Processo nº 50/2013
Decisão arbitral
I – Relatório
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O Cabeça-de-Casal da Herança de …, com o NIF …, com domicílio na …Lisboa, apresentou em 20 de março de 2013 pedido de constituição de Tribunal Arbitral singular, invocando o disposto na alínea a) do nº1 do artigo 10º, ambos do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (adiante designada por RJAT – Regime Jurídico da Arbitragem Tributária) deduziu pedido de pronúncia arbitral sobre o ato de liquidação de imposto de selo, no valor de € 531,65. O requerente impugna o ato de liquidação e peticiona a anulação do mesmo.
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite e notificado à Autoridade Tributária em 21 de março de 2013. Nos termos do disposto no artigo 11º do Decreto-Lei nº 10/2011 de 20 de Janeiro, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro, o conselho deontológico designou árbitro singular e as partes foram notificadas da designação. O tribunal arbitral foi constituído em 23 de maio de 2013.
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A reunião prevista no artigo 18º do RJAT teve lugar em 19 de setembro de 2013, em conformidade com a ata da reunião que aqui se dá por integralmente reproduzida. As partes optaram por apresentar alegações escritas, tendo sido fixado prazo para apresentação das mesmas. Foi, ainda, designada a data de 30 de outubro de 2013 para a prolação da decisão arbitral e para pagamento da taxa de justiça subsequente.
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O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para apreciar e decidir o objeto do processo.
O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões que obstem à apreciação do mérito da causa, mostrando-se reunidas as condições para ser proferida decisão final.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011 de 22/03)
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A pretensão objeto do pedido de pronúncia arbitral consiste na declaração de ilegalidade do mencionado ato de liquidação de imposto de selo, sobre o património imobiliário, constante da verba nº 28 da tabela geral do imposto de selo (doravante TGIS), nos termos em que foi aplicada pela AT, no caso dos presentes autos.
II – Matéria de Facto
Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, destacam-se os seguintes elementos factuais:
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A herança indivisa de … é integrada, entre outros, pelo prédio sito na …, concelho de Lisboa.
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Este prédio compreende 10 andares e divisões com utilização independente, cujo valor patrimonial tributário (VPT) foi determinado separadamente, nos termos do disposto no artigo 7º, nº2, alínea b) do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI).
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O prédio, apesar de constituído por dez andares e divisões com utilização independente, não se encontra constituído em regime de propriedade horizontal.
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Cada um dos andares independentes tem um valor patrimonial tributário atribuído, determinado nos termos do disposto no Código de Imposto Municipal sobre Imóveis, compreendido entre € 16.980,00 e €266.010,00.
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O prédio, em propriedade vertical, compreende um total de 10 andares e divisões com utilização independente, dos quais nove são afetos a habitação, e o seu VPT total perfaz o valor de € 1.499.900,00, sendo que nenhuma das partes ou andares com afetação habitacional tem um valor patrimonial tributário superior a €1.000.000,00.
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A soma dos valores patrimoniais de todos os andares e divisões (com afetação habitacional e outras) perfaz o valor de € 1.516.854,00.
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Em causa nos presentes autos está o imposto de selo, no valor de € 531,65, liquidado sobre o valor patrimonial tributário de € 106.330,00 correspondente ao 2º andar com utilização independente e afeto a Habitação, constante da matriz predial urbana sob a inscrição nº … .
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Este 2º “andar”, como todo o prédio no qual se integra, pertence à herança indivisa supra referida, à qual se habilitaram seis herdeiros, sem distinção de parte ou direito.
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Sobre o valor patrimonial deste 2º andar, a AT liquidou imposto de selo, com referência ao ano de 2012, nos termos dos artigos 6º, nº1, alínea f), subalínea i), o imposto de selo da verba 28.1 da TGIS, na redação dada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, à taxa de 0,5 %.
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O ato de liquidação, com o número de documento 2012 …, referente ao prédio identificado com o nº …, tendo como referência o valor patrimonial tributário de € 106.330,00, determinou um valor de imposto a pagar de € 531,65, com data limite de pagamento até 2012-12-20.
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A convicção sobre os factos dados como provados fundou-se na prova documental junta aos autos pela Requerente (docs. nºs 1 a 3 juntos à petição inicial), ao que acresce a aceitação mútua das partes sobre os mesmos.
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Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.
III – Matéria de Direito
O quadro alegatório em que se sustenta o pedido de pronúncia arbitral pode sintetizar-se nos termos seguintes:
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Para a AT, dado que nove dos dez andares e divisões com utilização independente têm afetação habitacional e o somatório dos respetivos VPT perfazem o valor de €1.499,900,00, há lugar a incidência de imposto de selo.
Foi este entendimento que conduziu ao ato de liquidação de IS sobre o 2º andar do prédio, aqui impugnado.
Assim, do ponto de vista da requerida AT, para um prédio em propriedade vertical (ou não constituído em regime de propriedade horizontal) o critério para a determinação da incidência do imposto de selo é o VPT global dos andares e divisões destinadas a habitação.
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Para a Requerente, tal entendimento é ilegal, já que, a sujeição ao imposto do selo contido na verba nº 28.1 da TGIS, é determinado pela conjugação de dois factos: a afetação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a €1.000.000,00. Tratando-se de um prédio com as características descritas nos autos a sujeição a imposto do selo é determinada, não pelo VPT do prédio, mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões.
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Estas são, sem síntese, as posições defendidas pelas partes, nos articulados junto aos autos por requerente e requerida, reforçada nas alegações juntas aos autos pelo requerente. A requerida não juntou alegações.
Cumpre decidir.
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A questão essencial a decidir é a de saber, com referência a prédios não constituídos em regime de propriedade horizontal, integrados por diversos andares e divisões com utilização independente, das quais algumas com afetação habitacional, qual o VPT relevante. Ou seja, saber se o VPT relevante como critério de incidência do imposto é o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) ou, antes, o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais.
A resposta a esta questão impõe a análise das normas jurídicas de referência de modo a determinar qual a interpretação conforme à Lei e à Constituição, com particular cuidado pois que se trata de aferir de um pressuposto de incidência de imposto, cuidadosamente protegido pelo princípio da legalidade fiscal resultante do disposto no artigo 103º, nº2 da CRP.
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A sujeição a imposto do selo dos prédios com afetação habitacional resultou do aditamento da verba 28 da TGIS, efetuada pelo artigo 4º da Lei 55-A/2012, de 29/10, que tipificou os seguintes factos tributários:
“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI:
28-1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%
28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.”
Esta lei entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, em 30 de outubro de 2012. Das normas transitórias constantes do seu artigo 6º resulta que o facto tributário se considera verificado a 31 de outubro de 2012 e que o valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011.
De acordo, ainda, com o mesmo artigo 6º da Lei nº 55-A/2012, a tributação prevista na verba 28 da TGIS é, no ano de 2012, efetuada à taxa de 0,5% sobre o valor patrimonial tributário, desde que igual ou superior a €1.000.000,00 de prédios urbanos com afetação habitacional.
A Lei 55-A/2012 nada diz quanto à qualificação dos conceitos em presença, nomeadamente, quanto ao conceito de “prédio com afectação habitacional.” No entanto o artigo 67º, nº 2 do Código do Imposto do Selo, aditado pela referida Lei, dispõe que “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”
A norma de incidência refere-se, pois, a prédios urbanos, cujo conceito é o que resulta do disposto no artigo 2º do CIMI, obedecendo a determinação do VPT aos termos do disposto no artigo 38º e seguintes do mesmo código.
Consultado o CIMI verifica-se que o seu artigo 6º apenas indica as diferentes espécies de prédios urbanos, entre os quais menciona os habitacionais (vd. alínea a) do nº 1), esclarecendo no nº 2 do mesmo artigo que “habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.”
Daqui podemos concluir que, na ótica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina o prédio. Concluímos ainda que para o legislador a situação do prédio em propriedade vertical ou em propriedade horizontal não relevou, pois que nenhuma referência ou distinção é efetuada entre uns e outros. O que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.
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Por resolver continua a questão que tem a ver com a determinação do valor relevante para a incidência do IS sobre os prédios em propriedade vertical, como sucede nos presentes autos, que a AT considera como um todo apesar de serem constituídos por várias partes autónomas para habitação, com utilização independente e que, desta forma, podem facilmente ultrapassar um milhão de euros.
Pois bem, este critério de oportunidade adotado pela AT não se afigura aceitável, nem conforme ao princípio da legalidade fiscal.
Utilizando o critério que a própria lei introduziu no artigo 67º, nº 2 do Código do Imposto do Selo, “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”
Ora, sendo assim, considerando que a inscrição na matriz de imóveis em propriedade vertical, constituídos por diferentes partes, andares ou divisões com utilização independente, nos termos do CIMI, obedece às mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal, sendo o respetivo IMI, bem como o novo IS, liquidados individualmente em relação a cada uma das partes, não oferece qualquer dúvida que o critério legal para definir a incidência do novo imposto tem de ser o mesmo.
Aliás, a AT admite que este é o critério, razão pela qual a própria liquidação emitida é muito clara nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT do 2º andar e a liquidação individualizada sobre a parte do prédio correspondente a esse mesmo andar.
Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto.
Assim, só haveria lugar a incidência do novo imposto de selo se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00.
Não pode, assim, a AT considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de CIMI, e este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à verba 28 da TGIS.
O critério pretendido pela AT, de considerar o valor do somatório dos VPT atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, com o argumento do prédio não se encontrar constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra sustentação legal e é contrário ao critério que resulta aplicável em sede de CIMI e, por remissão, em sede de IS.
Ao que acresce o facto da própria lei estabelecer expressamente, na parte final da verba 28 da TGIS, que o IS a incidir sobre os prédios urbanos de valor igual ou superior a €1.000.000,00 – “sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI.” (sublinhado nosso)
Assim, a adoção do critério defendido pela AT viola os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem assim como, o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal.
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No caso dos autos o prédio em causa encontra-se em propriedade vertical e contém 10 andares e divisões com utilização independente dos quais, uma grande parte se destina a habitação, como ficou provado supra. Dado que nenhum dos andares destinados a habitação tem valor patrimonial igual ou superior a €1.000.000,00, como resulta dos documentos juntos aos autos, conclui-se pela não verificação do pressuposto legal de incidência do IS previsto na Verba 28 da TGIS.
No caso do 2º andar, o único em apreço nos presentes autos, o seu valor patrimonial tributário é de €106.330,00, pelo que, não ultrapassa o valor fixado na norma de incidência.
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Por último, importa indagar qual a ratio legis subjacente à regra da verba 28 da TGIS, introduzida pela Lei nº 55-A/22012 de 29 de outubro, e em obediência ao disposto no artigo 9º do Código Civil, segundo o qual a interpretação da norma jurídica não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos e dos restantes elementos de interpretação o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
O legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a €1.000.000,00.
Isso mesmo se conclui da análise da discussão da proposta de lei nº 96/XII na Assembleia da República, disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de outubro de 2012.
A fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as “casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros.” 1
Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal.
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Também seguindo estes considerandos inspiradores da inovação legislativa em apreciação, há que concluir que a existência de um prédio em propriedade vertical ou horizontal não pode ser, por si só, indicador de capacidade contributiva. Pelo contrário, da lei decorre que uns e outros devem receber o mesmo tratamento fiscal em obediência aos princípios da justiça, da igualdade fiscal e da verdade material. Já a existência em cada prédio de habitações independentes, em regime de propriedade horizontal ou vertical, pode ser suscetível de desencadear a incidência do novo imposto se o VPT de cada uma das partes ou fração for igual ou superior ao limite definido pela lei: € 1.000.000,00.
Deste modo é ilegal e inconstitucional considerar como valor de referência seja o correspondente ao somatório dos VPT atribuídos a cada parte ou divisão. Desde logo, porque essa seria uma nítida violação do princípio da igualdade e proporcionalidade em matéria fiscal.
No caso dos autos o VPT do supra referido 2º andar não cumpre este pressuposto.
O legislador fiscal não pode tratar situações iguais de forma diferente. Ora, se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal, nenhuma das suas frações habitacionais sofreria incidência do novo imposto.
Por isso mesmo é que o artigo 12º, nº3 do CIMI diz que “cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial a qual discrimina igualmente o respetivo valor patrimonial tributário.”
A própria AT reconhece ao longo do seu articulado de resposta, e mais concretamente no seu artigo 35º, que a norma do artigo 12º, nº3 do CIMI (à semelhança do que era previsto no artigo 232º, regra 1º, do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola) releva para efeitos de inscrição na matriz predial a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, económica e funcionalmente independentes.
Ora, tal constatação não se afigura coerente com a decisão da AT tributar as partes habitacionais de um prédio em propriedade vertical, em função do VPT global do prédio e não do que é efetivamente atribuído a cada parte.
Como a própria AT reconhece a constituição da propriedade horizontal implica uma mera alteração jurídica do prédio não impondo sequer uma nova avaliação (vd. art. 53º da resposta).
Logo, a verdade material é a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico- formal do prédio.
Em consequência, a discriminação operada pela AT traduz uma discriminação arbitrária e ilegal. Nada na lei impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal. Por outro lado, é sabido que muitos dos prédios existentes em propriedade vertical são antigos, com uma utilidade social inegável, pois em muitos casos acolhem moradores com rendas módicas e mais acessíveis, fatores que necessariamente devem ser tidos em conta. E, certamente tendo em conta toda essa realidade social e económica, o próprio legislador fiscal no CIMI tratou as duas situações (propriedade horizontal e vertical) de forma equitativa, aplicando os mesmos critérios.
Não pode a AT distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103º, nº2 da CRP, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal.
IV. Decisão
Nestes termos e com a fundamentação que se deixa exposta decide este tribunal arbitral julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação do ato de liquidação impugnado.
Valor do processo: € 531,65
Custas: ao abrigo do disposto no artigo 22º, nº4 do RJAT e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 306,00, a cargo da requerida AT.
Notifique-se.
Lisboa, 29 / 10 / 2013
O Árbitro,
(Maria do Rosário Anjos)