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SUMÁRIO: As normas do n.º 1, parte final, e n.º 3 do artigo 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, interpretadas conjugadamente, ao estabelecerem um tratamento fiscal mais favorável para os organismos de investimento coletivo (OIC) que operem em Portugal de acordo com a legislação portuguesa, em relação aos organismos equiparáveis que tenham sido constituídos de acordo com a legislação de outro Estado-Membro da União Europeia, violam os princípios da liberdade de circulação de capitais e da não discriminação, consagrados nos artigo 63.º e 18º, respetivamente, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) e o artigo 8º, da Constituição Portuguesa (CRP).
ACÓRDÃO
Os árbitros, José Poças Falcão (Presidente do Tribunal), Gonçalo Estanque e António Pragal Colaço (Árbitros Adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o presente Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I – RELATÓRIO
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A... (doravante designada por “Requerente”), com sede social em ..., ... Paris, em França, titular do número de identificação fiscal português ... (enquanto entidade não residente sujeita a retenção na fonte a título definitivo), representada pela B..., na qualidade de sociedade gestora, com sede na mesma morada, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”).
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O pedido formulado tem por objeto, segundo alega, o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada, em 23 de Dezembro de 2021, contra os atos tributários de retenção na fonte suportados (identificados infra), a título de IRC, que lhe foram efetuados, a título definitivo, sobre dividendos de fonte portuguesa, entre 1 de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2020, no valor de € 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos, atos esses que considera indevidos.
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A título subsidiário, pede o reenvio prejudicial das questões referidas supra e/ou outras que entenda suscitar ao TJUE, nos termos do artigo 267.º do TFUE, se e na medida em que a matéria aqui em causa não seja clara para o Tribunal arbitral, não obstante a jurisprudência do TJUE já produzida em matéria idêntica (processo C-545/19).
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É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada somente por “Requerida”, “ATA” ou “AT)”. O pedido de constituição do tribunal arbitral (TA) foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.
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Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o presidente do Conselho Deontológico do CAAD, por despacho de 13-9-2022, comunicou a designação dos árbitros que iriam constituir o Tribunal Coletivo.
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As partes, devidamente notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar , nos termos do disposto no artigo 11.º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi declarado constituído em 3-10-2022.
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A AT, na sequência e em consequência de notificação para esse efeito, apresentou, oportuna e tempestivamente, Resposta e cópia do processo administrativo instrutor.
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Por despacho de 23-11-2022 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18º, do RJAT, notificadas as partes para alegações finais escritas, de facto e de direito, e fixada data para prolação e notificação da decisão final.
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Dentro do prazo respetivo ambas as partes apresentaram as suas alegações.
O Pedido e sua fundamentação
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Pede o Requerente:
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A anulação do indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada pelo Requerente;
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A consequente anulação dos atos tributários de retenção na fonte, a título de IRC, efetuados, a título definitivo, sobre os dividendos auferidos de fonte portuguesa, nos períodos de 2019 e 2020, no valor global de € 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos);
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A condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43º, da LGT e 61º, do CPPT;
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A título subsidiário, pede o “(...) reenvio prejudicial das questões referidas supra e/ou outras que entenda suscitar ao TJUE, nos termos do artigo 267.º do TFUE, se e na medida em que a matéria aqui em causa não seja clara para o Tribunal arbitral, não obstante a jurisprudência do TJUE já produzida em matéria idêntica (processo C-545/19) (...)”.
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Fundamenta o pedido alegando, em síntese:
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deduziu reclamação graciosa contra os atos tributários de retenção na fonte a título de IRC melhor identificados infra, que lhe foram efetuados, a título definitivo, sobre dividendos de fonte portuguesa, nos exercícios de 2019 e 2020, no valor global de € 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos) – cfr. reclamação graciosa, Documento n.º 2, que se dá por reproduzida para todos os efeitos legais;
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apresentou reclamação graciosa em 23-12-2021, como ato necessário que deveria sempre preceder a impugnação judicial ou arbitral;
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a reclamação foi considerada tacitamente indeferida em 24 de abril de 2022 à luz do disposto no artigo 57º, n.os 1 e 5, da LGT;
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o objeto mediato do presente pedido arbitral são os atos de retenção na fonte de IRC e o objeto imediato é o ato que o Diretor de Serviços de Relações Internacionais deixou de praticar no lapso de tempo de que dispunha e que fez presumir o indeferimento, por razões substantivas, da reclamação graciosa apresentada pelo Requerente;
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O ora Requerente tem residência fiscal em França e é uma pessoa coletiva de direito francês, concretamente um Organismo de Investimento Coletivo qualificado como Fundo de Investimento Alternativo (“AIF”), sob a forma contratual e não societária, supervisionado pela Authorité des Marchés Financiers (“AMF”), conforme declaração emitida por esta entidade, à qual se encontra anexado o Regulamento do Fundo (cfr. Documento n.º 3, junto com o pedido), sendo um sujeito passivo de IRC, não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável e isento de tributação em França e é gerido pela sociedade gestora B... que tem como Banco Depositário o I...
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No período compreendido entre 1 de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2020, em particular, o Requerente auferiu dividendos no montante total (bruto) de € 2.330.076,47 (€ 1.407.368,13 [2019] + € 922.708,34 [2020]), tendo sofrido retenções na fonte, a título definitivo, no montante total de € 582.519,12 (€ 351.842,03 [2019] + € 230.677,09 [2020]), em virtude da aplicação da taxa de 25% prevista no n.º 4 do artigo 87.º do Código do IRC, conforme se apresenta de forma resumida nas tabelas infra.
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Relativamente ao período de 2019, desde maio até setembro, o Requerente auferiu dividendos de fonte portuguesa, no montante total de
€ 1.407.368,13, tendo sofrido retenções na fonte, com caráter definitivo, à taxa de 25%, que ascenderam ao montante total de € 351.842,03, conforme se detalha na seguinte tabela:
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(valores expressos em Euros)
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2019
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Identificação da entidade distribuidora de dividendos
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Data do pagamento
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Guia de Retenção na fonte
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Dividendos
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Retenção da fonte (25%)
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C...
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11-06-2019
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...
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58.932,74
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14.733,19
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D...
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15-05-2019
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...
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633.362,34
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158.340,59
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E...
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09-05-2019
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...
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75.053,90
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18.763,48
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E...
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10-09-2019
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...
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66.393,84
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16.598,46
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F...
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23-05-2019
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...
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243.587,79
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60.896,95
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G...
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30-05-2019
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...
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114.350,37
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28.587,59
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H...
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24-05-2019
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...
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215.687,15
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53.921,79
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Total
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1.407.368,13
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351.842,03
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Relativamente ao período de 2020, em maio e em dezembro, o Requerente auferiu dividendos, de fonte portuguesa, no montante total de
€ 922.708,34, tendo sofrido retenções na fonte, com caráter definitivo, à taxa de 25%, que ascenderam ao montante total de € 230.677,09, conforme se detalha na seguinte tabela:
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(valores expressos em Euros)
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2020
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Identificação da entidade distribuidora de dividendos
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Data do pagamento
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Guia de Retenção na fonte
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Dividendos
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Retenção da fonte (25%)
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D...
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14-05-2020
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...
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453.283,57
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113.320,89
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I...
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15-07-2020
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...
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76.980,81
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19.245,20
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I...
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16-12-2020
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...
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65.105,08
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16.276,27
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H...
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14-05-2020
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...
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327.338,88
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81.834,72
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Total
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922.708,34
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230.677,09
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As retenções na fonte em apreço foram efetuadas pelo Banco Santander enquanto entidade registadora dos títulos em apreço, conforme Declarações emitidas por esta entidade Documento n.º 4, bem como Declarações emitidas pelo Banco Depositário do Requerente - o I... BANK, de que se juntam cópias sob a designação de Documento n.º 5.
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Por não concordar com as retenções na fonte de IRC sofridas em violação dos artigos 63.º e 65.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) (e por consequente violação do disposto no artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e em face da inúmera jurisprudência proferida acerca desta temática, o Requerente pede a anulação daqueles atos tributários e, consequentemente, o reembolso do imposto indevidamente retido;
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O regime previsto no artigo 22.º do EBF, ao qual os OIC residentes em Portugal estão sujeitos, estabelece no seu n.º 3 que “para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do Código do IRS” (sublinhado do Requerente), pelo que estando os dividendos abrangidos pelo artigo 5.º do Código do IRS, os mesmos estão excluídos de tributação nos termos do artigo 22.º do EBF.
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Em concordância com esta exclusão de tributação, o n.º 10 do artigo 22.º do EBF acrescenta que não incide qualquer retenção na fonte de IRC sobre os rendimentos obtidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF.
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Porém, e conforme antecipado acima, o n.º 1 do artigo 22.º do EBF estabelece que o mesmo só se aplica aos “fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional”, excluindo, portanto, do âmbito desta exclusão de tributação / isenção os fundos de investimento que não foram constituídos ao abrigo do direito português – como o Requerente, que é um Fundo de Investimento constituído ao abrigo do direito francês – ainda que atuem de acordo com a legislação comunitária em situação comparável aos fundos residentes (sublinhado do Requerente).
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Ou seja, nos termos da legislação em vigor, Portugal sujeita os dividendos distribuídos por uma entidade residente a tributação quando colocados à disposição de OIC não residentes, aplicando uma taxa definitiva de 25%; diversamente, quando estejam em causa os mesmos dividendos distribuídos a OIC residentes, não é aplicável qualquer imposto sobre os mesmos na esfera do OIC, na medida em que se exclui do apuramento do seu lucro tributável os dividendos independentemente da sua fonte, pagos a OIC residentes.
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Face ao exposto, conclui-se que o regime em apreço estabelece expressamente uma distinção de tratamento para efeitos de tributação entre OIC residentes e não residentes em Portugal – uma vez que, tendencialmente, as entidades constituídas noutro Estado-Membro também não terão domicílio fiscal em Portugal – impondo às primeiras um regime claramente mais favorável, através da concessão de uma exclusão de tributação / isenção, enquanto que os dividendos auferidos pelas segundas são tributados à taxa de 25%.
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Assim, à luz do referido enquadramento legal, o Requerente sofreu retenções na fonte, a título definitivo, à taxa de 25%, as quais ocorreram no estrito cumprimento dos dispositivos legais mencionados, muito embora, tais atos tributários de retenção na fonte se reputem de ilegais pela sua desconformidade com o Direito Europeu, o que implica, desde logo, a sua anulação e consequente reembolso do montante indevidamente retido de € 582.519,12, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.
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Em concreto, o artigo 18.º do TFUE estabelece uma proibição genérica de qualquer discriminação baseada na nacionalidade, princípio que é concretizado, no que respeita à livre circulação de capitais, no artigo 63.º do mesmo Tratado, que, no n.º 1 consagra a liberdade de circulação de capitais e, consequentemente, proíbe “todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros”.
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A distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal a um fundo de investimento não residente em Portugal – como é o caso do Requerente – é passível de ser qualificada como movimento de capitais, na aceção do artigo 63.º do TFUE, entendimento reforçado pelo disposto na Diretiva 88/361/CEE, de 24 de junho de 1988[1].
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Daqui resulta naturalmente que a distribuição de dividendos entre entidades de dois Estados-Membros da União Europeia não pode estar sujeita a quaisquer medidas restritivas, nos termos do artigo 63.º do TFUE, sobretudo, se estas envolverem discriminações baseadas na nacionalidade ou no local do investimento – no caso do Requerente – proibidas pelo artigo 18.º do TFUE.
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Sendo a fiscalidade da competência direta dos Estados-Membros, a alínea a) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE vem esclarecer que “o disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros aplicarem disposições pertinentes de direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao lugar de residência ou ao lugar onde o capital é investido.”
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Contudo, esta previsão é limitada pelo n.º 3 do mesmo artigo, nos termos do qual aquelas medidas e procedimentos internamente aplicados, decorrentes da soberania fiscal dos Estados-Membros, “não devem constituir um meio de discriminação arbitrária nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais”, estabelecida no artigo 63.º do TFUE, devendo as disposições do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE ser alvo de uma aplicação restrita[2] (sublinhado do Requerente).
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Aliás, os OIC residentes e não residentes estão numa situação comparável no que respeita à sujeição a tributação sobre o mesmo facto tributário.
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A jurisprudência arbitral nacional, em concreto, nos processos[3] n.º 90/2019-T, de 23 de julho de 2019, n.º 528/2019-T, de 27 de dezembro de 2019, n.º 549/2019-T, de 20 de abril de 2020, n.º 548/2019-T, de 26 de junho de 2020, n.º 11/2020-T, de 6 de novembro de 2020, n.º 922/2019-T, de 11 de janeiro de 2021, n.º 32/2021-T, de 5 de novembro de 2021, n.º 215/2021-T, de 16 de dezembro de 2021, n.º 133/2021-T, de 21 de março de 2022, n.º 625/2020-T, de 28 de março de 2022, n.º 675/2020-T, de 28 de março de 2022, n.º 547/2019-T, de 24 de abril de 2022, n.º 132/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 593/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 821/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 717/2021-T, de 27 de abril de 2022, n.º 368/2021-T, de 28 de abril de 2022, n.º 566/2020-T, de 2 de maio de 2022, n.º 576/2019-T, de 8 de maio de 2022, n.º 28/2021-T, de 18 de maio de 2022, n.º 623/2021-T, de 24 de maio de 2022, n.º 734/2021-T, de 7 de junho de 2022, relativos todos eles a casos idênticos ao do ora Requerente, considera que o Estado português, “no exercício da sua jurisdição fiscal, opta deliberadamente por diferenciar entre fundos residentes e fundos não residentes, isentando os primeiros da retenção de imposto sobre a distribuição de dividendos e sujeitando à mesma os segundos, colocando-os numa situação comparável, e em seguida tratando-os de forma diferente”, seguindo o sentido e a decisão do Processo C-545-19 – AllianzGI FondsAevn, do TJUE.
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Atendendo ao exposto, mais não resta concluir que o regime contido no artigo 22.º do EBF, por ser contrário às disposições do Direito da União Europeia, ao prever a exclusão de tributação de dividendos de fonte portuguesa distribuídos a OIC residentes, mas não a OIC não residentes, padece de um vício de inconstitucionalidade por violação do disposto no artigo 8.º da CRP.
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Aliás, parece que o próprio Estado Português começa a reconhecer a desconformidade deste regime ao concluir no Relatório de avaliação do regime fiscal dos Organismos de Investimento Coletivo, o qual foi elaborado com o objetivo de avaliar o regime fiscal aplicável aos OIC introduzido pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro (de que se junta cópia sob a designação de Documento n.º 8), que “o atual regime fiscal dos OIC deverá ser mantido”, devendo, contudo, ponderar-se a necessidade de “eliminar eventuais situações discriminatórias de aplicação do regime fiscal aos OIC residentes e aos OIC não residentes (quando comparáveis), mitigando, assim, o risco de violação à liberdade de circulação de capitais prevista no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”.
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Assim, da fundamentação demonstrada, reforçada pelos entendimentos jurisprudenciais apresentados, conclui-se que o regime consagrado no artigo 22.º do EBF, que estabelece uma distinção de tratamento com base na nacionalidade, é contrário ao Direito da União Europeia, ao colidir com os seus princípios basilares relativos à liberdade de circulação de capitais, ao funcionamento do mercado interno e à não discriminação em função da nacionalidade, pelo que deve ser objeto de uma interpretação conforme àquele Direito Comunitário[4], por forma a ser aplicado aos OIC não residentes, comparáveis pela situação em que se encontram, pela sua substância jurídica e económica, e pela atividade que gerou a tributação em sede de IRC – como é o caso do Requerente.
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Atendendo à jurisprudência do STA e do TJUE citada supra, entende o Requerente que, salvo o devido respeito, é por demais evidente que os atos tributários de retenção na fonte aqui em causa e os normativos legais de direito interno nos quais tais atos se baseiam são violadores dos artigos 56.º e 63.º do TFUE.
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Caso o Tribunal entenda que subsiste alguma dúvida interpretativa sobre estas disposições do TFUE – o que se coloca em tese e sem se conceder –, o Requerente peticiona o reenvio prejudicial para o TJUE, nos termos do artigo 267.º do TFUE, na medida em que está em causa a interpretação dos artigos 56.º e 63.º do TFUE e a conformidade da legislação interna portuguesa com estes preceitos.
Resposta da AT
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A Autoridade Tributária Aduaneira (AT), notificada para apresentar Resposta, exerceu esse direito, alegando e concluindo em síntese:
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AT encontra-se subordinada ao princípio da legalidade, pelo que não poderia aplicar de forma direta e automática as decisões do TJUE proferidas sobre casos concretos que não relevam do direito nacional, para mais não estando em causa situações materialmente idênticas, e em que a aplicação correta do direito comunitário não se revela tão evidente (Ato Claro) que não deixe margem para qualquer dúvida razoável quanto ao modo como deve ser resolvida a questão suscitada.
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O regime fiscal aplicável aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional, embora consagre a isenção dos dividendos distribuídos por sociedades residentes, não afasta a tributação desses rendimentos por outras formas, seja por tributação autónoma, seja em imposto do selo, quando os mesmos rendimentos integram o valor líquido destes organismos, logo, não pode afirmar-se que, em substância, as situações em que se encontram aqueles OIC e os Fundos de Investimentos constituídos e estabelecidos noutros Estados-Membros que auferem dividendos com fonte em Portugal, sejam objetivamente comparáveis.
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Assim, não pode concluir-se que o regime fiscal dos OIC – que não se contém em exclusivo no n.º 3 do artigo 22.º do EBF – não esteja em conformidade com as obrigações que decorrem do artigo 63.º do TFUE.´
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A retenção na fonte efetuada sobre os dividendos pagos à Requerente respeita o disposto na legislação nacional e na convenção para evitar a dupla tributação, devendo ser mantida na ordem jurídica.
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Convoca, a sufragar a sua posição, os argumentos da decisão que lhe foi favorável, proferida no processo do CAAD nº 96/2019-T, não transitada em julgado, designadamente, citando o teor dessa decisão: Tem sido jurisprudência comunitária pacífica não resultar do Direito da União Europeia, para os sujeitos passivos não residentes em Portugal e sem estabelecimento estável em território português, mas residentes num Estado-Membro da União Europeia, qualquer direito a uma tributação igual à dos residentes. Prevê, pelo contrário, o TFUE que a proibição de todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros não prejudica os Estados- Membros de aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao lugar de residência (n.º 1 do artigo 63º e alínea a) do nº 1 do artigo 65.º). A jurisprudência do Tribunal de Justiça revela, em termos genéricos, que o uso da residência como elemento de conexão, bem como a diferenciação fiscal entre sujeitos passivos residentes e não residentes, tanto na legislação interna dos Estados como nas Convenções sobre Dupla Tributação, por não contrariar as liberdades de circulação, nem consubstanciar uma discriminação contrária aos Tratados Europeus, em virtude de os residentes e os não residentes não se encontrarem, em geral, em situações comparáveis e assentar numa diferença objetiva relevante entre os sujeitos passivos, é admissível. Nessa medida, o tratamento diferenciado entre residentes e não residentes não constituí em si mesmo qualquer discriminação proibida pelo n.º 1 do artigo 63.º do TFUE ( o grifado é da Requerente). Ainda, por outro lado, que as situações de residentes e não residentes sejam comparáveis, a discriminação resultante de um tratamento diferenciado pode ser neutralizada pelos mecanismos previstos nas Convenções, em especial, extrapolando para o caso concreto, o crédito do imposto referido no n.º 2 do artigo 10º da referida Convenção entre Portugal e a República Federal Alemã. No entanto, "quid juris" caso a legislação do país da residência se opuser ao crédito do imposto, "máxime" por isentar total ou parcialmente os rendimentos tributados no país da fonte, caso em que a neutralização não é possível?(grifado da Requerente).Nos termos do Acórdão do STA de 28/11/2012, no Processo n.º 0694/12, em caso de crédito do imposto sobre dupla tributação internacional, a eventual isenção de tributação dos dividendos no país da residência, com o consequente efeito impeditivo do crédito do imposto previsto nas convenções, não poderia ser oponível ao país da fonte, pois este, ao definir a obrigação de retenção na fonte, se limitaria a fazer a aplicação do seu direito interno. Essa posição seria contrariada pelo Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário do STA, de 09/07/2014, Processo n.º 01435/12, que, em especial, declararia ser de anular a retenção na fonte efetuada pelo substituto tributário a entidade não residente, se ficou provado que aquela retenção, consubstanciada em maior tributação de entidade não residente, não pode ser neutralizada, em concreto, por via da Convenção celebrada entre os Estados para evitar a dupla tributação. Assim, apenas no caso de o imposto retido na fonte nos termos da legislação nacional poder ser imputado no imposto devido noutro Estado-Membro até ao montante da diferença de tratamento decorrente da legislação nacional, é que a diferença de tratamento entre os dividendos distribuídos a sociedades estabelecidas noutros Estados-Membros e os dividendos distribuídos às sociedades residentes se pode considerar neutralizada (no mesmo sentido podem ver-se os acórdãos do STA, de 21/01/2015, Proc. n.º 01160/13, de 26/11/2014, Proc. n.º 01877/13, de 12/11/2014, Proc. n.º 461/14, de 29/10/2014, Proc. n.º 01502/12, de 21/05/2014, Proc. n.º 01192/13, de 14/05/2014, Proc. n.º 01319/13, de 09/04/2014, Proc . n.º 01318/13, de 18/12/2013, Proc. n.º 0568/13 e de 27/11/2013, Proc. n.º 0654/ 13). Não se vislumbra que a posição acima enunciada da jurisprudência possa, no essencial, vir a ser alterada . Alega a Requerente a impossibilidade de recuperar a título de crédito de imposto por dupla tributação internacional o imposto sobre o rendimento suportado ou pago no estrangeiro, que resultaria da isenção subjetiva dos fundos de investiment o, ainda em vigor, na República Federal Alemã, no exercício de 2016. Esse argumento, associado ao também invocado pela Requerente e que é incontestável, que a distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal à ora Requerente é passível de ser qualificada como movimento de capital na aceção do artigo 63.º do TFUE e da própria Diretiva 88/361/CEE, de 24/6/88, não é suficiente para fundamentar a procedência do presente pedido de pronúncia arbitral pelos motivos que se passam a expor.A isenção de imposto sobre o rendimento que aproveitava à Requerente no exercício de 2016 resultava do seu enquadramento pela legislação alemã aplicável como entidade transparente. Como entidade transparente, a Requerente não podia ser objeto de tributação separada, sendo os seus lucros tributados na esfera dos sócios.Em resultado dessa transparência, o investidor nos fundos ou nas demais compropriedades indivisas de valores mobiliários era tratado da mesma forma que o investidor direto, solução que apenas seria alterada a partir do exercício de 2017, que eliminaria parcialmente o regime da transparência. Consequentemente, os fundos estavam isentos do imposto sobre o rendimento, de acordo com solução idêntica à redação originária do n.º 1 do artigo 19.º do EBF, aprovado pelo artigo 1.º do DL n.º 215/89, de 1/07, anterior à dada pelo artigo único da Lei n.º 4/90, de 17/02.A tributação tinha lugar apenas na esfera dos investidores e não dos fundos, ao contrário do que viria a estabelecer a Lei n.º 4/90. A referida Lei, na verdade, aboliu o regime anterior da transparência, passando os fundos de investimento, nos termos do nº 1 do artigo 22.º do EBF, na redação anterior à dada pelo DL n.º 7 / 2015, a ser tributados autonomamente ou por retenção na fonte como de pessoas singulares se tratassem, ficando os participantes dispensados de retenção na fonte ou isentos, respetivamente conforme exercessem ou não a título principal uma atividade empresarial, industrial ou agrícola, com a consequente impossibilidade, como reconheceria o preâmbulo desse Decreto-Lei, de acederem aos benefícios das convenções sobre dupla tributação internacional. No regime da transparência vigente da República Federal Alemã até ao termo do exercício de 2016, os participantes eram tributados aquando da distribuição real ou presumida dos rendimentos dos fundos ou da venda das unidades de participação, não sendo essa tributação precedida por qualquer tributação dos fundos. Tem sido administrativa e doutrinariamente entendido que os fundos transparentes carecem de personalidade jurídico-tributária, ainda que ficcionada. Nessa medida, a isenção dos fundos de investimento tem sido tradicionalmente entendida como uma não sujeição, com a consequente impossibilidade de acederem aos benefícios das convenções sobre dupla tributação internacional (o que coloca em causa a devolução de 10% da retenção ao abrigo da CDT Portugal/Alemanha}.Em conformidade, segundo a AT, o facto de os fundos transparentes se localizarem em determinado país e aí serem administrados por sociedade gestora ou entidade depositária não lhes permite invocar, salvo quando sejam fiscalmente pessoas residentes, a aplicação das convenções celebradas por esse país (nesse sentido, o n.º 2 da Circular n.º 6/2009, de 6/04, da DGCI, que mantém toda a atualidade). Essa é a solução seguida tradicionalmente pela doutrina (Alberto Xavier, "Direito Internacional", Coimbra, 1993, pág. 117). A aplicação das convenções deve, assim, efetuar-se relativamente a cada titular de unidades de participação, ao qual os rendimentos se reputam, real ou presumidamente diretamente atribuídos, sendo irrelevante a entidade pela qual transitavam. Em conformidade com esse entendimento, nos termos da parte final do nº 3 da Convenção, o direito ao crédito do imposto é exercido, pelos titulares das unidades de participação aquando da distribuição a estes dos respetivos rendimentos. A isenção da Requerente de imposto sobre o rendimento na Alemanha não colide, assim, com o direito ao crédito do imposto dos titulares das unidades de participação. Caso o direito ao crédito do imposto não possa ser exercido, por os participantes não estarem sujeitos ou, estando sujeitos, estarem isentos de imposto sobre o rendimento ("maxime, em virtude da existência entre a sociedade distribuidora dos dividendos e os participantes no fundo de uma relação de "participation exemption"), cabia a estes - e não aos fundos transparentes -, em sede de reclamação ou impugnação, invocar e provar os pressupostos de violação do princípio da não discriminação, nomeadamente a impossibilidade da dedução do imposto na República Federal da Alemanha, por exemplo, através de declaração passada pelas respetivas autoridades fiscais, já que tal impossibilidade não resulta da isenção consagrada na Secção 1, parágrafo 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Sociedades Alemão - "German Corporate Incarne Tax Act" - e da secção 11 parágrafo 1.2 do Código Fiscal de Investimento Alemão ("German lnvestment Tax Act" ) (estes e demais grifados são da autoria da Requerente). Face ao exposto, tendo em consideração que, não estamos perante qualquer violação do direito comunitário e/ou do direito constitucional, no que respeita à retenção na fonte dos dividendos auferidos pela Requerente, determina-se a improcedência do presente pedido arbitral.» (destaques nossos)
Saneamento
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O tribunal arbitral é materialmente competente, o processo o próprio e as partes legítimas, capazes e devidamente representadas.
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Não enferma o processo de nulidades, nem se mostram existir exceções, alegadas ou de conhecimento oficioso, que importe apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Matéria de facto
Factos relevantes provados
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Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].
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Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.
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A esta luz, considera o Tribunal PROVADO:
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O Requerente (ulterior e abreviadamente designado por “Requerente” ou “Fundo”) é um Organismo de Investimento Coletivo, com residência fiscal em França, qualificado como Fundo de Investimento Alternativo (AIF) sob a forma contratual e não societária, supervisionado em França pela Authorité des Marchés Financiers (AMF) e é sujeito passivo de IRC, não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável;
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Deduziu o Fundo reclamação graciosa contra os atos tributários de retenção na fonte a título de IRC (objeto do pedido e documentados) que lhe foram efetuados, a título definitivo, sobre dividendos de fonte portuguesa, nos exercícios de 2019 e 2020, no valor global de € 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos);
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Essa reclamação graciosa foi considerada tacitamente indeferida em 24 de abril de 2022 à luz do disposto no artigo 57º, n.os 1 e 5, da LGT;
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O Fundo é gerido pela sociedade gestora B... que tem como Banco Depositário o I... BANK.
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No âmbito da sua atividade, o Requerente, nos exercícios de 2019 e 2020, na qualidade de acionista de sociedades residentes em Portugal, auferiu dividendos sujeitos a tributação em Portugal, por se tratar do Estado da fonte de obtenção dos mesmos, no âmbito do regime legal da substituição tributária.
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No período compreendido entre 1 de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2020, em particular, o Requerente auferiu dividendos no montante total (bruto) de € 2.330.076,47 (€ 1.407.368,13 [2019] + € 922.708,34 [2020]), tendo sofrido retenções na fonte, a título definitivo, no montante total de € 582.519,12 (€ 351.842,03 [2019] + € 230.677,09 [2020]), em virtude da aplicação da taxa de 25% prevista no n.º 4 do artigo 87.º do Código do IRC, conforme se apresenta de forma resumida nas tabelas infra.
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Relativamente ao período de 2019, desde maio até setembro, o Requerente auferiu dividendos de fonte portuguesa, no montante total de € 1.407.368,13, tendo sofrido retenções na fonte, com caráter definitivo, à taxa de 25%, que ascenderam ao montante total de € 351.842,03, conforme se detalha na seguinte tabela:
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(valores expressos em Euros)
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2019
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Identificação da entidade distribuidora de dividendos
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Data do pagamento
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Guia de Retenção na fonte
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Dividendos
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Retenção da fonte (25%)
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C...
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11-06-2019
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...
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58.932,74
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14.733,19
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D...
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15-05-2019
|
...
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633.362,34
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158.340,59
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E...
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09-05-2019
|
...
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75.053,90
|
18.763,48
|
E...
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10-09-2019
|
...
|
66.393,84
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16.598,46
|
F...
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23-05-2019
|
...
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243.587,79
|
60.896,95
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G...
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30-05-2019
|
...
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114.350,37
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28.587,59
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H...
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24-05-2019
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...
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215.687,15
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53.921,79
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Total
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1.407.368,13
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351.842,03
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Relativamente ao período de 2020, em maio e em dezembro, o Requerente auferiu dividendos de fonte portuguesa, no montante total de € 922.708,34, tendo sofrido retenções na fonte, com caráter definitivo, à taxa de 25%, que ascenderam ao montante total de € 230.677,09, conforme se detalha na seguinte tabela:
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(valores expressos em Euros)
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2020
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Identificação da entidade distribuidora de dividendos
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Data do pagamento
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Guia de Retenção na fonte
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Dividendos
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Retenção da fonte (25%)
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D...
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14-05-2020
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...
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453.283,57
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113.320,89
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I...
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15-07-2020
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...
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76.980,81
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19.245,20
|
I...
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16-12-2020
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...
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65.105,08
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16.276,27
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H...
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14-05-2020
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...
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327.338,88
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81.834,72
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Total
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922.708,34
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230.677,09
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As retenções na fonte em apreço foram efetuadas pelo Banco Santander enquanto entidade registadora dos títulos em apreço e os dividendos foram pagos juntos do I... Bank (banco depositário do Requerente).
Motivação quanto à matéria de facto
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Não há outros factos essenciais provados ou não provados e, no tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), nos factos não contestados pela Requerida e no teor dos documentos juntos aos autos pelas Partes, incluindo a cópia do processo administrativo instrutor junta pela AT.
O DIREITO
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Assinale-se preliminarmente que, conforme tem assinalado a Jurisprudência, [cfr, v. g., o Acórdão do STA, de 14-3-2018, no Proc nº 0716/13/2ª Secção], “(...) é jurisprudência corrente e pacífica que o Tribunal não tem de apreciar ou conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes tenham produzido. Isto porque uma coisa são as questões submetidas ao tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa. Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando assim o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes (...)”.
Apreciando e decidindo o mérito do pedido:
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Por não concordar com as retenções na fonte de IRC sofridas, segundo alega, “(...) em violação dos artigos 63.º e 65.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) (e por consequente violação do disposto no artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e em face da inúmera jurisprudência proferida acerca desta temática, o Requerente pede a anulação daqueles atos tributários e, consequentemente, o reembolso do imposto indevidamente retido (...)”
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Em síntese entende o Requerente que o benefício fiscal previsto no artigo 22º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), que visa a não tributação da generalidade dos rendimentos auferidos por Organismos de Investimento Coletivo (OIC) residentes em Portugal, é bem mais favorável que a tributação conferida às entidades não residentes e sem estabelecimento estável em território português, pelo que a não aplicação de um regime de exclusão de tributação aos não residentes semelhante ao previsto naquela disposição do EBF aplicável aos residentes consubstancia uma discriminação injustificada em função da nacionalidade (proibida, por isso, pelo artigo 18.º do TFUE) e, concomitantemente, em função do lugar da residência.
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Ou seja e mais concretamente: na medida em que coloca as sociedades residentes em Portugal, que aufiram rendimentos de capitais junto de outras sociedades portuguesas, numa situação de vantagem relativamente às sociedades residentes noutros Estados-Membros da União Europeia que efetuem investimentos semelhantes, a discriminação assinalada é (…) proibida pelo artigo 63.º do TFUE, constituindo uma restrição à liberdade de circulação de capitais.
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A reclamação graciosa que, oportuna e tempestivamente apresentou, foi tacitamente indeferida e tal indeferimento legitimou o uso da presente via arbitral.
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Com a apresentação do presente pedido de pronúncia arbitral, a Requerente visa a apreciação da legalidade dos atos de retenção na fonte identificados, no valor total de EUR 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos), atos esses que considera indevidos pelas razões supra alegadas, respeitante a IRC retido na fonte no período compreendido entre 2019 e 2020, atos que pretende ver anulados.
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A Requerida defende, pelo contrário, que a diferença de tratamento dos OIC residentes e não residentes não é incompatível com o Direito da UE, porquanto o regime fiscal aplicável aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional, embora consagre a isenção dos dividendos distribuídos por sociedades residentes, não afasta a tributação desses rendimentos por outras formas, seja por tributação autónoma, seja em imposto do selo, quando os mesmos rendimentos integram o valor líquido destes organismos e, consequentemente, não pode afirmar-se que, em substância, as situações em que se encontram aqueles OIC e os Fundos de Investimentos constituídos e estabelecidos noutros Estados-Membros que auferem dividendos com fonte em Portugal, sejam objetivamente comparáveis e concluir-se que o regime fiscal dos OIC – que não se contém em exclusivo no n.º 3 do artigo 22.º do EBF – não esteja em conformidade com as obrigações que decorrem do artigo 63.º do TFUE.
Vejamos:
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O artigo 22º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 31 de janeiro, em vigor à data a que reportam os atos tributários em crise, estabelece o seguinte:
“Artigo 22.º
Organismos de Investimento Coletivo
1 – São tributados em IRC, nos termos previstos neste artigo, os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional.
2 – O lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC referidos no número anterior corresponde ao resultado líquido do exercício, apurado de acordo com as normas contabilísticas legalmente aplicáveis às entidades referidas no número anterior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3 – Para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do Código do IRS, exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada em portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.º-A do Código do IRC, bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para as entidades referidas no n.º 1.
4 – Os prejuízos fiscais apurados em determinado período de tributação nos termos do disposto nos números anteriores são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos 12 períodos de tributação posteriores, aplicando-se o disposto no n.º 2 do artigo 52.º do Código do IRC.
5 – Sobre a matéria coletável correspondente ao lucro tributável deduzido dos prejuízos fiscais, tal como apurado nos termos dos números anteriores, aplica -se a taxa geral prevista no n.º 1 do artigo 87.º do Código do IRC.
6 – As entidades referidas no n.º 1 estão isentas de derrama municipal e derrama estadual.
7 – Às fusões, cisões ou subscrições em espécie entre as entidades referidas no n.º 1, incluindo as que não sejam dotadas de personalidade jurídica, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 73.º, 74.º, 76.º e 78.º do Código do IRC, sendo aplicável às subscrições em espécie o regime das entradas de ativos previsto no n.º 3 do artigo 73.º do referido Código.
8 – As taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC têm aplicação, com as necessárias adaptações, no presente regime.
9 – O IRC incidente sobre os rendimentos das entidades a que se aplique o presente regime é devido por cada período de tributação, o qual coincide com o ano civil, podendo, no entanto, ser inferior a um ano civil:
a) No ano do início da atividade, em que é constituído pelo período decorrido entre a data em que se inicia a atividade e o fim do ano civil;
b) No ano da cessação da atividade, em que é constituído pelo período decorrido entre o início do ano civil e a data da cessação da atividade.
10 – Não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC relativamente aos rendimentos obtidos pelos sujeitos passivos referidos no n.º 1.
11 – A liquidação de IRC é efetuada através da declaração de rendimentos a que se refere o artigo 120.º do Código do IRC, aplicando -se, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 89.º, no n.º 1 do artigo 90.º, no artigo 99.º e nos artigos 101.º a 103.º do referido Código.
12 – O pagamento do imposto deve ser efetuado até ao último dia do prazo fixado para o envio da declaração de rendimentos, aplicando -se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 109.º a 113.º e 116.º do Código do IRC.
13 – As entidades referidas no n.º 1 estão ainda sujeitas, com as necessárias adaptações, às obrigações previstas nos artigos 117.º a 123.º, 125.º e 128.º a 130.º do Código do IRC.
14 – O disposto no n.º 7 aplica -se às operações aí mencionadas que envolvam entidades com sede, direção efetiva ou domicílio em território português, noutro Estado membro da União Europeia ou, ainda, no Espaço Económico Europeu, neste último caso desde que exista obrigação de cooperação administrativa no domínio do intercâmbio de informações e da assistência à cobrança equivalente à estabelecida na União Europeia.
15 – As entidades gestoras de sociedades ou fundos referidos no n.º 1 são solidariamente responsáveis pelas dívidas de imposto das sociedades ou fundos cuja gestão lhes caiba.
16 – No caso de entidades referidas no n.º 1 divididas em compartimentos patrimoniais autónomos, as regras previstas no presente artigo são aplicáveis, com as necessárias adaptações, a cada um dos referidos compartimentos, sendo-lhes ainda aplicável o disposto no Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de janeiro”.
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O regime previsto no artigo 22.º do EBF é um regime consideravelmente mais favorável que o regime geral de tributação em IRC, pois, nos termos do seu n.º 3 é referido que “para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.ºdo Código do IRS, exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada em portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.º-A do Código do IRC, bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para as entidades referidas no n.º 1” e isenção de derramas estadual e municipal (n.º 6).
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O n.º 1 do artigo 22.º do EBF estabelece que “são tributados em IRC, nos termos previstos neste artigo, os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional”, pelo que exclui do âmbito do regime aí previsto as sociedades como a Requerente, que não foram constituídas de acordo com a legislação nacional.
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Por outro lado, é manifesto que dos n.ºs 1 e 3 do artigo 22.º do EBF e do n.º 4 do artigo 87.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 94.º do CIRC, os OIC’s residentes em Portugal e os OIC’s residentes noutro Estado-Membro estão sujeitos, quanto aos dividendos que lhes são distribuídos por sociedades residentes em Portugal, a um tratamento distinto, pois apenas os dividendos distribuídos por aquelas a OIC’s não residentes, estão sujeitos a IRC através de retenção na fonte.
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Neste âmbito, cumpre realçar que de harmonia com o disposto no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, “(...)as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático (...)”.
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Também a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo tem decidido pacificamente no sentido da primazia do direito internacional convencional sobre o direito interno, como pode ver-se pelos acórdãos de 01-07-2015, proferido no processo n.º 0188/15, 17-06-2015, proferido no processo n.º 0187/15, e de 25-06-2015, proferido no processo n.º 0464/15, em que se entendeu que “nos termos do art. 8.º, n.º 2, da CRP, as normas de convenção internacional, quando regularmente adoptadas pelo Estado Português e publicadas na forma legal, prevalecem sobre o direito interno infraconstitucional, em tudo que seja conflituante com este, motivo por que os tribunais devem recusar a aplicação de lei ou norma jurídica que viole tratado internacional a que Portugal se tenha vinculado (…)”.[5]
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Ora, como vimos, a Requerente defende que a norma do artigo 22.º, n.º 1, do EBF é incompatível com a proibição de discriminações injustificadas materializada no tratado sobre o funcionamento da UE - liberdade de circulação de capitais e liberdade de estabelecimento.
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E como se escreve no Acórdão Arbitral prolatado no âmbito do Processo nº 11/2020-T de 06-11-2020, “como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do TFUE (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões conexas com o Direito da União Europeia (neste sentido, podem ver-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2593). Quando se suscita uma questão de interpretação e aplicação de Direito da União Europeia, os tribunais nacionais devem equacionar a colocação da questão ao TJUE através de reenvio prejudicial. No entanto, quando a lei comunitária seja clara e quando já haja um precedente na jurisprudência do TJUE não é necessário proceder a essa consulta, como o TJUE concluiu no Acórdão de 06-10-1982, Caso Cilfit, Proc. 283/81. Até mesmo quando as questões em apreço não sejam estritamente idênticas (doutrina do acto aclarado) e quando a correcta aplicação do Direito da União Europeia seja tão óbvia que não deixe campo para qualquer dúvida razoável no que toca à forma de resolver a questão de Direito da União Europeia suscitada (doutrina do acto claro) (idem, n.º 14)”.
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A Requerida, parece defender que a não tributação dos OIC’s residentes em sede de IRC é compensada pela tributação trimestral destes em Imposto do Selo, nos termos da verba 29 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), e a possibilidade de ser aplicável aos OIC´s residentes tributação autónoma, designadamente a prevista no n.º 11 do artigo 88.º do Código do IRC.
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No que concerne à referida tributação em Imposto do Selo, ocorre apenas quando “os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário sejam constituídos e operem de acordo com a legislação nacional” (artigo 4.º, n.º 7, do Código do Imposto do Selo), pelo que se trata, de facto, de uma tributação que não se aplica aos OIC´s não residentes.
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Realce-se que esta tributação incide sobre o valor líquido global dos OIC´s residentes, à taxa de 0,0025%, por cada trimestre, quando invistam exclusivamente em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e, nos restantes casos, em que a base tributável poderá incluir os dividendos distribuídos, à taxa 0,0125%, por cada trimestre.
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É manifesto, porém, que esta tributação em Imposto do Selo que poderá atingir, no máximo, a taxa de 0,05% anuais (na soma dos quatro trimestres), apesar de incidir sobre o valor líquido global dos OIC´s, não se pode considerar equivalente à que resulta da tributação em IRC por retenção na fonte.
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Por isso, é de concluir que do artigo 22.º do EBF resulta uma tributação agravada dos OIC´s não residentes em relação aos OIC´s residentes, que não é totalmente compensada pela tributação destes em Imposto do Selo, que é a tributação que apenas onera os residentes.
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Para além disso, a legislação nacional não prevê qualquer mecanismo ulterior que permita atenuar ou eliminar a carga fiscal a que os rendimentos auferidos por um fundo de investimento ou por uma sociedade de investimento não residente estão sujeitos.
Da violação da proibição de restrições à circulação de capitais (artigo 63.º do TFUE)
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Dispõe artigo 63.º do TFUE (ex-artigo 56.º do TCE):
“1. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros. 2. No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos pagamentos entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros”.
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E, nos termos do previsto no artigo 65.º do TFUE (ex-artigo 58.º do TCE), “1. O disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros: a) Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido; b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública. 2. O disposto no presente capítulo não prejudica a possibilidade de aplicação de restrições ao direito de estabelecimento que sejam compatíveis com os Tratados. 3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º”
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Por sua vez, assinala-se no acórdão do TJUE de 10-04-2014, proferido no processo n.º C-190/12, aplicável com as necessárias adaptações, que: “(...) 38. Importa recordar, antes de mais, que, embora a fiscalidade direta seja da competência dos Estados Membros, estes devem, todavia, exercer essa competência no respeito do direito da União (acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e C 338/11 a C 347/11, n.º 14 e jurisprudência referida). 39. A este respeito, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que as medidas proibidas pelo artigo 63.º, n.º 1, TFUE, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são de molde a dissuadir os não residentes de investirem num Estado Membro ou a dissuadir os residentes desse Estado Membro de investirem noutros Estados (acórdãos de 18 de dezembro de 2007, A, C-101/05, Colet., p. I-11531, n.º 40; de 10 de fevereiro de 2011, Haribo Lakritzen Hans Riegel e Österreichische Salinen, C-436/08 e C-437/08, Colet., p. I-305, n.º 50; e Santander Asset Management SGIIC e o., já referido, n.º 15). 40. No caso vertente, a isenção fiscal prevista pela legislação fiscal nacional em causa no processo principal era concedida unicamente aos fundos de investimento que exerciam a sua atividade em conformidade com a Lei sobre os fundos de investimento. 41. Resulta igualmente da decisão de reenvio que, nos termos da legislação nacional em causa no processo principal, os fundos de investimento só beneficiam da isenção na condição de a sua sede se situar em território polaco. Por conseguinte, os dividendos pagos a fundos de investimento não residentes não podiam beneficiar, apenas devido ao local de estabelecimento desses fundos, da isenção da retenção na fonte, mesmo que esses dividendos pudessem eventualmente ser objeto de uma redução da taxa de tributação ao abrigo de uma convenção preventiva da dupla tributação. 42. Ora, uma tal diferença de tratamento fiscal dos dividendos entre os fundos de investimento residentes e os fundos de investimento não residentes é suscetível de dissuadir, por um lado, os fundos de investimento estabelecidos num país terceiro de adquirirem participações em sociedades estabelecidas na Polónia e, por outro, os investidores que residem nesse Estado Membro de adquirirem participações em fundos de investimento não residentes (v., neste sentido, acórdão Santander Asset Management SGIIC e o., já referido, n.º 17). 43. Daqui resulta que uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal é de molde a conduzir a uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63.º TFUE”.
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Ora resulta óbvio desta decisão do TJUE (no caso, relativo à distribuição de dividendos) que no caso de aquela (distribuição) ser efetuada por sociedades residentes em Portugal a OIC´s não residentes tal se englobará no conceito de movimentos de capitais, para efeitos do artigo 63.º do TFUE.
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Esta jurisprudência do TJUE é necessária e obviamente aplicável à situação sub juditio, pois, em face do artigo 22.º, n.º 1, do EBF, o tratamento privilegiado não se aplica à Requerente exclusivamente por a sua constituição não ter sido feita segundo a legislação nacional.
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Por outro lado, as sociedades constituídas noutro Estado Membro serão tendencialmente não residentes em Portugal (como sucede no caso em apreço), pelo que este artigo 22.º, n.º 1, impondo-lhes um regime de tributação consideravelmente mais gravoso do que o aplicável às sociedades constituídas segundo a legislação nacional, tem potencialidade para “dissuadir os não residentes de investirem num Estado-Membro”, desde logo porque têm de enfrentar a concorrência das sociedades que usufruem de situação de vantagem fiscal, que ficam em melhores condições para comercialização dos seus produtos de investimento.
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É certo que a alínea a) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE acima transcrito, permite que os Estados-Membros apliquem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido, tendo em conta a sua soberania fiscal, desde que verificado o n.º 3 do mesmo artigo.
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Mas, como se refere no n.º 3 daquele artigo 65.º, “as medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º”.
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Ora, no caso em apreço, sendo tributados em Portugal os OIC´s não residentes, a sua situação é comparável à dos OIC´s nacionais pelo que devem ser objeto de tratamento equivalente ao aplicável aos OIC’s residentes.
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Como se defendeu na decisão arbitral proferida no processo n.º 90/2019-T (em matéria de dividendos), “embora não estejam sempre numa situação comparável, residentes e não residentes são colocados nessa posição a partir do momento em que o Estado-Membro que se considere, unilateralmente ou por convenção, opte por tributar os acionistas não residentes de maneira menos favorável que os residentes, relativamente aos dividendos que uns e outros recebam de sociedades residentes. Especialmente relevante, em sede das liberdades de estabelecimento e de circulação de capitais, é o facto de o tratamento fiscal menos favorável dos não residentes os dissuadir, na qualidade de acionistas, de investirem no Estado da residência das empresas distribuidoras de dividendos, e constituir, igualmente, um obstáculo à obtenção de capital no exterior por parte dessas empresas”.
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Para além disso, no que concerne à alínea b) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE, não se pode entender que o tratamento desfavorável dos OIC´s a não residentes possa ser justificado por uma razão imperiosa de interesse geral ou por risco de evasão fiscal, que só é relevante se estiverem em causa expedientes artificiais, que tenham como objetivo primacial evitar o pagamento de imposto normalmente devido, sendo que as restrições não podem exceder o necessário.
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Mas se dúvidas restassem relativamente à questão objeto dos autos, elas foram dissipadas pela relativamente recente decisão do TJUE, proferida em 17-03-2022, no processo C 545/19, em sede de reenvio prejudicial promovido no âmbito do processo arbitral do CAAD nº 93/2019-T, publicada em
https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf;jsessionid=AED083FA8FA02CE95E7517CE8B347E6D?text=&docid=256021&pageIndex=0&doclang=pt&mode=req&dir=&occ=first&part=1&cid=422856
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Aí decidiu o TJUE que “(...) o artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção(...)”.
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Concluindo: são ilegais os atos de indeferimento (tácito) da reclamação graciosa e os atos de retenção objeto do pedido.
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Assinale-se ainda, en passant, que a Jurisprudência Arbitral, de forma praticamente unânime, nalguns casos mesmo antes do Acórdão do TJUE de 17-3-2022 citado, defendia a invalidade/ilegalidade das retenções pelas razões discriminatórias apontadas – Cfr., v. g., além das que foram anteriormente assinaladas [6] as decisões arbitrais[7] nos processos do CAAD nºs 132/2021-T, 368/2021-T, 549/2019-T, 817/2021-T e 135/2021-T, neste último caso, proferida por Tribunal Coletivo presidido pelo mesmo árbitro que tem idênticas funções neste processo e que se segue, por razões óbvias, muito de perto.
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Registe-se finalmente, na linha do exposto, o Relatório[8] de Avaliação do Regime Fiscal dos OIC, visando a manutenção do respetivo regime jurídico mas com a eliminação de “(...) eventuais situações discriminatórias de aplicação do regime fiscal aos OIC residentes e aos OIC não residentes (quando comparáveis), mitigando, assim, o risco de violação à liberdade de circulação de capitais prevista no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”.
Reenvio prejudicial
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As questões objeto dos autos são absolutamente claras e foram já objeto de abundantes decisões na Jurisprudência, incluindo, em sede de reenvio prejudicial, a sobredita decisão do TJUE de 17-3-2022, não justificando o pedido de reenvio cautelarmente apresentado pela Requerente.
Juros indemnizatórios
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Peticiona a Requerente o pagamento de “(...) juros indemnizatórios que se mostrem devidos nos termos do artigo 43.º da LGT e do artigo 61.º do CPPT (...)”
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O artigo 43.º da LGT prevê que são devidos juros indemnizatórios “(...)quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido(...)”.
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Acontece que, uma vez que não pode a AT pôr em causa as leis que está incumbida de aplicar, no caso dos autos não pode ser imputado aos serviços qualquer erro: a retenção na fonte e o subsequente indeferimento, ainda que tácito, da reclamação conformaram-se estritamente com o Direito que cabia à AT aplicar.
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Na verdade, não competia à Autoridade Tributária e Aduaneira avaliar a conformidade das normas internas com as dos Tratados da União (nem com as orientações interpretativas do TJUE) e não podia, assim, no âmbito da sua atividade, deixar de aplicar uma norma com o fundamento na sua desconformidade com o Tratado da União Europeia. Tanto mais que, embora muito minoritariamente, alguns Tribunais entenderam então não ser claro se o diferente regime de tributação aplicável em Portugal a OIC era, ou não, desconforme com o Direito da União.
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Foi na constatação de que havia situações em que a estrita obediência à lei originava excessos de tributação que o legislador de 2019 (Lei n.º 9/2019, de 1 de Fevereiro) introduziu no n.º 3 do artigo 43.º da LGT a sua nova alínea d), prevendo o pagamento de juros indemnizatórios também “(...) em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução (...)”.
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Uma vez que, ao contrário das situações anteriormente previstas nas diferentes alíneas desse n.º 3, em que há sempre alguma censura à atuação da AT, no caso da alínea d) a censura só pode ser dirigida ao legislador – como acontece no presente caso, em que a norma legislativa em que se fundou a liquidação da prestação tributária foi julgada desconforme com Direito de hierarquia superior – compreende-se que só a partir do trânsito em julgado das decisões aí referidas estejam a cargo da AT os juros indemnizatórios, sem prejuízo, naturalmente, dos mecanismos próprios disponíveis na ordem jurídica para a responsabilização do legislador.
III - DECISÃO
Pelo exposto, decide este Tribunal:
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Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado;
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Anular o ato de indeferimento (tácito) da reclamação graciosa identificada, conforme pedido;
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Anular os atos tributários de retenção na fonte, a título de IRC, que foram efetuados a título definitivo, sobre os dividendos auferidos de fonte portuguesa, nos períodos de 2019 e 2020, no valor global de € 582.519,12 (quinhentos e oitenta e dois mil, quinhentos e dezanove euros e doze cêntimos), conforme pedido;
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Condenar a requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira, no reembolso dos valores das retenções indevidas, com juros indemnizatórios desde a data do trânsito em julgado deste acórdão;
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Indeferir o pedido de reenvio prejudicial formulado pela Requerente e
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Condenar a Requerida no pagamento das custas deste processo atento o seu decaimento.
Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 582.519,12.
Custas: Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas em EUR 8.874,00, a cargo da Requerida conforme decidido supra, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.
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Notifique-se, incluindo o Ministério Público.
Lisboa, 13 de março de 2023
O Tribunal Arbitral,
José Poças Falcão
(Presidente e Relator)
Gonçalo Estanque
(Árbitro Adjunto)
António Pragal Colaço
(Árbitro Adjunto)
[1] O TJUE tem vindo a reconhecer e a acolher sucessivamente o valor indicativo, mas não exaustivo, da Diretiva n.º 88/361/CEE, em particular do número IV do seu Anexo I, que estabelece a nomenclatura dos movimentos de capitais, onde se incluem as operações sobre ações e, portanto, as operações de distribuição de dividendos, vide Acórdão de 16 de março de 1999, Trummer e Mayer, C-222/97.
[2] Conforme jurisprudência do TJUE citada no âmbito do Processo n.º 90/2019-T, de 23 de julho de 2019, do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”):“Dada a linguagem prudente nelas incorporada, resulta claro que as exceções do artigo 65.º, nº 1, alínea a) e do n.º 3, do TFUE devem ser aplicadas somente em circunstâncias raras e especiais.”
[4] Sem necessidade de reenvio prejudicial de interpretação previsto no artigo 267.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do TFUE, na medida em que a jurisprudência nacional arbitral tem reconhecido diretamente a primazia do Direito da União Europeia sobre o direito interno e que é de seguir a orientação interpretativa acolhida pelo TJUE nos diversos processos que versam sobre a matéria, nomeadamente no Processo n.º 545/19-C, entendendo que se está claramente diante de uma restrição não indispensável nem justificada da liberdade de circulação de capitais consagrada no artigo 63.º do TFUE.
[5] Neste sentido, vide GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª edição, página 261.
[6] Processos do CAAD, n.º 90/2019-T, de 23 de julho de 2019, n.º 528/2019-T, de 27 de dezembro de 2019, n.º 549/2019-T, de 20 de abril de 2020, n.º 548/2019-T, de 26 de junho de 2020, n.º 11/2020-T, de 6 de novembro de 2020, n.º 922/2019-T, de 11 de janeiro de 2021, n.º 32/2021-T, de 5 de novembro de 2021, n.º 215/2021-T, de 16 de dezembro de 2021, n.º 133/2021-T, de 21 de março de 2022, n.º 625/2020-T, de 28 de março de 2022, n.º 675/2020-T, de 28 de março de 2022, n.º 547/2019-T, de 24 de abril de 2022, n.º 132/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 593/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 821/2021-T, de 26 de abril de 2022, n.º 717/2021-T, de 27 de abril de 2022, n.º 368/2021-T, de 28 de abril de 2022, n.º 566/2020-T, de 2 de maio de 2022, n.º 576/2019-T, de 8 de maio de 2022, n.º 28/2021-T, de 18 de maio de 2022, n.º 623/2021-T, de 24 de maio de 2022, n.º 734/2021-T, de 7 de junho de 2022
[7] Todos as decisões dos Tribunais constituídos no âmbito do CAAD estão publicadas no respetivo site: www.caad.org.pt
[8] Cfr Doc 8, junto pelo Requerente.
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