Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 238/2022-T
Data da decisão: 2022-09-19  IVA  
Valor do pedido: € 79.346,00
Tema: IVA – artigo 86.º. Presunção iuris tantum. Princípio do inquisitório.
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Sumário

  1. O artigo 86.º prevê uma presunção juris tantum que pode ser ilidida mediante prova de que os bens não foram transmitidos.
  2. O dever de colaboração do sujeito passivo não pode ser considerado como a única forma de AT assegurar a descoberta da verdade, podendo esta, no respeito pelo princípio do inquisitório, dispor de um conjunto de instrumentos legais diversos aptos a, perante o caso concreto, permitir-lhe procurar a descoberta da verdade.

 

 

Decisão Arbitral

 

Os árbitros Professor Doutor Nuno Cunha Rodrigues (árbitro-presidente), Dra. Catarina Belim e Dr. Francisco Carvalho Furtado, designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 15-06-2022, acordam no seguinte:

 

  1. Relatório

 

A... SA, com o NIPC ... e sede na Rua ..., n.º ..., ...-... Carnaxide (doravante “Requerente”), veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), tendo em vista a declaração de ilegalidade e anulação da liquidação adicional de IVA n.º 2021..., no montante de € 79.346,87, relativa ao período de 17.12M.

A Requerente pede ainda o reembolso das quantias pagas, acrescido de juros indemnizatórios.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT”).

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 07-04-2022.

Em 27-05-2022, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 8 do artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT sem que as Partes se pronunciassem, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 15-06-2022.

Deste modo, a Requerente sustentou, em síntese, o seu pedido da seguinte forma:

  1. O artigo 86.º do CIVA estabelece que, salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos os bens que se encontrem em qualquer dos locais em que o sujeito passivo exerce a sua actividade e presumem-se transmitidos os bens adquiridos, importados ou produzidos que se não encontrem em qualquer desses locais.
  2. Tal presunção é aplicável apenas para os casos e no contexto de uma inventariação física de bens.
  3. Para que haja uma presunção de aquisição de bens é necessária a constatação de que tais bens estão fisicamente nas instalações da empresa.
  4. Para os bens que constam dos registos contabilísticos, incluindo os inventários, não é necessária a presunção do artigo 86.º: a contabilidade presume-se verdadeira até prova em contrário.
  5. Tal entendimento será aplicável às aquisições bem como às transmissões.
  6. O artigo 86.º do CIVA disciplina apenas e só as consequências da inventariação física das existências quando a AT, no âmbito de um procedimento de inspeção, usar dessa faculdade.
  7. Cabe à inspeção o ónus da prova da incoerência dos dados.

A AT apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral tendo invocado, em síntese, o seguinte:

  1. A Requerente não apresenta uma única prova que permita aferir da concreta destruição ou inutilização dos stocks em questão.
  2. Os abates das mercadorias dos inventários levado a cabo pela Requerente, não assentaram em critérios que permitam aferir da comprovação da sua concreta destruição ou inutilização.
  3. O único facto que efectivamente caberia averiguar era se efectivamente os stocks teriam ou não sido destruídos/inutilizados e, tal facto nunca se conseguiria aferir com uma verificação física das existências da Requerente.
  4. Se a Requerente não apresenta qualquer prova, ou propõe a realização de qualquer diligência com potencial para alcançar a resposta a tal questão, não pode a Requerida fazer mais nada senão concluir que a Requerente não logrou provar a destruição/inutilização dos bens em apreço.
  5. Os sujeitos passivos devem manter em sua posse os documentos de validação da evidência contabilística, enquanto esta perdurar, de forma a que a mesma possa ser devidamente validada.
  6. Competia à Requerente, nos termos do previsto no art.º 74.º da LGT, provar as alegações que formula, mas para as quais nem uma prova apresenta, de que não é possível que tais mercadorias não tivessem sido devolvidas ou facturadas.

Em 11-09-2022 foi dispensada a realização da reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT bem como a apresentação de alegações.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:

  1. A Requerente exerce como atividade principal o comércio e retalho de mobiliário e artigos de iluminação, estab espec. CAE 47591 e como atividade secundária o comércio por grosso não especializado, CAE 46900.
  2. A Requerente, no mês de dezembro de 2017, efetuou três regularizações de stock, no total de 317.413,67 €:
  1. Saída de stock (SSF2) n.º 1/2017, no total de 68.773,76 € - Auto de abate de 22 de novembro;
  2. Saída de stock (SSF2) n.º 2/2017, no total de 174.957,97 € - Auto de abate de 6 de dezembro;
  3. Saída de stock (SSF2) n.º 3/2017, no total de 73.681,94 € - Auto de abate de 20 de dezembro.
  1. A Requerente apresentou os autos de abate no âmbito do procedimento de inspeção, com a discriminação detalhada dos bens abatidos melhor identificada no PPA a fls. 118 a 127.
  2. Os autos de abate foram emitidos em 22/11/2017; 6/12/2017 e 20/12/2017, deles constando centenas de peças de mobiliário melhor identificadas no PA a fls. 118 a 127.
  3. A Requerente identificou a Câmara Municipal de Oeiras como a entidade que procedeu à recolha das peças de mobiliário constante dos autos de abate.
  4. A Requerente foi alvo de um procedimento de inspeção tributária, ao abrigo da ordem de serviço n.º OI2019..., relativamente ao período de 2017, no âmbito do qual foram feitas as seguintes correções em sede de IVA, por aplicação da presunção constante do artigo 86.º do CIVA:

Abates                                                                   73.005,14€

Mercadorias em poder de terceiros                        6.341,73€

  1. A inspeção realizada pela AT considerou que não foram apresentados documentos que comprovem a existência de bens em armazém, presumindo a sua venda com referência a 31.12.2007.
  2. No ano de 2016 a Requerente incorporou a B... Lda. e, no âmbito da fusão, integrou os ativos e passivos da sociedade incorporada.
  3. A sociedade incorporada B... tinha na conta 326 – Mercadorias em poder de terceiros, um saldo de 27.272,72€, que foi diretamente integrado no Balanço da sociedade incorporante – a Requerente -, sem que tenha sido objeto de prévia regularização.
  4. A Requerente apresentou à AT guias de transporte comprovativas da transferência dos bens para os clientes no ano de 2009, melhor identificadas no PA a fls. 134 a 140.
  5. A Requerente informou a AT que não detinha, nem a B... detinha à data da fusão (2016), a posse de qualquer dos bens e que a maior parte dos clientes identificados nas guias de transporte já se tinham dissolvido ou liquidado pelo que as mercadorias em causa tinham sido devolvidas ou, eventualmente, faturadas, sem que tenha sido feito o correspondente reconhecimento na conta 326 – Mercadorias em poder de terceiros.
  6. Para efeitos de IVA vigora, relativamente à Requerente, e desde 01-01-1989, o regime de tributação normal de periodicidade mensal;

 

2.2. Factos não provados e fundamentação e fixação da matéria de facto

 

Com relevo para a decisão não existem factos não provados.

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos e nas posições assumidas por ambas as Partes em relação aos factos essenciais.

 

3. Matéria de direito

 

No caso em apreço está em causa a aplicação do artigo 86.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), correspondente ao artigo 80.º, na redacção anterior à revisão do articulado, efectuada pelo Decreto-Lei n.º102/2008, de 20 de junho, que fundamentou a contestada liquidação adicional.

O invocado artigo do CIVA determina o seguinte:

“Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos os bens que se encontrem em qualquer dos locais em que o sujeito passivo exerce a sua actividade e presumem-se transmitidos os bens adquiridos, importados ou produzidos que se não encontrem em qualquer desses locais.”

Como bem referem F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes a propósito da redação do artigo 80.º do CIVA (atual artigo 86.º), “O disposto neste artigo poderá considerar-se como uma consequência directa da inventariação que eventualmente tenha sido efectuada nos termos do artigo anterior, conduzindo à existência de bens não documentados nem registados e que se presume terem sido adquiridos pelo sujeito passivo. Também como resultado dessa inventariação poderá verificar-se a falta de bens face ao registo dos livros. Em ambos os casos o legislador admite por um lado, uma presunção juris tantum de aquisição daqueles bens e, por outro, a transmissão dos bens encontrados em falta, motivando, neste caso, a liquidação do correspondente imposto”.[1]

Também a este propósito, F. Duarte Neves, salientava o seguinte: “Este artigo estabelece que se presumem como transmitidos os bens não encontrados em qualquer dos locais em que o contribuinte exerça a sua actividade, salvo prova em contrário. O regime consagrado neste artigo pode considerar-se como uma consequência directa da inventariação de bens, sendo que o legislador presume a transmissão dos bens não encontrados no local onde é normalmente exercida a actividade do sujeito passivo, comportando a liquidação do respectivo IVA.[2]

O artigo 86.º prevê, portanto, uma presunção juris tantum que pode ser ilidida mediante prova (por qualquer meio legalmente admissível) de que os bens não foram transmitidos conforme, aliás, decorre do artigo 73.º da Lei Geral Tributária (LGT).

A este propósito, poder-se-á afirmar, como já foi referido anteriormente pela jurisprudência do CAAD proferida no âmbito do processo 208/2020-T, que “as presunções pressupõem a prova de um facto conhecido (base de presunção) do qual se infere um facto desconhecido (artigo 349.º do Código Civil).

Tratando-se de uma presunção estabelecida na lei, esta não constitui propriamente um meio de prova, ou seja, um meio destinado a formar a convicção sobre a realidade de um facto, mas antes um meio de dispensa da prova do facto presumido.

Com base num facto instrumental dado como provado, é possível inferir, por efeito da presunção legal, um outro facto sobre o qual não existe prova direta. Nesse contexto, cabe à parte provar o facto instrumental para que dele se possa inferir, por presunção legal, o facto presumido (cfr. Teixeira de Sousa, A prova em processo civil, sem data (policopiado), págs. 5-6). (…)

Ainda que, em regra, os dados e apuramentos inscritos na contabilidade do sujeito passivo se devam presumir verdadeiros (artigo 75.º, n.º 1, da LGT), o certo é que o facto instrumental que serve de base à presunção não pode dar-se como provado apenas através de um mero controlo contabilístico, visto que a base da presunção se traduz, nos termos da lei, na inexistência, em qualquer dos locais em que o sujeito passivo exerce a sua atividade, dos bens adquiridos, importados ou produzidos.

(…) Como se refere no acórdão do TCA Sul de 29 de Setembro de 2018 (Processo n.º 428/13), a Autoridade Tributária, no âmbito de um procedimento inspetivo, não pode prevalecer-se da presunção prevista no artigo 86.º do Código do IVA, dando como assente a transmissão dos bens em falta, sem proceder à verificação e contagem física das existências, não podendo extrair uma tal presunção a partir do confronto entre os valores inscritos nos registos contabilísticos do contribuinte, ou seja, através de factos registados na contabilidade.”

Assim, em síntese e como também foi referido no processo n.º 111/2013-T do CAAD, “nos casos de presunção legal ilidível mediante prova em contrário, ocorre a inversão do ónus da prova, ficando aquele que tem a ser favor a presunção legal dispensado de provar o facto a que a presunção legal conduz (artigos 344º, nº 1 e 350º, nº 1 do Código Civil).”

Dito por outras palavras, os bens adquiridos, importados ou produzidos que se não encontrem em qualquer dos locais em que o sujeito passivo exerce a sua actividade presumem-se transmitidos.

No caso sub judice, a Requerida AT tinha assim a seu favor a presunção legal de transmissão dos bens consignada no artigo 86º do CIVA, competindo à Requerente provar que, apesar dos bens já não estarem na sua posse, não os havia alienado a terceiros.

Para efeitos de afastamento da presunção, devem admitir-se todos os meios de prova ao dispor da Requerente.

A Requerente apresentou três autos de abate para justificar a inexistência dos bens no local onde exerce a actividade afastando, dessa forma, a presunção do artigo 86.º do CIVA.

É certo que aos três autos exibem uma quantidade inusitada de mercadoria. Porém, toda a mercadoria encontra-se devidamente identificada, bem como as datas em que o abate ocorreu, sendo igualmente conhecida a entidade que terá procedido à sua recolha: a Câmara Municipal de Oeiras.

Ora não só a actuação dos contribuintes presume-se de boa fé (cfr. artigo 59.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária (LGT)), como a documentação entregue pela Requerente presume-se verdadeira e de boa-fé, de harmonia com o disposto no artigo 75.º da LGT.

Em sentido oposto entende a Requerida AT que a Requerente não apresentou qualquer prova ou propôs a realização de qualquer diligência com potencial para determinar se efectivamente os stocks teriam ou não sido destruídos/inutilizados.

Ao fazê-lo, a Requerida AT escuda-se no dever de colaboração que impende sobre os sujeitos passivos, consagrado no artigo 59.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária.

Porém, o respeito pelo dever de colaboração não pode fazer esquecer que, no caso sub judice, a Requerente apresentou documentação comprovativa do abate de mercadoria e identificou o destinatário desta – a Câmara Municipal de Oeiras -, e que a Requerida AT tinha, consequentemente, a possibilidade de agir ao abrigo do princípio do inquisitório.

O dever de colaboração do sujeito passivo não pode ser considerado como a única forma que a AT tem para assegurar a descoberta da verdade. Em rigor esta dispõe, para esse efeito, de um conjunto de instrumentos legais diversos que lhe permitem procurar a descoberta da verdade, no respeito pelo princípio do inquisitório, de harmonia com o qual recai sobre a AT o dever de realizar todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade.

In casu, podia a Requerida AT, no cumprimento do referido princípio do inquisitório, e de forma exemplificativa, ter contactado com a entidade oficial a quem foi entregue a mercadoria abatida por forma a dissipar as eventuais dúvidas que tivesse sobre a entrega da mercadoria. Sucede que a Requerida AT não adoptou qualquer diligência ou tomou qualquer medida a este propósito que, a serem realizadas, não seriam, seguramente, inúteis no âmbito do presente caso, mais a mais sabendo-se que as fundadas dúvidas sobre a existência e quantificação do facto tributário, determinam a anulação do acto impugnado (cfr. artigo 100.º, n.º 1 do CPPT).

Não pode, por isso, deixar de se considerar que, ao não proceder dessa forma, a Requerida AT violou o princípio do inquisitório.

Tendo presente que não pode deixar de se presumir a boa-fé e a veracidade dos autos de abate exibidos pela Requerente, conclui-se que os bens foram de facto abatidos e não alienados a terceiros, não havendo lugar à liquidação de IVA sobre a mercadoria neles constante uma vez que não se verificou qualquer transmissão onerosa de bens para efeitos do disposto nos artigos 1.º, n.º 1 e 86.º do CIVA.

Por fim, e no que se refere às mercadorias em poder de terceiros, ficou provado que a Requerente não detinha em 31.12.2007, nem a B... detinha à data da fusão com a Requerente, em 2016, a posse de qualquer dos bens identificados, tendo sido apresentadas pela Requerente as guias de transporte comprovativas da transferência dos bens para os clientes ocorrida em 2009.

Também aqui deve entender-se que o contribuinte atuou de boa-fé e fazer prevalecer a presunção prevista no artigo 75.º da Lei Geral Tributária, de harmonia com a qual presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita.

Ao abrigo do princípio do inquisitório, competiria à Requerida AT ilidir a citada presunção de veracidade que permitiu à Requerente afastar a aplicação do disposto no artigo 86.º do CIVA, o que não foi realizado pela Requerida AT.

Face do exposto, conclui-se assistir razão à Requerente, devendo o pedido desta ser julgado totalmente procedente e, consequentemente, a liquidação adicional de IVA ser anulada por vício de violação de lei e por erro nos pressupostos.

 

4. Restituição de quantia paga indevidamente e juros indemnizatórios

 

         4.1. Reembolso de quantias pagas

 

         Na sequência da anulação da liquidação, a Requerente tem direito a ser reembolsada da quantia indevidamente suportada pela liquidação adicional de IVA sub judice.

          

         4.2. Juros indemnizatórios

 

         No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

Artigo 43.º

Pagamento indevido da prestação tributária

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

No caso em apreço, conclui-se que há erro na liquidação adicional imputável aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira, pois foi esta que a elaborou por sua iniciativa.

Os juros indemnizatórios devem ser contados da data em que foi efectuado o respectivo pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

5. Decisão        

 

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

  1. Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular a liquidação adicional de IVA n.º 2021..., no montante de € 79.346,87;
  3. Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los à Requerente;

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 79.346,00, atribuído pela Requerente, sem contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira.

7. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida AT.

 

Lisboa, 19-09-2022

 

O Árbitro-Presidente

 

(Nuno Cunha Rodrigues)

(Relator)

 

Os Árbitros

 

(Catarina Belim)

 

 

(Francisco Carvalho Furtado)

 



[1] Assim, cfr. Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, Anotado e Comentado, de, 4ª edição, pág. 813 e 814.

[2] Assim, cfr. Código do IVA Comentado e Anotado, edição Vida Económica, 2010, p. 628 e 629.