SUMÁRIO: I – No pedido de pronúncia arbitral de anulação de um acto de liquidação de IMI não podem ser apreciados vícios ou erros alegadamente praticados no procedimento de avaliação directa que fixou o valor patrimonial tributário, em que assentou essa liquidação.
II - O procedimento de fixação da matéria colectável ficou concluído após a notificação do valor patrimonial tributário e decurso do prazo posterior para requerer um pedido de segunda avaliação e subsequente apresentação de uma impugnação judicial. III - Uma vez decorridos três anos, contados a partir do final do ano de conclusão do procedimento avaliativo, o sujeito passivo poderia, em qualquer momento, solicitar um novo pedido de avaliação para reapreciação do valor patrimonial tributário, cujos efeitos retroagiriam à data de apresentação desse pedido.
DECISÃO ARBITRAL
I - Objecto do pedido e tramitação processual
A..., com número de identificação de pessoa colectiva ... e sede social na ..., ..., ..., ...-... Porto (doravante designada como Requerente), representada por «B..., S. A.», com número de identificação de pessoa colectiva..., apresentou pedido de pronúncia arbitral, requerendo:
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A anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa que apresentou em 24 de Setembro de 2021 dos actos de liquidação do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”) de 2016 n.º 2016..., 2016... e 2016...; e
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Consequente restituição de imposto no valor de € 32.128,37.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “Requerida” ou por “AT”).
Por decisão do Conselho Deontológico foi designado como árbitro único o signatário.
O tribunal arbitral singular foi constituído em 5 de Julho de 2022.
Em 8 de Julho de 2022 a Requerida foi notificada para, nos termos dos n.º 1 e 2 do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), apresentar resposta e remeter o processo administrativo.
Em 22 de Setembro de 2022, a Requerida apresentou a referida resposta. Estando em falta a junção do processo administrativo, a Requerida foi novamente notificada, em 10 de Outubro, para proceder ao envio do mesmo.
Em 21 de Outubro a Requerida informou que, malgrado as diligências efectuadas, ainda não lograra obter o processo administrativo junto do Serviço de Finanças Lisboa.... Mais requereu a dispensa de envio desse processo em face da documentação apresentada pela Requerente, a qual identificava tanto os actos impugnados como os imóveis subjacentes. Por fim, solicitou que a Requerente fosse notificada para juntar aos autos o comprovativo de envio do pedido de revisão oficiosa.
O tribunal arbitral, considerando que a remessa do processo administrativo visa assegurar a completude dos documentos e factos necessários ao enquadramento e apreciação do litígio, reconheceu que os elementos carreados pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral e respectivos anexos se afiguravam adequados e bastantes para dirimir a matéria de direito submetida a decisão arbitral. Acresce que a validade e suficiência desses elementos fora aceite pela Requerida.
Pelo que, em 25 de Outubro de 2022, o tribunal arbitral notificou a Requerente para aperfeiçoar a documentação anexa ao pedido de pronúncia arbitral (o que esta fez em 2 de Novembro) e a Requerida da dispensa de envio do processo administrativo.
Por despacho de 9 de Setembro, foi dispensada tanto a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT como a apresentação de alegações finais.
As partes gozam de capacidade e legitimidade jurídicas.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
II - MATÉRIA DE FACTO
Factos considerados provados em face da documentação
Com base nos documentos juntos pela Requerente e os que constam do processo administrativo, consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
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A Requerente está organizada como um fundo de investimento imobiliário fechado, sendo gerido e administrado pela sociedade gestora «B..., S. A.»;
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O fundo é proprietário de diversos bens imobiliários, incluindo dois terrenos para construção com inscrição matricial n.º U-... e U-..., sitos na freguesia das ... (Lisboa);
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O valor patrimonial tributário (“VPT”) dos prédios foi determinado em 20 de Setembro de 2005, data de entrega das declarações modelo 1 à qual retroage o VPT fixado no procedimento de avaliação directa;
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O VPT do prédio U-... foi fixado em € 8.630.730,00 (ficha de avaliação n.º...);
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Para o prédio U-... foi definido o VPT de € 8.228.310,00 (ficha de avaliação n.º ...);
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Ambas as avaliações foram efectuadas, nos termos do n.º 1 do artigo 38.º do Código do IMI, tendo por base os coeficientes de localização, de afectação e de qualidade e conforto, conforme se retira das fórmulas utilizadas:
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A Requerente não reagiu contra os VPT determinados em ambos os procedimentos de avaliação;
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Da aplicação das regras de correcção monetária consagrada no artigo 138.º do Código do IMI, o VPT, no ano de 2016, esta fixado em € 9.155.855,98 (U-...) e € 8.728.951,24 (U-...);
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A Requerente foi notificada dos actos tributários de liquidação de IMI n.º 2016..., ... e ..., com os valores individuais de respectivamente, € 19.941,29, € 19.941,27 e € 19.941,26 (valor total de € 59.823,82);
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As liquidações tiverem por base o VPT dos referidos prédios à data do facto tributário de IMI (31 de Dezembro de 2016);
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A Requereu procedeu ao pagamento integral das três notas de liquidação de IMI;
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Em 24 de Setembro de 2021 a Requerente submeteu um pedido de revisão oficiosa das três supra referidas notas de liquidação de IMI, solicitando a anulação parcial das mesmas com fundamento em erro na liquidação deste tributo relativamente ao ano de 2016. Dessa anulação parcial decorreria a restituição de € 32.128,37;
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A Requerida não respondeu ao pedido de revisão oficiosa;
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Em 22 de Abril de 2022 a Requerente, tendo considerado o pedido de revisão oficiosa como tacitamente indeferido, apresentou o pedido de pronúncia arbitral em apreciação.
Factos não provados
Com relevo para a apreciação do mérito, inexistem factos não provados.
III - Síntese dos fundamentos de direito invocados pelas Partes
O entendimento da Requerente
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O litígio em causa é arbitrável, dado que o tributável arbitral dispõe de competência para apreciar a ilegalidade oriunda de acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa. Sendo de considerar que o acto ficcionado (o indeferimento do pedido) conhece da legalidade do acto de liquidação, pelo que o meio adequado para a sua impugnação contenciosa é o processo de impugnação judicial, do qual o pedido de pronúncia arbitral constitui um meio alternativo;
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No ano sub judice (2016), relativamente aos terrenos para construção em apreço, a AT liquidou um montante de IMI superior ao montante legalmente devido face aos VPT que deveriam ter sido considerados para efeitos de cálculo da colecta de imposto. Consequentemente, os inerentes actos de liquidação de IMI padecem de erro nos pressupostos de facto e de Direito, acarretando a anulação (parcial) da liquidação de IMI por erro na determinação da matéria tributável;
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A AT, enquanto entidade responsável pela determinação dos VPT dos prédios através dos métodos de avaliação disponíveis, deverá sempre cingir- se às regras legalmente estabelecidas que regulam os diferentes métodos de avaliação, não devendo utilizar métodos de avaliação / determinação do VPT que não tenham base legal e / ou que não sejam aplicáveis aos concretos prédios urbanos em avaliação;
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A Lei de Orçamento do Estado para 2021 (Lei n.º 75 - B/ 2020, de 31 de Dezembro) alterou o artigo 45.º do Código do IMI, modificando a fórmula de cálculo do VPT dos terrenos para construção. Porém, tal só produziu efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2021, pelo que as liquidações de IMI referentes ao ano de 2016 se rege pela redação do artigo 45.º vigente nessa data;
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Nos termos do n.º 1 do referido artigo 45.º, na redacção vigente à data do facto tributário em apreço (31 de Dezembro de 2016), o “valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor dos terrenos adjacentes à implantação”. À luz do n.º 2 do referido preceito, o “valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas”;
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É inegável que os coeficientes de afectação (estabelecido no artigo 41.º), de localização (definido no artigo 42.º), de qualidade e conforto (regulado no artigo 43.º) e de vetustez (consagrado no artigo 44.º) não eram aplicáveis aos terrenos para construção, dado não estarem consagrados na respectiva fórmula legal;
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Conforme o disposto na redacção conferida ao n.º 3 do artigo 45.º do Código do IMI que se encontrava em vigor em 2016, a fixação da percentagem do valor do terreno de implantação - esta sim um dos elementos legais para efeitos de cálculo dos valores patrimoniais tributários de terrenos para construção - tem em consideração as características referidas no n.º 3 do artigo 42.º. Disposição normativa esta, que diz respeito à fixação do coeficiente de localização, estipulando que se deve ter em consideração a acessibilidade, a proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio, os serviços de transporte públicos ou a localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário;
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Até recentemente, a AT tipicamente calculava o VPT dos terrenos para construção com base na fórmula prevista no n.º 1 do artigo 38.º do Código do IMI para prédios urbanos, edificados, classificados como habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, considerando os coeficientes de localização, de afectação ou de qualidade e conforto (só não era aplicado o coeficiente de vetustez referente à idade do prédio);
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A jurisprudência do STA tem sido constante e reiterada no sentido de que a fórmula de cálculo / determinação do VPT dos terrenos para construção não deve considerar os coeficientes de localização, afectação e qualidade e conforto;
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Veja-se o Acórdão proferido pelo STA, no processo n.º 01107/ 16, de 4 de Maio de 2017, nos termos do qual “mandando o nº 3 do artigo 45º do CIMI utilizar esses mesmos critérios para determinar as percentagens de apuramento do valor da área de implantação, teríamos uma aplicação duplicada daqueles quatro factores que estão na base do coeficiente de localização, pois que estas características são também as mesmas que determinam a construção do coeficiente de localização: tais características determinam, primeiro, a construção do coeficiente de localização e em seguida, também a construção da percentagem do apuramento do valor da área de implantação, pelo que dada a coincidência de serem os mesmos factores que estão na base da construção do coeficiente de localização e das percentagens, parece também ser defensável a ideia de que não seria aplicável na fórmula de avaliação dos terrenos para construção o coeficiente de localização”;
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Pelo que, concluiu o STA no aresto em análise que na “(…) fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do artigo 45º do CIMI”;
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No mesmo sentido, aponta-se ainda o acórdão de 28 de Junho de 2017 (processo n.º 0897/ 16), o acórdão do STA de 14 de Novembro de 2018 processo n.º 0398/08.2BECTB 0133/18) e a decisão arbitral no processo n.º 554/2019-T;
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E quanto à ilegalidade da aplicação do coeficiente de afectação previsto no artigo 41.º do Código do IMI, e da aplicação do coeficiente de qualidade e conforto previsto no artigo 43.º deste mesmo Código, para efeitos de determinação do VPT de terrenos para construção, veja-se ainda: Acórdão do STA de 17 de Maio de 2017 (processo n.º 0902/16); Acórdão do STA de 16 de Maio de 2018 (processo n.º 0986/16); Acórdão do STA de 9 de Outubro de 2019 (processo n.º 0165/14.4BEBRG); Acórdão do STA de 3 de Julho de 2019 (processo n.º 016/10.9BELLE);
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Por fim, o Acórdão do STA de 23 de Outubro de 2019, proferido no processo n.º 0170/16.6BELRS 0684/17 resume a jurisprudência quanto à ilegal aplicação destes três coeficientes na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção;
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A própria AT reconheceu o erro por si cometido ao longo dos últimos anos quanto à determinação destes VPT, tendo alterado o método (ilegal) por si utilizado para estes efeitos, e passando a desconsiderar, conforme os termos fixados na lei, os coeficientes de localização, de afectação e de qualidade e conforto. Daqui se extrai que o erro de consideração desses coeficientes efeitos de cálculo do VPT dos terrenos para construção resulta de uma errónea aplicação das normas legais por parte da AT, pelo que os actos tributários em crise padecem de erro que lhe é imputável;
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Para efeitos de liquidação de IMI, o VPT dos terrenos para construção constitui a matéria tributável deste imposto. Qualquer erro nos pressupostos de facto e/ou de direito do qual resulte um erróneo cálculo dos VPT dos imóveis sobre os quais incide o acto tributário de liquidação de IMI e que, consequentemente, faz com que seja determinado um montante de imposto superior ao legalmente devido, constitui um vício que impõe a anulabilidade desse mesmo acto tributário na parte correspondente ao montante de imposto liquidado em excesso;
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O erro na determinação da matéria tributável para efeitos de IMI, resulta, inquestionavelmente, numa colecta de imposto superior à legalmente devida, estando assim preenchido o requisito para a revisão oficiosa das liquidações de IMI incorrectamente emitidas;
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Considerando que é a AT a entidade responsável pela determinação concreta dos VPT dos prédios, bem como a entidade emitente das liquidações de IMI, tais erros nessa determinação são “erros imputáveis aos serviços” que justificam plenamente a solicitada revisão oficiosa nos termos gerais do n.º 1 do artigo 78.º da LGT;
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Importa trazer à colação o entendimento do Tribunal Central Administrativo Sul, de 31 de Outubro de 2019 , proferido no processo n.º 2765/ 12.8 BELRS, em que se pode ler que, sem prejuízo do pedido de revisão oficiosa ser “inaplicável aos actos de fixação do VPT (actos administrativos em matéria fiscal)”, tal “não quer dizer que [o pedido de revisão oficiosa] seja de todo imprestável para o caso subjudice, visto que a coberto de um VPT ilegal foram produzidas liquidações de tributo (IMI) que foram exigidas à recorrida”. Devendo a revisão oficiosa de liquidações ser “realizada pela administração tributária, ainda que sob impulso inicial do contribuinte, quando tenha ocorrido erro imputável aos serviços”, tal “se verifica, precisamente no caso em apreço, erro esse que se traduziu até numa injustiça grave e notória concretizada na fixação de um VPT em valor claramente superior ao que resultaria das disposições legais que deveriam ter sido aplicadas”.
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Segundo o mesmo acórdão, este erro, “independentemente da inércia impugnatória da recorrida após a notificação do VPT [e.g. através de apresentação de pedido de 2 .ª avaliação ou de reclamação de matrizes], não pode ser imputável a qualquer comportamento negligente desta, visto que o erro no cálculo e fixação do VPT ocorre num procedimento desencadeado e concretizado pela administração e que sempre justificaria a revisão ao abrigo do n.º 4 do normativo em questão, se o n.º 1 não fosse inteiramente aplicável”;
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Deste modo, conforme sumariado pelo Tribunal, a “errada fixação do VPT (…) pode ser arguida através do pedido de revisão oficiosa das liquidações, nos termos conjugados dos artigos 78.º da LGT e 115.º do CIMI, ainda que o contribuinte não tenha reagido atempadamente contra essa fixação”. No mesmo sentido vai a jurisprudência arbitral tributária, mormente a resultante das decisões arbitrais nos processos n.º 760/2020-T e n.º 759/2020-T, sendo que tais decisões foram proferidas em processos incidentes sobre a mesma temática aqui em crise;
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Em conclusão, na sequência da errónea quantificação do VPT dos dois terrenos para construção detidos pela Requerente, a colecta de IMI referente ao ano de 2016 (e liquidada em 2017 através dos actos tributários em crise) foi superior ao legalmente devido na importância de € 32.128, 37. Pelo que os referidos actos de liquidação carecem de anulação parcial nesse montante;
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Sem prescindir, a aplicação dos coeficientes de avaliação na determinação do VPT de terrenos para construção seria contrária ao princípio da legalidade tributária, conforme consagrado na alínea i) do n.º 1 do artigo 165. º e no n.º 2 do artigo 103 .º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). Com efeito, a determinação do VPT de terrenos para construção sempre deverá ser efectuada (exclusivamente) com base no regime consagrado no artigo 45.º do Código do IMI (à data dos factos tributários);
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Pelo que, a interpretação do artigo 45.º do Código do IMI, no sentido de que os coeficientes de avaliação consagrados no artigo 38.º do Código do IMI devem ser atendidos no apuramento do VPT deste tipo de prédios, afrontaria o princípio da legalidade tributária, no sentido de reserva de lei formal, ínsito na alínea i) do n.º 1 do artigo 165 .º e no n.º 2 do artigo 103.º, ambos da CRP.
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A disciplina dos elementos essenciais dos impostos, por ser matéria de competência reservada do parlamento, tem de constar de lei ou de decreto-lei autorizado, sendo que os elementos essenciais dos impostos são reconduzidos, por imperativo constitucional, à incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes. No caso em apreço, está em causa precisamente a interpretação e aplicação de normas que determinam a base de incidência do IMI;
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Esta limitação legal em matéria de incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes, está também consagrada no artigo 11. º , n.º 4 da LGT;
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Ora, quando se expande a letra da lei para nela incluir situações que não estão expressamente previstas, tal equivale a criar norma onde não existia norma, e, portanto, em última análise, a exercer poder legislativo em matéria constitucionalmente vedada. Assim violando o princípio da legalidade fiscal, do qual decorre a denominada “tipicidade fechada” ou numerus clausus tributário;
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Nestes termos, seria formalmente inconstitucional a norma pretensamente extraída do artigo 45.º do Código do IMI, quando interpretada no sentido de os coeficientes de avaliação consagrados no artigo 38.º do mesmo compêndio teriam aplicação na determinação do VPT de terrenos para construção.
O entendimento da Requerida
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A origem do diferendo que opõe a Requerente à Autoridade Tributária diz respeito à fórmula de cálculo do VPT dos terrenos para construção inscritos na matriz sob os artigos U-... e U-..., ambos da freguesia das ... (com origem nos artigos U-... e U-... da extinta freguesia de ...);
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Em 20.09.2005 foram entregues as declarações modelo 1 do IMI relativas aos referidos prédios, às quais foram atribuídos os n.ºs ... e ..., com o motivo de “primeira transmissão na vigência do IMI”. Por força dessas declarações, foram desencadeados os procedimentos avaliativos, tendo sido fixados os VPT de:
- € 8.630.730,00 (ficha de avaliação n.º ...), em 01.11.2006, referente ao artigo U-..., o qual foi notificado, em 16.11.2006, através do ofício n.º ...;
- € 8.228.310,00 (ficha de avaliação n.º ...), em 25.04.2006, referente ao artigo U-..., o qual foi notificado, em 18.05.2006, através do ofício n.º ... .
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Decorrido o prazo de trinta dias após a notificação do resultado das avaliações, a Requerente não apresentou as reclamações/pedidos de 2.ª avaliação previstas no artigo 76.º do Código do IMI para reagir contra a fixação daqueles VPT, pelo que os mesmos se tornaram definitivos e foram registados na matriz;
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Relativamente à liquidação de IMI do ano 2016, os VPT que serviram de base à liquidação, provieram da actualização trienal prevista no artigo 138.º do Código do IMI (€ 9.155.855,98 € para o U-...e € 8.728.951,24 para o U-...);
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A AT acolheu o entendimento preconizado pelos tribunais superiores, no sentido de, na determinação do VPT dos terrenos para construção, relevar a regra específica constante do artigo 45.º do Código do IMI, não sendo considerados os coeficientes de localização, de afectação e de qualidade e conforto previstos no artigo 38.º;
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Sucede que o procedimento avaliativo constitui um acto autónomo e destacável para efeito de impugnação arbitral. Que, se não for impugnado nos termos e prazo fixado, se consolida na ordem jurídica como caso decidido ou resolvido, semelhante ao caso julgado, que a posterior liquidação tem de acolher. E cuja impugnação não abrange os erros ou vícios que eventualmente tenham ocorrido nessa avaliação;
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Não tendo a Requerente colocado em causa o VPT obtido na 1.ª avaliação, requerendo uma 2.ª avaliação, o mesmo fixou-se, não sendo possível conhecer, na posterior liquidação, de eventuais erros ou vícios cometidos nessa avaliação;
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Ou seja, a errónea qualificação e quantificação do valor patrimonial apenas pode ser conhecida em sede de impugnação da 2.ª avaliação. Neste sentido, veja-se o acórdão do STA (processo n.º 633/14, de 15/02(2017) e as decisões arbitrais nos processos n.º 40/2021-T e n.º 510/2021-T;
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Adicionalmente, o Tribunal Arbitral está limitado pelo princípio do pedido, pelo que importa delimitar com exactidão o respectivo âmbito e causa de pedir. Ora, os actos de fixação do VPT não constituem actos de liquidação, antes se apresentando como actos autónomos e dotados de eficácia próprio e directamente sindicáveis;
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No plano doutrinário, Jorge Lopes de Sousa, José Nasalta Nabais e Alberto Xavier coincidem na segregação entre o acto autónomo e destacável, cujos vícios podem ser arguidos em procedimento próprio, e a liquidação do tributo que se cinge à aplicação da taxa à matéria colectável previamente fixado no anterior acto de determinação do VPT. Verifica-se a prejudicabilidade entre a avaliação e a posterior liquidação, da qual decorre a impossibilidade de o acto de liquidação recuperar a matéria apreciada no acto destacável precedente;
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Aliás, esta posição está em concordância com o mais recente entendimento da jurisprudência dos Tribunais Superiores que qualifica os actos de fixação dos VPT como actos destacáveis diretamente susceptíveis de impugnação autónoma, que, se não atacados na forma e no tempo próprios, se consolidam na ordem jurídica e a posterior liquidação não poderá deixar de acatar. Veja-se os acórdãos do STA n.º 0885/16 de 10/05/2017 e n.º 1808/12.OBEPRT, de 18/10/2018, o acórdão do TCA Sul n.º 5964/12, de 20/12/2012 e as decisões arbitrais n.º 540/2020-T e n.º 487/2020-T;
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Uma vez que os vícios da fixação do VPT não são sindicáveis na análise da legalidade do cato de liquidação, porquanto os mesmos, sendo destacáveis e antecedentes destes, já se consolidaram na ordem jurídica não é, nem legal, nem admissível, a apreciação da correção do VPT em sede de impugnação do ato de liquidação;
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Bem vistas as coisas, a letra da lei não abrange os actos de avaliação patrimonial, que não são actos tributários previstos no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, nem são actos de apuramento da matéria tributável. Nem se verifica qualquer erro no acto de liquidação, o qual em cumprimento da lei foi calculado com base no VPT constante na matriz predial. Assim como também não é posta em causa a validade dos actos administrativos ou tributários de diversa natureza que, para diferentes efeitos, assumem como referencial o VPT de um imóvel constante da matriz predial;
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Um eventual erro do acto de liquidação consubstanciar-se-ia na consideração, à data, de um qualquer VPT diferente do que, à data, constava na matriz predial, o que não se verifica no caso em apreço;
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Por outro lado, mesmo que assim não se entendesse, o fundamento da injustiça grave ou notória do n.º 4 do artigo 78° da LGT, não é invocável quando a liquidação do IMI tenha sido efetuada de acordo com o n.º 1 do artigo 113.º do CIM;
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Pede a Requerente que seja desaplicada, no caso concreto, a norma pretensamente extraída do artigo 45.º do Código do IMI, por violação do princípio constitucional da legalidade tributária;
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O que importa referir nesta sede não é a violação do princípio da legalidade tributária, mas sim a constitucionalidade do regime da consolidação dos actos administrativos tributários por falta da sua impugnação atempada. Sendo que a lei veda a possibilidade de se tornear a falta de impugnação contenciosa tempestiva reabrindo a usa impugnabilidade no sentido de vir a obter por esta via os efeitos típicos da impugnação que não foi efetuada no devido tempo;
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A prevalecer a argumentação da Requerente, essa sim, acarretaria uma violação do princípio da igualdade tributária privilegiando os contribuintes que em tempo não contestaram o VPT face àqueles que o fizeram tempestivamente;
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Finalmente cumpre referir que a atual interpretação da forma de cálculo do VPT dos terrenos para construção já está alinhada com o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Administrativo pelo que se afigura prejudicada a controvérsia sobre a aplicação do artigo 38.º ou do 45.º do Código do IMI na avaliação dos terrenos para construção.
IV - Do direito
Os prédios urbanos detidos pela Requerente (terrenos para construção) foram objecto de avaliação, segundo as regras do Código do IMI, em 2006. Os VPT decorrentes desse procedimento avaliativo apresentavam natureza provisória, na medida em que as partes interessadas - o sujeito passivo e o chefe do serviço de finanças - poderiam, no prazo de 30 dias, solicitar a realização de uma segunda avaliação directa.
Até à entrada em vigor da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, a câmara municipal não era considerada parte interessada.
Dado que nenhuma das duas partes interessadas requereu a segunda avaliação, o procedimento de avaliação subjacente ficou concluído, i. e. ocorreu a definitividade do VPT.
Assim, esse VPT definitivo foi inscrito nas cadernetas prediais, passando a constituir a base tributável de IMI a partir do ano de 2005.
Exceptuando as situações e condições que obrigam à actualização da inscrição matricial (artigo 13.º do Código do IMI), as partes interessadas estão impedidas de solicitar uma nova avaliação após o decurso do prazo de 3 anos da actualização do prédio na matriz, conforme limitação consagrada no n.º 9 do artigo 130.º do código do IMI. Sendo que, até 1 de Janeiro de 2014 (data de entrada em vigor da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), esse prazo de 3 anos contava-se a partir da data de encerramento da matriz do ano em que o resultado da avaliação foi inscrito na matriz (31 de Dezembro 2006).
Assim, a partir de 1 de Janeiro de 2010, o sujeito passivo poderia - em qualquer momento - apresentar um pedido de avaliação, do qual, uma vez concluído o respectivo procedimento avaliativo, resultaria um novo VPT. Que passaria a constituir a matéria colectável do IMI com efeitos reportados ao ano de apresentação desse pedido de avaliação.
Importa salientar que a realização das tarefas em que se concretiza a avaliação não é da competência da AT, que a legislação trata, nesta matéria, como uma parte e numa posição paritária para com o sujeito passivo e a câmara municipal.
Isto, na medida em que a avaliação é efectuada por peritos locais que exercem as suas funções com independência técnica (artigos 63.º e 64.º do Código do IMI). Embora nomeados pela directora-geral da AT, não estão subordinados à AT.
A legislação confere aos serviços de finanças (artigo 67.º do Código do IMI) uma competência de orientação e fiscalização do trabalho dos peritos locais, sem que tal permita a interferência técnica na concretização da avaliação.
É precisamente por constituir uma parte interessada, que a AT dispõe de legitimidade para reclamar do procedimento de avaliação (n.º 1 do artigo 76.º do Código do IMI).
Iniciando a apreciação da matéria substantiva, a mesma reconduz-se à (in)sindicabilidade do acto de liquidação de IMI com fundamento em erros praticados no acto de fixação do VPT que constitui a respectiva matéria colectável.
Concretamente, trata-se de determinar se o alegado erro praticado no acto de fixação do VPT e vertido em actos subsequentes de liquidação de IMI, pode ser apreciado em sede do presente pedido de pronúncia arbitral.
A Requerente considera que o erro praticado na avaliação inquinou as liquidações de impostos que lhe sucederam. Pelo que o pedido de revisão oficiosa e subsequente pedido de pronúncia arbitral constituem o meio adequado para, através da anulação parcial da liquidação do IMI de 2016, assegurar a correcção desse erro.
Por seu turno, a Requerida insiste que a Requerente pretende, através do acto de liquidação, sindicar a legalidade do acto precedente de determinação do VPT. Sendo que este último é destacável e está consolidado no ordenamento jurídico.
Partindo para a conclusão, entendemos que não assiste razão à Requerente. Entendimento este que já foi vertido nas decisões arbitrais n.º 652/2021-T e n.º 756/2021-T, enquanto árbitro signatário das mesmas.
Seguindo de perto essa última decisão arbitral, o primeiro fundamento em apoio desse sentido de decisão consiste no facto de o Código do IMI oferecer um procedimento próprio e específico, tanto para solicitar a revisão dos actos de determinação do VPT, como para suscitar a apreciação de vícios ou erros que os possam afectar.
Como vimos, a Requerente aceitou o VPT determinado no procedimento de avaliação, na medida em que não solicitou uma segunda avaliação. Na qual poderia ter questionado a fórmula de cálculo do VPT de um terreno para construção. Razão pela qual um VPT provisório se tornou definitivo após o decurso do prazo de 30 dias (n.º 1 do artigo 76.º do Código do IMI).
O encerramento da matriz ocorreu em 31 de Dezembro de 2006, ainda que os efeitos decorrentes do procedimento avaliativo tenham retroagido a 31 de Dezembro de 2005, na medida em que o mesmo se reporta à data do pedido de inscrição ou actualização do prédio na matriz (conforme o n.º 4 do artigo 37.º do Código do IMI).
A Requerente poderia - em qualquer momento a partir de 1 de Janeiro de 2010, ex vi do n.º 9 do artigo 130.º do Código do IMI (na redacção vigente à data) - apresentar um pedido de avaliação do prédio em apreço, com fundamento na desactualização do VPT (conforme previsto na alínea a) do n.º 3 da citada norma).
E, na eventualidade de o perito local não acolher a jurisprudência já conhecida sobre esta matéria, a Requerente poderia solicitar uma segunda avaliação. Fazendo-se representar na comissão tripartida de avaliação (artigo 76.º do Código do IMI). E se, novamente, não visse acolhidos os seus fundamentos e pedido, poderia avançar para a impugnação judicial (n.º 1 do artigo 77.º do Código do IMI) ou pedido de pronúncia arbitral (alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT).
Note-se que o possível decurso de tempo entre o início e a conclusão do procedimento de avaliação, designadamente caso o mesmo envolvesse tutela judicial ou arbitral, seria neutro. Isto, na medida em que, como vimos, a fixação do VPT retroagiria sempre ao momento da apresentação do pedido de avaliação.
Face ao exposto, não oferece dúvidas que o acto de fixação do VPT constitui um acto perfeitamente destacável. Para o qual está consignado um procedimento tributário próprio (due processo of law). Ou seja, há tutela própria e específica. Que não se confunde com o acto de liquidação anual do IMI.
Essa tutela consiste, primeiramente, na necessidade de reagir contra o VPT provisório obtido na avaliação, requerendo a realização de uma segunda avaliação. Deste último acto avaliativo, sairá um VPT definitivo, sobre o qual assentarão as liquidações de IMI.
Todavia, o mesmo é passível de impugnação judicial ou de apresentação de um pedido de pronúncia arbitral, no qual podem ser apreciados todos os erros ou vícios que influíram na determinação do VPT. Em caso de acolhimento do pedido e causa de pedir formulados pelo sujeito passivo, será organizado um novo procedimento de avaliação que produzirá um VPT em conformidade com a sentença ou decisão arbitral.
Esse VPT será inscrito na matriz em substituição do VPT anteriormente determinado. E, por retroagir à data de apresentação do pedido de avaliação, originará a correcção de todas as notas de liquidação de IMI que houverem sido entretanto emitidas.
A fixação de um prazo especial de três meses para impugnação de actos de fixação de VPTs, em conjugação com a exigência de esgotamento do meio gracioso de reclamação em sede do procedimento de avaliação (n.º 1 e n.º 7 ambos do artigo 134.º do CPPT), afasta a impugnação judical do acto de liquidação com fundamento em vícios ou erros do procedimento de avaliação.
Dado que, como vimos, a Requerente dispunha da possibilidade de suscitar esses vícios ou erros em 2006. Não o fez. Ou, querendo-o, de solicitar um novo procedimento de avaliação a partir de 1 de Janeiro de 2010.
Existe uma necessária condição de prejudicabilidade entre o procedimento de avaliação que culmina com a fixação do VPT e o acto de liquidação que lhe sucede.
O primeiro é condição necessária e precedente do segundo.
O objecto do primeiro consiste na determinação da base tributável do imposto (uma vez que esteja previamente preenchida a norma de incidência do prédio a IMI). Já o segundo consiste na mera liquidação do imposto, i. e. na aplicação da taxa à base tributável.
Tem razão a Requerida quando diz que o acto de determinação do VPT está consolidado e fechado.
Chegados aqui, poderia colocar-se a questão de saber se um acto de liquidação de IMI estaria irremediavelmente afastado de tutela judicial ou arbitral, em situações de vícios ou erros praticados no procedimento de avaliação precedente.
A resposta é negativa.
Basta pensar na liquidação de IMI notificada ao sujeito passivo na pendência de segunda avaliação solicitada pelo sujeito passivo ou qualquer outra parte.
Caso em que, por não estar concluído o procedimento de avaliação, o n.º 1 do artigo 118.º determina a suspensão da liquidação do IMI, atento o facto de o correspondente VPT ainda se apresentar como provisório.
Mas mesmo nesta situação, a permitida contestação do acto de liquidação em sede de impugnação judicial, exigiria o simultâneo esgotamento do meio tutelar previsto no procedimento de avaliação (no exemplo oferecido, que a segunda avaliação houvesse sido ou viesse a ser solicitada no prazo disponível para o efeito).
Poderíamos elencar outros erros, como seja a notificação de um VPT não coincidente com aquele que resultou do procedimento de avaliação. Ou da incorrecta aplicação da fórmula de actualizacão trienal do VPT. Ou ainda a falta de notificação do VPT determinado num procedimento de avaliação.
É admissível o recurso à impugnação judicial (de que o pedido de pronúncia arbitral constitui um meio alternativo) para contestar erros ou vícios inerentes ao VPT e que foram vertidos na liquidação de IMI. Todavia, será de afastar do elenco de tais erros todos aqueles que apenas poderiam ser - e não o foram - suscitados no procedimento de avaliação precedente.
O quadro normativo oferece, a qualquer umas das três partes que pretendem contestar o VPT, um meio tutelar próprio e especificamente edificado para aferir da qualificação e quantificação da matéria colectável (o VPT). O qual, insiste-se, era passível de utilização desde 1 de Janeiro de 2010.
Permitir que a quantificação da matéria colectável seja suscitada nas liquidações anuais de IMI, esvaziaria o sentido e alcance do meio tutelar próprio. Significaria uma quase equiparação do acto de liquidação ao acto destacável do procedimento avaliativo, na medida em que, no limite, tudo aquilo que o último não contemplasse, por erro, vício ou outros motivos relevantes para as partes, poderia ser contestado através do primeiro.
Tudo se passaria como se o procedimento avaliativo nunca se consolidasse na ordem jurídica, na medida em que qualquer orientação jurisprudencial - ou qualquer outro facto superveniente ao acto destacável - poderia ser subsequente e livremente invocável.
Em jeito de resumo, o pedido controvertido de pronúncia arbitral da liquidação de IMI não permite recuperar a apreciação de vícios ou erros praticados (e/ou invocáveis) no decurso do procedimento de avaliação directa que conduz à fixação do VPT de um prédio urbano. Isto, na medida em que este procedimento foi concluído sem recurso pelas partes aos meios administrativos especificamente previstos para efeitos de determinação do VPT. Sendo que, nos 90 dias posteriores à definitividade do VPT, terminou o prazo para apresentar impugnação judicial ou pedido de pronúncia arbitral.
Pelo que os erros eventualmente praticados nas avaliações realizadas em 2006, não tendo sido à data tempestivamente objecto de impugnação judicial autónoma (incidente sobre esse procedimento de avaliação), não podem ser apreciados no presente pedido, designadamente para efeitos de anulação parcial do acto de liquidação de IMI de 2016.
Por fim, a Requerente argumenta pela inconstitucionalidade do acto de liquidação de IMI, nos casos em que o mesmo assenta num VPT cuja fórmula de cálculo teve em consideração dos factores de localização, afectação e qualidade e conforto. Tal equivaleria à criação de um imposto por via de um acto administrativo, sabendo-se que uma tal prerrogativa é matéria de reserva parlamentar.
Não está, todavia, em causa a apreciação dos critérios de quantificação da matéria colectável, nos termos em que os mesmos foram fixados em 2006. Outrossim, o pedido cinge-se à sindicabilidade do acto de liquidação de IMI emitido em 2017, referente ao ano de 2016 e que assentou no VPT determinado em 2006 e cujos efeitos retroagiram a 2005. Relativamente ao qual a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa em 2021.
Ora, conforme vimos supra, a quantificação da matéria colectável (VPT) poderia ter sido discutida e apreciada desde 1 de Janeiro de 2010, mediante a apresentação de um pedido de avaliação. De cuja conclusão resultaria um novo acto destacável, cujo VPT seria reflectido nos actos de liquidação praticados desde a data de início desse procedimento avaliativo.
Não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade tributária, na opção de questionar, em 2021, o acto de liquidação de IMI referente a 2016, ao invés de recorrer ao meio tutelar próprio que se encontrava disponível desde 2010.
Decidir em sentido contrário implicaria a inobservância de outros parâmetros de dignidade constitucional, designadamente o princípio do “due process of law”, i . e. o comando ao legislador ordinário de disponibilização de um meio tutelar próprio. Também sairiam fortemente abalados os princípios da certeza e segurança jurídicas, por impossibilidade de consolidação do acto destacável.
A concordância prática entre estes princípios facilmente afastaria inconstitucionalidade convocada pela Requerente e nos termos pela mesma fundamentados.
V - Decisão
Termos em que, o Tribunal Arbitral decide:
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Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa e consequente anulação parcial da liquidação de IMI de 2016; e
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Julgar improcedente o pedido de reembolso da quantia de € 32.128,37.
Fixa-se o valor do processo em € 32.128,37.
O valor da taxa de arbitragem, a cargo da Requerente, é fixado em € 1.836,00.
Lisboa, 16 de Novembro de 2022
O árbitro do Tribunal Arbitral Singular
José Luís Ferreira