Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 174/2022-T
Data da decisão: 2022-11-07  IRS  
Valor do pedido: € 26.185,72
Tema: Artigo 5.º do CIRS – Tributação do rendimento derivado da aplicação do montante investido no seguro de capitalização do ramo vida “unit-linked”.
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Sumário: 

 

1. O mero resgate/levantamento do capital investido na contratualização de um seguro de vida com capitalização, em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (seguros “unit-linked”), não constitui um rendimento sujeito a tributação em sede de categoria E do IRS.

2. Este seguro de capitalização, sem garantia, está dependente do mercado, e neste sentido pode gerar uma remuneração ou uma perda relativamente ao capital investido pelas carteiras “unit-linked”.

3. Apenas releva fiscalmente, nos termos do artigo 5.º do CIRS, o ganho de capital disponibilizado ao contribuinte resultante de um valor positivo de rendimento de capital efetivamente recebido.

4. Se do resgate da apólice de seguro resultar uma perda de capital, esse valor não é tributado em sede de categoria E do IRS.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

O árbitro José de Campos Amorim, designado pelo Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), como árbitro singular, para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 27 de maio de 2022, determina o seguinte:

 

 

I. RELATÓRIO       

 

            1. A..., cidadão britânico, portador do passaporte n.º ..., emitido pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, com o número de contribuinte ..., residente em ..., Reino Unido (doravante o “Requerente”), cujo serviço periférico local atual é o Serviço de Finanças ... (Algarve), deduziu um pedido de pronúncia arbitral nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que consagra o Regime Jurídico da Arbitragem Tributária em Matéria Tributária (“RJAT”), com vista à declaração de ilegalidade do ato tributário de demonstração de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2020..., respeitante ao período de tributação de 2016, da qual resultou um imposto a pagar de € 22.960,00 (vinte e dois mil, novecentos e sessenta euros), e um montante de juros compensatórios de € 3.225,72 (três mil, duzentos e vinte cinco euros, setenta e dois cêntimos), na sequência do despacho de indeferimento proferido no âmbito da reclamação graciosa nº ...2021..., com fundamento no disposto na alínea a) do artigo 99.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”), isto é, na errónea qualificação dos factos tributários.

 

2. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT ou Requerida).

 

3. O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o presente signatário como árbitro singular do Tribunal Arbitral, o qual comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

4. As partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 27 de maio de 2022.

 

6. Nesse mesmo dia 27 de maio de 2022, a Requerida, após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, por despacho da Sra. Subdiretora Geral datado de 23-05-2022, decidiu revogar parcialmente o ato de liquidação de IRS nº 2020... de 04.12 relativa ao período de tributação de 2016.

 

7. No dia 1 de julho de 2022, a AT comunicou ao CAAD a nova liquidação de IRS com o n.º 2022... e dos respetivos juros compensatórios n.º 2022..., relativa ao período de tributação de 2016, em que foi estabelecido um imposto total a pagar de € 1.545,40.

 

8. Não obstante a revogação parcial do ato tributário, o Requerente manteve o pedido de pronúncia arbitral do Tribunal Arbitral, através de requerimento apresentado no dia 1 de junho de 2022, considerando “que a manutenção do ato tributário ainda que sobre uma base tributável menor sofre de claros erros aritméticos e de argumentação sem qualquer base lógica”.

 

9. Por despacho arbitral de 4 de julho de 2022, foi dispensada a realização da reunião arbitral a que alude o artigo 18.º do RJAT e facultada às partes a possibilidade de, querendo, apresentar, as suas alegações escritas no prazo simultâneo de 15 (quinze) dias, nos termos do artigo 120.º, n.º 1 do CPPT.

 

10. O Requerente apresentou as suas alegações em 8 de julho de 2022, onde referiu que não se conforma com a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, considerando que deve ser anulado na sua totalidade o novo ato de liquidação n.º 2022... e respetivos juros compensatórios n.º 2022..., nos termos dos artigos 163.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 100.º da Lei Geral Tributária (LGT), por vício de violação de lei.

 

11. A Requerida apresentou um requerimento em 11 de julho de 2022 em que, depois de ter “tomado conhecimento da Réplica apresentada pelo Requerente em 2022-07-08, vem requerer o desentranhamento da mesma, dado não ser admissível em sede de processo arbitral e atendendo a que está a decorrer o prazo para a apresentação de alegações, todos os argumentos do Requerente devem ser deduzidos em sede de apresentação das mesmas”.

 

12. Em 30 de agosto de 2022, a Requerida apresentou as suas alegações, tendo concluído pela existência de um rendimento derivado da aplicação do montante investido no seguro de capitalização no valor de € 4.809,41, que se encontra sujeito a tributação e, neste sentido, entende que deve ser julgado improcedente o “pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido”.

 

13. Em 27 de setembro de 2022, o Tribunal Arbitral indeferiu o pedido de desentranhamento da “Réplica” apresentado pelo Requerente, por considerar que se trata de um manifesto erro na identificação das alegações e que este pedido, a ser admitido, violaria o princípio do contraditório consagrado nos artigos 3.°, 3.°-A, 158.°, n.º 2, 502.°, n.º 2 todos do CPC, e não permitiria, desse modo, uma apreciação global e unitária de todas as questões de facto e de direito nela contidas. Além desta questão, o Tribunal Arbitral solicitou ao Requerente a prova do pagamento do imposto liquidado de IRS com o n.º 2022... e dos respetivos juros compensatórios n.º 2022..., relativa ao período de tributação de 2016, em que foi estabelecido um imposto total a pagar de € 1.545,40.    

 

            14. Em resposta ao solicitado, o Requerente confirmou, em 12 de outubro de 2022, que não efetuou o pagamento do supramencionado imposto liquidado nem dos respetivos juros compensatórios, tendo apresentado, para o efeito, uma certidão extraída do Portal das Finanças do Serviço de Finanças de ..., com data de 10 de outubro de 2022, a informar que o contribuinte A..., NIF ..., não tem a sua situação regularizada.  

 

           

II. SANEAMENTO

 

            O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente em razão da matéria para conhecer dos atos de liquidação de IRS e de decisão de reclamação graciosa deduzida contra o mesmo, em face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT.

            As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

             O processo não enferma de nulidades e não existem quaisquer obstáculos à apreciação do mérito da causa, que cumpra conhecer.

 

III. QUESTÕES A DECIDIR

 

São questões a apreciar no presente processo arbitral:

 

i) Determinar se o resgate/levantamento do capital investido na contratualização de um seguro de vida com capitalização, em que o risco é suportado pelo tomador do seguro (em concreto, seguros “unit-linked”), constitui um rendimento sujeito a tributação em sede de categoria E do IRS;

ii) A outra questão central a dirimir no presente processo consiste na apreciação do valor disponibilizado ao contribuinte através de resgates/levantamentos, se respeita a lucros ou prejuízos de € 4.809,41. 

 

IV. MATÉRIA DE FACTO

 

IV.1. Factos provados

 

            Analisada a prova produzida nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

  1. O contribuinte, cidadão britânico, era residente em Portugal no ano de 2016, estatuto que manteve até emigrar para o Reino Unido, onde tem atualmente a sua residência fiscal, tendo sido aqui representado por B..., Ldª., ..., ... .
  2. Em 23 de fevereiro de 2015, o Requerente celebrou um contrato de seguro de vida com a seguradora C... SA (em diante, “Seguradora”), na modalidade de unit-linked, conforme cópia da Apólice de seguro com o n.º ...).
  3. A Apólice de seguro prevê a entrega de um prémio no montante de € 348.443,01 (trezentos e quarenta e oito mil, quatrocentos e quarenta e três euros e um cêntimo) e a possibilidade de o beneficiário realizar operações de resgate antecipado, total ou parcial, da Apólice antes de ocorrência de sinistro, com uma penalização no valor de 1% de qualquer valor resgatado antes do fim do período inicial de 10 anos da sua vigência.
  4. Em 2016, o Requerente optou por proceder ao levantamento de parte do capital inicialmente investido, a título de resgate, na quantia total de €82.000,00. A Seguradora disponibilizou o montante total de € 82.000,00 em quatro pagamentos no valor de € 18.000,00 cada, a 1 de fevereiro, 1 de março, 1 de julho e a 3 de outubro de 2016, e um pagamento no valor de € 10.000,00 a 23 de agosto de 2016, todos a título de resgate parcial da Apólice, conforme prova a declaração da Seguradora sobre os pagamentos efetuados ao Requerente referente ao ano de 2016, datada de 11 de março de 2022.
  5. Foram assim realizados 5 tranches de pagamentos durante o ano de 2016, conforme quadro dos valores e das datas dos resgates/levantamentos, onde também consta uma coluna com um rácio negativo, sob o título de lucros e prejuízos.
  6. Este pagamento do valor de € 82.000,00 foi dada a conhecer à Direção de Serviços de Relações Internacionais da AT em 2017-12-30, no âmbito da troca internacional de informação entre Portugal e o Luxemburgo, com a referência LU2016PT_HC_..._C9CDEF30-...-CF1DF30A453F-292, através da rede comum de comunicações (CCN) desenvolvida pela União Europeia para assegurar todas as transmissões seguras por via eletrónica entre autoridades competentes nos domínios aduaneiro e fiscal, constando do(s) registo(s) LU2016PT_AR_19912204696M00000000_... do ficheiro LUPT-INI-20171... 0-414d51204c5541503220202...53a105a04ffec21.xml.gz, que obedece ao formato eletrónico.
  7. Na sequência da comunicação por parte do Luxemburgo do pagamento pela Seguradora do rendimento controvertido, com a natureza “outros-CRS”, foi aberto pela AT um procedimento de divergência e posteriormente elaborado um DC oficioso, com anexo J, que originou a liquidação do IRS.
  8. No dia 23 de outubro de 2020, o Requerente é notificado pela AT de divergências em sede de IRS (procedimento de divergência nº ... tendo no dia 2 de novembro de 2020 submetido uma justificação no site do Portal das Finanças no espaço das divergências em que explicou que não obteve rendimentos de qualquer natureza no período de 2016.
  9. Inconformada com a justificação apresentada pelo Requerente, a AT procedeu a uma liquidação oficiosa, registada sob o n.º..., datada de 4 de dezembro de 2020, referente ao ano de 2016, com um montante de imposto a pagar de € 22.960,00 (vinte e dois mil, novecentos e sessenta euros), acrescido de montante correspondente a juros compensatórios.
  10. No dia 13 de janeiro de 2021, o Requerente reclamou da liquidação (procedimento administrativo de reclamação graciosa nº ...2021...), com o fundamento de que os pagamentos resultantes do resgate parcial da Apólice foram erroneamente qualificados como rendimentos de capitais provenientes do Luxemburgo e juntou, para o efeito, a declaração da Seguradora a comprovar a natureza dos pagamentos recebidos em 2016.
  11. No projeto de decisão, a AT referiu que a liquidação tem por base a informação prestada pela Autoridade Fiscal Luxemburguesa, no âmbito da troca automática de informações entre os dois países, baseada na norma comum de comunicação CRS (“Common Reporting Standard”), modelo desenvolvido pela OCDE, em que os rendimentos têm a identificação de “Outros – CRS”.
  12. Em 14.12.2021, a AT indeferiu a reclamação graciosa com o motivo de não ser possível confirmar “que os pagamentos efectuados ao contribuinte se tratam de levantamentos de capital investido” (Cf. despacho de indeferimento proferido pelo Diretor Adjunto de Direção de Finanças, ao abrigo de Delegação de competências).
  13. Inconformado com a decisão da AT, o Requerente apresentou, no dia 23/05/2022,  um pedido de constituição de Tribunal Arbitral no CAAD, tendo por objeto o ato de liquidação de IRS nº 2020..., de 04.12, relativa ao período de tributação de 2016, considerando que o montante disponibilizado pela Seguradora constituiu apenas um resgate parcial e antecipado do prémio de seguro do ramo vida que havia sido contratualizado em 2015, razão pela qual não apresentou qualquer declaração de rendimentos e que este resgate resultou em prejuízo e não em lucro.
  14. Por despacho de 23/05/2022, o Subdiretor Geral da área dos impostos sobre o rendimento decidiu revogar parcialmente o ato de liquidação, nos termos e com os fundamentos invocados, tendo fixado o valor do processo no montante de € 1.545,40.
  15. Não obstante a revogação parcial do ato tributário, o Requerente manteve o pedido de pronúncia arbitral do Tribunal Arbitral, através de requerimento apresentado no dia 1 de junho de 2022, considerando “que a manutenção do ato tributário ainda que sobre uma base tributável menor sofre de claros erros aritméticos e de argumentação sem qualquer base lógica”.
  16. Para o Requerente, o resgate parcial da Apólice no montante referido resultou em perdas de capital no montante total de € 4.809,41, isto é, para o Requerente “o valor da Apólice à data dos referidos resgates era inferior ao valor inicialmente investido”.

 

IV.2. Factos não provados

 

            Com relevo para a decisão da causa, não existem outros factos que devam ser considerados provados ou não provados.

 

IV.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

            O Tribunal Arbitral não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria de facto alegada pelas partes, tendo antes o dever de selecionar a que interessa à decisão, admitindo a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelo Requerente, e decidir se a considera provada ou não provada, conforme resulta do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT.

 

            Face às posições assumidas pelas partes nas respetivas peças processuais, o princípio da livre apreciação da falta de contestação especificada dos factos expressos nos artigos 110.º, n.º 7 e 115.º, n.º 1, ambos do CPPT, a prova documental e a cópia do processo administrativo junto aos autos, que foram objecto de exame e avaliação cuidada por este Tribunal Arbitral, consideraram-se provados e não provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

Não se consideraram provadas nem não provadas as alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

Estando fixados os factos sobre os quais é requerida a decisão e dado parecer estar em causa apenas matéria de direito, os documentos juntos pelo Requerente e pela Requerida são suficientes à emissão da decisão arbitral.

 

V. MATÉRIA DE DIREITO

 

V.1. Desentranhamento da “Réplica”

Considerando o requerimento da Requerente relativo ao pedido de desentranhamento da “Réplica”, e tendo em consideração os princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, o Tribunal Arbitral determina o seguinte:

Na sequência do despacho arbitral de 4 de julho de 2022, o Requerente apresentou as suas alegações no dia 8 de julho de 2022, dentro do prazo legalmente previsto, em que identificou os documentos anexos de “Réplica ... Final” e de “Anexos-Réplica”. Perante isto, a Requerida solicitou em 11 de julho de 2022, o desentranhamento dos mesmos.

 

Os documentos enviados para o CAAD e anexos aos autos têm efetivamente a identificação de “Réplica ... Final” e de “Anexos-Réplica”, mas consubstanciam na realidade alegações. O Requerente não apresenta uma réplica propriamente dito, mas alegações que designa, aliás, por “alegações adicionais” relativamente ao processo em causa, em que elenca uma série de questões relativas aos factos já referidas na Petição Inicial (PI).

 

Face a esta designação de “Réplica ... Final” e de “Anexos-Réplica”, a AT vem requerer o desentranhamento da “Réplica” por considerar “não ser admissível em sede de processo arbitral e atendendo a que está a decorrer o prazo para a apresentação de alegações, todos os argumentos do Requerente devem ser deduzidos em sede de apresentação das mesmas”.

 

Ora, entende o Tribunal Arbitral que, face a descrição dos elementos apresentados, perante o manifesto erro na identificação dos documentos anexados e pelo confronto com o aí articulado, em especial a identificação dos todas as questões de facto e de direito, não deve relevar o pedido da Requerida por estar em conformidade, de resto, com o disposto nos artigos 146.º, n.º 1 do CPC [ex vi alínea e), do artigo 2.º, do CPPT] e 249.º do Código Civil. Assim, na identificação à margem do processo, onde se lê “Réplica ... Final” deve ser entendido como alegações, dado o seu conteúdo elencar um conjunto de “alegações adicionais” baseadas no que já vem refletido e defendido na PI, não devendo as alegações serem desentranhadas do processo.

 

Considerando que não foi cometido nenhuma irregularidade, não se vê como não aproveitar o seu conteúdo na parte em que ele é lícito. Impõe-se o aproveitamento da referida peça processual pelo menos em sede de exercício do direito ao contraditório dos documentos apresentados pelo Requerente.

 

Por isso, deve ser indeferido o pedido de desentranhamento apresentado pela Requerida. O Tribunal Arbitral entende que, por respeito ao princípio do contraditório, o Requerente tem o direito a apresentar alegações, tal como sucede efetivamente, devendo ser admitido o articulado das alegações para esse efeito.

 

O desentranhamento violaria o princípio do contraditório (art. 3.°, 3.°-A, 158.°, n.º 2, 502.°, n.º 2 todos do CPC) porque as alegações contêm questões que importam para o exercício do direito ao contraditório.  A desentranhamento retira dos autos a posição do Requerente perante os documentos, recusando desse modo, o exercício do contraditório, alterando, ou podendo alterar, desse modo, substancialmente, uma apreciação global e unitária de todos os factos e documentos.

 

Em face do exposto, deve ser indeferido o pedido de desentranhamento da “réplica” e determinado, por conseguinte, a admissão das alegações, em nome do princípio do contraditório (artigos 3.°, 3.°-A, 158.°, n.º 2, 502.°, n.º 2 todos do CPC). Em consequência, as considerações nelas alegadas devem ser tidos em conta na seleção da matéria relevante para boa decisão a proferir e para que o Tribunal Arbitral possa tomar uma posição definitiva sobre eventuais elementos novos alegados pelo Requerente.

 

V.2. Proveniência dos rendimentos

 

No âmbito da troca internacional de informação, a AT recebeu informações sobre os rendimentos provenientes do estrangeiro, tendo recebido, em 30-12-2017, a informação de origem DAC2/CRS, proveniente do LUXEMBURGO, com a referencia LU2016PT_HC_ …, através da rede comum de comunicações (CCN) desenvolvida pela União Europeia para assegurar todas as transmissões seguras por via eletrónica entre autoridades competentes nos domínios aduaneiro e fiscal, constando do(s) registo(s)

 LU2016PT_AR_199122046..._201709151416_19858 do ficheiro LUPT-INI-201712...-414d51204c554150322...0453a105a04ffec21.xml.gz, que obedece ao formato eletrónico. Da declaração emitida pela Direção de Serviços de Relações Internacionais em 28 de junho de 2022 consta o pagamento do valor de € 82.000,00 no ano de 2016.

 

Tendo em conta esta informação fiscal, a AT considerou que o Requerente havia auferido em 2016 rendimentos de capitais em proveniência do Luxemburgo e que não apresentou a declaração de rendimentos relativa a esse período, mesmo que não tenha auferido nesse ano qualquer outro tipo de rendimento. Sendo assim, a AT procedeu à liquidação oficiosa através da elaboração modelo 3, anexo J, com o montante dos rendimentos de capitais sujeito a retenção na fonte à taxa liberatória de 28%.

 

Da informação prestada, consta a indicação de que o produto financeiro em questão resulta de um contrato do ramo vida, com o nº..., celebrado pelo contribuinte com a entidade financeira C..., S.A, sita no Luxemburgo, pelo período inicial de 10 anos e com o prémio de 348.443,01€, conforme identificado no documento constante dos autos, e emitido em 12.03.2015.

 

Para a AT, este produto financeiro configura um seguro de capitalização do ramo vida, em que o capital investido é garantido, prevendo ainda uma capitalização remunerada e associado a fundos de investimento.

 

Consta ainda da informação fornecida que a entidade financeira pagadora do rendimento emitiu dois documentos, um em língua inglesa, datado de 2017/02/10, e outro datado de 2022/03/11, em português, que traduz o documento anterior, de onde se retira que foram realizadas, a título de resgate, cinco tranches de pagamentos durante o ano de 2016.

 

Para o contribuinte, os pagamentos efetuados pela Seguradora ao Requerente no ano de 2016 “integram somente os montantes de resgate de capital anteriormente investido, sem elemento de diferença positiva entre o capital investido e os montantes pagos” (PI). Considera ainda o Requerente que o montante de € 82.000,00 constante do documento enviada pela autoridade luxemburguesa não configura um rendimento sujeito a tributação por se tratar de resgate de capital investido.

 

V.3. Qualificação do rendimento

 

A Requerida considera que um eventual acréscimo derivado da contratualização realizada deve ser enquadrado como rendimento da categoria E, apesar de não se encontrar uma qualquer referência de tal qualificação no Código do IRS (CIRS) (Cf. despacho de revogação). Não se encontra uma qualquer identificação de que “um eventual acréscimo derivado da contratualização realizada enquadra-se como rendimentos da Cat E” (Cf. despacho de revogação da AT).

 

Neste sentido, a AT procedeu ao reconhecimento dos rendimentos de capitais disponibilizados ao Requerente no ano de 2016 a partir da informação transmitida pela DSRI, tendo em conta a identificação fiscal dos rendimentos de capitais fornecida pela autoridade fiscal do Luxemburgo, de que “uma entidade financeira, ao abrigo de um contrato de seguro do ramo vida, pagou determinado rendimento cuja natureza mostra-se classificada como “outros-CRS” ”(Cf. despacho de revogação da AT).

 

A AT efetuou o enquadramento do rendimento disponibilizado ao Requerente como rendimentos de capitais, de acordo com o facto de a entidade financeira ter pago um determinado rendimento, ao abrigo de um contrato de seguro do ramo vida, classificada como “outros – CRS”, seguindo o sentido da informação fiscal transmitida pela autoridade fiscal luxemburguesa, “atendendo à carência de prova” (Cf. Alegações da Requerida, ponto 9).

 

Sobre a natureza, propriamente dito, do rendimento em causa, o art.º 5 do CIRS dispõe que se consideram rendimentos de capitais “os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, procedentes direta ou indiretamente de direitos ou situações jurídicas de natureza mobiliaria, bem como da respetiva transmissão ou cessação”. Refere ainda o nº 3 do mesmo artigo que se consideram “rendimentos de capitais a diferença positiva entre os montantes pagos a título de resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações do ramo “Vida” e os respetivos prémios pagos ou importâncias investidas…”. Considerando o disposto no art.º 5 do CIRS, resulta do seguro de capitalização contratualizado a expetativa de uma vantagem económica em contrapartida do investimento realizado (Cf. despacho de revogação), que é suscetível de ser tributável em sede de categoria E do IRS.

 

São, de facto, considerados rendimentos de capitais a diferença positiva entre os montantes pagos a título de resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações de ramo “Vida” e os respetivos prémios pagos ou importâncias investidas. A contratualização deste seguro de capitalização do ramo vida em 2015 gere a expetativa de uma vantagem económica inerente ao investimento realizado, suscetível, de facto, de ser tributado em sede de IRS (Cf. Resposta da AT).

 

Com o capital investido na contratualização do seguro do ramo vida supra referido, não resultou, segundo o Requerente, um incremento patrimonial de € 4.809,41, mas um prejuízo fiscal no mesmo montante de € 4.809,41, conforme consta na coluna lucros/prejuízos que comprova o pagamento efetuado pela Seguradora. Este montante de € 4.809,41 corresponde ao valor derivado da aplicação do montante investido no seguro de capitalização, de acordo com o documento emitido pela Seguradora. Este montante consta da coluna lucros ou prejuízos com um sinal menos, o que prova que se trata não de um pagamento efetuado pela Seguradora, a título de lucro, ao contrário do afirmado pela AT, mas de um prejuízo fiscal nesse montante de € 4.809,41.

 

A AT reconheceu que do capital investido na contratualização do seguro do ramo vida não resultou um incremento patrimonial de € 82.000,00, conforme resulta da revogação parcial da liquidação IRS nº2020... de 04.12, do ano fiscal de 2016, em que considerou um incremento patrimonial de €4.839,41, que na verdade, somando os prejuízos, é de apenas €4.809,41 (Cf. despacho de revogação). A Requerida acabou por reconhecer que o capital investido pelo Requerente aquando da contratualização no ano de 2015 do seguro do ramo vida não produziu um incremento patrimonial de € 82.000,00, mas um incremento patrimonial no montante de € 4.809,41, de acordo com o constante na coluna lucros/prejuízos, do qual resulta para a AT um montante de € 4.809,41 sujeito a tributação em sede de IRS (Cf. Alegações da Requerida, ponto 14).

 

Entende a AT que este valor de € 4.809,41 deve estar sujeito a tributação em sede de IRS, uma vez que se enquadra no artigo 5º do CIRS, que dispõe que se consideram rendimentos de capitais, os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, procedentes direta ou indiretamente de direitos ou situações jurídicas de natureza mobiliária, bem como da respetiva transmissão ou cessação, e que, segundo o n.º 3 do citado artigo, existem rendimentos de capitais se resultar uma diferença positiva entre os montantes pagos a título de resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações de ramo “Vida” e os respetivos prémios pagos ou importâncias investidas.

 

Do contrato resulta que o montante investido na contratualização do seguro de capitalização produziu um resultado negativo de € 4.809,41. O investimento realizado com a contratualização do seguro de capitalização não originou um rendimento de €82.000,00, tal como o reconheceu a AT no despacho de revogação, nem tampouco um rendimento de € 4.809,41, mas um prejuízo nesse mesmo montante.

 

V.4. Natureza do contrato de seguro de vida na modalidade de unit-linked

 

Os contratos de seguro unit-linked são contratos ligados a fundos de investimento, que asseguram uma solução de seguro de vida individual.

 

Estes seguros de vida com capitalização, ou seguros de capitalização, sem garantia (também denominados unit-linked), estão dependentes do mercado, e neste sentido podem gerar uma remuneração ou a perda do capital investido pelas carteiras “unit-linked”. Os unit-linked “não garantem taxas de rentabilidade, podendo mesmo, nos casos em que os fundos têm uma componente accionista mais elevada, o seu resultado ser negativo” (Cf. Acórdão do TCA Sul, proc. n.º 09756/16, de 15 de dezembro de 2016).

 

«Quando o tomador subscreve este tipo de produto, continua a ter que pagar um prémio. No entanto, as prestações que a seguradora se obriga para com o segurado são variáveis (podendo existir uma parte fixa/garantida). «(…) [T]odos os contratos de seguro são contratos aleatórios por natureza, pela imprevisibilidade em relação ao facto (seja ao se, ou apenas ao quando). (…) Aos valores pagos a título de prémio por parte do tomador do seguro, a seguradora faz corresponder um certo número de unidades de conta. Estas unidades de conta (que não são títulos e não têm mercado) têm o seu valor ligado, em cada momento, ao valor de um conjunto de activos (por exemplo, unidades de participação em fundos de investimento, participações sociais, depósitos bancários, créditos sobre o Estado). (…) O conjunto de activos que serve de referência para se encontrar o valor da unidade de conta é conhecido como “o Fundo”. Para cada segurado, a seguradora cria uma conta (em sentido escritural), na qual são creditadas as unidades de conta atribuídas em função do prémio pago, e é o valor total das unidades de contas inscritas a favor de cada segurado o valor a que este tem direito por parte da seguradora no evento. Assim, o valor da responsabilidade da seguradora para com o segurado varia ao longo do período contratual, consoante a variação do valor dos activos a que estão indexadas as unidades de conta» (Cf. J. Luís Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, Provisões no âmbito de seguros unit-linked e dupla tributação económica, Business & Economics School, ISG, p. 8; https://www.isg.pt/wp-content/uploads/2021/03/33_2_jlss-jg_provisoes-unit-linked_f33.pdf)

 

Os produtos unit-linked não têm, à partida, um capital definido no que respeita à prestação devida pela seguradora. “As prestações a que a seguradora se obriga estão indexadas ao valor de um determinado conjunto de activos na data do evento (i. e. termo do prazo, momento do resgate ou data da morte)” (Cf. J. Luís Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, Provisões no âmbito de seguros unit-linked e dupla tributação económica, Business & Economics School, ISG, p. 3; https://www.isg.pt/wp-content/uploads/2021/03/33_2_jlss-jg_provisoes-unit-linked_f33.pdf).

 

Importa aqui distinguir “os seguros de vida com capitalização com garantia dos seguros de vida com capitalização sem garantia (os unit-linked)”.  Estes, os unit-linked, não podem ser comparados aos fundos de investimento na medida em que os primeiros são jurídica e contabilisticamente distintos dos segundos.

 

A tributação incide sobre a diferença entre os montantes entregues pelas seguradoras a título de “resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações do ramo vida” e as quantias pagas a título de prémios investidos. Esta diferença é tributada em sede de IRS, na categoria E, como rendimentos de capitais, de acordo com o art. 5.º, n.º 3 do CIRS. Na realidade, são tributados pela diferença entre as quantias pagas pelos tomadores e os montantes recebidos pelas companhias de seguros não a título de mais-valias mas de rendimentos de capital (Cf. J. Luís Saldanha Sanches e João Taborda da Gama, Provisões no âmbito de seguros unit-linked e dupla tributação económica, Business & Economics School, ISG, p. 14; https://www.isg.pt/wp-content/uploads/2021/03/33_2_jlss-jg_provisoes-unit-linked_f33.pdf).

 

Estando as unidades de participação do fundo de investimento das companhias de seguro mensuradas ao justo valor, não há uma qualquer mais ou menos valia fiscal, nos termos do art. 10º do CIRS (diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição), mas o apuramento de um ganho ou perda pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição. Esse ganho ou perda pela alienação dessas unidades de participação do fundo de investimento contabilizado é relevante fiscalmente, conforme o caso, nos termos do art. 5.º do CIRS.

 

V.5. Da aplicação do princípio do rendimento-acréscimo

 

A teoria do rendimento-acréscimo é aplicável aos rendimentos de capitais, incluindo-se aqui os rendimentos de seguros e operações do ramo “vida”, conforme decorre do previsto no n.º 5 do Preâmbulo do CIRS.

 

A tributação incide sobre a “diferença positiva entre os montantes pagos a título de resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações do ramo «Vida» e os respetivos prémios pagos ou importâncias investidas”.

 

O rendimento só está sujeito à tributação em sede de IRS se resultar numa diferença positiva entre o capital investido e os montantes pagos ao sujeito passivo de IRS. A tributação da totalidade de capital investido é, de facto, “contrário ao princípio da capacidade contributiva”, tal como está explicitamente reconhecido “no Preâmbulo ao Código IRS (ver ns.º 3.º, 5.º e 8.º do Preâmbulo do Código IRS que menciona e explica o princípio) e, implicitamente, no artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa” (Cf. Petição Inicial).

 

No caso em concreto, a diferença entre os montantes pagos a título de resgate, adiantamento ou vencimento de seguros e operações do ramo «Vida» e os respetivos prémios pagos ou importâncias investidas” conduziram, tal como já foi referido, a um resultado negativo de € 4.809,41, o que significa que não deve incidir a tributação sobre um resultado negativo, não se verificando, neste caso, qualquer tributação em 2016.

 

V.6. Do resgate de capital nos seguros de vida

 

Importa saber se os pagamentos da Seguradora ao Requerente em 2016 integram somente os montantes de resgate de capital anteriormente investido e se apresentam uma diferença positiva ou negativa entre o capital investido e os montantes pagos.

 

Para a AT, a questão prende-se com o facto de o Requerente não comprovar, de forma inequívoca, que os pagamentos da Seguradora em 2016 representam um “levantamento do capital investido” e que ao valor dos resgates efetuados no montante global de €82.000,00 corresponde, na coluna dos Lucros/Prejuízos, um lucro total de € 4.809,41.

 

Alega o Requerente que o montante de € 82.000,00, indicado no documento referente à troca de informação fiscal com o Luxemburgo, não se encontra sujeito a tributação por se tratar do resgate parcial do capital investido e que “os valores apresentados sob a coluna Lucros/Prejuízos representam, por serem acompanhados de um sinal negativo, o prejuízo sofrido pelo Requerente com cada um dos cinco resgates efetuados em 2016” (Alegações Requerente), prejuízo esse que soma uma perda total de € 4.809,41 em 2016.

 

Para uma melhor compreensão dos valores constantes da declaração da Seguradora, o Requerente compara os valores de 2016 com os valores de 2017. Em 2016, os valores constantes da declaração da Seguradora apresentam um prejuízo e não um incremento patrimonial, ao passo que, em 2017, a declaração da Seguradora relativa ao período de 2017, datada de 11 de março de 2022 (Cf. cópia do documento junto aos autos), apresenta na coluna dos Lucros/Prejuízos um valor positivo de rendimentos de capitais efetivamente recebidos.

 

Acrescentando aqui os valores de 2018, para efeitos de comparabilidade, a declaração da Seguradora relativa ao período de 2018, data de 7 de fevereiro de 2019 (Cf. cópia do documento junto aos autos) apresenta na coluna dos Lucros/Prejuízos valores positivos ou negativos, relativamente aos valores resgatados.

 

Resulta do exposto que alguns dos resgates efetuados em 2016, 2017 ou 2018 apresentam valores positivos e outros valores negativos, devendo ser tributados os lucros e não os prejuízos.

 

Uma vez que os resgates efetuados pelo Requerente em 2016 resultaram num prejuízo no valor de € 4.809,41, o pedido do Requerente deve ser julgado totalmente procedente e anulado na sua totalidade o novo ato de liquidação n.º 2022... e a liquidação de respetivos juros compensatórios n.º 2022..., no valor total de € 1.545,40.

 

V.7. Revogação do ato tributário

 

No âmbito da troca internacional automática de informação entre o Luxemburgo e Portugal, foi considerado pela AT, na sua Resposta, que o Requerente havia auferido no ano de 2016 rendimentos de capitais provenientes do Luxemburgo, pelo que deveria ter apresentado a declaração de rendimentos modelo 3 de IRS referente a esse ano.

 

Esta informação consta, tal como já foi referido, dos documentos emitidos pela entidade financeira pagadora do rendimento que indica as cinco tranches de pagamentos realizadas durante o ano de 2016, a título de resgate, no montante global de € 82.000,00 (Cf. quadro com os valores e as datas dos resgates/levantamentos e a coluna que representa os lucros e prejuízos, neste caso valores negativos).

 

Por se tratar de um resgate parcial do capital investido, a AT acabou por admitir que o montante de € 82.000,00 não deveria estar sujeito a tributação, tendo esta análise sido submetida a despacho superior que originou a revogação parcial da liquidação em crise, o que levou a AT, na sua Resposta, a considerar apenas como rendimento o montante constante da coluna com o título lucros e prejuízos.

 

A Subdiretora Geral da área dos impostos sobre o rendimento procedeu, através do despacho de 2022/05/23, à revogação do ato tributário, tendo depois notificado o Presidente do CAAD da sua decisão, nos termos do artigo 13° do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, na redação introduzida pela Lei nº 64 - B/2011, de 30 de dezembro, e pela Lei nº 66 - B/2012, de 31 de dezembro.

 

Do ato de liquidação revogado parcialmente resultou um valor a pagar de € 1.545,40. Ora, tendo os resgates efetuados no montante global de €82.000,00 resultado num prejuízo de € 4.809,41, não deve incidir a tributação sobre um resultado negativo, não se verificando, por isso, uma qualquer tributação em 2016.

 

Em face do exposto, entende este Tribunal Arbitral que os actos tributários impugnados nos presentes autos são ilegais por assentarem numa errónea qualificação dos factos tributários, devendo o ato tributário de liquidação do IRS n.º 2020..., respeitante ao período de tributação de 2016, ser declarado ilegal.

           

VI. DECISÃO

 

Nestes termos, acorda este Tribunal Arbitral em:

  1. Anular a decisão de indeferimento do pedido de reclamação graciosa impugnado;
  2. Anular totalmente o novo ato de liquidação de IRS de 2016 e respetivos juros compensatórios objeto daquele procedimento nos concretos termos acima expostos;
  3. Condenar a Requerida nas custas do processo arbitral.

 

VII. VALOR DO PROCESSO

 

            De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 26.185,72.

 

VIII. CUSTAS

 

            Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 1.530,00, a cargo da Requerida, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Notifique-se.

Lisboa, 7 de novembro de 2022.

O Árbitro,

José de Campos Amorim