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SUMÁRIO
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A exceção ao princípio da impugnação unitária que permite a impugnação contenciosa, direta e autónoma, dos atos de fixação do VPT, consiste numa faculdade concedida aos sujeitos passivos que não preclude a sindicância das suas ilegalidades no âmbito do ato final do procedimento, isto é, no âmbito da impugnação do ato de liquidação subsequente;
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O artigo 78.º, n.º 1, da LGT permite a revisão oficiosa do ato de liquidação de IMI no prazo de quatro anos com base em erro na fixação do VPT que seja imputável aos serviços;
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O artigo 45.º do Código do IMI, na redação anterior à Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, não previa a aplicação na determinação do VPT dos terrenos para construção dos coeficientes de afetação, de localização e/ou de qualidade e conforto previstos no artigo 38.º do Código do IMI.
DECISÃO ARBITRAL
A Árbitra Ana Pinto Moraes designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, decide o seguinte:
I – RELATÓRIO
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A... S.A., com o número de identificação fiscal..., com sede no ..., ... ..., ...-... ... (“Requerente”), vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), na sequência da formação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa que apresentou, com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à anulação parcial do ato de liquidação do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”) do ano de 2017 referente ao prédio urbano inscrito sob o artigo ... da freguesia do ..., bem como o reembolso do imposto eventualmente pago em excesso e o pagamento de juros indemnizatórios.
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 28 de julho de 2022 pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT” ou “Requerida”).
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A Requerente não exerceu o direito à designação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitro do Tribunal Arbitral, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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As partes foram notificadas dessa designação em 15 de setembro de 2022, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
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Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral singular ficou constituído em 4 de outubro de 2022.
I.1 ARGUMENTOS DAS PARTES
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A Requerente veio sustentar a procedência do seu pedido, em síntese, tendo em conta os seguintes argumentos:
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A Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa nos termos do n.º 1 do artigo 78.º da LGT e artigo 115.º, n.º 1, alínea c), do Código do IMI, seguindo a jurisprudência consolidada;
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A Requerente não coloca em causa a natureza de ato destacável que é atribuída aos atos de avaliação de valores patrimoniais;
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Trata-se de sindicar os atos de liquidação de IMI, na sequência de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa. A Requerente requer a revisão do ato tributário de liquidação de IMI, com fundamento em erro imputável aos serviços e em injustiça grave e notória, e não a revisão dos atos de fixação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção;
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A errada fixação do VPT pode ser arguida através do pedido de revisão oficiosa das liquidações, nos termos conjugados dos artigos 78.º da LGT e 115.º do CIMI, ainda que o contribuinte não tenha reagido atempadamente contra essa fixação;
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O artigo 115.º do CIMI constitui uma válvula de escape, devendo o respetivo mecanismo ser desencadeado pela Administração, por sua iniciativa ou a impulso do interessado;
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Trata-se de um caso de injustiça grave ou notória causada pela aplicação de uma fórmula na avaliação dos terrenos para construção da qual resultou o pagamento de IMI, em valor consideravelmente superior ao que seria efetivamente devido;
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Da interpretação conjugada do n.º 1 do artigo 78.º da LGT com o disposto no artigo 115.º, n.º 1, alínea c), do Código do IMI, resulta que a revisão oficiosa das liquidações deve ser realizada pela administração tributária, ainda que sob impulso inicial do contribuinte, quando tenha ocorrido erro imputável aos serviços. O que se verifica, precisamente, no caso em apreço, erro esse que se traduziu até numa injustiça grave e notória concretizada na fixação de um VPT em valor claramente superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas;
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Não existem quaisquer dúvidas quanto à competência dos tribunais arbitrais para apreciar a (i)legalidade de pedidos de revisão oficiosa tácita ou expressamente, indeferidos pela AT, desde que isso implique, também e antes de mais, a apreciação dos atos de liquidação que lhes estão subjacentes – como é o caso;
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O artigo 45.º do Código do IMI – na redação em vigor à data dos factos – estabelece normas de determinação do VPT especificas para os terrenos de construção, as quais são diferentes das previstas no artigo 38.º do mesmo Código;
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Foram indevidamente aplicados os coeficientes de localização, de afetação e de qualidade e conforto, os quais não são aplicáveis aos terrenos para construção;
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Foi considerado como valor base dos terrenos para construção o valor médio de construção majorado em 25%, sendo que essa majoração não se aplica aos terrenos para construção;
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Não foi considerado o Caj, o qual se aplica igualmente aos terrenos para construção e é dependente e varia em função da afetação do imóvel e dos respetivos escalões de área;
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Não foi atualizada a percentagem para o cálculo da área de implantação, de 40% para 35%, em vigor desde 2015;
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Não deverá ser tido em consideração qualquer dos coeficientes presentes no artigo 38.º do Código do IMI, na medida em que, os mesmos se encontram associados aos prédios já edificados, o que não se verifica no caso sub judice.
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A Requerida, tendo sido devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta em 9 de novembro de 2022, tendo concluído pela improcedência da presente ação e, consequentemente, pela sua absolvição do pedido. A Requerida sustentou a sua resposta, sumariamente, com base nos seguintes argumentos:
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Começou a Requerida por registar que acolheu o entendimento preconizado pelos tribunais superiores no sentido que na determinação do VPT dos terrenos para construção, releva a regra específica constante do artigo 45º do CIMI e não outra, não sendo considerados os coeficientes previstos na expressão matemática do artigo 38.º do CIMI, tais como os coeficientes de localização, de afetação, de qualidade e conforto.
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Entende a Requerida que não está legalmente prevista a dedução de pedido de revisão oficiosa dos atos de avaliação do valor patrimonial tributário, pelo que a pretensão da Requerente carece de fundamento legal. Por outro lado, o ato que fixou o VPT em vigor no período de tributação dos presentes autos está consolidado na ordem jurídica, tendo a força de caso julgado. Eventuais vícios próprios e exclusivos do VPT são insuscetíveis de ser impugnados no ato de liquidação que seja praticado com base no mesmo, pelo que o ato de liquidação não enferma de qualquer ilegalidade.
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Vem ainda a Requerida defender que mesmo que assim não se entendesse, o que por hipótese se admite, o pedido de revisão oficiosa sempre seria intempestivo face aos prazos previstos no número 4 do artigo 78.° da LGT;
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Não obstante, por força do artigo 168.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo (“CPA”) apenas seria possível proceder à anulação dos atos de avaliação dos quais resultou a fixação do VPT que tivessem sido efetuados há menos de 5 anos;
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Na perspetiva da Requerida, fundamentada com recurso à jurisprudência do STA e à jurisprudência arbitral (CAAD), o procedimento avaliativo constitui um ato autónomo e destacável para efeitos de impugnação arbitral, o que significa que se o mesmo não for impugnado no prazo fixado para o efeito, verifica-se a consequente consolidação na ordem jurídica como caso decidido ou resolvido semelhante ao caso julgado, que a posterior liquidação tem de acolher;
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Ao não ter a Requerente solicitado uma 2.ª avaliação, não podia por via do pedido arbitral impugnar o ato de liquidação de IMI com fundamento em erros ou vícios ocorridos naquelas avaliações. Nestes termos, concluiu a Requerida que já estava consolidado o ato de fixação do VPT e, consequentemente, não podia o ato de liquidação contestado ser anulado com fundamento em erros na qualificação e quantificação daquele;
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A revogação e anulação dos atos administrativos em matéria tributária está prevista no artigo 79.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), sendo subsidiariamente aplicável o regime previsto nos artigos 165.º a 174.º do CPA, por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT. Conforme invoca a Requerida, nos termos do artigo 168.º do CPA, apenas são passíveis de anulação os actos de fixação do VPT que contrariam o recente entendimento jurisprudencial nos casos em que não tenham decorrido cinco anos desde a respetiva emissão, o que não era o caso;
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Já se encontra precludido o prazo para anulação administrativa do ato que fixe valor patrimonial tributário o qual se encontra sanado e produz efeitos jurídicos, nomeadamente para efeitos de cálculo de IMI;
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O pedido formulado não está fundamentado na lei, não sendo admissível ao Tribunal Arbitral julgar o processo de acordo com critérios da equidade, mas tão só com base no direito constituído;
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Por fim, alegou a Requerida que estava vinculada ao princípio da legalidade previsto no artigo 266.º da CRP e concretizado no artigo 55.º da LGT e no artigo 3.º do CPA, razão pela qual não podia deixar de dar integral cumprimento aos normativos que o legislador ordinário criou e que estavam em vigor no ordenamento jurídico, conforme se teria verificado no caso em apreço, não existindo qualquer erro imputável aos serviços que conferisse à Requerente o direito a juros indemnizatórios;
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Nestes termos, concluiu a Requerida que os atos impugnados não padecem dos vícios que lhe foram assacados nem de nenhuns outros, de tal forma que o pedido arbitral deveria ser julgado improcedente por não provado.
I.2 RESPOSTA ÀS EXCEÇÕES
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Muito embora a AT não tenha identificado na sua resposta que se defendia por exceção, a verdade é que a argumentação que realizou incluiu ambos os tipos de defesa. Assim sendo, em 18 de novembro de 2022 foi proferido despacho arbitral no qual se concedeu à Requerente a possibilidade de exercer o contraditório quanto às exceções invocadas pela Requerida na sua resposta. Em 6 de dezembro de 2022, a Requerente exerceu aquele direito tendo referido, em síntese, o seguinte:
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Começou a Requerente por registar que não coloca em causa a natureza de ato destacável que é atribuída aos atos de avaliação de valores patrimoniais. O que está em causa é a possibilidade da Requerente sindicar os atos de liquidação de IMI, na sequência de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa;
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Acresce que, entende a Requerente que não existem quaisquer dúvidas quanto à competência dos tribunais arbitrais para apreciar a (i)legalidade de pedidos de revisão oficiosa tácita ou expressamente, indeferidos pela AT, desde que isso implique, também e antes de mais, a apreciação dos atos de liquidação que lhes estão subjacentes – como é o caso. Pelo que não pode proceder a exceção de incompetência do tribunal, uma vez que restringir ou eliminar essa impugnabilidade constituiria, uma agressão manifesta ao princípio da tutela jurisdicional efetiva, plasmado no art.º 268.º da Constituição da República Portuguesa;
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Invoca ainda a Requerente que, da interpretação conjugada do n.º 1 do artigo 78.º da LGT com o disposto no artigo 115.º, n.º 1, alínea c), do CIMI, resulta que a revisão oficiosa das liquidações deve ser realizada pela administração tributária, ainda que sob impulso inicial do contribuinte, quando tenha ocorrido erro imputável aos serviços. O que se verifica, precisamente, no caso em apreço, erro esse que se traduziu até numa injustiça grave e notória concretizada na fixação de um VPT em valor claramente superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas;
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Quanto à tempestividade, entende a Requerente que tendo apresentado o pedido de revisão oficiosa no dia 29 de dezembro de 2021, a mesma foi apresentada no prazo de três anos prevista no artigo 78.º, n.º 4, da LGT;
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Relativamente à aplicação do disposto no artigo 168.º, n.º 1, do CPA, refere não ser aplicável ao caso. A Requerente que não coloca em causa, a natureza de ato destacável que é atribuída aos atos de avaliação de valores patrimoniais, e, por conseguinte, essa questão não é minimamente controvertida. O que está em causa é a possibilidade da Requerente sindicar os atos de liquidação de IMI, na sequência do indeferimento tácito da revisão oficiosa, ao abrigo do disposto no artigo 115.º do CIMI e do artigo 78.º da LGT;
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Por último, quanto à pronúncia com base na equidade, invoca que o controlo jurisdicional do pedido formulado será realizado com base na apreciação da legalidade do ato de liquidação, conforme resulta do disposto no artigo 2.º do RJAT e não em juízos de equidade;
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Mais invoca a Instrução de Serviço n.º .../2021, de 05.04.2021, da Direção de Serviços de Justiça Tributária da AT, para afirmar que a Requerida não dá cumprimento à mesma.
I.3 REUNIÃO – ARTGO 18.º
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Por despacho proferido em 19 de dezembro de 2022, foi dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAT ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo e da celeridade, simplificação e informalidade processuais, previstos nos artigos 16.º, alínea c) e 29.º, n.º 2, ambos do RJAT, tendo-se ainda concedido às partes a faculdade de, querendo, apresentarem alegações escritas, direito que exerceram, mantendo as posições anteriormente defendidas.
II – SANEAMENTO
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O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 4.º e 5.º, todos do RJAT.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
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O processo não enferma de nulidades.
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Tal como resulta do relatório, a Requerida apresentou parte da sua defesa por excepção, cujo conhecimento será feito logo após a fixação da matéria de facto, que é necessária a parte da sua apreciação.
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O processo não padece de nulidades ou de quaisquer outros vícios que o invalidem, podendo prosseguir-se para a decisão sobre o mérito da causa.
III – DO MÉRITO
III.1. MATÉRIA DE FACTO
III.1.1. Factos provados
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Analisada a prova produzida no âmbito do presente processo, com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:
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A 31 de dezembro de 2017 a Requerente era proprietária de um terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., sob o artigo U- ... .
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A Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa do ato de liquidação de IMI identificado sob o n.º 2017 ... referente ao período de 2017.
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A Requerente procedeu ao pagamento da totalidade do IMI liquidado.
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O pedido de revisão oficiosa deu entrada no Serviço de Finanças Lagoa-... no dia 29 de dezembro de 2021.
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A Requerente solicitou a restituição de 26.529,29€.
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A AT não decidiu o pedido de revisão oficiosa no prazo de 4 meses que dispunha para o efeito até ao dia 29 de abril de 2022, tendo-se formado uma presunção de indeferimento tácito;
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Em 8 de julho de 2022 a Requerente apresentou o pedido de constituição de Tribunal Arbitral que deu origem aos presentes autos.
III.1.2. Factos não provados
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Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.
III.1.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
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Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
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Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram assim selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é definida tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como resulta do artigo 596.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
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Tendo em conta as posições assumidas pelas partes, o disposto nos artigos 110.º, n.º 7 e 115.º, n.º 1, ambos do CPPT, a prova documental e o PPA junto aos autos, consideraram-se provados e não provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
III.2. MATÉRIA DE DIREITO
III.2.1. Questões prévias
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Antes de se analisar o mérito do pedido formulado pela Requerente cumpre apreciar a título prévio a matéria de exceção invocada pela Requerida na sua Resposta, designadamente a consolidação do ato tributário que determinou o VPT, a inimpugnabilidade dos atos de liquidação com fundamento em vícios próprios do ato de fixação do VPT e a intempestividade do pedido de revisão oficiosa.
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Na sua resposta invocou também a Requerida a consolidação do ato tributário que determinou o VPT e a inimpugnabilidade do ato de liquidação com fundamento em vícios próprios do ato de fixação do VPT. Tendo em conta que estas são exceções que estão intrinsecamente ligadas, a sua apreciação será feita de forma conjunta, à semelhança do que fez a Requerente no requerimento que apresentou e no qual exerceu o direito de contraditório.
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Por se tratar de um caso em tudo semelhante, transpomos a fundamentação vertida na Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 718/2022-T, à qual aderimos integralmente e sem reserva quanto à impugnação unitária:
«Quanto a estas excepções, cabe desde logo aferir se o princípio da impugnação unitária, consagrado no artigo 54.º do CPPT, obsta ou não a que sejam discutidas ilegalidades inerentes à determinação do VPT no âmbito da impugnação da legalidade dos actos de liquidação de IMI que lhe são subsequentes.
Do referido princípio decorre que, em regra, os vícios dos actos interlocutórios do procedimento apenas são invocáveis no âmbito da impugnação do acto de liquidação final. Só assim não será nos casos em que os actos interlocutórios produzam um efeito externo imediatamente lesivo na esfera jurídica dos contribuintes, caso em que poderão ser objecto de impugnação contenciosa directa e autónoma.
Um exemplo deste tipo de situações em que os actos interlocutórios representam desde logo um potencial efeito lesivo externo na esfera dos contribuintes é precisamente o acto de fixação do VPT, que ao estabelecer a base de incidência para efeitos de tributação em sede de IMI, implica igualmente consequências no âmbito da liquidação de outros tributos, tais como o AIMI, o Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, o Imposto do Selo ou outros tributos nos quais o VPT pode ser juridicamente relevante, tais como o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares ou o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas.
De resto, a susceptibilidade de impugnação contenciosa directa e autónoma dos actos de fixação do VPT resulta da própria lei, designadamente do disposto no artigo 86.º da LGT e no artigo 134.º do CPPT. Isto ainda que se preveja igualmente que tal possibilidade está dependente do esgotamento dos meios graciosos previstos no respectivo procedimento de avaliação, designadamente do recurso ao mecanismo da segunda avaliação previsto no artigo 76.º do Código do IMI cujo resultado é, nos termos do artigo 77.º daquele mesmo código e do artigo 97.º, n.º 1, alínea f), do CPPT, objecto de impugnação judicial.
Neste sentido pronunciou-se o Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão proferido no âmbito do processo n.º 2765/12.8BELRS, em 31 de Outubro de 2019, no qual se referiu o seguinte:
“[a] fixação do VPT constitui, como se disse, um acto administrativo em matéria tributária, destacável e, por isso, passível de impugnação autónoma. A impugnação autónoma dos actos destacáveis tem como propósito oferecer uma maior garantia aos administrados, permitindo-lhes reagir atempadamente de molde a evitar a produção de efeitos lesivos, que se projectam no acto final do procedimento ou em actos externos a este.
A impugnabilidade autónoma constitui um desvio ao princípio da impugnação unitária (cfr. artigo 54.º do CPPT), que postula que em princípio só é possível impugnar o acto final do procedimento tributário, por só este apresentar efeitos lesivos na esfera jurídica do contribuinte. Este artigo prevê a possibilidade de impugnabilidade autónoma dos actos imediatamente lesivos e a possibilidade de, na impugnação do acto final de liquidação, serem invocados todos os vícios de que padeçam os actos prévios a essa liquidação (actos instrumentais, preparatórios ou prodrómicos dessa decisão final).
Como assim, sendo a fixação do VPT um acto destacável, ele goza de possibilidade de impugnação autónoma, independentemente da existência ou não de liquidação (…)”.
Sem prejuízo do que se referiu, a verdade é que esta excepção ao princípio da impugnação unitária não preclude a possibilidade de impugnação dos vícios dos actos de fixação do VPT (acto interlocutório) no âmbito do acto de liquidação subsequente (acto final do procedimento), tal como ressalva o próprio artigo 54.º do CPPT.
De facto, o que resulta da lei é que os sujeitos passivos podem impugnar os actos de fixação do VPT e não que têm de impugnar esses actos interlocutórios de forma a assegurar a impugnabilidade dos vícios neles constantes no âmbito da impugnação dos actos de liquidação subsequentes. Dito de outro modo, a excepção que a lei consagra ao princípio da impugnação unitária mais não é do que a atribuição aos sujeitos passivos e demais interessados de uma garantia adicional de tutela das respectivas posições jurídicas, possibilitando uma sindicância antecipada de ilegalidades que se poderão repercutir em actos (lesivos) posteriores. O mesmo é dizer que a referida excepção não materializa um ónus de impugnação do acto de fixação do VPT enquanto condição sine qua non à posterior impugnação do acto de liquidação que lhe é subsequente.
Mas ainda que se considerasse que dos artigos 86.º, n.º 2, da LGT e 134.º, n.º 7, do CPPT decorre a consagração de um regime de tutela administrativa prévia, sempre haveria que se considerar que esse ónus apenas se impõe na estrita óptica do acto interlocutório impugnado, porquanto é por referência a este que se consagra aquele regime. Significa isto que a obrigatoriedade de utilização prévia dos meios de tutela administrativos cinge-se à contestação directa e autónoma do acto de fixação do VPT e já não ao acto de liquidação que lhe é subsequente e relativamente ao qual não resulta da lei qualquer limitação quanto à sua impugnação contenciosa.
A este respeito convém recordar que do artigo 185.º do CPA aplicável ex vi artigo 2.º, alínea c), da LGT resulta que as limitações aos princípios da impugnação unitária e da tutela jurisdicional efectiva, no que à imposição de impugnações administrativas necessárias diz respeito, apenas é admitida nos casos expressamente qualificados como tal por lei, como sucede a título de exemplo nos casos de reclamação graciosa necessária previstos nos artigos 131.º a 133.º-A do CPPT. Isto sem contar que a regra no contencioso administrativo e, por aplicação subsidiária, no contencioso tributário, por força do disposto no artigo 51.º, n.º 3, do CPA aplicável ex vi artigo 2.º, alínea c), da LGT, é a de que a impugnação de actos interlocutórios tem um carácter facultativo, não ficando precludida a impugnação do acto final do procedimento com base em vícios do acto intermédio.
Conclusão esta que é certificada pela previsão do princípio da impugnação unitária no artigo 54.º da LGT, onde se refere de forma expressa e inteligível que em certos casos os actos interlocutórios do procedimento são susceptíveis de impugnação contenciosa “sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida”.
Entendimento diverso resultaria numa clara diminuição das garantias dos contribuintes, já que a pretexto do reforço da tutela jurisdicional efectiva concretizado pela sindicância antecipada de ilegalidades do procedimento, aqueles acabariam por ver limitada a possibilidade de impugnação do acto final do procedimento. De facto, se a “discussão antecipada da legalidade” do acto interlocutório de fixação do VPT não for entendida como uma faculdade mas antes como um efectivo ónus de impugnação, ao qual está associado um efeito preclusivo da sindicância futura dessas ilegalidades, o legislador não estaria a excepcionar a ratio subjacente à previsão do princípio da impugnação unitária de forma a assegurar e incrementar a tutela jurisdicional efectiva, bem pelo contrário.
É que convém não esquecer que o prazo de impugnação do acto de fixação do VPT é substancialmente inferior ao prazo para impugnar o acto final de liquidação. E se o objectivo do legislador era encurtar aquele prazo de forma a consolidar na ordem jurídica o acto de fixação do VPT, tornando-o inimpugnável, por via da formação de caso decidido, seria incoerente a previsão no artigo 115.º, do Código do IMI da possibilidade de requerer a revisão oficiosa do acto de liquidação com base em “erro de que tenha resultado colecta de montante diferente do legalmente devido”, onde se inclui, como se verá, o erro na fixação da base tributável, isto é, na fixação do VPT.
De forma algo similar ao que se deixou exposto, considerou o Tribunal Arbitral no acórdão proferido no âmbito do processo n.º 760/2020-T, em 22 de Julho de 2021, o seguinte:
“A nosso ver, a questão não é a de saber se a lei configura a fixação do VPT como um ato destacável, prevendo a sua impugnação judicial autónoma – o que é um facto –, mas sim saber se existem razões que obstem a que tal ato, quando surja como instrumental relativamente a um ato de liquidação, possa, também, ser objeto de apreciação em processo dirigido à impugnação desta. Há, pois, que ponderar sobre a ratio das normas que preveem a impugnabilidade judicial autónoma de atos administrativos que constituem pressuposto de outros atos administrativos.
Estas razões serão, essencialmente, três:
(i) O ato ser imediatamente lesivo, produzir diretamente efeitos negativos na esfera do particular, o que não é o caso, pois a ablação do património pela via do imposto só acontece após a prática de um ato de liquidação.
(ii) A sindicância judicial imediata oferecer maiores garantias ao particular: é o caso, desde logo porquanto o decidido em tal recurso produzirá efeitos de caso julgado relativamente a todas as liquidações que tiverem por base o VPT impugnado.
Está, pois, presente uma intencionalidade garantística (consagração de meio de garantia mais abrangente) e não um intuito de restrição dos normais meios de garantia, como resultaria do acolhimento do pensamento sufragado pela Requerida)
(iii) Previsão legal de um “filtro” pré-judicial que possa contribuir para reduzir o número de casos que os tribunais sejam chamados a apreciar, quando a decisão dependa essencialmente de conhecimentos técnicos próprios de outras áreas do saber, que não a jurídica (o “filtro” aqui existe - a segunda avaliação dos prédios urbanos).
Porém, atenta a razão de ser destes sistemas, há que entender que a previsão da impugnabilidade direta e imediata, em processo a tal diretamente dirigido, do «resultado das segundas avaliações», como diz a lei, só se mostra «indispensável» quando esteja em causa o resultado da aplicação da lei (das normas que regulam o procedimento de avaliação) num caso concreto, pois é em tal aplicação que poderão estar envolvidos conhecimentos técnicos, não jurídicos, e não, como acontece no presente caso, quando esteja em causa a determinação da lei aplicável à avaliação. Esta é uma questão exclusivamente jurídica, para a qual, por definição, um tribunal é mais qualificado para a precisar que uma comissão de peritos avaliadores.”.
Aqui chegados, conclui-se que assistia à Requerente a faculdade de impugnar directa e autonomamente os diversos actos de avaliação que fixaram o VPT dos terrenos para construção objecto dos presentes autos, como também lhe assistia a faculdade de impugnar os actos de liquidação de IMI emitidos com base nos VPT’s anteriormente fixados, aí arguindo os vícios próprios destes últimos actos que inquinaram o acto final de liquidação que neles se baseou.
Nestes termos, julgam-se improcedentes as excepções dilatórias invocadas pela Requerida na sua resposta a este respeito, consideram-se admissível a impugnação dos actos de liquidação de IMI com base em vícios próprios dos actos de determinação do VPT».
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Cumpre ainda apreciar se a Requerente podia ou não ter impulsionado a revisão dos atos de liquidação de IMI ora contestados com fundamento em erro imputável aos serviços nos termos do artigo 78.º, n.º 1, da LGT.
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Certo é que já se encontra devidamente consolidado na jurisprudência que a imputabilidade de erro aos serviços é independente da demonstração de culpa dos seus funcionários, por todos o Acórdão do STA de 12 de dezembro de 2001, proferido no recurso n.º 26233.
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Havendo um erro de direito na liquidação e sendo ela efetuada pelos serviços, é à AT que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte, o que é o caso.
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Igualmente por se tratar de um caso em tudo semelhante, transpomos a fundamentação vertida na Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 718/2022-T, à qual aderimos integralmente e sem reserva ainda a título de exceção quanto à intempestividade da revisão oficiosa, que apenas podia ter sido impulsionado pela Requerente nos três anos posteriores ao do ato tributário:
«Enquanto ponto de partida, cumpre desde logo referir que a possibilidade de impulsionar a revisão oficiosa de actos de liquidação de IMI se encontra prevista no artigo 115.º do Código do IMI, que para além de remeter genericamente para o artigo 78.º da LGT, determina expressamente na alínea c), do n.º 1, que a revisão pode ter fundamento em “erro de que tenha resultado colecta de montante diferente do legalmente devido”.
Ora, na medida em que se concluiu anteriormente pela possibilidade de sindicar vícios na fixação do VPT no âmbito da impugnação do acto de liquidação subsequente, independentemente de ter sido autonomamente impugnado aquele acto interlocutório, verifica‑se que a Requerente podia, em abstracto, impulsionar a revisão dos actos de liquidação de IMI, com fundamento em erro imputável aos serviços, no prazo de 4 anos, nos termos previstos no artigo 78.º, n.º 1, da LGT. Registe-se a este respeito que os erros alegados pela Requerente e que se traduzem na aplicação de coeficientes multiplicadores de afectação, de localização e/ou de qualidade e conforto nas avaliações do VPT dos terrenos para construção, são erros que a serem julgados procedentes são unicamente imputáveis aos serviços, porquanto foi a AT que procedeu ao apuramento do VPT de cada um daqueles prédios urbanos, conforme resulta da matéria de facto dada como provado nos presentes autos.
A este respeito, vejam-se as considerações do Tribunal Central Administrativo Sul, no acórdão proferido no âmbito do processo n.º 2765/12.8BELRS, em 31 de Outubro de 2019, no qual se considerou em sentido similar o seguinte:
“(…) ciente da natureza agressiva das leis fiscais, que afectam coercivamente o património dos contribuintes, criou válvulas de escape para as situações de ilegalidade, permitindo que a própria Administração reveja as suas decisões, a fim de corrigir as ilegalidades que porventura tenha cometido.
É o que sucede com o artigo 78.º da LGT, que prevê a possibilidade de revisão dos actos tributários com fundamento em ilegalidade ou erro, mecanismo que se encontra presente na legislação tributária de outros países, como sucede em Espanha com o artigo 219.º da Ley General Tributária.
O artigo 78.º da LGT consagra um verdadeiro direito do contribuinte, permitindo‑lhe exigir da administração tributária que expurgue da ordem jurídica, total ou parcialmente, um acto ilegal, bem como a restituição do que tenha sido ilegalmente cobrado, com base no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, que não permite a cobrança de tributos, nem os respectivos montantes, que não estejam previstos na lei.
Todavia, como já se disse, o artigo 78.º é inaplicável aos actos de fixação do VPT (actos administrativos em matéria fiscal), na medida em que visa apenas os actos tributários stricto sensu, incluindo o acto de determinação da matéria tributável, quando não dê lugar à liquidação e qualquer tributo(2). O que não quer dizer que seja de todo imprestável para o caso sub judice, visto que a coberto de um VPT ilegal foram produzidas liquidações de tributo (IMI) que foram exigidas à recorrida.
Ora, ultrapassada que está actualmente a questão de saber se a iniciativa de revisão pela administração pode ser desencadeada a impulso do interessado, da interpretação conjugada do n.º 1 do artigo 78.º da LGT com o disposto no artigo 115.º, n.º 1, alínea c), do CIMI, resulta que a revisão oficiosa das liquidações deve ser realizada pela administração tributária, ainda que sob impulso inicial do contribuinte, quando tenha ocorrido erro imputável aos serviços.
O que se verifica, precisamente, no caso em apreço, erro esse que se traduziu até numa injustiça grave e notória concretizada na fixação de um VPT em valor claramente superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas.”. (destaque nosso)
Em face do exposto, e na medida em que o prazo para a revisão dos actos de liquidação de IMI deve ser contado nos termos conjugados do artigo 78.º, n.º 1, da LGT e 129.º, n.º 2, do Código do IMI, verifica-se que ainda não tinha decorrido o prazo de 4 anos para a Requerente impulsionar a revisão dos actos de liquidação objecto do pedido de revisão oficiosa. Consequentemente, verifica-se que o pedido de pronúncia arbitral também foi apresentado dentro do prazo previsto para o efeito, sendo assim improcedente a excepção dilatória invocada pela Requerida a este respeito».
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Cumpre, deste modo, aferir a legalidade do ato de liquidação de IMI contestado pela Requerente, tendo para o efeito em conta que o VPT dos respetivos terrenos para construção foi determinado pela AT através da aplicação de coeficientes de afetação, de localização e/ou de qualidade e conforto.
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Por se tratar de um caso em tudo semelhante, transpomos a fundamentação vertida na Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 718/2022-T, à qual aderimos integralmente e sem reserva:
«À data dos factos, previa-se no artigo 38.º, n.º 1, do Código do IMI que “[a] determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços resulta da seguinte expressão: Vt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv, em que: Vt = valor patrimonial tributário; Vc = valor base dos prédios edificados; A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação; Ca = coeficiente de afectação; Cl = coeficiente de localização; Cq = coeficiente de qualidade e conforto; Cv = coeficiente de vetustez”. Pelo contrário, quanto aos prédios urbanos qualificados como terrenos para construção, determinava-se no artigo 45.º, n.º 1, do Código do IMI que “O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação”.
Do regime jurídico previsto para cada um dos referidos “tipos” de prédios urbanos resultava que só o VPT dos prédios para habitação, comércio, indústria e serviços é que era determinado através de uma fórmula que previa a aplicação de coeficientes de afectação, de localização, de qualidade e conforto e/ou de vetustez. Quer isto dizer que, à data dos factos, não se previa a aplicabilidade daqueles coeficientes para os terrenos para construção. Conclusão esta que é certificada pelo facto de a Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, ter alterado a redacção do artigo 45.º do Código do IMI de forma a prever expressamente a aplicação de alguns daqueles coeficientes no apuramento do VPT dos terrenos para construção.
De resto, é pacífico na jurisprudência que este era o regime vigente à data, tendo o STA uniformizado jurisprudência através do acórdão proferido no âmbito do processo n.º 0183/13, em 21 de Setembro de 2016, no qual se decidiu que:
“(…) na determinação do seu valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tem aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38º do CIMI onde expressamente se prevê, entre outros o coeficiente, aqui discutido, de qualidade e conforto relacionado com o prédio a construir. O que, faz todo o sentido e dá coerência ao sistema de tributação do IMI uma vez que os coeficientes previstos nesta fórmula só podem ter a ver com o que já está edificado, o que não é o caso dos terrenos para construção alvo de tributação específica, sim, mas na qual não podem ser considerados para efeitos de avaliação patrimonial factores ainda não materializados”.
O entendimento expresso neste acórdão, que versou sobre a aplicabilidade do coeficiente de qualidade e conforto, foi posteriormente confirmado por diversos acórdãos daquele Tribunal que versaram sobre os demais coeficientes previstos no artigo 38.º do Código do IMI, de que é exemplo o acórdão proferido no âmbito do processo n.º 0170/16.6BELRS, em 23 de Outubro de 2019.
Por fim, regista-se que esta inaplicabilidade é defendida pela AT no artigo 4.º da sua resposta, onde refere que “Importa desde já clarificar que a Autoridade Tributária acolheu o entendimento preconizado pelos tribunais superiores no sentido que na determinação do VPT dos terrenos para construção, releva a regra específica constante do artigo 45.º do CIMI e não outra, pelo que não devem ser considerados os coeficientes previstos na expressão matemática do artigo 38.º do CIMI, tais como os coeficientes de localização, de afetação, de qualidade e conforto”.
Em face do exposto, julga-se verificada a ilegalidade invocada pela Requerente, impondo-se a anulação parcial dos actos de liquidação de IMI contestados nos presentes autos».
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A própria Requerida emitiu a seguinte Instrução de Serviço n.º .../2021, de 05 de abril de 2021, da Direção de Serviços de Justiça Tributária da AT:
«- a intenção de a AT adaptar a sua atuação à jurisprudência do STA e dos tribunais centrais administrativos no que concerne à determinação do VPT dos terrenos para construção a qual deve ser efetuada de acordo com a regra constante do artigo 45.º do Código do IMI, não podendo ser considerados os coeficientes previstos no artigo 38.º do Código do IMI, como os coeficientes de localização, de afetação, de qualidade e de conforto;
- nos processos e procedimentos pendentes, assim consideradas as situações de litígio entre os contribuintes e a administração tributária (...) a AT profira despacho favorável ao contribuinte nos procedimentos de contencioso administrativo pendentes de decisão e promova, nos termos e nos prazos previstos no artigo 112.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pela revogação do ato impugnado nos processos de impugnação judicial, bem assim que na pendência da impugnação judicial observe o que resulta da «Instrução n.º 15 – Divulgação de entendimento quanto à revisão oficiosa de ato tributário impugnado judicialmente»;
- que seja proferida decisão favorável aos contribuintes nos processos e procedimentos pendentes, nos termos explicitados, e que seja promovida a correção (anulação parcial) dos atos de liquidação que constituem o objeto do litígio entre os contribuintes e a administração tributária (…), cumprindo o desígnio legal de “reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado”, conforme disposto no artigo 100.º da Lei Geral Tributária».
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Constata-se, assim, que o teor e alcance desta Instrução de Serviço foram totalmente ignorados pela Requerida, pelo menos no domínio do presente processo arbitral.
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Pelo que, julga-se procedente a pretensão do Requerente estando a AT obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio.
IV – JUROS INDEMNIZATÓRIOS
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Nos termos do disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito», de acordo com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
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O n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao estabelecer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
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Este entendimento decorre do princípio da tutela jurisdicional efetiva e da correspondente ampliação dos poderes conformadores da jurisdição administrativa e tributária. Por isso, a Requerente tem o direito de ser reembolsada do imposto pago e juros indemnizatórios por força dos referidos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».
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O pedido de revisão do ato tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo n.º 0402/06.
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Também se refere no mesmo acórdão que «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º, n.º 3, da LGT».
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Este regime justifica-se pela falta de diligência do contribuinte em apresentar reclamação graciosa ou pedido de revisão no prazo desta, como se prevê no n.º 1 do artigo 78.º da LGT.
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No caso que nos prende, a norma à face da qual tem de ser aferida a existência de direito a juros indemnizatórios é a alínea c) deste n.º 3 do artigo 43.º da LGT, que estabelece que eles são devidos «quando a revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte se efetuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária».
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Como releva dos Factos Provados o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 29 de dezembro de 2021, pelo que apenas a partir de 30 de dezembro de 2021 haverá direito a juros indemnizatórios, porquanto o pedido não foi apreciado.
V – DECISÃO
Termos em que se decide julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente e, em consequência:
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Anular parcialmente o ato de liquidação de IMI objeto de impugnação nos termos acima evidenciados;
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Condenar a Requerida à restituição do imposto pago em excesso e ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º n.º 3 da LGT.
VI – VALOR DO PROCESSO
Atendendo ao disposto no artigo 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 26.529,29€.
VII – CUSTAS
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 1.530,00, a cargo da Requerida, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 31 de janeiro de 2023.
Ana Pinto Moraes
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