SUMÁRIO:
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A atividade das Sociedades Gestoras de Organismos de Investimento Coletivo (SGOIC) encontra-se regulada pelo Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo (RGOIC) aprovado pela Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro.
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As SGOIC têm a natureza de instituições financeiras e, na redacção do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras vigente em 2019, eram qualificadas como sociedades financeiras (alínea vi) do n.º 1, do art.º 6.º do RGICSF).
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No exercício das funções de gestão de Organismos de Investimento Coletivo (OIC), as SGOIC realizam um conjunto de tarefas, de acordo com o disposto no artigo 66.º do RGOIC.
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Como remuneração da actividade desenvolvida, as SGOIC cobram comissões de gestão aos OIC, de acordo com o artigo 67.º do RGOIC.
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Os montantes suportados pelos OIC – encargos destes, nos termos do art.º 139.º do RGOIC - configuram-se como contraprestação dos serviços prestados pelas SGOIC no exercício da actividade de instituição financeira, não sendo tributados em IVA mas caindo no âmbito de aplicação do Imposto do Selo (artigo 1.º, n.º 1, do Código do Imposto do Selo e verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo).
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Essa tributação em Imposto do Selo não incide sobre qualquer dos tipos de operação previstos no artigo 5º da Directiva 2008/7/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro.
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Não subsistindo, no caso, dúvidas sobre a violação do direito comunitário, não se justifica o reenvio prejudicial para apreciação prévia pelo TJUE.
DECISÃO ARBITRAL
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Relatório
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Procedimentos
A...– SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLETIVO, S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na ..., ..., ..., ..., ...-... Lisboa (Requerente), na qualidade de sociedade incorporante (em processo de fusão por incorporação) da sociedade B...– SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLECTIVO, S.A., pessoa coletiva n.º ..., com sede na ..., ..., ..., ..., ...-... Lisboa (“B...”), vem, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, e 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, 95.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e d), da LGT, e 99.º, alínea a), do CPPT, requerer a constituição de tribunal arbitral com vista à declaração de ilegalidade do indeferimento de um pedido de revisão oficiosa e de um pedido de revisão oficiosa, assim como das liquidações de Imposto do Selo (“IS”) a que aqueles respeitam, todas referentes ao ano de 2019, num montante total de € 32.898,06 (trinta e dois mil, oitocentos e noventa e oito euros e seis cêntimos).
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, adiante também designada por AT.
Com o Requerimento inicial foram juntos, para além da procuração e comprovativo de pagamento da taxa de arbitragem inicial, dezasseis (16) documentos e, no dia seguinte, os documentos 17 a 74.
A aceitação do pedido de constituição do Tribunal Arbitral, em 22 de Fevereiro de 2022, pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), foi automaticamente notificada à Requerida.
No Pedido de pronúncia arbitral, o Requerente não designou árbitro tendo sido, nos termos dos artigos 6º, n.º 1, e 11º n.º 1, alínea a) do RJAT, designada a árbitro signatária que aceitou o cargo no prazo legalmente estipulado.
As Partes foram notificadas em 13 de Abril de 2022 da designação de árbitro pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, e não manifestaram intenção de a recusar, pelo que o tribunal arbitral ficou constituído em 4 de Maio de 2022, nos termos do disposto no artigo 11º, n.º 1, alínea c), e n.º 8, do RJAT.
Notificada para o efeito, a Requerida enviou, em 6 de Junho de 2022, a Resposta e o processo administrativo (PA) referente ao processo de revisão oficiosa.
Em 8 de Junho de 2022, as Partes foram notificadas para se pronunciarem sobre a necessidade de se realizar a reunião prevista no art.º 18.º do RJAT.
Dispensada a realização daquela reunião, as Partes foram notificadas de despacho arbitral de 31 de Julho de 2022 no sentido de Requerente e Requerida produzirem alegações no prazo de 15 dias, a decorrer sucessivamente, e de que a decisão arbitral seria emitida e notificada até ao termo do prazo previsto no art.º 21º, n. 1, do RJAT.
Apenas a Requerente apresentou alegações, em 16 de Setembro de 2022.
2. O Pedido de Pronúncia
A Requerente diz, em síntese:
- Auto liquidou imposto do selo sobre as comissões de gestão cobradas aos OIC porque o mercado passou a liquidar Imposto do Selo (IS) por haver a convicção de que a Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro de 2018 (OE para 2019) revogara as isenções anteriormente vigentes e que a verba 17.3.4. da TGIS passava a aplicar-se a todas as comissões a partir de 01.01.2019;
- À cautela, passou também a liquidar IS sobre as comissões de gestão cobradas aos OIC por si geridos, convicta contudo de que não estão preenchidos os requisitos de incidência da verba n.º 17.3.4 da TGIS e que, ainda que se entendesse o contrário, a sujeição destas comissões a IS seria claramente contrária à legislação europeia;
- A B... é uma SGOIC, qualificada pelas disposições do RGICSF em vigor em 2019 como “sociedade financeira”, mas as comissões de gestão que cobra aos OIC não se referem a “serviços financeiros”;
- O conceito de “serviço financeiro”, o elemento subjectivo da verba n.º 17.3.4 da TGIS, não abrange todo e qualquer serviço prestado por uma “instituição de crédito”, “sociedade financeira” ou “instituição financeira”, porque qualquer destas entidades presta serviços que não podem ser considerados “serviços financeiros”;
- O “serviço financeiro”, segundo o Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29/5, é qualquer serviço bancário, de crédito, de seguros, de investimento ou de pagamento e os relacionados com a adesão individual a fundos de pensões abertos”;
- Os serviços de gestão, administração e comercialização prestados aos OIC pela B... não cabem nesta definição, nem sequer na vertente “serviço de investimento”, dado que este conceito refere-se às atividades de investimento permitidas às instituições de crédito e às sociedades financeiras, nos termos do artigo 199.º-A do RGICSF, onde claramente não se inclui qualquer atividade de gestão, administração e comercialização de OIC;
- Resulta também do senso comum que os serviços previstos no artigo 66.º do RGOIC não são os previstos no nº 1 do artigo 199.º-A do RGICSF (“serviços e atividades de investimento”) nem os instrumentos financeiros referidos no nº 3 do mesmo artigo;
- Nem o RGICSF, nem a própria Diretiva Bancária, quando elencam as atividades permitidas às “instituições de crédito”, “sociedades financeiras” e “instituições financeiras”, em momento algum, identificam a atividade de gestão de OIC;
- Assim, a comissão de gestão cobrada pela B... aos OIC não inclui remuneração de “serviços financeiros”, não sendo abrangida pela verba n.º 17.3.4 da TGIS;
- Por outro lado, a sujeição a IS destes serviços seria contrária à “Diretiva da Reunião de Capitais” (Diretiva n.º 2008/7/CE, do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008) que, para garantir a livre circulação de capitais, proíbe a aplicação de qualquer tributação indireta sobre as operações de reunião de capitais, o que inclui as comissões de gestão suportadas por OIC;
- Tendo em conta os considerandos 2 e 3 da mesma Diretiva, seus artigo 5.º, n.º 2, alínea a), artigo 5.º, n.º 1, alínea b), o artigo 2.º, n.º 1, alínea b) e diversa jurisprudência do TJUE, os serviços dos serviços de gestão, administração e comercialização prestados pelas sociedades gestoras apresentam inequívoca ligação e indispensabilidade às operações de reunião de capitais operadas através de OIC, porque o legislador comunitário quis proteger da tributação indireta todo e qualquer serviço necessário à reunião de capitais, tendo incluído expressamente na redação da norma a “colocação em circulação ou negociação” dos títulos, que é exatamente o que acontece quando a sociedade gestora, direta ou indiretamente, promove a comercialização dos títulos, capturando investidores.
- Existindo uma dupla tributação injustificada e violadora do direito da União Europeia, sem que possa ser invocada nenhuma das exceções previstas no artigo 6.º da Diretiva da Reunião de Capitais, devem ser anulados os actos em matéria tributária, restituição do montante de IS autoliquidado num total de € 32.898,06, e pagamento de juros indemnizatórios;
- No caso de se entender aplicável o IS, o tribunal deve pedir o reenvio para o TJUE, nos termos do artigo 267º, alínea a) e primeiro parágrafo do TFUE, com suspensão da presente instância, para apreciação da conformidade dessa norma com a Directiva de Reunião de Capitais.
3. Resposta da Requerida
A AT respondeu, em síntese:
- A Requerente reconhece que, enquanto SGOIC, era uma entidade qualificada como “sociedade financeira”, de acordo com o disposto no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), na redacção vigente em 2019;
- Quanto ao elemento objetivo da norma de incidência, estão sujeitas a Imposto do Selo todas as comissões, assim como, todas as contraprestações por serviços financeiros, desde que a sua cobrança seja realizada por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras;
- A Requerente, enquanto SGOIC, gere diversos fundos de investimento (OIC), instrumentos financeiros que resultam da captação de capital junto de variados investidores, e que formam um património autónomo tipicamente constituído para permitir o aforro coletivo segundo um princípio de repartição de riscos, gerido por especialistas (SGOIC), no interesse exclusivo do participantes, que o aplicam numa variedade de ativos, pelo que a sua actividade envolve sempre a prestação de “serviços financeiros” conexos com os OIC que gere, traduzidos, no mínimo, em “serviços de investimento”;
- As SGOIC prestam serviços materialmente financeiros aos OIC por si geridos, quer se trate de serviços e atividades de investimento, quer os correspondentes serviços auxiliares;
- A comissão de gestão cobrada pelas SGOIC é suportada pelos OIC em contrapartida da prestação dos serviços financeiros enunciados no nº 1 do art.º 66.º do RGOIC e abrange os respectivos serviços complementares, não se justificando a desagregação de actividades, nem a distinção de três funções distintas ou incomunicáveis entre si, antes correspondendo, em substância, na prestação de um serviço materialmente financeiro, reservado a entidades legalmente habilitadas para o seu exercício;
- A remuneração correspondente preenche o elemento objetivo da verba 17.3.4 da TGIS - outro entendimento levaria, no limite, a que todas as comissões cobradas por “entidades financeiras” pudessem não ficar sujeitas a Imposto do Selo, por se questionar a respectiva vertente ou natureza financeira, o que redundaria num casuísmo inadministrável;
- Segundo a alínea f) do artigo 3.º do Decreto-Lei 58/2013, de 8 de Maio (legislado para a atividade bancária mas constitui um caso paralelo) as «comissões» são «as prestações pecuniárias exigidas aos clientes pelas instituições como retribuição por serviços por elas prestados, ou subcontratados a terceiros, no âmbito da sua atividade»;
- As comissões estão isentas de IVA (CIVA e alínea g) do n.º 1 do artigo 135.º da Diretiva IVA) mas essa isenção do IVA nos serviços financeiros é colmatada com tributação em sede de Imposto do Selo, como muito limitadas excepções;
- As isenções previstas no CIS em sede de serviços financeiros (cf. art.º 7.º, CIS) visam salvaguardar os mecanismos de financiamento do setor bancário, em particular no mercado interbancário, não se justificando a desoneração de tributação indireta a prestação de serviços de gestão de fundos de investimento, ao mesmo tempo que se onera em sede de Imposto do Selo outras operações financeiras de idêntica natureza;
- A tributação das comissões cobradas pela gestão de OIC não se confunde com a tributação vedada pela Diretiva de Reunião de Capitais - entradas de capital numa sociedade de capitais, operações de reestruturação ou a emissão de determinados títulos e obrigações – sendo que o artigo 6.º da mesma Diretiva ainda admite ainda que os Estados-Membros podem cobrar diversos impostos e direitos;
- Não se justifica o pedido subsidiário de reenvio prejudicial por não existir qualquer violação da Diretiva 2008/7/CE;
- As liquidações não são ilegais, não existe erro imputável aos serviços na liquidação do tributo, pelo que não são devidos juros indemnizatórios (art.º 43.º da LGT).
- Ainda que o pedido fosse considerado procedente, como o imposto foi apurado pela Requerente, os juros indemnizatórios seriam devidos apenas após o indeferimento da reclamação graciosa, e no caso da revisão oficiosa, um ano após o pedido de revisão por iniciativa do contribuinte (alínea c) do n.º 3 art.º 43.º da LGT).
4. Alegações
Nas alegações, entregues apenas pela Requerente, esta repetiu argumentos do PPA, e voltou a requerer o reenvio prejudicial para apreciação do TJUE, juntando dois documentos comprovativos de abertura de processos naquele TJUE na sequência de pedidos de reenvio realizados em outros casos pendentes no CAAD.
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Saneamento
5. O tribunal arbitral singular foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), 5.º e 6.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
As partes encontram-se devidamente representadas, nos termos legais aplicáveis.
A cumulação de pedidos é admissível à luz do disposto no artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), considerando que a procedência desses pedidos depende essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.
O processo é tempestivo e não padece de qualquer nulidade.
Não havendo questões que obstem à apreciação do mérito da causa, passa-se a apreciar e decidir.
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Fundamentação
6. Matéria de facto
6.1. Factos Provados
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A Requerente A...– SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLETIVO, S.A., (“A...”) pessoa coletiva n.º..., age no presente processo na qualidade de sociedade incorporante (em processo de fusão por incorporação) da sociedade B...– SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLECTIVO, S.A., (“B...”), pessoa coletiva n.º..., ambas com sede na ..., ..., ..., ..., ...-... Lisboa (cf. doc. nº 14, junto com PPA);
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A fusão foi deliberada em 20/04/2021, por incorporação de capital, sendo registada em 18/11/2021 (cf. doc. nº 14 junto com PPA);
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A A...- SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLECTIVO, S.A, tem como objecto: a) a constituição, participação, gestão e administração, em representação dos participantes, de organismos de investimento colectivo, designadamente organismos de investimento colectivo em valores mobiliários, organismos de investimento imobiliário, sociedades de investimento colectivo e organismos de investimento colectivo em activos não financeiros; b) a administração e gestão de carteiras por conta de outrem; c) a prestação de serviços de consultoria e assessoria em matéria de investimentos; e) a comercialização de unidades de participação dos organismos de investimento colectivo sob sua gestão; e f) todas as demais actividades legalmente permitidas a sociedades gestoras de organismos de investimento colectivo. (cf. doc. 14 junto com PPA);
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A B... era uma sociedade gestora de organismos de investimento coletivo (“SGOIC”), tendo como atividade principal a gestão, administração e comercialização de OIC (cf. art. 20.º do PPA);
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Pela actividade de gestão dos organismos de investimento colectivo por si geridos a B... cobrava uma “comissão de gestão”, nos termos do artigo 67º do RGOIC e dos regulamentos de gestão aplicáveis, podendo assumir uma componente fixa e outra variável, esta última, quando existente, geralmente indexada à performance do fundo (cf. art. 24º do PPA);
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Durante o ano de 2019, a B..., no âmbito da sua atividade de gestão e administração de OIC, facturou importâncias no montante total de € 822.470,50 (oitocentos e vinte e dois mil, quatrocentos e setenta euros e cinquenta cêntimos), a título de comissões de gestão e de liquidação de Imposto do Selo sobre tais comissões, nos termos da verba n.º 17.3.4 da Tabela Geral do IS (“TGIS”), no montante global de € 32.898,06 (trinta e dois mil, oitocentos e noventa e oito euros e seis cêntimos) (cf. art. 30º do PPA e documentos nºs 17 a 74);
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Os montantes de imposto de selo liquidados foram entregues nos cofres do Estado (cf. documentos 2 a 4 e 6 a 13, juntos com PPA);
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Em 15 de Junho de 2021, a B... apresentou pedido de revisão oficiosa das autoliquidações de IS, no montante total de € 12.846,90, referentes ao período entre Fevereiro e Abril de 2019, através das guias n.º ... (Fevereiro), n.º ... (Março) e n.º ... (Abril) (cf. Docs. nº 1 a 4);
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Também em 15 de Junho de 2021, a B... apresentou reclamação graciosa das autoliquidações de IS, no montante total de € 20.051,16, referente aos meses de Maio a Dezembro de 2019, através das guias n.º ... (Maio), n.º ... (Junho), n.º ... (Julho), n.º ... (Agosto), n.º ... (Setembro), n.º ... (Outubro), n.º ... (Novembro) e n.º ... (Dezembro) (Docs. nºs 15, 16, e 6 a 13, juntos com PPA);
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A reclamação graciosa, instaurada com o n.º ...2021..., foi objecto de comunicação de projecto de decisão (informação n.º ...-ISCPS – 1/2021) através de ofício da UGC de 04/10/2021, para efeitos de audição prévia, direito que não foi exercido, e de decisão final de indeferimento (informação n.º ...-ISCPS1/2021) comunicada pela AT por ofício datado de 8 de Novembro de 2021, recebida apenas em 23 de Novembro de 2021 pela Requerente, segundo afirmação no PPA não contraditada pela AT (PPA, art. 10.º, e doc. nº 5 junto com PPA);
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O pedido de revisão oficiosa, instaurado com o nº ...2021..., deu origem a um projecto de decisão (informação ...-ISCP-1/2021), notificado para exercício do direito de audição prévia, que não foi exercido, tendo sido a decisão final de indeferimento (sobre a informação ...-ISCPS1/2021) sido notificada à B... através do ofício n.º ...-DJT/2021, datado de 2 de Dezembro de 2021 (cf. PA, fls. 65 e 83, e doc. nº 1, junto com PPA);
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Em 21 de Fevereiro de 2022 foi apresentado o presente pedido de pronúncia arbitral.
6.2. Factos não provados
Não se identificou factualidade não provada com relevância para a decisão da causa.
6.3 Fundamentação dos factos provados e não provados
A fixação dos factos foi efectuada tendo presente que cabe ao Tribunal seleccionar os factos relevantes para a decisão, nos termos do disposto no artigo 123º, n, º 2 do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º do RJAT, e baseou-se nas peças juntas pela Requerente (Pedido de pronúncia arbitral, documentos juntos com o Pedido e alegações) e pela Requerida (Resposta e Processo administrativo – PA, junto aos autos).
7. Aplicação do direito
Neste processo há que apreciar e decidir:
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Se as comissões de gestão cobradas pela Requerente aos organismos de investimento colectivo por si geridos estão ou não sujeitas a Imposto do Selo por aplicação da norma de incidência consagrada na verba n.º 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo.
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A admitir-se a sujeição das referidas comissões à incidência do imposto do selo, se tal tributação viola a proibição de criação pelos Estados membros de formas de tributação indirecta, de acordo com as normas da Directiva 2008/7/CE, do Conselho, de 18 de Fevereiro de 2008.
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Caso se conclua pela ilegalidade da liquidação, terá que determinar se, e em que termos, a Requerente tem direito a pagamento de juros indemnizatórios.
7.1. O direito Interno
7.1.1. As comissões de gestão e o âmbito de incidência do Imposto do Selo (CIS e TGIS)
Está em causa nos autos a incidência de normas do Código do Imposto do Selo[1] e respectiva Tabela Geral, em especial a sub-verba 17.3.4, que manda aplicar Imposto do Selo à taxa de 4% a «Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões».
A verba 17 da Tabela Geral do IS, de que está em causa a referida sub-verba, tem como objecto “operações financeiras”, categoria em que inclui as «Operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras», incidindo sobre o «valor cobrado» (verba 17.3).
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As Partes concordam que o caso preenche o elemento subjectivo de incidência da norma, defendendo a Requerente que se encontrava qualificada pela alínea vi) do nº 1 do art.º 6º do RGICSF, na redacção vigente em 2019, como uma sociedade financeira (cf. artigos 62º e 63º do PPA).
Mas a Requerente defende que as comissões de gestão por si cobradas não constituem “serviços financeiros” e que esse conceito não abrange todo e qualquer serviço prestado por uma “instituição de crédito”, “sociedade financeira” ou “instituição financeira”.
Defende que as SGOIC realizam um conjunto de atividades “de prestação de serviços auxiliares da atividade financeira” mas sem fornecimento de “serviços financeiros”, não sendo invocável paralelismo com actividades permitidas às instituições de crédito e às sociedades financeiras nos termos da Directiva Bancária (Directiva nº 2013/36/EU, do PE e do Conselho, de 26 de Junho de 2013), actividades essas que também contém realidades sem índole financeira.
E sustenta que os “serviços de gestão, administração e comercialização” prestados aos OIC pela B..., também não são abrangidos pelo conceito «serviços financeiros», na definição do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de Maio porque este apenas abrange atividades de investimento permitidas às instituições de crédito e às sociedades financeiras nos termos do artigo 199.º-A do RGICSF (cf. arts. 76º e ss do PPA).
Até o senso comum, diz, leva a concluir que a “esmagadora maioria dos serviços (para não dizer todos) que a comissão de gestão visa remunerar não é, de modo algum, subsumível ao conceito de serviço financeiro” (arts. 82º a 85º do PPA)”.
E que o INE, nas observações à classificação de actividades económicas (CAE), indica tratar-se de um conjunto de atividades “de prestação de serviços auxiliares da atividade financeira, mas sem fornecer serviços financeiros”.
Em sentido oposto, a Requerida defende que todas as comissões e contraprestações por serviços financeiros realizadas com intermediação de sociedades financeiras estão sujeitas a Imposto do Selo e que atendendo às diversas disposições aplicáveis do RGICSF, do CVM e do RGOIC, as SGOIC prestam serviços materialmente financeiros aos OIC por si geridos, quer se trate de serviços e atividades de investimento quer os correspondentes a serviços auxiliares, correspondendo, em qualquer caso, a diferentes funções exercidas pelas SGOIC, reservadas a entidades legalmente habilitadas para o seu exercício.
O CIS visa tributar a actividade de serviços financeiros salvaguardando apenas os mecanismos de financiamento do setor bancário, em particular no mercado interbancário (artigo 7.º).
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Comissões de gestão e serviços financeiros
A Requerente, que defende não fornecer “serviços financeiros”, não explicitou, nem procurou fornecer ou obter a clarificação factual da sua actividade na gestão das OIC, indicando a que correspondem exactamente as diversas operações que originaram o cálculo de comissões cobradas durante o ano de 2019 às entidades por si geridas, num montante total de € 822.470,50 (oitocentos e vinte e dois mil, quatrocentos e setenta euros e cinquenta cêntimos), e que deram origem ao pagamento de IS num valor global de € 32.898,06 (trinta e dois mil, oitocentos e noventa e oito euros e seis cêntimos).
Contudo, frisou (manifestando até surpresa por as informações produzidas pelos serviços da AT, no indeferimento dos seus pedidos, terem referido a matéria) que não estava em causa, por exemplo, “a emissão de obrigações e papel comercial” (art.º 38º do PPA).
E deixou bem claro que apenas estava em causa a apreciação de “comissões de gestão” cobradas pela B... aos fundos de investimento por si geridos (cf. arts. 39.º e 36.º do PPA).
Nas alegações, a Requerente refere que não tem havido pronúncia jurisprudencial sobre a questão aqui controvertida, com excepção de dois processos do CAAD (n.º 741/2021-T e n.º 742/2021-T).
Contudo, para além da determinação do número exacto de processos já decididos no âmbito do CAAD sobre a questão que é objecto do presente processo, verifica-se que a aplicação da verba 17.3.4 da TGIS, que abrange comissões, tem dado origem a uma multiplicidade de processos.
Nalguns esteve em causa a aplicação da alínea e) do nº. 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, registando-se designadamente, a controvérsia surgida acerca da constitucionalidade do artigo 154.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março (OE para 2017) no segmento que atribuiu natureza meramente interpretativa ao nº 7 do artigo 7º do CIS, aditado pelo artigo 152.º da mesma Lei, e que diz: “O disposto na alínea e) do n.º 1 apenas se aplica às garantias e operações financeiras diretamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da atividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea”. [2]
A questão controversa nesses processos era porém diferente da aqui sub judice, porque neles não se discutiu propriamente, ou em especial, a abrangência de actividades cobertas pelo conceito “comissão” da norma de incidência mas sim o âmbito da isenção contida na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º [3], sendo que o número 7 do artigo 7º.º do CIS veio restringir a aplicação da alínea e) às «garantias e operações financeiras directamente destinadas à concessão de crédito, no âmbito da atividade exercida pelas instituições e entidades referidas naquela alínea »
Ainda outros processos, em que também estava em causa a aplicação da verba 17.3.4, apresentam uma diversidade de questões, embora muitas vezes interrelacionadas.
No caso em apreciação, e já em alguns outros, as dúvidas derivam da interpretação do conceito “serviços financeiros” objecto, e razão de cobrança, das comissões.
Diga-se, desde já, que este tribunal considera correctas as interpretações adoptadas nas decisões sobre questão idêntica à do presente processo, produzidas no âmbito do CAAD e indicadas nos autos (Processos 741/2021-T e 742/2021-T).
Por isso as utilizaremos na apreciação das questões a decidir.
7.1.3. Analisando:
Ao tempo dos factos tributários em análise, o regime aplicável às Sociedades de Gestão de Organismos de Investimento Colectivo (SGOIC) era o previsto na Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 56/2018, de 9 de Julho.[4]
A sua constituição encontrava-se dependente de autorização prévia da CMVM [5].
O artigo 66º do diploma já dispunha, nos seus n.ºs 1 e 2:
«1 - No exercício das funções respeitantes à gestão de organismo de investimento coletivo, compete à entidade gestora:
a) Gerir o investimento, praticando os atos e operações necessários à boa concretização da política de investimento, em especial:
i) A gestão do património, incluindo a seleção, aquisição e alienação dos ativos, cumprindo as formalidades necessárias para a sua válida e regular transmissão e o exercício dos direitos relacionados com os mesmos; e
ii) A gestão do risco associado ao investimento, incluindo a sua identificação, avaliação e acompanhamento.
b) Administrar o organismo de investimento coletivo, em especial:
i) Prestar os serviços jurídicos e de contabilidade necessários à gestão dos organismos de investimento coletivo, sem prejuízo da legislação específica aplicável a estas atividades;
ii) Esclarecer e analisar as questões e reclamações dos participantes;
iii) Avaliar a carteira e determinar o valor das unidades de participação e emitir declarações fiscais;
iv) Cumprir e controlar a observância das normas aplicáveis, dos documentos constitutivos dos organismos de investimento coletivo e dos contratos celebrados no âmbito da atividade dos mesmos;
v) Proceder ao registo dos participantes na condição prevista no n.º 4;
vi) Distribuir rendimentos;
vii) Emitir, resgatar ou reembolsar unidades de participação;
viii) Efetuar os procedimentos de liquidação e compensação, incluindo o envio de certificados;
ix) Registar e conservar os documentos.
c) Comercializar as unidades de participação dos organismos de investimento coletivo sob gestão.
2 - No exercício das funções respeitantes à gestão de OIA, à entidade gestora compete ainda, no que respeita aos ativos deste, nomeadamente:
a) Prestar os serviços necessários ao cumprimento das suas obrigações fiduciárias;
b) Administrar imóveis, gerir instalações e controlar e supervisionar o desenvolvimento dos projetos objeto de promoção imobiliária nas suas respetivas fases;
c) Prestar outros serviços relacionados com a gestão do OIA e ativos, incluindo sociedades, em que tenha investido por conta do OIA.
3 - A entidade gestora só pode ser autorizada a prestar as atividades previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 e no n.º 2 se estiver autorizada para o exercício da atividade referida na alínea a) do no 1.
4 - A entidade gestora pode assegurar, sem necessidade de registo na CMVM para a prestação desse serviço, o registo individualizado das unidades de participação dos organismos de investimento coletivo sob gestão quando assegure a respetiva comercialização, desde que as unidades de participação estejam integradas em sistema centralizado.
5 - Quando a entidade gestora assegure o registo referido no número anterior fica sujeita às regras aplicáveis ao registo individualizado de valores mobiliários previstas no Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, e respetiva regulamentação.».
Sobre se estas competências correspondem a serviços financeiros prestados pelas SGOIC, considerou-se nas decisões do CAAD, de 11/03/2022 e de 20/05/2022, processos 742/2021-T e 741/2021-T:
«(...) quando entendidas de forma isolada ou segregada, as tarefas de administrar imóveis, gerir instalações e controlar e supervisionar o desenvolvimento dos projetos objeto de promoção imobiliária nas suas respetivas fases poderão não corresponder, necessariamente, a um serviço financeiro. Porém, a prestação, pelas SGOIC, dessas tarefas aos OIC não é feita de forma isolada ou segregada (…). O núcleo central da atividade das SGOIC corresponde à gestão de OIC. Com efeito, a differentia specifica das SGOIC face a outras sociedades financeiras – como, por exemplo, uma sociedade financeira de corretagem, uma sociedade de locação financeira ou uma sociedade de garantia mútua, reside na circunstância de as primeiras serem responsáveis pela gestão de OIC. A gestão de OIC corresponde à atividade principal e constitui o pilar essencial – vulgarmente designado por “core-business” - de uma SGOIC. Ao realizarem uma actividade de gestão por conta alheia dos OIC, as SGOIC são chamadas a prestar diversos serviços conexos, previstos no artigo 66.º do RGOIC. Essas tarefas devem ser executadas pelos SGOIC, no contexto das obrigações fiduciárias que têm para com os OIC. É por esse facto que a remuneração das SGOIC pela prestação de todos aqueles serviços baseia-se, nos termos do artigo 67.º do RGOIC, na cobrança de “comissões de gestão”, estabelecidas no regulamento de gestão, que podem assumir uma componente fixa e outra variável (esta última, quando existente, geralmente indexada à performance do fundo).» (proc. n.º 742/2021-T).
« (…) é artificioso decompor todas as atividades indicadas na norma atrás citada e verificar se cada uma é, ou não, um serviço financeiro porque a comissão paga não é decomposta de igual forma. A comissão é relativa a todos os serviços, não sendo feita qualquer distinção em função da atividade concretamente desenvolvida. Os serviços indicados no art. 66.º, n.º 1, al. b), subalínea i) não são autónomos dos serviços de administração, são auxiliares do serviço de administração e diretamente dele dependentes. Os serviços da subalínea i) estão enunciados na al. b), o que indica que são realizados no âmbito da administração dos organismos de investimento coletivo. Pelo que, não se pode dissociar as atividades indicadas na subalínea i) da própria atividade de administração, como se fossem autónomas. Esses serviços não são autónomos, estão incluídos nos atos de administração.» (proc. n.º 741/2021-T).
Com efeito, é como contrapartida de toda a actividade prestada na administração do OIC que as Sociedades de Gestão recebem uma comissão de gestão, de acordo com o artigo 67.º da Lei nº 15/2016: «O exercício da atividade de gestão de organismo de investimento coletivo é remunerado através de uma comissão de gestão, podendo esta incluir uma componente variável calculada em função do desempenho do organismo de investimento coletivo, nos termos previstos em regulamento da CMVM.».
Ainda procurando a clarificação do conceito “serviços financeiros”, as referidas decisões procederam a uma interpretação sistemática, recorrendo a outras normas do ordenamento jurídico, e chegaram a conclusões idênticas.
A análise efectuada no processo 741/2021-T das normas do Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29 de Maio, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e do Código de Valores Mobiliários, confirmou que as atividades desenvolvidas pelas SGOIC nos termos do artigo 66.º do RGOIC, devem ser também consideradas serviços financeiros.
Por um lado, atendendo ao conceito de “serviço financeiro” utilizado pelo artigo 2.º do Dec. Lei 95/2006, que integra serviços de investimento, e à classificação das SGOIC, pelo RGICSF, como sociedades financeiras, retira-se que as actividades desenvolvidas pelas SGOIC, de acordo com o artigo 66.º do RGOIC, são idênticas à das restantes sociedades financeiras, tendo, pois, a mesma classificação como serviços financeiros (artigos 4º e 199º-A do RGICSF, redacção vigente em 2019).
Quanto ao Código de Valores Mobiliários (versão vigente em 2019), dispõe no artigo 289.º, n.º 1, que são actividades de intermediação financeira:
«a) Os serviços e atividades de investimento em instrumentos financeiros;
b) Os serviços auxiliares dos serviços e atividades de investimento; (…)»
E contém nos artigos 290.º, 291.º e 294.º uma listagem de múltiplas tarefas descritas como “serviços e actividades de investimento”, serviços auxiliares” e “consultoria para investimento e consultoria para investimento independente”, todas incluídas nos conceitos do artigo 289.º
Tal permite concluir que todas essas actividades integram o conceito de actividade financeira.
E, realizando as SGOIC actividades idênticas, também essas são financeiras e os respectivos serviços prestados se devem classificar como serviços financeiros.
Por isso se conclui: «Deste modo, mesmo as atividades auxiliares à atividade financeira são integradas no mesmo conceito. Esta é mais uma razão para afastar a decomposição das atividades da Requerente previstas no art. 66.º do RGOIC».
No proc. 742/2021-T, sobre a noção de serviços financeiros, admitindo a amplitude do conceito consagrado no art.º 2.º, alínea c) [6], do Decreto-Lei n.º 95/2006, de 29/05, acrescenta-se: «Esta amplitude encontra-se presente, de forma idêntica, no Direito da União Europeia. A chamada diretiva MIFD II prevê, no artigo 29.º, n.º 1, e a propósito das obrigações das empresas de investimento que nomeiam agentes vinculados, uma noção ampla de serviços financeiros» [7] .
E sobre a abrangência do conceito: «Com efeito, o artigo 66.º, n.ºs 1 e 2 do RGOIC determina que, no exercício das funções respeitantes à gestão de OIC e das suas obrigações fiduciárias, a entidade gestora preste aos ativos do OIC um conjunto global de serviços, nos quais se incluem serviços de gestão; de administração e comercialização. De forma idêntica, o artigo 289.º, n.º 1, alínea b) do Código dos Valores Mobiliários vigente em 2019, considera serem atividades de intermediação financeira os serviços auxiliares dos serviços e atividades de investimento, tal como descritos no artigo 291.º, estando as SGOIC abrangidas por esta disposição ex vi artigo 293.º, n.º 2, alínea g) do mesmo Código».
Concluindo, com fundamento em todas razões expostas, incluindo as também invocadas nas decisões do CAAD nos processos 741/2021-T e 742/2021-T, e que sinteticamente aqui reproduzimos, não assiste razão à Requerente no processo sub judice ao defender que os serviços de gestão, administração e comercialização prestados pelas SGOIC aos OIC «não cabem na definição de serviços de investimento permitidos às instituições de crédito e às sociedades financeiras, nos termos do artigo 199.º-A do RGICSF».
O argumento de que nem o RGICSF nem a Directiva Bancária identificam a actividade de gestão de OIC (arts 81º a 92.º do PPA) não colhe, considerando uma interpretação jurídica sistemática.
E o que resulta da interpretação conjugada de normas de diversos diplomas, designadamente o RGOIC, o Dec. Lei nº. 95/2006, o RGICSF e o CVM, é que as entidades com competência para gerir OIC, institucionalizadas como Sociedades Gestoras de OIC, realizam operações qualificáveis como serviços financeiros, idênticos aos praticados pelas entidades especificamente objecto dos diversos diplomas relevantes para a classificação em causa.
E que o conceito de “serviços financeiros” inclui todo o tipo de serviços necessários à realização das funções de gestão de organismo de investimento colectivo (artigo 66.º do RGOIC) [8].
7.1.4. Objectivos do Imposto do Selo
Como afirmado no preâmbulo do Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de Setembro, a reforma do Imposto do Selo «de 2000 marcou uma tendência para a alteração de uma das suas mais ancestrais características, que de imposto sobre os documentos se tende a afirmar cada vez mais como imposto sobre as operações que, independentemente da sua materialização, revelem rendimento ou riqueza».
Carlos Lobo, de forma sintética, identificou [9] no Código de Imposto do Selo, entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2000 [10], pelo menos nove modos de alcançar aqueles objectivos: imposto de registo relativo a transmissões onerosas de propriedade imobiliária, imposto de trespasse ou direitos de exploração; imposto sobre sucessões e doações; imposto de registo sobre documentos públicos ou particulares para efeitos de outorga de fé pública; imposto sobre actos públicos pela remuneração de serviços; imposto sobre actos públicos tendo subjacente propósitos de desincentivo; imposto sobre manifestações indirectas de capacidade contributiva reveladas por via da celebração de determinados contratos; imposto sobre instrumentos e operações financeiras e de seguros; imposto ambiental sobre actividade publicitária e imposto sobre a entrada de capitais.
Entretanto, foram revogadas diversas verbas (entre as quais a relativa a “entrada de capitais”) e outras surgiram, mas pode dizer-se que as caraterísticas gerais apontadas, incluindo a diversidade, se mantém.
O referido Autor observava ainda que a cada tipo tributário correspondia uma filosofia própria, realçando, nomeadamente que «as operações e os instrumentos financeiros são inevitavelmente sujeitos, na nova configuração do Imposto do Selo, a uma tributação que atende unicamente à substância económica das operações, alheando-se o legislador da forma jurídica dos contratos».
Muito relevante para o presente caso, é a sua observação sobre «as comissões ou quaisquer contraprestações por serviços financeiros» que considera serem «tipicamente tributadas tomando em consideração a sua natureza de prestação de serviços que gozando de isenção em sede de IVA se tornam alvos por excelência do Imposto do Selo entendido como imposto residual ou “intersticial”».
Por contraposição a outras operações, como as de “utilização do crédito”, realçava a clareza da sua «base de legitimação de tributação directamente assente no conceito de prestação de serviços».
Ora, como temos vindo a analisar, as comissões de gestão cobradas aos organismos de investimento colectivo pelas respectivas sociedades de gestão, correspondem à remuneração destas pelo exercício das funções previstas no artigo 66.º do RGOIC.
De resto, o RGOIC prevê expressamente no artigo 139.º quais os encargos e receitas dos organismos de investimento colectivo, norma que dizia, à data dos factos: [11]
«1 - Constituem encargos do organismo de investimento coletivo:
a) A comissão de gestão e a comissão de depósito, destinadas a remunerar os serviços prestados pela entidade responsável pela gestão e pelo depositário do organismo de investimento coletivo, respetivamente;
b) Os custos de transação ou de exploração onerosa dos ativos do organismo de investimento coletivo, incluindo os custos de mediação;
c) Custos de conservação e manutenção dos ativos;
d) Os custos relacionados com a celebração de contratos de seguros;
e) Os custos emergentes das auditorias e de avaliações externas exigidas por lei ou regulamento da CMVM;
f) Outras despesas e encargos devidamente documentados e que decorram de obrigações legais;
g) A taxa de supervisão devida à CMVM.
2 - Os custos relativos à mediação e avaliação de imóveis apenas são imputáveis aos organismos de investimento coletivo relativamente a negócios que para este sejam concretizados.
3 - Podem também constituir encargos do organismo de investimento coletivo os custos de realização de estudos de investimento (research) desde que cumpridas as seguintes condições:
a) Os custos correspondem a serviços efetivamente prestados ao organismo de investimento coletivo; e
b) O relatório e contas anual inclui informação quantitativa sobre os custos de realização de estudos de investimento (research).
4 - Constituem, nomeadamente, receitas dos organismos de investimento coletivo, as resultantes do investimento ou transação dos ativos que os compõem, bem como os rendimentos desses ativos, as comissões de subscrição, resgate e transferência, e os benefícios admitidos ao abrigo do artigo 92.º
5 - Não obstante o disposto no número anterior, parte ou a totalidade das comissões de subscrição, resgate e transferência podem reverter para a entidade comercializadora, desde que tal esteja previsto nos documentos constitutivos do organismo de investimento coletivo.
6 - As demais regras relativas a receitas e encargos do organismo de investimento coletivo são definidas em regulamento da CMVM»
Ou seja, o RGOIC prevê uma clara distinção entre vários encargos dos OIC, autonomizando os suportados com a comissão de gestão destinados a “remunerar os serviços prestados pela entidade responsável pela gestão” (primeira parte da alínea a) do n,º 1 do art,º139.º), ou seja a remuneração cobrada pelas SGOIC (art.º 67.º do RGOIC).
A essa autonomia da remuneração por serviços prestados corresponde também a autonomia dos respectivos custos.
O montante correspondente a essa remuneração, contraprestação de serviços prestados, estaria por natureza sujeita a IVA[12].
Porém, no contexto do sistema europeu de IVA, os serviços financeiros estão isentos desse imposto, nos termos do artigo 135º da Directiva IVA, invocando-se diversas dificuldades de ordem técnica para a aplicação do imposto àquele tipo de operações.
A isenção de IVA leva os diversos ordenamentos jurídicos a adoptar para as realidades em causa outras formas de tributação indirecta.
Em Portugal, diversas dessas actividades, isentas no CIVA[13], caem então no campo de incidência do Código do Selo e Tabela Geral do Imposto do Selo.
Ou seja, estamos de regresso à norma objecto da controvérsia, a verba da Tabela Geral do Imposto do Selo que dispõe:
«17 Operações financeiras: (…)
17.3 Operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras - sobre o valor cobrado: (…)
17.3.4 Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões. 4%”»
7.1.5. Aplicação da verba 17.3.4. às comissões
Por tudo o que fica dito supra, estamos em condições de confirmar que as operações em apreciação nos autos – a remuneração dos serviços prestados pelas SGOIC aos OIC por si geridos - se encontram abrangidas pelas normas de incidência do Imposto do Selo (artigos 1º, 7.º e verba 17. 3. 4 da Tabela Geral)
Ou, tal como se disse no proc. 742/2021-T, «é o próprio legislador que assim entende quando fixa, no artigo 67.º do RGOIC, a forma de remuneração destas sociedades. Observe-se que as SGOIC não cobram, aos OIC, comissões individualizadas, específicas ou segregadas por cada um dos serviços que lhes prestam nos termos do artigo 66.º, n.ºs 1 e 2 do RGOIC. Ora, estando em causa sociedades financeiras, seria absurdo entender-se que as comissões de gestão por estas cobradas, que constituem as suas receitas principais, não decorre da prestação de serviços financeiros».
Nesse processo verificava-se que a Requerente «não fez qualquer prova que tenham sido pagas, pelos OIC, comissões devidas pela prestação individualizada de específicos serviços de gestão ou de comercialização ou até de administração ou sequer que essa hipotética prestação individualizada e específica de serviços tivesse sido sujeita a Imposto do Selo».
E entendeu-se que o imposto devido relativamente às comissões «constitui um encargo do próprio património autónomo sob gestão e não diretamente dos participantes, e são distintas das comissões de comercialização, cobradas pelos intermediários financeiros às SGOIC, razão pela qual não se pode considerar, neste domínio, a existência de dupla tributação, como a certo passo alega a Requerente»
Também nos presentes autos se confirmou não ter sido feita, nem invocada, prova de prestação individualizada de serviços específicos, sendo o exercício da atividade de gestão de organismo de investimento coletivo – que inclui a prestação de todas as atividades previstas no artigo 66.º do RGOIC - remunerada, nos termos da lei, através de uma comissão de gestão, nos termos do artigo 67.º do mesmo diploma.
Aliás, como já referido, a Requerente nestes autos acentuou que estava em causa a caraterização da própria comissão de gestão, em si.
Deste modo, conclui - se no presente processo que a comissão de gestão, prevista no artigo 67.º do RGOIC e cobrada por parte das SGOIC, deve entender-se como estando abrangida pelo âmbito de incidência da sub-verba 17.3.4. da TGIS, pelo que as autoloquidações impugnadas foram devidamente efectuadas, de acordo com o disposto no Código do Imposto do Selo (CIS e Tabela Geral).
7.1. 6. Observação complementar
A propósito do conceito de comissões e confirmando estabilização da qualificação das SGOIC, parece pertinente referir ainda a decisão de 11 de Julho de 2022, no proc. 68/2022-T.
Apreciando a legalidade de liquidação referente a 2020, período em que vigorava já uma nova redacção do RGICSF (dada pelo Dec. Lei n.º 144/2019, de 23/09) considerou-se que as SGOIC mantinham a natureza de instituição financeira abrangida pela verba 17.3.4 da TGIS.
Desde logo por aplicação do direito comunitário, de cuja análise – designadamente do Regulamento (EU) nº 575/2013, de 29 de Junho de 2013, da Directiva 2013/36 e do Regulamento 1095/2010, de 24 de Novembro de 2010 - se conclui que as SGOIC são expressamente qualificadas como instituições financeiras, «estando como elas sujeitas a toda uma panóplia de normas que regulam a actividade dos profissionais dos mercados financeiros».
E também porque a lei interna não visou, com a alteração introduzida pelo DL n.º 144/2019, alterar essa qualificação[14].
Assim, concluiu-se, também aí, e já em período posterior, que as comissões de gestão auferidas pelas SGOIC estão abrangidas pela verba 17.3.4 da TGIS.
7.2. O direito comunitário
7.2.1. A Directiva n.º 2008/7/CE do Conselho
A Requerente considera ainda que está em causa a violação do direito comunitário, argumentando que as comissões de gestão suportadas por OIC incluem-se na categoria de operações de reunião de capitais cuja sujeição a Imposto do Selo é vedada pela Diretiva n.º 2008/7/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, com proibição de qualquer tributação indireta sobre esse tipo de operações (artigo 5.º).
Vejamos:
A Directiva n.º 2008/7/CE, invocada como “relativa aos impostos indirectos que incidem sobre reuniões de capitais”, regula matéria que desde a Directiva 69/335/CEE tem sofrido diversas alterações.
O artigo 1º da Diretiva n.º 2008/7/CE define como seu objecto a regulação da aplicação de impostos indirectos sobre:
a) Entradas de capital em sociedades de capitais;
b) Operações de reestruturação que envolvam sociedades de capitais;
c) Emissão de determinados títulos e obrigações.
O art.º 5.º, n.º 1, dispõe que os Estados Membros não devem sujeitar as sociedades de capitais a qualquer forma de imposto indirecto sobre: a) Entradas de capital[15]; b) Empréstimos ou prestações de serviços, efectuadas no âmbito das entradas de capital; c) Registo ou qualquer outra formalidade prévia ao exercício de uma actividade a que uma sociedade de capitais esteja sujeita em consequência da sua forma jurídica; d) Alterações do acto constitutivo ou dos estatutos de uma sociedade de capitais, designadamente as seguintes: i) a transformação de uma sociedade de capitais numa sociedade de capitais de tipo diferente, ii) a transferência de um Estado-Membro para outro Estado-Membro da sede de direcção efectiva ou da sede estatutária de uma sociedade de capitais, iii) a alteração do objecto social de uma sociedade de capitais, iv) a extensão do período de duração de uma sociedade de capitais; e) As operações de reestruturação referidas no artigo 4.o
O n.º 2, do artigo 5.º da Directiva prevê:
“Os Estados-Membros não devem sujeitar a qualquer forma de imposto indirecto:
a) A criação, emissão, admissão à cotação em bolsa, colocação em circulação ou negociação de acções, de partes sociais ou de outros títulos da mesma natureza, bem como de certificados representativos desses títulos, independentemente de quem os emitiu;
b) Os empréstimos, incluindo os estatais, contraídos sob a forma de emissão de obrigações ou outros títulos negociáveis, independentemente de quem os emitiu, e todas as formalidades conexas, bem como a criação, emissão, admissão à cotação em bolsa, colocação em circulação ou negociação dessas obrigações ou de outros títulos negociáveis.”
Ora, como também defendido nas duas decisões do CAAD já amplamente citadas (processos 741/2021-T e 742/2021-T), o pagamento das comissões efetuado pelas OIC às SGOIC, em virtude das funções exercidas por estas, são operações que não se confundem com as abrangidas pelo citado artigo 5.º como resulta de adequada interpretação das normas da Directiva de Reunião de Capitais.
Há que não perder de vista a preocupação enunciada no considerando 2 da Directiva: «Os impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais, designadamente o imposto sobre as entradas de capital (imposto que incide sobre as entradas de capital nas sociedades), o imposto de selo sobre os títulos, e o imposto sobre as operações de reestruturação, independentemente de essas operações envolverem ou não um aumento de capital, dão origem a discriminações, duplas tributações e disparidades que dificultam a livre circulação de capitais. O mesmo se aplica a outros impostos indirectos com características idênticas às do imposto sobre as entradas de capital e do imposto de selo sobre os títulos»
Mas, no caso da tributação das comissões cobradas pelas SGOIC aos organismos por si geridos, não está em causa qualquer restrição aos movimentos de capitais entre os Estados, não se verifica qualquer das situações descritas como podendo prejudicar a livre circulação de capitais, objectivo primordial da Directiva.
De resto, conforme também já evidenciado em outras decisões, o artigo 6º da Directiva dispõe no seu nº. 1:
« Em derrogação ao disposto no artigo 5.o, os Estados-Membros podem cobrar os seguintes impostos e direitos: a) Impostos sobre a transmissão de valores mobiliários, cobrados forfetariamente ou não; b) Direitos de transmissão, incluindo os encargos de registo de propriedade que incidem sobre a entrada, numa sociedade de capitais, de bens imóveis ou de estabelecimentos comerciais sitos no respectivo território; c) Direitos de transmissão sobre activos de qualquer natureza que constituam entradas de capital numa sociedade de capitais, na medida em que a transmissão dos referidos activos não seja remunerada através de partes sociais; d) Direitos que onerem a constituição, inscrição ou extinção de privilégios e hipotecas; e) Direitos com carácter remuneratório; f) Imposto sobre o valor acrescentado».
No presente caso, acentuando, mais uma vez, o carácter remuneratório dos serviços prestados pelas SGOIC – e que são serviços financeiros porque visam precisamente realizar os objectivos dos OIC geridos, actuando em sua representação na prática de uma actividade de investimento - este tribunal conclui, com a fundamentação já exposta, ser claro que a tributação das comissões cobradas previstas na verba 17.3.4 da TGIS não se encontra abrangida pela proibição constante do artigo 5.º da Directiva n.º 2008/7/CE.
7.2.2. Sobre a necessidade de reenvio prejudicial
7.2.2.1 A Requerente invoca jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) que tem por consolidada – designadamente os acórdãos Comissão/Bélgica (Processo C-415/02, Comissão/Bélgica), Isabelle Gielen (Processo C-299/13), Albert Reiss (Processo C‑466/03) e HSBC Holdings (Processo C‑569/07) - defendendo que não subsistem dúvidas quanto ao enquadramento dos OIC, e em particular dos fundos de investimento, no escopo subjetivo da Diretiva, apesar de o artigo 5.º da Diretiva da Reunião de Capitais não mencionar expressamente os serviços de gestão, administração e comercialização de OIC.
Considera que as comissões de gestão cobradas aos OIC teriam necessariamente de ser consideradas como abrangidas pela exclusão de tributação estabelecida na Directiva, por violação do art.º 5º, quer quanto às comissões de gestão quer quanto à comercialização de unidades de participação, por essenciais às reuniões de capitais (arts 102º e ss. do PPA).
Considera fundamental o reenvio para apreciação do TJUE, invocando, em termos de jurisprudência nacional, o Acórdão do TCAS no proc. 6866/02, de 29/10/2002.
E invoca ainda, para justificar o reenvio, as decisões recentemente tomadas no âmbito do CAAD, para apreciação do TJUE e que aí deram origem aos processos nºs C- 335/22 e C-656/21.
7.2.2.2. As decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia
As decisões do TJUE citadas referem-se, com efeito, a situações relacionadas com reunião de capitais mas não se assemelham ao caso objecto do presente processo, como resulta de uma rápida verificação.
No caso C-415/02 (Comissão contra Reino da Bélgica), foi decidido que:
« - Ao sujeitar ao imposto sobre as operações de Bolsa as subscrições efectuadas na Bélgica de títulos de uma nova emissão, criados quer no momento da constituição de uma sociedade ou de um fundo de investimento, quer após a realização de um aumento de capital, quer ainda em virtude da emissão de um empréstimo obrigacionista, e
- ao sujeitar ao imposto sobre as emissões de títulos ao portador a entrega material de títulos ao portador, relativos a fundos públicos belgas ou estrangeiros, quando se trate de títulos de uma nova emissão, criados quer no momento da constituição de uma sociedade ou de um fundo de investimento, quer após a realização de um aumento de capital, quer ainda em virtude da emissão de um empréstimo obrigacionista,
o Reino da Bélgica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 11.° da Directiva 69/335/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais (JO L 249, p. 25; EE 09 Fl p. 22), alterada pela Directiva 85/303/CEE»
No caso C- 299/03 (Isabelle Gielen/ Ministerraad), estava em causa a apreciação da compatibilidade com a Directiva de Reunião de Capitais, do art. 167º do Código dos direitos e impostos diversos, introduzido por uma Lei de 2011, ao criar um imposto sobre a conversão (tornada obrigatória por Lei de 2005) de títulos ao portador em títulos escriturais ou nominativos.
Foi considerado que o imposto não podia ser justificado com base no artigo 6.° da Directiva 2008/7 porque: «Essa disposição, que, enquanto exceção à regra da não tributação, deve ser interpretada de forma estrita, não se pode aplicar no caso de um imposto sobre a conversão de ações ao portador como o que está em causa no processo principal. Com efeito, no âmbito desta conversão, transforma‑se ações ao portador em títulos escriturais ou em títulos nominativos, sem que haja transmissão de um direito de um primeiro titular para um segundo titular» (pontos 29 e 30).
E, assim, concluiu que o artigo 5.°, n.º2, da Diretiva 2008/7/CE do Conselho, de 12 de fevereiro de 2008, relativa aos impostos indiretos que incidem sobre as reuniões de capitais, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à cobrança de um imposto sobre a conversão de títulos ao portador em títulos nominativos ou em títulos escriturais, como o que estava em causa no processo principal.
No caso C-466/03, de 28 de Junho de 2007 (Albert Reiss/Land Baden‑Württemberg), o TJUE sintetizou as questões colocadas da seguinte forma:
«Através das suas questões, que devem ser apreciadas em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se a Directiva 69/335 se opõe à cobrança de emolumentos notariais pela autenticação de uma transferência de partes sociais para uma sociedade, efectuada como entrada no âmbito um aumento do capital social de uma sociedade de capitais, num sistema que se caracteriza pelo facto de os notários serem funcionários e de os emolumentos reverterem, pelo menos em parte, para o Estado a fim de suportar despesas públicas».
Atendendo a que «a autenticação em causa constitui efectivamente uma formalidade prévia à qual está sujeita uma sociedade de capitais em razão da sua forma jurídica» considerou-se que estava em causa a liberdade de circulação de capitais, com violação do objectivo de eliminação de obstáculos fiscais no domínio das reuniões de capitais, entre as quais, designadamente, as entradas efectuadas pelos sócios ou accionistas das sociedades de capitais, e decidiu-se que a Directiva (69/335/CEE do Conselho) se opunha à referida cobrança de emolumentos notariais pela autenticação de uma transferência de partes sociais para uma sociedade, efectuada como entrada no âmbito de um aumento do capital social de uma sociedade de capitais.
No caso C – 569/07, de 1 de outubro de 2009, ( HSBC Holdings plc,Vidacos Nominees Ltd/ The Commissioners of Her Majesty’s Revenue & Customs (UK), a questão colocada ao Tribunal de Justiça, foi:
«O artigo 10.o ou o artigo 11.o da [d]irectiva […] ou os artigos 43.o [CE], 49.o [CE] ou 56.o [CE] ou qualquer outra disposição de direito comunitário proíbem que um Estado-Membro (a seguir ‘primeiro Estado-Membro’) aplique um imposto de 1,5% sobre a transferência ou emissão de acções num serviço de compensação quando:
a)
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[u]ma sociedade (a seguir ‘sociedade A’) estabelecida no primeiro Estado-Membro lança uma oferta de aquisição das acções, cotadas e negociadas em bolsa, de uma sociedade (a seguir ‘sociedade B’), estabelecida noutro Estado-Membro (a seguir ‘segundo Estado-Membro’), em troca de acções da sociedade A, a emitir na bolsa de valores do segundo Estado-Membro;
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b)
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[o]s accionistas da sociedade B podem optar por receber as novas acções da sociedade A:
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sob forma materializada; ou
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sob forma escritural, através de um sistema de liquidação no primeiro Estado-Membro; ou
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sob forma escritural, através de um serviço de compensação do segundo Estado-Membro;
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c)
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[a] legislação do primeiro Estado-Membro dispõe, [no essencial], que:
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[em] caso de emissão de acções tituladas (ou escriturais no sistema de liquidação de acções desmaterializadas do primeiro Estado-Membro), o imposto não incide sobre a emissão das acções, mas sobre cada venda subsequente das acções, à taxa de 0,5% da contrapartida da transferência; mas,
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na transferência ou emissão de acções escriturais ao operador de um serviço de compensação, o imposto é aplicado ([em] caso de emissão das acções) à taxa de 1,5% do preço de emissão ou ([em] caso de transferência a título oneroso) à taxa de 1,5% do montante ou valor da contrapartida ou (em todos os outros casos) à taxa de 1,5% do valor das acções, não sendo subsequentemente cobrado nenhum imposto sobre as vendas das acções (ou dos direitos sobre as acções) no âmbito do serviço de compensação;
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o operador de um serviço de compensação pode, quando recebe a aprovação da autoridade fiscal competente, optar por que não seja cobrado [nenhum] imposto sobre a transferência ou a emissão das acções ao seu serviço de compensação, mas por que, em vez disso, seja cobrado imposto sobre cada venda das acções no âmbito do serviço de compensação à taxa de 0,5% do preço de venda. A autoridade fiscal competente pode exigir (e actualmente exige), como condição para aprovar essa opção, que o operador do sistema de compensação que pretende optar por esse regime institua e mantenha procedimentos (considerados satisfatórios pela autoridade fiscal) de cobrança do imposto no âmbito do serviço de compensação e de cumprimento, ou garantia de cumprimento, da regulamentação a ele relativa;
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d)
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[a] regulamentação em vigor na bolsa de valores do segundo Estado-Membro exige que todas as acções emitidas no território sob jurisdição deste sejam detidas sob forma escritural por intermédio de um único serviço de compensação estabelecido no segundo Estado-Membro, cujo operador não exerceu a opção acima referida?»
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Tendo em conta as operações em causa e as disposições da Directiva referente a Reunião de Capitais o TJUE acabou a declarar que «na medida em que um imposto como o SDRT é cobrado sobre títulos novos consecutivamente à realização de um aumento de capital, esse imposto constitui uma imposição na acepção do artigo 11.o, alínea a), da directiva cuja instituição é proibida por essa disposição.»
E decidiu: «O artigo 11.o, alínea a), da Directiva 69/335/CEE do Conselho, de 17 de Julho de 1969, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais, conforme, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à cobrança de um imposto, como o em causa no processo principal, quando da emissão de acções no âmbito de um serviço de compensação».
7.2.2.3. Jurisprudência nacional
Quanto ao Acórdão do TCAS, proferido em 19/10/2002, no processo n.º 6866/02, invocado pela Requerente para confirmar a sua tese de necessidade evidente de reenvio do presente processo ao TJUE, não parece útil para esse efeito.
É que o referido Acórdão, apreciando um recurso de sentença que considerara intempestiva uma impugnação de emolumentos e pedido de restituição oficiosa de emolumentos, considerou, naquele caso concreto, que o prazo para impugnar actos de liquidação de receitas tributárias perante os tribunais portugueses era o fixado na lei nacional, e rejeitou o pedido de reenvio, confirmando a decisão recorrida que julgara a impugnação extemporânea. [16]
7.2.2.4. Os reenvios invocados no âmbito do CAAD
Quanto aos processos do CAAD que a Requerente alega terem dado origem no TJUE aos Processos C-656/21 e C- 335/22.
Analisando:
No proc. C-656/21 TJUE formula-se as seguintes questões:
1) O artigo 5.º, n.º 2, da Directiva 2008/7/CE opõe-se a uma legislação nacional, como a verba 17.3.4 do Código do Imposto do Selo, que prevê a tributação em Imposto do Selo das comissões cobradas por bancos às entidades gestoras de fundos mobiliários abertos por prestação de serviços a estas relativos à actividade dos bancos dirigida à concretização de novas subscrições de UP, isto é, dirigida a novas entradas de capitais para os fundos de investimento, consubstanciadas na subscrição de novas unidades de participação emitidas pelos fundos?
2) O artigo 5.º, n.º 2, da Directiva 2008/7/CE opõe-se a uma legislação nacional que prevê a tributação em Imposto do Selo das comissões de gestão cobradas pelas entidades gestoras aos fundos mobiliários abertos, na medida em que essas comissões de gestão incluam o redébito das comissões cobradas por bancos, às entidades gestoras, pela actividade referida?
Este processo parece referir-se ao processo do CAAD nº 88/2021-T, em que o tribunal arbitral decidiu, em 7/10/2021, enviar ao TJUE um pedido de decisão prejudicial.
Assinala-se o seguinte (com base no texto da decisão):
Nesse caso, trata-se de um processo em que são Requerentes uma sociedade gestora de fundos e os fundos por ela geridos, a Sociedade gere vários fundos de investimento mobiliário abertos que comercializa através de instituições financeiras (bancos) que lhe facturam comissões de comercialização, em função das subscrições de unidades de participação dos fundos de que aquela é gestora.
Nas facturas emitidas relativamente a essas comissões de comercialização, as entidades financeiras liquidam Imposto do Selo, invocando a verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS). A sociedade gestora repercutiu nos fundos estas comissões de comercialização, redebitando o valor destas facturações dos bancos, aos fundos a que diziam respeito as comercializações de subscrição de UP em causa, e liquidando, pela segunda vez, imposto do selo sobre as mesmas.
Segundo transcrição constante da referida decisão do CAAD, o Pedido afirmava (nos arts. 81.º e 82.º): “Dito de outro modo, a tributação em imposto do selo da comissão de gestão propriamente dita não está aqui em causa, nem nunca esteve em causa nesta questão da dupla tributação”, “Nesta questão da dupla tributação apenas está em causa, e sempre esteve apenas em causa, a parcela da comissão debitada pela A... aos fundos correspondente ao débito das comissões de comercialização (e respectivo imposto do selo), facturadas anteriormente pelos bancos e sujeita já pelos bancos ao devido imposto do selo”.
Independentemente de saber se no caso do processo n.º 88/2021-T do CAAD se justificava ou não o reenvio prejudicial para apreciação do TJUE [17], trata-se de um caso bastante diferente do proc. 107/2022-T, e onde até surge implícita a concordância dos Requerentes com a tributação das comissões de gestão.
No processo C- 335/22 TJUE, foram colocadas as seguintes questões:
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O artigo 5.º, n.º 2, alínea b) da Diretiva 2008/7/CE, do Conselho, de 12 de fevereiro, pode ser interpretado no sentido de que se opõe à tributação em Imposto do Selo de comissões por serviços de intermediação financeira prestados por um Banco relativos à colocação em mercado de títulos negociáveis – obrigações e papel comercial – emitidos por diversas sociedades comerciais, compreendendo tais serviços a obrigação de o Requerente desenvolver os seus melhores esforços, identificando e contactando os investidores, de modo a distribuir os valores mobiliários, receber ordens de subscrição ou de aquisição e, em alguns casos, adquirir os valores mobiliários
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A resposta à primeira questão difere consoante a prestação dos serviços financeiros seja legalmente exigida ou apenas facultativa?
Este processo parece referir-se ao processo n.º 208/2021-T, que proferiu, em 19/05/2022, uma decisão de envio ao TJUE com pedido de decisão prejudicial.
Assinala-se o seguinte (com base no texto da decisão):
Trata-se de caso em que a Requerente é uma instituição de crédito, a operar em Portugal, que pretende discutir a incidência de Imposto do Selo relativamente a comissões de colocação (“agency fee – bond placement”) cobradas. As referidas comissões respeitam aos serviços prestados pelo Requerente, como intermediário financeiro, em operações associadas à emissão de valores mobiliários sob a forma de títulos negociáveis – obrigações e papel comercial – emitidos por diversas sociedades comerciais (“Emitentes”) para obtenção, junto do mercado de capitais, de meios financeiros destinados à sua atividade.
Ou seja, as dúvidas surgidas referem-se a comercialização de títulos, questão que a própria Requerente no presente processo declarou não se confundir com a da natureza das “comissões de gestão” (cf. artigos 38.º e 39.º do Pedido de Pronúncia Arbitral).
E é clara a distinção entre essas realidades, como já referido (supra, ponto 7.1. e desenvolvimentos). [18].
Tudo visto, conclui-se que, cabendo a este Tribunal decidir sobre a pertinência e necessidade de submeter a questão para apreciação do caso ao TJUE (Proc. C-2/06, Kempter, n.º 42), considera-se, pelas razões expostas, que o pedido de reenvio prejudicial com suspensão da instância é de indeferir no presente caso, por injustificado.
7. 3. Outros pedidos
Sendo o pedido de pronúncia arbitral considerado totalmente improcedente, não há lugar a qualquer reembolso por parte da Requerida nem a pagamento de juros indemnizatórios (art. 43º da LGT).
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Decisão
8. Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:
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Julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, rejeitando a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa n.º ...2021..., referente aos acto de liquidação de Imposto do Selo no valor total de € 12.846,90, refletido nas guias n.º ... (Fevereiro), n.º ... (Março) e n.º 2... (Abril), a declaração de ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2021..., relativa à liquidação de Imposto do Selo no montante total de € 20.051,16 correspondente a liquidações efetuadas entre Maio e Dezembro de 2019, através das guias n.º ... (Maio), n.º ... (Junho), n.º ... (Julho), n.º ... (Agosto), n.º ... (Setembro), n.º ... (Outubro), n.º ... (Novembro) e n.º ... (Dezembro).
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Confirmar a legalidade das impugnadas autoliquidações do Imposto do Selo, referentes ao ano de 2019, num montante total de € 32.898,06 (trinta e dois mil, oitocentos e noventa e oito euros e seis cêntimos).
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Absolver a AT de todos os pedidos, condenando a Requerente em custas.
9. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 32.898,06 (trinta e dois mil, oitocentos e noventa e oito euros e seis cêntimos), indicado pela Requerente e não contestado pela Requerida.
10. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 1.836,00 (mil oitocentos e trinta e seis euros) nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do referido Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa, 2 de Novembro de 2022.
A Árbitro
Manuela Roseiro)
(A presente decisão foi redigida de acordo com as regras ortográficas em vigor até ao mais recente AO, excepto no caso de transcrições).
[1] Segundo o artigo 1º do CIS o imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral de IS.
[2] O Tribunal Constitucional considerou inconstitucional, por violação do artigo 103.º, n.º 3 da CRP, o artigo 154.º da Lei n.º 7-A/2016, que atribuiu carácter interpretativo ao n.º 7 aditado ao artigo 7º do CIS. Cf. Acórdão do TC n.º 92/2018, de 20/02/2018.
[3] Resulta do artigo 7.º, alínea e), que são isentos do imposto do selo juros e comissões cobrados, a garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com excepção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças.
[4] O Decreto-Lei nº 144/2019, 23 de Setembro de 2019, introduziu alterações ao RGOIC aprovado pela Lei 15/2016 e a outros diplomas (incluindo o RGICSF e CVM), para vigorarem a partir de 1 de Janeiro de 2020. Foram aditados diversos artigos ao RGOIC, incluindo o artigo 71.º-A: «Sem prejuízo do disposto em lei especial, os organismos de investimento coletivo hétero geridos apenas podem ser geridos por sociedades gestoras de organismos de investimento coletivo (SGOIC)»
[5] Art. 19º, n.º 2, alínea b), do RGOIC, na redacção vigente em 2019.
[6] A referida alínea c), do n. º 1 do art. 2.º do DL 95/2006, caracteriza como “Serviços financeiros” qualquer serviço bancário, de crédito, de seguros, de investimento ou de pagamento e os relacionados com a adesão individual a fundos de pensões abertos». Também nos parece relevante a definição, na alínea d), de «Prestador de serviços financeiros' as instituições de crédito e sociedades financeiras, as instituições de pagamento, as instituições de moeda eletrónica, os intermediários financeiros em valores mobiliários, as empresas de seguros e resseguros, os mediadores de seguros e as sociedades gestoras de fundos de pensões».
[7] O citado artigo 29.º, n.º 1, da Diretiva 2014/65/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de Maio de 2014, relativa aos mercados de instrumentos financeiros, que altera a Diretiva 2002/92/CE e a Diretiva 2011/61/EU, dispõe: 1- Os Estados-Membros permitem a uma empresa de investimento nomear agentes vinculados para efeitos da promoção dos serviços da empresa de investimento, da angariação de serviços ou da receção de ordens de clientes ou clientes potenciais e sua transmissão, da colocação de instrumentos financeiros e da prestação de aconselhamento no que diz respeito aos instrumentos ou serviços financeiros oferecidos por essa empresa de investimento.
[8] Quanto aos comentários explicativos do INE sobre a classificação e numeração CAE, há que ter em conta que, ainda que se trate de uma nomenclatura aprovada pelo Decreto-Lei nº 381/2007, de 14 de Novembro, adaptando a Nomenclatura do Regulamento (CE) nº 1893/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Dezembro, visando harmonizar conceitos constantes de restantes normas vigentes à época, não poder gozar do estatuto de fonte de interpretação de diplomas sobre matérias financeiras, objecto, aliás, de numerosas alterações nos direitos comunitário e nacional.
[9] In “As Operações Financeiras no Imposto do Selo: Enquadramento Constitucional e Fiscal”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano 1, nº 1, pp. 73 a 86.
[10] Artigo 6.º da Lei n.º 150/99.
[11] Redacção do Decreto-Lei n.º 56/2018, de 9 de Julho.
[12] «Enquanto imposto geral sobre o consumo, o IVA onera por princípio todas as operações com conteúdo económico, quaisquer que sejam os respectivos contornos. Em particular, esta pretensão de generalidade exige que a incidência do IVA vá além das transmissões de bens, em que assentam os mais antigos impostos indirectos, e que se alargue também às prestações de serviços, que compõem a parcela dominante das economias modernas. Um dos trunfos maiores do IVA no confronto com outros modelos de impostos sobre o consumo está precisamente em garantir que a economia dos serviços cresça “para dentro” do sistema fiscal, ainda que estejam aqui os problemas de evasão mais delicados». (Sérgio Vasques, in “O Imposto sobre o Valor Acrescentado”, p. 195, Almedina, 2020).
[13] O artigo 9º do CIVA prevê a isenção de operações desse tipo, designadamente na alínea g): “A administração ou gestão de fundos de investimento”.
[14] Sobre a invocada intenção do legislador com as alterações então introduzidas no RGICSF, diz a decisão no proc. n.º 68/2022-T: «Bastará ler o preâmbulo de tal diploma para se concluir que o mesmo não visou, em qualquer medida, alterar a natureza jurídica das SGOIC, mas tão só proceder à transferência da competência para a sua fiscalização do Banco de Portugal para a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, o que é justificado pelo facto de esta entidade ser já responsável pela supervisão dos organismos de investimento coletivo sob gestão daquelas sociedades gestoras e se considerar existirem vantagens na concentração das vertentes prudencial e comportamental da supervisão. Ou seja, esta alteração legislativa não teve como objeto as entidades reguladas (nada alterou relativamente a elas), mas sim a redefinição das competências das entidades reguladoras. A atividade própria das SGOIC é regulamentada pela Lei n.º 16/2015, de 24 de fevereiro (Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo), cujo art.º 71º-D expressamente sujeita as sociedades gestoras aos princípios, condições, termos, requisitos e deveres previstos no Código dos Valores Mobiliários para os intermediários financeiros».
[15] Conceito definido para efeitos da Directiva, no seu artigo 3º «a) A constituição de uma sociedade de capitais; b) A transformação em sociedade de capitais de uma sociedade, associação ou pessoa colectiva que não seja sociedade de capitais; c) O aumento do capital social de uma sociedade de capitais mediante a entrada de activos de qualquer espécie; d) O aumento do património de uma sociedade de capitais mediante a entrada de activos de qualquer espécie, remunerada não por partes representativas do capital social ou do activo, mas por direitos da mesma natureza que os dos sócios, tais como direito de voto, participação nos lucros ou no saldo de liquidação; e) A transferência de um país terceiro para um Estado-Membro da sede de direcção efectiva de uma sociedade de capitais cuja sede estatutária se encontre num país terceiro; f) A transferência de um país terceiro para um Estado-Membro da sede estatutária de uma sociedade de capitais cuja sede de direcção efectiva se encontre num país terceiro; g) O aumento do capital social de uma sociedade de capitais através da incorporação de lucros, reservas ou provisões; h) O aumento do activo de uma sociedade de capitais através de prestações de serviços efectuadas por um sócio, que não impliquem o aumento do capital social, mas que tenham a sua contrapartida numa alteração dos direitos sociais ou que sejam susceptíveis de aumentar o valor das partes sociais; i) O empréstimo contraído por uma sociedade de capitais, se o credor tiver direito a uma quota-parte dos lucros da sociedade; j) O empréstimo contraído por uma sociedade de capitais junto de um sócio, do cônjuge ou de um filho de um sócio, bem como o empréstimo contraído junto de um terceiro, quando seja garantido por um sócio, desde que os referidos empréstimos tenham a mesma função que o aumento de capital social».
[16] «Portanto, na falta de fixação, em norma de direito comunitário, de prazo para o efeito, como tem reconhecido o TJCE (cf. os acórdãos de 15 de Setembro de 1998 nos processos n.ºs C-231/96 e C-260/96, e 17 de Novembro de 1998, no processo n° C-228/96), o prazo para impugnar actos de liquidação de receitas tributárias perante os tribunais portugueses é o fixado na lei nacional. E não se põe, aqui, a necessidade de interpretar qualquer norma de direito comunitário, porque ela não existe, em termos de poder ser afrontada pela de direito interna que fixa o prazo para a impugnação. Donde, a impossibilidade de reenvio prejudicial, quanto a este ponto.» (TCAS, in proc.6866/02).
[17] De realçar, por desenvolvimentos com interesse para a compreensão e tratamento destas matérias, a declaração de voto de um dos árbitros. Considera, nomeadamente, tratar-se de questão idêntica à decidida no proc. n.º 856/2019-T, em 22/9/2020, no sentido da inaplicabilidade da proibição da alínea b) do n.º 2 do art.º 5º da Diretiva 2008/7/CE às comissões cobradas pelos bancos que procedem à comercialização para subscrição das unidades de participação em fundos de investimento mobiliário pela respetiva sociedade gestora.
[18] Ainda sobre essa distinção cf. decisão do CAAD de 23/05/2022 no proc. 574/2021-T. Trata-se de situação, diversa das dos autos, de intermediação de instituição de crédito, residente, na colocação de valores mobiliários emitidos por entidades sediadas em países terceiros. A Requerente concordava que existe sujeição de comissões cobradas a imposto do selo, por aplicação da verba da 17. 3. 4 da TGIS mas defendia a interpretação restritiva desta verba, invocando o artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Diretiva da Reunião de Capitais.
A decisão julgou desnecessário qualquer reenvio prejudicial, considerando, designadamente:
«82. Mas o imposto que as sociedades emitentes pagam às instituições financeiras e que onera o valor do serviço que lhes prestam nada tem a ver com a emissão dos títulos propriamente dita, que cai no domínio do financiamento das empresas (reunião de capitais). 83. É verdade que a Diretiva diz que os Estados-membros não devem sujeitar a qualquer forma de imposto indireto a emissão de obrigações. E isso, o Estado Português não faz, pois não tributa tais emissões.84. Mas a Diretiva não diz que os Estados não devem sujeitar a impostos indiretos os serviços bancários ou financeiros. E o Estado Português sempre o fez e vai certamente continuar a fazê-lo, tributando as mais diversas prestações de serviços/comissões cobradas por instituições de crédito e sociedades financeiras. 85. Mais: a Diretiva admite expressamente na alínea e) do seu artigo 6.º que os Estados possam cobrar “Direitos com carácter remuneratório;” – o que implica que onde haja prestações pode haver tributação».