Sumário
I - O conceito de estabelecimento estável que no nº 1 do artigo 2.º do Decreto Legislativo Regional nº 21/2016/A, de 17/10, define o universo subjetivo de aplicação da Derrama Regional dos Açores abrange qualquer instalação fixa através da qual uma sociedade residente no continente exerce a sua atividade naquela Região Autónoma, independentemente da sua qualificação jurídica prévia como sucursal, representação permanente ou agência.
II - Para esse efeito, uma torre de controlo aéreo, ou um centro de controlo aéreo, que prestam serviços de navegação aérea, nos termos do Regulamento de Execução nº 1035/2011 de 17/10/2011 da Comissão, e outra legislação comunitária e internacional aplicáveis, são estabelecimentos estáveis.
DECISÃO ARBITRAL
Os Árbitros Guilherme W. d´Oliveira Martins, Vera Figueiredo e António Lima Guerreiro, designados para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I – Relatório
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Requerente
A..., E. P. E. (A...), pessoa coletiva e contribuinte fiscal n.º..., com sede no concelho de Lisboa.
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Requerida
Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
3-Tramitação e constituição do Tribunal Arbitral
O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 25/7/22 e aceite no mesmo dia, nos termos regulamentares aplicáveis
A 29/7/2022, esse pedido seria, pelo CAAD, notificado à AT.
A Requerente indicou, na Petição Inicial (PI), para árbitra a jurista Vera Figueiredo.
A 4/8/22, a Requerida indicou como suas representantes processuais as juristas ... e ...,
A 15/9/22, a Requerida indicou como árbitro o jurista António Barros Lima Guerreiro, que, no mesmo dia, aceitou o encargo.
Despacho de 25/10/2022 do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designaria Árbitro Presidente o Professor Doutor Guilherme Waldemar Oliveira Martins.
A 7/11/2022, a Requerida juntou o despacho de designação do jurista que anteriormente indicara.
A 15/11/2022; o Presidente do CAAD, nos termos do nº 7 do artigo 11º do RJAT, comunicaria às partes a constituição do Tribunal Arbitral.
No mesmo dia, o árbitro presidente, nos termos do artigo 17º do RJAT, notificaria a Requerida para apresentar Resposta e enviar o Processo Administrativo no prazo de 30 dias.
A 19/12/2022, a Requerida apresentou Resposta.
A 20/12/2022, a Requerida enviou o PA.
A 16/01/2023, por estar em causa mera questão de direito, o Tribunal Arbitral considerou dispensável a reunião a que se refere o artigo 18º do RJAT e determinou o prosseguimento do processo até à sua finalização, no prazo legal.
4 – Pedido
Está em causa a legalidade do indeferimento a 13/4/2022, pela Chefe de Divisão, por delegação, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (DSIR do recurso hierárquico da reclamação graciosa de IRC, deduzida nos termos do artigo 131º do CPPT, autuada com o nº ...2020..., em que a Requerente cumulou os pedidos de anulação parcial das autoliquidações do imposto dos exercícios de 2018 e 2019, nos montantes respetivamente de € 6.873,33 e € 4.484,02, acrescidos de juros indemnizatórios que entende devidos , nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT.
5 – A) Posição da Requerente
A Requerente fundamenta a sua posição no nº 1 do artigo 2º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, de 17/10, cujo artigo 1º criou a Derrama Regional para vigorar na Região Autónoma dos Açores e aprovou o respetivo regime jurídico.
De acordo com a norma referida em primeiro lugar, a Derrama Regional incide às taxas constantes da tabela anexa sobre a parte do lucro tributável superior a € 1 500 000,00 sujeito e não isento de IRC, apurado por sujeitos passivos residentes na Região Autónoma dos Açores, bem como por sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável na Região Autónoma dos Açores, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.
Fundamentou-se a criação dessa derrama regional, segundo o preâmbulo desse Decreto Legislativo Regional, no direito de a Assembleia Regional da Região Autónoma dos Açores legislar em matérias do seu poder tributário próprio e de adaptar o sistema fiscal dessa Região ao sistema fiscal nacional, designadamente em matéria de incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes, nos termos da Lei de Finanças das Regiões Autónomas e do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
No exercício dessa faculdade, a Assembleia Regional entenderia, assim, adaptar a derrama estadual prevista no artigo 87.º-A do Código do IRC (“CIRC”), na redação então em vigor, à Região Autónoma dos Açores sob a forma de derrama regional.
Por via da adaptação referida, o legislador regional estabeleceria uma redução de 20 % nas taxas da derrama regional face às atualmente aplicadas em sede de derrama estadual, tendo por fundamento a identidade entre aquelas derramas e o IRC, bem como a redução de taxa deste último na Região Autónoma dos Açores ao abrigo do art 5.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/99/A, de 20/1
Contudo, o sistema informático de processamento da declaração modelo 22 apenas permite a autoliquidação da derrama à taxa de 3%, sem proceder para esse efeito à repartição do lucro tributável pelas diferentes circunscrições onde a Requerente opera, ao arrepio das leis nacionais e regionais, nomeadamente o referido Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A.
Segundo a Requerente, a recusa do (in)deferimento seria suportada exclusivamente no argumento de que “a A... não é residente nos Açores”, como se a receita da atividade desenvolvida através das instalações detidas nessa Região Autónoma não fosse receita dos órgãos regionais, suscetível de aproveitar da referida redução da taxa de 20 % por comparação com a taxa da derrama estadual que seria aplicável caso o Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A não tivesse sido aprovado.
5- B) Posição da Requerida.
Reconhece a Requerida, na Informação I 2022..., proc. 063/21, de 28/2/2022 da Divisão de Administração da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas(DSIRC) em que se baseou o despacho impugnado, que aos residentes em território português que possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica própria, em mais de uma circunscrição, pode ser aplicável uma redução da taxa geral de IRC relativamente às receitas geradas na Região Autónoma dos Açores ,
Essa redução não seria extensiva, no entanto, à Derrama Regional, já que o nº 1 do artigo 2º do Decreto Legislativo Regional a limita aos sujeitos passivos de IRC sediados na Região Autónoma dos Açores e àqueles que, embora não sediados na Região Autónoma dos Açores desenvolvam nesta Região a sua atividade através de estabelecimento estável .
Deste modo, ao contrário da redução de taxa prevista no artigo 5º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/99/A, que abrangeria todas as sucursais, delegações, agências escritórios, instalações ou qualquer forma de representação permanente em mais de uma região, a redução da taxa prevista no Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, abrangeria, não todos e quaisquer rendimentos imputáveis às instalações dos sujeitos passivos localizados na Região Autónoma dos Açores, mas apenas os imputáveis àquelas instalações que se revestissem das características de representação permanente, o que não seria o caso das torres de controlo aéreo e centros de controlo aéreo detidos pela A... na Região Autónoma dos Açores.
II. Fundamentação de facto
1-Factos Provados
1-A Requerente A..., E. P. E., doravante referida também por A..., é, nos termos do nº 1 do artigo 1º dos seus Estatutos que integram o Anexo I do DL nº 404/98, de 18/12, renumerados pelo artigo 4º do DL nº 74/2003, de 16/4, uma pessoa coletiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, tendo por objeto a prestação do serviço de apoio à gestão do tráfego aéreo nos aeroportos onde está instalada.
2-Segundo o nº 2 daquele artigo 1º, tem sede em Lisboa, no ... de Lisboa, e pode estabelecer e encerrar qualquer tipo de representação ou instalações onde e quando for necessário ou conveniente à prossecução dos seus fins, em qualquer ponto do território nacional ou no estrangeiro.
3- Está instalada, na Região Autónoma dos Açores, nos aeroportos de Ponta Delgada, Horta e Flores, onde dispõe de torres de controlo aéreo, e no aeroporto de Santa Maria, onde de dispõe de um centro de tráfego aéreo.
4-Segundo o nº 1 do artigo 2º desses Estatutos, a A... rege-se pelas normas legais que lhe sejam especialmente aplicáveis, integrantes desses Estatutos e respetivos regulamentos de execução, observando nos casos omissos o atualmente disposto no DL nº 133/2013, de 3/10, e demais legislação aplicável ao sector empresarial do Estado.
5-Ainda segundo essa norma, nos casos omissos aplica-se à atividade da A..., o direito privado, salvo relativamente a atos de autoridade ou cuja natureza implique o recurso a normas de direito público.
6-A Requerente está integrada no grupo dos contribuintes de elevada relevância económica e fiscal, nos termos previstos no artigo 68.º-B da LGT, cujo acompanhamento permanente e gestão tributária competem à Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC), de acordo com o disposto no Anexo I do Despacho da Diretora-Geral da AT n.º 977/2019, de 28/1, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 19, Parte C, de 28/172019.
7-É objeto principal da atividade da A..., nos termos do nº 2 do artigo 2º desses Estatutos, o serviço público de navegação aérea para apoio à aviação civil, assegurando a gestão, exploração e desenvolvimento dos sistemas de navegação aérea, nele se compreendendo os serviços de gestão de tráfego aéreo e atividades com eles conexas e pelos mesmos exigidos, em cumprimento das normas de convenções internacionais ou de organizações internacionais de aviação civil de que Portugal seja respetivamente subscritor ou Estado membro, nomeadamente através de controladores do tráfego que exercem a sua atividade nos aeroportos onde a B... se encontra instalada .
8-Acessoriamente, segundo essa norma, a referida empresa explora atividades e efetuar operações comerciais e financeiras relacionadas direta ou indiretamente, no todo ou em parte, com o objeto principal ou que sejam suscetíveis de facilitar ou favorecer a sua realização.
9-Segundo o nº 3 daquele artigo 3º dos Estatutos da A..., o Governo pode cometer à empresa especiais obrigações de serviço público, de que resultam reduções e isenções de taxas, bem como o exercício de tarefas e atividades estruturalmente deficitárias.
10- A 13/8/2019 e 20/8/2020, por transmissão eletrónica de dados, submeteu as Declarações modelo 22 de IRC relativas aos exercícios respetivamente de 2018 e 2019, tendo apurado no primeiro exercício um lucro tributável de € 6,319,675,42 e no segundo exercício um lucro tributável de € 4.595,130,14, como consta do Campo 778 do Quadro 07.
11- A primeira Declaração deu origem à Liquidação 2019 ..., de 29/7/2019, corrigida pela Liquidação 2019 ... .
12- A segunda Declaração deu origem à Liquidação 2020..., de 7/7/2020, corrigida pela Liquidação 2020..., de 26/8/2020.
13- - A Requerente, por desenvolver a sua atividade em diferentes circunscrições do Estado português, está sujeita à Derrama Estadual regulada no artigo 87º- A do CIRC, à Derrama Regional em vigor na Região Autónoma da Madeira (Decreto Legislativo Regional 14/2010/M, de 5/8) e à Derrama Regional em vigor na Região Autónoma dos Açores(Decreto Legislativo Regional 21/2016/A, de 17/10).
14- Aquando da entrega da declaração modelo 22 dos exercícios de 2018 e 2019, a Requerente procurou sem sucesso que o Campo 373 do Quadro 10, onde deveriam ser inscritas as Derramas Estadual e Regionais incidentes sobre a parte do lucro, tributável superior e € 1.500.000,00, auferida por sujeitos passivos residentes em território português que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e por não residentes com estabelecimento estável na Região Autónoma dos Açores, refletisse a parte do lucro tributável imputável à Região Autónoma dos Açores cuja taxa é 20% menor.
15- Na impossibilidade de o fazer, por a tal se opor o sistema informático de processamento da declaração modelo 22 adotado pela administração fiscal e perante as consequências contraordenacionais do incumprimento do dever previsto no artigo 120º do CIRC, optaria a Requerente por submeter as declarações nas datas anteriormente mencionadas, deixando, assim, de beneficiar da redução da taxa de 20 % que, de outro modo, seria aplicada aos rendimentos gerados na Região Autónoma dos Açores no cálculo da respetiva derrama regional, tendo apurado os seguintes valores.
Exercício de 2019
Exercício de 2020
16- A 22/9/2020, a A..., nos termos do nº 1 do artigo 131º do CPPT, reclamaria graciosamente dessas autoliquidações junto do Serviço de Finanças Lisboa ..., tendo essa reclamação sido autuada com o nº ...2020... .
17- A 25/9/2020, o Serviço de Finanças Lisboa ... remeteria o processo para a UGC, para decisão.
18- A 27/11/2020, o Chefe de Divisão do Serviço Central da UGC indeferiria a reclamação.
19- A 12/1/2021, a Requerente recorreria hierarquicamente desse indeferimento para o Ministro das Finanças.
20- A 13/4/2022, a Chefe de Divisão em substituição, por delegação, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (DSIRC), indeferiria o recurso hierárquico.
Não se consideram não provados quaisquer factos relevantes para a decisão.
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Fundamentação da prova dos factos
Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do nº 1º do artigo 29.º do RJAT). Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. n.º 1 do artigo 511.º do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi dessa alínea e) do n.º 1 do artigo 29.ºdo RJAT). Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
III - Questão decidenda
Está em causa se a expressão “estabelecimento estável”; referida no nº 1 do artigo 2º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, cujo artigo 1º criou a derrama regional para vigorar na Região Autónoma dos Açores e aprovou o respetivo regime jurídico, abrange todas as instalações de carácter fixo através das quais os residentes noutra circunscrição desenvolvem a sua atividade na Região Autónoma dos Açores, como as partes dos aeroportos onde estão instaladas as torres de controlo aéreo e os centros de controlo aéreo, ou, entre essas instalações, apenas compreende aquelas que exercem uma função de representação permanente da empresa.
IV- Decisão
A Derrama Estadual, imposto acessório do IRC, foi criada pelo artigo 2º da Lei nº 12-A/2010, de 30/6, que integrou um conjunto de medidas adicionais de consolidação orçamental visando reforçar e acelerar a redução de défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Recai a uma taxa progressiva que, no primeiro escalão, é de 3 % sobre a parte do lucro tributável superior a € 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos residentes em território português que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e por não residentes com estabelecimento estável em território português.
No exercício do poder de adaptação do sistema fiscal nacional, o artigo 3º do Decreto Legislativo Regional nº 14/2010/M, de 14/10/2010, determinou a aplicação na Região Autónoma da Madeira de uma Derrama Regional com uma taxa proporcional de 2,5 % estabelecida no artigo 4º.
O artigo 2º do Decreto Legislativo Regional nº 5-A/2014/M, de 23 /7, através de um nº 2 aditado artigo 4º do Decreto Legislativo Regional nº 14/2010/M, transformaria essa taxa proporcional em progressiva nos termos seguintes:
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Quando superior a € 7 500 000 e até € 35 000 000, o lucro tributável passaria a ser dividido em duas partes: uma, igual a € 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual ao lucro tributável que exceda € 7500 000, à qual se aplica a taxa de 5 %;
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Quando superior a € 35 000 000, o lucro tributável passaria a ser dividido em três partes: uma, igual a € 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual a € 27 500 000, à qual se aplica a taxa de 5 % e outra igual ao lucro tributável que exceda € 35 000 000, à qual se aplica a taxa de 7 %.
Essa alteração foi a execução da medida 31 do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro da Região Autónoma da Madeira que previa o agravamento da derrama regional até às taxas aplicáveis à derrama estadual.
A Derrama Regional, não cumulável com a Derrama Estadual nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, apenas seria criada na Região Autónoma dos Açores pelo artigo 1.º deste diploma, o qual, segundo o nº 1 daquele artigo 5.º, entrou em vigor a 18/10/2016.
Como é sabido, é receita de cada circunscrição, no caso, da Região Autónoma dos Açores, a gerada através das instalações fixas, tenham estas a natureza de sucursais, agências ou outras, localizadas nesse território, de sujeitos passivos residentes noutras circunscrições, que, nesse caso, poderiam ser o continente ou a Região Autónoma da Madeira.
Com efeito, segundo o artigo 26º da Lei de Finanças das Regiões Autónomas (Lei Orgânica nº 2/2013, de 2/9:
«1 - Constitui receita de cada região autónoma o imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC):
a) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável numa única região;
b) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica própria em mais de uma circunscrição, nos termos referidos no número seguinte;
c) Retido, a título definitivo, pelos rendimentos gerados em cada circunscrição, relativamente às pessoas coletivas ou equiparadas que não tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território nacional.
2 - Relativamente ao imposto referido na alínea b) do número anterior, as receitas de cada circunscrição são determinadas pela proporção entre o volume anual de negócios do exercício correspondente às instalações situadas em cada região autónoma e o volume anual total de negócios do exercício.
3 - Para efeitos do disposto no presente artigo, entende-se por volume anual de negócios o valor das transmissões de bens e prestações de serviços, com exclusão do imposto sobre o valor acrescentado (IVA).»
Por outro lado, reza o nº 2 do artigo 59º que, no âmbito do seu poder de adaptação às regiões autónomas do sistema fiscal nacional a que se refere o anterior nº 1, «As Assembleias Legislativas das regiões autónomas podem ainda, nos termos da lei e tendo em conta a situação financeira e orçamental da região autónoma, diminuir as taxas nacionais do IRS, do IRC e do IVA, até ao limite de 30 /prct. e dos impostos especiais de consumo, de acordo com a legislação em vigor».
A Requerida não põe em causa a aplicabilidade dessas taxas reduzidas aos rendimentos obtidos pela Requerente através das torres de controlo aéreo e eventualmente do centro de tráfego aéreo da A... na Região Autónoma dos Açores, mas sim da Derrama Regional.
Fundamenta a sua posição em que, ao exercer esse poder de adaptação ao sistema fiscal nacional no nº 1 do artigo 2º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, excluiu as instalações localizadas nesse território, que não tivessem as características de estabelecimento estável como seriam a parte dos aeroportos onde funcionam as torres de controlo e os centros de controlo do tráfego aéreo, que não são sucursais, agências nem exercem funções de representação permanente da empresa.
A situação em causa não é idêntica àquelas sobre as quais se pronunciaram as Decisões Arbitrais nºs 742/2019-T, 187/2020- T e 836/2021-T, em que estava em causa a dependência da aplicação das taxas constantes da tabela do n.º 1 do artigo 2.º desse Decreto Legislativo Regional em vez das taxas referidas no artigo 87.º-A do CIRC às sociedades tributadas pelo regime especial de tributação de grupos de sociedades (“RETGS”), segundo os artigos 69º a 71º desse Código, à condição de essas sociedades integrarem um grupo de sociedades para efeitos do RETGS , com sede ou direção efetiva na Região Autónoma dos Açores.
Também tal situação não é idêntica à apreciada nas Decisões Arbitrais nºs 610/2014-T, 611/2014-T e 612/2014- T que se reportam a factos anteriores ao início da Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, quando a derrama estadual se aplicava, segundo essas Decisões Arbitrais, à Região Autónoma dos Açores.
Ainda que se considere , no entanto, o conceito de estabelecimento estável utilizado no nº 1 do artigo 2º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A não abranger, por mais estrito, todas as entidades abrangidas pela alínea b) do nº 1 do artigo 26º da Lei Orgânica nº 2/2013, o que é, pelo menos, discutível, a verdade é que cabem claramente no seu âmbito as partes do aeroporto destinadas ao controlo do tráfego aéreo, através dos serviços de navegação aérea regulados no Regulamento de Execução nº 1035/2011 da de 17/10/2011 da Comissão, e outra legislação comunitária e internacional aplicáveis ao tráfego aéreo.
Na falta de disposição legal em sentido diferente da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, quando a incidência da derrama dependa da localização das instalações do sujeito passivo, deve ser considerado o conceito de estabelecimento estável previsto no CIRC (Manuela Duro Teixeira, “A determinação do lucro tributável dos estabelecimentos estáveis de não residentes”, Coimbra, 2007, pg. 20), correspondente ao artigo 5º da Convenção modelo da OCDE, e que foi largamente reproduzido no artigo 5º do CIRC. Assim, nos termos desse artigo 5º do CIRC:
Segundo esse artigo 5º do CIRC:
«1 — Considera-se estabelecimento estável qualquer instalação fixa através da qual seja exercida uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.
2 — Incluem-se na noção de estabelecimento estável, desde que satisfeitas as condições estipuladas no número anterior:
a) Um local de direção;
b) Uma sucursal;
c) Um escritório;
d) Uma fábrica;
e) Uma oficina;
f) Uma mina, um poço de petróleo ou de gás, uma pedreira ou qualquer outro local de extração de recursos naturais situado em território português.
3 — Um local ou um estaleiro de construção, de instalação ou de montagem, as actividades de coordenação, fiscalização e supervisão em conexão com os mesmos ou as instalações, plataformas ou barcos de perfuração utilizados para a prospecção ou exploração de recursos naturais só constituem um estabelecimento estável se a sua duração e a duração da obra ou da actividade exceder seis meses. (…)
8 - Com a ressalva do disposto no n.º 3, a expressão «estabelecimento estável» não compreende as atividades de caráter preparatório ou auxiliar a seguir exemplificadas:
a) As instalações utilizadas unicamente para armazenar, expor ou entregar mercadorias pertencentes à empresa;
b) Um depósito de mercadorias pertencentes à empresa mantido unicamente para as armazenar, expor ou entregar;
c) Um depósito de mercadorias pertencentes à empresa mantido unicamente para serem transformadas por outra empresa;
d) Uma instalação fixa mantida unicamente para comprar mercadorias ou reunir informações para a empresa;
e) Uma instalação fixa mantida unicamente para exercer, para a empresa, qualquer outra atividade de caráter preparatório ou auxiliar;
f) Uma instalação fixa mantida unicamente para o exercício de qualquer combinação das atividades referidas nas alíneas a) a e), desde que a atividade de conjunto da instalação fixa resultante desta combinação seja de caráter preparatório ou auxiliar.».[1]
Refira-se a propósito do conceito de estabelecimento estável, a doutrina emanada da OCDE, nos Comentários ao artigo 5º do Convenção Modelo[2]:
«Paragraph 1 gives a general definition of the term “permanent establishment” which brings out its essential characteristics of a permanent establishment in the sense of the Convention, i.e. a distinct “situs”, a “fixed place of business”. The paragraph defines the term “permanent establishment” as a fixed place of business, through which the business of an enterprise is wholly or partly carried on. This definition, therefore, contains the following conditions:
− the existence of a “place of business”, i.e. a facility such as premises or, in certain instances, machinery or equipment;
− this place of business must be “fixed”, i.e. it must be established at a distinct place with a certain degree of permanence;
− the carrying on of the business of the enterprise through this fixed place of business. This means usually that persons who, in one way or another, are dependent on the enterprise (personnel) conduct the business of the enterprise in the State in which the fixed place is situated.»
As partes superiores dos aeroportos, como as torres de controlo, destinadas à prestação de serviços de controlo aéreo, em geral por controladores de tráfego aéreo, visando uma adequada gestão da navegação aérea e a evitação de acidentes, são, assim, estabelecimentos estáveis para efeitos da incidência da derrama regional dos Açores: são instalações permanentes e não temporárias, onde é exercida com autonomia, com meios materiais e humanos próprios, uma atividade principal de prestação de serviços da A... .
O facto de as torres de controlo e os centros de controlo de tráfego não serem sucursais ou agências da A..., nem exercerem funções de representação desta, não prejudica a qualificação dessas instalações fixas como estabelecimento estável da A..., já que assim o não exige o nº 1 do artigo 5º do CIRC.
Uma interpretação restritiva desse conceito de estabelecimento estável não é, aliás, compatível com o objetivo da Derrama Regional dos Açores expresso na seguinte passagem do preâmbulo do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A , de acordo com a qual “a redução das taxas da derrama afigura-se como um instrumento de política fiscal para promoção da economia e reforço dos meios dos agentes económicos na concretização de investimento e criação de emprego, em benefício do desenvolvimento sustentável da Região Autónoma dos Açores”.
Trata-se, assim, com a Derrama Regional dos Açores de promover a economia de uma região periférica, independentemente da circunscrição a que pertençam os operadores económicos que desenvolvam uma atividade económica nessa Região Autónoma e não da consagração de um benefício estatutário exclusivamente reservado aos residentes com sede na região autónoma e aos estabelecimentos estáveis de não residentes, excluindo os demais residentes em território nacional com estabelecimento estável nessa mesma região autónoma, que, apesar da porventura escassa dimensão, não poderia deixar de ser considerado discriminatório perante o direito comunitário da concorrência aplicável.
Termos em que o Tribunal Arbitral decide:
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Anular o indeferimento do recurso hierárquico da reclamação graciosa n.º ...2020..., datado de 13/4/2022, da autoria do Chefe de Divisão, por delegação, da DSIRC e consequentemente parte das autoliquidações do imposto dos exercícios de 2018 e 2019, nos montantes respetivamente de € 6.873,33 e € 4.484,02;
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Reconhecer o direito da Requerente a juros indemnizatórios nos termos do nº 1 do artigo 43º da LTG.
V - VALOR
Fixa-se o valor do processo em € 11.357.35, nos termos do disposto na alínea b) do nº . 1 do artigoº 97º-A do CPPT, aplicável ex vi as alíneas a) e b) do artigoº 29º do RJAT e do n.º 2 do artigoº 3º do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.
VI – CUSTAS
Fixa-se em € 6.000,00 (seis mil euros) o valor das custas, a cargo da Requerente, nos termos do nº 2 do artigo 5º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela II anexa.
Lisboa, 6 de março de 2023
O Árbitro Presidente
(Guilherme W. d´Oliveira Martins)
O Árbitro Adjunto,
(Vera Figueiredo)
O Árbitro Adjunto,
(António Lima Guerreiro)
[1] Redação dada pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, Republicação da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, em vigor a 31-12-2019 e a 31-12-2020, respetivamente.