Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 131/2022-T
Data da decisão: 2022-11-10   
Valor do pedido: € 5.385.426,20
Tema: IRS – incremento patrimoniais – indemnização por danos emergentes – Artigos 9.º, n.º 1, al. b) e 101.º, n.º 1, al. a), do CIRS.
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Sumário:

As quantias pagas a título de indemnização que tenham como fim reparar danos emergentes comprovados judicialmente não são incrementos patrimoniais subsumíveis à norma de incidência prevista no artigo 9.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRS, pelo que não são objecto de tributação em sede de IRS nem estão sujeitas à retenção na fonte prevista no artigo 101.º, n.º 1, alínea a) do código do IRS.

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros Carla Castelo Trindade, Álvaro Caneira e Susana Mercês, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o presente Tribunal Arbitral Coletivo, constituído a 17.05.2022, decidem o seguinte:

 

 

  1. RELATÓRIO
  1. A…, contribuinte n.º …, residente na …,  …, … e B…, contribuinte n.º …, residente na …, …, …, vieram ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º s 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante “RJAT”), requerer a constituição do Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à declaração de ilegalidade dos atos de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (doravante “IRS”) praticados pelo Município de ... (doravante “C...”), relativamente aos valores indemnizatórios pagos a cada um dos Requerentes, nos montantes individuais de 2.692.713,10 € (dois milhões seiscentos e noventa e dois mil e setecentos e treze euros e dez cêntimos).
  2. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite a 08.03.2022 pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.
  3. Os Requerentes não exerceram o direito à designação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a), e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os ora signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do cargo no prazo aplicável.
  4. A 29.04.2022 as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.
  5. Em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído a 17.05.2022.
  6. Por despacho proferido pelo Tribunal Arbitral a 17.05.2022 foi a Requerida notificada para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional.
  7. No dia 14.06.2022, a Requerida juntou o processo administrativo.
  8. A 15.06.2022, a Requerida apresentou a sua resposta na qual suscitou a exceção da caducidade do direito de ação (intempestividade do pedido de pronúncia arbitral), bem como a exceção da litispendência (ou, caso assim não se entendesse, que fosse dada por verificada a existência de causa prejudicial, nos termos do artigo 272.º do Código de Processo Civil, doravante “CPC” –, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, determinando-se a suspensão da instância), defendeu-se por impugnação e juntou dois documentos.
  9. Por despacho proferido a 24.06.2022 pelo Tribunal Arbitral, foi concedido aos Requerentes o prazo de 10 (dez) dias para, querendo, exercerem o contraditório relativamente à matéria de exceção invocada pela Requerida na sua resposta.
  10. No dia 01.07.2022, os Requerentes apresentaram requerimento no qual se pronunciaram quanto às exceções deduzidas pela Requerida, pugnando pela improcedência das mesmas, e manifestaram a sua não oposição ao prosseguimento do processo com dispensa da produção de prova testemunhal, tendo, ainda, pedido que fosse ordenada a notificação das partes para, em prazos sucessivos de 20 (vinte) dias, apresentarem alegações finais por escrito. 
  11. A 03.10.2022 foi proferido pelo Tribunal Arbitral o seguinte despacho:

1. Compulsados os autos, verifica-se que os Requerentes entendem que já não se justifica a produção de prova testemunhal que haviam peticionado no pedido de pronúncia arbitral. Neste sentido, e na medida em que a Requerida já tinha anteriormente manifestado que não considerava necessária a produção deste tipo de prova, dispensa-se a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, simplificação e informalidade processuais previstos nos artigos 16.º, alínea c), 19.º e 29.º, n.º 2, todos do RJAT, sendo que a apreciação da matéria de exceção será efetuada no âmbito da decisão arbitral.

2. Faculta-se às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas, facultativas, por prazo simultâneo de 15 dias contados da data da notificação do presente despacho. Em idêntico prazo deverá a Requerente proceder ao depósito da taxa arbitral subsequente e à junção aos autos do respetivo comprovativo.

3. A decisão final será proferida até ao dia 17 de Novembro de 2022.

 

  1. A 25.10.2022 os Requerentes apresentaram as suas alegações finais, reiterando a argumentação anteriormente expendida e procederam ao depósito da taxa arbitral subsequente.

 

  1. A Requerida não apresentou alegações finais.

I.1. ARGUMENTOS DAS PARTES

  1. A questão decidenda consiste em determinar se as importâncias pagas pelo C... a cada um dos Requerentes a título de indemnização estão ou não sujeitas a retenção na fonte de IRS, à taxa de 16,5%, nos termos dos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (doravante “CIRS”).
  2. Os Requerentes alegam que tais importâncias não estão sujeitas a retenção na fonte de IRS à taxa de 16,5%, nos termos dos mencionados artigos, com os fundamentos que a seguir se sumariam:
  1. A retenção na fonte que incidiu sobre as quantias que o C... foi condenado a pagar aos ora Requerentes, pelos Acórdãos do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 22.09.2005, de 03.11.2005, de 24.05.2018 e de 12.07.2018, todos já transitados em julgado, viola frontalmente o disposto nos artigos 103.º e 104.º da CRP, nos artigos 4.º, 8.º 11.º e segs. e 36.º e segs. da LGT, bem como no artigo 2.º do DL 46373, de 9 de junho de 1965, no artigo 5.º do DL 442-A/88, de 30 de Novembro, nos artigos 5.º, 9.º, n.º 1, al. b), 10.º, 42.º e segs. do CIRS (cfr. artigos 8.º, 11.º e 18.º da LGT), e nos artigos 562.º e segs. do Código Civil, lesando e onerando os direitos e interesses legalmente protegidos dos ora Requerentes de forma absolutamente injusta e desproporcionada (cfr. artigos 8.º, n.º 1 e 12.º da LGT);
  2. O artigo 5.º do DL 442-A/88, de 30 de novembro, e os artigos 5.º, n.º 2, al. g) e 9.º, n.º 1, al. b) do CIRS, com o alcance normativo que lhes foi atribuído nos atos tributários sub judice, no sentido de permitirem a tributação de valores pagos em execução de decisões judiciais transitadas em julgados e que assumem natureza indemnizatória ou compensatória de danos ou perdas patrimoniais dos particulares, que foram lesados por atuações abusivas e ilícitas de entidades públicas, como se se tratasse de acréscimos patrimoniais ou rendimentos, constituem normativos inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 2.º, 9.º, 17.º, 18.º, 22.º, 62.º, 103.º, 104.º, 202.º e 205.º da CRP, sendo claramente inaplicáveis in casu (cfr. artigo 204.º da CRP);
  3.  Os citados normativos, com o sentido e alcance que lhes foi atribuído nos atos tributários sub judice, sempre violariam frontalmente os princípios da repartição justa dos rendimentos, bem como da proporcionalidade e da capacidade contributiva (cfr. artigos 13.º, 18.º, 103.º, n.º 1, 104.º e 266.º da CRP), impondo um injustificado e duplo sacrifício, pois os contribuintes suportaram prejuízos durante trinta anos, que, posteriormente, foram tributados como rendimentos, o que não tem qualquer razão, justificação ou fundamento (cfr. 103.º, 104.º e 204.º da CRP);
  4.  É manifesta a inexistência de facto tributário, causa e base legal dos atos tributários sub judice, bem como a falta de elementos essenciais ou “causa jurídica a que a constituição ou manutenção da obrigação tributária possa ser atribuída”, tendo sido frontalmente violado o disposto nos artigos 2.º, 9.º, 13.º, 17.º, 18.º, 20.º, 22.º, 62.º, 103.º, 104.º e 266.º e segs. da CRP, nos artigos 4.º, 8.º e 11.º e segs. e 36.º da LGT, bem como no artigo 2.º do DL 46373, de 9 de Junho de 1965, no artigo 5.º do DL 442‑A/88, de 30 de novembro, nos artigos 5.º, 9.º, n.º 1, al. b), do CIRS e nos artigos 562.º e segs. do Código Civil;
  5. Os atos tributários sub judice não foram precedidos de audiência e defesa dos ora Requerentes sobre as questões que foram efetivamente objeto de decisão, maxime num caso em que (i) o C... invocou ter previamente consultado apenas a AT e (ii) não se verifica nem foi invocado qualquer evento ou situação que permita a dispensa de audiência prévia dos ora Requerentes, pelo que foram frontalmente violados os artigos 2.º, 18.º, 100.º e segs. e 267.º, n.º 5 da CRP, o artigo 45.º do CPPT, o artigo 60.º da LGT e os artigos 12.º e 121.º e segs. do NCPA;
  6. Os atos tributários sub judice enfermam de manifesta falta de fundamentação de facto e de direito ou, pelo menos, esta é insuficiente, obscura e incongruente, tendo violado frontalmente, entre outros, o artigo 268.º, n.º 3 da CRP, os artigos 77.º e segs. da LGT e os artigos 152.º e segs. do NCPA;
  7. É, pois, manifesta a ilegalidade dos atos tributários sub judice por inexistência de facto tributário, violação de normas e princípios constitucionais e legais, falta de fundamentação e erros de facto e de direito.
  1. Por sua vez, a AT contra-argumentou com base nos seguintes argumentos:
  1. A indemnização a que foi condenado o Município visa, precisamente, compensar os doadores por determinado proveito económico que deixarem de fruir em resultado do incumprimento contratual pela contraparte;
  2. A indemnização decidida pelo STJ, nos Acórdãos de 22.09.2005, 25.05.2018 e 12.07.2018 enquadra-se, portanto, na reparação de lucros cessantes, pois com a lesão os requerentes deixaram de alcançar um ganho que teriam se eles próprios tivessem podido dispor dos terrenos nos mesmos termos em que o C... o veio a fazer;
  3. A indemnização por danos patrimoniais que integre lucros cessantes fica abrangida pela alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do CIRS, constituindo um incremento patrimonial tributado na categoria G do IRS;
  4. A indemnização pelo incumprimento parcial do contrato de doação visa a reparação de um lucro cessante dos doadores, motivo pelo qual, não se encontrando integrada em qualquer outra categoria de rendimentos, consubstanciará um incremento patrimonial, sendo enquadrado como rendimento de categoria G em sede de IRS;
  5. O legislador tributário expressamente sujeita a retenção na fonte, à taxa de 16,5%, o pagamento de quaisquer quantias a título de indemnização tributáveis nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do CIRS;
  6. A retenção na fonte assume, no presente caso, a natureza de pagamento por conta do imposto que for apurado a final pelo sujeito passivo, aquando da submissão da declaração de rendimentos, onde será apurada a taxa a aplicar ao conjunto de rendimentos englobáveis dos sujeitos passivos. Existe, tão somente, uma substituição tributária parcial pela entidade devedora dos rendimentos (substituto), cabendo a responsabilidade originária pelo montante eventualmente não retido ao substituto, sujeito passivo do imposto e efetivo devedor do mesmo;
  7. O que está em causa não é a tributação de uma mais-valia imobiliária, mas a tributação de uma indemnização nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do CIRS;
  8. Não assiste razão aos Requerentes, quanto à invocada falta de audiência prévia e defesa na formação de informação vinculativa, pois esta foi formulada ao abrigo do n.º 2 do artigo 28.º da LGT, a pedido do C..., na qualidade de substituto tributário, para além de que, tratando-se de atos de retenção na fonte, não tem qualquer suporte legal a audição prévia dos sujeitos passivos;
  9. Os atos de retenção na fonte são da autoria do C..., sendo certo que consta dos ofícios da C... aos Requerentes os fundamentos legais que suportam tais atos;
  10. Quanto à menção feita no PPA à decisão arbitral proferida no Proc. n.º 270/2019-T, para além de se entender que tal decisão não fez a melhor aplicação do Direito, a mesma debruçou-se sobre a retenção na fonte de 28%, a título de taxa liberatória de IRS, sobre os juros de mora pagos pelo C..., contados a partir de 29.09.2006, data em que foi fixado o valor de indemnização a pagar.
  11. Sem prejuízo do excecionado, que obsta à apreciação do mérito do presente PPA, os atos de retenção em causa não estão feridos de qualquer ilegalidade que os afaste da ordem jurídica.

 

  1. SANEAMENTO
  1. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
  2. As partes gozam de personalidade, capacidade judiciária, legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
  3. O processo não enferma de nulidades.
  4. As exceções da caducidade do direito de ação (intempestividade do pedido de pronúncia arbitral) e da litispendência suscitadas pela Requerida serão apreciadas após determinada a matéria de facto.

 

III. MATÉRIA DE FACTO

III.1. FACTOS PROVADOS

  1. Consideram-se provados os seguintes factos:
  1. A 18.11.1983 os pais dos ora Requerentes, D... e E... outorgaram com o C... escritura de doação do “prédio descrito na … Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número oito mil quatrocentos e cinco, a folhas cinquenta e sete verso do Livro B-trinta e dois, constituído por terreno para construção com a área de quarenta e cinco mil setecentos e um metros e treze decímetros quadrados, sito à …, freguesia do ..., desta cidade, a que atribuem o valor de quinhentos mil escudos, destinado a equipamento a executar pela Câmara ou a  seu mando e execução do PRAD, ou outro plano de realojamento de natureza social” (Cf. Documento n.º  7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. O terreno doado pelos pais dos ora Requerentes ao C... “foi formado pela anexação de três parcelas, a primeira com a área de 20.760 m2, desanexada do prédio descrito sob o n.º ..., fls. 49 vº. do Livro B-9, a segunda com a área de 20.241,13 m2, desanexada do prédio descrito sob o n.º ..., a fls. 49 do Livro B-9 e a terceira com a área de 4.700 m2, desanexada do prédio descrito sob o n.º ..., a fls. 48 vº. do Livro B-9” (Cf. Documento n.º 8, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  3. O prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., a fls. 49 do Livro B-9, foi adquirido a 22.12.1948 pela mãe dos ora Requerentes, D..., por sucessão testamentária da sua anterior proprietária, F…, falecida a 22.12.1948 (Cf. Documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  4. O prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..., a fls. 49 vº. do Livro B-9, foi adquirido pela mãe dos ora Requerentes, D..., por escritura pública de doação outorgada pelos seus pais a 11.06.1954 no … Cartório Notarial de ... (Cf. Documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  5. O prédio descrito na ... Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº. ..., a fls. 48 vº. do Livro B-9, foi adquirido pelos pais dos ora Requerentes, E... e D..., por escritura pública de compra e venda celebrada a 28.03.1958 no … Cartório Notarial de ... (Cf. documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  6. Por o terreno doado não ter sido “destinado a equipamento a executar pela Câmara ou a seu mando e execução do PRAD, ou outro plano de realojamento de natureza social”, os pais dos ora Requerentes propuseram a 14.05.1997, contra o C..., a ação declarativa de condenação que,  sob o n.º …/97, correu termos na 1ª Secção da ... Vara Cível de ... (Cf. Documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido), tendo peticionado a anulação ou resolução da doação realizada através da escritura pública outorgada a 18.11.1983.
  7. Por requerimento conjunto apresentado, a 03.02.2003, no referido processo judicial, as partes – pais dos ora Requerentes e C... – peticionaram a alteração do pedido e da causa de pedir, passando o pedido a ter a seguinte formulação:

    Deve      a   presente   ação    ser   julgada  provada   e   procedente                anulando-se ou, subsidiariamente, declarando-se resolvido ou incumprido definitivamente o contrato de doação (...), e, em consequência, ser o R. condenado a pagar aos AA a indemnização correspondente ao valor atual do terreno doado, a liquidar em execução de sentença” (Cf. Documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

 

 

  1. Pelo referido requerimento conjunto de 03.02.2003 as partes peticionaram ainda “o cancelamento do registo da presente ação sobre os prédios descritos na ... Conservatória do Registo Predial de ... sob os n.º s .../..., .../..., ..., …, ..., …, …, …, …, …, …, … e … todos da freguesia do ...” (Cf. Documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

 

  1. Por despacho de 04.02.2003 ali se decidiu o seguinte:

Ao abrigo no disposto no art. 272º do C. P. Civil e face ao requerimento de fls. 374 a 380, subscrito por ambas as partes, admite-se a alteração do pedido e da causa de pedir e ordena-se o cancelamento do registo da presente ação sobre os prédios descritos na ... Conservatória do Registo Predial de ... sob os números .../..., .../..., ..., …, ..., …, …, …, …, …, …, … e … todos da freguesia do ...” (Cf. Documento n.º 17 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Por sentença da 1... Vara Cível de ... de 09.07.2003 foi julgada procedente a ação declarativa de condenação intentada pelos pais dos ora Requerentes contra o C..., considerando que estes tinham doado os terrenos identificados no ponto A. para equipamento e realojamento de populações carenciadas e o C... os alienara para a construção de edifícios de luxo e de padrão médio/alto, em venda livre, condenando-se o C... a indemnizar os AA, pagando-lhes a quantia correspondente ao valor atual do terreno doado, a liquidar em execução de sentença (Cf. Documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. Pelo Acórdão do Tribunal da Relação de ... de 07.10.2004, retificado pelo Acórdão do  mesmo Tribunal de 18.11.2004, foi confirmada a aludida sentença da 1... Vara Cível de ... (Cf. Documento n.º 19 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  3. Pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.09.2005, retificado pelo Acórdão de 03.11.2005 foi decidido que “pelo incumprimento (parcial) do mesmo contrato, vai o réu condenado a pagar aos autores, a título de indemnização, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença e que corresponda à diferença entre o valor do terreno se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação e o valor que passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado” (Cf. Documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  4. Nesse Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça consta ainda que:

(…) Os autores/doadores celebraram o contrato de doação por terem confiado que ao terreno doado iria ser dado determinado destino, vindo o donatário, contudo, a dar-lhe, depois da celebração do negócio, destino diferente daquele que, por acordo de ambas as partes, ficou a constar da escritura de doação.

Ora, temos para nós que este destino do terreno, porque acordado e declarado expressamente no documento formalizador do contrato, configura uma obrigação do donatário juridicamente vinculante - ou seja, consubstancia um encargo da doação.

Constitui, assim, uma autêntica cláusula modal (artigo 963 do Código Civil), que foi  incumprida pelo donatário/recorrente. `

A consequência desse incumprimento só pode ser a do direito a uma indemnização a favor dos doadores/recorridos, nos termos do n°2 do artigo 801º do Código Civil, já que a do direito à resolução do contrato, também prevista na norma, está definitivamente precludida pelo facto de não ter ficado a constar do contrato, como exige o artigo 966º do mesmo Código” (Cf. Documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. A 22.09.2006 os pais dos ora Requerentes deduziram incidente de liquidação da indemnização fixada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.09.2005, retificado pelo  Acórdão de 03.11.2005.
  2. A sentença da 1ª Vara Cível de ... de 26.03.2010 decidiu que “a questão decidenda traduz-se na fixação do montante (liquidação) da obrigação de restituição/indemnização a cargo do R., operação que, no caso em apreço, depende exclusivamente do apuramento da diferença entre:
  • o valor do terreno identificado no n.º 1 do ponto II, se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação (equipamento a executar pela Câmara ou a seu mando e execução do PRAD ou outro plano de realojamento de natureza social)

e

  • o valor que esse terreno passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado (construção de edifício de luxo e de outros de construção e preço médio/alto)” (Cf. Documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  1. Na referida sentença da 1ª Vara Cível de ... de 26.03.2010 foi liquidado “o valor da indemnização fixada no acórdão do STJ de 22.09.2005, e, por conseguinte, a quantia a pagar pelo R. aos AA, em €119.988.557,69 (cento e dezanove milhões novecentos e oitenta e oito mil quinhentos e cinquenta e sete euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida dos juros de mora vincendos, desde a presente data e até integral pagamento, às taxas legais que vierem a vigorar” (Cf. Documento n.º 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. Pelo Acórdão da 2ª Secção do Tribunal da Relação de ... de 30.06.2011, proferido no processo que ali correu termos sob o nº. .../09.1T...., foi julgada “parcialmente procedente a apelação do Réu, anulando-se o julgamento sobre a matéria de facto e, sequencialmente a sentença recorrida, devendo o julgamento ser repetido na sua totalidade tendo em atenção os parâmetros supra  enunciados, cumprindo-se assim cabalmente o decidido pelo STJ” (Cf. Documento n.º 22 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  3. O pai dos ora Requerentes faleceu a 10.09.2015 e a mãe faleceu a 15.11.2015 (Cf. Documentos n.ºs 23 e 24 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  4. Por sentenças do Tribunal Cível da Comarca de ..., de 02.11.2005 e de 15.04.2016, proferidas no Processo n.º .../09.1T..., os ora Requerentes foram declarados habilitados por falecimento de seus Pais (Cf. Documentos n.ºs 25 e 26 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  5. A 28.12.2015 os ora Requerentes apresentaram declarações Modelo 1 de Imposto de Selo no Serviço de Finanças de ..., indicando nos respetivos Anexos I – Relação de Bens – 03 que as heranças dos seus falecidos pais eram titulares do “crédito litigioso peticionado em liquidação do acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 22.09.2005” (Cf. Documento n.º 27 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  6. Por sentença do Tribunal Cível da Comarca de ... de 16.03.2016, proferida no Processo n.º .../09.1T..., apreciando-se o mérito da causa, foi fixado o “crédito litigioso peticionado em liquidação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22.09.2005”, decidindo-se o seguinte:

Tudo ponderado e em face do exposto, julgo o presente incidente de liquidação parcialmente procedente, por parcialmente provado e, em consequência, fixo o valor da indemnização devida pelo R. aos AA. em € 54.963.344,42 (cinquenta e quatro milhões, novecentos e sessenta e três mil, trezentos e quarenta e quatro euros e quarenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos desde a notificação para o presente incidente de liquidação e até integral pagamento, às taxas legais” (Cf. Documento n.º 28 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Por Acórdão do Tribunal da Relação de ... de 06.07.2017 foi decidido “julgar improcedentes as apelações interpostas pelos autores e pelo réu, mantendo-se a sentença recorrida” (Cf. Documento n.º 29 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. Pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.05.2018, retificado pelo Acórdão do mesmo Tribunal de 12.07.2018, foi fixado o “crédito litigioso peticionado em liquidação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22.09.2005”, nos seguintes termos:

Ponderando os valores que constam da matéria de facto provada (pontos 8 e 10) temos que o valor do prédio doado era em 18.11.1983, de 794.655,58 euros (actualizado a 29.09.2006, segundo os índices do INE, é de 3.821.619,66 Euros – este será o valor do prédio se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação).

O valor do prédio com o destino que efectivamente passou a ter era, em 31.05.1999 de € 55.758.000,00, valor este que actualizado a 20.09.2006, segundo os índices do INE, é de 69.099.513,02 Euros” (Cf. Documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

X.No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.05.2018, retificado pelo Acórdão do mesmo Tribunal de 12.07.2018, decidiu-se:

Negar a revista do Recorrente/Réu Município de ...; conceder a revista pedida pelos Autores e, por isso, se revoga parcialmente o Acórdão recorrido, fixando o valor da indemnização a que os Autores têm direito, nos termos que constam do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.09.2005, devidamente actualizada a 20.09.2006, em € 65.277.893,36 Euros.

A este montante devem acrescer os devidos juros de mora, à taxa legal, contados a partir de 29.09.2006 e até efectivo e integral pagamento” (Cf. Documento n.º 30 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

Y.A 03.09.2018, declarando ter previamente obtido informação vinculativa da AT relativamente aos tributos a reter na fonte, o C... procedeu ao pagamento da quantia de  2.794.063,74 €, já líquida de retenção, referente aos valores indemnizatórios, a cada um dos ora Requerentes (Cf. Documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. O C... classificou as quantias a pagar aos ora Requerentes como incremento patrimonial, tendo procedido à retenção na fonte dos seguintes montantes, pagos a cada um daqueles (Cf. Documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido):
  1. 7.620.523,39 € - 2.133.746,55 € (relativo à retenção de 28% que incidiu sobre juros, sob invocação do artigo 71.º, n.º 1, alínea a), do CIRS) = 5.486,776,84 €;
  2. 5.486,776,84 € - 2.692.713,10 € (relativo à retenção de 16,5% que incidiu sobre a indemnização, sob invocação dos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101, n.º 1, alínea a), ambos do CIRS) = 2.794.063,74 €.

AA.Os referidos atos de retenção não foram precedidos de audição dos ora Requerentes, que também não tiveram qualquer intervenção no procedimento promovido pelo C... que levou à emissão de informação vinculativa pela AT.

BB.A 12.04.2019 os Requerentes apresentaram pedido de pronúncia arbitral relativamente à retenção de IRS na fonte de 28% sobre os juros de mora, que correu termos neste CAAD, sob o n.º 270/2019-T (Cf. Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral que originou o presente processo, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Os ora Requerentes foram notificados pelo Serviço de Finanças de que “os rendimentos de incrementos patrimoniais são inferiores aos conhecidos”, invocando a verificação de divergência relativamente às declarações Modelo 3 de IRS de 2018 e concedendo-lhes o prazo de quinze dias para justificarem e regularizarem a referida situação (cf. documento n.º 31 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

DD.A 24 e a 26.06.2019 os ora Requerentes apresentaram no Serviço de Finanças resposta aos referidos processos de divergência, na qual referiram que o valor pago pelo C... a  título de capital ou indemnização não estava sujeito a tributação, tendo requerido “a rápida regularização, por parte dos serviços, da divergência apresentada, assim como a restituição do imposto indevidamente retido” (Cf. Documento n.º 32 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Pela douta Decisão Arbitral deste CAAD de 23.01.2020, já transitada em julgado, foi julgado totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral que teve por objeto a tributação dos juros de mora (cf. documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

FF.Na fundamentação da douta Decisão Arbitral do CAAD de 23.01.2020, referiu-se:

  1. Os montantes indemnizatórios fixados nos acórdãos do STJ, de 2005.09.22, de 2005.11.03, de 2018.05.24 e de 2018.07.12, a título de capital e juros, assumiram natureza compensatória e constituíram um valor de substituição, fixado de acordo com a teoria da diferença. Os referidos montantes visaram o ressarcimento do dano patrimonial suportado pelos Requerentes, em consequência do incumprimento de obrigações contratuais, imputáveis ao Município de E.…, tendo em vista a reconstituição da situação hipotética actual dos proprietários dos terrenos doados. Tratam-se, em rigor, de danos emergentes que foram devidamente comprovados através da decisão judicial de liquidação da indemnização” (Cf. fls. 24 do Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. (...) as quantias auferidas a título de indemnização por danos emergentes comprovados destinam-se a repor um decréscimo do património, não havendo qualquer acréscimo, mas apenas a reposição da situação patrimonial inicial, pelo que não há lugar a tributação se os danos emergentes estiverem devidamente comprovados, como sucede in casu” Cf. fls. 25 do Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

c)“A esta luz, o pagamento de uma indemnização por danos emergentes comprovados e, bem assim, os respectivos juros de mora, não devem ser - nem são - tributados em sede de IRS” (Cf. fls. 29 do Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

d)“O Município E.… não podia proceder à retenção na fonte em sede de IRS das quantias sub judice, nomeadamente para efeitos do disposto no artigo 71.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, uma vez que não havia facto tributário. Isto porque os juros de mora sub judice não estavam sujeitos a qualquer norma de incidência real prevista no CIRS porquanto a indemnização principal conferida aos Requerentes também não estava” (Cf. fls. 29 do Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

GG.A 20.02.2020, a AT informou os ora Requerentes que, após “análise efectuada aos documentos/alegações apresentados relativamente à notificação da(s) divergência(s) identificada(s) na declaração de rendimentos Modelo 3 do ano de 2018 (…), encontram(-se) devidamente esclarecidas as questões submetidas a apreciação, pelo que se procederá de imediato ao encerramento do processo e  consequente desbloqueio da sua declaração de IRS” (Cf. Documento n.º 33 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Das demonstrações de liquidação de IRS, relativas ao ano de 2018, não constam as quantias pagas pelo C... aos ora Requerentes, inexistindo, igualmente, qualquer referência às importâncias de 2.692.713,10 € que foram retidas na fonte a cada um deles (Cf. Documento n.º 34 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. Entre 02.04.2020 e 08.04.2020, a AT procedeu aos seguintes pagamentos e restituições a cada um dos ora Requerentes (Cf. Documento n.º 35 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido):
  1. 2.133.746,55 € relativos à retenção de 28% ilegalmente aplicada aos juros pagos pelo C... a 03.09.2018;
  2. 99.379,98 € relativos a parte dos juros indemnizatórios devidos nos termos do aludido Acórdão do CAAD de 23.01.2020.

JJ.Por ofício da AT de 22.06.2020 os ora Requerentes foram   notificados de que os “reembolsos efectuados estão em conformidade com o requerido e decidido pelo Tribunal Arbitral” (Cf. Documento n.º 35 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

KK.Por requerimentos apresentados a 24.06.2019, a 26.06.2019, a 03.06.2020, a 20.08.2020, a 14.12.2020, e a 09.02.2021 (Cf. Documentos n.ºs 32, 36, 37 e 38 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido) os ora Requerentes insurgiram-se junto da AT contra a retenção efetuada a 03.09.2018 sobre o valor pago a título de indemnização ou capital – 2.692.713,10€ – e pediram a respetiva devolução.

  1. A 23.06.2021 os Requerentes deduziram reclamação graciosa no Serviço de Finanças de ..., contra os atos de retenção na fonte aqui sindicados, na qual pugnaram pela restituição/pagamento da quantia de 2.692.713,10€, acrescida de juros devidamente atualizados até à data em que tal pagamento se vier a realizar (Cf. documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  2. A 23.09.2021 os ora Requerentes foram notificados pela AT para juntarem às reclamações apresentadas a 23.06.2021 os documentos nelas indicados (Cf. Documento n.º 39 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  3. A 29.09.2021 os ora Requerentes procederam à junção dos documentos solicitados pela AT a 23.09.2021 (Cf. Documento n.º 40 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  4. Por ofícios da AT de 27.10.2021 os ora Requerentes foram notificados para se pronunciarem em  sede de audiência prévia no âmbito do procedimento de reclamação iniciado a 23.06.2021 (Cf. Documento n.º 41 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  5. A 11.11.2021 os ora Requerentes apresentaram junto da AT requerimento de resposta em sede de audição prévia (Cf. Documento n.º 42 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).
  6. Por ofícios da AT datados de 09.12.2021 os ora Requerentes foram notificados do despacho de 02.12.2021 do Senhor Diretor Adjunto da Direção de Finanças de ..., que rejeitou as reclamações apresentadas a 23.06.2021 (Cf. Documentos n.ºs 4 e 5 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá por reproduzido).

 

III.2. FACTOS NÃO PROVADOS

  1. Os factos dados como provados são os relevantes no entendimento do Tribunal, não se considerando factualidade que tenha interesse para a decisão como não provada.

 

III.3. FUNDAMENTAÇÃO DA FIXAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

  1. Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão, discriminar a matéria que julga provada e declarar, se for o caso, a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre dos termos conjugados do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (doravante “CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
  2. Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram assim selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é definida tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, tal como resulta do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
  3. Tendo em conta as posições assumidas pelas partes, o disposto nos artigos 110.º, n.º 7, e 115.º, n.º 1, ambos do CPPT, a prova documental e o processo administrativo juntos aos autos, estão assentes, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

IV. DA CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO (INTEMPESTIVIDADE DO PEDIDO DE PRONÚNCIA ARBITRAL)

  1. Começa a Requerida por suscitar a este Tribunal Arbitral, previamente a tudo o mais, a questão da tempestividade da presente lide.
  2. Defende a Autoridade Tributária que o presente pedido de pronúncia arbitral é intempestivo, com os fundamentos que a seguir se sumariam:
  1. A reclamação graciosa apresentada contra os mencionados atos de retenção na fonte é manifestamente intempestiva e, por consequência, é intempestiva a apresentação do presente PPA;
  2. Do disposto no n.º 3 do artigo 140.º do CIRS e nos n.ºs 3 e 4 do artigo 132.º do CPPT (aplicável ex vi do artigo 140.º, n.º 1, do CIRS) resulta que o prazo para apresentação de reclamação graciosa contra os aludidos atos de retenção na fonte é de dois anos contados a partir do dia 20 de Janeiro do ano seguinte àquele a que a retenção disser respeito;
  3. No caso concreto, e como demonstrado nos autos, o pagamento da indemnização e a consequente retenção na fonte ocorreu a 03.09.2018, iniciando-se, portanto, o prazo de dois anos a partir de 20.01.2019, o que significa que a interposição tempestiva da reclamação graciosa teria de ser efetuada até ao dia 20.01.2021;
  4. Sucede que a interposição da reclamação graciosa ocorreu a 23.06.2021, tendo, portanto, a esta data, há muito terminado o prazo para a sua atempada apresentação;
  5. Não assiste razão aos Requerente quando sustentam que o termo do referido prazo de dois anos só se consumaria a 29.06.2021, por força das suspensões sucessivamente determinadas pelos artigos 10.º da Lei 1-A/2020, de 19/03, 37.º do DL 10-A/2020, de 13/03, 5.º e 6.º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 06/04, bem como pelos artigos 6.º-B, n.º 3 e 4 e 6.º-C, n.ºs 3 e 4, da Lei 1-A/2020, de 19/03, na redação da Lei 4-B/2021, de 01/02;
  6. O regime legal de suspensão de prazos previsto no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 iniciou-se a 09.03.2020, tendo o legislador, no que concerne ao procedimento tributário, restringido a aplicação de suspensão de prazos apenas aos atos praticados por contribuintes, designadamente apresentação de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico ou outros procedimentos de âmbito tributário de natureza impugnatória, como por exemplo, revisão oficiosa, revisão de matéria tributável, entre outros, assim como atos posteriores que surjam no decurso da tramitação do procedimento;
  7. Efetivamente, o regime dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março tinha como finalidade evitar a verificação de prescrições e de caducidades intrinsecamente relacionadas com o contexto de pandemia e com o regime transitório, daí o legislador ter apenas prevenido a suspensão dos atos (iniciais e subsequentes) que devam ser praticados pelos contribuintes no âmbito de procedimentos impugnatórios;
  8. O mencionado artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020 veio a ser revogado pela Lei n.º 16/2020, de 29/05 (cfr. artigo 7.º, n.º 2), que entrou em vigor a 03.06.2020, fazendo cessar o regime de suspensão de prazos para a prática de atos processuais e procedimentais;
  9.  Assim, nos termos do artigo 5.º, da Lei n.º 16/2020, de 29/05: “os prazos administrativos que, caso não houvesse suspensão, terminariam dentro do período de suspensão – entre 09.03.2020 e 03.06.2020 – e os que terminariam depois desta última data, mas antes do vigésimo dia útil posterior a 03.06.2020, terminam no vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da Lei n.º 16/2020, ou seja, em 02.07.2020. Por seu turno, os prazos administrativos que, caso não houvesse suspensão, terminariam após 02.07.2020, terminam na data em que se venceriam originalmente”;
  10. No caso em apreço, ocorrendo o termo original do prazo para apresentar a reclamação graciosa no dia 20.01.2021 não lhe é aplicável, no âmbito das medidas excecionais e temporárias no âmbito da pandemia da doença COVID-19, o regime de suspensão previsto no artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, alterado pela Lei n.º 4-A/2020 e revogado pela Lei n.º 16/2020;
  11. Por seu turno, e ainda no âmbito das medidas adotadas no âmbito da pandemia da doença COVID-19, foi publicada a Lei n.º 4-B/2021, de 01/02, que veio aditar à Lei n.º 1-A/2020 o artigo 6.º-C, preceito legal que determina a suspensão dos prazos para a prática de atos por particulares nos procedimentos administrativos e tributários, nos precisos termos do regime de suspensão dos prazos ocorrida no ano de 2020 (ao abrigo do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, na versão original e com a redação introduzida pela Lei 4-A/2020);
  12. O artigo 4.º da Lei n.º 4-B/2021 veio consagrar que “o disposto nos artigos 6.º-B a 6.º‑D da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, produz efeitos a 22 de janeiro de 2021, (...)”, pelo que tal regime de suspensão também não é aplicável ao caso concreto, pois o prazo original para apresentação da reclamação graciosa terminou a 20.01.2021.
  13. Face ao exposto, sendo intempestiva a apresentação da reclamação graciosa interposta contra os atos de retenção na fonte sindicados nos presentes autos, é intempestivo o PPA em apreço.
  14. A intempestividade, traduzida na caducidade do direito de pedir a pronúncia arbitral constitui uma exceção peremptória que, nos termos dos artigos 576.º, n.º 3 e 579.º, ambos do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, tem como consequência a absolvição da AT do pedido.
  1. Antes de mais é relevante recordar os factos essenciais para solucionar a questão prévia suscitada sob a forma de exceção de caducidade do direito de ação (intempestividade do pedido de pronúncia arbitral), designadamente os seguintes:
  1. A 03.09.2018, declarando ter previamente obtido informação vinculativa da AT relativamente aos tributos a reter na fonte, o C... procedeu ao pagamento da quantia de 2.794.063,74 €, já líquida de retenção, referente aos valores indemnizatórios, a cada um dos ora Requerentes (Cf. Ponto Y da factualidade assente).
  2. O C... classificou as quantias a pagar aos ora Requerentes como incremento patrimonial, tendo procedido à retenção na fonte dos seguintes montantes, pagos a cada um daqueles (Cf. Ponto Z da factualidade assente):

7.620.523,39 € - 2.133.746,55 € (relativos à retenção que incidiu sobre juros, sob invocação do artigo 71.º, n.º 1, alínea a), do CIRS) = 5.486.776,84 €;

5.488.776,84 € - 2.692.713,10 € (relativos à retenção que incidiu sobre a indemnização, sob a invocação dos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101.º, n.º 1, alínea b), ambos do CIRS) = 2.794.063,74 €.

  1. A 23.06.2021 os Requerentes deduziram reclamação graciosa no Serviço de Finanças de ..., contra os atos de retenção na fonte aqui sindicados, na qual pugnaram pela restituição/pagamento da quantia de 2.692.713,10€, acrescida de juros devidamente atualizados até à data em que tal pagamento se vier a realizar (Cf. Ponto LL da factualidade assente).
  2. Por ofícios da AT datados de 09.12.2021 os Requerentes foram notificados do despacho de 02.12.2021 do Senhor Diretor Adjunto da Direção de Finanças de ..., que rejeitou as reclamações apresentadas a 23.06.2021 (Cf. Ponto PP da factualidade assente)

Ora,

  1. Decorre do disposto no n.º 3 do artigo 140.º do CIRS, conjugado com o número 3 do artigo 132.º, do CPPT, que o prazo para apresentação da reclamação graciosa contra os atos de retenção aqui sindicados é de dois anos contados a partir do dia 20 de janeiro do ano seguinte àquele a que a retenção disser respeito.
  2. No caso em apreço, e conforme resulta da factualidade dada como provada, os atos de retenção na fonte foram emitidos pelo C... em 03.09.2018, o que, a priori, significaria que o prazo de dois anos para apresentação da reclamação graciosa se iniciaria a partir de 20.01.2019 e terminaria a 20.01.2021 (tendo aquela sido deduzida pelos Requerentes apenas a 23.06.2021). 
  3. Contudo, em virtude da pandemia que assolou o país (e o mundo) e da sua anormalidade e imprevisibilidade, o legislador decidiu criar medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e doença COVID-19, sendo uma delas a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimento, designadamente, e para o aqui interessa, dos prazos tributários que corressem a favor de particulares onde se incluía o prazo para interposição de reclamação.
  4. É nesta questão que reside o dissídio entre as partes, na medida em que para os Requerentes o termo do prazo para apresentação das reclamações graciosas só teria acabado a 29.06.2021, por força das suspensões sucessivamente determinadas pelos artigos 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, 5.º e 6º, n.º 2, da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, bem como pelos artigos 6.º-B e 6.º-C, da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação da Lei n.º 4‑B/2021, de 1 de fevereiro, enquanto que para a Requerida tais suspensões não são aplicáveis ao caso dos autos, pelas razões já explanadas.

Vejamos:

  1. O artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que estabeleceu o regime da suspensão dos prazos e entrou em vigor em 09.03.2020, estatuía o seguinte:

3 - A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.

 

(...)

 

6 – O disposto no presente artigo aplica-se ainda, com as necessárias adaptações, a:

(...)

  1. Prazos administrativos e tributários que corram a favor de particulares.

7 – Os prazos tributários a que se refere a alínea c), do número anterior dizem respeito apenas aos atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos prazos para a prática de atos no âmbito dos mesmos procedimentos tributários.

  1. A referida Lei foi alterada pela Lei n.º 4-A/2020, de 06 de abril, que, no entanto, manteve no essencial o dito regime previsto no seu artigo 7.º:

3 - A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.

 

9- O disposto nos números anteriores aplica-se, com as necessárias adaptações, aos prazos para a prática de atos em:

(...)

c) Procedimentos administrativos e tributários no que respeita a atos por particulares.

10- A suspensão dos prazos em procedimentos tributários, referida na alínea c), do número anterior, abrange apenas os atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como os atos processuais ou procedimentais subsequentes àqueles.

  1. Sucede que a Lei n.º 16/2020, de 19 de maio, que entrou em vigor a 03.06.2020, revogou tal regime, designadamente, o artigo 7.º, da Lei n.º 1-A/2020, e estabeleceu, respetivamente, nos seus artigos 5.º e 6.º, o seguinte:

Artigo 5.º

Prazos administrativos

1- Os prazos administrativos cujo termo original ocorreria durante a vigência do regime de suspensão estabelecido pelo artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua redação original e na redação dada pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, consideram-se vencidos no vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da presente lei.

2- Os prazos administrativos cujo termo original ocorreria após a entrada em vigor da presente lei, caso a suspensão referida no número anterior não tivesse tido lugar, consideram-se vencidos:

  1. No vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da presente lei caso se vencessem até esta data;
  2. Na data em que se venceriam originalmente caso se vencessem em data posterior ao vigésimo dia útil posterior à entrada em vigor da presente lei.”    

Artigo 6.º

Prazos de prescrição e caducidade

Sem prejuízo do disposto no n.º 5, os prazos de prescrição e caducidade que deixam de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a suspensão.

  1. Aqui chegados, resulta claro que da conjugação dos artigos 5.º e 6.º da Lei n.º 16/2020, de 19 de maio (que entrou em vigor a 03.06.2020 e fez cessar o regime de suspensão dos prazos) é possível extrair que o primeiro quis unicamente abranger os prazos administrativos, estabelecendo um regime específico para os mesmos (fixou as datas de vencimento dos prazos administrativos que estiverem suspensos) e o segundo pretendeu integrar os demais (prazos) de caducidade e prescrição (determinando o seu alargamento por igual período de tempo ao que vigorou durante a suspensão).
  2. Não obstante, entende a Requerida que o prazo para deduzir reclamação graciosa constitui um prazo administrativo, abrangido pelo aludido artigo 5.º e não pela norma vertida no artigo 6.º da mencionada lei.
  3. Crê o Tribunal Arbitral que a posição sufragada pela AT assenta numa errada interpretação de toda a legislação aqui mencionada e da própria natureza do prazo aqui em apreço, pois não só confunde prazos tributários (ou prazos relacionados com procedimentos tributários) com prazos administrativos (ou prazos relacionados com procedimentos administrativos), considerando que se trata de uma mesma realidade, quando, na verdade, é a própria lei que, de forma clara, os distingue e os especifica, como também desconsidera a efetiva natureza/finalidade do prazo em questão. [sublinhado nosso]. 
  4. Ora, adiante-se, desde já, que tal prazo delimita o exercício do direito de “ação graciosa” dos contribuintes, ou seja, é um prazo de caducidade para a prática de um ato no procedimento tributário, que se encontra tutelado no regime excecional da COVID 19, pelo artigo 7.º, n.º 3 e n.º 9, alínea c), da Lei n.º 4-A/2020, de 06 de Abril e que, por conseguinte, está abrangido pelo artigo 6.º, da Lei n.º 16/2020, de 19 de maio, que determinou o alargamento dos prazos de prescrição e caducidade por igual período de tempo ao que vigorou durante a suspensão e não pelo artigo 5.º, do citado diploma.
  5. Não obstante, o Tribunal Arbitral considere que o essencial para a decisão da presente questão assenta na efetiva natureza do prazo em discussão, sufragamos, também, a ponderação do elemento literal feita pelos Requerentes. 
  6. Pois, se retrocedermos e analisarmos o artigo 7.º, da Lei n.º 1-A/20202, de 19 de março, quer na sua redação inicial, quer na redação alterada pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, concluímos que o legislador diferencia expressamente os referidos conceitos – “Prazos administrativos e tributários que corram a favor de particulares”, na redação inicial (artigo 7.º, n.º 6, c)); “Procedimentos administrativos e tributários no que respeita à pratica de atos por particulares”, redação alterada (artigo 7.º, n.º 9, c)) [negrito nosso]. 
  7. Aliás, a aludida lei, no seu artigo 7.º, teve a atenção especial de especificar a que atos diziam respeito a suspensão dos prazos tributários (redação inicial) e a suspensão dos prazos em procedimentos tributários (redação alterada):

Os prazos tributários a que se refere a alínea c) do número anterior dizem respeito apenas aos atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos prazos para a prática de atos no âmbito dos mesmos procedimentos tributários” (redação inicial do artigo 7.º, n.º 7); A suspensão dos prazos em procedimentos tributários, referida na alínea c) do número anterior, abrange apenas os atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como os atos processuais ou procedimentais subsequentes àqueles.” (redação alterada do artigo 7.º, n.º 10) [negrito nosso].

  1. A presente interpretação é a que se afigura, mais correta, pois, “a letra da lei assume se, naturalmente, como o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe, desde logo, uma função negativa, qual seja, não poder ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. Também como refere Oliveira Ascensão, a letra não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito.” (Cf. Decisão Arbitral proferida no processo n.º 741/2021-T).
  2. Dito isto, anuímos à posição dos Requerentes de que: “A referida distinção – prazos e procedimentos administrativos e tributários – não é meramente formal ou semântica, identificando duas realidades que são material e substancialmente diferentes ou distintas:
  1. Os prazos administrativos, aplicáveis e convocáveis no domínio de procedimentos administrativos, são regulados pelo artigo 87.º do NCPA, que estabelece diversas regras específicas, suspendendo-se aos sábados, domingos, feriados, não sendo esta norma aplicável a procedimentos tributários de reclamação, recurso ou revisão (...);
  2. Os prazos tributários, aplicáveis e convocáveis no domínio de procedimentos tributários, atualmente regulados pelo artigo 57.º, n.º 3 da LGT e pelo artigo 20.º, n.º 1 do CPPT, estão sujeitos a um regime legal completamente diferente, contando-se sempre de modo continuo e nos termos do artigo 279.º, do Código Civil, transferindo‑se o seu termo, quando os prazos terminarem em dia em que os serviços ou os tribunais estiverem encerrados, para o primeiro dia útil seguinte (...).
  1. Aqui chegados, entendemos que o prazo em apreço sempre estaria compreendido no artigo 6.º da Lei 16/2020, de 19 de maio, que revogou o regime da suspensão dos prazos.
  2. Não só porque é um prazo de caducidade diretamente abrangido pelo teor literal da norma, mas também porque no início da norma (artigo 6.º da Lei 16/2020, de 19 de maio) se determina que a sua aplicação se faz “sem prejuízo do disposto no artigo anterior”.
  3. Ora, do artigo 5.º da mencionada lei apenas resulta que o prazo que esteve suspenso se vence na data em que venceria inicialmente, o que terá necessariamente de ser conjugado com o alargamento determinado pelo artigo 6.º quanto a todos os prazos de caducidade independentemente do concreto dia em que se venceram, sob pena de se inviabilizar/limitar a aplicabilidade prática deste preceito normativo e de se introduzir uma regra desigual e injustificada para os prazos de caducidade do procedimento e do processo que estiveram igualmente suspensos e relativamente aos quais se determinou sem distinções o alargamento do prazo por igual período ao da suspensão de forma a assegurar aos contribuintes o direito à tutela efetiva constitucionalmente garantida (artigo 20.º, da CRP).
  4. Face ao exposto, consideramos que o prazo de caducidade para apresentação das reclamações graciosas (dois anos a partir de 20.01.2019 – ou seja, 20.01.2021) foi alargado pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão – 09.03.2020 a 03.06.2020 (oitenta e seis dias), nos termos do artigo 6.º da Lei 16/2020, de 19 de maio, não sendo aplicável, ao contrário do que entende a Requerida, o artigo 5.º do sobredito diploma.
  5. Sucede ainda que no decurso dos oitenta e seis dias – de 21.01.2021 até 16.04.2021, correspondentes ao período pelo qual foi alargado o prazo de caducidade para apresentação das reclamações graciosas, o regime legal da suspensão dos prazos foi reeditado nos seus precisos termos, aquando do segundo surto, tendo sido publicada a Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, que entrou em vigor a 22.01.2021 e veio aditar à Lei n.º 1-A/2020 o artigo 6.º-C, com a epígrafe “Prazos para a prática de atos procedimentais”, que reza:

1- São suspensos os prazos para a prática de atos em:

(...)

  1. Procedimentos administrativos e tributários no que respeita à prática de atos por particulares.

2- A suspensão dos prazos em procedimento tributários, referidos na alínea c) do número anterior, abrange apenas os atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como os atos processuais ou procedimentais subsequentes àqueles.

  1. Tal como já havia sucedido em 2020, este regime foi revogado pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, que entrou em vigor a 06.04.2021, e estabeleceu, no seu artigo 4.º, um regime específico para os prazos administrativos e, no seu artigo 5.º, o regime a aplicar aos demais (prazos) de prescrição e caducidade, ambos com teor idêntico aos anteriores artigos 5.º e 6.º, da Lei n.º 16/2020, de 19 de maio, respetivamente.
  2. Assim, aplicando o raciocínio já explicitado supra, concluímos que o prazo de dois anos contado desde 20.01.2019 foi objeto de duas suspensões, num total de cento e sessenta dias (1ª suspensão – de 09.03.2020 a 03.06.2020 – oitenta e seis dias; 2ª suspensão – de 22.01.2021 a 06.04.2021 – setenta e quatro dias), pelo que o prazo para apresentação das reclamações graciosas só terminaria a 29.06.2021 (id est, cento e sessenta dias contados de 20.01.2021).
  3. Face a todo o exposto, tendo os Requerentes deduzido as reclamações graciosas a 23.06.2021, é manifesto que as mesmas são tempestivas e, consequentemente, o pedido de pronúncia arbitral também o é.

 

Improcede, portanto, a exceção de caducidade do direito de ação suscitada pela Requerida.

 

V. DA LITISPENDÊNCIA

  1. A Requerida, na sua resposta, alega que existe uma total similitude entre o presente processo arbitral e o processo que, sob o n.º …/21.1…, está a correr termos pelo Tribunal ... de ..., consubstanciado numa ação de intimação para um comportamento, no qual, segundo a Requerida, os Requerentes submetem à apreciação judicial a mesma questão que está em causa nestes autos.

 

  1. Alega a Requerida que “Tanto no presente PPA como no Proc.º …/21.1 do … de ..., a causa de pedir é idêntica, enquanto facto jurídico donde emerge o direito que os Rs./As. invocam e pretendem fazer valer. Igualmente, existe uma identidade de pedido porquanto, tanto nos presentes autos, como na ação de intimação, se pretende obter o mesmo efeito jurídico, assente numa mesma fundamentação de facto e de direito.

 

  1. Visto que o presente processo arbitral foi instaurado em segundo lugar, a Requerida termina invocando a exceção dilatória da litispendência entre este processo e aquele processo judicial, peticionando a sua absolvição da instância.

 

Cumpre apreciar e decidir.

  1. O artigo 580.º do CPC diz que a exceção da litispendência pressupõe a repetição de uma causa, estando a anterior ainda em curso (n.º 1), isto tendo por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (n.º 2).

 

  1. Os requisitos da litispendência são enunciados no artigo 581.º do CPC, no qual se esclarece que se repete uma causa “quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir” (n.º 1), havendo “identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica” (n.º 2), verificando-se “identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico” (n.º 3) e ocorrendo “identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas ações procede do mesmo facto jurídico” (n.º 4).

 

  1. Significa que a litispendência só ocorrerá se, cumulativamente, nas ações em apreciação intervierem as mesmas partes, sob a mesma qualidade jurídica, pretendendo obter o mesmo efeito jurídico e esse efeito jurídico tiver por causa o mesmo facto jurídico.

 

  1. Importa, pois, verificar se, in casu, ocorre ou não esta tríplice identidade exigida pelo n.º 1 do artigo 581.º do CPC entre o presente processo arbitral e o dito processo judicial.

 

  1. Ora, adiante-se, desde logo, que não assiste razão à Requerida, pela evidência de não haver identidade nem nos pedidos nem nas causas de pedir.
  2. Na ação de intimação para comportamento peticiona-se que a AT seja intimada “a suprir a omissão verificada no cumprimento dos deveres que lhe são impostos pelos citados artigos 96.º e 97.º do CIRS, (...), praticando os seguintes atos e operações materiais no prazo máximo de trinta dias : a) processar e restituir a cada um dos ora requerentes as quantias que lhes foram retidas (...); b) processar e pagar a cada um dos requerentes os juros vencidos e vincendos, que na presente data já ascendem a €64.625,10 (...).”, ou seja, tal ação tem como objeto a omissão de uma ação legalmente imposta/vinculada por parte da Requerida.
  3. Já na presente ação pede-se a declaração, a final, de nulidade ou a anulação dos atos tributários impugnados (os aludidos atos de retenção na fonte de IRS praticados pelo C... em 03.09.2018), com base nas suas alegadas ilegalidades.
  4. Ou seja, o efeito jurídico que é possível obter através da ação instaurada no Tribunal ... de ... – a intimação da AT para um comportamento (restituição das quantias retidas aos ali autores, acrescidas de juros) – e o visado pela dedução de impugnação judicial/pedido de pronúncia arbitral – a nulidade ou anulação dos atos tributários impugnados – são inconfundíveis, tendo, aliás, por objeto, atos diversos.
  5. Acresce que, no primeiro caso, a causa de pedir é a alegada omissão do cumprimento do dever, imputável à AT, de proceder à restituição oficiosa do imposto retido, em excesso, que se verificou, no entender dos Requerentes, em 2019, após a emissão das liquidações de IRS relativas ao ano de 2018, com base no incumprimento das normas contidas nos artigos 96.º, 97.º e 102.º-B, n.º 2, todos do CIRS.
  6. No segundo caso, a causa de pedir tem por objeto um ato tributário alegadamente ilegal (de retenção na fonte de IRS, praticado a 03.09.2018 pelo C...), com fundamento em normas jurídicas totalmente distintas (designadamente, as previstas nos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101.º, n.º 1, alínea a), ambos do CIRS).    
  7. Em suma, estamos perante fundamentos diversos, suportados em distintas normas jurídicas, diferenças do elemento temporal (ação de intimação para comportamento – verificou-se o alegado imposto retido em excesso em 2019; ação arbitral – verificou-se a retenção na fonte de IRS, alegadamente ilegal, a 03.09.2018) e processos de natureza diversa (ação de intimação para comportamento – prevista e regulada nos artigos 97.º, n.º 1, alínea m) e 147.º, ambos do CPPT e 101.º, n.º 1, alínea h), da LGT; ação arbitral – prevista e regulada nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.ºs 1 e 2, do RJAT e 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março), não pretendendo os Requerentes o mesmo efeito jurídico em ambas as ações, nem as suas pretensões nelas deduzidas procedem do mesmo facto jurídico, pelas razões já explanadas [negrito nosso].
  8. Por sua vez, e apesar de as partes serem as mesmas, elas não intervêm nas causas em confronto com idêntica qualidade jurídica, porquanto na presente ação arbitral os Requerentes intervêm como sujeitos passivos (são sujeitos passivos da relação tributária as pessoas singulares ou coletivas, os patrimónios e as organizações de facto ou de direito que estão vinculados ao cumprimento de prestações tributárias, seja como contribuintes diretos, substitutos ou responsáveis – cf. artigo 18.º, n.º 3, da LGT – ) do tributo impugnado, e na ação de intimação para um comportamento os Requerentes intervêm como titulares de um direito originado em alegada omissão da AT do dever de uma prestação jurídica, omissão suscetível de lesar direitos ou interesses legítimos em matéria tributária [negrito nosso].
  9. Diga-se ainda que numa situação como a dos autos não ocorre risco de contradição ou repetição de decisões, pois a decisão a proferir pelo Tribunal ... de ... deixará intocáveis os atos tributários aqui em crise e a decisão arbitral a proferir nesta sede própria para se apreciar a (i)legalidade de tais atos (de retenção na fonte de IRS) e a sua eventual nulidade ou anulação vedará a sua apreciação em outra ação.
  10. Em bom rigor, os atos de retenção na fonte de IRS praticados encontram-se consolidados na ordem jurídica e assim se irão manter até que seja declarada (se for caso disso) a sua anulação, na presente lide, não prejudicando tal iter a referência reiterada que fazem os Requerentes ao Acórdão do CAAD de 23.01.2020 proferido no Processo n.º 270/2019-T, pois este apenas decidiu sobre a retenção na fonte de 28% a título de taxa liberatória de IRS, quanto aos juros de mora pagos pelo C... (em cumprimento do princípio do pedido) e, não, sobre as importâncias por este pagas a título de indemnização (capital) – objeto da presente ação.
  11. Além disso, no processo de intimação para um comportamento não há propriamente uma fase declarativa, onde se afira se assiste ou não direito à concreta prestação – in casu, restituição do imposto retido alegadamente em excesso – a que se pretende que a AT seja intimada, isto é, tal processo tem como pressuposto intrínseco que haja uma prévia definição da existência desse dever por parte da AT, sendo que os atos de retenção aqui em crise se encontram em vigor na ordem jurídica.
  12. A ser proferida decisão no presente processo que declare a ilegalidade dos atos tributários aqui sindicados e condene a Requerida à restituição do valor retido, a possibilidade de os Requerentes obterem a execução (e reagirem judicialmente contra a eventual inércia da AT) é, salvo melhor opinião, através do meio processual de execução de julgados (cfr. artigos 102.º, n.º 1, da LGT, 146.º, n.º 1 do CPPT e 173.º e seguintes do CPTA), por ser o meio processual adequado nos casos em que há uma decisão judicial, e não mediante a ação de intimação para um comportamento.

 

Face ao exposto, improcede, portanto, a exceção de litispendência suscitada pela Requerida.

 

***

 

V.1. DA QUESTÃO PREJUDICIAL

  1. Alega, ainda, a Requerida, em sede subsidiária, que a não ser aceite a exceção de litispendência, sempre existirá uma relação de prejudicialidade entre o pedido de pronúncia arbitral e a citada ação de intimação para comportamento, que justificaria a suspensão da instância neste processo arbitral.

 

  1. Determina o artigo 272.º do CPC que “o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado”.

 

  1. Na verdade, além de a suspensão ser uma faculdade do tribunal que, no caso em apreço, não vê fundamento para tal decisão, também não foram invocadas quaisquer razões que levem a concluir que a apreciação e a decisão do presente pedido arbitral esteja dependente do julgamento que venha a ser feito na ação de intimação para comportamento, a correr termos no Tribunal ... de ....

 

  1. A decisão a proferir pelo Tribunal ... de ... em nada pode afetar e/ou prejudicar o julgamento da presente lide, menos ainda lhe retira o fundamento (que é distinto do deduzido na outra ação) ou a sua razão de ser (que é diversa da invocada na outra ação), pois aquela deixará intocável os atos tribuários aqui em crise, e isto por ser unicamente, na presente ação que se poderá discutir e decidir a (i)legalidade daqueles e a sua eventual anulação.

 

  1. Ou seja, o efeito da sentença a ser proferida pelo Tribunal ... de ..., seja qual for ou venha a ser o seu conteúdo em nada interfere ou influencia a anulação ou não anulação dos atos tributários aqui sindicados, porquanto a decisão a elaborar neste pleito é que irá determinar se tais atos se mantêm ou não na ordem jurídica e se, efetivamente, foi ou não retido imposto que não deveria ter sido.

 

  1. Quanto muito, seria a presente ação que afetaria ou influenciaria a decisão a proferir na ação de intimação para comportamento, pois só com a eliminação dos aludidos atos da ordem jurídica é que poderá a AT ser obrigada a restituir (seja de modo voluntário ou coercivo) o imposto indevidamente retido, o que, salvo melhor opinião, deverá ser feito (se for caso disso) através do meio processual adequado – execução de julgados – (cfr. artigos 102.º, n.º 1, da LGT, 146.º, n.º 1, do CPPT e 173.º e seguintes do CPTA) e não através da ação de intimação para comportamento.

 

Face ao exposto, indefere-se o pedido de suspensão da instância formulado pela AT.

***

VI. MATÉRIA DE DIREITO

  1. A questão decidenda consiste em determinar se as quantias de 2.692.713,10 € (dois milhões seiscentos e noventa e dois mil e setecentos e treze euros e dez cêntimos) pagas pelo C... a cada um dos Requerentes a título de indemnização estão sujeita a retenção na fonte de IRS, à taxa de 16,5%, nos termos do disposto nos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101.º, n.º 1, alínea a), ambos do CIRS.

Cumpre decidir.

  1. Os atos tributários aqui sindicados operaram, ao abrigo dos citados artigos, a retenção na fonte de IRS, à taxa de 16,5%, dos montantes de 2.692.713,10 € (dois milhões seiscentos e noventa e dois mil e setecentos e treze euros e dez cêntimos) pagos a cada um dos Requerentes a título de indemnização em execução dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 22.09.2005, 03.11.2005, 24.05.2018 e 12.07.2018.
  2. No Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça a 22.09.2005, retificado pelo Acórdão do mesmo tribunal de 03.11.2005, após se concluir que o C... incumpriu o contrato de doação celebrado a 18.11.1983 por ter dado aos terrenos em apreço destino diferente daquele que havia declarado na referida escritura, decidiu-se o seguinte:

Pelo exposto (...) vai o réu condenado a pagar aos autores, a título de indemnização, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença e que corresponde à diferença entre o valor do terreno se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação e o valor que passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado”.

  1. Tal decisão apoiou-se, em síntese, nos seguintes fundamentos:

(…) Os autores/doadores celebraram o contrato de doação por terem confiado que ao terreno doado iria ser dado determinado destino, vindo o donatário, contudo, a dar-lhe, depois da celebração do negócio, destino diferente daquele que, por acordo de ambas as partes, ficou a constar da escritura de doação.

 

Ora, temos para nós que este destino do terreno, porque acordado e declarado expressamente no documento formalizador do contrato, configura uma obrigação do donatário juridicamente vinculante - ou seja, consubstancia um encargo da doação.

Constitui, assim, uma autêntica cláusula modal (artigo 963 do Código Civil), que foi   incumprida pelo donatário/recorrente. `

A consequência desse incumprimento só pode ser a do direito a uma indemnização a favor dos doadores/recorridos, nos termos do n°2 do artigo 801º do Código Civil, já que a do direito à resolução do contrato, também prevista na norma, está definitivamente precludida pelo facto de não ter ficado a constar do contrato, como exige o artigo 966º do mesmo Código”

 

  1. Nesta sequência, foi deduzido pelos pais dos ora Requerentes incidente de liquidação da indemnização fixada no aludido Acórdão, tendo na sentença da 1ª Vara Cível de ..., de 26.03.2010, sido decretado que: “a questão decidenda traduz-se na fixação do montante (liquidação) da obrigação de restituição/indemnização a cargo do R., operação que, no caso em apreço, depende exclusivamente do apuramento da diferença entre:
  • o valor do terreno identificado no n.º 1 do ponto II, se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação (equipamento a executar pela Câmara ou a seu mando e execução do PRAD ou outro plano de realojamento de natureza social)

e

  • o valor que esse terreno passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado (construção de edifício de luxo e de outros de construção e preço médio/alto)

 

  1. O valor indemnizatório estabelecido pela 1ª Vara Cível de ... foi confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.05.2018 (retificado pelo Acórdão do mesmo Tribunal de 12.07.2018), que fixou a quantia da indemnização a que os ora Requerentes tinham direito em 65.277.893,26 € (sessenta e cinco milhões duzentos e setenta e sete mil oitocentos e noventa e três euros e vinte seis cêntimos), valor a que acresciam juros de mora, à taxa legal, contados a partir de 29.09.2006 e até efetivo e integral pagamento.

 

  1. Em ambas as decisões, proferidas em 2005, o Supremo Tribunal de Justiça considerou que o C... havia incumprido o contrato de doação celebrado com os pais dos ora Requerentes, pelo que o condenou à restituição dos terrenos em apreço (cf. entendimento constante da decisão da 1ª Vara Cível de ..., de 26.03.2010 – “obrigação de restituição/indemnização a cargo do R.”), o que, não sendo possível, se converteu numa obrigação de indemnizar os herdeiros entretanto encabeçados naquele património (os aqui Requerentes) pela diferença entre o valor do terreno “se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação (equipamento a executar pela Câmara ou a seu mando e execução do PRAD ou outro plano de realojamento de natureza social” e o “valor que esse terreno passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio a ser dado” (construção de edifício de luxo e de outros de construção de preço médio/alto).

 

  1. E é quanto a esta indemnização que as partes discordam, pois, se para a Requerida tal indemnização visa compensar lucros cessantes, para os Requerentes a sua atribuição visa reparar danos emergentes comprovados, sendo tal qualificação determinante para efeitos de IRS.

 

Mister é decidir a quem assiste razão.

 

  1. Antes de mais, é consabido que o IRS incide sobre o valor anual dos rendimentos das diversas categorias, mesmo quando provenientes de atos ilícitos, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos, ou seja, tem o CIRS por desiderato regular a tributação dos acréscimos patrimoniais das pessoas, digamos, o “enriquecimento” alcançado durante o período de tributação.

 

  1. Na construção do conceito de rendimento tributário, o CIRS adota a conceção de “rendimento-acréscimo”, segundo o qual a base de incidência deste tributo abrange todo o aumento do poder aquisitivo do contribuinte, incluindo nela as mais-valias e, de um modo geral, as receitas irregulares e ganhos fortuitos, os quais também devem ser considerados manifestações de capacidade contributiva.

 

  1. Logo, e à partida, porque os montantes auferidos a título de indemnização visam o ressarcimento de um dano (cf. artigo 562.º do Código Civil), o que obriga a reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido verificado o evento que obriga à reparação (princípio da reposição natural), então, e por via de regra, não beneficia o lesado de um qualquer acréscimo patrimonial que deva estar sujeito a tributação em sede deste imposto.

 

  1. Contudo, certo é que o legislador tributário, com vista a regular os incrementos patrimoniais insuscetíveis de tributação na qualidade de rendimentos de quaisquer outras categorias, estabelece sob a categoria G – Incrementos Patrimoniais – uma forma de tributação taxativa/tipificada de acréscimos patrimoniais cujo âmbito inclui, efetivamente, rendimentos provenientes de indemnizações.

 

  1. Assim, quando na presença de valores auferidos a título de indemnização – cujo fim é o ressarcimento de danos sofridos pelo lesado – e com vista ao apuramento da sua sujeição ou não a tributação em sede de IRS, releva atender ao que decorre da norma de incidência objetiva desde imposto, prevista no artigo 9.º do CIRS.

 

  1. O artigo 9.º, n.º 1, alínea b), do CIRS, dispõe o seguinte:

1 – Constituem incrementos patrimoniais, desde que não considerados rendimentos de outras categorias:

(...)

b) As indemnizações que visem a reparação de danos não patrimoniais, excetuadas as fixadas por decisão judicial ou arbitral ou resultantes de acordo homologado judicialmente, de danos emergentes não comprovados e de lucros cessantes, considerando-se neste último caso como tais apenas as que se destinem a ressarcir os benefícios líquidos deixados de obter em consequência da lesão.

 

  1. Aqui chegados, e em sede de IRS, serão de considerar como incrementos patrimoniais, e consequentemente objeto de tributação, as quantias provenientes de indemnizações, desde que: (i) visem a reparação de danos não patrimoniais (exceto as fixadas por decisão judicial ou arbitral ou resultantes de acordo homologado judicialmente); (ii) visem a reparação de danos emergentes quando estes não se encontrem devidamente comprovados; (iii) visem a reposição de lucros cessantes, mas apenas quanto à parcela destinada a ressarcir os benefícios líquidos deixados de obter em consequência da lesão [sublinhado nosso].

 

  1. Com efeito, afasta-se ab initio a possibilidade da situação aqui em crise integrar a previsão da primeira parte do citado artigo, quer por não estar em causa uma indemnização que vise a reparação de danos não patrimoniais, quer porque, ainda que o estivesse, certo é que se mostra a mesma fixada por decisão judicial (in casu, decisão judicial de liquidação da indemnização).

 

  1. Assim, resta-nos aferir se a indemnização é suscetível de enquadrar alguma das restantes hipóteses/situações estabelecidas no citado preceito normativo, sendo determinante para tal apurar a distinção entre danos emergentes e lucros cessantes.

 

  1. Veja-se a propósito o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de ... a 22.03.2018, no processo n.º 10667/12.1TCLRS:

O dano emergente inclui o prejuízo causado nos bens, ou direitos existentes aquando da lesão, podendo consistir na diminuição do ativo ou num aumento do passivo, enquanto que os lucros cessantes englobam a perda de benefícios que a lesão impediu de auferir e que ainda não tinham existência à data do evento.

O lucro cessante como compreende benefícios que o lesado não obteve, mas deveria ter obtido, tem de ser determinado segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade. São vantagens que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido, não fora o facto lesivo – cfr. CC anot. P.Lima e A. Varela - art. 564 CC.

  1. No mesmo sentido, refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16.12.2004, proferido no processo n.º 04B3907, que:  

Conforme ensina o Prof. Galvão Teles, "Direito das Obrigações", 6ª ed., pág. 373, «Os danos emergentes traduzem-se numa desvalorização do património, os lucros cessantes numa sua não valorização. Se diminui o ativo ou aumenta o passivo, há um dano emergente (damnum emergens); se deixa de aumentar o ativo ou de diminuir o passivo, há um lucro cessante (lucrum cessans). Ali dá-se uma perda, aqui a frustração de um ganho.»

Os danos patrimoniais compreendem duas modalidades: os danos emergentes, que correspondem aos prejuízos sofridos, respeitando à diminuição do património (já existente) do lesado; e os lucros cessantes, que correspondem aos ganhos que deixou de ter por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património (art. 564º, nº 1, do Cód. Civil).» - cfr. acórdão do S.T.J. de 4/3/80, R.L.J. 114º- 317.

 

  1. Por aqui se verifica que é pacífico na Doutrina e na Jurisprudência o entendimento sobre aquilo em que consistem os danos emergentes e os lucros cessantes.

 

  1. Dito isto, tudo está em saber se o dano em apreço se verifica em bens (ou direitos) de que o lesado era já titular, desvalorizando o seu património – dano emergente – ou, antes, se o dano consiste na falta de aquisição de novos valores, na frustração de um ganho – lucro cessante.

 

  1. O que está em causa nos presentes autos é uma mudança do destino do bem, ou seja, o C... incumpriu o contrato de doação celebrado a 18.11.1983 com os pais dos ora Requerentes, por ter dado ao terreno em apreço destino diferente daquele que havia declarado na referida escritura, o que conduziu à obrigação de indemnizar os Requerentes pelo prejuízo causado.

 

  1. Como sucedâneo do recurso à reconstituição natural, enquanto forma de reparação do dano, a indemnização, normalmente em dinheiro, consiste na reparação, mediante compensação adequada, do prejuízo sofrido por outrem, sendo o seu cálculo baseado na teoria da diferença, expressa entre a situação real em que o lesado se encontra e a situação hipotética em que se encontraria, acaso não tivesse ocorrido o facto gerador do dano, em termos de causalidade adequada, devendo reportar-se tal avaliação à data mais recente que possa ser atendida pelo Tribunal. 

 

  1. Aqui chegados, é inequívoco que do enquadramento factual aqui presente e dado como provado, o prejuízo sofrido atinge um património já existente (ou seja, não é um dano sofrido em bens que os lesados esperassem vir a adquirir), o que conduz à sua diminuição/desvalorização.

 

  1. A este respeito pronunciou-se já de forma extensa e bastante precisa o Tribunal Arbitral no acórdão proferido em 23.01.2020, no âmbito do processo n.º 270/2019-T, que apreciou o enquadramento jurídico-tributário dos juros devidos pelo C... em resultado da condenação do pagamento da indemnização aos ora Requerentes e cujas considerações consideramos serem aqui aplicáveis mutatis mutandis.

 

  1. No referido acórdão sublinhou-se, em síntese, o seguinte:

 

 “De harmonia com os factos dados como provados, os Requerentes, face ao incumprimento da cláusula modal pelo Município E..., tinham direito à restituição do terreno em apreço com a finalidade de que este tinha originariamente. A limitação da finalidade do terreno apenas ocorreria em virtude da execução do contrato de doação celebrado com o Município E... (rectius da cláusula modal)

Sucede que este contrato de doação foi incumprido pelo Município E...

Consequentemente, os Requerentes tinham direito à restituição do terreno, agora sem a específica finalidade (social) que resultava da cláusula modal.

Dito de outra forma, os Requerentes tinham direito aos benefícios (valor do terreno) à data da lesão (que resultou do incumprimento do contrato de doação)

Nas decisões proferidas pelo STJ em 2005 e em 2018 nunca esteve em causa a atribuição, aos Requerentes, de benefícios a que estes (na qualidade de herdeiros) não tivessem direito à data da lesão.

A indemnização conferida aos Requerentes não pode, por conseguinte, considerar-se como resultante de lucros cessantes.

Na verdade, a qualificação como derivada de lucros cessantes não permitiria colocar novamente os Requerentes, enquanto titulares do direito ou crédito indemnizatório, na situação patrimonial que existiria se não se tivesse verificado o incumprimento do contrato de doação, i.e. se o Município E... tivesse restituído os terrenos sub judice.

Não pode, por isso, deixar de se concluir que a indemnização conferida visou colmatar danos emergentes devidamente comprovados.

Os montantes indemnizatórios fixados nos acórdãos do STJ, de 22.09.2005, de 03.11.2005, de 24.05.2018 e de 12.07.2018, a título de capital e juros, assumiram natureza compensatória e constituíram um valor de substituição, fixado de acordo com a teoria da diferença.

Os referidos montantes visaram o ressarcimento do dano patrimonial suportados pelos Requerentes em consequência do incumprimento de obrigações contratuais, imputáveis ao Município E..., tendo em vista a reconstituição da situação hipotética atual dos proprietários dos terrenos doados.

Tratam-se, em rigor, de danos emergentes que foram devidamente comprovados através da decisão judicial de liquidação da indemnização.

Está assim em causa uma dívida de valor (como, aliás, consta a páginas 42 do acórdão do STJ de 24.05.2018 (e de 12.07.2018) junto aos autos).

(...)

Estas situações não estão sujeitas ao princípio nominalista, consagrado no artigo 550.º do Código Civil, uma vez que, tratando-se de dívidas de valor convertidas em dinheiro, deve ser atribuído ao credor o respetivo valor atualizado, sob pena de nunca ser reconstituída a situação hipotética atual.

(...)

Ora as quantias auferidas a título de indemnização por danos emergentes comprovados destinam-se a repor um decréscimo do património, não havendo qualquer acréscimo, mas apenas a reposição da situação patrimonial inicial pelo que não há lugar a tributação se os danos emergentes estiverem devidamente comprovados, como sucede in casu.

(...)

Está em causa, reitere-se, o pagamento de indemnizações decorrentes de danos emergentes comprovados judicialmente, bem como os respetivos juros de mora.

Como tal, estas quantias (que incluem o valor da indemnização e os juros de mora) não estão abrangidas pelo disposto no artigo 9.º, n.º 1, al. b) do CIRS porquanto não se tratam de indemnizações que visam a reparação de danos não patrimoniais resultantes de danos emergentes não comprovados ou de lucros cessantes.

(...)” [negrito nosso].

 

  1. Desta feita, é manifesto que as quantias pagas aos Requerentes a título de indemnização tiveram como objetivo reparar danos emergentes comprovados judicialmente (decisão judicial de liquidação da indemnização), não estando por isso sujeita a tributação, nos termos do disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea b), do CIRS.

 

  1. Tal indemnização visou tão só repor uma perda, pelo que não desencadeou qualquer enriquecimento, na medida em que apenas procurou compensar o decréscimo patrimonial sofrido pelos indemnizados, em virtude do dano, reconstituindo a situação patrimonial anterior à lesão.

 

  1. Por conseguinte, não havendo facto tributário, causa ou base legal ou verificando-se a falta de elementos essenciais ou a causa jurídica a que a constituição ou manutenção da obrigação tributária possa ser atribuída, não pode haver ato tributário.

 

  1. Assim, não podia o C... proceder à retenção na fonte de IRS da quantia em apreço, ao abrigo do disposto nos artigos 9.º, n.º 1, alínea b) e 101.º, n.º 1, alínea a), ambos do CIRS, uma vez que não havia facto tributário, pois tal indemnização não está sujeita a qualquer norma de incidência real prevista no CIRS.

 

  1. Face a todo o exposto, são os presentes atos de retenção na fonte ilegais, devendo, nesta sequência, ser anulados os despachos de indeferimento das respetivas reclamações graciosas.

 

  1. Nestes termos, ao abrigo da proibição da prática de atos no processo inúteis e desnecessários, prevista no artigo 130.º, do CPC, subsidiariamente aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, fica prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados pelos Requerentes.

 

VII. JUROS INDEMNIZATÓRIOS

  1. Apesar de os Requerentes não terem peticionado expressamente o pagamento de juros indemnizatórios, cumpre apreciar se os mesmos são devidos e em que termos, uma vez que nos termos do n.º 8 do artigo 61.º do CPPT se determina que “o pagamento de juros indemnizatórios não está sujeito a impulso processual da iniciativa do contribuinte”.

 

  1. A jurisprudência do STA tem entendido de forma uniforme, por exemplo no acórdão proferido em 29.06.2022 no âmbito do processo n.º 093/21.7BALSB, que:

I - Os juros indemnizatórios correspondem à concretização de um direito de indemnização que tem raiz constitucional. Com efeito, no artº.22, da C.R.Portuguesa, estabelece-se que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem. O artº.43, da L.G.T., estabelece o regime geral do direito a juros indemnizatórios.

II - É jurisprudência deste Tribunal, no que respeita à questão da obrigação de juros indemnizatórios nos casos de retenção indevida de imposto e em que foi deduzido meio gracioso (v.g.reclamação graciosa), que o erro passa a ser imputável à A. Fiscal depois de eventual indeferimento, expresso ou silente, da pretensão deduzida pelo contribuinte.

(…)

IV - Em caso de retenção na fonte e havendo lugar a impugnação administrativa do acto tributário em causa (v.g.reclamação graciosa), o erro passa a ser imputável à A. Fiscal depois de operar o indeferimento do mesmo procedimento gracioso, efectivo ou presumido, funcionando tal data como termo inicial para cômputo dos juros indemnizatórios a pagar ao sujeito passivo, nos termos do artº.43, nºs.1 e 3, da L.G.T.”.

 

  1. Por conseguinte, considera o presente Tribunal Arbitral que são devidos juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT desde o dia 25.10.2021 que corresponde à data do indeferimento tácito dos pedidos de reclamação graciosa apresentados pelos Requerentes.

VIII. DECISÃO

Em face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Declarar a ilegalidade dos atos de retenção na fonte praticados pelo C... relativamente ao valor indemnizatório pago a cada um dos Requerentes, nos montantes parcelares de 2.692.713,10 € cada e, nesta sequência, anular os despachos de indeferimento das respetivas reclamações graciosas;
  3. Condenar a Requerida AT a restituir aos Requerentes o valor de imposto retido descrito na alínea anterior, acrescido de juros indemnizatórios nos termos fixados, com todas as consequências legais;
  4. Condenar a Requerida AT nas custas do processo, abaixo fixadas.

 

XI. VALOR DA CAUSA

Fixa-se ao processo o valor de 5.385.426,20 (cinco milhões trezentos e oitenta e cinco mil quatrocentos e vinte seis euros e vinte cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

XII. CUSTAS

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas, a cargo da Requerida, em 67.626,00 €, nos termos da tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

[Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.]

Lisboa, 10 de Novembro de 2022

 

O Tribunal Arbitral Coletivo,

 

Carla Castelo Trindade

 

(Presidente)

 

 

 

 

Álvaro Caneira

 

(Árbitro Adjunto)

 

 

 

 

Susana Mercês

 

(Árbitra Adjunta – relatora)