SUMÁRIO
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A violação do direito de audição consubstancia preterição de formalidade essencial geradora de invalidade do ato, tendo a Requerente requerido diligencia de prova de audição de uma testemunha, compete à AT caso entenda não ser de efetuar a diligência requerida, pronunciar-se expressamente sobre o pedido da sua realização, se não antes, na decisão final sob pena de não o fazendo, dever considerar-se preterido o direito de audição prévia.
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O dever de fundamentação exige que um destinatário normal, colocado na posição do requerente, face ao teor expresso do ato, possa apreender o percurso lógico-jurídico trilhado pela autoridade recorrida para chegar a tal decisão, por forma a poder determinar-se, conscientemente, no sentido da impugnação ou não impugnação. A fundamentação deve consistir, por isso, numa exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão. As razões de facto e os fundamentos de direito da decisão devem ser percetíveis, claras e congruentes para o sujeito passivo. Resulta que a fundamentação contida nos atos foram suficientes para a Requerente, e consideram-se suficientes se colocados na posição de um destinatário normal.
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Compete à Requerente o ónus probandi da atividade por si desenvolvida, ou seja, demonstrar porque declarou que a sua atividade é enquadrável no CAE n.º 1519 - Outros prestadores de serviços - e não se não enquadra no seu CAE Principal previamente declarada à AT. Em contraposição, competia à AT comprovar que a prestação de serviços em analise, se enquadra no CAE Principal da Requerente conforme resultou da correção efetuada.
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Atendendo ao âmbito de incidência real do IRS sobre uma multiplicidade de atividades exercidas pelos sujeitos passivos deste imposto, o legislador na tabela a que alude o artigo 151.º do CIRS optou pela definição das atividades em sentido amplo, pelo que o enquadramento das atividades do Requerente terá de ser analisado caso a caso.
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DECISÃO ARBITRAL
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Relatório
A... e. B..., (doravante a Requerente ou Sujeito passivo) contribuintes respetivamente n.º ... e ..., residentes na Rua ..., ..., ..., ..., ...-... ..., vieram, em 16-06-2022, ao abrigo do artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto‐Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), e do artigo 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral e apresentar pedido de pronúncia arbitral (“PPA") contra o ato de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) relativo ao ano de 2019, com o imposto a pagar no valor de € 3.887,60, peticionando a respetiva declaração de ilegalidade e anulação, bem como o reembolso dos montantes indevidamente pagos, ao abrigo do artigo 43.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT” ou “Requerida”).
A Requerente fundamenta a sua pretensão, em síntese, nos seguintes termos:
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O ato de liquidação ora posto em crise emergiu de correção ao rendimento global, no montante de € 12.480,00 (doze mil quatrocentos e oitenta euros), em virtude de a AT entender que parte dos rendimentos declarados pela Requerente B..., no montante de €31.200,00, resultaram do exercício de uma atividade prevista no art.º 151.º do CIRS e, por isso, a determinação do rendimento coletável se obteria pela aplicação do coeficiente de 0,75 e não do coeficiente 0,35, como foi declarado na Declaração de IRS apresentada tempestivamente pelos ora Requerentes.
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Alega a Requerente a existência da violação do direito de audição previa. Sustenta que foram notificados do projeto de decisão da Reclamação Graciosa por si apresentada, que exerceram o seu direito de audição tendo requerido a audição de uma testemunha, a qual poderia cabal e efetivamente esclarecer qual a atividade exercida pela Requerente B..., ao serviço do Município de ... e que originou os rendimento de €31.200,00, que a AT alega ter resultado do exercício da atividade de Professora.
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Sustenta que ao rejeitar em absoluto, sem qualquer fundamentação, a audição da testemunha arrolada pelos Requerentes a AT incorreu em violação do direito de audição dos Requerentes e violação do princípio do inquisitório, inquinando o ato de liquidação de manifesto vício, suscetível de determinar a sua anulabilidade.
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Alega a Requerente a falta de fundamentação da liquidação, por entender que no ato de liquidação, a AT não esclareceu, cabalmente, em que elementos se baseou para efetuar as correções ao IRS dos Requerentes. A AT não esclareceu, nem sequer indicou, quais os elementos em que se baseou para ter procedido à Liquidação de IRS, nos termos em que o fez. Na Demonstração de Liquidação de IRS, não foi, assim, deduzida qualquer fundamentação, quer de facto quer de direito, que justifique o montante de imposto apurado.
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Sobre a natureza dos serviços prestados, sustenta a Requerente que a AT apenas no projeto de decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, tentou completar a informação em falta – que deveria ter constado da Liquidação – informando que os rendimentos declarados pela Requerente B... se depreendem ser resultantes da atividade de Professora.
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Defende que a conclusão extraída pela AT é manifestamente contraditória com o objeto do contrato celebrado pela Requerente B..., com o Município de ... . Isto porque, a atividade de Professora em nada se relaciona com a contratada atividade de “desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde”.
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Com efeito, a Requerente B... coordenava e organizava todo o trabalho dos professores das diversas atividades desportivas que o Município de ... disponibiliza aos seus munícipes. Designadamente, através da conceção e organização das atividades a lecionar pelos professores. Bem como a coordenação e elaboração dos horários dos professores. E, ainda, a gestão das infraestruturas e equipamentos desportivos necessárias para o efeito. Ou seja, a Requerente desenvolvia a sua atividade num nível hierárquico superior ao dos professores, respondendo diretamente à Vereadora com o Pelouro do Desporto.
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Defende a Requerente que não exerceu a atividade de professora, não tendo interagido, de qualquer forma, com os utentes das aulas que, reitera-se, eram lecionadas pelos professores cujo trabalho lhe cabia coordenar e gerir.
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Defende a Requerente sobre a atividade secundária da Requerente B..., que tem o CAE 1519, a AT entendeu que se encontra prevista na lista anexa ao art.º 151.º do CIRS.
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Neste sentido, sustenta encontram-se abrangidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 31.º do Código do IRS os rendimentos auferidos no exercício por conta própria de atividades enquadradas na alínea b) do n.º 1 do artigo 3º do mesmo Código, independentemente da atividade estar classificada de acordo com a Classificação Portuguesa de Atividades Económicas do Instituto Nacional de Estatísticas, ou de acordo com os códigos mencionados na Tabela de atividades aprovada pela Portaria n.º 1011/2001, de 21 de agosto.
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Portanto, a partir de 2015, o legislador fiscal passou a prever expressamente que o coeficiente de 0,75 apenas pode ser aplicado às atividades profissionais especificamente previstas na tabela do artigo 151.º do Código do IRS.
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Este normativo não inclui o Código “1519 – Outros prestadores de serviços” e demais prestações de serviços de atividades profissionais não especificamente previstas na referida tabela, aplicando-se o coeficiente 0,35, conforme resulta do artigo 31.º, n.º 1, alínea c), do Código do IRS.
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Assim, e presumindo que o legislador fiscal soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (tal como resulta do disposto no n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável ex vi alínea d) do artigo 2.º da Lei Geral Tributária), não se pode senão concluir que o coeficiente de 0,75 só pode ser aplicado às atividades concreta e indubitavelmente previstas naquela tabela, aplicando-se o coeficiente residual de 0,35 às atividades aí não especificamente previstas, visto que este coeficiente não evidencia uma atividade profissional de prestação de serviços específica.
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Conclui a Requerente que a interpretação das normas fiscais convocáveis para o efeito, e a interpretação veiculada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, sempre se deverá considerar a Requerente como desenvolvendo uma atividade que se enquadra na categoria residual prevista no código “1519- Outros prestadores de serviços” da Tabela de atividades anexa, ficando, por conseguinte, sujeita ao coeficiente de tributação de 0,35, nos termos do artigo 151.º do Código do IRS, e da alínea c) do n.º 1 do artigo 31.º do Código do IRS.
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Pelo que a Declaração de IRS, do ano de 2019, apresentada pela Requerente se encontra inequivocamente correta.
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Conclui a Requerente, pela anulação da Liquidação ora em crise, por violação do art.º 31.º do Código do IRS.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 14-06-2022, e automaticamente notificado à AT.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou o ora signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 04-08-2022, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 24-08-2022, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alíneas a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio.
A Requerida apresentou a sua resposta e juntou o processo administrativo (“PA”) em 30-09-2022, alegando, em síntese, o seguinte:
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No Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes da AT, verifica-se que no ano de 2019, a Requerente estava coletado em IR, Regime simplificado de IRS - CAE Principal 8012 - PROFESSORES, CAE Secundário 1519 - OUTROS PRESTADORES DE SERVIÇOS desde 01-01-2015 e em IVA regime normal mensal por opção desde 13-09-2017.
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Em 30-06-2020, a Requerente entregou a declaração de rendimentos modelo 3, referente ao ano de 2019.
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Com a referida declaração, preencheram o anexo B-rendimentos da categoria B – referentes à Requerente B..., no qual mencionou, nos campos 403 e 404 do quadro 4 A, os valores de 1.463,41€ e 31.200€, respetivamente, resultando o rendimento global de 37.320,62€.
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Na sequência da divergência criada, derivado do código D71 - coerência do CAE, em nome do SP B, foi apresentada declaração de substituição em 10-09-2020 à qual foi atribuída o nº...2019-...-..., com o mesmo rendimento global de 37.320,62€.
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Em 12-09-2020, foi criado um novo processo de divergência com o código D71 - coerência do CAE em nome do SP B, uma vez que voltou a declarar no anexo B os valores 1.463,41€ e 31.200€, nos referidos campos 403 e 404, respetivamente.
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Em 25-09-2020, a AT notificou o Município de ..., para esclarecer qual o tipo de prestação de serviços que a professora B..., NIF..., (ora Requerente) tinha prestado ao mesmo durante o ano de 2019.
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O referido Município respondeu que a ora Requerente teve um contrato de prestação de serviços, em regime de avença, com início em 19-09-2018 e término em 19-09-2020.
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De acordo com o art. 59.º da Lei Geral Tributária (doravante LGT), foi solicitado o contrato, confirmando-se que a ora Requerente exerceu atividade constante da tabela anexa ao CIRS código 8012 – professora.
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Da segunda cláusula do referido contrato consta o seguinte: “O objeto do contrato consiste no desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde”.
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Na sequência da conclusão do procedimento de divergências, os serviços da AT elaboraram, 27-11-2020, a declaração oficiosa nº ... - 2019 - ...- ..., para o ano de 2019, corrigindo os rendimentos de 31.200€ do campo 404 para o campo 403 do Q4A do anexo B e consequentemente o rendimento tributável (líquido) para o ano em causa, foi determinado, nos termos do nº 1, alínea b) do art.º 31º do CIRS à data vigente, pelo coeficiente de 0,75.
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Dessa declaração resultou a liquidação oficiosa nº 2021 ... de 12-01-2021 com valor a pagar de 343,93€, objeto da presente impugnação.
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Em 17-05-2021, os Requerentes apresentaram reclamação graciosa contra a referida liquidação oficiosa, tendo sido proferido despacho de indeferimento de 09-03-2022 pelo Chefe do SF de ... ... .
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Através do ofício nº 2022 ... de 11-03-2022 do SF... ..., foi o mandatário do SP notificado do referido despacho de indeferimento a 15-03-2022, nos termos do nº 1 do art.º 39º do CPPT.
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Defende a Requerida, que da alegada violação do direito de audição prévia, não houve violação do princípio de participação, constante no art. 60º da LGT, porquanto no âmbito do procedimento de divergências os Requerentes foram notificados para esclarecer os valores mencionados no campo 403 por não se enquadrarem com as atividades do código CAE/tabela anexa do IRS. Defende que os Requerentes não se pronunciaram.
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O órgão instrutor (SF... ...) pediu esclarecimentos ao Município de ... sobre a atividade exercida, o qual respondeu e enviou mais tarde o contrato de avença respetivo onde constam a descrição das atividades exercidas, ao abrigo do princípio da colaboração previsto no art.º 59º da LGT.
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Existindo evidências de que as atividades exercidas se enquadram na atividade constante da tabela anexa ao CIRS código 8012 – professora, a que se refere o art.º 151º do CIRS e do qual o SP B (B...) se encontra coletada, foi a mesma notificada para se pronunciar sobre as correções a efetuar resultantes das conclusões do processo de divergências.
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Sustenta, que m dos exemplos apontados pelos Requerentes da violação do seu direito de audição, tem a ver com o facto de a AT não ter procedido à inquirição da testemunha por si arrolada (Chefe do Departamento de Recursos Humanos do Município de ...). Nos termos do art.º 69º do CPPT, na Reclamação Graciosa vigoram como regras fundamentais a simplicidade, a dispensa de formalidades essenciais e a limitação dos meios probatórios à forma documental e aos elementos oficiais de que os serviços disponham, sem prejuízo do direito de o órgão instrutor ordenar outras diligências complementares manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material.
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Por outro lado, nos termos dos artigos 58º e 72º da LGT, o órgão instrutor pode utilizar para o conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito tendo em vista à descoberta da verdade material, não estando sujeita à iniciativa do autor do pedido.
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Isto significa que a AT não é obrigada a realizar todas as diligências requeridas pelos contribuintes, se entender que as mesmas diligências, não acrescentam nada aos factos já apurados. Foi efetivamente o que aconteceu. Ou seja, se não houve diligências adicionais é porque o órgão instrutor (no caso a SF de ...), entendeu que foram recolhidos os meios de prova suficientes e necessários para os objetivos dos procedimentos.
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Sobre a alegada falta de fundamentação da liquidação, a liquidação contém os dados que permitem perceber o rendimento global que serviu de base ao cálculo do imposto devido no ano de 2019.
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A demonstração da liquidação contém, ainda que de forma sucinta, todos os dados necessários para a sua compreensão e decorrem do disposto na legislação aplicável.
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Defende que fundamentou de facto e de direito os atos tributários agora em crise, contendo todos os dados relevantes para a decisão dos procedimentos (que culminou com a correção dos rendimentos de 31.200€ da avença, do campo 404 para o campo 403 do Q4A do anexo B da modelo 3 de IRS e consequentemente o rendimento tributável (líquido) para o ano de 2019, foi determinado, nos termos do nº 1, alínea b) do art.º 31º do CIRS à data vigente, pelo coeficiente de 0,75),
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A Requerida sobre as às atividades exercidas pela Requerente no Município de..., defende que a aplicação dos coeficientes para a determinação do rendimento coletável previstos no art.º 31º do CIRS, com a reforma do IRS operada em 2015 pela Lei n.º 82-E/2014 de 31/12, ficou previsto que o coeficiente de 0.75 se aplicaria às atividades especificamente constantes na lista a que se refere o art.º 151º do CIRS, sendo que esta redação se aplica aos anos fiscais de 2015 em diante.
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Sendo que a criação do coeficiente 0,35 em 2015 visou reconhecer, no tratamento em regime simplificado, a existência de prestações de serviços que são efetuadas com recurso a estruturas empresariais que incorrem em montantes mais significativos de gastos, por oposição às prestações de serviços de natureza profissional liberal, com gastos pouco significativos, continuando estas a estar sujeitas ao coeficiente 0,75.
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No presente caso, a Requerente está inscrita, desde 01-01-2015, para o exercício da atividade principal de “PROFESSORES” com a CAE 8012 e enquadrado no regime simplificado de tributação.
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Pelo que se conclui que, não obstante os argumentos invocados, em termos substantivos, a atividade desenvolvida pela Requerente B... no âmbito da sua atividade de “desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde” para o Município de ... é uma atividade com enquadramento na atividade com código 8012 – PROFESSORES da lista anexa a que se refere o artigo 151.º do CIRS.
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Em termos de incidência real, as tarefas enquadram-se na alínea b) do nº 1 do artigo 3º do CIRS, sendo os rendimentos declarados no campo 403 do quadro 4A do anexo B da Modelo 3 de IRS e o rendimento tributável, obtido através da aplicação do coeficiente 0,75, previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 31º do CIRS, à luz da legislação em vigor.
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Termina a Requerida sustentado que o deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.
No dia 02-11-2022, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, tendo sido inquirida a testemunha apresentada pela Requerente. As Partes ficaram notificadas para apresentarem alegações escritas finais e o Tribunal indicou a data previsível para prolação da decisão arbitral, com advertência à Requerente da necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente até essa data (v. ata que se dá por reproduzida e gravação áudio disponível no SGP do CAAD).
A Requerida apresentou alegações em 02-12-2022, reafirmando, no essencial, a posição assumida nos respetivo articulado. A Requerente não apresentou alegações.
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Saneamento
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente para apreciar da legalidade de atos de liquidação de IRS, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, contado da data-limite de pagamento do imposto, fixada em 11 de Março de 2022, tendo a presente ação sido proposta em 14 de Junho de 2022.
O processo não enferma de nulidades.
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Matéria De Facto
§3.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa:
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No ano de 2019, a Requerente (B...) estava inscrita no Regime simplificado de IRS, com o CAE Principal 8012 - PROFESSORES, e com o CAE Secundário 1519 - OUTROS PRESTADORES DE SERVIÇOS, e encontra-se inscrita desde 01-01-2015 e em IVA regime normal mensal por opção desde 13-09-2017. Cf RIT
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Em 30-06-2020, a Requerente, entregou a declaração de rendimentos modelo 3, referente ao ano de 2019, onde identificou no anexo B-rendimentos da categoria B – referentes à Requerente B..., nos campos 403 e 404 do quadro 4 A, os valores de 1.463,41€ e 31.200€, respetivamente, resultando o rendimento global de 37.320,62€. Cf. RIT.
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Da submissão, resultou uma divergência, com o do código D71 - coerência do CAE, tendo sido apresentada pela Requerente uma declaração de substituição em 10-09-2020 à qual foi atribuída o nº...2019-...-..., com o mesmo rendimento global de 37.320,62€. Cf. RIT.
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Desta declaração de substituição, em 12-09-2020, resultou um novo processo de divergência com o código D71 - coerência do CAE, uma vez que a Requerente declarou nos campos 403 e 404, os valores 1.463,41€ e 31.200€. Cf. RIT.
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Em 25-09-2020, a AT notificou o Município de ..., para esclarecer qual o tipo de prestação de serviços que a Requerente (B...), tinha prestado ao mesmo durante o ano de 2019. Cf. RIT.
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O referido Município respondeu que a ora Requerente teve um contrato de prestação de serviços, em regime de avença, com início em 19-09-2018 e término em 19-09-2020. Cf. RIT.
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A AT, solicitou ao referido Município o contrato de prestação de serviços. CF. RIT.
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A Requerente celebrou um contrato de prestação de serviços na modalidade de avença com o Município de ... datado de 19 de Setembro de 2018. Desse contrato resulta o seguinte:
. Cf RIT
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A Requerente prestava os seguintes serviços: coordenava e organizava todo o trabalho dos professores das diversas atividades desportivas que o Município de ... disponibiliza aos seus munícipes, mediante a conceção e organização das atividades a lecionar pelos professores. Coordenava e elaborava os horários dos professores, fazia a gestão das infraestruturas e equipamentos desportivos. Cf. RIT e testemunha C... .
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Na sequência da conclusão do procedimento de divergências, os serviços da AT elaboraram em 27-11-2020, a declaração oficiosa nº ... - 2019 - ... - ..., para o ano de 2019, corrigindo os rendimentos de 31.200€ do campo 404 para o campo 403 do Q4A do anexo B e consequentemente o rendimento tributável (liquido) para o ano em causa, foi determinado, nos termos do nº 1, alínea b) do art.º 31º do CIRS à data vigente, pelo coeficiente de 0,75. Cf. RIT.
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O rendimento global da Requerente foi de 49.800,62€ calculado tendo em conta a soma das diversas categorias de rendimento tributável do agregado familiar da seguinte forma: a.15.606,99€ de Trabalho dependente (Q4A do Anexo A); b.25.293,07€ de anexo B (32.663,41€*0,75 da al. b) do nº 1 do art.º 31º do CIRS = 24.497,56€ + 795,51€ de acréscimo ao rendimento do art.º 31º nº 13 do CIRS, conforme verificação das despesas de categoria B na página 2 da demonstração de liquidação); c.2.650,57€ (lucro tributável declarado no campo 470 do Q4 do anexo C) e; d.6.250€ (100.000€ - 87.500€ = 12.500/2, nos termos da alínea b) do nº 2 do art.º 43º do CIRS) de mais-valias declaradas no anexo G. cf. RIT
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Dessa declaração resultou a liquidação oficiosa nº 2021 ... de 12-01-2021 com valor a pagar de 343,93€, objeto da presente impugnação. Cf. RIT.
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Em 17-05-2021, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra a referida liquidação oficiosa, tendo sido proferido despacho de indeferimento de 09-03-2022 pelo Chefe do SF de... ... . Cf. RIT.
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A Requerente foi notificada pelo ofício n.º 2022... de 16-02-2022 para o exercício do direito de Audição.
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A Requerente exerceu o seu direito de Audição, tendo requerido prova testemunhal a audição de uma Testemunha – Dra. C..., Chefe do departamento de recursos Humanos do Município de... . Cf. RIT.
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A Requerida no despacho de indeferimento, quanto ao Direito de Audição e pedido de audição de uma Testemunha, concluiu: “Após apreciação dos argumentos aludidos na referida exposição escrita aqui em apreciação, constata-se que não são apresentados factos novos, comprovados documentalmente, passíveis de alterar a decisão proferida no sentido do indeferimento do processo de reclamação graciosa n.º ...2021... .
(…) Quanto à requerida audição de testemunha indicada, tal não poderá ocorrer no âmbito da Reclamação Graciosa, atendendo à alínea e) do art.º 69º do CPPT.”cf. RIT
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Através do ofício nº 2022 ... de 11-03-2022 do SF... ..., foi o mandatário da Requerente notificado do referido despacho de indeferimento a 15-03-2022, com os seguintes fundamentos:
Cf. RIT
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Inconformada com os atos tributários de IRS, a Requerente apresentou no CAAD, em 16 de Junho de 2022, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral tendo em vista a anulação das referidas liquidações de IRS. – cf. registo de entrada no SGP do CAAD.
§3.2. Factos não provados
Não foram identificados outros factos que devam ser considerados não provados.
§3.3. Fundamentação da matéria de facto
Cabe ao Tribunal Arbitral selecionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, quanto à matéria de facto, na sua íntima e prudente convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação da prova produzida, o referido princípio da livre apreciação (cfr. artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados como factos provados, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e da prova testemunhal.
Em relação à prova testemunhal importa salientar o contributo trazido pelo depoimento da Chefe do Departamento de Recursos Humanos do Município de ..., Sra. Dra. C... . A testemunha demonstrou ter conhecimento direto da atividade prestada pela Requerente.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem os factos incompatíveis ou contrários aos dados como provados.
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Matéria de Direito
§4.1. Delimitação das questões a decidir
Tendo em consideração a posição das Partes e a matéria de facto dada como assente, as questões a decidir são as seguintes: (i) violação do direito de audição prévia; (ii) da falta de fundamentação da liquidação, (iii) e determinar qual a natureza dos serviços prestados pela Requerente ao Município de ... .
Vejamos, pois, se assiste razão à Requerente quanto aos vícios de forma alegados.
§4.2. Quanto à questão de violação do direito de audição prévia
A Requerente, sustenta, que exerceu o seu direito de audição tendo requerido a audição de uma testemunha, a qual poderia cabal e efetivamente esclarecer qual a atividade exercida pela Requerente, contudo a AT entendeu não proceder à inquirição da testemunha, violando o direito de audição da Requerente.
A Requerida, defende que não houve violação do princípio de participação, constante no art. 60º da LGT, porquanto no âmbito do procedimento de divergências os Requerentes foram notificados para esclarecer os valores mencionados no campo 403 por não se enquadrarem com as atividades do código CAE/tabela anexa do IRS. No entanto, os Requerentes não se pronunciaram. Os serviços da AT efetuaram as diligências adequadas e proporcionais aos objetivos dos procedimentos (Divergências e reclamação graciosa), atendendo aos princípios da verdade material, inquisitório, da proporcionalidade, do contraditório, da cooperação, conforme dispõem os artºs 55.º, 58.º, 59.º e 60º, todos da LGT
Nos presentes autos, face à factualidade assente, resulta que a Requerente exerceu o seu direito de Audiência Previa, requereu à AT diligências complementares de audição de uma Testemunha. A AT entendeu não ser necessário e não procedeu a sua audição.
Perante o exposto a questão que se discute é a de saber se existe a violação do direito de audição da Requerente e consequente violação do princípio de participação previsto no art. 60º da LGT.
vejamos o que dispõe a lei sobre esta matéria.
Estabelece o art.º 60º, n.º 1 al. a) da LGT que “A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efetuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido contrário, por direito de audição antes da liquidação”.
Acresce salientar que a doutrina e a jurisprudência são pacíficas quanto à violação do direito de audição, reconhecendo que consubstancia preterição de formalidade essencial geradora de invalidade do ato.
A jurisprudência dos nossos Tribunais superiores e arbitrais, sobre a violação do Direito de Audição, designadamente o processo n.º 06559/13 do Tribunal Central Administrativo Sul, plasmado no acórdão de 18 de abril de 2018, onde se pode ler, além do mais, o seguinte:
“O exercício do direito de audição inclui, não apenas o direito do contribuinte de se pronunciar sobre todas as questões objeto de procedimento, mas também o direito de requerer diligências complementares e a juntar documentos ao processo.
Perante a possibilidade de requerer diligências complementares, recai sobre a Administração tributária (AT) o dever de as realizar, sempre que as mesmas se afigurem adequadas e úteis a averiguar o circunstancialismo de facto relevante para a decisão a tomar no procedimento.
Caso a AT entenda não ser de efetuar as diligências requeridas, deverá pronunciar-se expressamente sobre o pedido da sua realização, se não antes, na decisão final sob pena de não o fazendo, dever considerar-se preterido o direito de audição prévia.” (nosso negrito)
Em igual sentido, vejam-se as decisões proferidas pelos tribunais arbitrais tributários, n.º 628/2014-T, 123/2021-T.
Por último, resulta da alínea e) do art.º 69º do CPPT “e) Limitação dos meios probatórios à forma documental e aos elementos oficiais de que os serviços disponham, sem prejuízo do direito de o órgão instrutor ordenar outras diligências complementares manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material;”.
Na sequência do périplo jurisprudencial e normativo que acima fizemos referência, cumpre apreciar se no caso concreto a decisão da AT de não audição da Testemunha indicada pela Requerente não constitui uma violação do direito de audição, e se a AT se pronunciou expressamente sobre a mesma.
Ora, conforme factualidade assente, resulta que a AT pronunciou-se expressamente pela não audição da testemunha arrolada, indicando que “tal não poderá ocorrer no âmbito da Reclamação Graciosa, atendendo à alínea e) do art.º 69º do CPPT”, e igualmente concluiu “Após apreciação dos argumentos aludidos na referida exposição escrita aqui em apreciação, constata-se que não são apresentados factos novos, comprovados documentalmente, passíveis de alterar a decisão proferida no sentido do indeferimento do processo de reclamação graciosa n.º ...2021... .”
Na verdade, a AT, pronunciou-se expressamente quanto ao pedido da Requerente.
Por outro lado, quanto à indispensabilidade da audição da testemunha, temos que a Requerente no exercício do direito de Audição e no presente PPA, não apresentou argumentos ou prova documental que atestasse a indispensabilidade da audição da testemunha na descoberta da verdade material.
À face do exposto, conclui-se, em relação à fundamentação formal bem como no tocante à fundamentação substantiva, ser improcedente a ilegalidade alegada pela Requerente.
§4.3. Quanto à questão de falta de fundamentação da liquidação.
A Requerente, alega falta de fundamentação da liquidação porquanto não esclareceu, cabalmente, em que elementos se baseou para efetuar as correções, não permitindo à Requerente elaborar conveniente a sua defesa.
A Requerida, defendeu-se, alegando que fundamentou de facto e de direito os atos tributários agora em crise, contendo todos os dados relevantes para a decisão dos procedimentos (que culminou com a correção dos rendimentos de 31.200€ da avença, do campo 404 para o campo 403 do Q4A do anexo B da modelo 3 de IRS e consequentemente o rendimento tributável (liquido) para o ano de 2019, foi determinado, nos termos do nº 1, alínea b) do art.º 31º do CIRS à data vigente, pelo coeficiente de 0,75), bem como o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido, nos termos legalmente previstos e conforme jurisprudência de tribunais superiores.
Ora, a fundamentação dos atos tributários constitui uma imposição constitucional (cfr. artigo 268.º, n.º 3, da CRP) e legal (cfr. artigos 77.º da LGT e 153.º do CPA). Do artigo 268.º, n.º 3, da CRP resulta que os atos administrativos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos “carecem de fundamentação expressa e acessível”.
Cabe apreciar esta pretensão à luz das seguintes disposições legais:
Dispõe o artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, da LGT:
“1 — A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
2 — A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.”
E dispõe o artigo 153.º, n.ºs 1 e 2, do CPA:
“1 - A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.
2 - Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.”
Há, sobre a mesma questão, abundante jurisprudência que se seguirá de perto, em particular o Acórdão 51/14.8YFLSB do Supremo Tribunal Administrativo que (i) a fundamentação do ato administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto; (ii) a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação; (iii) um ato tributário encontra-se fundamentado quando o sujeito passivo, colocado na posição de um destinatário normal possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese; (iv) não ocorre o vício de fundamentação deficiente quando o sujeito passivo revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do ato e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido.
Em igual sentido, vejam-se aos seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 10-02-2010, processo n.º 01122/09: “Este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.”
- de 30-01-2013, processo n.º 0105/12: “não ocorre o vício formal de falta de fundamentação se a própria impugnante expressamente revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do ato e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido”.
- de 23-04-2014, processo n.º 01690/13: “O acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.”
- de 27-01-2016, processo n.º 0174/15: “Apesar da não indicação expressa do preceito legal aplicável, a exigível fundamentação de direito do acto tributário será suficiente com a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, desde que, em qualquer caso, se possa concluir que aqueles eram conhecidos ou cognoscíveis por um destinatário normal colocado na posição em concreto do real destinatário.”
- de 29-09-2016, processo n.º 0956/16: “IV - A fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto. Ponto é que a fundamentação responda às necessidades de esclarecimento do contribuinte informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. V - Está suficientemente fundamentado o acto administrativo que, complementado com informação para que remete, permite atingir esse objectivo.”
Da jurisprudência arbitral resulta que a fundamentação de um ato de liquidação é suficiente quando o sujeito passivo mostre compreender os concretos fundamentos usados pela AT, conforme resulta das Decisões Arbitrais:
- de 12-10-2021, processo n.º 97/2020-T: “A fundamentação vertida pela AT mostra-se suficiente desde que sujeito passivo mostre compreender os concretos fundamentos usados pela AT.”
- de 17-01-2022, processo n.º 521/2021-T: “para a fundamentação ser considerada suficiente basta que sejam perceptíveis as razões por que se decidiu no sentido em que se decidiu.”
- de 22-03-2022, processo n.º 730/2021-T: “O dever de fundamentação formal do ato de liquidação, encontra-se preenchido quando se revela a compreensão pelo sujeito passivo do fundamento que permitiu a elaboração da liquidação adicional.”
Como é entendimento jurisprudencial corrente, a fundamentação do ato tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, sendo que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu num certo sentido e não de forma diferente.
Isso mesmo se colhe do entendimento reiterado do STA nesta matéria e de que a decisão de 11.11.1998, no âmbito do processo n.º 31339 é exemplo “(…) o dever de fundamentação exige que um destinatário normal, colocado na posição do recorrente, face ao teor expresso do acto, possa apreender o percurso lógico-jurídico trilhado pela autoridade recorrida para chegar a tal decisão, por forma a poder determinar-se, conscientemente, no sentido da impugnação ou não impugnação.”
A fundamentação deve consistir, por isso, numa exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão. As razões de facto e os fundamentos de direito da decisão devem ser percetíveis, claras e congruentes para o sujeito passivo.
Resulta assim de primacial exigência que ao sujeito passivo seja dada a possibilidade de alcançar e perceber as razões subjacentes a essa mesma decisão, para que sobre a mesma possa estar apto a permitir, em tese, formular um juízo sobre o seu mérito e não que a decisão não é uma pura demonstração de arbítrio ou de discricionariedade.
Ora, nos presentes autos, resulta que a fundamentação contida nos atos é clara e percetível, foi suficiente permitiu à Requerente aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela AT do ato para proferir a decisão.
Conclui-se, assim, que a AT cumpriu o seu dever de fundamentar a liquidação de IRS em apreço, nos termos dos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º da LGT e 153.º do CPA, com a consequente improcedência do vício invocado pela Requerente de falta de fundamentação.
§4.4. Quanto à questão da natureza dos serviços prestados
A Requerente, alega que, a atividade de Professora em nada se relaciona com a contratada atividade de “desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde”, que não exerceu a atividade de professora, não tendo interagido, de qualquer forma, com os utentes das aulas que, reitera, eram lecionadas pelos professores cujo trabalho lhe cabia coordenar e gerir. que desenvolveu uma atividade que se enquadra na categoria residual prevista no código “1519- Outros prestadores de serviços”.
A Requerida, contra-alegou, no sentido de que a atividade desenvolvida pela Requerente B... de “desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde” para o Município de ..., é uma atividade com enquadramento na atividade com código 8012 – PROFESSORES da lista anexa a que se refere o artigo 151.º do CIRS.
Face à factualidade em análise, a questão jurídica que se impõe solucionar é a seguinte, se os serviços prestados pela Requerente se enquadram no CAE (secundário) da Requerente n.º 1519 (Outros prestadores de serviços), conforme declarado pela Requerente, ou se enquadram no CAE principal da Requerente n.º 8012 (Professores), conforme correção promovida pela AT.
A distinção do CAE, releva para a aplicação dos coeficientes na determinação do rendimento tributável dos Sujeitos Passivos tributados ao abrigo do regime simplificado em IRS, aplicável à Recorrente por referência aos rendimentos obtidos no ano de 2019, previsto no artigo 31.º do Código do IRS.
Enfrentando a questão, cumpre em primeiro lugar apreciar sobre quem recai o ónus da prova sobre o CAE aplicável, designadamente a verificação da natureza e tipo de prestação de serviços realizados.
vejamos o que dispõem a lei e a jurisprudência sobre esta matéria.
Resulta do artigo 74.º n.º 1 da LGT que: "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.", em consonância com o artigo 342.º n.º 1 do CC, " Aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.".
Existe ampla jurisprudência, sustentando que cabe à Autoridade Tributaria e Aduaneira, o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos legitimadores da sua atuação e que cabe ao Sujeito Passivo provar os factos que operam como suporte das pretensões e direitos que invoca. (vide Processo Arbitral nº 236/1014-T de 4 de Maio de 2015; Ac. STA 0951/11 de 26 de fevereiro de 2014).
Neste sentido, seguindo a legislação e jurisprudência elencada, cabe à Requerente o onus probandi da atividade por si desenvolvida no Município de ... ou seja, demonstrar que a atividade desenvolvida se enquadra no CAE n.º 1519 Outros prestadores de serviços e não no seu CAE Principal de Professor.
Em contraposição, cabe à AT demonstrar que a prestação de serviços no âmbito do contrato aqui em analise, se enquadra no CAE Principal da Requerente de Professor.
Convém realçar, que o facto de a Requerente ter desenvolvido uma atividade, que no seu entender não se enquadra na sua atividade principal, quer seja ela Professora ou outra Profissão Liberal, não significa que essa atividade seja diretamente enquadrada no CAE n.º 1519 Outros prestadores de serviços, devendo sim, ser feita uma análise casuística ao serviço efetivamente prestado e à profissão da Requerente.
Aqui chegados, é altura de abordar, em especial, a questão do enquadramento da atividade da Requerente, vejamos o que dispõe a lei e jurisprudência sobre esta matéria.
Referem os artigos 31º nº 1 alíneas b) e c); 151º, do Código do IRS:
Artigo 31.º do CIRS
Regime simplificado
1 - No âmbito do regime simplificado, a determinação do rendimento tributável obtém-se através da aplicação dos seguintes coeficientes:
a)(...)
b) 0,75 aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º;
c) 0,35 aos rendimentos de prestações de serviços não previstos nas alíneas anteriores;
Mais dispõe o Artigo 151.º do CIRS
Classificação das atividades
As atividades exercidas pelos sujeitos passivos do IRS são classificadas, para efeitos deste imposto, de acordo com a Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade (CAE), do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados em tabela de atividades aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
Tabela de atividades aprovada pela Portaria n.º 1011/2001, de 21/08, com a alteração a data dos factos, pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12;
8 - Professores e técnicos similares:
8010 Explicadores;
8011 Formadores;
8012 Professores;
(…)
15 - Outras atividades exclusivamente de prestação de serviços:
1519 Outros prestadores de serviços.
Os diversos parágrafos desta tabela agrupam, de forma sistematizada, os códigos correspondentes às atividades exercidas pelos sujeitos passivos do IRS. Atendendo ao âmbito de incidência real do IRS verifica-se a existência de uma multiplicidade de atividades exercidas pelos sujeitos passivos deste imposto, consequentemente numa tabela deste tipo o legislador optou pela definição das atividades em sentido amplo.
Relativamente à questão principal há que convocar a legislação aplicável ao caso controvertido acima identificada. Assim, os rendimentos da Requerente, em termos de incidência de IRS, estão abrangidos pela al. b) n.º 1 do art. 3.º do CIRS.
Uma vez assente esse pressuposto, também é pacifico quer para a Requerente quer para a Requerida que esses rendimentos sujeitos a IRS, estão abrangidos pelo regime simplificado previsto no artigo 31.º do CIRS.
Uma vez chegados aqui, há que averiguar em quais das alíneas b) ou c) do n.º 1 do artigo 31.º do CIRS, se enquadram os ditos rendimentos.
A nível da jurisprudência arbitral, não tem sido pacifico o entendimento quanto ao enquadramento dos rendimentos provenientes das atividades profissionais/prestações de serviços que possam ser enquadráveis nas alíneas b) e c) do n.º1 do artigo 31.º do CIRS, dando origem a decisões de julgados contraditórios. O enquadramento a nível das alíneas referidas vai dar origem a que se aplique ou um coeficiente de 0,75 ou de 0,35 para efeitos de apuramento de rendimento tributável em IRS. Ora devido precisamente à existência de jurisprudência contraditória, no Acórdão do Pleno do STA, para uniformização de jurisprudência, de 9-12-2010, proc.º 092/19.9BASLB, relatado por Isabel Marques da Silva, ainda que com um voto de vencido pronunciou-se da seguinte forma:
A este respeito, importa começar por referir que em matéria de incidência tributária e de aplicação de taxas de tributação não há, por definição, lacunas. Mercê do especial vigor que o princípio da legalidade assume neste domínio na sua vertente de tipicidade tributária (artigo 103.º n.º 2 da Constituição), as taxas de tributação apenas podem ser utilizadas nas situações que concretamente se insiram na previsão da norma aplicável. A integração analógica encontra-se vedada nestas matérias mercê do princípio constitucional da legalidade, sendo a afirmação concordante do legislador ordinário nesse sentido mero corolário daquela norma constitucional (vide, a este respeito, o n.º 4 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária).
Não se encontra, porém, constitucionalmente vedada a possibilidade de interpretação extensiva, pelo que se se concluir que a letra da lei se quedou aquém do seu espírito, haverá que adequar a letra ao respectivo espírito por via da interpretação extensiva (sobre a interpretação extensiva na doutrina tradicional, pressuposta pelo nosso legislador, cfr. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 13.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2002, pp. 185/186).
Pressuposto para assim operar é, contudo, a demonstração de que o legislador minus dixit quam voluit, in casu, que quando o legislador se refere a Desportistas no Código 1323 da tabela do artigo 151.º do Código do IRS quer abarcar não apenas os desportistas em sentido estrito mas, também, outras atividades profissionais incluídas na atividade desportiva, como é o caso dos árbitros.
Senão, vejamos.
Com a Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que entrou em vigor a 1 de Janeiro desse ano, os coeficientes aplicáveis aos rendimentos resultantes do exercício de atividades profissionais passaram a estar indexados ao exercício das atividades profissionais previstas na tabela de atividades do artigo 151.º do Código do IRS, prevendo-se no n.º 2 do artigo 31.º desse mesmo Código, e na parte que aqui nos interessa, a aplicação do coeficiente de 0,75 aos “rendimentos das atividades profissionais constantes da tabela a que se refere o artigo 151.º” e o coeficiente de 0,10 aos “subsídios destinados à exploração e restantes rendimentos da categoria B não previstos nas alíneas anteriores” (nosso sublinhado).
Com a republicação do Código do IRS operada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro, que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2015, a redacção do artigo 31.º daquele Código foi alterada, passando a prever-se no respectivo n.º 1 a aplicação de um coeficiente de “0,75 aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º” (nosso sublinhado).
Portanto, a partir de 2015, o legislador fiscal passou a prever expressamente que o coeficiente de 0,75 apenas pode ser aplicado às atividades profissionais especificamente previstas na tabela do artigo 151.º do Código do IRS. Assim, e presumindo que o legislador fiscal soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (tal como resulta do disposto no n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável ex vi alínea d) do artigo 2.º da Lei Geral Tributária), não se pode senão concluir que o coeficiente de 0,75 só pode ser aplicado às atividades concreta e indubitavelmente previstas naquela tabela, aplicando-se o coeficiente residual de 0,35 às atividades aí não especificamente previstas.
Ora, nos presentes autos, relativamente aos rendimentos provenientes do código 1519 Outros prestadores de serviços, a AT de acordo com o entendimento constante do ponto n.º 5 da Circular n.º 2/2016, de 2016/05/06, aplica o coeficiente 0,35 a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 31.º do Código do IRS:
4- Estão abrangidos na alínea b) do n.º 1 do artigo 31.º do Código do IRS, os rendimentos provenientes das prestações de serviços de atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS, não incluindo o código “1519 Outros prestadores de serviços” dado este código não explicitar uma atividade profissional especifica, independentemente da atividade estar classificada de acordo com os códigos das atividades especificamente mencionados na tabela de atividade aprovada pela Portaria n.º 1011/2001, de 21 de Agosto, ou de acordo com a Classificação Portuguesa de Atividades Económicas (CAE) do Instituto Nacional de Estatística.
5 - Aos rendimentos provenientes do código “1519 Outros prestadores de serviços” e demais prestações de serviços de atividades profissionais não especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS (onde se incluem as enquadráveis na al. a) do n.º 11 do artigo 3.º), e desde que não previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 31.º do Código do IRS, aplica-se o coeficiente de 0,35, a que se refere o n.º 1 da alínea c) deste artigo.
Pelo que o enquadramento das atividades terá de ser analisada caso a caso, neste sentido, o artigo 11.º da Lei Geral Tributária(“LGT”) determina que devem – na interpretação das normas fiscais e na qualificação dos factos a que se aplicam – ser observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Deste modo, o intérprete não deve cingir-se à letra da lei, mas antes, a partir dela, reconstituir o pensamento legislativo tendo em conta a unidade do sistema jurídico.
Como refere o Artigo 151.º do CIRS, há duas formas distintas de classificar as atividades exercidas pelos sujeitos passivos de IRS: de acordo com a Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade (CAE), ou de acordo com os códigos mencionados em tabela de atividades aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
O legislador escolheu a conjunção coordenativa alternativa ou disjuntiva “ou” e não usou a conjunção coordenativa aditiva “e”, o que há-de ter consequências ao nível da determinação da vontade da lei.
Vejamos, a Tabela a que alude o artigo 151.º do CIRS foi elaborada de acordo com a Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade do Instituto Nacional de Estatística. A seção P do referencial “Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade” compreende Educação, dentro deste em concreto do campo 85 e subcampos que o incluem, de relevo para a presente análise retira-se:
85 EDUCAÇÃO
“Compreende as actividades de ensino público, privado e cooperativo de todos os tipos (oral, escrito, rádio, televisão, Internet, etc.), em qualquer nível ou área, fornecido por estabelecimentos e professores independentes ou isolados, em regime de tempo inteiro, parcial ou intensivo, durante o dia ou à noite, tanto os acessíveis ao público como os que são orientados por empresas ou outras entidades para uma determinada categoria de pessoas. São actividades de ensino que pertencem ao sistema tradicional de ensino, isto é, um sistema de ensino escolar progressivo para crianças e jovens, desde o nível pré-escolar até ao nível superior. Inclui o ensino em escolas, institutos e academias militares, o ensino de indivíduos com deficiência e o dirigido a casos sociais (indivíduos com dificuldades de inserção social).
Compreende também escolas de educação (escolas de condução, etc.) e de formação profissional, ensino desportivo, recreativo e das actividades culturais.”
(…)
856 ACTIVIDADES DE SERVIÇOS DE APOIO À EDUCAÇÃO
8560
85600
Compreende, nomeadamente, actividades de: gestão que apoiam os processos e os sistemas educativos; consultoria para a educação; avaliação e testes da educação; e organização de programas de troca de estudantes.
Continuando a nossa análise, será necessário levar a efeito uma leitura do artigo 151º do CIRS, em conformidade com o seu elemento irremovível, a sua letra. Com efeito, o elemento literal da norma é sempre o mais relevante, por ser delimitador da atividade interpretativa. A letra é um elemento irremovível da interpretação, ou um “limite da busca do espírito”.
Veja-se neste sentido, a Decisão do CAAD Processo nº 399/2018-T de 25 de Março de 2019:
(…) na falta de um verdadeiro conceito tributário de prestação de serviços ou de atividade comercial, tratando-se de conceitos cuja extensão nos respectivos ramos do direito de origem não são exactamente transponíveis para o direito fiscal, o recurso a listas abertas de atividades implica – assim o exige o princípio da segurança jurídica – que as atividades descritas nas tabelas ou listas sejam entendidas de forma lata. Como pode ler-se na decisão que vimos citando, “existindo dúvidas entre qualificar uma determinada atividade como comercial ou prestação de serviços – e existem, manifestamente, zonas cinzentas – o primeiro critério deve ser o enquadramento pensado pelo legislador, ou seja, reconduzir à qualificação existente nas listas (do artigo 4.º ou da tabela a que se refere o artigo 151.º) ainda que essa qualificação exija uma leitura ampla das atividades descritas”. Mais adiante, “em todo o caso, na situação em análise, a atividade desenvolvida pelo Requerente (acabamentos em edifícios e revestimento de pavimentos) enquadrando-se, no entendimento deste Tribunal, num conceito comum de construção civil merecerá igualmente enquadramento na categoria de construção civil prevista no Código do IRS já que do ponto de vista da obtenção do rendimento, a forma de obtenção de rendimento, no caso do Requerente não será muito diferente de outras obras de construção civil (com um teor mais abrangente) designadamente tendo em vista os custos com materiais necessários ao desenvolvimento da atividade”.
Face à factualidade assente, resulta do contrato de prestação de serviços que: “O objeto do contrato consiste no desenvolvimento de atividades de dinamização desportiva, predominantemente relacionadas com o exercício físico na promoção da saúde”, serviços que em melhor detalhe, consistiam em a Requerente coordenar e organizar todo o trabalho dos professores das diversas atividades desportivas que o Município de ... disponibiliza aos seus munícipes, mediante a conceção e organização das atividades a lecionar pelos professores. Coordenava e elaborava os horários dos professores, fazia a gestão das infraestruturas e equipamentos desportivos, conforme descrito pela Requerente e confirmado pela testemunha C... .
Para a prestação dos serviços descritos, a Requerente transmitia os seus conhecimentos aos Professores, desenvolvendo atividades, participando diretamente no ensino e transmissão de conhecimento aos Professores e aos alunos. A “conceção e organização das atividades a lecionar”, enquadra-se no conceito de Professores.
Mais se refere, que da conjugação da tabela a que alude o artigo 151.º do CIRS e do CAE supra transcrito, incluem-se não só Professores, bem como técnicos similares e formadores, dentro do sistema tradicional de ensino, e incluem-se igualmente atividades de gestão que apoiam os processos e os sistemas educativos.
Perante o exposto, da descrição das atividades desenvolvidas pela Requerente no Município, não merece duvidas que se inclui no CAE 8 de Professores e Técnicos Similares, especificamente no CAE 8012, da tabela a que alude o artigo 151.º do CIRS, bem como se encontra descrita na seção P de Educação (em várias das suas subclassificações) da Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade.
Conclui-se assim da análise do probatório dos presentes autos, que os serviços prestados pela Requerente se enquadram no CAE 8012 de Professores, e, por conseguinte, andou bem a AT na correção efetuada.
Assim, quanto ao que vem alegado nesta matéria, entende este Tribunal Arbitral não se ter verificado qualquer violação, tendo a atuação da Requerida sido realizada de acordo com o normativo legal vigente, sendo assim de improceder os argumentos alegados pela Requerente, nesta matéria.
§4.4. Da restituição do imposto indevidamente pago
Quanto ao pedido de restituição do imposto indevidamente pago formulado pela Requerente, vai improcedente atendendo à decisão de improcedência total do pedido de PPA.
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Decisão
De harmonia com o exposto, este Tribunal Arbitral decide, em:
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Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, porquanto os atos de liquidação de IRS e juros impugnados não padecem de qualquer ilegalidade, sendo assim de os manter;
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Em consequência, julgar improcedente o pedido de reembolso dos montantes pagos.
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Condenar os Requerentes no pagamento das custas do processo.
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Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 305.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 3.887,60, indicado pela Requerente e não contestado pela Requerida, correspondente ao valor das liquidações de IVA e de juros compensatórios cuja anulação constitui o objeto desta ação.
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Custas Arbitrais
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente
Notifique-se.
Lisboa, 3 de Janeiro de 2023
O Árbitro,
Pedro Guerra Alves