Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 253/2022-T
Data da decisão: 2022-12-12  IRC  
Valor do pedido: € 491.058,11
Tema: IRC - Mais-valias. Prazo da inspecção tributária
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Decisão Arbitral

 

 

         Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Pedro Roque e Dr. José Coutinho Pires (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 23-06-2022, acordam no seguinte:

 

        

         1. Relatório

 

A…, SA., NIPC …, com sede na Av. …, Lisboa, (doravante, o “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista a anulação da liquidação de IRC relativa ao ano de 2017, com o n.º 2021 …, no valor de € 491.532,36, em que se inclui a liquidação de juros compensatórios no valor de € 57.155,98.

A Requerente pede ainda a restituição da quantia paga, com juros indemnizatórios.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 11-04-2022.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 01-06-2022, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 23-06-2022.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Na pendência do processo arbitral, a Autoridade Tributária e Aduaneira comunicou «que o ato objeto do pedido de constituição do tribunal arbitral foi parcialmente revogado».

Em 19-10-2022, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

Não há nulidades.

 

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

 

  1. A Requerente tem por objeto social a conceção, planeamento, exploração e administração de restaurantes, bares, discotecas, lojas, aldeamentos e habitações turísticas, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e projetos urbanísticos;
  2. No âmbito da sua actividade, a Requerente alienou, em 08-11-2017, 5 (cinco) frações de imóveis, a saber:
  • Discotecas algarvias …,
  • …Clube,
  • Escritório,
  • Cave A, e
  • Cave B;

 

  1. Na declaração Mod. 22 de IRC relativa ao ano de 2017 (campos 739 e 740), a Requerente declarou o valor de 649.917,27€, referente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais sem intenção de reinvestimento (art. 46º do CIRC) e o valor de 67.554,02€ relativo a 50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento (art.º 48º, n.º 1 do CIRC) (Relatório da Inspecção Tributária);
  2. A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção tributária interna à Requerente relativa a IRC e referente ao período de 2017, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI201901229;
  3. No âmbito dessa inspecção, foram expedidas a Requerente foi notificada, por carta enviada em 29-11-2019, para apresentar documentação, o que fez em 02-01-2020 (fls. 13 e 14 do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  4.  Em 29-03-2021, a Requerente foi notificada do projecto de Relatório da Inspecção Tributária (documento n.º 2);
  5. A Requerente pronunciou-se sobre o projecto de Relatório da Inspecção Tributária nos termos que constam do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, juntando cinco documentos que constam das páginas 174 a 238 do por administrativo, que se dão como reproduzidos;
  6. Entre os documentos juntos pela Requerente no exercício do direito de audição inclui-se o mapa de reintegrações e amortizações modelo 32 relativo ao exercício de 2017, que consta das páginas 183 a 189 do processo administrativo, em que além do mais se refere o seguinte:

  

  1.  Por ofício de 05-11-2021, foi notificado à Requerente o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 3-A (junto com o pedido de pronúncia arbitral, mas substituído em 11-11-2022);
  2. No Relatório da Inspecção Tributária, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais, o seguinte

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

Dispõe o art.º 17º do CIRC que o lucro tributável corresponde aos valores apurados na contabilidade do sujeito passivo (demonstrações financeiras) eventualmente corrigidos nos termos do CIRC, consistindo na soma algébrica do resultado líquido do período (diferença entre rendimentos ou ganhos e gastos ou perdas), das variações patrimoniais positivas e negativas que se tenham verificado no mesmo período de tributação e não tenham sido refletidas no respetivo resultado, bem como dos acréscimos e deduções decorrentes de correções fiscais efetuadas nos termos do CIRC e demais disposições legais aplicáveis.

Em conformidade com o disposto neste artigo, a noção de lucro tributável (ou prejuízo fiscal, no caso do resultado ser negativo), poderá desdobrar-se na seguinte fórmula:

-L(P-)f-=+/-RL + VP +/-Correções-fiscais

 

Em que:

L(P)f= Lucro tributável ou prejuízo fiscal do período;

RL = Resultado líquido contabilístico do período, positivo ou negativo;

VP = Variações patrimoniais positivas ou negativas não refletidas nas contas de resultados, com exceção das previstas nas alíneas a) a e) do n.º 1 do art.º 21º e nas alíneas a) a f) do art.º 24º

 

Sendo o lucro tributável aferido pela realidade contabilística do sujeito passivo, esta deverá cumprir todos os requisitos do n.º 3 do art.º 17º, ou seja;

• Estar organizada em conformidade com a normalização contabilística;

• Obedecer a outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;

• Refletir todas as operações praticadas pelo sujeito passivo;

• Evidenciar separadamente os resultados das operações e as variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC, de forma a que estas possam ser clara e inequivocamente diferenciadas das restantes.

 

Todas as operações realizadas pelo sujeito passivo devem estar refletidas na contabilidade, devendo todos os lançamentos estar apoiados em documentos justificativos, datados e suscetíveis de serem apresentados sempre que necessário (alínea a) do n.º 2 do art.º 123º do CIRC).

O Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, que adaptou o Código do IRC ao Sistema de Normalização Contabilística (SNC), manteve a estreita ligação entre a contabilidade e a fiscalidade, essencial para a minimização dos custos de contexto suportados pelos sujeitos passivos, reforçando o modelo de dependência parcial, determinando no seu preâmbulo que «sempre que não estejam estabelecidas regras fiscais próprias, se verifica o acolhimento do tratamento contabilístico decorrente das novas normas».

Resultando, assim, que a determinação da matéria coletável dos sujeitos passivos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas tem como ponto de partida o resultado líquido do período apurado de acordo com a normalização contabilística aplicável, dando-se, deste modo, especial relevo à função instrumental desempenhada pela contabilidade para cujas regras se faz, sistematicamente, remissão, numa tentativa de aproximar a fiscalidade da contabilidade e evitar controversos pontos de vista. A este resultado líquido vão acrescer as variações patrimoniais positivas e deduzir as variações patrimoniais negativas, não refletidas nesse resultado. Sendo ainda efetuadas eventuais correções fiscais, em resultado das regras que o CIRC impõe.

Ora um dos regimes em que existem mais diferenças entre a fiscalidade face à contabilidade é o respeitante às Mais-Valias e Menos-Valias realizadas (Artigos 46º a 48º do CIRC).

Por razões de deperecimento, insuficiente capacidade produtiva, necessidades de substituição de equipamento ou constatação de oportunidades de negócio, ocorrem situações de alienação de ativos nas empresas que originam mais-valias ou menos-valias.

As mais-valias são consideradas rendimentos e ganhos para efeitos fiscais (alínea h) do n. 1 do art.º 20º do CIRC) e as menos-valias, gastos e perdas de acordo com a alínea l) do n.º 2 do art.º 23º do mesmo Código.

As mais-valias e as menos-valias contabilísticas não relevam para efeitos fiscais, razão pela qual têm sempre que ser corrigidas no apuramento do lucro tributável (campo 767 do quadro 07 da mod. 22 de IRC), dado que já influenciaram o resultado contabilístico. Simultaneamente procede-se à inclusão, no(s) campo(s) 739 e/ou 740 do referido quadro 07, das mais-valias ou menos-valias fiscais, de acordo com o regime de tributação aplicável.

O art. 46º do CIRC dá-nos o conceito de mais-valias e menos-valias fiscais definindo como tais os ganhos obtidos ou as perdas sofridas mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título porque se opere, e, bem assim, num conceito mais alargado, os derivados de sinistros e os resultantes da afetação permanente a fins alheios à atividade exercida, relativos a:

• Ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis, ativos biológicos não consumíveis e propriedades de investimento, ainda que qualquer destes ativos tenha sido reclassificado como ativo não corrente detido para venda;

• Instrumentos financeiros, com exceção dos reconhecidos, contabilística e fiscalmente, pelo justo valor através de resultados (art.º 18º, n.º 9 do CIRC).

 

Temos, assim, por um lado, as mais e menos valias contabilísticas que são apuradas contabilisticamente e, por outro, as mais e menos valias fiscais que partem do apuramento das mais e menos valias contabilísticas a que se aplicam as correções fiscais previstas no Código do IRC e demais disposições legais aplicáveis.

Assim, em relação às Mais-Valias e Menos-Valias contabilísticas a forma de as apurar é feita a partir da seguinte fórmula:

Em que:

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Naturalmente que a quantia revalorizada, como já tivemos oportunidade de referir, aplica-se às entidades cuja contabilidade se encontra organizada conforme as NCRF's mas já não se aplica às entidades cuja contabilidade se encontre organizada conforme a NC-ME. De referir, ainda, que as depreciações contabilizadas podem não corresponder às fiscalmente aceites.

Enquanto que as Mais-Valias/Menos-Valia fiscais são obtidas a partir da seguinte fórmula:

Em que:

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Constata-se, assim, que as principais diferenças entre as mais-valias/menos-valias fiscais e as contabilísticas prendem-se com:

• Não consideração da reavaliação, para o cálculo da mais-valia/menos-valia fiscal;

• Não consideração do coeficiente de correção monetária, para o cálculo da mais-valia/menos-valia contabilística;

• Para o cálculo da mais/menos-valia fiscal só contam as depreciações ou amortizações praticadas e aceites fiscalmente, sem prejuízo da quota mínima.

 

É importante referir, ainda, que, existem as seguintes três ordens de razões para que na determinação da mais-valia ou menos-valia fiscal, o valor de aquisição dos itens do ativo fixo tangível deva corresponder ao valor que foi inicialmente reconhecido em AFT, ou seja, ao seu custo de aquisição ou custo histórico e não ao seu valor reavaliado ou revalorizado (justo valor): A primeira é devido à circunstância do n.º 2 do art. 46º do CIRC, referir que as mais-valias e as menos-valias fiscais são dadas pela diferença entre o valor de realização (... ) e o valor de aquisição(... ); A segunda é porque o disposto no n.º 9, do artigo 18º do CIRC, refere que "Os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável (... ), exceto quando:

a) Respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados(... ) ou b) tal se encontre expressamente previsto no CIRC, como é o caso das situações previstas na alínea g) do n.º 1 do art.º 20º (ganhos por aumentos de justo valor em ativos biológicos consumíveis) ou o caso da alínea j) do n.º 2 do art.º 23º (Perdas por reduções de justo valor em instrumentos financeiros) e a terceira é porque, segundo o disposto no artigo 2º,n.º 1, do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro (diploma que aprova o regime das depreciações e amortizações para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas), para efeitos de cálculo das quotas máximas de depreciação ou amortização, os elementos do ativo devem ser valorizados do seguinte modo: a) Custo de aquisição ou de produção, consoante se trate, respetivamente, de elementos adquiridos a terceiros a título oneroso ou de elementos construídos ou produzidos pela própria empresa; b) Valor resultante de reavaliação ao abrigo de legislação de carácter fiscal; c) Valor de mercado, à data da abertura de escrita, para os bens objeto de avaliação para este efeito, quando não seja conhecido o custo de aquisição ou de produção, podendo esse valor ser objeto de correção, para efeitos fiscais, quando se considere excedido.

Ora não se verificando que os valores dos Ativos fixos tangíveis alienados pelo SP (terrenos, edifícios e benfeitorias) tenham resultado de reavaliações efetuadas ao abrigo de legislação de caráter fiscal (Reavaliação legal) mas antes por iniciativa do SP (Reavaliação livre), considera-se que o valor de aquisição dos itens do AFT do SP só pode corresponder ao seu custo histórico ou custo de aquisição.

Acresce, ainda, referir que encontrando-se a contabilidade do SP organizada conforme a Norma Contabilística para Microentidades (NC-ME), não prevê esta Norma a utilização do modelo da revalorização na mensuração subsequente de um ativo fixo tangível, ao contrário da NCRF 7.

Assim, do que precede, o que importa agora é determinar como é que o SP efetuou o apuramento das Mais-valias ou Menos-Valias contabilísticas e depois proceder ao apuramento das mais-valias ou menos-valias fiscais devidas pela alienação dos referidos terrenos, edifícios, incluindo as benfeitorias realizadas nestes, por forma a podermos determinar se o SP apurou ou não as mais-valias fiscais de forma correta.

Em relação ao apuramento das Mais-Valias e Menos-Valias contabilísticas por parte do SP, constata-se que, no balancete analítico respeitante a 31/12/2017, antes do apuramento de resultados, encontram-se registados os seguintes valores respeitantes a Ativos Fixos Tangíveis (conta 43):

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Se efetuarmos o cruzamento entre o Mapa de Mais-Valias e Menos-Valias (Printscreen 32) e o Mapa de Reintegrações e Amortizações (Printscreen 33), verifica-se que o SP apurou como valor total de aquisição contabilístico dos itens do Ativo Fixo Tangível (terrenos, edifícios e benfeitorias e reparações) o valor de 1.327.430, 17€ enquanto que, em relação ao valor total das depreciações, apurou no Mapa de Mais-Valias e Menos-Valias o valor total de 653.436,89€ e no mapa de reintegrações e amortizações o valor total de 653, 701,44€.

Ou seja, se aplicarmos a fórmula de cálculo das Mais-Valias e Menos-Valias contabilísticas em que:

MVc/mvc = VR -(Q. Rev. - PI- Aac)

Resulta, no nosso entendimento, que o SP obteve como mais-valias contabilísticas decorrentes da alienação dos AFT já referidos, o valor de 2.231.271,27€, de acordo com o seguinte cálculo:

MVc = 2.905.000,00€ -(1.327.430,17€ - 653.701,44€) =

MVc = 2.905.000,00 -673.728,73 =

MVc= 2.231.271,27€

Tendo em consideração, no entanto, que em relação às Mais-valias contabilísticas apuradas pelo SP, decorrentes da alienação dos AFT (Frações …-A, …-AP, …-BH, …-A e …-B), este apresenta quatro (4) valores diferentes para as mesmas, ou seja, o valor de 2.231.006,72€, que apurou no seu Mapa de Mais-Valias e Menos-Valias - ct. Printscreen 32, resultante do cálculo de 2.905.000,00€ - (1.327.430,17€ - 653.436,89€), ou o valor de 2.231.271,27€ apurado no seu mapa de reintegrações e amortizações -Printscreen 33, que resulta do seguinte cálculo: 2.905.000,00€- (1.327.430,17€- 653.701,44€), ou o valor de 2.231.491,14€ que consta na conta 78712 do seu balancete do exercício antes de apuramento de resultados, decorrente do cálculo de 2.905.000,00€ - 677.908,86€, ou, ainda, o valor de 2.231.226,55€, que consta no campo 767 do quadro 07, da sua Mod. 22 de IRC, referente ao exercício de 2017, iremos considerar este último como o valor das Mais-Valias contabilísticas apuradas pelo SP, dado que foi este valor que o SP considerou como tendo influenciado o apuramento do resultado líquido do período ou exercício.

Dado que em relação às Mais-Valias Fiscais obtidas com a alienação dos bens do seu AFT (terrenos, edifícios e benfeitorias a reparações), se constata através da Mod. 22 de IRC/2017 (campos 739 e 740) que o SP declarou o valor de 649.917,27€, referente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais sem intenção de reinvestimento (art. 46º do CIRC) e o valor de 67.554,02€ relativo a 50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento (art.º 48º, n.º 1 do CIRC), resulta que o SP declarou ter obtido mais-valias fiscais no montante total de 785.025,31€ [649.917,27€ + (67.554,02€ x 100 / 50)].

Assim, o que importa é determinar se as Mais-Valias fiscais declaradas pelo SP, no valor de 785.025,31€ correspondem ou não às Mais-Valias Fiscais que deviam de ser apuradas pelo SP e que correspondem às mais-valias contabilísticas apuradas na contabilidade do SP com as correções fiscais efetuadas nos termos do Código do IRC e demais disposições legais aplicáveis

Conforme já tivermos oportunidade de referir as principais diferenças que existem entre as mais-valias/menos-valias fiscais e as contabilísticas prendem-se com a não consideração da reavaliação ou quantia revalorizada (justo valor) para o cálculo da mais-valia/menos-valia fiscal e a não consideração do coeficiente de correção monetária para o cálculo da mais-valia/menos-valia contabilística (ou o mesmo é dizer que no cálculo da mais-valia fiscal é aplicável o coeficiente de desvalorização nas condições previstas no art. 47º do CIRC) a que temos que juntar o regime das depreciações e amortizações para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro) uma vez que no cálculo das mais/menos-valias fiscais só são aceites as depreciações praticadas e aceites fiscalmente.

Antes de prosseguirmos para o cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP, é necessário, também, abordarmos alguns dos conceitos que se encontram diretamente relacionados com as Mais e Menos valias Fiscais, designadamente o conceito de coeficiente de correção monetária das mais-valias e das menos-valias previsto no art. 47º do CIRC e o conceito de reinvestimento do valor de realização previsto no art.º 48º do mesmo Código.

Em relação ao coeficiente de desvalorização monetária refere o art.º 47º do CIRC, que o valor de aquisição, neste caso dos AFT, é atualizado mediante a aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda para o efeito publicados em portaria do Ministro das Finanças, sempre que, à data da realização (que é a data em que se opera a transferência da propriedade nos termos do disposto no art.º 18º,n.º 3, al. a) do CIRC), tenham decorrido pelo menos dois anos desde a data da aquisição, sendo o valor dessa atualização deduzido para efeitos da determinação do lucro tributável.

Já no que diz respeito ao reinvestimento do valor de realização (que corresponde ao valor da contraprestação recebido pela venda dos AFT de acordo com o disposto no art.º 46º, n.º 3, al. g) do CIRC) refere o art.º 48º que a diferença positiva entre mais-valias e menos-valias fiscais só concorre para a formação do lucro tributável em metade do seu valor quando:

- Resultar de transmissão onerosa de ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis e ativos biológicos não consumíveis, detidos por um período não inferior a um ano, ainda que qualquer destes ativos tenha sido reclassificado como ativo não corrente detido para venda, ou de indemnização por sinistro (ainda que reclassificado como ativo não corrente detido para venda); e

 - No período de tributação anterior ao da realização, no próprio período ou até final do segundo período de tributação seguinte, todo o valor de realização seja reinvestido em ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis ou ativos biológicos não consumíveis.

 

Outra condição a observar é que o reinvestimento não se concretize na aquisição de bens usados a sujeito passivo de IRC ou IRS com quem haja relações especiais (art.º 63º, n.º 4 CIRC) e os bens adquiridos sejam detidos por um período não inferior a um ano contado do final do período de tributação em que ocorra o reinvestimento ou, se posterior, a realização.

Para poder beneficiar deste regime, a intenção de reinvestimento deve ser manifestada na declaração anual de informação contabilística e fiscal (IES) relativa ao período de tributação em que ocorre a transmissão onerosa, comprovando na mesma e nas declarações dos períodos seguintes o reinvestimento efetuado (Quadro 09 do Anexo A -Mais-Valias: Reinvestimento dos valores de realização).

Não sendo concretizado, total ou parcialmente, o reinvestimento até ao fim do segundo período de tributação seguinte ao da realização, a diferença ou a parte proporcional da diferença não incluída no lucro tributável, é considerada como rendimento desse período de tributação, majorada em 15% (n.º 6 do art? 48º) -campo 741 do Q. 07 da mod. 22.

No n.º 2 do art.0 48º, o legislador previu a hipótese de ocorrer reinvestimento parcial do valor de realização, situação em que não concorre para a determinação do lucro tributável apenas a parte proporcional da mais-valia correspondente ao valor reinvestido.

Em relação a este assunto do reinvestimento parcial verifica-se que o SP declarou no campo 739 do quadro 07 da sua Mod. 22, a obtenção de mais-valias no valor de 649.917,27€ e que de acordo com o campo 740 do mesmo quadro se constata que 50% das mais-valias com intenção de reinvestimento correspondem ao valor de 67.554,02€, o que equivale a dizer que declarou a obtenção de Mais-Valias fiscais no montante total de 785.025,31€ [649.917,27€ + (67.554,02€ x 100 / 50) = 649.917,27€ + 135.108,04€]. Resultando, assim, que das mais-valias fiscais obtidas pelo SP a parte proporcional que concorreu para a formação do lucro tributável em metade do seu valor corresponde a 17,21% das mais-valias fiscais obtidas (135.108,04€ x 100 / 785.025,31€).

Dado que o valor de realização obtido pelo SP com a alienação dos seus AFT foi no montante de 2.905.000,00€, a parte do valor de realização que deve ser reinvestido para que o SP possa beneficiar da regra das mais-valias no valor de 135.108,04€ só poderem ser tributadas em 50% do seu valor (67.554,02€), corresponde ao valor de 499.950,50€ (2.905.000,00€ x 17,21 / 100).

Atendendo, porém, a que a não concretização, total ou parcial, do reinvestimento verificado até ao fim do segundo período de tributação seguinte ao da realização, isto é, até 2019, é considerado como rendimento desse período de tributação, não se irá abordar se são ou não devidas correções ao lucro tributável do SP apurado em 2019, uma vez que o presente procedimento inspetivo incide apenas sobre o exercício de 2017.

Uma vez que o objeto da nossa análise é proceder ao apuramento das Mais-Valias Fiscais obtidas pelo SP com a venda dos bens do seu AFT, iremos de seguida apurar as mesmas chamando, no entanto, a atenção para as seguintes notas:

- Em primeiro lugar iremos determinar a mais-valia fiscal decorrente da alienação dos terrenos e edifícios de cada uma das frações …-A4, …-A4P, …-BH, …-A e …-B, com desconsideração do seu valor de aquisição após reavaliação efetuada em 2017 (justo valor) e com a aplicação do respetivo coeficiente de desvalorização da moeda para o efeito publicado pela Portaria n.º 326/2017, de 30 de outubro (diploma legal que aprova os coeficientes de desvalorização da moeda a aplicar aos bens e direitos alienados durante o ano de 2017), dado que a mensuração subsequente dos AFT ao justo valor não é aceite fiscalmente e se aplica ao apuramento das mais/menos-valias fiscais do SP o disposto no art. 47º do CIRC;

- De seguida iremos determinar o valor fiscal das benfeitorias e reparações efetuadas nas frações …-A e …-AP, com vista a podermos incluir o seu valor no cálculo das mais-valias fiscais obtidas com a alienação dos AFT do SP (onde se incluem também as benfeitorias necessárias ou úteis realizadas nos bens do AFT), dado que de acordo com o balancete do exercício do SP, as benfeitorias que constam no mapa de Reintegrações e Amortizações só foram efetuadas nas frações (sub-conta 432501 e sub-conta 432502), na proporção, respetivamente, de 48,73% e de 51,27%; Para tal, vamos desconsiderar o seu valor de aquisição após reavaliação efetuada em 2017 (justo valor) e consideramos apenas o seu custo de aquisição inicial (custo histórico). depois vamos determinar quais são as depreciações que foram efetuadas às benfeitorias e reparações que são aceites fiscalmente, e, por fim, aplicamos os coeficientes de desvalorização da moeda para o efeito publicados pela Portaria n. 326/2017, de 30 de outubro;

- Por fim, vamos determinar qual é o valor total das mais-valias fiscais que foram obtidas pelo SP com a alienação dos referidos AFT (onde se incluem os terrenos, os edifícios e as benfeitorias).

No que respeita à mais-valia fiscal obtida pelo SP com a alienação dos terrenos e edifícios de cada uma das frações …-A, …-A4P, …-H, …-A e …-B, com desconsideração do seu valor de aquisição após reavaliação efetuada em 2017 (justo valor) e com a aplicação do respetivo coeficiente de desvalorização da moeda para o efeito publicado pela Portaria n.º 326/2017, de 30 de outubro, apuram-se os seguintes valores de acordo com a fórmula de apuramento já atrás referida: MVf= VR-(VA- Aac) X coef.:

 

Fração …-A

VR= 1.400.000,00€

VA terreno= 22.527,05€

VA edifício= 225.500,81€

Aac (Depreciações acumuladas)= 225.500,81€

Coef. = 3,38 (imóvel adquirido em 20/03/1986)

MVf= 1.400.000,00€ -(22.527,05€ + 225.500,81€ - 225.500,81€) x 3,38 =

MVf= 1.400.000,00€ - 22.527,05€ x 3,38 =

MVf = 1.400.000,00€- 76.141,43€=

MVf = 1.323.858,57€

 

Fração …-AP

VR = 1.309.000,00€

VA terreno= 23.702,46€

VA edifício = 237.267,00€

Aac (Depreciações acumuladas)= 237.267,00€

Coef. = 2, 78 (imóvel adquirido em 09/12/1988)

MV= 1.309.000,00€ -(23.702,46€ + 237.267,00€ - 237.267.,00€) x 2,78 =

MVt= 1.309.000,00€ - 23.702,46€ x 2,78 =

MVf = 1.309.000,00€ - 65.892,84€ =

MVf= 1.243.107,16€

 

Fração …-BH

VR = 125.000,00€

VA terreno= 2.962,81€

VA edifício= 29.658,37€

Aac (Depreciações acumuladas) = 29.658,37€

Coef. = 2, 78 (imóvel adquirido em 07/12/1988)

MVf= 125.000,00€ - (2.962,81€ + 29.658,37€ - 29.658,37€) X 2,78 =

MVt = 125.000,00€ -2.962,81€ x 2,78 =

MVf = 125.000,00€ - 8.236,61€ =

MVf = 116.763,39€

 

Fração …-A

VR = 47.000,00€

VA terreno= 888,84€

VA edifício = 8.897,51€

Aac (Depreciações acumuladas) = 8.897,51€

Coef. = 2,78 (imóvel adquirido em 09/12/1988)

MVf = 47.000,00€ - (888,84€ + 8.897,51€-8.897,51€) x 2,78 =

MVf = 47.000,00€ - 888,84€ x 2,78 =

MVf = 47.000,00€ - 2.470,98€ =

MVf = 44.529,02€

 

Fração …-B

VR = 24.000,00€

VA terreno = 444,42€

VA edifício = 4.448,75€

Aac (Depreciações acumuladas) = 4.448.75€

Coef. = 2,78 (imóvel adquirido em 09/12/1988)

MVf = 24.000,00€ - (444,42€ + 4.448,75€ - 4.448,75€) x 2,78 =

MVf = 24.000,00€ - 444,42€ x 2,78 =

MV= 24.000,00€ - 1.235,49€ =

MVf = 22.764,51€

 

O que totaliza o valor de 2.751.022,65€, a título de Mais-Valia Fiscais decorrentes da alienação dos terrenos e edifícios do AFT tangível do SP.

Relativamente às benfeitorias e reparações efetuadas nos edifícios do AFT do SP, dado que se verifica que as mesmas foram realizadas em diferentes anos e que só foram efetuadas nas frações …-A e …-AP (na proporção de 48,73% e de 51,27%, conforme resulta da sub-conta 438202 do balancete do exercício), vamos evidenciar agora qual foi o valor das mesmas para efeitos contabilísticos e qual deve ser o seu valor para efeitos fiscais, pois, tal como acontece com o valor de aquisição contabilístico dos terrenos e dos edifícios, também em sede do valor contabilístico de aquisição das benfeitorias o mesmo pode ser objeto de reavaliação e não são considerados os coeficientes de correção monetária para efeitos do cálculo da mais - valia/menos-valia

contabilística ao passo que no valor de aquisição fiscal quer dos terrenos, quer dos edifícios, quer das benfeitorias realizadas nestes, a reavaliação ou justo valor não é aceite para o cálculo da mais-valia/menos-valia fiscal, só são aceites as depreciações contabilizadas que sejam aceites fiscalmente e os coeficientes de correção monetária são aplicáveis se forem cumpridos os requisitos estabelecidos no art.º 47º do CIRC.

Assim, de acordo com os printscreens 19 a 31 e 33 deste relatório, verifica-se que em relação às frações …-A e …-AP do AFT do SP, foram contabilizadas as seguintes benfeitorias, reparações e depreciações nas benfeitorias:

Uma imagem com texto, recibo

Descrição gerada automaticamente

 

Sendo que em relação ao mapa de reintegrações e amortizações de benfeitorias, são de realçar 5 notas que nos parecem relevantes/importantes: A primeira refere-se às benfeitorias e reparações (anteriores a 2001) no valor de 600.521,94€, em relação às quais foi preenchido o seguinte comentário na IES/2015 e na IES/2016 (pág. 57), que se passa a citar: "08- Transcrição das reservas e enfâses constantes da CLC16 -A rubrica de Ativos Fixos Tangíveis inclui valores líquidos de 2.467.000 Euro relativos a revalorizações de imóveis. Encontra-se, também, o valor de 600.522 Euro identificado como benfeitorias antigas sobre as quais não obtivemos

prova de auditoria suficiente e adequada que nos permita retirar conclusões sobre o suporte desse montante. Não foram refletidos valores relativos a passivos por impostos diferidos para as situações supracitas."

A segunda refere-se ao registo de uma reavaliação ao valor das benfeitorias que o SP efetuou no ano 2017, no montante de (-) 296.971,38€, A terceira nota é relativa ao valor das benfeitorias (anteriores a 2001) que o SP registou pelo montante 303.550,55€ - Printscreen 31 -que mais não é do que o valor das benfeitorias que o SP tinha registado pelo valor de 600.521,94€ (em relação às quais foi preenchido o comentário acima referido) deduzido do seu valor de revalorização/reavaliação, efetuada em 2017, de - 296.971,38€ (600.521,94 -296.971,38 = 303.550,56); A quarta refere-se ao valor total de aquisição das benfeitorias que o SP apurou contabilisticamente no seu mapa de reintegrações e amortização, no montante de 474.160,78€, que engloba o valor de benfeitorias no valor de 600.521,94 que após revalorização efetuada em 2017, no valor de -- 296.971,38€, passaram a ter o valor de 303.550,56€ e a quinta refere-se a depreciações acumuladas no valor de 184.403,28, que englobam as depreciações reavaliadas em 2017, no valor de 36.474,26€.

Assim, no que respeita ao valor as benfeitorias e reparações referidas quer no Mapa de Reintegrações e Amortizações a que corresponde o printscreen 36, quer no mapa de mais-valias e menos-valias a que corresponde o printscreen 31, vamos efetuar as seguintes correções em termos fiscais: i) Desconsideramos o valor das benfeitorias e reparações anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, uma vez de acordo com as reservas e enfases que constam da CLC (Certificação Legal de Contas) não foi obtida prova de auditoria suficiente e adequada sobre o suporte do montante de 600.522 Euro identificado como benfeitorias antigas, isto é, vamos desconsiderar este valor porque nas auditorias que se realizaram, em 2015 e 2016, às contas do SP não foram obtidas provas de auditoria suficientes e adequadas de que o SP tenha suportado o montante de 600.522 Euro referente a essas benfeitorias antigas; ii) Desconsideramos valor de reavaliação de benfeitorias de -296.971,38€ (referente às benfeitorias e reparações anteriores a 2001 no valor de 600.521,94€) com base no motivo acima referido e também porque o art.º 18º, n.º 9, do CIRC, dispõe que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, exceto quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor ou tal se encontre expressamente previsto no CIRC, o que não acontece no caso do SP dado que o ajustamento que o SP efetuou decorrente da aplicação do justo valor, respeita a AFT

e iii) Desconsideramos o valor de depreciações de 36.474,26€, que o SP efetuou sobre a reavaliação das benfeitorias efetuada em 2017, dado que no caso de se tratar de bens objeto de reavaliação o art.º 15º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, refere que a depreciação correspondente apenas é aceite fiscalmente se a reavaliação for efetuada ao abrigo de legislação de caráter fiscal, o que não aconteceu no caso do SP já que a reavaliação que este realizou, não foi uma reavaliação efetuada ao abrigo de legislação de caráter fiscal (designadamente ao abrigo do regime facultativo de reavaliação de determinados ativos afetos à atividade empresarial estabelecido em 2016, pelo Decreto-Lei n.º 66/2016, de 3 de novembro), mas sim uma reavaliação livre.

Do exposto e aplicando os fatores de correção monetária, previstos Portaria n. 0 326/2017, de 30 de outubro, às benfeitorias realizadas nas frações …-A e …-AP do AFT do SP, com vista ao cálculo das Mais-Valias Fiscais, obtidas pelo SP, apuramos como valor de aquisição fiscal referentes a benfeitorias efetuadas pelo SP, o valor total de 29.109,34€, assim discriminado:

Uma imagem com mesa

Descrição gerada automaticamente

Valor este que se dividirmos pelas frações …-A e …-AP do AFT do SP, na proporção de 48,73% e de 51,27%, respetivamente, obtemos como valor de aquisição fiscal para as benfeitorias realizadas na fração …-A, o valor de 14.184,98€ e para a fração …-AP, o valor de 14.924,36€.

O que implica que para cálculo da mais-valia fiscal obtida pelo SP com a alienação dos terrenos, edifícios e benfeitorias das frações …-A e …-AP, só temos que subtrair aos valores das Mais-Valias apuradas com a alienação dos terrenos e dos edifícios destas frações o valor de aquisição fiscal das benfeitorias nelas realizadas, ou seja:

Em relação à Fração …-A:

MVf = 1.323.858,57€ - 14.184,98€ =

MVf= 1.309.673,59€

E, em relação à Fração …-AP

MVf= 1.243.107,16€ -14.924,36€ =

MVf = 1.228. 182180€

 

No que respeita às restantes frações …-BH, …-A e …-B, o apuramento das Mais-Valias fiscais referentes a terrenos e edifícios mantêm-se tal e qual como já foi efetuado neste projeto de relatório, uma vez que as benfeitorias que o SP realizou só incidiram sobre os edifícios das frações …-A e …-AP.

Assim, e em resumo, apura-se como valor de Mais-Valias Fiscais decorrentes da alienação dos itens do AFT do SP, o seguinte montante total:

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Em face da divergência que existe entre as Mais-Valias Fiscais que foram apuradas pelo SP em resultado da alienação dos AFT, no montante de 785.025,31€ (campos 739 e 740 do quadro 07 da mod. 22 de IRC) e as Mais-Valias Fiscais que apuramos no âmbito deste procedimento inspetivo, no valor de 2.721.913,31€, foi proposta a seguinte correção em sede das Mais-Valias Fiscais obtidas pelo SP:

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III.1. Correções propostas na Declaração Mod. 22

Em resultado das irregularidades descritas anteriormente, o SP passa de um lucro tributável no montante de 484.111,27 € para um lucro tributável no montante de 2.420.999,27 €, nos termos do artigo 17º do CIRC, conforme sistematizado nos respetivos campos do Q7 da Declaração modelo 22:

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IX.2. Exercício do Direito de Audição

No exercício do direito de audição, o SP alegou, em síntese, o seguinte:

 - Que os cálculos relativos ao apuramento do IRC, do exercício de 2017, foram incorretamente efetuados pela AT tendo em conta os elementos recolhidos no âmbito da ação inspetiva e os demais elementos que a Declarante pretende, nesta sede, apresentar.

2 - Após a apresentação da decomposição do balancete da sociedade no exercício anterior à alienação dos imóveis, ou seja, a 31/12/2016, refere que o valor líquido contabilístico do terreno, edifícios e benfeitorias era, em 31.12.2016 e na data de abertura em 01.01.2017, de 3.143.649,68€, o qual decorre da soma dos valores líquidas históricos e reavaliados dos terrenos, edifícios e benfeitorias nos edifícios.

3 - O valor líquido da reserva de reavaliação em 31.12.2016/01.01.2017, no valor de 2.467.275,34€, encontrava-se decomposto da seguinte forma (os valores apresentados são líquidos de depreciações).

a) Reserva de reavaliação dos terrenos: 133.553,38€ (resultante da soma dos valores de 59.800,04€ e de 73.753,34€, que constam nas sub-contas 43110102e43110202); o que implicou que o custo histórico ou valor de aquisição dos terrenos de 50.525,58€ (soma das sub-contas 43110101, 43110201, 431103, 431105 e 431106. n0s valores respetivamente, de 22.527,05€, 23.702,46€, 2.962,81€, 888,84€ e 444,42€), após a reserva de reavaliação dos terrenos das frações …-A e …-AP, no valor total de 133.553,38€, passasse a ter como valor de aquisição contabilístico, o montante de 184.078,96€ (50.525,58€ + 133.553,38€):

b) Reserva de reavaliação dos edifícios: 413.710,34€ (resultante da diferença entre a soma das sub-contas 43210102 e 43210202, no valor, respetivamente, de 598.611,76€ e de 738.287,69€ e a soma das sub-contas 4382010102 e 4382010202, no valor. respetivamente, de 413.368,30€ e de 509.820,81€, ou seja, [(598.611,76€ + 738.287,69€) - (413.368,30€ + 509.820,81€)]; Resultando, assim, que o valor bruto da reserva de reavaliação dos edifícios fosse de 1.336.899,45€ (598.611,76€ + 738.287,69€) e as depreciações acumuladas sobre a reavaliação dos edifícios fosse de 923.189,11€ (413.368,30€ + 509.820,81€);

c) Reserva de reavaliação das benfeitorias dos edifícios: 1.920.011,62€ (resultante da diferença entre a soma das sub-contas 43250102 43250202, no valor, respetivamente, de 987.621,22€ e de 1.218.065,96€ e a soma das sub-contas 4382020102 e 4382020202, no valor, respetivamente, de 127.914,44€ e de 157.761,12€, ou seja, [(987.621,22€ + 1.218.065,96€) -(127.914,44€ + 157.761,12€)]; Resultando, assim, que o valor bruto da reserva de reavaliação das benfeitorias dos edifícios fosse de 2.205.687,18 (987.621,22€ + 1.218.065,96€) e as depreciações acumuladas sobre as benfeitorias dos edifícios fosse de 285.675.56€ (127.914,44€ + 157.761, 12€);

 

4- Afirmando, assim, que previamente à sua alienação, o SP detinha um conjunto de ativos imobiliários cujo valor líquido contabilístico era de 3.143.649,68€, dos quais 2.467.275,34€ constituíam reserva de reavaliação, ou seja, que a reserva de reavaliação constituía cerca de 78,5% do valor dos ativos imobiliários alienados. O que é o mesmo que dizer que o valor líquido contabilístico histórico dos bens alienados em causa (a totalidade do património imobiliário) era de 676.374,34.

5-Alega, também, que se considerarmos estes valores, verifica-se que, se os bens tivessem sido alienados em 01.01.2017, a mais-valia contabilística seria de 2.905.000,00€- 676.374,34€, donde resultaria um valor aproximado de 2,2 milhões de Euros, o que corresponde, grosso modo, ao valor reconhecido na conta 7871, em 2017. Se, fiscalmente, considerássemos, como mero exercício teórico, que todos os bens tinham sido adquiridos entre a década de 80 e 90, aplicando um coeficiente de desvalorização da moeda de 2,5, a mais-valia fiscal seria de cerca de 1,2 milhões de Euros. Por aqui se compreende que a mais-valia fiscal nunca poderia ascender a 2.7 milhões de Euros, como pretende a IT e que a leva a propor correções para alcançar uma mais-valia fiscal de 2.721.913,31€, concluindo que fácil se torna compreender que o cálculo da mais-valia fiscal padece de erro, que não pode persistir, sob pena de violação de lei.

6-Depois, nos artigos 13º a 45º e 65ºa 79º faz referência aos movimentos contabilísticos que foram efetuados em 2017, no âmbito da alienação dos imóveis, utilizando, para o efeito, os movimentos que foram efetuados nos diários do ano de 2017, referentes à anulação contabilística do valor histórico dos terrenos, à anulação contabilística do valor histórico dos edifícios, à anulação contabilística do valor histórico das benfeitorias nos edifícios, à anulação contabilística das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor de aquisição histórico dos edifícios e à anulação contabilística das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor de aquisição histórico das benfeitorias, referentes aos imóveis 4043-A e 6828-AP, bem como, os movimentos referentes à anulação contabilística dos valores de reavaliação dos terrenos, à anulação contabilística do valor de reavaliação dos Edifícios, à anulação contabilística do valor de reavaliação das benfeitorias, à anulação contabilística das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor reavaliado dos edifícios e à anulação contabilística das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor reavaliado das benfeitorias, todas referentes aos imóveis …-A e …-AP.

7-Concluindo que nenhum dos valores de reavaliação dos terrenos, dos edifícios ou das benfeitorias relativos aos imóveis …-A e …-AP, foi considerado pelo SP no cálculo das mais-valias contabilísticas e fiscais, pelo que toda a argumentação expendida pela IT a esse respeito terá soçobrar, por não aderir aos factos e registos contabilísticos -Art.s 46º a 53º e 80º a 82º

8-A seguir faz uma demonstração de que os valores de aquisição fiscal e contabilístico que constam nos mapas das mais-valias dos imóveis …-A e …-AP, era o seu valor histórico à data da alienação e não os seus valores reavaliados -- Artes 54ºa 64ºe 83ºa 89º.

9-Por fim, em relação às benfeitorias anteriores a 2001, no montante de 600.521,94€, que a AT considerou irrelevantes por o respetivo revisor oficial de contas ter feito a menção ou enfase na certificação legal de contas do SP "que não foi obtida prova de auditoria suficiente e adequada que nos permita retirar conclusões sobre o suporte desse montante", refere o SP que o artigo 123º, n.º 4 do CIRC, em vigor em 2017, ditava que os livros, registos contabilísticos e respetivos documentos de suporte deviam de ser conservados em boa ordem durante o prazo de 10 anos, pelo que o SP não se encontrava legalmente obrigado a conservar o suporte documental de benfeitorias realizadas anteriormente a 2001, por já se encontrar largamente ultrapassado tal prazo.

10-Alega, também, que a AT não pode argumentar de que menção feita pelo revisor oficial de contas, por ter fé publica, faz prova da irrelevância das benfeitorias anteriores a 2001, no montante de 600.521,94€, uma vez que o próprio revisor oficial de contas não apresenta qualquer conclusão de que decorra a evidenciação da situação ou do seu contrário, ou seja, é uma mera afirmação conclusiva, em face das circunstâncias mas que não corresponde a uma qualquer verdade e, como tal, são afirmações que culminaram em constatações que não permitem chegar a qualquer conclusão em matéria de prova.

11 -Refere que já se encontra largamente excedido o prazo legal que a AT dispunha para desconsiderar tais benfeitorias, uma vez que era no ano da sua realização que o devia de ter feito já que era nesse ano que a falta de suporte documental afetava a sua substância.

12-Menciona, também, que em nenhum momento o revisor oficial de contas afirma ou demonstra que tais benfeitorias não foram realizadas. Limita-se a constatar que não tem suporte documental para elas. E que a AT reparou naquela menção, feita por uma entidade terceira e embarcando num princípio de fé publica, limitou-se a concluir, sem mais, que este conferia à AT um direito a corrigir os custos, mas não pode ser assim.

13- Faz, ainda, menção a dois acórdãos, um a decisão do TCAS, Processo 05354/12, de 17-10-2013, onde, sobre a impossibilidade fáctica de documentar uma reavaliação de um imóvel em 1964, alienado em 1999, o Tribunal decidiu que "recai sobre a AT o ónus de provar que as mesmas não correspondem à realidade, não podendo ser exigido ao contribuinte. 30 anos depois, que demonstre documentalmente o valor daquelas, visto

que apenas está obrigado a guardar os livros de contabilidade, registos auxiliares e respetivos documentos de suporte durante o prazo de dez anos.", e o outro, a decisão do STA, proferido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário, no recurso 26614, de 08.05.2002, nos termos do qual se determina "Se confrontarmos o probatório, logo vemos que a exigência da AF junto do contribuinte para que procedesse à exibição dos

documentos comprovativos dos custos da construção do imóvel ocorreu para lá do prazo de 5 anos, previsto no n.º 2 daquele artigo. O impugnante, ora recorrido, não os apresentou, a pretexto de os já ter destruído. Como resulta da lei - e já acima se referiu - o Declarante não é obrigado a guardar os documentos por mais de 5 anos. E não sendo obrigado a guardá-los não pode ser penalizado pela eventual destruição dos mesmos. E ela/ decorre que da não apresentação de tais documentos, exigidos ao contribuinte para além do prazo de cinco anos (em que era obrigado a guardá-los) não pode a AF extrair a consequência de que o impugnante não fez prova dos custos, não considerando o valor declarado pelo impugnante, unicamente com base na não apresentação dos mesmos"

14-Defendendo o SP que a conclusão a retirar da referida jurisprudência do STA é linear: havendo que fazer prova do valor de aquisição de um bem imóvel-ou de benfeitorias sobre o mesmo, in casu -- com recurso a documentos que os sujeitos passivos não estão legalmente obrigados a dispor, a IT não pode, sem mais, desconsiderar os montantes declarados pelos sujeitos passivos.

15 - Menciona, ainda, que nos termos do artigo 75º da Lei Geral Tributária, ''Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos".

Pelo que, presumindo-se a veracidade dos registos contabilísticos, caberá à IT afastar tal presunção, fazendo prova dos factos que colocam em crise a veracidade do declarado.

16 - Assim, da análise do projeto não se vislumbra a invocação de qualquer facto suscetível de afastar a presunção de veracidade que gozam os elementos declarados pela declarante, mas apenas a invocação da falta de apresentação do suporte documental das benfeitorias realizadas até ao ano de 2001.

17-- Refere, ainda, que sem prejuízo do exposto, sempre se diga que se a Administração Tributária está onerada com a demonstração da factualidade que a leva a querer desconsiderar certas rubricas contabilísticas, em termos de abalar a presunção de veracidade da contabilidade corretamente organizada e dos respectivos documentos de suporte, compete ao contribuinte o ónus da prova de que a escrita é merecedora de

credibilidade. E isso ficou amplamente demonstrado, como se viu, pois todos os saldos e registos contabilísticos estão devidamente suportados.

 

IX.3. Posição da AT

Em relação ao exercício do direito de audição por parte do SP verifica-se que existem matérias em relação às quais a AT e o mesmo estão de acordo e existem outras em que as posições são divergentes.

Começando pelas primeiras verifica-se que a AT e o SP se encontram de acordo quanto ao facto de que nenhum dos valores de reavaliação dos terrenos, dos valores de reavaliação dos edifícios, dos valores de reavaliação das benfeitorias e dos valores de reavaliação das depreciações acumuladas praticadas quer sobre os valores de reavaliação dos edifícios, quer sobre as benfeitorias realizadas nos imóveis …-A e …-P, devem ser considerados no cálculo das mais-valias contabilísticas e fiscais obtidas pelo SP com a alienação dos cinco (5) imóveis que efetuou em 2017.

 

Também, nos parece, que existe acordo entre a AT e o SP, no que diz respeito ao valor de aquisição (custo histórico) dos terrenos, edifícios e depreciações acumuladas praticadas sobre o valor de aquisição dos edifícios dos 5 imóveis, já que tanto a AT como o SP, consideram como valores das mesmas, os seguintes:

Uma imagem com texto, recibo, captura de ecrã

Descrição gerada automaticamente

Sendo que é em relação às benfeitorias, no valor de 600.521,94€, que o SP diz ter realizado nas frações …-A e …-AP (na proporção de 48,73% e de 51,27%), anteriormente a 2001, e em relação às depreciações acumuladas praticadas sobre as referidas benfeitorias, no valor total de 142.611,63€ (69.493,37€ +73.118,26€), que se encontram refletidas nas sub-contas 4382020101 e 4382020202, que existem divergências entre a AT e o SP.

Pois, enquanto a AT, considera que no cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP, com a alienação dos 5 imóveis, se devem desconsiderar as benfeitorias que o SP diz ter realizado no valor de 600.521,94€, já o SP considera que este valor deve fazer parte do valor total de aquisição de benfeitorias de 763.498,73€, conforme consta no seu mapa 32.1 referente a depreciações e amortizações e nas suas sub-contas 43250101 e 43250201, no valor, respetivamente, de 372.043,12€ e de 391.455,60€.

Verificando-se, ainda, que a divergência entre a AT e o SP, no que diz respeito às depreciações acumuladas praticadas sobre as benfeitorias realizadas nas frações …-A e …-AP, resulta da AT considerar que o valor acumulado destas (69.493,37€ e de 73.118,38€, refletido nas sub-contas 438202101 e 43820202) deve ser desconsiderado em virtude de as benfeitorias no valor de 600.521,94€ (que fazem parte das benfeitorias no

Valor total de 763.498,73€) deverem ser desconsideradas fiscalmente, enquanto que o SP considera que devem ser aceites fiscalmente não só as benfeitorias que refere ter efetuado nos referidos imóveis no valor de 763.498,73€ (de que fazem parte as benfeitorias anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€), como também, as depreciações acumuladas que contabilizou como tendo sido efetuadas sobre o valor de 763.498,73€, ou seja, depreciações acumuladas no valor total de 142.611,63€ (69.493,37€ + 73.118,38€).

Sendo que a posição do SP é bem evidente, quando relativamente aos valores que preencheu nos mapas de mais-valias referentes às frações …-A e …-AP (art.ºs 54º a 59º e 83ºa 86º d0 seu direito de audição), refere no art.º 28º que, em relação à fração …-A, o valor de aquisição declarado no mapa de mais-valias de 394.877,34€, corresponde à soma das parcelas de 22.527,05€ (relativo ao terreno) e de 372.350,29€ (referente a benfeitorias do edifício), e quando, em relação à fração …-AP, menciona no seu artigo 65º que o valor de aquisição declarado no mapa de mais-valias de 403.379,85€, corresponde à soma das parcelas de 23.702,46€ (relativo ao terreno) e de 379.677,39€ (referente a benfeitorias efetuadas no edifício), e quando, em relação às depreciações acumuladas praticadas sobre o valor de aquisição histórico das benfeitorias, refere nos art.ºs 39º e no 73º (já que o SP trocou o valor que consta no art.º 73º com o do 74º) que procedeu à anulação contabilística das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor de aquisição histórico das benfeitorias supostamente realizadas nos referidos imóveis …-A e …-P, no valor, respetivamente, de 69.493,37€ e de 73.118,26.

 

Em face do exposto e dado que a divergência entre a posição da AT e do contribuinte assenta, essencialmente, em a AT considerar que, no cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP, se deve excluir do mesmo o valor das benfeitorias de 600.521,94€ e o valor das depreciações acumuladas praticadas sobre o valor das benfeitorias que o SP contabilizou, no valor de 69.493,37€ e de 73.118,26, enquanto que o SP defende que estes valores devem ser incluídos no cálculo das mais/menos-valias fiscais por si obtidas, vamos de seguida analisar esta situação.

Em relação a esta matéria, o SP refere que o artigo 123º, n.º 4, do CIRC, em vigor em 2017, ditava que os livros, registos contabilísticos e respetivos documentos de suporte devem ser conservados em boa ordem durante o prazo de 10 anos, pelo que não se encontrava legalmente obrigada a conservar o suporte documental das benfeitorias realizadas anteriormente a 2001.

Tendo suportado tal alegação com a citação de dois Acórdãos, um do TCAS e outro do STA, proferido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário.

Em relação à posição da AT de desconsiderar o valor das benfeitorias e reparações anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, no cálculo das mais-valias fiscais, porque a menção feita pelo ROC, que certificou legalmente as contas do SP, nos anos de 2015 e de 2017, por ter fé pública, faz prova de que o SP não detinha nos referidos anos suporte documental de tais despesas, refere o SP que a enfâse dada pelo ROC, na certificação legal das contas do SP, dos anos de 2015 e de 2016, se trata de uma mera afirmação conclusiva mas que não corresponde a qualquer verdade, isto é, são constatações que não permitem chegar a qualquer conclusão em matéria de prova e que a serem desconsideradas tais benfeitorias, já se encontra largamente excedido o prazo legal que a IT dispunha para o fazer, que era o do ano da sua realização, já que era nesse ano que a falta de suporte documental afetava a sua substância.

Refere, ainda, o SP que em nenhum momento o ROC afirma ou demonstra que tais benfeitorias não foram realizadas, pois, o que faz é limitar-se a constatar que as mesmas não têm suporte documental, sendo que é inequívoco que a declarante não estava obrigada, para efeitos fiscais, a manter a prova documental das benfeitorias realizadas anteriormente 2001, pela simples razão de que essa obrigação não lhe era imposta pelo CIRC.

Ora, em relação às benfeitorias anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, a AT também nunca disse ou afirmou que tais benfeitorias nunca foram realizadas pelo SP, uma vez que o que afirmou foi que as mesmas deviam de ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP com a alienação dos 5 imóveis.

Sendo evidente que as mesmas devem ser desconsideradas devido a várias ordens de razões:

Em primeiro lugar, porque, embora o SP considere que, para efeitos fiscais, não estava obrigado, a dispor ou manter a prova documental das benfeitorias realizadas anteriormente a 2001, em termos contabilísticos devia de dispor em cada momento de encerramento de contas de elementos suficientes por forma a que todos os lançamentos estivessem apoiados em documentos justificativos, uma vez que só dessa forma é que se pode aferir do correto ou incorreto apuramento de Mais ou Menos-valias contabilísticas e fiscais.

Evitando, assim, que o ROC que efetuou a certificação legal das contas do SP, relativas a 2015 e 2016, tivesse emitido a certificação legal de contas "com reservas", isto é, uma opinião que é utilizada pelo auditor quando o próprio não pode comprovar que as demonstrações financeiras no seu todo apresentam uma imagem verdadeira e apropriada da referida entidade, este tipo de opinião acontece quando existem situações materialmente relevantes.

Depois, considera-se, também, que as referidas benfeitorias no valor 600.521,94€ (anteriores a 2001) devem ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas com a alienação dos 5 imóveis, devido ao facto de as mesmas se encontrarem totalmente depreciadas em exercícios anteriores ao de 2017, conforme resulta da Modelo 32.1 (Mapa de Reintegrações e Amortizações) entregue pelo SP, designadamente da coluna das reintegrações e amortizações de exercícios anteriores referente às benfeitorias e reparações anteriores a 2001, verificando-se, assim, que o valor líquido do Ativo Imobilizado referente às benfeitorias o valor de 600.521,94€ deve ser de 0,00€ e não de 600.521,94 €, conforme por lapso foi inscrito no referido mapa.

Resultando, assim, da Modelo 32.1, entregue pelo SP, que o valor total das depreciações efetuadas nos exercícios anteriores a 2017, no próprio exercício de 2017 e que as depreciações acumuladas, para cálculo das Mais-Valias fiscais obtidas, sejam as seguintes:

Uma imagem com texto, jornal, recibo

Descrição gerada automaticamente

Sendo, ainda, de realçar que o Mapa de Mais-valias e Menos-valias (modelo 31) referente às benfeitorias (anteriores a 2001) - cfr. printscreen 31 deste relatório - apenas se encontra preenchido com o valor de 303.550,55€, referente ao valor de aquisição fiscal e contabilístico das referidas benfeitorias (que mais não é que o valor de aquisição de 600.521,94€ deduzido do valor de 296.971,38€, referente à reavaliação de 2017) e com o valor de 36.474,26, referente a depreciações/amortizações contabilísticas e fiscais, em vez de se encontrar preenchido como os demais mapas de Mais-valias e Menos-valias referentes a benfeitorias (cfr. printscreens 19 a 30 este relatório) realizadas pelo SP, os quais se encontram preenchidos com os valores de aquisição fiscal e contabilístico das benfeitorias e com os valores das depreciações/amortizações praticadas nos diversos anos do seu período de vida útil.

No que respeita às depreciações acumuladas que o SP contabilizou nas sub-contas 4382020101 e 4382020201, nos valores, respetivamente, de 69.493,37€ e de 73.118,26€, que incidiram sobre as benfeitorias realizadas na Fração …-A (sub-conta 43250101) e na fração …-AP (sub-conta 43250201), nos valores, respetivamente, de 372.043,12€ e de 391.455,60€, não iremos considerar as mesmas, dado que, como acima demonstrámos no quadro 14 deste relatório, o valor das depreciações efetuadas pelo SP em relação às benfeitorias realizadas nos referidos edifícios, foi no valor acumulado de 745.461,15€.

Assim, demonstrada que está a factualidade que leva a Administração Tributária a considerar que as benfeitorias realizadas nas frações …-A e …-AP, no valor de 600.521,94€, já se encontravam totalmente depreciadas no exercício de 2017, considera-se que as correções que foram propostas, em sede de IRC do exercício de 2017, se devem manter.

Do que precede, com vista à correção da Matéria Tributável, é elaborado Documento de Correção, em consonância com o descrito no ponto III.

 

  1. Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRC relativa a exercício de 2017 com o n.º 2021 …, no valor de € 491.532,36, em que se inclui a liquidação de juros compensatórios no valor de € 57.155,98 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  2. Em 11-01-2022, a Requerente pagou a quantia de € 491.499,39, relativa à liquidação referida (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  3. Há cerca de 30 anos, houve um incêndio de grande envergadura nas instalações da Requerente, que abrangeu as caves, onde estava o armazém que, além de outros bens, tinha pastas de arquivo, que ficou totalmente destruído (depoimentos das testemunhas B… e C…);
  4. A discoteca da Requerente foi sempre mantida e renovada no fim de cada época, havendo melhorias de ano para ano (depoimentos das testemunhas B…, C…, D… e E… e documentos n.ºs 8 e 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  5. As obras de remodelação eram feitas com materiais de alta qualidade e com preços muito elevado, incluindo construção de novos bares, obras utilizando mármore, madeira e inox, e renovação do mobiliário e decoração, e adaptações às alterações das exigências legais (depoimentos das testemunhas E…, F… e G… e documentos n.ºs 8 e 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  6. A Requerente procurava obter uma clientela de prestígio e requinte, procurando manter-se distinta da concorrência e a esta superior (depoimento da testemunha E…, F… e G… e documentos n.ºs 8, 9 e 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  7. A contabilidade da Requerente era feita por uma empresa externa (depoimento da testemunha C…);
  8. Por despacho da Subdiretora-Geral da Área da Gestão Tributária IR datado de 19 de maio de 2022 foi determinada a correcção dos valores a inscrever nos campos 739 e 740 do quadro 07 da declaração modelo 22 de IRC, nos seguintes termos:

– campo 739 “Diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias sem intenção de reinvestimento (art.º 46.º)” - € 2.253.444,81

– campo 740 “50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias com intenção de reinvestimento (art.º 48.º nº 1)” - € 234.234,25

(documento junto pela Autoridade Tributária e Aduaneira em 19-10-2022, cujo teor se dá como reproduzido);

  1. O despacho referido manifesta concordância com a Informação DSIRC N.º I2022 …, que consta do documento juto pela Autoridade Tributária e Aduaneira em 19-10-2022, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:   

... o valor de realização dos imóveis foi de 2.905.000,00 € e o valor que se subentende ter pretendido reinvestir no campo 740 da Mod.22 de IRC/2017, foi de 500.000,00 €, verifica-se que este valor corresponde a 17,211% do valor de realização; Ora se este valor corresponde a esta percentagem do valor de realização, o valor que devia de constar no campo 740 da Mod. 22 de IRC/2017, relativo a 50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento (art.º 48º n.º 1) devia corresponder ao valor de 234.234,25 € [(2.721.913,31 x 17,211 / 100) x 50%], enquanto que, o valor que devia de constar no campo 739 da Mod. 22 de IRC/2017, referente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais sem intenção de reinvestimento (art.º 46º) devia de corresponder ao valor de 2.253.444,81 € (2.721.913,31 – 468.468,50), o que significa que o valor que devia de ter sido liquidado em sede de DC de IRC/2017, devia de ter sido por um montante inferior”;

 

Assim, perante o que nos foi possível analisar, afigura-se-nos que deve manter-se a correção de € 1.936.888,00 proposta pelos SIT, devendo, contudo, corrigir-se, a favor da Requerente, os valores a inscrever nos campos 739 e 740 do quadro 07 da declaração modelo 22:

- campo 739 “Diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias sem intenção de reinvestimento (art.º 46.º)” - € 2.253.444,81;

- campo 740 “50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias com intenção de reinvestimento (art.º 48.º n.º 1)” - € 234.234,25.

 

  1. A Requerente sociedade só passou a ser sujeita a revisão legal de contas em 2013, quando foi transformada em sociedade anónima (depoimento de H…);
  2. Na contabilidade da Requerente incluem-se os mapas que constam dos documentos n.º 4 e 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, que serviram de base ao cálculo pela Requerente das mais-valias declaradas;
  3. As reavaliações que a Requerente efectuou em 2006 foram anuladas em 29-08-2017, não tendo influência do cálculo das mais-valias efectuado pela Requerente (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, página 29);
  4. Em 2017, a Requerente procedeu ao desreconhecimento da reserva de revalorização reconhecida em 2006, por motivo de alienação dos Ativos revalorizados, como se verifica pela análise da Conta 58.Excedentes de Revalorização constante do Balancete em 31-12-2017, na página 8 do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  5. Em 08-04-2022, o Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

2.2.1. Factos não provados

 

2.2.1.1. Não se provou que a contabilidade da Requerente tivesse sido completamente destruída pelo incêndio referido nos factos provados.

Na verdade, embora as testemunhas B… e C… referissem que nos armazéns da Requerente estavam pastas de arquivo, que foram atingidas pelo incêndio, ambas afirmaram desconhecer o seu conteúdo.

Por outro lado, a Requerente não diz quando ocorreu o incêndio e faz afirmações contraditórias quanto aos seus hipotéticos efeitos, dizendo, por um lado, que ele «destruiu o seu arquivo» (artigo 203.º do pedido de pronúncia arbitral), e destruiu «tudo - incluindo a documentação de suporte à sua contabilidade» (artigo 161.º do pedido de pronúncia arbitral), e, por outro lado, que «viu parte do seu arquivo dos anos noventa do século XX» (artigo 165.º do pedido de pronúncia arbitral).

A isto acresce, decisivamente, que, quando exerceu o direito de audição sobre o projecto de Relatório da Inspecção Tributária, a Requerente pronunciou-se longamente sobre a questão da falta de documentação das benfeitorias (artigos 90.º a 108.º) e não fez qualquer referência à sua eventual destruição por um incêndio, que seria uma justificação para não dispor da documentação ela e, por isso, se correspondesse à realidade, seria decerto utilizada, à face das regras da experiência que os Árbitros devem aplicar na fixação da matéria de facto, nos termos da alínea e) do artigo 16.º do RJAT.

Neste contexto, tem de se concluir que não é possível considerar provado que o incêndio tenha tido eliminado toda a documentação contabilística relativa a benfeitorias anteriores a 2001.

 

2.2.1.2. Não se provou que a Autoridade Tributária e Aduaneira tivesse efetuado qualquer revalorização em 2017, provando-se, antes, que efectuou o desreconhecimento da reserva de revalorização reconhecida em 2006, por motivo de alienação dos Ativos revalorizados, como se refere na alínea W) da matéria de facto fixada.

 

2.2.1.3. Não se provou que, relativamente a benfeitorias anteriores a 2001, no valor de € 303.550,55, a Requerente apenas tenha efectuado até 2017 depreciações no valor de € 36.474,26 (12,06%), como é indicado no mapa de mais-valias e menos-valias que consta da página 18 do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral.

À face das regras da experiência, que os árbitros devem aplicar na apreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 16.º, alínea e), do RJAT, não é crível, por não ser normal, que despesas volumosas efectuadas antes de 2001 por uma empresa que dispõe de contabilidade organizada e está atenta ao tratamento fiscal de reintegrações e amortizações (como evidenciam os mapas que a Requerente juntou no documento n.º 4), as benfeitorias anteriores a 2001 apenas estejam depreciadas numa percentagem de 12,06% em 2017, ao fim de mais de 16 anos, em face das taxas de depreciação ou amortização  previstas  no Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, e no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, para itens dos tipos em que se enquadram as benfeitorias que se provou a Requerente ter efectuado, que variarão entre 12,5% e 25% (previstas, por exemplo, nos códigos 1610, 1615, 1650, 1655, 1680, 2400, 2405 e 2430 deste último diploma).

Para além disso, no mapa de reintegrações e amortizações modelo 32 relativo ao exercício de 2017, que consta das páginas 183 a 189 do processo administrativo, a própria Requerente referiu que o valor das reintegrações e amortizações relativas a benfeitorias anteriores a 2001 (aí indicado como sendo de € 600.521,94, por efeito da reavaliação de 2006), era igual ao das próprias benfeitorias, o que conduz a uma percentagem de depreciações de 100%.

 

2.2.1.4. Não se provou que a Autoridade Tributária e Aduaneira tenha emitido qualquer nova liquidação na sequência da revogação que comunicou.

 

2.2.1.5. Não se provou que a Requerente tivesse pagado a quantia de € 491.058,11, cujo reembolso pede, mas apenas € 491.499,39, que é o valor que consta do documento n.º 11.

 

 

2.2.2. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e os que constam do processo administrativo e, mos pontos indicados, com base nos depoimentos das testemunhas.

A testemunha B… teve uma loja no centro comercial onde funcionavam os estabelecimentos da Requerente, ao tempo em que neles ocorreu o incêndio referido nos autos. Não viu o conteúdo das pastas que disse estarem nas caves atingidas pelo incêndio. Referiu que o incêndio terá sido há cerca de 30 anos.

A testemunha C… trabalhava para a Requerente fazendo trabalhos gerais de manutenção de pequena dificuldade. Confirmou a existência de obras e remodelações nas instalações da Requerente e a existência do incêndio que atingiu as caves do estabelecimento, mas não sabe o conteúdo das pastas que disse que lá estavam guardadas.

A testemunha D… é engenheiro responsável técnico pelas obras iniciais das instalações da Requerente e seu licenciamento e continuou a frequentar o estabelecimento, tendo confirmado a existência das obras de remodelação.

A testemunha E… é o arquitecto que aconselhava a Requerente sobre as obras de remodelação. Confirmou a alta qualidade dos materiais e a preocupação da Requerente com ter estabelecimentos de nível elevado e superiores à concorrência.

A testemunha F… trabalhou para a Requerente entre 2003 e 2017. Confirmou a existência de obras de remodelação frequentes e sua elevada qualidade e teve conhecimento do incêndio apenas por ouvir dizer.

A testemunha G… foi o arquitecto que fez o projecto das instalações da Requerente, tendo confirmado a alta qualidade dos materiais utilizados.

A testemunha H… é revisor de contas, representante da sociedade de revisores oficiais que faz a revisão das contas da Requerente, tendo efectuado a revisão dos anos de 2013-2014. O seu depoimento foi muito inseguro, designadamente por não conseguir precisar se foi ou não a testemunha que fez a revisão de 2015 e 2016, quando é o seu NIF que é indicado nas IES respectivas (campo 08. 3.1). Neste contexto, o Tribunal arbitral não considerou credível o seu depoimento nem o considerou relevante para a fixação da matéria de facto, a não ser quanto a ser 2013 o ano em que a Requerente começou a estar sujeita a revisão oficial de contas, o que, aliás, não é controvertido.

As testemunhas, com excepção da testemunha H…, aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que foram dados como provados com base nos seus depoimentos.

 

 

3. Matéria de direito

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção tributária à Requerente, relativa ao ano de 2017, em que foram efectuadas correcções em sede de IRC, relativas a mais-valias obtidas pela Requerente com a venda de imóveis, que estão subjacentes às liquidações impugnadas.

Na pendência do presente processo, a Subdiretora Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira decidiu manter a correcção efectuada ao valor global das mais-valias (€ 1.936.888,00) mas alterar os correspondentes valores a inscrever nos campos 739 e 740 da declaração modelo 22, relativos aos montantes das mais-valias a considerar como sendo acompanhados ou não de intenção de reinvestimento, mas não se provou que tenha emitido nova liquidação.

A Requerente imputa às liquidações os seguintes vícios, em suma:

– vício procedimental, por inobservância do prazo para notificação do Relatório da Inspecção Tributária (artigos 1.º a 19.º do pedido de pronúncia arbitral);

– vício de falta de fundamentação [artigos 33.º e 203.º, alíneas vii) e x), do pedido de pronúncia arbitral];

– vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito quanto ao valor das benfeitorias a considerar para efeitos do cálculo de mais-valias e sobre os valores das mais-valias relativamente às quais deve entender-se que há intenção de reinvestimento e quanto à exigência de documentação relativa a benfeitorias cujas despesas foram realizadas há mais de 10 anos.

 

Apreciar-se-ão os vícios imputados pela Requerente à liquidação impugnada pela ordem indicada pela Requerente, em consonância com o preceituado na alínea b) do n.º 2 do artigo 124.º do CPPT.

 

3.1. Vício procedimental por excesso do prazo da inspecção tributária

 

A Requerente imputa vício ao procedimento inspectivo, por, em suma, terem sido ultrapassados os prazos estipulados na lei para a realização do procedimento inspectivo, designadamente o prazo de seis meses previsto no ario 36.º, n.º 2, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira).

A Requerente conclui que «o procedimento através da emissão do relatório de Conclusões deveria ser concluído até ao dia 08.04. 2021, sob pena de violação do disposto no artigo 36º do RCPIT, pelo que apenas tendo sido notificado em 05.11.2021, implica a preterição de formalidades legais essenciais», o que entende implicar a anulação da liquidação.

O artigo 36.º, n.ºs 2 e 3, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA) estabelece que «o procedimento de inspecção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início», prazo este que pode ser ampliado por mais dois períodos de três meses.

Como tem vindo a entender o Supremo Tribunal Administrativo, o excesso do prazo de inspeção tributária não tem, só por si, efeito invalidante da notificação, apenas implicando a cessação do efeito suspensivo da caducidade do direito de liquidação previsto no n.º 1 do artigo 46.ºda LGT. ( [1] )

O artigo 36.º do RCPITA inclui actualmente uma norma em que se consagra este entendimento jurisprudencial, que é o n.º 7, aditado pela Lei nº 75-A/2014, de 30 de Setembro, que estabelece que «o decurso do prazo do procedimento de inspeção determina o fim dos atos externos de inspeção, não afetando, porém, o direito à liquidação dos tributos».

Assim, a Requerente não tem razão quanto a esta questão, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a este vício.

 

 

3.2. Vício de falta de fundamentação

 

A Requerente faz referências a falta de fundamentação das correcções efectuadas por se basearem numa reserva do Revisor Oficial de Contas que não está fundamentada e documentada (artigo 157.º do pedido de pronúncia arbitral) e «aceitar o valor de mais-valia fiscal calculado pela Requerente para efeitos do reinvestimento parcial do valor de realização» [alínea x) do artigo 203.ºdo pedido de pronúncia arbitral].

A exigência de fundamentação dos actos administrativos lesivos é feita no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, que estabelece, que «carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».

Concretizando o conteúdo da fundamentação no procedimento tributário, o artigo 77.º, n.º 1, da LGT que estabelece a regra geral de que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. ( [2] )

Assim, para a fundamentação ser considerada suficiente basta que sejam perceptíveis as razões por que se decidiu no sentido em que se decidiu.

Mas, por força do disposto no n.º 2 do referido artigo 77.º da LGT, «a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».

Por outro lado, quanto a fundamentação, deverão distinguir-se os conceitos de «fundamentação material» e «fundamentação formal».

Esta última «pode ser entendida como uma exposição enunciadora das razões ou motivos da decisão», enquanto a fundamentação material corresponde à «recondução do decidido a um parâmetro valorativo que o justifique: no primeiro sentido, privilegia-se o aspecto formal da operação, associando-a à transparência da perspectiva decisória; no segundo, dá-se relevo à idoneidade substancial do acto praticado, integrando-o num sistema de referência em que encontre bases de legitimidade». (...)

«O dever da fundamentação expressa obriga a que o órgão administrativo indique as razões de facto e de direito que o determinaram a praticar aquele acto, exteriorizando, nos seus traços decisivos, o procedimento interno de formação da vontade decisória. O dever cumpre-se desde que exista uma declaração a exprimir um discurso que pretenda justificar a decisão, independentemente de esse arrazoado». ( [3]).

Apenas a falta de fundamentação formal constituirá vício de forma.

A falta de fundamentação substancial, por incorrecção ou falta de prova dos pressupostos de facto ou o erro de direito, consubstanciará vício de erro sobre os pressupostos de facto ou erro sobre os pressupostos de direito.

Neste sentido, refere-se no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28-09-2011, proferido no processo n.º 0494/11:

O facto de, porventura, a valia substancial dos fundamentos aduzidos nesse discurso fundamentador não ser suficiente para retirar a conclusão que aí se retirou, isto é, ser insuficiente ou inapta, do ponto de vista legal, para suportar a correção efetuada, é matéria que não contende com a fundamentação formal do acto, mas sim com a fundamentação substancial, que pode levar à procedência da impugnação por força dos vícios de violação de lei que foram invocados.

Com efeito, não deve confundir-se a suficiência da fundamentação com a exatidão ou a validade substancial dos fundamentos invocados. É que, como adverte SÉRVULO CORREIA ("Noções de Direito Administrativo", I, pág. 403.), «a fundamentação pode ser inexata e ser suficiente, por permitir entender quais os pressupostos de facto e de direito considerados pelo autor do acto. Deste modo, a inexatidão dos fundamentos não conduz ao vicio de forma por falta de fundamentação. Ela pode sim revelar a existência de outros vícios, como o vicio de violação de lei por erro de interpretação ou aplicação de norma, ou (...) por erro nos pressupostos de facto» (...)".

 

No caso em apreço, a falta de fundamentação a que se refere a Requerente não é a falta de fundamentação formal, a que se referem os artigos 268.º, n.º 3, da CRP e 77.º, n.º 1, da LGT.

Na verdade, a eventual insuficiência do elemento em que a Autoridade Tributária e Aduaneira se baseou para demonstrar o facto que considerou provado, designadamente a utilização da reserva do ROC incluída na certificação legal de contas, que a Requerente entende que «não pode servir de fundamento à correção efetuada, por não ter suporte documental que a evidencie e complete, além de se reportar a períodos muito anteriores à data da alienação dos imóveis» e ser contrariada por outros elementos de prova (artigos 146.º a 154.º do pedido de pronúncia arbitral), não obsta a que se percebam as razões pelas quais a Autoridade Tributária e Aduaneira decidiu como decidiu. Se for errada, por não ter suficiente suporte probatório, a fixação da matéria de facto que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou com base naquela certificação, designadamente por ser contrariada por ouros elementos de prova, como defende a Requerente, estar-se-á perante vício de erro sobre os pressupostos de facto, mas não de falta de fundamentação formal, pois perceber-se a razão que a levou a considerar esse facto como provado, que é a existência da referida reserva e os factos nela afirmados.

Por outro lado, a Requerente defende que há uma contradição em a Autoridade Tributária e Aduaneira ter alterado para mais o valor das mais-valias e «aceitar o valor de mais-valia fiscal calculado pela Requerente para efeitos do reinvestimento parcial do valor de realização» [alínea x) do artigo 203.ºdo pedido de pronúncia arbitral].

A fundamentação exigível é a relativa à correcção que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou e não a outras que poderia ter efectuado e não efectuou.

Se a Autoridade Tributária e Aduaneira, para além das correcções que efectuou, deveria ter efectuado outras com elas conexionadas e não as efectuou, estar-se-á perante um vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto ou de direito, mas não perante uma insuficiência de fundamentação.

Aliás, a Requerente não faz referência a qualquer norma relativa ao vício formal de falta de fundamentação, o que corrobora a interpretação do pedido de pronúncia arbitral no sentido de não ser à fundamentação formal que a Requerente se refere.

Por isso, a questão da suficiência da fundamentação substantiva, será apreciada no âmbito dos vícios de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

 

3.3. Vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto ao valor das benfeitorias a considerar para efeitos do cálculo de mais-valias

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correções ao cálculo das mais-valias efectuado pela Requerente relativamente à venda das frações …-A e …-AP.

 

3.3.1. Âmbito do processo arbitral

 

O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele], pelo que os actos têm de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. ( [4] )

Assim, a fundamentação sucessiva ou a posteriori não é relevante para aferir a sua suficiência, quando não acompanhada de revogação e prática de um novo acto. ( [5] )

No caso em apreço, apesar de ter sido decidida a «revogação parcial» da liquidação de IRC impugnada, não há conhecimento de ter sido praticado novo acto.

Por isso, é à face da fundamentação que consta do Relatório da Inspecção Tributária que há que apreciar a legalidade das correcções efectuadas.

Isto é, em conclusão, não é objecto do processo saber se o cálculo das mais-valias efectuado pela Requerente foi correcto, mas sim apurar de as correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira que estão subjacentes liquidação impugnada têm fundamento legal e, caso o não tenham, impõe-se a sua anulação, independentemente de o cálculo feito pela Requerente ser ou não o adequado.

Examinado a fundamentação que consta do Relatório da Inspecção Tributária, constata-se que, depois do exercício do direito de audição da Requerente sobre o projecto de RIT, a Autoridade Tributária e Aduaneira alterou a fundamentação das correcções efectuadas, designadamente deixando de as relacionar com uma invocada «reavaliação» de 2017, que, efectivamente, não ocorreu.

Na verdade, antes do exercício do direito de audição, a Autoridade Tributária e Aduaneira desconsiderou todas as benfeitorias anteriores a 2001, com base no parecer do Revisor Oficial de Contas, e depreciações, dizendo o seguinte:

(i) Desconsideramos o valor das benfeitorias e reparações anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, uma vez de acordo com as reservas e enfases que constam da CLC (Certificação Legal de Contas) não foi obtida prova de auditoria suficiente e adequada sobre o suporte do montante de 600.522 Euro identificado como benfeitorias antigas, isto é, vamos desconsiderar este valor porque nas auditorias que se realizaram, em 2015 e 2016, às contas do SP não foram obtidas provas de auditoria suficientes e adequadas de que o SP tenha suportado o montante de 600.522 Euro referente a essas benfeitorias antigas;

ii) Desconsideramos valor de reavaliação de benfeitorias de -296.971,38€ (referente às benfeitorias e reparações anteriores a 2001 no valor de 600.521,94€) com base no motivo acima referido e também porque o art.º 18º, n.º 9, do CIRC, dispõe que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, exceto quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor ou tal se encontre expressamente previsto no CIRC, o que não acontece no caso do SP dado que o ajustamento que o SP efetuou decorrente da aplicação do justo valor, respeita a AFT e

iii) Desconsideramos o valor de depreciações de 36.474,26€, que o SP efetuou sobre a reavaliação das benfeitorias efetuada em 2017, dado que no caso de se tratar de bens objeto de reavaliação o art.º 15º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, refere que a depreciação correspondente apenas é aceite fiscalmente se a reavaliação for efetuada ao abrigo de legislação de caráter fiscal, o que não aconteceu no caso do SP já que a reavaliação que este realizou, não foi uma reavaliação efetuada ao abrigo de legislação de caráter fiscal (designadamente ao abrigo do regime facultativo de reavaliação de determinados ativos afetos à atividade empresarial estabelecido em 2016, pelo Decreto-Lei n.º 66/2016, de 3 de novembro), mas sim uma reavaliação livre.

 

Depois do exercício do direito de audição, na sequência da alegação da ora Requerente de que não havia reavaliações que tivessem sido consideradas no cálculo das mais-valias, a Autoridade Tributária e Aduaneira deixou de basear as correcções na indevida consideração de valores resultantes da invocada «reavaliação» de 2017, e decidiu manter as correcções com fundamento na referida falta de prova dos valores das benfeitorias e, agora, também com fundamento em estarem completamente depreciadas em 2017, o que concluiu com base na declaração Modelo 32.1 (Mapa de Reintegrações e Amortizações) entregue pela Requerente:

– «em relação às benfeitorias anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, a AT nunca disse ou afirmou que tais benfeitorias nunca foram realizadas pelo SP, uma vez que o que afirmou foi que as mesmas deviam de ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP com a alienação dos 5 imóveis»;

– «as referidas benfeitorias no valor 600.521,94€ (anteriores a 2001) devem ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas com a alienação dos 5 imóveis, devido ao facto de as mesmas se encontrarem totalmente depreciadas em exercícios anteriores ao de 2017, conforme resulta da Modelo 32.1 (Mapa de Reintegrações e Amortizações) entregue pelo SP, designadamente da coluna das reintegrações e amortizações de exercícios anteriores referente às benfeitorias e reparações anteriores a 2001, verificando-se, assim, que o valor líquido do Ativo imobilizado referente às benfeitorias o valor de 600.521,94€ deve ser de 0,00€ e não de 600.521,94 €, conforme por lapso foi inscrito no referido mapa»;

– «o Mapa de Mais-valias e Menos-valias (modelo 31) referente às benfeitorias (anteriores e 2001) - cfr. printscreen 31 deste relatório - apenas se encontra preenchido com o valor de 303.550,55€, referente ao valor de aquisição fiscal e contabilístico das referidas benfeitorias (que mais não é que o valor de aquisição de 600.521,94€ deduzido do valor de 296.971,38€, referente à reavaliação de 2017) e com o valor de 36.474,26, referente a depreciações/amortizações contabilísticas e fiscais, em vez de se encontrar preenchido como os demais mapas de Mais-valias e Menos-valias referentes a benfeitorias (cfr. printscreens 19 a 30 este relatório) realizadas pelo SP, os quais se encontram preenchidos com os valores de aquisição fiscal e contabilístico das benfeitorias e com os valores das depreciações/amortizações praticadas nos diversos anos do seu período de vida útil»;

– «No que respeita às depreciações acumuladas que o SP contabilizou nas sub-contas 4382020101 e 4382020201, nos valores, respetivamente, de 69.493,37€ e de 73.118,26€, que incidiram sobre as benfeitorias realizadas na Fração …-A (sub-conta 43250101) e na fração …-AP (sub-conta 43250201), nos valores, respetivamente, de 372.043,12€ e de 391.455,60€, não iremos considerar as mesmas, dado que, como acima demonstrámos no quadro 14 deste relatório, o valor das depreciações efetuadas pelo SP em relação às benfeitorias realizadas nos referidos edifícios, foi no valor acumulado de 745.461,15€».

 

Assim, interpretando o Relatório da Inspecção Tributária, conclui-se que são estes fundamentos invocados pela Autoridade Tributária e Aduaneira após o exercício do direito de audição, que a levaram a manter as correcções, alterando a fundamentação em face das alegações da ora Requerente e documentos por esta apresentados.

Por isso, são estes os fundamentos a atender na apreciação da legalidade das correcções efectuadas, não podendo ter-se em conta o alegado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo, relativamente à uma hipotética reavaliação de 2017, que foram abandonadas no Relatório da Inspecção Tributária, após o exercício do direito de audição.

 

 

3.3.1. Questão da irrelevância dos valores das benfeitorias anteriores a 2001 por falta de documentos comprovativos

 

A Requerente não apresentou documentos justificativos dos valores das benfeitorias anteriores a 2001, registadas na sua contabilidade, o que já havia sido fundamento para uma reserva do Revisor Oficial de Contas relativa a exercícios anteriores.

A Requerente defende, em suma, que tais documentos se reportam a despesas realizadas há mais de 10 anos, pelo que não era exigível a sua conservação, por força do disposto no artigo 123.º, n.º 4, do CIRC, na redacção em vigor em 2017, em que se estabelecia que «os livros, registos contabilísticos e respetivos documentos de suporte devem ser conservados em boa ordem durante o prazo de 10 anos» (Redacção da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março).

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende no presente processo, em suma, que a Requerente tem o ónus de provar as despesas referidas.

O CIRC, nas redacções anteriores à Lei n.º 28/2019, de 15 de Fevereiro, previa prazos máximos de obrigação de documentos de suporte da contabilidade, prazo esse que foi de 10 anos, com excepção do período entre as entradas em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, e da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, em que o prazo foi de 12 anos (artigos 98.º, n.º 5, na redacção inicial, a que correspondeu o artigo 115.º, n.º 5, na renumeração do Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, e o artigo 123.º, n.º 4, renumeração do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho).

Como entendeu o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 08-11-2006, processo n.º 0244/06, «não tendo o contribuinte apresentado quaisquer elementos justificativos dos valores considerados como valores de aquisição de imóvel, alegando que já não os possuía "pelo decurso do tempo", não pode a Administração Fiscal concluir que aquele não fez a prova dos elementos que compõem o respectivo valor de aquisição, designadamente daqueles que sejam diferentes do preço propriamente dito e levar em consideração o valor constante da escritura para efeito de cálculo de menos/mais-valias».

Podem ser colocadas pertinentes dúvidas quanto à adequação desta jurisprudência às situações de cálculo de mais-valias e menos-valias, em que a necessidade de comprovação das despesas pode colocar-se muitos depois dos 10 anos referidos, como sucede no caso em apreço.

Aliás, relativamente a mais-valias para efeitos de IRS, o Supremo Tribunal Administrativo tem entendido que para prazo de conservação de documentos relativos a despesas na data em que se declara que tais despesas tiveram lugar, como pode ver-se pelo acórdão do Pleno do Contencioso Tributário proferido no processo n.º 0106/18, datado de 27-06-2018.

No entanto, relativamente a IRC, o Supremo Tribunal Administrativo manteve aquele entendimento adoptado no acórdão do processo 0244/06, designadamente nos acórdãos de n 19-11-2014, processo n.º 056/14, de 30-01-2019, processo n.º 217/12.5BELLE 01245/17, e de 06-05-2020, processo n.º 0828/11.6BELRS, explicitando que o prazo se conta da data da inscrição na contabilidade (os dois últimos proferidos já depois referido do acórdão do processo n.º 0106/18).

Aquele acórdão do processo n.º 0244/06 foi proferido pelo Pleno, com fundamento em oposição de acórdãos, tendo em vista uniformização de jurisprudência, que foi votado por unanimidade, pelo que não se justifica que a jurisprudência não seja acatada, inclusivamente porque, como se vê pela jurisprudência citada, o entendimento tem sido mantido uniformemente relativamente a IRC.

De resto, no caso em apreço, resulta inquestionavelmente da prova produzida testemunhal que a Requerente fez benfeitorias antes de 2001 e a própria Autoridade Tributária e Aduaneira reconhece no Relatório da Inspecção Tributária que elas foram realizadas ao afirmar que «em relação às benfeitorias anteriores a 2001, no valor de 600.521,94€, a AT também nunca disse ou afirmou que tais benfeitorias nunca foram realizadas pelo SP, uma vez que o que afirmou foi que as mesmas deviam de ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas pelo SP com a alienação dos 5 imóveis».

Em face do exposto, acatando aquela jurisprudência uniforme, tem de se concluir que a Requerente tem razão quanto a esta questão, pelo que enferma de vício de violação de lei, designadamente o n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, ao considerar como fundamento da correcção que efectuou a falta de documentos relativos às despesas.

     

3.3.2. Questão da irrelevância dos valores das benfeitorias anteriores a 2001 para cálculo de mais-valias por estarem totalmente depreciadas em exercícios anteriores ao de 2017

 

Como se referiu os fundamentos da não aceitação da posição da Requerente que se devem ter em conta são os que a Autoridade Tributária e Aduaneira refere

– «as referidas benfeitorias no valor 600.521,94€ (anteriores a 2001) devem ser desconsideradas para efeito do cálculo das mais-valias fiscais obtidas com a alienação dos 5 imóveis, devido ao facto de as mesmas se encontrarem totalmente depreciadas em exercícios anteriores ao de 2017, conforme resulta da Modelo 32.1 (Mapa de Reintegrações e Amortizações) entregue pelo SP, designadamente da coluna das reintegrações e amortizações de exercícios anteriores referente às benfeitorias e reparações anteriores a 2001, verificando-se, assim, que o valor líquido do Ativo imobilizado referente às benfeitorias o valor de 600.521,94€ deve ser de 0,00€ e não de 600.521,94 €, conforme por lapso foi inscrito no referido mapa»;

– «o Mapa de Mais-valias e Menos-valias (modelo 31) referente às benfeitorias (anteriores e 2001) - cfr. printscreen 31 deste relatório - apenas se encontra preenchido com o valor de 303.550,55€, referente ao valor de aquisição fiscal e contabilístico das referidas benfeitorias (que mais não é que o valor de aquisição de 600.521,94€ deduzido do valor de 296.971,38€, referente à reavaliação de 2017) e com o valor de 36.474,26, referente a depreciações/amortizações contabilísticas e fiscais, em vez de se encontrar preenchido como os demais mapas de Mais-valias e Menos-valias referentes a benfeitorias (cfr. printscreens 19 a 30 este relatório) realizadas pelo SP, os quais se encontram preenchidos com os valores de aquisição fiscal e contabilístico das benfeitorias e com os valores das depreciações/amortizações praticadas nos diversos anos do seu período de vida útil»;

– «No que respeita às depreciações acumuladas que o SP contabilizou nas sub-contas 4382020101 e 4382020201, nos valores, respetivamente, de 69.493,37€ e de 73.118,26€, que incidiram sobre as benfeitorias realizadas na Fração …-A (sub-conta 43250101) e na fração …-AP (sub-conta 43250201), nos valores, respetivamente, de 372.043,12€ e de 391.455,60€, não iremos considerar as mesmas, dado que, como acima demonstrámos no quadro 14 deste relatório, o valor das depreciações efetuadas pelo SP em relação às benfeitorias realizadas nos referidos edifícios, foi no valor acumulado de 745.461,15€».

 

À face do teor do mapa de reintegrações e amortizações modelo 32 relativo ao exercício de 2017, junto pela Requerente no exercício do direito de audição, que consta das páginas 183 a 189 do processo administrativo, afigura-se claro que as benfeitorias anteriores a 2001 já estavam completamente depreciadas, como expressamente aí se declara, na parte que aqui interessa:

Uma imagem com texto, edifício, captura de ecrã

Descrição gerada automaticamente

Como se vê, a Requerente declarou naquele mapa que, em 2017, a totalidade das benfeitorias anteriores a 2001, no valor (resultante da reavaliação de 2006) de € 600.521,94, estavam depreciadas.

Como bem diz a Autoridade Tributária e Aduaneira, na Resposta que apresentou o Mapa de Reintegrações e Amortizações entregue pela Requerente contém um lapso, que resulta da falta de inscrição do valor € 600.521,94 na coluna “depreciações acumuladas” (que deve corresponder à soma da coluna “depreciações 18 exercícios anteriores” (€ 600.521,94) e “depreciações do exercício” (€ 0,00).

Mas, é claro que a Requerente declarou naquele mapa modelo 32 que as benfeitorias anteriores a 2001 estavam completamente depreciadas em exercícios anteriores a 2017.

As declarações fiscais dos contribuintes presumem-se verdadeiras, por força do artigo 75.º, n.º 1, da LGT, como defende a própria Requerente, o que, neste caso, impõe que se considere provado que as benfeitorias anteriores a 2001 estavam completamente depreciadas em 2017.

Aliás, esta é uma conclusão que nem sequer se afigura duvidosa, à face das regras da experiência que os árbitros devem aplicar na apreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 16.º, alínea e), do RJAT, pois, como já se referiu na fundamentação da decisão da matéria de facto, não é normal que despesas com tal antiguidade e valor relevante efectuadas por uma empresa que dispõe de contabilidade organizada e está atenta ao tratamento fiscal de reintegrações e amortizações (como evidenciam os mapas que a Requerente juntou no documento n.º 4), não estejam completamente depreciadas ao fim de mais de 16 anos, em face das taxas de depreciação aplicáveis, previstas  no Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, e no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro. ( [6] )

Por isso, considera-se provado que as benfeitorias anteriores a 2001 já estavam totalmente depreciadas em 2017.

Consequentemente, relevando para cálculo das mais-valias e menos valias o valor de aquisição deduzido das depreciações e amortizações aceites fiscalmente (artigo 46.º, n.º 2, do CIRC), sendo o montante das depreciações igual ao valor da aquisição das benfeitorias efectuadas antes de 2001, o valor dessas benfeitorias deve ser desconsiderado no cálculo das mais-valias.   

Assim, tem suporte legal este fundamento invocado no Relatório da Inspecção Tributária para desconsideração do valor destas benfeitorias anteriores a 2001, pelo que a liquidação impugnada não enferma de vício por ter como pressuposto essa desconsideração.

   

3.4. Questão do valor das mais-valias relativamente às quais deve entender-se que há intenção de reinvestimentos   

 

O artigo 48.º do CIRC estabelece um regime de redução da tributação das mais-valias a metade relativamente às quais há intenção de reinvestimentos do valor de realização, sujeito a condições.

No n.º 2 deste artigo 48.º admite-se o reinvestimento parcial do valor de realização.

Nos termos do n.º 5 daquele artigo 48.º «os sujeitos passivos devem mencionar a intenção de efetuar o reinvestimento na declaração a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 117.º do período de tributação em que a realização ocorre, comprovando na mesma e nas declarações dos dois períodos de tributação seguintes os reinvestimentos efetuados».

Na declaração Mod. 22 de IRC relativa ao ano de 2017 (campos 739 e 740), a Requerente, com base no seu entendimento de que a mais-valia fiscal era no montante de € 784.977,77, declarou o valor de € 649.917,27, referente à diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais sem intenção de reinvestimento (art. 46º do CIRC) e o valor de € 67.554,02 relativo a 50% da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias fiscais com intenção expressa de reinvestimento (art.º 48º, n.º 1 do CIRC) (página 46 do Relatório da Inspecção Tributária).

No caso em apreço, o valor de realização foi de € 2.905.000,00 e a Requerente alega ter declarado intenção de reinvestimento quanto a € 500.000,00, que corresponde à percentagem de 17,211704% daquele valor e foi com base nesta percentagem e nas mais-valias que entendeu ter obtido, no montante de € 784.977,77, que determinou o valor de € 67.554,02 que inscreveu no campo 740 da declaração modelo 22 (784.977,77*17,211704% = 135.108,04 *50% = 67.554,02€).

A existência de uma intenção de reinvestimento de uma percentagem de 17,21% (com aproximação limitada à centésima) do valor de realização é reconhecida pela Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária, em que refere:

 

Em relação a este assunto do reinvestimento parcial verifica-se que o SP declarou no campo 739 do quadro 07 da sua Mod. 22, a obtenção de mais-valias no valor de 649.917,27€ e que de acordo com o campo 740 do mesmo quadro se constata que 50% das mais-valias com intenção de reinvestimento correspondem ao valor de 67.554,02€, o que equivale a dizer que declarou a obtenção de Mais-Valias fiscais no montante total de 785.025,31€ [649.917,27€ + (67.554,02€ x 100 / 50) = 649.917,27€ + 135.108,04€]. Resultando, assim, que das mais-valias fiscais obtidas pelo SP a parte proporcional que concorreu para a formação do lucro tributável em metade do seu valor corresponde a 17,21% das mais-valias fiscais obtidas (135.108,04€ x 100 / 785.025,31€).

Dado que o valor de realização obtido pelo SP com a alienação dos seus AFT foi no montante de 2.905.000,00€, a parte do valor de realização que deve ser reinvestido para que o SP possa beneficiar da regra das mais-valias no valor de 135.108,04€ só poderem ser tributadas em 50% do seu valor (67.554,02€), corresponde ao valor de 499.950,50€ (2.905.000,00€ x 17,21 / 100).

 

 

Após a inspecção, no Documento de Correcção Único que consta do processo administrativo, a Autoridade Tributária e Aduaneira inscreveu no campo 739 o valor de € 2.586.805,25 e no campo 740 manteve o valor de € 67.554,02.

A Requerente defende que há contradição em, por um lado, corrigir o valor da mais-valia apurada pela Requerente, aumentando-a, e, por outro, aceitar implicitamente como válido o valor da mais-valia fiscal apurada pela Requerente, 784.977,77€, para efeitos do reinvestimento parcial do valor de realização a ela associado.

A Requerente alude a falta de fundamentação, na alínea x) do artigo 203.º do pedido de pronúncia arbitral, mas, pelo que já se referiu no ponto 3.2. deste acórdão, não se está perante um vício de falta de fundamentação formal, pois conhecem-se as razões que motivaram a correcção global das mais-valias.

Mas, estar-se-á perante um vício de violação de lei, designadamente os artigos 46.º e 48.º, n.º 1, do CIRC, se estiverem incorrectos os valores que, na sequência da inspecção, deveriam ser considerados naqueles campos 739 e 740 e que formam pressuposto da liquidação.

A Autoridade Tributária e Aduaneira já reconheceu, no despacho de revogação referido nos autos, que a percentagem do valor de realização relativamente ao qual há intenção de reinvestimento deve reflectir-se nos valores de mais-valias a indicar naqueles campos 739 e 740, pelo que considerou errados os valores inscritos no referido Documento Único de Correcção, em que se baseou a liquidação.

Assim, não há controvérsia sobre essa matéria, devendo ter-se como assentes esses erros na determinação da matéria tributável que serviu de base à liquidação impugnada, por desconformidade com o preceituado no n.º 2 do artigo 48.º do CIRC, em que se prevê, para os casos de reinvestimento parcial do valor de realização, a aplicação proporcional à diferença entre as mais-valias e as menos-valias a que se reportam aqueles campos 739 e 740.

Assim, tem de se concluir que a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, por assentar em valores errados quanto às mais valias a considerar nos referidos campos 739 e 740.

Estes erros justificam a anulação total da liquidação e não a anulação parcial (como se terá entendido no despacho de revogação), por erro quanto à determinação da matéria tributável, pois ambos os valores inscritos nos campos 739 e 740 do Documento Único de Correcção em que baseou são errados.

Isto não significa que não haja outra matéria tributável que possa vir a ser considerada em eventual renovação da liquidação, mas, como lapidarmente esclareceu o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 31-01-2018, processo n.º 01157/17, por força do princípio da separação de poderes enunciado nos artigo 2.º da CRP, não sendo o Tribunal um órgão com competências primárias para definir a tributação, não pode substituir-se à Administração na determinação de outra matéria tributável (sob pena de estar a invadir o núcleo essencial da função administrativa-tributária).

Assim, independentemente da eventual anulação administrativa que possa ser efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira na sequência do reconhecimento daqueles erros, impõe-se, por isso, a anulação da liquidação impugnada, com fundamento neste vício, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

4. Restituição de quantia paga e juros indemnizatórios

 

         A Requerente pede a restituição do montante de € 491.058,11, com juros indemnizatórios. Como resulta do documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, em 11-01-2022, a Requerente pagou a quantia de € 491.499,39 (e não a que pede, que é de € 491.058,11, nem a que foi liquidada, que é de € 491.532,36), relativa à liquidação de IRC e juros compensatórios impugnada e pede a restituição do que foi pago indevidamente acrescido de juros indemnizatórios.

         De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.

Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios.

Na sequência da anulação da liquidação, a Requerente tem direito a ser reembolsada da quantia indevidamente suportada, no montante de € 491.499,39. Como se referiu, a liquidação é no valor de € 491.532,36 e a Requerente pede o reembolso de € 491.058,11, mas apenas se provou o pagamento de € 491.499,39).

No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

No caso em apreço, conclui-se que há erro na liquidação que é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pois foi ela quem efectuou a liquidação por sua iniciativa.

Os juros indemnizatórios devem ser calculados com base na quantia de € 491.499,39 e contados desde 11-01-2022, data em que a Requerente foi efectuado o pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

 

 

 

            5. Decisão     

 

            De harmonia com o exposto acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular a liquidação de IRC com o n.º 2021 …, com o valor de € 491.532,36;
  3. Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso, quanto à quantia de € 491.499,39, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-la à Requerente;
  4. Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios, nos termos referidos no ponto 4 deste acórdão.

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 491.058,11 indicado pela Requerente e sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

7. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 7.650,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 12-12-2022

 

Os Árbitros

 

 

 

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

(Relator)

 

 

(Pedro Roque)

 

 

 

(José Coutinho Pires)



[1]  Essencialmente neste sentido, podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27-02-2008, processo n.º 0955/07, de 07-05-2008, processo n.º 0102/08, e de 25-02-2015, processo n.º 0709/14.

[2]             Essencialmente neste sentido, podem ver-se, entre muitos, os seguintes acórdãos do STA: de 4-11-1998, processo n.º 40618; de 10-3-1999, processo n.º 32796; de 6-6-1999, processo n.º 42142; de 9-2-2000, processo n.º 44018; de 28-3-2000, processo n.º 29197; de 16-3-2001, do Pleno, processo n.º 40618; de 14-11-2001, processo n.º 39559; de 18-12-2002, processo n.º 48366.

[3] VIEIRA DE ANDRADE, O dever da Fundamentação Expressa de Actos Administrativos, páginas 11-13.

[4] Essencialmente neste sentido, podem ver–se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

–   de 10–11–98, do Pleno, proferido no recurso n.º 032702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12–4–2001, página 1207:

–   de 19-06-2002, processo n.º 047787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10–02–2004, página 4289.

–   de 09-10-2002, processo n.º 0600/02.

–   de 12-03-2003, processo n.º 01661/02;

– de 22–03–2018, processo nº 0208/17.

 

               Em sentido idêntico, podem ver–se:

 –  MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é "irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto", e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que "não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa".           

 –  MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que "as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade".

 

( [5] )        Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: de 11-2-93, do Pleno, processo n.º 026389, publicado em Apêndice ao Diário da República de 16-10-95, página 103; de 4-11-93, processo n.º 031798, publicado em Apêndice ao Diário da República de 15-10-96, página 6007; e de 03-02-94, processo n.º 032325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 20-12-96, página 791.         

No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1999, processo n.º 023720; e 19-12-2007, recurso n.º 0874/07.

[6] As benfeitorias anteriores a 2001 foram agrupadas pela Requerente num único item do activo e não individualmente, mas, como se refere no ponto  2.2.1.3. deste acórdão, as taxas aplicáveis a bens dos tipos dos que se provou reportarem-se as benfeitorias, variando entre 12,5% e 25%, não viabilizam a depreciação de qualquer deles em mais de 16 anos.