Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 202/2022-T
Data da decisão: 2023-01-30  IRS  
Valor do pedido: € 95.876,80
Tema: IRS; artigo 12.º- A do CIRS; o regime fiscal dos ex-residentes.
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SUMÁRIO:

I. A litispendência pressupõe a repetição da mesma ação em dois processos, dependendo da verificação cumulativa da identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir, de modo a evitar contradizer ou reproduzir decisão anterior.

II. O artigo 12.º-A do Código do IRS estabelece uma medida excecional de caráter automático, não estando a sua aplicação dependente de qualquer ato de reconhecimento por parte da AT. Porém, depende da declaração do sujeito passivo de beneficiar do regime, o que será feito aquando do preenchimento do modelo 3 da declaração de IRS do ano seguinte ao ano de regresso a Portugal.

III. O sujeito passivo para beneficiar deste benefício fiscal estabelecido no artigo 12.º -A, além de ter sido residente em território português antes de 31 de dezembro de 2015, ter a sua situação tributária regularizada, também terá de não ter sido residente em território português em qualquer dos três anos anteriores ao ano de regresso a Portugal e não ter solicitado a sua inscrição como residente não habitual.

 

***

I - RELATÓRIO 

A..., nacionalidade portuguesa, residente na Rua ..., n.º ..., ...-... Lisboa, portador do cartão do cidadão n.º ..., e do número de identificação fiscal (NIF)..., ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes do RJAT, apresentar Pedido de Pronúncia Arbitral visando a declaração de ilegalidade e anulação dos atos de liquidação de IRS com o n.º 2021 ... e 2021 ... referentes ao ano de 2020, no valor de 95 876,80, bem como do ato de indeferimento da reclamação graciosa apresentada 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 25-07-2022.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Tendo na mesma data sido notificadas, as partes dessa designação, não tendo estas manifestado vontade de a recusar. 

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo foi constituído em 31-05-2022. 

A AT, devidamente notificada para o efeito, em 30-06-2022 apresentou a sua resposta defendendo-se por exceção e impugnação, tendo ainda junto o PA.

Por despacho de 15-07-2022 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e facultando às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas no prazo simultâneo de 20 dias, contados da notificação do mencionado despacho.

A 21-09-2022 a Requerente e apresentou as alegações escritas, e que em síntese “que deve ser declarada a ilegalidade dos atos de liquidação de IRS referentes ao ano de 2020 os quais devem, consequentemente, ser anulados, bem como do ato de indeferimento da reclamação graciosa contra eles apresentada, na medida em que não refletem o regime fiscal aplicável a ex-residentes, constante do artigo 12.º-A do Código do IRS, do qual o Requerente beneficia, tudo com as demais consequências legais”. 

Em 21-09-2022 a Requerida apresentou as suas alegações escritas em que defende que deve ser “julgada procedente a exceção dilatória de litispendência invocada e absolvida a Requerida da instância ou se assim não se entender ser julgado improcedente o pedido de pronúncia arbitral, tudo com todas as legais consequências, ou se assim não se entender, ser suspensa a instância até ser conhecida a decisão no processo n.º 863/21.6BELRS que corre termos no Tribunal Tributário de Lisboa”.

Em 30-11-2022 foi proferido despacho arbitral a prorrogar o prazo para prolação da decisão arbitral nos termos doa artigo 21.º, n.º 2 do RJAT.

 

II - MATÉRIA DE FACTO

II.1. Factos provados

 

Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

A. O Requerente foi notificado de duas demonstrações de liquidação de IRS, referentes ao ano de 2020: 

Liquidação n.º 2021..., no montante de € 782,33, com prazo para pagamento voluntário até 31 de agosto de 2021 – cfr. doc. n.º 1, junto com o PPA; 

Liquidação n.º 2021..., referente à parte do ano no qual o Requerente foi residente em Portugal, e no âmbito da qual foi apurado um reembolso no valor de € 9.903,24 - cfr. doc. n.º 2, junto com o PPA. 

B. Não concordando com as liquidações supra mencionadas, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa sobre as mesmas que foi convolada em reclamação graciosa pela AT – cfr. doc. n.º 3 junto com o PPA

C. A reclamação foi indeferida por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa –..., em 21 de dezembro de 2021 e notificado ao ora Requerente em 29 de dezembro de 2021. 

D. A 1 de junho de 2021, o Requerente submeteu no Portal das Finanças a sua declaração Modelo 3, na qual optou pela tributação no âmbito do “Programa Regressar” e, mais concretamente, do regime fiscal aplicável a ex-residentes, contemplado no artigo 12.º - A do Código do IRS. 

E. O Requerente foi residente fiscal em Portugal até ao final de maio de 2017, 

F. Nos primeiros meses do ano de 2017, o Requerente recebeu uma proposta de trabalho, para exercer a sua profissão na empresa ‘B..., S.A.U.’, sita em ..., Espanha, a qual aceitou – cfr. cópia do contrato de trabalho que se junta como doc. n.º 5 junto com o PPA.

G. O Requerente foi contratado para trabalhar presencialmente, nas instalações da sua entidade empregadora, a tempo inteiro e a partir do dia 19 de junho de 2017 – cfr. cláusulas primeira, terceira e quarta, respetivamente, do contrato como doc. n.º 5 junto com o PPA. 

H. O Requerente emigrou para Espanha, juntamente com a sua mulher e filhos. 

I. O Requerente deixou Portugal juntamente com a sua família, em 26 de maio de 2017, cfr. doc. 6 junto com o PPA.

J. O requerente passou os primeiros dias da sua permanência em Espanha no Hotel..., a expensas da sua nova entidade patronal – cfr. doc. n.º 7 junto com o PPA

K. O Requerente alterou junto da AT a sua residência fiscal para Espanha em 1 de julho de 2017. Cfr. artº 59 do PPA.

L. O Requerente solicitou a emissão de Número de Identificação de Estrangeiros espanhol e, bem assim, a sua inscrição no sistema de Segurança Social espanhol – cfr. docs. n.º 10 e 11 junto com o PPA.

M. O Requerente foi tributado em Espanha pelos rendimentos auferidos nos anos de 2017, 2018 e 2019, que se juntam como doc. n.º 12 junto com o PPA.

N. O 16 de agosto de 2020 comunicou à Agência Tributária do Ministerio de Hacienda, (España) o fim da sua deslocação para território Espanhol. – cfr. doc. n.º 13 junto com o PPA. 

O. E, procedeu à alteração da sua residência fiscal para Portugal em 12 de setembro de 2020 e tem a sua situação tributária regularizada. Cfr. art.º 19 do PPA e art.º 5 da Resposta e doc. n.º 18 junto com o PPA.

P. O Requerente relativamente aos rendimentos sujeitos a IRS do ano de 2020, submeteu duas declarações de IRS, uma referente ao período em que não residiu em Portugal e uma segunda declaração relativa ao período em que residiu em Portugal. Cfr. docs. a págs. 99 a 112 do PA e artº 10 da Resposta.

Q. Nessas declarações o Requerente assinalou no Anexo A, o campo 4-E “Regime Fiscal Aplicável a Ex-residentes” (Artigo 12.º-A do CIRS), para oficializar o seu pedido a ser tributado no âmbito do respetivo regime fiscal. Cfr. art. 22 do PPA  docs. a págs. 99 a 112 do PA e artº 10 da Resposta.

 R. No ano de 2020, o Requerente auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor de 191.753,60 €.

S. A 4 de junho de 2021, o Requerente recebeu uma carta, seguida de um e- mail, ambos da Autoridade Tributária com a seguinte informação (Docs.  n.º 14 e 15 juntos com o PPA, com o seguinte teor: 

“Na sua declaração Modelo 3 de IRS submetida via internet, verificou-se a ocorrência, após validação central, dos seguintes erros: 

Z10 – regime fiscal ex residente não permitido – reside em PT últimos 3A” 

T. Foi então comunicado que o Requerente deveria submeter uma nova declaração suprir as divergências evidenciadas na Modelo 3 de IRS previamente entregue, mas desta vez não invocando a aplicação do artigo 12.º-A do CIRS, para evitar que o sistema da AT voltasse a gerar erro na declaração. 

U. O Requerente atendeu ao conteúdo da notificação do Serviço de Finanças e corrigiu a declaração Modelo 3), não assinalando no Anexo A, o campo 4-E “Regime Fiscal Aplicável a Ex-residentes (Artigo 12.º-A do CIRS)” (docs. n.os 16 e 17 juntos com o PPA)

W. Em 2020-09-07, o Requerente submeteu junto da Direção de Serviços do IRS pedido de informação vinculativa para saber se a sua situação, respeitante ao ano de 2020, era enquadrável no regime constante do artigo 12.º-A do CIRS – Regime fiscal aplicável a ex-residentes. Cfr. artº 6.º da Resposta. 

X. O Requerente foi informado, em janeiro de 2021, que “face à situação constante da base de dados dos serviços da AT, ao caso em apreço, por o Requerente ter sido residente, ainda que parcialmente, não reúne os pressupostos do regime fiscal dos ex- residentes, porque não verifica a condição de não ter sido ‘Não Residente’ nos três anos anteriores a 2020, pelo que este regime de benefício não lhe é aplicável.” 

Y. O Requerente impugnou a informação vinculativa, nos termos alínea c) do n.º 20 do artigo 68.º do artigo da Lei Geral Tributária (LGT), correndo atualmente termos no Tribunal Tributário de Lisboa (UO 3) ação administrativa com o n.º 863/21.6BELRS, na qual o Requerente solicita a anulação da informação vinculativa e sua substituição “por outra que reconheça o direito do Autor a beneficiar do regime fiscal aplicável a ex-residentes, constante do artigo 12.º- A do Código do IRS”. Cfr. artº 9 da Resposta.

 

II.2. Factos não provados

Não existem factos essenciais não provados, uma vez que todos os factos relevantes para a apreciação da competência material do Tribunal foram considerados provados. 

 

II. 3. Fundamentação da decisão da matéria de facto 

 

Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, a) e e), do RJAT).

No que se refere à matéria de facto dada como provada, a convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas Partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa e, portanto, admitidos por acordo, bem como na análise crítica da prova documental que consta dos autos, designadamente os documentos juntos pela Requerente, cuja correspondência à realidade não é contestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Não se deram como provadas nem como não provadas alegações feitas pelas partes, com natureza meramente conclusiva, ainda que tenham sido apresentadas como factos, por serem insuscetíveis de comprovação, sendo que o seu acerto só pode ser aferido em confronto com a fundamentação da decisão da matéria jurídica.

 

III – SANEAMENTO

 

O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5 e 6, n.º 2, alínea a), do RJAT. 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março. 

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa. 

 

IV – Matéria de direito

IV. 1. Exceção da litispendência

 

Invoca a Requerente a exceção dilatória da litispendência considerando que Requerente já havia submeteu à AT, através de PIV, a questão sobre a sua aptidão para se prevalecer do regime aplicável a ex-residentes ao seu IRS de 2020. 

E que, perante a resposta negativa da AT, o Requerente dela interpôs recurso contencioso, nos termos do artigo 20.º do artigo 68.º da LGT, através de ação administrativa especial com vista a condenar a AT a emitir informação vinculativa consonante com qualificação jurídico-tributária constante do PIV. 

O Requerente notificado para se pronunciar sobre esta exceção referiu: “é ainda de improceder a exceção de litispendência arguida pela AT na sua resposta, nos termos oportunamente explicitados pelo Requerente”. 

A exceção dilatória da litispendência obsta ao conhecimento do mérito da causa e implica a absolvição da Requerida da presente instância, nos termos do disposto no artigo 577.º, i) e 278.º, n.º 1, e) do CPC, pelo que se torna necessário analisar a sua procedência a qual terá consequências no conhecimento do mérito do pedido arbitral. E estas normas do Código de Processo Civil são aplicáveis ao processo arbitral tributário, ex vi da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT. 

7. A exceção da litispendência nos termos do n.º 1 do artigo 581.º do CPC ex vi do artigo 29.º e) do RJAT, pressupõe a repetição de uma causa: se uma causa se repete estando a anterior ainda em curso, há lugar à litispendência. 

 

Vejamos.

Considerando os dados disponíveis segundo a informação carreada para os autos pela Requerida, “o Requerente impugnou a informação vinculativa, nos termos alínea c) do n.º 20 do artigo 68.º do artigo da Lei Geral Tributária (LGT), correndo atualmente termos no Tribunal Tributário de Lisboa (UO 3) ação administrativa com o n.º 863/21.6BELRS, na qual o Requerente solicita a anulação da informação vinculativa e sua substituição “por outra que reconheça o direito do Autor a beneficiar do regime fiscal aplicável a ex-residentes, constante do artigo 12.º- A do Código do IRS”. A litispendência pressupõe a repetição da mesma ação em dois processos, dependendo da verificação cumulativa da identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir, de modo a evitar contradizer ou reproduzir decisão anterior.

Os sujeitos em ambos os processos são os mesmos. 

O pedido e a causa de pedir não são idênticos, dado que no Processo que corre os seus termos no Tribunal Tributário de Lisboa, ação administrativa com o n.º 863/21.6BELRS o ora Requerente pede a anulação da informação vinculativa “sobre a sua aptidão para se prevalecer do regime aplicável a ex-residentes ao seu IRS de 2020”.

Nos presentes autos o Requerente pede a anulação dos atos de liquidação de IRS referentes ao ano de 2020, bem como do ato de indeferimento da reclamação graciosa contra eles apresentada.

Assim sendo, temos de concluir que improcede a exceção de litispendência, e, igualmente, o pedido de suspensão por causa prejudicial.

Termos em que improcede a alegada exceção de litispendência.

 

IV. 2. Aplicação do estatuto de ex-residente previsto no artigo 12.º -A do IRS

 

thema decidendum refere-se ao procedimento a adotar na determinação do quantitativo dos rendimentos líquidos sujeitos a imposto, tendo em consideração o estatuto de ex-residente do Requerente, previsto com o artigo 12.º-A, do Código do IRS.

 

O Requerente entende que reúne todos os pressupostos mencionados no corpo do n.º 1 e nas alíneas a), b) e c) da norma vinda de citar, pareceu-lhe, aquando do seu regresso a Portugal, que deveria beneficiar do regime fiscal para ex-residentes ali previsto já a partir de 2020, ano durante o qual voltou a ser residente em Portugal”.

E isto porque, “deixou de ser residente em Portugal em 26 de maio de 2017 e regressou a Portugal em 15 de agosto de 2020, data em que voltou a ser residente em Portugal, tendo alterado a sua residência fiscal em conformidade, em 12 de setembro de 2020”. O Requerente perdeu a qualidade de residente em Portugal em 26 de maio de 2017, último dia da sua permanência em território nacional, ao abrigo do disposto no artigo 16.º, n. 4 do Código do IRS.

E acrescenta que “foi tributado em Espanha pelos rendimentos auferidos durante todo o tempo em que foi residente nesse país, como evidenciam as declarações de rendimentos apresentadas em Espanha, relativamente aos anos de 2017, 2018 e 2019”.

“Em todo o caso, e ainda que assim não se entenda, o que só por dever de patrocínio se cogita, sem conceder, o Requerente continua a não satisfazer o critério estabelecido na alínea a), do n.º 14, do artigo 16.º do Código do IRS, para que tenha que ser considerado residente em Portugal durante a totalidade do ao de 2017. 

Com efeito, somando todos os dias desde 1 de janeiro de 2017 a 1 de julho de 2017, conclui-se que o Requerente terá passado, no máximo, 181 dias em território português nesse ano. 

Assim, claramente que, para efeitos do critério supra mencionado, o Requerente não pode vir a ser considerado residente fiscal em Portugal durante a totalidade do ano em que emigrou para Espanha. 

Adicionalmente, é também incontestável que o Requerente não deve ser considerado residente fiscal nos termos da alínea b), do n.º 14 do artigo 16.º do Código IRS”. 

Não que o Requerente não cumpra o que aí se dispõe; com efeito, resulta largamente dos Factos, que o Requerente emigrou com a sua família essencialmente por motivos profissionais, tendo auferido rendimentos do trabalho dependente derivados do contrato de trabalho junto como doc. n.º 5 em anexo, que seriam sujeitos a tributação em Portugal em 2017, caso este tivesse mantido a sua residência neste território. 

Todavia, a alínea a), do n.º 15 do artigo 16.º do Código do IRS dita que o disposto na alínea b) do n.º 14 do mesmo artigo não é aplicável quando os rendimentos a que se refere sejam tributados por um imposto sobre o rendimento idêntico ou substancialmente similar ao IRS aplicado devido ao domicílio ou residência, designadamente, noutro Estado membro da União Europeia. 

Ora, como se demonstrou, o Requerente, enquanto residente fiscal em Espanha, foi aí tributado em sede de Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas (IRPF) – o correspondente ao IRS português – não só em 2017, como nos anos que se lhe seguiram – cfr. doc. n.º 12 já em anexo. 

Assim, do exposto resulta que, não se encontrando verificados os pressupostos para a aplicação dos n.os 14 e 16 do artigo 16.º do Código do IRS, nenhum motivo existe para que o Requerente seja considerado como residente fiscal em Portugal durante a totalidade do ano de 2017”. 

A Requerida defende que “Na base das liquidações impugnadas e, bem assim, da decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa deduzida, está o entendimento de que o Requerente não poderia aproveitar o regime previsto no artigo 12.º-A do CIRS no período de 2020, tendo sido residente num dos três anos anteriores – o termo “ano” aqui entendido como “ano fiscal”.

E continua alegando: “Já a pretensão do Requerente assenta numa interpretação do artigo 12.º-A do CIRS segundo a qual o termo “ano” é ali empregue como medida de tempo, correspondendo os “três anos” a um período de 36 meses.

Na verdade, o termo “ano”, quando é antecedido de preposição “de” ou “em”, como é o caso, refere-se a um concreto ano, que corresponde a um ano civil do calendário gregoriano, e não a uma medida de tempo

E assim é que uma interpretação literal da norma legitima a interpretação que subjaz às liquidações impugnadas, pela utilização da expressão «em qualquer dos três anos anteriores em que o termo «ano» é antecedido de preposição “de” ou “em”, remetendo assim para um eventual estatuto de residente que se tenha verificado em momento incluído num dos três anos anteriores, entendidos estes como um ano civil do calendário gregoriano. 

Em todo o caso, se admitirmos, por deferência ao Requerente, que a letra desta norma poderá suscitar ambiguidade, designadamente no segmento que se refere aos «três anos anteriores», ainda assim o elemento lógico e sistemático da norma rapidamente nos esclarece sobre o sentido que ela incorpora. 

Desde logo porque, determinando o artigo 143.º do Código do IRS (com a epígrafe “Ano Fiscal”) que «Para efeitos do IRS, o ano fiscal coincide com o ano civil», o sentido que autorizadamente se poderá dar à utilização do termo “ano” nas normas que regem o IRS não poderá deixar de coincidir com o “ano fiscal” e, consequentemente, com o ano civil

E, assim, quando a condição para aplicação do regime diz que o sujeito passivo não pode ter sido residente “em qualquer dos três anos anteriores”, não se poderá deixar de interpretar como “não pode ter sido residente num dos três anos civis anteriores”. 

In casu, regressando em 2020, não poderia o Requerente ter tido o estatuto de residente fiscal nos anos de 2017, 2018 e/ou 2019, se quisesse aproveitar o regime previsto no artigo 12.º-A do CIRS. 

Acresce que, nos termos do n.º 8 do artigo 13.º do Código do IRS, a condição de residente, relevante para efeitos do IRS (logicamente, também, para efeitos do regime do artigo 12.º-A) «é aquela que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeite». 

O que inculca que, também à luz desta norma, a determinação do estatuto de residente “em qualquer um dos três anos anteriores” se reportará ao que se verificar no último dia daqueles anos, independentemente, portanto, do exato dia em que, no decurso desse ano, obteve o estatuto de residente. 

Por outro lado, e ao contrário do que aqui preconiza o Requerente, é também evidente que, quando se quer referir a períodos de 12 meses, o legislador não utiliza o termo “ano”, mas utiliza textualmente a expressão “período de 12 meses” – o que se compreende, sob pena de atentar contra a «unidade do sistema jurídico» (cfr. artigo 9.º do Código Civil) por inextrincável confusão com o termo “ano fiscal” definido no artigo 143.º do Código do IRS. 

É assim que, nos termos do artigo 16.º do Código do IRS, são considerados residentes «as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos: a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;» (negritos nossos) 

Sendo normativamente evidente, desde logo por aplicação do artigo 143.º do CIRS, que a alusão a determinado “ano” no CIRS, antecedido portanto das preposições “de” e “em”, corresponde a um ano civil, e não a um período de 12 meses (caso em que “ano” é antecedido, expressa ou implicitamente, da preposição “durante” e a indicação do número de anos), poderemos invocar variadíssimos exemplos que o confirmam, o que passamos a fazer sem preocupações de exaustividade: 

«Artigo 10.º 

[...]
b) Nos demais casos, o adquirente não requeira a inscrição na matriz do imóvel ou das alterações decorridos 48 meses desde a data da realização, devendo afetar o imóvel à sua habitação ou do seu agregado até ao fim do quinto ano seguinte ao da realização; 

Artigo 10.º-A 

[...]
8 - O sujeito passivo que tiver exercido a opção pela modalidade de pagamento do imposto prevista na alínea c) do n.º 3 deve efetuar o pagamento do imposto devido até ao final do mês de agosto do ano da entrega da declaração de rendimentos e de cada um dos quatro anos seguintes

Artigo 12.º 

[...]
10 - Para efeitos do disposto no número anterior, devem os sujeitos passivos submeter através do Portal das Finanças, até 15 de fevereiro do ano seguinte àquele a que o imposto respeita, documento comprovativo da frequência de estabelecimento de ensino oficial ou autorizado.
» 

Outro subsídio interpretativo que respalda a interpretação da AT subjacente às liquidações ora impugnadas encontramo-lo nas circunstâncias em que foi criado o regime e em que é atualmente aplicado.

Se concebermos este regime como um benefício fiscal de aplicação automática, para mais inserido num procedimento massificado como é o IRS, facilmente se conclui que o legislador não teria motivos para, divergindo das regras incorporadas dos artigos 13.º, n.º 8 e 143.º do CIRS, optar por uma solução de aplicação casuística, que obrigasse o sistema de liquidação do IRS a determinar o exato momento em que o sujeito passivo obteve o estatuto de residente

Com efeito, o artigo 12.º-A do Código do IRS estabelece uma medida excecional de caráter automático, pois os seus efeitos resultam direta e imediatamente da lei pela simples verificação dos respetivos pressupostos e condições, não estando a sua aplicação dependente de qualquer ato de reconhecimento por parte da AT. 

Mas nem sequer seria necessário conhecer o Código do IRS, nem tão-pouco sondar o elemento lógico ou sistemático da interpretação das normas, para se chegar à conclusão de que o regime fiscal do 12.º-A estabelece como condição não ter tido o contribuinte estatuto de residente em qualquer momento num dos três anos civis anteriores. 

Na divulgação pública do Programa Regressar, foi claramente explicitado, como condição de acesso ao benefício fiscal, para quem se tornasse, de novo, residente em Portugal em 2020, «não ter sido residente em 2017, 2018 e 2019». 

A mesma interpretação foi divulgada através do Ofício-Circulado n.º 20206, de 2019-02-28, da área dos Impostos sobre o Rendimento e Relações Internacionais, nos seguintes termos: 

«os pressupostos essenciais do benefício estão eles próprios delimitados no tempo, a saber, (i) tenham sido residentes em território português antes de 31.12.2015; (ii) não tenham sido considerados residentes em território português em qualquer um dos três anos anteriores a 2019 ou a 2020; e, (iii) voltem a ser fiscalmente residentes em território português em 2019 ou em 2020, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 16.º do Código do IRS.» 

De resto, a mesma interpretação tem sido feita de norma com redação equivalente no regime fiscal para o residente não habitual, de forma pacífica e perfeitamente consolidada na prática administrativa, ao longo dos seus vários anos de vigência. 

E a Requerida conclui: “a interpretação que o Requerente faz da expressão «em qualquer dos três anos anteriores», como se referindo a um período de 36 meses, não tem acolhimento na letra da norma, o que sempre tornaria ilegítima a sua pretensão. 

Por outro lado, numa interpretação sistemática, o sentido do termo “ano”, no regime do IRS, tem necessariamente de coincidir com o de “ano fiscal”, por força do artigo 143.º do CIRS. 

Para além de que, por aplicação do n.º 8 do artigo 13.º do CIRS, a condição de residente que releva para efeitos do IRS é a que se verifica no final do respetivo ano fiscal, o que infirma a tese do Requerente segundo a qual, para efeitos do artigo 12.º-A do CIRS, relevariam os dias em que mudasse a residência para o estrangeiro e o dia em que voltasse a obter residência”. 

 

Assim, a questão em análise refere-se à aplicação do regime previsto no artigo 12.º-A do CIRS a rendimentos que auferidos em território nacional, por sujeito passivo que regressou a Portugal em 12-08-2020 e que residiu em Espanha desde 27.05.2017, tendo alterado a residência fiscal em 01-07- 2017.

O artigo 258.º da Lei n.° 71/2018, de 31/12 (OE 2019), aditou o artigo 12.°-A ao Código do IRS, consagrando um novo regime fiscal respeitante a ex-residentes, o qual, por força do disposto no artigo 259.º da mesma lei, é aplicável aos rendimentos auferidos no primeiro ano em que o sujeito passivo reúna as condições para ser abrangido pelo regime e nos quatro anos seguintes. Nos termos do disposto nos números 1 do artigo 12.º-A do Código do IRS, estão excluídos de tributação, em 50% do respetivo montante.

O artigo 12.º-A, do Código do IRS, foi aditado pelo artigo 258.º, da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2019, com a seguinte redação:

Artigo 12.º - A Regime fiscal aplicável a ex-residentes

1 - São excluídos de tributação 50 % dos rendimentos do trabalho dependente e dos rendimentos empresariais e profissionais dos sujeitos passivos que, tornando-se fiscalmente residentes nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 16.º em 2019 ou 2020:

a) Não tenham sido considerados residentes em território português em qualquer dos três anos anteriores;

b) Tenham sido residentes em território português antes de 31 de dezembro de 2015;

c) Tenham a sua situação tributária regularizada.

2 - Não podem beneficiar do disposto no presente artigo os sujeitos passivos que tenham solicitado a sua inscrição como residente não habitual.”

O artigo 12.º-A do Código do IRS estabelece uma medida excecional de caráter automático, pois os seus efeitos resultam direta e imediatamente da lei pela simples verificação dos respetivos pressupostos e condições, não estando a sua aplicação dependente de qualquer ato de reconhecimento por parte da AT. Porém, depende da declaração do sujeito passivo de pretender beneficiar do regime, o que será feito aquando do preenchimento do modelo 3 da declaração de IRS do ano seguinte ao ano de regresso a Portugal. 

Consideramos que é um benefício fiscal, na medida em que preenche os pressupostos estabelecidos no artigo 2.º, n.º 1 do EBF.

E, como benefício fiscal os seus fundamentos são extrafiscais, tendo o objetivo de atrair cidadãos que abandonaram o país em consequência da crise financeira de 2008 e o aumento da população ativa. Este benefício fiscal, que se traduz na exclusão de tributação de 50% dos rendimentos ativos dos sujeitos passivos, o legislador pretendeu assim, atrair para o território português pessoas que pretendam exercer uma atividade das Categorias A e B previstas no CIRS, que de outro modo voltariam para residir e trabalhar em território português. 

Concordamos com o mencionado no Processo n.º de 168/2021-T, de 2021-10-22 “Trata-se de uma norma que, embora inserida no Código do IRS, consubstancia um benefício fiscal automático e temporário, enquanto medida de caráter excecional instituída tendo em vista incentivar o regresso “daqueles que tiveram de sair do país em consequência da crise económica que afetou Portugal”, enquadrada no Programa Regressar (de acordo com as “Medidas Fiscais de Apoio às Famílias” incluídas no Relatório do Orçamento do Estado para 2019 – pág. 42), interesse público extrafiscal, cuja proteção o legislador considerou superior ao da própria tributação que impede.

Consagrando uma medida de caráter excecional, também aquela norma do artigo 12.º-A, do Código do IRS, é, ela própria, excecional, na medida em que contraria os efeitos decorrentes das normas de incidência, exonerando os respetivos beneficiários do pagamento de IRS sobre “50% dos rendimentos do trabalho dependente e dos rendimentos empresariais e profissionais”, nas condições ali definidas”.

Para poder beneficiar deste regime excecional de tributação em IRS, dos rendimentos da Cat. A, o Requerente teria de cumprir com o cumprimento de todos os requisitos estabelecidos no art.º 12-A do CIRS. 

Assim, o Requerente além de ter sido residente em território português antes de 31 de dezembro de 2015, e ter a sua situação tributária regularizada, também teria de não ter sido residente em território português em qualquer dos três anos anteriores ao ano de regresso a Portugal e não ter solicitado a sua inscrição como residente não habitual. 

Pelos factos carreados para os autos, é de considerar que o requisito que não é preenchido para poder usufruir deste regime fiscal aplicável a ex-residentes, é apenas o do Requerente não ter sido considerado residente em território português em qualquer um dos três anos anteriores, pois em 2017 foi residente em Portugal, onde auferiu rendimentos do trabalho por conta de outrem até ao dia em que deixou o território português, deslocando-se para Espanha.

Entendemos que o legislador no art.º 12.º -A, n.º 1 a) ao mencionar “Não tenham sido considerados residentes em território português em qualquer dos três anos anteriores” está a referir-se a 3 anos civis e não a 36 meses. 

E para justificar esse nosso entendimento é de considerar o artigo 143.º do CIRS que determina: “Para efeitos do IRS, o ano fiscal coincide com o ano civil”.

E, em algumas normas do CIRS, quando o legislador entende que o prazo deve ser contado de modo diferente, estabelece expressamente a contagem dos prazos em meses ou dias como é o caso do artigo 10.º, n.º 5 b): “O reinvestimento previsto na alínea anterior seja efetuado entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da realização”. 

E, também é exemplo de uma norma que estabelece a contagem diferente da feita com base em anos civis, o artigo 18.º, n.º 1 q) do CIRS em que o legislador se refere à contagem de prazos em dias: “As mais-valias resultantes de cessão onerosa de direitos, de qualquer natureza, sobre uma estrutura fiduciária, desde que, em qualquer momento durante os 365 dias anteriores à transmissão, o valor dessa estrutura resulte, direta ou indiretamente, em mais de 50 % de bens imóveis ou direitos reais sobre bens imóveis situados em território português. (Redação da Lei n.º 12/2022, de 27 de junho)”

O Requerente como viveu e trabalhou em Portugal até 26 de maio de 2017 e no dia seguinte deixou o país para ir trabalhar para o estrangeiro, é considerado residente em  território português desde 1 de janeiro de 2017 até à mudança da sua residência para Espanha.

Assim, no ano de 2017 o Requerente foi residente em Portugal, e aqui auferiu efetivamente  rendimentos pelo que não cumpre com o requisito estabelecido no artigo 12.º-A do CIRS, não ter sido considerado residente em qualquer dos últimos três anos, não obstante ter resido durante 36 meses fora do território português.

 

O Requerente não reúne todos os requisitos para poder beneficiar do regime aplicável a ex-residentes, pois não cumpre com o requisito relativo à não residência em território português em qualquer dos três anos anteriores ao ano em que regressou (2020).

 

V – Decisão

 

Em face de tudo quanto se deixa consignado, decide-se julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, absolvendo-se a Requerida do pedido, com as legais consequências. 

 

VI. Valor do processo

 

Fixa-se o valor do processo em € 95.876,80 nos termos do artigo 97º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n. º 2 do art.º 3 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

 

VII. Custas

 

Fica-se as custas no montante € 2.754,00, a cargo do Requerente, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.º 5, do RCPAT e 527.º, n.os 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT. 

 

Notifique-se

 

 

Lisboa, 30 de janeiro de 2023

 

Os Árbitros

 

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(Regina de Almeida Monteiro -Árbitro Presidente e relator)

 

 

 

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(Pedro Guerra Alves-Árbitro Adjunto)



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(Martins Alfaro- Árbitro Adjunto, com a seguinte declaração de voto):

Acompanho a decisão arbitral quanto à questão da litispendência, mas, salvo o devido respeito, não posso acompanhar a decisão quanto à questão de fundo.

Concordo com o fundamento da decisão arbitral de que, no que respeita ao acesso ao regime fiscal dos ex-residentes, a redacção do artigo 12.º-A, alínea a), do Código do IRS, é clara quando refere a exclusão parcial de tributação dos sujeitos passivos que «não tenham sido considerados residentes em território português em qualquer dos três anos anteriores» e não, nos 36 meses anteriores.

Contudo, parece-me que para chegar à conclusão a que chegou, a decisão arbitral deveria ter abordado e determinado a residência fiscal do Requerente de acordo com um critério estritamente normativo.

Com efeito e no que se refere à determinação da residência fiscal, penso que a expressão «considerados residentes», constante da redacção do artigo 12.º-A, alínea a), do Código do IRS, remete decisivamente para um conceito jurídico de residência fiscal e não para um conceito físico de residência.

Deste modo, a residência fiscal do Requerente, em 2017, haveria de ter sido determinada por um critério normativo e - isto independentemente de este ter residido fisicamente durante parte do ano de 2017 em território português.

Nesta perspectiva, entendo que haveria, primeiramente, que ter-se resolvido a questão de saber se a residência fiscal do Requerente, em 2017, deveria ser determinada por aplicação da Convenção entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de impostos sobre o Rendimento (adiante, CDT Portugal-Espanha), uma vez que, nesse ano, o Requerente teve contacto com ambas as jurisdições, ou se deveria ser determinada por directa aplicação da lei interna (Código do IRS), como sucedeu na presente decisão arbitral.

A entender-se aplicável ao caso a CDT Portugal-Espanha - entendimento que perfilho - e que o Requerente, face à lei interna de cada um dos Estados, se considerava residente de ambos os Estados, haveria então que aplicar -se o artigo 4.º, n.º 2, da referida Convenção, determinando-se, deste modo, em que qual dos dois Estados - português ou espanhol - o Requerente deveria ser considerado residente.

E, uma vez que os autos não contêm os factos suficientes para a aplicação do artigo 4.º, n.º 2, da referida Convenção, carecem, nesta parte, de complementação probatória.

Já a entender-se que a lei interna seria directamente aplicável, teria sido  necessário determinar em que medida, ainda assim, era possível concluir que o Requerente foi, nos termos e de acordo com os critérios constantes do artigo 16.º, do Código do IRS, residente - ainda que parcial - em território português, durante o ano de 2017.

E só apenas resolver estas questões me parece que seria possível, silogisticamente, decidir-se a questão de fundo.