos, para que se constate uma atividade económica. A maior parte das atividades desenvolvidas pelos operadores económicos, sujeitos passivos de IVA, não têm um cliente ou comprador assegurado num momento inicial, nem tal condição figura nas normas de incidência do Código deste imposto ou da Diretiva IVA, sendo desprovida de suporte legal».
Pelo exposto, tem de se concluir que as autoliquidações efetuadas com base no pressuposto de que a atividade de investigação da Requerente não constitui atividade económica para feitos de IVA enfermam de vícios de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito, que justificam a sua anulação, nas partes respetivas, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.
Assim, em consequência, dado que o IVA incorrido em projetos de I&D é passível de dedução integral, deverá a referida correção ser objeto de anulação ..”
44. Refira-se, também, a decisão proferida no Processo C-448/2021-T “Por outro lado, quanto ao requisito invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira na referida Informação Vinculativa de a actividade não reverter em benefício directo ou indirecto do financiador não é requisito exigido pelo artigo 9.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, para a caracterização de uma actividade como económica para efeitos de IVA, à face do artigo 9.º da Directiva n.º 2006/112/CE. Como se refere no acórdão arbitral de 04-02-2021, proferido no processo n.º 83/202-T, «não é exigível, ao contrário do que refere a Requerida, que a Requerente tenha à partida encomendas e destinatários definidos e contratados para os seus projetos, para que se constate uma atividade económica. A maior parte das atividades desenvolvidas pelos operadores económicos, sujeitos passivos de IVA, não têm um cliente ou comprador assegurado num momento inicial, nem tal condição figura nas normas de incidência do Código deste imposto ou da Diretiva IVA, sendo desprovida de suporte legal». Pelo exposto, tem de se concluir que as autoliquidações efectuadas com base no pressuposto de que a actividade de investigação da Requerente não constitui actividade económica para feitos de IVA enfermam de vícios de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito, que justificam a sua anulação, nas partes respectivas, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.”
45. E, ainda no mesmo sentido, pode ler-se na decisão proferida no Processo 527/2019-T:“No caso em apreço, resulta da prova produzida que, com a actividade no âmbito de projectos de investigação, a Requerente visa a produção e comercialização de bens e prestação de serviços, utilizando bens de investimento, inclusivamente adquiridos com subsídios, e visando retirar deles receitas com carácter de permanência, pelo que se está perante uma situação que se enquadra no conceito de actividade económica.
Assim, ao contrário do que pressupôs a Autoridade Tributária e Aduaneira, não se está perante uma situação em que a investigação constitua uma actividade com exclusivo fito científico, sem valor económico relevante, em que não sejam obtidos rendimentos com o resultado da investigação.
Por outro lado, quanto ao requisito invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira de a actividade não reverter em benefício directo ou indirecto do financiador, para além de isso não se ter provado, não é requisito exigido pelo artigo 9.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, para a caracterização de uma actividade como económica para efeitos de IVA, à face do artigo 9.º da Directiva n.º 2006/112/CE.
Pelo exposto, tem de se concluir que as correcções efectuadas com base no pressuposto de que a actividade de investigação da Requerente não constitui actividade económica para feitos de IVA enferma de vícios de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito, que justificam a anulação das liquidações, nas partes respectivas, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.”
46. Do exposto, pode, pois, conclui-se que as liquidações impugnadas, efetuadas com base no entendimento de que a atividade de investigação e desenvolvimento exercida pelo Requerente não constitui atividade económica para efeitos de dedução do IVA enfermam de vício de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, o que justifica a sua anulação de acordo com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º. alínea c), da Lei Geral Tributária.
47. Resultando do exposto a declaração de ilegalidade, e consequente anulação, da totalidade das liquidações que constituem objeto do presente processo, designadamente das que decorrem do cálculo da percentagem de dedução que toma em consideração operações que, erradamente, foram consideradas como não constituindo atividade económica abrangida pela incidência do IVA, fica prejudicado o conhecimento do vício invocado pelo Requerente relativo à determinação daquela percentagem.
48. Este entendimento fundamenta-se no disposto no artigo 124.º do CPPT. subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º do RJAT, que ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios pressupõe que julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes não é necessário conhecer dos restantes.
Do direito a juros indemnizatórios
49. A par da anulação dos atos de liquidação, e consequente reembolso das importâncias indevidamente cobradas, o Requerente solicita ainda que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT.
50. Com efeito, nos termos da norma do n.º 1 do referido artigo, serão devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido." Para além dos meios referidos na norma que se transcreve, entendemos que, conforme decorre do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros pode ser reconhecido no processo arbitral e, assim, se conhece do pedido.
51. O direito a juros indemnizatórios a que alude a norma da LGT supra referida pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.
52. No caso dos autos, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, pelas razões que se apontaram anteriormente, a limitação do crédito de imposto a reportar para os períodos seguintes determinou que fosse efetuado o pagamento de imposto no montante € 27 110,00 (Docs. 15 a 17), manifestamente indevido.
53. Julgando-se, assim, a ilegalidade dos atos impugnados reconhece-se ao Requerente o direito aos juros indemnizatórios peticionados, contados, à taxa legal, sobre o montante de € 27 110,00 indevidamente cobrado, desde a data do respetivo pagamento até ao momento do efetivo reembolso (cfr. LGT, art.43.º, n.º 1 e CPPT, art. 61.º).
Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o tribunal decide julgar inteiramente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, determinar a anulação dos atos de liquidação impugnados, consequente reembolso das importâncias indevidamente cobradas, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios contados nos termos legais.
Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em € 100 027,20 , nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º1, alíneas a) e b), do RJAT e artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 3 060,00, a cargo da Requerida.
Lisboa, 21 de março de 2023,
Os árbitros,
Manuel Luís Macaísta Malheiros – Árbitro presidente)
Fernando Miranda Ferreira – Árbitro vogal
Álvaro Caneira – Árbitro vogal e relator.