Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 516/2021-T
Data da decisão: 2022-09-05  Selo  
Valor do pedido: € 1.169.454,96
Tema: Imposto do Selo – Taxa Multilateral de Intercâmbio e Comissões Interbancárias por utilização de ATM’s – Sucessão da lei no tempo – art. 3.º, n.º 3, al. h) do CIS e verba 17.3.4 da TGIS.
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Alexandra Coelho Martins (presidente), Raquel Franco e Hélder Faustino, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 10 de novembro de 2021, acordam no seguinte:

 

 

            I.         Relatório

 

Banco A..., S.A., doravante designado por “Requerente”, pessoa coletiva número..., com sede na Rua ... n.º ..., ...-... Porto, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral Coletivo e deduzir pedido de pronúncia arbitral (“ppa”), ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, e do artigo 102.º, n.º 1, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), na redação vigente.

 

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.

 

O Requerente pretende a anulação parcial da liquidação de Imposto do Selo n.º 2021 ... (demonstração n.º 2021 ...) e das liquidações de juros compensatórios n.ºs 2021 ... a 2021 ..., com data limite de pagamento de 31 de maio de 2021, relativas ao ano 2017, emitidas no valor global de € 1.730.763,64.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 1 de setembro de 2021 e, de seguida, notificado à AT.

 

De acordo com o preceituado nos artigos 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar.

 

O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 10 de novembro de 2021.

 

            Em 13 de dezembro de 2021, a Requerida apresentou a sua Resposta, com defesa por impugnação, e juntou o processo administrativo (“PA”). Pugna pela improcedência do pedido arbitral e absolvição de todos os pedidos.

 

Por despacho de 15 de dezembro de 2021, o Tribunal dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessidade, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, simplificação e informalidade processuais (v. artigos 16.º, alínea c) e 29.º, n.º 2 do RJAT).

 

As Partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, por despacho de 14 de janeiro de 2022.

 

Em 1 de fevereiro de 2022, o Requerente apresentou as suas alegações. A Requerida contra-alegou em 22 de fevereiro de 2022. Ambas as Partes reafirmaram, no essencial, as posições assumidas nos articulados iniciais.

 

Por despachos de 10 de maio de 2022 e de 1 de julho de 2022, foi prorrogado o prazo para prolação da decisão, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, derivado da tramitação processual, da interposição de períodos de férias judiciais e da situação pandémica.

 

Posição do Requerente

 

O Requerente começa por alegar que não lhe cabe qualquer responsabilidade pela cobrança do Imposto do Selo que fosse eventualmente devido em relação às Taxas Multilaterais de Intercâmbio (“TMI”) e às Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de ATM’s recebidas no período de 1 de janeiro a 23 de maio de 2017.

 

Salienta, a este respeito, que a atual redação do artigo 3.º, n.º 3, alínea h) do Código do Imposto do Selo apenas foi introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, com entrada em vigor no dia seguinte, inexistindo, até essa data, norma que lhe atribuísse [ao Requerente] o encargo deste imposto. Assim, embora nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea c) do mencionado Código o sujeito passivo fosse o Requerente, o encargo do imposto recairia sobre os seus clientes, enquanto titulares do interesse económico da operação subjacente (v. artigos 1.º e 3.º, n.ºs 1 e 3, alínea g) do Código do Imposto do Selo), configurando uma situação de substituição tributária sem retenção, à qual não se aplica o regime do artigo 28.º da Lei Geral Tributária (“LGT”). Deste modo, considera serem as liquidações impugnadas parcialmente anuláveis por violação do artigo 3.º do Código do Imposto do Selo e do artigo 28.º da LGT.

 

Por outro lado, o Requerente invoca que, nem as TMI, nem as Comissões Interbancárias pela utilização de caixas automáticas ATM’s se reconduzem a contraprestações de serviços financeiros com enquadramento na verba 17.3.4 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), configurando, antes, operações interbancárias não sujeitas a Imposto do Selo. Acrescenta que é errónea a interpretação, que atribui à Requerida, de que as operações isentas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) estão necessariamente sujeitas a Imposto do Selo.

 

Em relação às TMI, o Requerente, além de considerar que não está em causa a contraprestação por serviços financeiros entre bancos, preconiza, sem conceder, que ainda que assim se entendesse, apenas o montante líquido poderia receber a qualificação de comissão, e não, como fez a Requerida o montante bruto, ignorando desta forma a natureza/função de reequilíbrio daquela taxa na repartição dos custos nas relações interbancárias.

No tocante às operações efetuadas junto de caixas automáticas ATM’s, para o Requerente, estas traduzem uma mera cooperação material, uma relação de facto. Não são criados quaisquer vínculos contratuais, seja entre o banco detentor do ATM e o titular do cartão, seja entre o banco detentor do ATM e o banco emissor do cartão. As quantias pagas pelo banco emitente ao banco detentor do ATM não correspondem à remuneração de uma prestação de serviços financeiros, antes decorrem de convenção interbancária de colaboração recíproca e visam repartir os custos associados à tecnologia utilizada para pôr à disposição dos clientes operações automatizadas, não estando previstas na verba 17.3.4 da TGIS com a consequente não sujeição a Imposto do Selo.

 

Sem conceder, e à semelhança do acima referido para as TMI, o Requerente defende que caso as taxas em análise estivessem sujeitas a Imposto do Selo, apenas a compensação líquida poderia assumir relevância e não todos os feixes multilaterais de taxas interbancárias.

 

O Requerente invoca também a fundada dúvida sobre o facto tributário e a sua quantificação como fundamento para a anulação parcial das liquidações em crise, ao abrigo do artigo 100.º, n.º 1 do CPPT.

 

Sem prescindir, suscita a inconstitucionalidade da norma constante da verba 17.3.4 da TGIS por violação do princípio da capacidade contributiva – v. artigos 103.º e 104.º da Constituição – quando aquela seja interpretada no sentido de incluir a TMI e as Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de ATM’s, por não existir uma realidade económica de base que a sustente, uma vez que se está perante a de mera compensação de custos de processamento das operações em causa.

 

Adicionalmente, de acordo com o Requerente, verifica-se erro de quantificação relativamente a cobranças de valor unitário inferior a € 0,125, sobre as quais a aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4 da TGIS não resulta em qualquer valor a pagar. Neste âmbito, considera que até ao montante de € 0,1249 não está sujeito a Imposto do Selo, por força do arredondamento aplicável, pois o resultado é zero. Argumenta que o Euro está dividido em 100 subunidades – “cêntimos” – não sendo possível efetuar pagamentos inferiores a 1 cêntimo (0,1249€*4%=0,004996€=0,00€). O Imposto do Selo incide sobre atos individualizados e concretos (i.e., operação a operação), independentemente da sua forma de cobrança ou pagamento e não sobre o somatório ou agregado dessas operações (v. artigo 1.º, n.º 1 do respetivo Código). As operações em questão perfazem o total de € 1.975.114,38, de onde deriva Imposto do Selo liquidado em excesso na importância de € 79.311,82 (€ 1.975.114,38*4%).

 

Em relação aos juros compensatórios proporcionais às correções de Imposto do Selo contestadas na presente ação arbitral, que o Requerente estima no montante de € 149.394,59, este defende que os mesmos devem ser igualmente anulados, por não existir retardamento da liquidação, nos termos do artigo 35.º, n.º 1 da LGT.

 

Por fim, o Requerente peticiona a indemnização por prestação de garantia indevida, com suporte no artigo 53.º da LGT.

 

Posição da Requerida

 

            Relativamente à responsabilidade pelo pagamento do Imposto do Selo, a Requerida afasta o entendimento de que não seria exigível ao Requerente em virtude de, até 23 de maio de 2017, não dever ser considerado o titular do interesse económico[1].

 

            Contrapõe que o Requerente é o sujeito passivo do imposto, sendo tal definição diferenciada da de “titular do encargo do imposto”, como ressalta do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea b) e 23.º, ambos do Código do Imposto do Selo (v. ainda os artigos 9.º, n.º 1, 41.º, 43.º e 44.º, n.º 1 do mesmo diploma). Deste modo, não se está perante um caso de substituição tributária sem retenção, situação em que a prestação tributária é exigida a pessoa diferente do contribuinte (v. artigos 20.º e 28.º da LGT), mas do fenómeno de repercussão tributária, atendendo a que:

  1. A prestação tributária foi exigida ao contribuinte, o Requerente, na qualidade de sujeito passivo do imposto; e
  2. O titular do encargo, que suporta economicamente o imposto, é diferente do sujeito passivo. 

                             

Sobre o erro de direito na interpretação do artigo 1.º, n.º 2 do Código do Imposto do Selo, a Requerida refuta que resulte da fundamentação do RIT que a liquidação efetuada se deva a ser aplicável a isenção de IVA. Afirma que as correções estão devidamente enquadradas no artigo 1.º, n.º 1 do Código do Imposto do Selo e na verba 17.3.4 da TGIS e que do mencionado artigo 1.º, n.º 2 deste Código se retira tão-só que, para evitar situações de dupla tributação, o legislador determinou que as mesmas operações não sejam tributadas cumulativamente em IVA e Imposto do Selo.

 

            Na perspetiva da Requerida, quer a TMI, quer as comissões interbancárias cobradas pela utilização de caixas automáticas ATM’s constituem contraprestações de serviços financeiros sujeitas a Imposto do Selo por enquadramento na verba 17.3.4 da TGIS, na redação conferida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março. Acrescenta que a respetiva base de incidência deve ser a totalidade do montante das comissões ou contraprestações cobradas pelas entidades financeiras, em conformidade com o teor da referida verba em conjugação com os artigos 1.º, n.º 1, 5.º, n.º 1, alínea h) e 9.º n.º 1, todos do Código do Imposto do Selo, e não um valor líquido resultante de compensação dos “feixes multilaterais” das taxas interbancárias.

 

            Quanto à alegada inconstitucionalidade da verba 17.3.4 da TGIS a Requerida defende que a cobrança de taxas e comissões consubstancia um incremento patrimonial na esfera do Requerente, demonstrativo da sua capacidade contributiva, pelo que não ocorre a violação deste parâmetro constitucional.

 

            Defende ainda que o Requerente não conseguiu provar, como lhe competia ao abrigo do artigo 74.º, n.º 1 da LGT, que a cobrança das comissões de valor inferior a € 0,125 ocorreu operação a operação e que procedeu à emissão de faturas de valores iguais ou inferiores a € 0,125, até porque a cobrança deve ser feita apenas no fecho do TPA, momento gerador da obrigação de imposto, e não por conta de cada movimento individual. Tendo em conta que o Requerente cobra a comissão pela totalidade das transações do dia (ou dias), e não sobre cada transação, para efeitos de Imposto do Selo o relevante é o total sobre o qual incide a comissão (v. parte final da verba 17.3.4 da TGIS e artigo 5.º, n.º 1, alínea h) do Código do Imposto do Selo).

 

            Conclui serem devidos os juros compensatórios liquidados, discordando do cálculo do Requerente sobre a parcela de juros atribuível à liquidação de Imposto do Selo impugnada na presente ação, que assenta numa proporção quantitativa (regra de “três simples”), quando devia ter sido efetuado mês a mês por forma a respeitar os diferentes números de dias de contagem de cada ato de liquidação de juros.

 

II.        Saneamento

 

O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria para conhecer dos atos de liquidação de Imposto do Selo e juros compensatórios correlatos, atenta a conformação do objeto do processo (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, contado da data limite de pagamento do imposto, fixada em 31 de maio de 2021, tendo a presente ação sido proposta em 30 de agosto de 2021.

 

Não foram identificadas nulidades ou questões que obstem ao conhecimento do mérito.

 

            III.      Fundamentação de Facto

 

            1.         Matéria de Facto Provada

 

            Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos:

 

  1. O Banco A..., S.A., aqui Requerente, é uma instituição de crédito que se dedica à atividade de comércio bancário e está sujeito à supervisão do Banco de Portugal, nos termos do disposto no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (“RGICSF”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, na redação vigente à data dos factos [2017] – cf. Relatório de Inspeção Tributária constante do PA (“RIT”).
  2. No âmbito da sua atividade o Requerente procede à concessão de crédito, conceção, emissão e comercialização de cartões de pagamento e outros serviços especializados, e é credor de comissões e outras contraprestações – cf. RIT.
  3. O Requerente é sujeito passivo de Imposto do Selo, de acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea b) do respetivo Código, cabendo-lhe a responsabilidade pela cobrança, receção e entrega nos cofres do Estado das importâncias deste imposto devidas pelas operações sujeitas, e não isentas, em que intervém, em conformidade com os artigos 23.º, 41.º e 44.º, todos do Código do Imposto do Selo – cf. RIT.
  4. O Requerente foi objeto de um procedimento inspetivo ao período de tributação de 2017, de âmbito parcial, abrangendo o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) e o Imposto do Selo, de acordo com os critérios de seleção das empresas acompanhadas pela Unidade dos Grandes Contribuintes (“UGC”), ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2020..., de 14 de setembro de 2020 – cf. RIT.
  5. No decurso do procedimento inspetivo, o Requerente facultou diversos ficheiros que contêm o detalhe de valores de compras no total de € 1.923.715,98 e de pagamentos de serviços no total de € 51.398,40 realizados através de TPA e de ATM’s cujo valor unitário, i.e., operação a operação, gera comissões inferiores a € 0,125, tendo a AT concluído quanto aos primeiros ascenderem ao valor superior de € 1.931.397,02 – cf. RIT e PA.
  6. Na sequência do exame realizado pelos Serviços de Inspeção Tributária, o Requerente foi notificado para exercer o direito de audição sobre a proposta de correções em sede de IRC e de Imposto do Selo, o que fez, por escrito, em 7 de abril de 2021, estando em causa na presente ação apenas a matéria do Imposto do Selo – cf. RIT e PA.
  7. Após exercício do direito de audição, o Requerente foi notificado do relatório final de inspeção tributária (“RIT”), que manteve as correções de Imposto do Selo sintetizadas no quadro seguinte – cf. RIT:

Resumo das correções efetuadas pelos SIT no Relatório de Inspeção

Descrição

Montante

Taxa de serviço do Comerciante

€ 489.603,07

Taxa multilateral de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM’s

€ 1.020.060,37

Total

€ 1.509.663,44

 

  1. De acordo com o RIT, constituem fundamentos das correções de Imposto do Selo os que, de seguida, se transcrevem na parte relevante para a apreciação da matéria em discussão nos presentes autos:

“[…]

III.2 – Imposto em Falta

III.2.1 – Imposto do Selo – IS

[…]

III.2.1.2 – Taxa multilateral de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM (n.º 1 do art.º 1.º, n.º 1 do art.º 9.º e n.º 1 do art.º 22.º, todos do CIS e verba 17.3.4 da TGIS)

€ 1.020.060,37

Para validar a liquidação de Imposto do Selo sobre a comissão designada por Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) também conhecida por Multilateral Interchange Fee, bem como sobre as comissões cobradas pelos bancos detentores das caixas automáticas (adiante também designadas por caixas multibanco ou ATM) aos bancos emissores de cartões bancários, relativamente às operações com cartões bancários, efetuadas pelos clientes dos bancos emissores dos cartões nos ATM, foram solicitados ao A... diversos elementos […]

Posteriormente, em 2021-02-03 o A.entregou um requerimento junto da Unidade dos Grandes Contribuintes, com o qual anexou uma pendrive com informação adicional relativa ao ponto 9.2 do pedido de elementos n.º 1, no qual evocou o que se transcreve:

«Indicam-se de seguida os ficheiros incluídos na pendrive por referência aos pontos 9.1. e 9.2 do pedido de Elementos n.º 1, bem como a redução da base tributável, em sede de IS, que na opinião da Requerente resulta da informação contida nos referidos ficheiros por referência a cada um desses pontos do Pedido de elementos n.º 1.

Ponto 9.2. - Utilização dos serviços de pagamento através dos TPA — Compras

  1. Montante correspondente a IFs de valor unitário inferior a 0,125 €, sobre as quais da aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4 da Tabela Geral não resulta qualquer Imposto do Selo a pagar:

Compras_lnf12JAN_Det a Compras_Inf12DEZ_Det (foi necessário criar 12 ficheiros, um por mês)

Compras_lnf12_Totais: Eur 1.923.715,98

  1. Montante correspondente a IFs cobrada a entidades isentas de Imposto do Selo (em especial CCAMs e C...) entre os dias de janeiro e 23 de maio de 2017 (cfr. alterações ao artigo 3.º do Código do Imposto do Selo, decorrentes da Lei n.º 22/2017, de 23 de Maio):

Compras_MBCCAM_Det

Compras_MBCCAM_Totais. Eur 212.983,16

Compras_Não MB CCAM_DET

Compras_Não MB CCAM_Totais: Eur 232.107,16

Compras_MG Det

Compras_MG Totais: Eur 246.838,34

  1. Montante de IFs autocobradas, as quais não correspondem a qualquer operação tributável, por serem operações realizadas entre o Requerente e ele próprio:

Compras_MB Autocobradas_Det

Compras_MB Autocobradas_Totais: Eur 410.118,06

Compras Private Label_Det

Compras Private Label_ Totais: Eur 227.661,10

Ponto 9.2. - Utilização dos serviços de pagamento através dos TPA — Pagamento

  1. Montante de IFs autocobradas, as quais não correspondem a qualquer operação tributável, por serem operações realizadas entre o Requerente e ele próprio:

Pag_Serv_TPA_AUTO-Det

Pag_Serv_TPA_AUTO_Totais: Eur 18.663,70

  1. Montante correspondente a IFs de valor unitário inferior a 0,125 €, sobre as quais da aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4 da Tabela Geral não resulta qualquer Imposto do Selo a pagar:

Pag_Serv_TPA_Inf12-Det

Pag_Serv_TPA_Inf12_Totais: Eur 51.398,40

Após análise da informação contida nos ficheiros facultados pelo banco, através dos pontos 3 a 5 do pedido de elementos n.º 5 solicitaram-se os seguintes elementos adicionais:

«3. No que diz respeito aos ficheiros denominados “Compras_Inf12JAN_Det a Compras_Inf12DEZ_Det” e “Pag_Serv_TPA_Inf12_Det”, referentes a IF de valor unitário inferior a €0,125, nos montantes de € 1.923.715,98 (compras) e € 51.398,40 (pagamento de serviços), respetivamente, apresentar:

  1. Uma fatura (ou documento equivalente) que comprove a cobrança individualizada das IF inferiores a € 0,125 com referência às seguintes operações:

Ficheiro “Compras Inf12FEV Det”

3.1.1.   Operação referente ao proprietário com o código 5973202 (“TALHOS...”), realizada no dia 18 de fevereiro às 11h58, no valor de € 0,11;

Ficheiro “Compras Inf12JUN Det”

3.1.2.   Operação referente ao proprietário com o código 6544192 (“...DIAS...”), realizada no dia 30 de junho, às 18h08, no valor de € 0,08;

Ficheiro “Pag_Serv_TPA_Inf12_Det”

3.1.3.   Operação referente ao proprietário com o código 9465643 (“...- 4435-208 RIO TINTO”), realizada no dia 10 de fevereiro às 19h05 no valor de € 0,12;

3.2. Discriminação mensal das bases tributáveis referidas no ponto 3;

[…]

Quanto aos montantes invocados pelo A... como sendo correspondentes a comissões (IF) de valor unitário inferior a € 0,125, relativos a compras e pagamentos de serviços, cobradas pelo A... a outras Instituições Financeiras, enquanto emissor dos cartões utilizados nos TPA daquelas, nos valores globais de € 1.931.397,02 e € 51.398,40, respetivamente, refira-se que o banco não apresentou faturas ou documentos equivalentes que comprovassem a cobrança individualizada, operação a operação, das IF inferiores a € 0,125, com referência às operações selecionadas dos ficheiros apresentados pelo banco na pendrive, denominados “Compras_lnf12FEV_Det”, “Compras_Inf12JUN_Det” e “Pag_Serv_TPA_Inf12Det”.

Em resposta ao solicitado no ponto 9.3 (operações realizadas através dos Caixas Automáticos (ATM) detidos pelo A...), apresentou a seguinte informação, refletida nos dois (2) quadros que se seguem:

 

Conta

Contabilística

Acumulado

Conta

Valor mensal conta

jan-17

8139920

759.971,95

759.971,95

fev-17

8139920

1.429.838 73

669.866,73

mar-17

8139920

2.228.616,37

798.777,64

abr-17

8139920

2.962.317,95

733.701,58

mai-17

8139920

3.854.084,93

891.766,98

jun-17

8139920

4.673.107,42

819.022,49

jul-17

8139920

5.558.855,43

885.748,01

ago-17

8139920

6.454.072,41

895.216,98

set-17

8139920

7.233.183,43

779.111,02

out-17

8139920

8.067.200,09

834.016,66

nov-17

8139920

8.843.352,39

776.152,30

dez-17

8139920

9.644.305,41

800.953,02

 

Total

9.644.305,41

9.644.305,41

 

 

 

 

Conta

Contabilística

Acumulado

Conta

Valor mensal conta

jan-17

8139924

627.144,08

627.144,08

fev-17

8139924

1.166.980,44

539.836,36

mar-17

8139924

1.813.962,10

646.981,66

abr-17

8139924

2.387.838,78

573.876,68

mai-17

8139924

3.072.298,47

684.459,69

jun-17

8139924

3.669.630,27

597.331,80

jul-17

8139924

4.302.894,15

633.263,88

ago-17

8139924

4.914.001,50

611.107,35

set-17

8139924

5.489.673,79

575.672,29

out-17

8139924

6.115.320.71

625.646,92

nov-17

8139924

6.737.828,73

622.508,02

dez-17

8139924

7.353.150,30

615.312,57

 

Total

7.353.150,30

7.353.150,30

 

Assim, o total das comissões cobradas no ano de 2017, registadas nas duas rubricas contabilísticas 8139920 e 8139924, ascendeu a € 16.997.455,71.

Em complemento à resposta ao ponto 9.3 teceu os seguintes comentários:

«Fazemos, contudo, notar que a informação acima indicada não considera os seguintes dados, que não nos foi possível apurar até este momento, mas que pretendemos transmitir-vos ainda durante a inspeção tributária em curso – discriminação, dentro do valor acima indicado, dos montantes que correspondem às seguintes realidades:

  1. Montante correspondente a IFs de valor unitário inferior a 0,125 € sobre as quais da aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral não resulta qualquer Imposto do Selo a pagar;

[…]”

Contudo, até à data deste projeto de relatório, o banco não apresentou qualquer informação adicional relativamente às realidades mencionadas nos pontos 1, 2 e 3 da sua resposta ao ponto 9.3.

Em resposta aos pontos 9.4 e 9.5 o banco indicou que: «Tendo o Banco A... considerado, no exercício em questão, que as taxas discriminadas, se encontram fora do âmbito de incidência de imposto do selo, não foi efetuado qualquer cálculo relativo ao apuramento do imposto correspondente.

Note-se que a legislação tributária não prevê qualquer obrigação de cálculo de imposto sobre realidades não sujeitas. Nesse sentido, não é possível providenciar o cálculo solicitado.»

 Quanto à solicitação formulada no ponto 9.6, nomeadamente indicação das contas de rédito e apresentação de um exemplo de contabilização, o banco indicou o que de seguida se expõe.

Relativamente às comissões em referência no ponto 9.2 (cobradas pelo A... enquanto emitente de cartões, aos adquirentes ou “acquirers”, relativas a à utilização dos serviços de pagamento através dos TPA) o banco indicou o que se transcreve: «enviamos um exemplo de 2017: Data da Transacção 2017-06-28; Nº cartão...; Montante da Transacção 135,00€; Montante de IF recebido pelo A...: 0,27€. A IF em vigor à data é de 0,2% do valor da compra.»

[…]

No que diz respeito às operações realizadas através dos Caixas Automáticos (ATM) detidos pelo A..., apresentou o seguinte documento como sendo “Exemplo de contabilização e faturação do ponto 9.3”:

[…]

Em resposta ao ponto 9.7, informou que «O Banco A... considera que as realidades em causa não se encontram sujeitas a Imposto do Selo, por corresponderem, nalguns casos, à diferença entre o preço de aquisição dos créditos adquiridos a comerciantes no âmbito do circuito dos Terminais de Pagamento Automático e o valor de revenda desses mesmos créditos às entidades emitentes dos meios de pagamento usados nos referidos TPA, e, noutros, a comissões por serviços que não se encontram sujeitos a esse imposto.»

Face a todo o exposto, apresentam-se no quadro abaixo um resumo mensal de todas as comissões em causa, registadas nas contas de registo contabilístico antes referenciadas:

 

 

 

 

Mês

IF Cobrada

(TPA)

# 813500 e # 813501

IF cobrada

Levantamentos

ATM – OIC

# 8139920

(3)

IF cobrada

Pagamentos e Operações em

ATM – OIC

# 8139924

(4)

 

 

Total Comissões

(5)=(1)+(2)+(3)+(4)

IF Compras

(1)

IF Pagamento de Serviços

(2)

janeiro

646.513,33

28.319,68

759.971,95

627.144,08

2.061.949,04

fevereiro

542.957,76

24.891,72

669.866,78

539.836,33

1.777.552,62

março

638.188,70

28.797,88

798.777,64

646.981,66

2.112.745,88

abril

612.977,89

24.220,75

733.701,58

573.876,68

1.944.776,90

maio

713.368,95

27.155,53

891.766,98

684.459,69

2.316.751,15

junho

685.887,31

24.954,76

819.022,49

597.331,80

2.127.196,36

julho

758.729,83

26.801,22

885.748,01

633.263,88

2.304.542,94

agosto

727.983,03

25.495,82

895.216,98

611.107,35

2.259.803,18

setembro

667.597,78

24.799,97

779.111,02

575.672,29

2.047.181,06

outubro

702.977,21

25.133,84

834.016,66

625.646,92

2.187.774,63

novembro

693.636,23

24.233,74

776.152,30

622.508,02

2.116.530,29

dezembro

804.459,19

23.971,34

800.953,02

615.321,57

2.244.705,12

Total

8.195.277,21

308.776,25

9.644.305,41

7.353.150,30

25.501.509,17

 

Estamos assim perante comissões auferidas pelo sujeito passivo na qualidade de emitente de cartões de crédito e débito (no caso dos TPA) ou de detentor de caixas automáticos (no caso dos ATM), com a particularidade de que as contrapartes nas operações são instituições financeiras, pelo que importa antes de tudo fazer o enquadramento fiscal destas operações.

O A..., conforme já referido, não liquidou Imposto do Selo sobre qualquer uma destas comissões, nem efetuou o apuramento do imposto sobre as mesmas conforme solicitado, caso não tivesse considerado que as comissões referidas nos pontos (...), 9.2. e 9.3, estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto.

Atenta a matéria de facto acima descrita, estamos perante comissões com a particularidade de que as contrapartes nas operações são instituições financeiras. Assim e por forma a ter uma melhor compreensão das comissões “multilateral interchange fee” (ou taxa multilateral de intercâmbio) – taxa cobrada pelo emissor dos cartões bancários [A...] ao detentor banco de apoio terminal do TPA – e das comissões/taxas cobradas pelo detentor dos ATM [A...] ao banco emissor do cartão bancário (relativamente às operações efetuadas com cartões bancários junto dos referidos ATM, pelos clientes do banco emissor do cartão bancário), dever-se-ão ter presentes os seguintes aspetos:

A) Terminais de Pagamento Automático (TPA) e Caixas automáticos (CA)

O Banco de Portugal (BdP) como entidade de supervisão e de regulação das instituições de crédito e outras entidades financeiras, publicou no seu sítio na área de “Publicações” os “Cadernos do Banco de Portugal” que têm por finalidade exclusiva prestar informações específicas do setor bancário ao público em geral, o Caderno n.º 10, intitulado “Terminais de Pagamento e Caixas Automáticos”

A1) Terminais de Pagamento Automático (TPA)

Naquele documento consta a definição de Terminal de Pagamento Automático como «(…) um dispositivo de aceitação de cartões que permite realizar pagamentos por via eletrónica. Efetua a leitura dos dados do cartão para autorização da operação e recolha dos elementos da transação para processamento. Possibilita ainda a autenticação eletrónica da operação (digitação do código secreto) e a emissão de talões com informações sobre os dados da transação.».

Em traços gerais, trata-se de um terminal que permite fazer pagamentos por via eletrónica em estabelecimentos comerciais, através de cartões bancários, em alternativa ao pagamento através de numerário.

Nessa publicação, o Banco de Portugal vem esclarecer a forma como é efetuado um pagamento no TPA, passando pelas seguintes etapas:

1.  O titular do cartão dá uma ordem de pagamento relativa à liquidação de uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA, que autentica através da marcação de um código secreto ou assinatura;

2.  A informação é transmitida pelo adquirente (ou “acquirer”) ao emissor do cartão, pedindo a respetiva autorização;

3.  O emissor do cartão dá uma “garantia” de pagamento através de uma autorização;

4.  O adquirente paga ao comerciante e cobra-lhe uma comissão, chamada de “taxa de serviço do comerciante”,

5.  O adquirente é depois reembolsado pelo emissor do cartão e paga-lhe uma comissão intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (ou “multilateral interchange fee”);

6.  O emissor do cartão cobra o valor da transação ao titular do cartão.

Por igualmente abordar esta matéria e entrecruzar-se com os conceitos aqui abordados, recordamos o disposto no Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015, relativo às taxas de intercâmbio aplicáveis a operações de pagamento baseadas em cartões que «deverá aplicar-se à emissão e aceitação de operações de pagamento com cartões a nível transfronteiriço e nacional». (cfr. preâmbulo, Ponto 15).

O Regulamento (UE) 2015/751 estabelece uma definição para esta taxa multilateral de intercâmbio. Assim, no n.º 10 do seu art.º 2.º podemos ler que «taxa de intercâmbio» consiste numa «(…) taxa paga direta ou indiretamente (ou seja, através de terceiros), por cada operação realizada entre o emitente e o adquirente das operações de pagamento baseadas em cartões. A compensação líquida ou qualquer outra remuneração acordada faz parte da taxa de intercâmbio.»

De acordo com o ponto 10 do preâmbulo do Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015 «As taxas de intercâmbio são habitualmente aplicadas entre os prestadores de serviços de pagamento adquirentes e os prestadores de serviços de pagamento emitentes de cartões pertencentes a um determinado sistema de pagamento com cartões. As taxas de intercâmbio constituem uma parte importante das taxas cobradas aos comerciantes pelos prestadores de serviços de pagamento adquirentes por cada operação de pagamento associada a um cartão. Por sua vez, os comerciantes incorporam esses custos do cartão, tal como todos os seus outros custos, nos preços dos bens e serviços.»

A cobrança deste tipo de comissão nasce no âmbito de operações de pagamento baseadas em cartões suportadas nos dois principais modelos de negócio, os chamados sistemas tripartidos de pagamento com cartões (titular do cartão-adquirente e emitente-comerciante) e sistemas quadripartidos de pagamento com cartões (titular do cartão-banco adquirente-banco emitente-comerciante).

O ponto 29 do preâmbulo do citado Regulamento refere que «[o] serviço de emissão baseia-se numa relação contratual entre o emitente do instrumento de pagamento e o ordenante, independentemente da circunstância de o emitente deter ou não os fundos em nome do ordenante. O emitente coloca cartões de pagamento à disposição do ordenante, autoriza a realização de operações em terminais ou dispositivos equivalentes e pode garantir ao adquirente o pagamento das operações que estejam em conformidade com as regras do sistema em causa. Por conseguinte, não constitui emissão a mera distribuição de cartões de pagamento ou a prestação de serviços técnicos, tais como o mero processamento e armazenamento de dados.»

O emitente, neste âmbito, é claramente um prestador de serviços de pagamento (cfr. n.º 24 do art.º 2.º do Regulamento já citado).

A2) Caixas Automáticos (CA)

Um Caixa Automático (CA), também vulgarmente designado de ATM, de acordo o Caderno n.º 10 – “Terminais de pagamento e Caixas Automáticos”, do Banco de Portugal, é «um terminal de uma rede do sistema bancário que permite ao cliente efetuar diversos tipos de opera em regime de autosserviço, sem necessidade de recorrer aos balcões das agências bancárias.

Os Caixas Automáticos permitem que operações correntes, como levantamentos, consultas, pagamentos e depósitos, ou outras operações normalmente realizadas junto do caixa do banco, possam ser realizadas pelos clientes, mesmo que o banco não esteja aberto. Isso possibilita o acesso a esses serviços de forma mais rápida e cómoda, evitando filas de espera nos balcões.»

«Em Portugal existem dois tipos de CA: os pertencentes a redes partilhadas (como a Rede Multibanco) e os pertencentes a redes privativas. Nos CA de redes partilhadas, o acesso faz-se através de um cartão de pagamento de uma marca aceite no terminal (Multibanco, American Express, Maestro, MasterCard, Visa, Visa Electron, entre outros), emitido por qualquer entidade devidamente autorizada para tal. Na maioria das operações é exigida a introdução do código secreto.

Nos CA pertencentes a redes privativas, a utilização é restrita aos clientes do banco proprietário do Caixa Automático, podendo o acesso ser efectuado através de um cartão emitido pelo próprio banco ou, em alguns bancos e para alguns CA, através de caderneta. Na maioria das operações é exigida a introdução do código secreto.»

Refira-se que no Glossário do Banco de Portugal, consta, para Caixa Automático, a seguinte definição: «Equipamento automático que permite aos titulares de cartões bancários com banda magnética e/ou chip aceder a serviços disponibilizados a esses cartões, designadamente, levantar dinheiro de contas, consultar saldos e movimentos de conta, efetuar transferências de fundos e depositar dinheiro. Os caixas automáticos podem funcionar em sistema real-time, com ligação ao sistema automático da entidade emitente do cartão, ou em on line, com acesso a uma base de dados autorizada que contém informação relativa à conta de depósitos à ordem associado ao cartão de débito.»

B) Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee e Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de caixas automáticos em operações efetuadas com cartões bancários

Na continuidade das operações de pagamento de compras realizados através de TPA - conforme já se referiu, - o adquirente (ou "acquirer"), uma vez efetuado o pagamento da compra ao comerciante. é depois reembolsado pelo emissor do cartão bancário e paga-lhe uma comissão intitulada de Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee.

Por outro lado, existindo um pagamento (por exemplo, da água, da eletricidade, ou de qualquer outro bem e/ou serviço) efetuado através dos ATM, é cobrada uma comissão pelo banco detentor do ATM ao banco emissor do cartão bancário (seja de débito seja de crédito) pelo serviço prestado; e, de igual modo, quando o cliente de um banco procede ao levantamento de numerário numa caixa automática (ou ATM) pertencente a outro banco [banco detentor do ATM], este cobra uma comissão ao banco emissor do cartão bancário pelo serviço prestado com aquela operação. Estas são, pois, as comissões interbancárias cobradas pela utilização de CA em operações de pagamentos com cartões, de levantamentos de numerário, de consultas de saldos ou de movimentos, de carregamentos telemóveis, de compra de bilhetes, de adesões a serviços, etc.

C) Enquadramento em sede de IVA das comissões em apreço [Taxa Multilateral de Intercâmbio (TMI) ou Multilateral Interchange Fee e Interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações efetuadas com cartões bancários]

Sendo o IVA um imposto geral sobre o consumo que pretende tributar toda a atividade económica, então as operações bancárias e financeiras - que pela sua natureza são normalmente desenvolvidas por entidades bancárias: prestações de serviços exercidas/efetuadas por sujeitos passivos - são operações sujeitas a IVA.

Relativamente às operações financeiras, «(…) a regra acolhida no regime comum do IVA, constante do artigo 13.º, B, alínea d) da Sexta Diretiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, transposta para o direito português através do n.º 28 [atual alínea 27)] do artigo 9.º do Código do IVA, é a da isenção, sem direito a dedução do imposto suportado a montante»

Assim, o [então] art.º 13.º, ponto B, da Sexta Diretiva prevê:

«Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados-Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:

(…)

d) As seguintes operações:

  1. A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
  2. A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu esses créditos;
  3. As operações, incluindo a negociação relativa a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dívidas;
  4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção de moedas e notas de coleção; consideram-se de colecção as moedas de ouro de prata ou de outro metal, e bem assim as notas, que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentam um interesse numismático;
  5. As operações, incluindo a negociação, mas excetuando a guarda e a gestão, relativas às acções, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão:

- dos títulos representativos de mercadorias,

- dos direitos ou títulos referidos no n.º 3 do art.º 5.º;

  1. A gestão de fundos comuns de investimento, tal como são definidos pelos Estados membros;».

A então alínea d) do ponto B, do art.º 13.º da Sexta Diretiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de maio de 1977, passou a constar nas alíneas b) a g) do n.º 1 do art.º 135.º do Capítulo 3 – “Isenções em benefício de outras entidades” da Diretiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro, relativa ao sistema do imposto comum sobre o valor acrescentado.

«1. Os Estados-Membros isentam as seguintes operações:

  1. A concessão e a negociação de créditos, e bem assim a gestão de créditos efetuada por parte de quem os concedeu;
  2. A negociação e a aceitação de compromissos, fianças e outras garantias, e bem assim a gestão de garantias de crédito efetuada por parte de quem concedeu o crédito;
  3. As operações, incluindo a negociação relativas a depósitos de fundos, contas-correntes, pagamentos, transferências, créditos, cheques e outros efeitos de comércio, com exceção da cobrança de dívidas;
  4. As operações, incluindo a negociação, relativas a divisas, papel-moeda e moeda com valor liberatório, com exceção das moedas e notas de coleção, nomeadamente as moedas de ouro, prata ou outro metal, e bem assim as notas que não são normalmente utilizadas pelo seu valor liberatório ou que apresentem um interesse numismático;
  5. As operações, incluindo a negociação, excluindo a guarda e gestão, relativas às ações, participações em sociedades ou em associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias, os direitos ou títulos referidos no n.º 2 do artigo 15.º;
  6. A gestão de fundos comuns de investimento, tal como definidos pelos Estados-Membros;»

A redação deste preceito – quer da Diretiva 77/388/CEE quer da Diretiva n.º 2006/112/CE – teve assim correspondência na alínea 27) [anterior n.º 28)) do art.º 9.º do CIVA.

O referido normativo do CIVA [alínea 27) do art.º 9.º] identifica as operações bancárias e financeiras abrangidas pela isenção, referindo expressamente outras que lhes sendo próximas são delas excluídas", pelo que estão, assim, isentas do IVA, as «(…) operações seguintes:

  1. A concessão e a negociação de créditos, sob qualquer forma, compreendendo operações de desconto e redesconto, bem como a sua administração ou gestão efetuada por quem os concedeu;
  2. A negociação e a prestação de fianças, avales, cauções e outras garantias, bem como a administração ou gestão de garantias de créditos efetuada por quem os concedeu;
  3. As operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas;
  4. As operações, incluindo a negociação, que tenham por objeto divisas, notas bancárias e moedas, que sejam meios legais de pagamento, com exceção das moedas e notas que não sejam normalmente utilizadas como tal, ou que tenham interesse numismático;
  5. As operações e serviços, incluindo a negociação, mas com exclusão da simples guarda e administração ou gestão, relativos a ações, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, com exclusão dos títulos representativos de mercadorias e dos títulos representativos de operações sobre bens imóveis quando efetuadas por um prazo inferior a 20 anos;
  6. Os serviços e operações relativos à colocação, tomada e compra firmes de emissões de títulos públicos ou privados;
  7. A administração ou gestão de fundos de investimento;».

Em face do que antecede , temos de concluir que, quer a comissão intitulada “taxa multilateral de intercâmbio”, quer as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos ou ATM em operações efetuadas com cartões bancários, são prestações de serviços (remuneradas como comissões) enquadráveis na isenção prevista na subalínea c) da alínea 27) do art.º 9.º do CIVA, a qual isenta deste imposto as «(…) operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas».

D) Sujeição a Imposto do Selo da comissão Taxa Multilateral de Intercâmbio e das Comissões Interbancárias cobradas pela utilização de caixas automáticos

De acordo com o n.º 1 do art.º 1.º do Código do Imposto do Selo (CIS), «O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens».

Relativamente à incidência do Imposto do Selo, salienta-se que o próprio Preâmbulo do CIS, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, refere que «(…) a reforma de 2000 marcou uma tendência para a alteração de uma das suas mais ancestrais características, que de imposto sobre os documentos se tende a afirmar cada vez mais como imposto sobre as operações que, independentemente da sua materialização, revelem rendimento ou riqueza».

Por sua vez o n.º 2 do art.º 1.º do mesmo normativo estabelece que «Não são sujeitas a imposto as operações sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado e dele não isentas», afastando deste modo da incidência deste tributo as operações sujeitas ao IVA e dele não isentas.

Ou seja, na definição do âmbito de incidência do imposto do selo nas operações financeiras importa ter-se presente o disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Código, que no sentido evitar a sobreposição de tributações, afasta da incidência deste tributo as operações sujeitas ao IVA e dele não isentas.

Pelo que, em concreto, a comissão intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (TMI) e as comissões interbancárias em análise (cobradas pela utilização de Caixas Automáticos), encontram-se sujeitas a Imposto do Selo nos termos do n.º 1 do art.º 1.º do respetivo código (não sendo de aplicar o n.º 2 do art.º 1.º  do CIS).

Assim, constituindo normas de incidência objetiva do imposto de Selo as verbas previstas na Tabela Geral do Imposto da Selo (TGIS), importa primeiramente analisar as verbas aí constantes. E, dessa análise, rapidamente se conclui que a verba “17 – Operações financeiras”, mais concretamente a verba “17.3.4 – Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões”, prevê expressamente a incidência de Imposto do Selo em comissões cobradas nas operações realizadas por ou com a intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras.

Assim, como bem referem João Espanha e Marta Gaudêncio [“Sobre o Imposto do Selo: Algumas especificidades do Crédito ao Consumo” in Fiscalidade n.º 44, out-dez 2010, págs. 85-86] são sujeitas a imposto «(…) b) as comissões auferidas em razão da prestação de serviços financeiros; c) todas as demais contraprestações auferidas em razão da prestação de serviços financeiros, desde que as comissões e contraprestações selam relativas a operações praticada por instituições de crédito ou sociedades financeiras (e ainda entidades legalmente equiparadas e, bem assim, quaisquer outras instituições financeiras) ou por elas intermediadas».

Deste modo, a verba 17.3.4. da TGIS prevê expressamente a incidência de Imposto do Selo em comissões cobradas, nomeadamente as decorrentes das prestações de serviços financeiros (aqui em estudo) cobradas pelo A..., no caso em apreço:

  • As comissões cobradas pelo A..., enquanto entidade emissora dos cartões bancários, às entidades detentoras dos TPA;
  • As comissões cobradas por operações com cartões bancários efetuadas em Caixas Automáticos ou ATM do A... (comissões cobradas pelas entidades detentoras das Caixas Automáticos ou ATM às entidades emissoras dos cartões bancários).

Ainda a propósito da verba 17.3.4 da TGIS, convém referir que «diversamente do que dispunha o artigo 120-A da Tabela anterior, que limitava o âmbito de incidência às comissões, a norma atual alarga-o, pois, a todas e quaisquer contraprestações por serviços financeiros, desde que, naturalmente, não se trate de serviços sujeitos ao imposto sobre o valor acrescentado e não isentos deste imposto». [Vide Mateus, J. Silvério; Freitas, L. Corvelo de (2005) “Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo”, Engifisco, p. 739]

Estando preenchidos tanto o pressuposto de natureza objetiva que se prende com a natureza de “serviços financeiros” atribuída às comissões aqui em crise, como o pressuposto de natureza subjetiva que tem a ver com a qualificação de “instituição de crédito” que resulta do art.º 3.º do RGICSF, de que gozam os prestadores de serviços de pagamento/transferências (instituições de crédito e instituições de pagamento), não subsistem quaisquer dúvidas de que encontram cabimento na verba 17.3.4 – “Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões”, da TGIS.

Estando sujeitas a Imposto do Selo, também se dirá que estas comissões não se encontram isentas.

Com efeito, no que respeita a estas comissões, estando as mesmas sujeitas à verba 17.3.4 da TGIS como vimos supra, às mesmas não é aplicável a isenção a que alude a alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS na medida em que as comissões em apreço, embora cobradas por e entre bancos não estão diretamente relacionadas com a concessão de crédito entre eles.

De facto, quanto ao alcance da alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º do CIS, o mesmo vai no sentido de que só estarão isentos de Imposto do Selo aqueles juros e comissões que estejam «diretamente ligadas a operações de concessão de crédito, no âmbito de atividade exercida palas instituições e entidades referidas naquele normativo.»

No que diz respeito especificamente às operações de pagamento baseadas em cartões, previstas na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo, a nova redação da alínea h) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS, introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, com entrada em vigor em 2017-05-24, clarifica que o titular do interesse económico são as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas, no caso aqui em discussão, o A... .

Assim, nos períodos mensais de tributação posteriores à data de entrada em vigor da nova redação da alínea h) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS introduzida peta Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, não se coloca a questão da divergência entre o titular de interesse económico, que tem o encargo do imposto e a pessoa que figura como sujeito passivo nas operações de pagamento baseadas em cartões.

No que concerne ao período anterior àquela alteração legislativa importa trazer à colação a alínea g) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS que considera titular do interesse económico nas «(…) restantes operações financeiras realizadas por ou com a intermediação de instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras, o cliente destas.».

Sobre a questão do interesse económico importa antes de mais referir que o A... enquanto instituição financeira de crédito, procede, no âmbito da sua atividade, à concessão de crédito, conceção, emissão e comercialização de cartões de pagamento e outros serviços especializados, e é credora de comissões e outras contraprestações, sendo sujeito passivo de Imposto do Selo, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 2.º do CIS, a quem compete a cobrança, a receção e a entrega nos cofres do Estado do imposto sobre todas as operações sujeitas a Imposto do Selo, nos termos dos art.ºs 23.º, 41.º e 44.º do CIS.

Assim, independentemente de se saber quem detém a titularidade do interesse económico da operação, é sobre o banco que recai o ónus de liquidar e é apenas a ele que a Autoridade Tributária e Aduaneira pode exigir o pagamento do imposto.

Por outro lado, de harmonia com o disposto na alínea h) do artigo 5.º  do CIS, nas operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas a obrigação tributária considera-se constituída no momento da cobrança das comissões e contraprestações, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira podia exigir o pagamento do Imposto do Selo.

Posto isto, a disposição legal prevista na alínea g) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS, não é obstáculo à exigência do imposto nos períodos mensais de tributação anteriores a 24 de maio de 2017, na medida em que, em caso de divergência entre o sujeito passivo do imposto e o titular do interesse económico que tem o encargo do imposto, o único responsável tributário, perante o Estado, pela falta de imposto liquidado é o sujeito passivo, no caso, o A... e não o repercutido ou o titular daquele interesse económico – este entendimento tem sido reforçado pela mais recente jurisprudência, nomeadamente pelas decisões arbitrais proferidas no âmbito dos processos 496/2017-T e 431/2018-T,

Face ao exposto, somos a concluir que:

  1. As comissões TMI (Taxa Multilateral de Intercâmbio) e as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações com cartões bancários, são comissões cobradas entre bancos [detentores de ATM ou emissores de cartões bancários);
  2. O A... não procedeu a qualquer liquidação de Imposto do Selo sobre as comissões TMI ou sobre as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticas em operações (como as acima descritas) efetuadas com cartões bancários;
  3. As comissões referidas no ponto 1, encontram-se isentas de IVA, nos termos da subalínea c) da alínea 27) do art.º 9.º do CIVA;
  4. Estão isentas de IVA e encontram-se sujeitas a Imposto do Selo, nos termos do n.º 1 e do n.º 2 do art.º 1 .º do CIS;
  5. Nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 2.º do CIS – “Incidência subjetiva”, são sujeitos passivos de imposto as «Entidades concedentes do crédito e da garantia ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações», competindo-lhes pelo n.º 1 do art.º 23.º, 41.º, 43.º e n.º 1 do art.º 44.º , todos do CIS, a sua liquidação e entrega nos cofres do Estado;
  6. De acordo com o disposto no n.º 1 e na alínea g) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS, nas «(…) restantes operações financeiras realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras...» , quem suporta o encargo do imposto é o cliente (neste caso os comerciantes que utilizam o Serviço de Pagamento Automático) na medida em que é o titular do interesse económico [para os períodos mensais de tributação anteriores à entrada em vigor Lei n.º 22/2017, de 23 de maio que introduziu a nova redação da alínea h) do n.º 3 do art.º 3.º do CIS];
  7. A alínea h) do n.º 3 do art.º 3 do CIS com a nova redação introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, com entrada em vigor no dia 24 de maio de 2017, estabelece que nas «operações de pagamento baseadas em cartões, previstas na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo, as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas», neste caso o A...;
  8. Por sua vez, ao abrigo da alínea h) do n.º 1 do art.º 5.º do CIS, o nascimento da obrigação tributária ocorre nas «(...) operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas, no momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações (…);
  9. Nos termos do n.º 1 do art.º 9.º do CIS, o valor tributável de Imposto do Selo é o que resulta da TGIS;
  10. O n.º 1 do art.º 22.º do CIS, remete as taxas de imposto para a TGIS;
  11. As comissões TMI e as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos em operações com cartões (como as acima referidas) têm pleno cabimento na verba 17.3.4 da TGIS;
  12. As comissões acima referidas não se encontram abrangidas pela isenção contemplada na alínea e) do n.º 1 do art.º 7.º  do CIS.

Face ao que antecede, na medida em que, conforme supra referido, questionado sobre se, relativamente ao ano de 2017, liquidou Imposto do Selo sobre o valor das comissões acima referidas o A... respondeu que aquelas comissões se encontravam excluídas de tributação em sede de Imposto do Selo, e uma vez que, conforme acima demonstrado, o A... deveria ter liquidado Imposto do Selo relativamente as estas comissões, foi, ao abrigo do princípio de colaboração plasmado nos números 1 e 4 do art.º 59.º da Lei Geral Tributária e princípio de cooperação consagrado nos art.os 9.º e 48.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), convidado a apurar o montante de Imposto do Selo a liquidar mensalmente relativamente a estas comissões.

Com efeito, na medida em que os diversos elementos (dados/informações) que possibilitam o cálculo estavam na posse do A..., foi. solicitado ao sujeito passivo, relativamente às comissões em análise, que efetuasse uma discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Seto que o A... teria apurado, tendo por base a verba 17.3.4 da TGIS, caso não tivesse considerado que as comissões acima referidas estavam (i) isentas de Imposto do Selo ao abrigo do art.º 7.º do respetivo Código ou (ii) fora do âmbito de aplicação e/ou sujeição deste imposto.

Contudo o banco não procedeu à discriminação, por mês de cobrança, do valor do Imposto do Selo alegando que «Tendo o Banco A...considerado, no exercício em questão, que as taxas discriminadas, se encontram fora do âmbito de incidência de imposto do selo, não foi efetuado qualquer cálculo relativo ao apuramento do imposto correspondente. Note-se que a legislação tributaria não prevê qualquer obrigação de cálculo de imposto sobre realidades não sujeitas. Nesse sentido, não é possível providenciar o cálculo solicitado.»

Além disso, importa relembrar que. nas respostas ao pedido de elementos n.º 1, nas quais o A... apresentou a discriminação das comissões cobradas ao longo do ano de 2017 (ponto 9.2 - enquanto emitente de cartões, aos adquirentes, relativamente à utilização dos serviços de pagamento através dos TPA e ponto 9.3 - comissões referentes a operações realizadas através dos Caixas Automáticos (ATM) detidos pelo A..., relativamente aos quais é cobrada uma comissão pelo serviço prestado ao banco detentor do cartão bancário, relativas a pagamentos com cartões, alegou que a informação prestada em resposta aos referidos pontos não considerava as seguintes realidades;

1. Montante correspondente a IFs de valor unitário inferior a 0,125 €, sobre as quais da aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral não resulta qualquer Imposto do Selo a pagar;

2. Montante correspondente a IFs cobrada a clientes isentos de Imposto do Selo

3.  Montante correspondente a IFs autocobradas.”

O A... não apresentou, até à data do presente projeto de relatório, a discriminação que protestou juntar relativamente às operações em ATM (ponto 9.3 do pedido de elementos n.º 1).

No que concerne às comissões cobradas pelo A... enquanto emissor de cartões utilizados em TPA de outras Instituições Financeiras, o banco apresentou a informação adicional ao ponto 9.2 que protestara juntar, bem como os elementos complementares solicitados nos pontos 3 a 5 do pedido de elementos n.º 5.

Conforme descrito no início da presente correção e aqui se relembra, da análise a todos os elementos apresentados pelo banco relativos ao valor das comissões cobradas pelo A..., enquanto emitente de cartões, aos adquirentes ou "acquirers", relativas à utilização dos serviços de pagamento através dos TPA, concluiu-se que estavam reunidas condições para excluir da base tributável inicial as seguintes realidades invocadas pelo banco no requerimento apresentado junto da UGC em 2021-02-03:

  1. Montante correspondente a IF cobrada a entidades isentas de Imposto do Selo entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017 no valor global de € 691.928,66 (€ 212.983,16 + € 232.107,16 + € 246.838.34);
  2. Montante de IF relativas a Compras, autocobradas, no montante de € 637.779,14 (€410.118,04 10 + € 227.661,10); e
  3. Montante de IF relativas a pagamentos de serviços, autocobradas, no valor de € 18.663,70;

Quanto aos montantes invocados pelo A... no sobredito requerimento de 2021-02-03, como sendo correspondentes a IF de valor unitário inferior a € 0,125, relativas a compras e pagamentos de serviços, cobradas pelo A... a outras Instituições Financeiras, enquanto emissor dos cartões utilizados nos TPA daquelas, nos valores globais de € 1.931.397,02 [A importância considerada, apurada pela Inspeção Tributária, com os dados da discriminação mensal apresentada pelo A... em resposta ao ponto 3.2 do pedido de elementos n.º 5, diverge do valor indicado no requerimento (€ 1.923.715,98)] e € 51.398,40, respetivamente, refira-se que, para além de não ter indicado qualquer suporte normativo para aplicar a regra do arredondamento, de não existir qualquer regra de arredondamento em sede do Imposto do Selo, de não apresentar qualquer fatura ou documento equivalente ou outro elemento referente a comissões IF inferiores a € 0,125, o banco não demonstrou que procedeu à cobrança das comissões aqui em causa de forma individualizada, operação a operação.

Apenas a título informativo refira-se que as importâncias mencionadas no parágrafo anterior têm a seguinte discriminação mensal.

 

 

Mês

IF Compras

IF Pag Serv

janeiro

146.797,79

5.034,31

fevereiro

136.789,42

4.304,71

março

149.867,17

4.811,40

abril

152.778,58

4.085,66

maio

157.761,92

4.428,80

junho

161.315,14

4.107,63

julho

172.705,70

4.377,98

agosto

165.077,18

4.193,11

setembro

160.834,52

3.954,55

outubro

158.851,04

4.051,74

novembro

161.447,27

3.983,36

dezembro

207.171,29

4.062,15

Total

1.931.397,02

51.398,40

 

Sobre esta realidade importa clarificar a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Saliente-se antes de mais que estamos perante muitos milhares de operações diárias, pelo que, a cobrança destas comissões por cada operação não era de todo operacional, por essa razão, sendo as cobranças por valores acumulados, seria sobre estes valores que deveria ser liquidado o Imposto do Selo, tanto mais, para efeitos da cobrança de Imposto do Selo importa o momento da cobrança das comissões e não o do seu apuramento.

O entendimento da AT, de não excluir da base tributável do imposto a Interchange Fee de valor unitário inferior a € 0,125, sobre as quais da aplicação da taxa de 4% prevista na verba 17.3.4. da Tabela Geral não resulta qualquer Imposto do Selo a pagar, está alinhado com a posição doutrinal e jurisprudencial em torno desta matéria (aplicação da regra do arredondamento).

Desde logo, do mecanismo de liquidação e entrega do Imposto do Selo nos cofres do Estado resulta que, apesar do Imposto do Selo ser um imposto de obrigação única, não é seu objetivo ser liquidado e entregue nos cofres do Estado operação a operação, pois, do ponto de vista prático, tal não seria viável, tendo em conta o grande volume de operações sujeitas a Imposto do Selo liquidadas pelas Instituições Financeiras, designadamente o A... . Desta forma, o imposto a entregar ao Estado será sempre o somatório de todas as quantias de Imposto do Selo liquidadas em cada verba no âmbito de um conjunto de operações, e nunca operação a operação.

Destarte, já que, tendo em conta que as instituições financeiras praticam um elevado número de operações sujeitas a Imposto do Selo em cada verba, e o valor a inserir na guia corresponde ao somatório de todas as quantias, liquidadas e inseridas na respetiva verba, pelo que este valor nunca será inferior a € 0,01.

Pelo que, podemos concluir que o argumento apresentado pelo A... não tem relevância prática pelo facto de a entrega do Imposto do Selo ao Estado se processar através do somatório de todas as quantias liquidadas no âmbito das diversas operações inseridas em cada verba e por um certo período de tempo, tendo obrigatoriamente que ser entregue até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que a obrigação tributária se tenha constituído, não sendo, portanto, possível que ocorram situações em que o valor inserido na guia de pagamento seja inferior a € 0,01.

A este respeito, segundo a norma consagrada na alínea h) do n.º 1 do art.º 5.º do CIS, a qual estabelece que «Nas operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas», o nascimento da obrigação tributária ocorre «no momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações, considerando-se efetivamente cobrados, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 51.º, os juros e comissões debitados em contas correntes à ordem de quem a eles tiver direito», ou seja, ad normam «(…) a obrigação tributária considera-se constituída no momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações.

Ainda assim, consideram-se efetivamente cobrados, sem prejuízo da sua correcção [art. 51.º/1], os juros e comissões debitados em contas correntes à ordem de quem a eles tiver direito.

Por isso, o facto tributário e o momento da liquidação de imposto ocorrem no momento da efetiva cobrança dos juros, prémios ou comissões ou no momento do débito destes ao cliente e que haverá de corresponder ao momento em que os mesmos são creditados a favor da entidade credora.» [Vide Rocha, António Santos e Brás, Eduardo José Martins (2015) “Tributação do Património – IMI-IMT e IMPOSTO DO SELO (Anotados e Comentados)”, p. 566-567.]

Acrescenta-se ainda que, tendo presente a arguição do A..., a bene placito alínea h) do n.º 1 do art.º 5.º do CIS, «(…) nas operações financeiras a que se refere a Verba n.º 17.2 da Tabela (atual Verba n.º 17.3], realizadas pelas instituições na mesma referidas, (...), o facto tributário constitui-se no acto do recebimento dos juros, comissões e demais contraprestações. Para o efeito, segundo dispõe a parte final desta norma, consideram-se efectivamente cobrados os juros e comissões debitados em contas correntes à ordem de quem a eles tiver direito, independentemente do lançamento contabilístico anteceder ou não a sua efectiva cobrança. Em caso de anulação da operação ou redução do valor tributável, podem os sujeitos passivos efectuar a compensação do imposto nos termos previstos no n.º 1 do artigo 51.º» [Vide Mateus, J. Silvério; Freitas, L. Corvelo de (2005) “Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo”, Engifisco, p. 573]

Ora, conforme antes exposto e aqui se relembra, o A... em momento algum fez prova de que faturou, contabilizou ou cobrou, operação a operação, a Interchange Fee.

Relembre-se ainda que, em resposta ao ponto 9.6, o banco apresentou um extrato de fecho de TPA datado de 2017-06-09, referente ao mês de maio de 2017 […], o qual é demonstrativo de que o banco efetua a cobrança das comissões apenas por fecho de TPA, e não operação a operação.

O banco não demonstrou que procedeu à emissão de faturas de valores iguais ou inferiores a € 0,125, até porque a cobrança deverá ser feita apenas no fecho do TPA e não por cada movimento individual, conforme parecem evidenciar os ficheiros referidos no parágrafo anterior.

Esta informação é corroborada pelo ponto 8 das regras e condições gerais de utilização do contrato de serviço de pagamento automático: «8. Sempre que existam movimentos, o Banco fornecerá mensalmente um Extracto de Fecho de TPA, com informação sobre as operações efectuadas, agregadas por fecho de TPA, nomeadamente o valor das operações e o montante dos encargos das mesmas.» , pelo que é naquele momento que é feita a cobrança da comissão pela utilização do TPA e não transação a transação.

Refira-se que apesar de normalmente o fecho dos TPA ocorrer no final do dia, existem comerciantes que tendo um menor volume de movimentos optam por não efetuar os fechos diariamente.

Nestes termos, a comissão sobre a qual incide o Imposto do Selo é apenas cobrada quando o comerciante efetua o fecho da máquina e incide sobre um conjunto de operações, e não operação a operação e somente neste momento (cobrança) ocorre o nascimento da obrigação tributária.

Assim, o banco cobra a comissão pela totalidade das transações do dia (ou dias), e não sobre cada transação de per si, logo, para efeitos de liquidação de Imposto do Selo, o relevante também é o total sobre o qual incide a comissão.

Importa ainda salientar que a Instrução n.º 8/2018 de 2018-03-22 do Banco de Portugal cujo tema é “Sistemas de Pagamentos- Compensação” e tem por objeto a regulamentação do Sistema de Compensação Interbancária (SICOI), que substituiu a revogada instrução n.º 3/2009, corrobora o que antes foi dito, pois no ponto 1 do Anexo III – “Calendário dos fechos de compensação e de liquidação financeira em diferido e horários” (página 29) daquela instrução é estabelecido que «No subsistema de compensação de operações de pagamento baseadas em cartão efetua-se diariamente um fecho de compensação, o qual será liquidado no dia útil seguinte que não coincida com dias de encerramento do TARGET2.», do que se depreende que, no que diz respeito a operações de pagamento baseadas em cartão, a compensação e a subsequente liquidação, ou seja, o fluxo financeiro entre as instituições Financeiras, quer das importâncias transacionadas, quer das comissões interbancárias conexas, ocorre diariamente e não operação a operação.

Por tudo o quanto até aqui ficou escrito, não é possível expurgar do montante das comissões interbancários cobradas pelo A... a outras Instituições Financeiras, enquanto emissor dos cartões bancários utilizados nos TPA daquelas, os valores das transações de valor unitário abaixo de € 0,125 (pela dita regra do arredondamento e das duas casas decimais do euro).

Deste modo, tendo o banco informado que em 2017 não liquidou Imposto do Selo sobre as comissões aqui em apreço e não efetuou o cálculo do Imposto de Selo em falta, conforme lhe foi solicitado, outra solução não resta aos Serviços de Inspeção Tributária que não seja, com base na discriminação mensal das comissões (acima referidas) cobradas em 2017, facultada pelo A..., proceder ao apuramento do Imposto do Selo a liquidar.

Face ao que antecede, tendo por base a informação mensal das comissões (acima referidas) cobradas em 2017, apurou-se Imposto do Selo em falta, no montante de € 1.020.060,37, em resultado da aplicação da taxa de 4%, prevista na verba 17.3.4. da TGIS, à base tributável das comissões (melhor identificadas supra e no quadro infra) cobradas pelo A..., no valor total de € 25.501.509,17.

De forma a dar cumprimento ao disposto no n.º 1 do art.º 44.º do CIS, o Imposto do Selo apurado em falta deveria ter sido entregue nos cofres do Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que a obrigação tributária se tenha constituído. O Imposto do Selo apurado em falta, repartido mensalmente por mês de cobrança, é apresentado no quadro infra:

 

 

 

 

 

Mês

IF Cobrada

(TPA)

# 813500 e # 813501

IF cobrada

Levantamentos

ATM – OIC

# 8139920

(3)

IF cobrada

Pagamentos e Operações em

ATM – OIC

# 8139924

(4)

 

Total Comissões

(5)=(1)+(2)+(3)

+(4)

 

Imposto do Selo em falta (Verba 17.3.4 TGIS)

(5)*4%

IF Compras

(1)

IF Pagamento de Serviços

(2)

janeiro

646.513,33

28.319,68

759.971,95

627.144,08

2.061.949,04

82.477,96

fevereiro

542.957,76

24.891,72

669.866,78

539.836,33

1.777.552,62

71.102,10

março

638.188,70

28.797,88

798.777,64

646.981,66

2.112.745,88

84.509,84

abril

612.977,89

24.220,75

733.701,58

573.876,68

1.944.776,90

77.791,08

maio

713.368,95

27.155,53

891.766,98

684.459,69

2.316.751,15

92.670,05

junho

685.887,31

24.954,76

819.022,49

597.331,80

2.127.196,36

85.087,85

julho

758.729,83

26.801,22

885.748,01

633.263,88

2.304.542,94

92.181,72

agosto

727.983,03

25.495,82

895.216,98

611.107,35

2.259.803,18

90.392,13

setembro

667.597,78

24.799,97

779.111,02

575.672,29

2.047.181,06

81.887,24

outubro

702.977,21

25.133,84

834.016,66

625.646,92

2.187.774,63

87.510,99

novembro

693.636,23

24.233,74

776.152,30

622.508,02

2.116.530,29

84.661,21

dezembro

804.459,19

23.971,34

800.953,02

615.321,57

2.244.705,12

89.788,20

Total

8.195.277,21

308.776,25

9.644.305,41

7.353.150,30

25.501.509,17

1.020.060,37

 

Esta correção é efetuada nos termos e com os fundamentos acima explanados.

O sujeito passivo pronunciou-se, em sede de direito de audição, quanto à correção proposta no Projeto de Relatório, tendo a mesma sido mantida, de acordo com os fundamentos descritos no ponto IX.2 do presente documento.

[…]

IX.2 – IMPOSTO DO SELO – IS 

Ponto III.2.1.1 – Taxa de Serviço do Comerciante (n.º 1 do art.º 1.º do CIS – verba 17.3.4 da TGIS)

[…]

I.  Da inexistência de responsabilidade na esfera do Requerente, no que respeita ao IS putativamente incidente sobre as TSC cobradas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017

O banco considera que «a existir facto tributário em sede de IS associado às Taxas de Serviço do Comerciante cobradas pelo Requerente aos seus clientes titulares de Terminais de Pagamento Automático (TPA), existência essa da qual o Requerente discorda, ainda assim o Requerente está de acordo com a quantificação desse putativo facto tributário que foi feita pelos Serviços de Inspeção Tributária, em especial no que respeita às TSC de valor unitário inferior a 0,125 € e às TSC cobradas a comerciantes subjetivamente isentos de IS entre os dias 1 de Janeiro e 23 de maio de 2017 (neste último caso tendo em consideração as alterações ao artigo 3.º  do Código do IS decorrentes da Lei n.º  22/2017, de 23 de Maio, entrada em vigor no dia 24 de Maio, as quais implicaram que o encargo do - putativo, no entender do Requerente - IS incidente sobre a TSC passou a recair sobre o sujeito passivo do imposto - i.e., sobre o próprio Requerente, na qualidade de instituição financeira à qual as TSC são devidas - e não sobre os seus clientes, na qualidade de repercutidos, criando-se pois assim uma exceção à regra geral de repercussão do IS Incidente sobre as operações financeiras - cfr. a atual redação das als. g) e h) do artigo 3.º, n.º 3 do Código do IS).» (parágrafo 183.º).

Alega ainda que «o IS putativamente incidente sobre as TSC cobradas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017 é encargo dos devedores de tais TSC, ou seja, dos clientes do Requerente» (parágrafo 186.º).

E que «apenas passou a assumir simultaneamente a qualidade de sujeito passivo e de titular do encargo do imposto na sequência da entrada em vigor, a 24 de maio de 2017, da Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, em consequência da qual passou a prever-se no artigo 3.º, n.º 3, al. h) do CIS (...)» (parágrafo 189.º).

Defende assim que o ato tributário incorre em ilegalidade, porque, não obstante ser o sujeito passivo do imposto (substituto), o imposto deverá ser exigido aos seus clientes (substituídos), a quem as comissões foram cobradas, visto serem estes os titulares do encargo do imposto, e para sustentar a sua defesa, vem invocar no parágrafo 191.º  que «Com efeito, nos termos da alínea g) do n.º  3 do artigo 3.º  do Código do IS, sempre se considerou (e continuou a considerar-se, mesmo de 24 de maio de 2017 em diante, não obstante a partir dessa data ter passado a existir uma exceção a esta regra geral) titular do interesse económico nas “(…) restantes operações financeiras realizadas por ou com a intermediação de instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras o cliente destas.” (negrito nosso).»

No que se refere ao interpretado pelo banco relativamente ao art.º 3.º  do CIS, que estipula que o imposto constitui encargo do titular do interesse económico, refira-se que o banco não questiona sequer o enquadramento da sua situação no âmbito da sujeição ao Imposto do Selo, reconhecendo expressamente no parágrafo 188.º  que «de facto, o Requerente será o sujeito passivo do imposto, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º do CIS».

Assim, sendo sujeito do passivo do imposto, compete-lhe a liquidação do imposto, por força do preceituado no n.º 1 do artigo 23.º do CIS, sempre que se encontre em alguma das situações em que é devido Imposto do Selo.

Não é relevante, assim, para afastar a incidência subjetiva, apurar se o A... é sujeito passivo na qualidade de contribuinte direto ou substituto (duas das categorias previstas no n.º  3 do artigo 18.º da LGT), pois, em qualquer caso, independentemente de saber quem detém a titularidade do interesse económico da operação, é sobre o A... que recai o ónus de liquidar e é apenas a ele e não aos titulares dos cartões ou aos comerciantes que a Autoridade Tributária e Aduaneira pode exigir o pagamento do imposto.

Por outro lado, de harmonia com o disposto na alínea h) do artigo 5.º  do CIS, nas operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas a obrigação tributária considera-se constituída no momento da cobrança das comissões e contraprestações, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira podia exigir ao A... o pagamento do Imposto do Selo.

Resulta deste regime que se está, nas relações entre o banco e as entidades a quem cobra comissões ou contraprestações, não perante situação de substituição tributária (que se efetua através de retenção na fonte do imposto liquidado pelo substituto, nos termos do artigo 20.º  da LG T) mas sim perante situação em que se admite (e legalmente se pretende) a repercussão económica do imposto, sendo este, por facilidade de cobrança, exigido a quem não é o titular do interesse económico, mas está numa situação em que lhe é possível transferir o encargo para a esfera do titular do interesse económico no âmbito das suas relações privadas com este, ficando na disponibilidade do sujeito passivo efetuar ou não essa transferência, através da inclusão ou não do valor do imposto nos preços dos bens que lhe transmite ou dos serviços que lhe presta.

Em situações deste tipo, «o único responsável tributário, perante o Estado, pela falta de imposto liquidado é, em caso de divergência entre a pessoa que figura como sujeito passivo e a que figura como titular do interesse económico que tem o encargo do imposto, o sujeito passivo, e não o repercutido ou o titular daquele interesse económico (acórdão arbitral proferido no processo n.º  496/2017-T).

Assim, nem a alínea g) do n.º  3 do artigo 3.º  do CIS nem o artigo 28.º  da LGT são obstáculo à exigência do imposto ao Requerente, por existir tributação, conforme adiante melhor se explanará.

Nos parágrafos 192.º  e 193.º  refere que «o pagamento do imposto deverá ser exigido aos clientes titulares do interesse económico, e não ao Requerente.» e por conseguinte «está-se no caso em apreço perante uma situação de substituição tributária sem retenção, à qual não se aplica o regime constante do artigo 28.º  da Lei Geral Tributária (LGT).»

Nos parágrafos 194.º e seguintes, complementa este argumento citando o autor Sérgio Vasques.

O autor invocado pelo banco, reconhece a necessidade do substituto ter de diligenciar pela cobrança do imposto em causa. Caso contrário não é possível responsabilizar o substituído pelo tributo.

Neste sentido, Sérgio Vasques escreve: «Já no que respeita às hipóteses de falta de entrega, seguramente que a única solução materialmente correcta é também aqui a de responsabilizar o substituído pelo tributo, desonerando o substituto de qualquer responsabilidade, posto que este tenha empregue na tarefa da cobrança a diligência que dele se deve esperar. Com efeito quando o substituto não logra a boa cobrança do tributo em causa, juntamente com o preço dos bens ou serviços que fornece ao substituído, não chega produzir-se a oneração do contribuinte que visa a lei, subsistindo o fundamento material para responsabilizar o contribuinte substituído, e apenas este, pelo pagamento do tributo. A responsabilização do substituto nos casos em que este não logra a boa cobrança do tributo público redundaria numa oneração tributária sem fundamento objectivo que o princípio da igualdade tributária não tolera, mais ainda quando o substituto possui uma capacidade de influência limitada sobre o comportamento do contribuinte substituído, de cuja cooperação depende sempre em larga medida a tarefa da boa cobrança do tributo (A este entendimento julgamos que se poderá fazer apenas uma ressalva, respeitante aos casos em que o substituto não tenha cumprido com diligência os deveres que sobre ele impendem, negligenciando as tarefas da liquidação e cobrança. Excluída esta hipótese e desde que empregues na liquidação os normais deveres do cuidado – sempre cabendo à administração a prova do contrário não parece que o princípio da igualdade permita que seja assacado ao substituto o pagamento do tributo que não consiga cobrar).»

No caso em apreço, tal como resulta do explanado no ponto III.2.1.1 deste documento, é facto certo e seguro que o banco, não obstante cobrar aos seus clientes taxa de serviço do comerciante e ainda taxa multilateral de intercâmbio e comissões interbancárias pela utilização de ATM's, não tributou (não liquidou e cobrou) aos mesmos o respetivo imposto do selo.

Atente-se que, no decurso do procedimento inspetivo, o banco foi interpelado a indicar se foi liquidado Imposto do Selo e o respetivo enquadramento fiscal em sede de IVA e Imposto do Selo, tendo o mesmo respondido que «Tendo o Banco A... considerado, no exercício em questão, que as taxas discriminadas, se encontram fora do âmbito de incidência de imposto do selo, não foi efetuado qualquer cálculo relativo ao apuramento do imposto correspondente. Note-se que a legislação tributaria não prevê qualquer obrigação de cálculo de imposto sobre realidades não sujeitas. Nesse sentido não é possível providenciar o cálculo solicitado.».

Não existem assim dúvidas que o A... sabia que cobrava taxas de serviço ao comerciante, e ainda taxas e comissões relacionadas com os pagamentos automáticos, e que essa cobrança decorria de operações por si realizadas, enquanto instituição financeira e dentro do âmbito e desenvolvimento da sua atividade económica. Não obstante, não exerceu a tarefa de liquidação e cobrança do imposto do selo, conduta que dele se deve esperar.

Importa então analisar e concluir se atuou com a diligência devida e que de si se esperava.

Conforme já referido no ponto III.2.1.1 «(...) sendo a comissão TSC cobrada ao comerciante pela entidade prestadora do serviço automático (banco) sujeita a IVA mas isenta do mesmo, encontra-se sujeita a Imposto do Selo nos termos do n.º 1 do art.º 1.º do respetivo código (não sendo de aplicar o n.º 2 do art.º 1.º do CIS), caso se encontre prevista na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS).

Assim, constituindo normas de incidência objetiva do Imposto de Selo as verbas previstas na Tabela Geral de Imposto do Selo (TGIS), importa primeiramente analisar as verbas aí constantes. E, dessa análise, rapidamente se conclui que a verba “17 — Operações financeiras”, mais concretamente a verba “17.3.4 — Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros”, prevê a incidência de Imposto do Selo em comissões cobradas nas operações realizadas por ou com a intermediação de instituições financeiras (como seja o caso da TSC, em que a entidade prestadora do serviço automático – no caso, o A... – cobra ao comerciante).

E mais adiante, «(…) em concreto, a comissão intitulada de taxa multilateral de intercâmbio (TMI) e as comissões interbancárias em análise (cobradas pela utilização de Caixas Automáticos), encontram-se sujeitas a Imposto do Selo nos termos do n.º 1 do art.º 1.º do respetivo código (não sendo de aplicar o n.º 2 do art.º 1.º do CIS).

Assim, constituindo normas de incidência objetiva do imposto de Selo as verbas previstas na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), importa primeiramente analisar as verbas aí constantes. E, dessa análise, rapidamente se conclui que a verba “17 – Operações financeiras”", mais concretamente a verba “17.3.4 – Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros”, prevê expressamente a incidência de imposto do selo em comissões cobradas nas operações realizadas por ou com a intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras.»

Deste modo, este normativo prevê expressamente a incidência de Imposto do Selo em comissões cobradas (tal como as aqui em apreço) pela entidade prestadora do serviço (no caso, o A...).

Por outro lado, importa anotar que o banco sabe e conhece, que “enquanto instituição de crédito que realiza, no âmbito da sua atividade, intermediação de “operações de crédito, de prestação de garantias ou juros, comissões e outras contraprestações devidos por residentes no mesmo território a instituições de crédito ou sociedades financeiras não residentes”, é sujeito passivo de imposto, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º do CIS, sendo responsável pela cobrança, receção e entrega nos cofres do Estado do Imposto do Selo sobre todas as operações sujeitas, nos termos dos art.os 23.º, 41.º e 44.º do CIS.” (vide II.3.3.3 deste documento).

É facto público e notório que o A..., no ano de 2017, já gozava do privilégio de exercer esta atividade há muitos anos, pois “Por escritura pública de dezembro de 1984, esta sociedade (B..., SARL) foi transformada no A... –...S.A.” (vide ponto II.3.1 deste documento).

Além de que se trata de um sujeito passivo que no período de tributação em causa dispunha de um acompanhamento técnico, a nível contabilístico e fiscal, reputado de grande credibilidade e competência técnica.

Assim, entende-se que o banco não atuou com a diligência devida e que sobre si recaía, negligenciando as tarefas da liquidação e cobrança do imposto do selo sobre estas operações financeiras por si realizadas, e consequentemente a ele próprio deve ser exigido o imposto em causa.

Por outro lado, e sem conceder, a aceitar-se que não sejam aplicáveis à substituição tributária sem retenção as regras de responsabilidade previstas no art.º 28.º  da LGT, releva sublinhar que não foi com base nesta norma legal que se fundamentou a correção.

Não obstante o encargo do imposto ser do utilizador de crédito e/ou do cliente da instituição de crédito (art.º 3.º n.º 3 al. f) e g) do CIS), não podemos descurar que nos termos da lei, o banco é o sujeito passivo do imposto nos termos do art.º 2.º  n.º 1 alínea b) do CIS, e ao mesmo compete a liquidação (art.º 23.º n.º 1 do CIS), bem como dever de pagamento do imposto (art.º 41.º do CIS), tal como ficou anteriormente fundamentado.

Como explicam J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas (vide Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo, Engifisco, 2005, pág. 557) e Casalta Nabais (in Direito Fiscal, 6.a Edição, págs. 259-260), no imposto do selo, e à semelhança do que acontece nos impostos sobre o consumo, verifica-se o denominado fenómeno económico de repercussão.

A repercussão consiste na «transferência do imposto que legalmente incide sobre um sujeito passivo, para outrem com que este tem relações económicas.» (Américo Fernandes Brás Carlos, in Impostos – Teoria Geral, 3.ª Edição, pág. 264).

«(...) o repercutido não tem a qualidade de sujeito passivo, pois não se encontra numa relação jurídica tributária nos termos em que a Doutrina fiscalista tradicional a desenvolveu com o sujeito activo.

Não obstante, não restam dúvidas que é meramente por razoes de eficiência recaudatória e de eficácia na cobrança que a obrigação de cobrar imposto recai sobre o vendedor e não sobre o adquirente dos bens e serviços. Na verdade, mesmo sem nos alhearmos da noção restritiva da relação jurídica, somos forçados a admitir que o repercutido tem um dever legal de contribuir para as despesas públicas e esse dever é-lhe imposto legal e constitucionalmente. Apenas no tocante aos mecanismos recaudatórios se verifica uma distorção do que seria esperado acontecer, ou seja, uma equivalência entre o sujeito passivo e o titular da capacidade contributiva.» (“Da Repercussão Fiscal no IVA”, do autor Bruno Botelho Antunes, Almedina, pág. 127).

«A Doutrina fiscal tem vindo a defender que a repercussão é um fenómeno essencialmente económico, através do qual uma pessoa transfere para outras o sacrifício económico do imposto, característica que será inerente aos impostos indirectos, onde, por razões de economia de imposto, se onera uma entidade que, em nosso entendimento, não é a detentora da capacidade económica com a obrigação de cobrar IVA àquelas entidades que, no contacto comercial, lhe adquirem bens ou serviços.

O repercutido será, para muitos, meramente o contribuinte de facto – conceito contraposto ao de contribuinte de direito – que suporta o encargo do tributo. Não significa isto que se deva retirar à repercussão o seu carácter jurídico, mas antes que o repercutido não deve ser considerado como sujeito passivo stricto sensu, na medida em que se encontra numa situação de ausência de vínculo jurídico com a administração tributária.» (págs. 43 e 44 da obra antes identificada).

Os referidos autores J. Silvério Mateus e L. Corvelo Freitas (ver obra citada, pág. 557), referem que as pessoas elencadas no artigo 3.º do CIS (encargo do imposto), «não obstante suportarem, por repercussão, o encargo do imposto, não têm a qualidade de sujeitos passivos, não estando, consequentemente, sujeitas a qualquer obrigação de natureza fiscal».

A jurisprudência confirma este fenómeno para situações como estas aqui em debate, conforme se transcreve:

«Ainda que o imposto deva ser liquidado e pago pela impugnante, o mesmo é suportado por terceiro, concretamente pelo titular do interesse económico; o qual é, nas garantias, a entidade obrigada à sua apresentação (artigo 3.º/3/e), do CIS), na concessão do crédito, o utilizador do crédito (artigo 3.º/3/f), do CIS). Verifica-se assim a repercussão fiscal do imposto, dado que «o sujeito directamente determinado pela lei para pagar o imposto não é verdadeiramente o titular da riqueza a tributar, mas apenas um sujeito sobre quem é mais fácil executar a cobrança» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p. 93.

«O contribuinte de facto é, então, o sujeito que, apesar de não estar previsto na norma de incidência fiscal, suporta realmente o montante em dívida» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: O caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p. 96. Na repercussão fiscal, «[t]udo se passa apenas entre dois sujeitos privados, com o afastamento do sujeito activo da relação jurídica tributária» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p, 93.”

Posto que é o sujeito passivo (aqui, o A...) que está adstrito à obrigação principal de pagamento do imposto do selo (isto é, à liquidação, cobrança e entrega nos cofres do Estado do imposto devido), em conformidade com o anteriormente contestado, com os art.os 23.º n.º 1 e 41.º , ambos do CIS. Recaindo também sobre o sujeito passivo as obrigações acessórias de natureza declarativa e contabilística (art. os 52.º a 56.º e 60.º todos do CIS).

E este sujeito passivo, repita-se, é uma das entidades referidas na alínea b) do n.º 1 do art.º 2 do CIS, “in casu” as «[e]ntidades concedentes do crédito e da garantia ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações».

Neste sentido veja-se ainda o ensinado por Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (in Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª  Edição 2012, pág. 187):

«A exclusão do terceiro repercutido do âmbito da noção de sujeito passivo tem larga consagração na doutrina (vd., DIOGO LEITE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS, OB. CIT., 2.ª ed., Coimbra, 2000, Parte II, A Obrigação tributária). Entre ele e o sujeito activo não existe vínculo jurídico, no sentido de que o repercutido não é devedor do sujeito activo. A sua obrigação não nasce da realização do facto tributário, mas sim da realização de um facto ao qual a lei liga o direito do sujeito passivo de repercutir e a correlativa obrigação do repercutido de reembolsar o sujeito passivo quando este exerça o seu direito. A obrigação do repercutido é só perante o sujeito passivo. Daqui decorre, nomeadamente, que as relações entre o sujeito passivo e o repercutido inadimplente se regem pelo Direito privado. E que o sujeito passivo deve cumprir a sua obrigação de imposto antes e, mesmo, independentemente do cumprimento do repercutido.»

Os mesmos autores explicam ainda (na mesma obra, pág. 188):

«Aprofundemos a pergunta de saber se o repercutido algo deve ao ente público. E se pode construir-se uma figura de sujeito passivo com base em alguém que nada deve ao ente público.

Há que levar em conta que o Estado nem sempre recebe o montante dos impostos, directa ou imediatamente, dos sujeitos que devem contribuir por serem dotados de capacidade tributária.

Mas utiliza diversas técnicas de cobrança dos tributos. Estas por vezes, consistem em obter o montante dos tributos, não dos sujeitos que devem contribuir, mas de outros sujeitos, eventualmente sem capacidade contributiva, mas que se constituem como simples intermediários para cobrar os tributos de outros sujeitos com capacidade contributiva. A lei obriga diretamente um sujeito a quem atribui a faculdade de exigir a um terceiro o montante do imposto pago.

Sob o ponto de vista exclusivamente jurídico, o repercutido está obrigado a contribuir. Está obrigado legalmente a reembolsar o sujeito passivo da obrigação tributária, por que ele é o titular da capacidade contributiva prevista pela norma.

No caso do IVA, e em geral dos impostos sobre o consumo, visa-se uma manifestação de capacidade económica, o consumo, capacidade contributiva que é manifestada pelos repercutidos. Parece que não teria sentido impor um imposto ao vendedor, quando a capacidade contributiva visada pelo imposto é detida pelo comprador.

Pode afirmar-se que há um sujeito passivo do imposto que é quem o vai pagar ao Estado; e um sujeito passivo de uma obrigação legal, não perante o Estado, mas sim perante o sujeito passivo, a cargo do titular da capacidade contributiva.

Assim, nos impostos sobre o consumo, o sujeito passivo é obrigado legalmente a entregar o montante do imposto. Mas como não é efe o titular da capacidade contributiva, este montante deve ser-lhe entregue pejo titular dessa capacidade, que é o repercutido. O repercutido não tem qualquer obrigação perante o sujeito ativo.

Aliás, o sujeito passivo pode exigir o pagamento do repercutido mesmo antes de entregar o imposto ao credor.»

Assim se concluindo que não deve proceder o argumento do A..., isto é, que o imposto do selo deve ser exigido aos clientes que pagaram as comissões até 23 de maio de 2017, nem se verifica a ilegalidade do ato tributário por violação do art.º 3.º do CIS e do art.º 28.º da LGT.

a) Da não sujeição da TSC a Imposto do Selo

[matéria não contestada na presente ação arbitral]

[…]

Ponto III..2.1.2 – Taxa multilateral de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM (nº 1 do art.º 1.º, n.º 1 do art.º 9.º e n.º 1 do art.º 22.º , todos do CIS e verba 17.3.4 da TGIS)

€ 1.020.060,37

Em sede de direito de audição o A... contesta a correção da Taxa multilateral de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM (nº 1 do art.º 1.º, n.º 1 do art.º 9.º e n.º 1 do art.º 22.º , todos do CIS e verba 17.3.4 da TGIS), argumentando relativamente à tributação desta realidade na sua esfera, no que respeita ao imposto do Selo incidente sobre as TMI cobradas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017 e à quantificação do facto tributário.

Tendo em consideração os argumentos contidos no articulado para o exercício do direito de audição, para efeitos de demonstração da “ilegalidade da liquidação”, seguir-se-á a ordem indicada naquele documento, contrapondo-se os fundamentos aduzidos de igual forma, dando-se ainda por reproduzido o ponto III.2.1.2 deste relatório final de inspeção.

I.  Da inexistência de responsabilidade na esfera do Requerente, no que respeita ao IS putativamente incidente sobre as TMI cobradas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017

Uma vez que no parágrafo 226.º da petição o banco alega que «O Requerente entende que o IS putativamente incidente sobre as taxas multilaterais de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de TPA e ATM recebidas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio, à semelhança do que ocorre quanto às TSC, o Requerente entende que o IS putativamente incidente sobre as TSC cobradas entre os dias 1 de janeiro e 23 de maio de 2017 apenas pode ser legalmente liquidado às entidades às quais foram cobradas as TMI.» , dá-se aqui por reproduzido o conteúdo, tanto da arguição do sujeito passivo como a resposta da inspeção tributária, já referidos no ponto III.2.1.1 deste direito de audição, concluindo-se que:

  • Não deve proceder o argumento do A..., de que o imposto do selo deve ser exigido aos clientes que pagaram as comissões;
  • Não se verifica a ilegalidade da liquidação de imposto do selo proposta, por violação do art.º 3.º do CIS e do art.º 28.º da LGT.

II.   Da quantificação do facto tributário

O banco vem contestar a importância correspondente à IF cobrada pelo banco relativamente às operações em TPA (compras e pagamento de serviços), de valor unitário inferior a € 0,125, cujas bases tributáveis ascendem a € 1.931.397,02 [A importância considerada. apurada pela Inspeção Tributária, com os dados da discriminação mensal apresentada pelo A... em resposta ao ponto do pedido de elementos n.º 5, diverge do valor indicado no requerimento (€ 1.923.715,98)] e € 51.398,40, respetivamente.

O A... começa por afirmar que «(…) não pode ser negado que nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do Código do IS, o mesmo incide sobre «todos os atos, contratos, documentos títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstas na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens» (Parágrafo 234.º) e que esses atos «(…) no caso concreto, serão as “comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões” (...)» que estão previstos na verba 17.3.4 da TGIS. (Parágrafo 235.º).

No entanto, considera que «(...) essa incidência não se encontra, de nenhum modo, dependente da forma de cobrança ou pagamento (isolada ou agregada) das realidades em causa.» (Paragrafo 236.º) e que «(...) o imposto incide sobre comissões e contraprestações e não sobre qualquer somatório (seja ele infra-diário, diário, semanal, mensal, etc.) de operações.» (Parágrafo 237.º).

Alega ainda que:

  • «Aliás, veja-se que nem mesmo o facto de, com as alterações promovidas pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, que conduziram a que passe o Requerente a ser simultaneamente sujeito passivo e titular do encargo do imposto aqui em causa, tal se modificou.» (Parágrafo 238.º).
  • «Com efeito, essa alteração, tendo criado uma exceção à regra geral segundo a qual o IS das operações financeiras é encargo do cliente das instituições financeiras, não veio alterar o facto tributário sujeito a imposto.» (Parágrafo 239.º).
  • «Facto tributário esse que continua a ser cada uma das operações e contraprestações em causa, independentemente da sua forma de cobrança, e não qualquer somatório de tais operações.» (Parágrafo 240.º).
  • «Aliás, existem casos em que o IS de facto incide sobre valores agregados, mas nesses casos o legislador teve o cuidado de o prever expressamente - é o caso, por exemplo do IS da verba 29 da TGIS, devido por cada semestre.» (Parágrafo 241.º).
  • «Depois, quanto à afirmação dos serviços de inspeção tributária segundo a qual a posição dos serviços de inspeção tributária está alinhada com a posição doutrinal e jurisprudencial em torno desta matéria, cabe notar que, tanto quanto é do conhecimento do Requerente, tal posição não é unívoca mesmo dentro da Autoridade Tributária e Aduaneira: a este respeito, cita-se a resposta enviada pela DSIMT à Associação Portuguesa de Bancos, no contexto de questões relativas à nova DMIS (a qual se anexa como documento n.º 3), a qual admite expressamente a aplicação de arredondamentos na liquidação de IS.» (Parágrafo 242.º).
  • «Motivos pelos quais a presente correção não deverá parcialmente proceder.» (Parágrafo 243.º).
  • «Conforme já múltiplas vezes referido noutras sedes, o Requerente continua a considerar que as realidades aqui em causa (taxas multilaterais de intercâmbio e comissões interbancárias cobradas pela utilização de TPA e ATM) não preenchem a norma de incidência da verba 17.3.4, o que conduziria à anulação total da presente correção.» (Parágrafo 244.º).

Relativamente ao referido no parágrafo 242.º em que o banco afirma que não há uma posição unívoca quanto aos arredondamentos no seio da AT, apresentando como exemplo a resposta dada à Associação Portuguesa de Bancos (APB), relativamente a questões suscitadas quanto ao preenchimento da nova DMIS, parece-nos que a resposta dada àquela entidade em nada contraria o que ficou dito no ponto III.2.1.2 do PRIT (pg. 82 e 83), já que a mesma (ponto II.3 da informação) refere-se apenas à margem de erro admissível no preenchimento da própria declaração que resulta da liquidação de imposto efetuada sobre o somatório de bases tributáveis do período de reporte, e não a possíveis arredondamentos de cada uma das operações individualmente.

O que a IT defende é que a elevado número de operações financeiras efetuadas por cada banco, torna impraticável a liquidação de imposto do selo operação a operação. Embora o banco tenha refutado por diversas vezes que cobra este tipo de comissões de forma integrada, a verdade é que nunca demonstrou que o faz de forma individualizada, isto é, operação a operação.

No decurso do procedimento de inspeção o que se verificou foi que a liquidação das comissões efetuada pelo A... às outras instituições detentoras dos cartões não é efetuada operação a operação, mas sim na sequência da informação dos totais diários facultados pela SIBS, para efeitos de compensação, pelo que, a liquidação de imposto do selo que deveria ter sido efetuada peio A... nunca seria efetuada operação a operação, mas sim pelo valor total cobrado diariamente a cada uma das outras instituições.

Estamos perante muitos milhares de operações diárias efetuadas nos TPA do A... pelo que a cobrança destas comissões por cada operação não era de todo operacional, por essa razão, sendo as cobranças efetuadas sobre os valores acumulados, seria sobre estes valores que deveria ser liquidado o imposto do selo, pelo que não deverá ser atendida a pretensão do A... .

Nestes termos, a correção proposta do projeto de relatório será mantida na totalidade.

[…]”.

  1. Subsequentemente, o Requerente foi notificado dos seguintes atos tributários:
    1. Liquidação de Imposto do Selo, reportada ao período de 2017, emitida sob o n.º 2021..., com data de compensação de 13 de abril de 2021, no valor de € 1.509.663,44;
    2. Liquidações de juros compensatórios correspondentes, emitidas sob os n.ºs 2021... a 2021 ..., no valor total de € 221.100,20;

perfazendo o valor global de € 1.730.763,64 (Imposto do Selo e juros), com data limite de pagamento fixada em 31 de maio de 2021,

            – cf. Documento 1 – Demonstração de Liquidação de Imposto do Selo – junto pelo Requerente.

  1. O Requerente foi citado no processo de execução fiscal n.º ...2021... instaurado em relação à dívida exequenda resultante dos atos tributários atrás identificados, tendo prestado garantia bancária a favor da AT no valor de € 2.192,737,72 – cf. Documentos 2 e 3 juntos pelo Requerente.
  2. Inconformado com estes atos tributários, o Requerente apresentou no CAAD, em 30 de agosto de 2021, pedido de constituição do Tribunal Arbitral e de pronúncia arbitral tendo em vista a anulação parcial das liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios inerentes, na parte referente à Taxa Multilateral de Intercâmbio e Comissões Interbancárias Cobradas pela Utilização de ATM’s, cujo Imposto de Selo é de € 1.020.060,37, acrescido de juros de € 149.394,59), não impugnando, nesta sede, as correções e liquidações relativas à Taxa de Serviço do Comerciante – cf. registo de entrada no SGP do CAAD.

 

            2.         Motivação da Decisão da Matéria de Facto e Factos não Provados

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre todas as alegações das Partes, mas apenas sobre as questões de facto necessárias para a decisão.

 

No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos pelas Partes e nas posições por estas assumidas em relação aos factos que, de um modo geral, é consensual, com exceção do valor das operações geradoras de comissões unitárias iguais ou inferiores a € 0,125 (artigos 154.º e 155.º do ppa), relativamente às quais a Requerida, na Resposta, entende não ter sido feita prova pelo Requerente, apesar de no RIT não as ter contestado ou infirmado. Dados os elementos facultados no procedimento inspetivo pelo Requerente, não contraditados pela AT, entende este Tribunal ter ficado satisfeito o ónus de demonstração do valor unitário das operações geradoras de comissões de valor igual ou inferior a € 0,125. Afigura-se, porém, que mesmo com este facto firmado, a divergência de posições das Partes subsiste, dado que a solução também passa por uma questão de direito. Consiste esta em saber se, para efeitos de determinação da base de incidência do Imposto do Selo, as operações e correspondentes comissões devem ser consideradas individualmente, ou seja, operação a operação realizada através de TPA ou ATM, ou se devem ser calculadas de forma agregada, nomeadamente pelo “fecho” diário do TPA (ou outro período escolhido pelo comerciante para apuramento dos pagamentos feitos por essa via).

 

Não existem factos alegados com relevância para a apreciação da causa que devam considerar-se não provados.

 

 

            IV.      Do Mérito

 

            1.         Questões a Decidir

 

Importa apreciar e decidir na presente ação as seguintes questões:

 

  1. Responsabilidade do Requerente pela liquidação do Imposto do Selo entre 1 de janeiro e 23 de maio de 2017, até à entrada em vigor da alteração introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, à alínea h) do n.º 3 do artigo 3.º do Código do Imposto do Selo;
  2. Incidência de Imposto de Selo sobre a TMI e sobre as comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM’s;
  3. Em caso de incidência, determinação da respetiva base tributável, em concreto se deve, para esse efeito, ser considerado o valor total das comissões e taxas recebidas ou valor líquido compensado;
  4. Fundada dúvida sobre o facto tributário (v. artigo 100.º, n.º 1 do CPPT);
  5. Inconstitucionalidade por violação do princípio da capacidade contributiva;
  6. Aplicação de arredondamento por cada operação realizada ou consideração agregada das comissões de um dado período (normalmente diário);
  7. Ilegalidade da liquidação de juros compensatórios;
  8. Indemnização por prestação de garantia indevida.

 

            2.         Responsabilidade pela Cobrança – Sucessão de Leis no Tempo

 

            A interpretação do Requerente no sentido de que só a partir de 24 de maio de 2017 poderia ser responsabilizado pela cobrança do imposto respeitante a operações de pagamento baseadas em cartões, i.e., após a da entrada em vigor da nova redação do artigo 3.º, n.º 3, alínea h) do Código do Imposto do Selo, introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio, não pode ser seguida. 

 

            Antes de mais, como o próprio Requerente aceita, assiste-lhe a qualidade de sujeito passivo, ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea b) do Código do Imposto do Selo, que dispõe serem como tal consideradas as “[e]ntidades concedentes do crédito e da garantia ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações”. Deste modo, não é controvertida a incidência subjetiva deste imposto na esfera do Requerente.

 

O ponto suscita-se, assim, na situação de divergência entre o sujeito passivo, que é, como se referiu, o Requerente, e os titulares do interesse económico de quem o Imposto do Selo constitui encargo, nos termos do artigo 3.º, n.ºs 1 e 3 do Código deste imposto, que eram, no período mencionado, os clientes daquele.

 

Com efeito, até 23 de maio de 2017, o Código em apreço não continha uma norma específica para as operações de pagamento baseadas em cartões, pelo que era o cliente que, nos termos do preceituado no artigo 3.º, n.º 3, alínea g) do citado Código[2], se considerava titular do interesse económico, recaindo (ou devendo recair) sobre o mesmo o encargo do imposto.

 

Com a nova redação dada pela Lei n.º 22/2017, que entrou em vigor em 24 de maio desse ano, o artigo 3.º, n.º 3, alínea h) do Código do Imposto do Selo passou a considerar titular do interesse económico “[n]as operações de pagamento baseadas em cartões, previstas na verba 17.3.4. da Tabela Geral do Imposto do Selo, as instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras a quem aquelas forem devidas”.

 

            Porém, contrariamente ao preconizado pelo Requerente, esta alteração legislativa não tem o alcance de definir ou alterar a incidência subjetiva do Imposto do Selo, nem a entidade que está adstrita à obrigação de liquidação e cobrança do mesmo, que emergem das normas de incidência, liquidação e cobrança do Código, as quais, nesse âmbito, não sofreram alteração, dispondo à data dos factos [2017] o seguinte:

  1. Artigo 1.º, n.º 1 – incidência objetiva – de que resulta que “[o] imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral”, determinando a verba 17.3.4 da TGIS a tributação, à taxa de 4% sobre o valor cobrado, das operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, abrangendo as “comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões”. De notar que, de acordo com o artigo 3.º, alínea a) do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, os bancos, categoria em que se insere o Requerente, são enquadrados como um dos tipos de instituições de crédito;
  2. Artigo 2.º, n.º 1, alínea b) – incidência subjetiva – que elege como sujeitos passivos do Imposto do Selo as “[e]ntidades concedentes do crédito e da garantia ou credoras de juros, prémios, comissões e outras contraprestações”;
  3. Artigo 4.º, n.º 1 – incidência espacial – que institui a regra de sujeição para todos os factos que caiam no âmbito da incidência objetiva, “ocorridos em território nacional”;
  4. Artigo 5.º, n.º 1, alínea h)[3] – temporalidade – que remete para o “momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações” a constituição da obrigação tributária referente a operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito;
  5. Artigo 23.º, n.º 1 – liquidação do imposto – que expressamente designa os sujeitos passivos referidos no artigo 2.º, n.ºs 1 e 3 do Código do Imposto do Selo como as entidades com competência para a liquidação;
  6. Artigo 41.º – dever de pagamento – que impõe o dever de pagamento às entidades referidas no artigo 23.º, que deve ser cumprido até ao dia 20 do mês seguinte ao da constituição da obrigação tributária (v. artigo 44.º, n.º 1).

 

Assim, independentemente da titularidade do interesse económico da operação e de sobre quem deve recair o encargo (económico) do Imposto do Selo, é o Requerente o sujeito passivo sobre quem recai o ónus de liquidar e pagar o imposto decorrente da verba 17.3.4 da TGIS (caso se conclua ser este devido) e não os clientes titulares dos cartões ou os comerciantes.

 

No mesmo sentido, vejam-se, a título de exemplo, as decisões arbitrais proferidas nos processos n.º 433/2020-T, de 13 de janeiro de 2021, e n.º 763/2020-T, de 15 de setembro de 2021, que apreciaram questão idêntica. Declara-se aí (n.º 433/2020-T):

       “Não é relevante, assim, para afastar a incidência subjectiva, apurar se o Requerente é sujeito passivo na qualidade de contribuinte direto ou substituto (duas das categorias previstas no n.º 3 do artigo 28.º da LGT), pois, em qualquer caso, independentemente de saber quem detém a titularidade do interesse económico da operação, é sobre o Requerente que recai o ónus de liquidar e é apenas a ele que a Autoridade Tributária e Aduaneira pode exigir o pagamento do imposto. ( 2 ) É irrelevante, para este efeito, saber se, depois de efectuar o pagamento, o Requerente tem ou não direito de regresso sobre o titular do interesse económico.

       Por outro lado, de harmonia com o disposto na alínea h) do artigo 5.º do CIS, nas operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas a obrigação tributária considera-se constituída no momento da cobrança das comissões e contraprestações, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira podia exigir o pagamento do Imposto do Selo.

       Resulta deste regime que se está, nas relações entre o Requerente e as entidades a quem cobra comissões ou contraprestações, não perante situação de substituição tributária (que se efectua através de retenção na fonte do imposto liquidado pelo substituto, nos termos do artigo 20.º da LGT), mas sim perante situação em que se admite (e legalmente se pretende) a repercussão económica do imposto, sendo este, por facilidade de cobrança, exigido a quem não é o titular do interesse económico, mas está numa situação em que lhe é possível transferir o encargo para a esfera do titular do interesse económico no âmbito das suas relações privadas com este, ficando na disponibilidade do sujeito passivo efetuar ou não essa transferência, através da inclusão ou não do valor do imposto nos preços dos bens que lhe transmite ou dos serviços que lhe presta. [( 3 ) Como se refere no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 30-04-2013, proferido no processo n.º 04457/11, na esteira de DIOGO FEIO, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento:

«Verifica-se assim a repercussão fiscal do imposto, dado que «o sujeito directamente determinado pela lei para pagar o imposto não é verdadeiramente o titular da riqueza a tributar, mas apenas um sujeito sobre quem é mais fácil executar a cobrança» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p. 93.. «O contribuinte de facto é, então, o sujeito que, apesar de não estar previsto na norma de incidência fiscal, suporta realmente o montante em dívida» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p. 96. Na repercussão fiscal, «[t]udo se passa apenas entre dois sujeitos privados, com o afastamento do sujeito activo da relação jurídica tributária» Diogo Feio, A substituição fiscal e a retenção na fonte: o caso específico dos impostos sobre o rendimento, Coimbra Editora, 2001, p. 93».]

       Em situações deste tipo, «o único responsável tributário, perante o Estado, pela falta de imposto liquidado é, em caso de divergência entre a pessoa que figura como sujeito passivo e a que figura como titular do interesse económico que tem o encargo do imposto, o sujeito passivo, e não o repercutido ou o titular daquele interesse económico (acórdãos arbitrais proferidos nos processos n.ºs 496/2017-T e 431/2018-T).

       Assim, nem a alínea g) do n.º 3 do artigo 3.º do CIS, nem o artigo 28.º da LGT são obstáculo à exigência do imposto ao Requerente (se se apurar que deve existir tributação).

       Este regime não se afigura ser incompatível com o princípio da tributação com base na capacidade contributiva que é corolário do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), pois, como se referiu, não exclui a possibilidade de o Requerente transferir o encargo para a esfera do titular do interesse económico no âmbito das suas relações privadas, designadamente meios cíveis.

       De resto, a entender-se que era o Requerente quem tinha o dever de liquidar o Imposto do Selo nas situações em causa e tinha a consequente possibilidade de repercutir nos seus clientes as quantias pagas, através dos preços dos serviços que presta, a omissão de liquidação e repercussão serão condutas imputáveis apenas ao Requerente, pelo que não haverá qualquer fundamento para transferir para o Estado, com o afastamento da tributação, as consequências daquelas omissões.

       Para além disso, a exigência do imposto ao Requerente e não aos seus clientes justifica-se por evidentes considerações de praticabilidade e a eficiência da tributação, que são também valores com relevo constitucional, em matéria tributária ( 4 ) Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 48/2020, de 16-01-2020, processo n.º 548/2019.“

 

            Mais se dirá que nem sequer se identifica no caso em análise uma situação jurídica de substituição tributária, que só se verifica quando, por imposição da lei, a prestação tributária for exigida a pessoa diferente do contribuinte (de direito – v. artigo 20.º da LGT). Na verdade, in casu, o Imposto do Selo está a ser exigido precisamente ao sujeito passivo e não a outra pessoa.

 

            Desta forma, a liquidação da AT não pode ser encarada como a efetivação de responsabilidade por substituição tributária ao abrigo do artigo 28.º da LGT, cuja aplicação nunca esteve em causa, uma vez que não há qualquer fenómeno de substituição, mas a cobrança do Imposto do Selo ao contribuinte direto, i.e., à entidade que, pela lei, foi designada sujeito passivo originário (v. artigo 2.º, n.º 1, alínea c) do Código do Imposto do Selo e artigo 18.º, n.º 3 da LGT). É, assim, de afastar a construção do Requerente, não sendo aplicável a jurisprudência e doutrina por este invocada, porquanto não se trata de liquidação de imposto ao substituto tributário.

 

            Nestes termos, improcede o argumento de inexistência de responsabilidade na esfera do Requerente quanto ao Imposto do Selo incidente sobre as comissões e contraprestações cobradas entre 1 de janeiro e 23 de maio de 2017.

 

            3.         Enquadramento da TMI e das Comissões Interbancárias Cobradas pela Utilização de ATM’s na Verba 17.3.4 da TGIS

 

            A título preliminar convém assinalar que a fundamentação do ato tributário de liquidação de Imposto do Selo que consta do RIT não indica o n.º 2 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo como motivo de sujeição das operações a este imposto. Efetivamente, apesar de a norma em causa ser invocada pela Requerida, é-o somente no sentido de demonstrar que não opera a delimitação negativa da incidência aí contida, por não se verificar a condição relativa à tributação das operações em IVA, estabelecida pelo legislador com o propósito de evitar a aplicação cumulativa, sobre a mesma contraprestação, de IVA e Imposto do Selo.

 

            Nestes moldes, a AT percorre as normas de incidência e de isenção das operações financeira em sede de IVA (na Diretiva e no Código do IVA) para chegar à conclusão de que não é de aplicar o artigo 1.º, n.º 2 do Código do Imposto do Selo, tendo em conta que as operações em discussão são enquadráveis como serviços financeiros sujeitos, mas isentos de IVA, como se infere do seguinte excerto do RIT: “quer a comissão intitulada “taxa multilateral de intercâmbio”, quer as comissões interbancárias cobradas pela utilização de Caixas Automáticos ou ATM em operações efetuadas com cartões bancários, são prestações de serviços (remuneradas como comissões) enquadráveis na isenção prevista na subalínea c) da alínea 27) do art.º 9.º do CIVA, a qual isenta deste imposto as «(…) operações, compreendendo a negociação, relativas a depósitos de fundos, contas correntes, pagamentos, transferências, recebimentos, cheques, efeitos de comércio e afins, com exceção das operações de simples cobrança de dívidas».”

 

            Esclarecida a questão da inaplicabilidade da norma de delimitação negativa constante do artigo 1.º, n.º 2 do Código do Imposto do Selo, uma vez que não ocorre qualquer sobreposição dos dois tributos [IVA e Imposto do Selo], os Serviços de Inspeção da AT prosseguem com a fundamentação da tributação das operações na origem do ato tributário controvertido, em diversas normas deste Código, e no que se refere à incidência objetiva, especificamente no artigo 1.º, n.º 1 e na verba 17.3.4 da TGIS.

 

            Pelo que é erróneo o entendimento do Requerente de que os Serviços de Inspeção Tributária partiram da premissa de que a sujeição a Imposto do Selo da TMI e das comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM’s deriva de estas serem isentas de IVA, considerando-se improcedente este argumento. De igual modo conclui a decisão arbitral do processo n.º 433/2020-T:

“A interpretação adequada do Relatório da Inspecção Tributária é a de que a Autoridade Tributária e Aduaneira não entendeu que as operações estavam sujeitas a Imposto do Selo apenas por não serem tributadas em IVA, mas sim que, para além desta condição (delimitação negativa de incidência) era necessária a incidência resultante de previsão na Tabela Geral.

Confirmando que é esta interpretação correcta, constata-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira se esforça por demonstrar, invocando normas do CIS, que há lugar a tributação, incluindo uma norma de incidência objectiva da Tabela Geral, que é a verba 17.3.4..

Por isso, devidamente interpretado o Relatório da Inspecção Tributária, não ocorre o erro de interpretação da lei que o Requerente invoca.”

 

            Em relação ao enquadramento da TMI e das comissões cobradas pela utilização de ATM’s na verba 17.3.4 da TGIS, o Requerente defende a exclusão destas por entender que não constituem a contraprestação de serviços financeiros, antes, a mera repartição ou partilha de custos suportados pelas diversas instituições envolvidas nas operações.

 

            Em ambos os casos é consensual que estamos perante taxas e comissões interbancárias – i.e., contraprestações cobradas entre instituições de crédito – relativas a operações realizadas com cartões bancários:

  1. Quer em terminais de pagamento automático (TPA’s), nomeadamente no âmbito de aquisição de bens e serviços em estabelecimentos comerciais [TMI];
  2. Quer através da utilização de Caixas Automáticos (ATM ou multibanco), designadamente para realização de pagamentos [comissões por utilização de ATM’s]. 

 

            O regime de pagamentos aplicável encontra-se descrito no Caderno 10  do Banco de Portugal (BdP) disponível em linha: https://www.bportugal.pt/sites/default/files/anexos/pdf-boletim/10_terminais_de_pagamento_e_caixas_automaticos.pdf.

 

            No caso de pagamento em TPA’s[4], que dão origem às TMI, o titular do cartão dá uma ordem de pagamento relativa a uma compra ao comerciante, através da utilização do seu cartão no TPA. A informação é transmitida pelo Banco do comerciante que forneceu o TPA, designado por adquirente (acquirer)[5], ao Banco emissor do cartão, que autoriza o pagamento e fornece uma “garantia” de pagamento. O Banco adquirente paga ao comerciante, deduzindo (cobrando-lhe) uma comissão (a taxa de serviço do comerciante ou TSC). O Banco emissor do cartão, por sua vez, cobra ao cliente titular do cartão o valor da transação, reembolsa o Banco adquirente e cobrando a este último TMI.

           

            Em relação às comissões por utilização de ATM, interessa compulsar o Caderno 10 do BdP que configura o Caixa Automático como “um terminal de uma rede do sistema bancário que permite ao cliente efetuar diversos tipos de operações em regime de autosserviço, sem necessidade de recorrer aos balcões das agências bancárias. Os Caixas Automáticos permitem que operações correntes, como levantamentos, consultas, pagamentos e depósitos, ou outras operações normalmente realizadas junto do caixa da instituição, possam ser realizadas pelos clientes, mesmo que a instituição não esteja aberta.[6]

 

            Neste âmbito, quando são efetuados pagamentos através de ATM/Caixa Automático o Banco detentor do ATM cobra ao Banco emitente do cartão bancário uma comissão pelo serviço prestado.

 

            Com a alteração introduzida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março[7], a verba 17.3.4 da TGIS passou a enquadrar no âmbito de incidência do Imposto do Selo não apenas as comissões cobradas aos clientes das instituições, mas também as comissões e contraprestações interbancárias (v. resumo histórico na decisão arbitral do processo n.º 736/2020-T, ponto 3.2), apresentando à data dos factos a seguinte redação:

            “17.3 Operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas e quaisquer outras instituições financeiras - sobre o valor cobrado:

            […]

            17.3.4 Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões  4%

 

            O Requerente argumenta que não liquidou Imposto do Selo sobre as TMI e sobre as comissões interbancárias pela utilização de Caixas Automáticos em operações efetuadas com cartões bancários cobradas a outros Bancos por entender que aquelas não representam a remuneração de serviços financeiros, correspondendo apenas à redistribuição dos custos incorridos entre as diversas entidades bancárias intervenientes, pelo que sem cabimento na mencionada verba 17.3.4 da TGIS.

           

            Alega o Requerente que os serviços de pagamentos eletrónicos realizados com cartões bancários funcionam com o apoio de diversas empresas que operam o sistema de pagamentos e se situam a montante dos bancos, indicando nomeadamente a SIBS e as entidades que possuem a tecnologia e as marcas dos cartões, que cobram comissões aos Bancos. Assim, na construção do Requerente, a justificação da TMI e da comissão por utilização de ATM’s reside na partilha desses custos e reequilíbrio financeiro das posições dos bancos intervenientes, entre os quais não existe um específico vínculo jurídico e que se limitam a concertar a sua atividade para disponibilizarem aqueles meios aos seus clientes. Salienta, ainda, que, no caso dos ATM’s existe uma “mera relação de facto” entre os bancos que decorre de uma “convenção interbancária de colaboração recíproca” e, uma vez mais, que a comissão cobrada visa apenas repartir custos associados à tecnologia utilizada para por à disposição dos clientes as operações automatizadas.

 

            Porém, o facto de os Bancos incorrerem, a montante, em custos, tais como os inerentes aos serviços de plataformas tecnológicas e às marcas dos cartões bancários, não afasta, nem é incompatível, com a prestação de serviços financeiros que, pelo contrário, em regra postula existirem diversos encargos incorridos para a sua realização. Por outro lado, conforme assinalado na decisão do processo arbitral n.º 433/2020-T, não há qualquer indício de que o montante de TMI e de comissões cobrados seja estritamente limitado aos custos suportados para realizar as operações.

 

            Nem se afigura válida a asserção de que inexiste vínculo jurídico entre os bancos intervenientes, que é contrariada pela existência da relação de mandato e pela “convenção interbancária de colaboração recíproca” a que o Requerente faz apelo na caracterização das operações.

            Atenta a redação da verba 17.3.4, a sujeição a Imposto do Selo depende da circunstância de serem cobradas “comissões e contraprestações por serviços financeiros, incluindo as taxas relativas a operações de pagamento baseadas em cartões” e, na situação vertente, constata-se a cobrança efetiva de taxas [TMI] e comissões [pela utilização de ATM’s] decorrentes de operações de pagamento com cartões (v. a título ilustrativo, no mesmo sentido, as decisões arbitrais n.ºs 433/2020-T e 763/2020-T).

           

            Pelo exposto, não pode deixar de concluir-se que, quer a TMI, quer as comissões de utilização de ATM’s estão sujeitas a Imposto do Selo, nos termos da verba 17.3.4 da TGIS, na redação dada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março[8], encontrando-se preenchidos os pressupostos da tributação, de natureza objetiva e subjetiva, tendo em consideração que o Requerente é, como antes referido, uma instituição de crédito e que estas comissões são isentas de IVA (artigo 9.º, 27), alínea c) do Código do IVA), não beneficiando de qualquer norma de isenção de Imposto do Selo. Improcede, assim, este argumento do Requerente.

 

            4.         Valor Tributável – Compensação

 

Sobre o valor que constitui a base de incidência de Imposto do Selo, retira-se do disposto na verba 17.3 da TGIS que o mesmo corresponde ao valor cobrado das comissões e contraprestações e não a um valor “líquido” compensado de comissões e contraprestações pagas. Assim, em linha com o decidido nas ações arbitrais n.ºs 433/2020-T e 763/2020-T, inexiste suporte textual para aplicar a taxa de imposto [4%] apenas à compensação líquida que o Requerente aufere com as comissões recebidas “depois de saldados os diversos feixes de taxa multilateral de intercâmbio entre os diversos bancos”.

 

            Acresce salientar que, contrariamente ao que sustenta a Requerente, não se retira do Regulamento (UE) 2015/751 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2015, relativo às taxas de intercâmbio aplicáveis a operações de pagamento baseadas em cartões, que a compensação a considerar deva ser, para efeitos de Imposto do Selo, líquida. O artigo 2.º, ponto 10) deste diploma delimita a “taxa de intercâmbio”, como a taxa paga, “direta ou indiretamente (ou seja, através de terceiros), por cada operação realizada entre o emitente e o adquirente das operações de pagamento baseadas em cartões”, referindo de forma expressa que “[a] compensação líquida[9] ou qualquer outra remuneração acordada faz parte da taxa de intercâmbio”. (sublinhado nosso) Assim, a contraprestação acordada integra a TMI, devendo ser nesse sentido, sujeita a tributação integral.

 

            5.         Fundada Dúvida sobre o Facto Tributário

 

O Requerente suscita a invalidade do ato tributário com fundamento em dúvida sobre o facto tributário, nos termos do disposto no artigo 100.º, n.º 1 do CPPT. Todavia, não resultam da prova produzida dúvidas sobre a existência e quantificação do facto tributário, devendo, por essa razão, improceder o alegado vício.

 

            6.         Inconstitucionalidade – Capacidade Contributiva

 

            Prevalecendo o entendimento de que a verba 17.3.4. da TGIS é aplicável à TMI e às comissões interbancárias cobradas pela utilização de ATM's, por estarem incluídas no seu escopo, como este Tribunal concluiu supra, o Requerente suscita a inconstitucionalidade material da norma vertente, por violação do princípio da capacidade contributiva (v. artigos 103.º e 104.º da Constituição).

 

Para tanto, argumenta o Requerente que na tributação nesta cédula das operações financeiras é necessária a existência de uma realidade económica de sustentação que se reconduza à tributação de “despesa” ou “consumo” de serviços financeiros, o que, na sua perspetiva, não se verifica, pelo menos no que se circunscreve ao elemento da compensação.

 

Começamos por discordar da visão do Imposto do Selo como imposto sobre o consumo que constitui o ponto de partida do raciocínio do Requerente e que não corresponde à atual matriz introduzida com a Lei n.º 150/99, de 11 de setembro. Como afirma o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 4 de maio de 2022, no processo n.º 01711/15.1BEPRT, a propósito da questão da Taxa de Serviço de Comerciante que também se inscreve na citada verba 17.3.4 da TGIS, “o Imposto de Selo mudou a sua natureza essencial de imposto sobre os documentos, passando a afirmar-se como um verdadeiro tributo incidente sobre operações que, independentemente da forma da sua materialização, revelem rendimento ou riqueza. Nalguns casos incide sobre a despesa, noutros sobre o rendimento, e noutros ainda sobre o património, situação que, inevitavelmente, introduz um elemento perturbador da coerência do imposto e, por isso, um desafio acrescido para o intérprete. Na sua actual modelação, o imposto de selo configura-se como meio de atingir manifestações de capacidade contributiva não abarcadas pelas regras de incidência de quaisquer outros tributos, assim tendendo a assumir uma função residual (cfr.José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, 3ª. Edição, Almedina, 2016, pág.447 e seg.; António Santos Rocha e Outro, Tributação do Património, 2ª. Edição, Almedina, 2018, pág.615 e seg.; J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados, 1ª. Edição, Engifisco, 2005, pág.534).

 

Este imposto abrange, desta forma, realidades heterogéneas, como também assinala a decisão arbitral no processo 433/2020-T[10], incluindo “todas as situações reveladoras de capacidade contributiva que legislativamente se pretendem tributar que não são, como tal, incluídas no âmbito de incidência de outros impostos. Isto é, «através do imposto do selo, propriamente dito, visa-se tributar circulações de riqueza, de bens, de valores; sobretudo quando tais valores, ou bens, não tenham podido ser tributados por outra via». [( 6 ) SOARES MARTINEZ, Manual de Direito Fiscal, 7.ª edição, 1993, página 597. Na mesma linha, SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 435: o Imposto do Selo “assume a sua vocação de tributar aquilo que não pode ser tributado de outra forma”. Com o mesmo alcance, assinalando a natureza residual do Imposto do Selo, podem ver-se JÓNATAS E.M. MACHADO e PAULO NOGUEIRA DA COSTA, Manual de Direito Fiscal – Perspectiva Multinível, 2016, página 443, na esteira de SILVÉRIO MATEUS e CORVELO DE FREITAS, Os Impostos sobre o Património Imobiliário. O Imposto do Selo, 2005, página 534, e SALDANHA SANCHES e ANSELMO TORRES, A Incidência de Selo sobre o Trespasse de Estabelecimento, Fiscalidade, nº 32, Outubro-Dezembro de 2007, página 6.] [( 7 ) Neste sentido, podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 24-02-2011, processo n.º 0790/10, e de 14-03-2012, processo n.º 03/12.]

 

Por isso, não valem em relação ao Imposto do Selo preocupações de coerência sistemática, nem derivadas do facto de a tributação destas comissões não ser tributação do consumo, pois o âmbito de incidência objetiva do Imposto do Selo não se restringe a este tipo de tributação.

 

Em qualquer caso, continuando a acompanhar-se a decisão arbitral n.º 433/2020-T, “[n]o que concerne ao princípio da tributação tendo em atenção a capacidade contributiva, que é afloramento do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP), afigura-se que não é violado pela tributação das referidas comissões, pois elas revelam que quem as aufere dispõe de uma capacidade contributiva superior a quem não as recebe.

Por outro lado, não há qualquer indício de que o montante dessas comissões seja estritamente limitado aos custos suportados para realizar as operações.

Neste contexto, não se demonstra violação dos princípios da igualdade e da tributação com base na capacidade contributiva.

No que concerne ao artigo 104.º da CRP, afigura-se que não se coloca a questão da violação dos seus n.ºs 3 e 4, pois reportam-se à tributação do património e do consumo.

No caso destas comissões, incidindo o Imposto do Selo sobre os proventos que advêm da realização de operações com cartões, está-se perante uma forma especial de tributação de rendimento […]. Esta tributação não é incompaginável com o n.º 2 do artigo 104.º da CRP, pois estabelece que «a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real», não proibindo outras formas de tributação do rendimento, não baseadas no lucro tributável, inclusivamente com natureza de impostos de sobreposição. [( 8 ) Como sucede também com tributações autónomas em IRC, derramas municipais e estadual e várias contribuições especiais sobre determinados sectores de actividade.]

Pelo exposto, a TMI e as comissões não são materialmente inconstitucionais.”

 

            Aderindo ao acima exposto, conclui-se, neste ponto, pela improcedência da inconstitucionalidade material por violação do princípio da capacidade contributiva alegada pelo Requerente.

 

            7.         Redução do Valor Tributável – Comissões Inferiores a € 0,125

           

Sustenta o Requerente que até ao montante de comissões no valor de € 0,1249 não ocorre sujeição a Imposto do Selo na medida em que, por força do arredondamento aplicável, o resultado aritmético corresponde a zero, atendendo ao facto de que o Euro, enquanto moeda com curso legal em Portugal, está dividido em 100 subunidades designadas “cêntimos”, não sendo possível efetuar pagamentos inferiores a 1 cêntimo, por aplicação da fórmula 0,1249€*4%= 0,004996€=0,00€, pois se o algarismo que se encontra na terceira casa decimal é menor que 5, o algarismo que se encontra na segunda casa decimal não se altera.

 

            A Requerida contrapõe a ausência de suporte normativo para a regra de arredondamento e, além do mais, considera que as comissões não são apuradas individualmente, devendo ser consideradas conjuntamente/em bloco, por referência ao momento da respetiva cobrança (v. artigo 5.º, n.º 1, alínea h) do Código do Imposto do Selo).

 

            Relativamente à regra de arredondamento, afigura-se que a mesma, conforme defende a Requerente, resulta de uma lei científica, neste caso matemática, não carecendo de suporte normativo específico além das regras referentes ao Euro, moeda com curso legal em Portugal, que limitam as suas subunidades ao cêntimo, ou seja, à segunda casa decimal.

 

            Por outro lado, no tocante à contraprestação sobre a qual incide o Imposto do Selo, a verba 17.4.3 faz referência expressa a comissões e contraprestações por serviços financeiros, pelo que não é o conjunto das comissões/taxas que é sujeito a imposto, mas cada comissão ou taxa cobrada. Isto, independentemente de as comissões ou taxas serem cobrados de forma conjunta numa base periódica, diária ou outra, nomeadamente dependente do fecho dos TPA’s operados pelos comerciantes. 

 

Atenta a prova produzida pelo Requerente, inclusivamente em sede de procedimento inspetivo, ficaram evidenciados valores de compras pagas através de TPA e ATM cujo valor unitário gerou comissões inferiores a € 0,125, no período em causa [2017], no montante de € 1.931.397,02, conforme concluíram os Serviços de Inspeção (corrigindo inclusivamente o valor reportado neste âmbito pelo Requerente, que era de € 1.923.715,98), e os valores de pagamentos de serviços pagos pelo mesmo método no mesmo período, com comissões inferiores a € 0,125, na importância de € 51.398,40 (pontos E e H da matéria de facto supra). Deste modo, conclui-se, em linha com o Requerente, que foi liquidado indevidamente Imposto do Selo[11] no valor de € 79.311,82, decomposto nas seguintes parcelas:

  • € 77.255,88 = € 1.931.397,02 €*4%
  • € 2.055,94 = € 51.398,40*4%).

 

De referir, por fim, que se afigura irrelevante a forma como as comissões e taxas em causa foram faturadas, tendo em conta que a norma de incidência de Imposto do Selo não contempla qualquer exigência de faturação e de segregação específica para efeitos de determinação e apuramento deste imposto.

 

À face do exposto julga-se procedente a ilegalidade invocada pelo Requerente, sendo a liquidação de Imposto do Selo impugnada parcialmente anulada no mencionado valor de € 79.311,82.

            8.         Juros Compensatórios

 

Sendo anulada parcialmente a liquidação de Imposto do Selo no valor de € 79.311,82, não existe nessa medida retardamento da liquidação da prestação tributária, pelo que atento o disposto no artigo 35.º, n.º 1 da LGT devem ser anuladas as liquidações de juros compensatórios que lhe respeitem, no montante que vier a ser apurado pela Requerida, em execução da presente decisão.

 

            9.         Indemnização por Prestação de Garantia Indevida

 

Sobre o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, que o Requerente alicerça no disposto no artigo 53.º da LGT, o mesmo deve proceder na parte que proporcionalmente corresponda ao valor da prestação tributária anulada, de € 79.311,82 e juros compensatórios inerentes, improcedendo na parte remanescente, por se entender quanto à primeira que deriva de erro imputável aos Serviços, que calcularam o Imposto do Selo sobre uma base de incidência superior à que resulta da lei.

 

Assim, considerando que nos termos dos artigos 171.º, do CPPT, e 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, o processo arbitral constitui um meio processual próprio para requerer o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida, julga-se parcialmente procedente o pedido de indemnização pelas despesas suportadas para prestação de garantia bancária, na concreta parte das liquidações de Imposto do Selo e juros compensatórios correspondentes que vão anuladas, nos moldes acabados de referir.

 

Em todo o caso, não tendo sido indicado o montante de despesas efetivamente suportadas com a prestação da garantia, o montante de indemnização a pagar ao Requerente deve ser fixado em sede de execução do presente julgado.

 

* * *

 

Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil (artigo 608.º do CPC, ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

 

V.        Decisão

 

De harmonia com o supra exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e:

  1. Anular parcialmente a liquidação de Imposto do Selo referente ao ano 2017, acima identificada, no valor de € 79.311,82;
  2. Anular parcialmente as liquidações de juros compensatórios correspondentes, na parte que tenham sido calculados sobre o montante de Imposto do Selo de € 79.311,82 que vai anulado, a determinar em execução da presente decisão;
  3. Condenar a Requerida ao pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do artigo 53.º da LGT, na parte em que esta respeita à importância de imposto anulada [€ 79.311,82] e juros compensatórios que lhe correspondem, também a determinar em execução do julgado,

tudo com as legais consequências.

 

 

VI.      Valor do Processo

 

            Fixa-se ao processo o valor de € 1.169.454,96, indicado pela Requerente, respeitante ao montante das liquidações de Imposto do Selo cuja anulação pretende, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

 

VII.     Custas

 

            Custas no montante de € 15.912,00 (quinze mil novecentos e doze euros), sendo € 14.833,17 a cargo da Requerente (93,22%%) e € 1.078,83 da Requerida (6,78%), na proporção do decaimento, em conformidade com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT e 4.º do RCPAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 5 de setembro de 2022

 

Os árbitros,

 

Alexandra Coelho Martins, Relatora

 

Raquel Franco

 

Hélder Faustino

 

 



[1] Dado que a redação da alínea h) do n.º 3 do artigo 3.º do Código deste imposto apenas foi introduzida pela Lei n.º 22/2017, de 23 de maio.

[2] Norma que dispõe, a título residual, que nas “restantes operações financeiras realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades ou outras instituições financeiras, o cliente destas;”

[3] Dispõe esta alínea que a obrigação tributária nasce, “[n]as operações realizadas por ou com intermediação de instituições de crédito, sociedades financeiras ou outras entidades a elas legalmente equiparadas, no momento da cobrança dos juros, prémios, comissões e outras contraprestações, considerando-se efetivamente cobrados os juros e comissões debitados em contas correntes à ordem de quem a eles tiver direito;”.

[4] Caracterizados como “um dispositivo de aceitação de cartões que permite realizar pagamentos por via eletrónica. Efetua a leitura dos dados do cartão para autorização da operação e recolha dos elementos da transação para processamento. Possibilita ainda a autenticação eletrónica da operação (digitação do código secreto) e a emissão de talões com informações sobre os dados da transação” – v. Caderno 10 do BdP, p. 7.

[5] O adquirente (acquirer) é a entidade que adquire o crédito dos comerciantes que aceitam pagamentos com cartões de crédito e de débito. O adquirente (acquirer) contrata com o comerciante a aceitação de pagamentos com cartões e obtém do emissor do cartão a autorização para a realização da transação pelo cliente titular do cartão – v. Caderno 10 do BdP, pp. 7 e 8.

[6] V. Caderno 10 do BdP, p. 4.

[7] Que entrou em vigor em 31 de março de 2016 (artigo 218.º dessa Lei).

 

[8] Como referem João Espanha e Marta Gaudêncio, são sujeitas a imposto “(...) b) as comissões auferidas em razão da prestação de serviços financeiros; c) todas as demais contraprestações auferidas em razão da prestação de serviços financeiros, desde que as comissões e contraprestações sejam relativas a operações praticadas por instituições de crédito ou sociedades financeiras (e ainda entidades legalmente equiparadas e, bem assim, quaisquer outras instituições financeiras) ou por elas intermediadas” – v. “Sobre o Imposto do Selo: Algumas especificidades do crédito ao consumo”, Fiscalidade n.º 44 Out-Dez de 2010, pp. 85-86.

[9] Compensação líquida que o ponto 11) do mesmo artigo define como “o montante total líquido dos pagamentos, descontos ou incentivos recebido de um sistema de pagamento com cartões, de um adquirente ou de qualquer outro intermediário por um emitente, relativo a operações de pagamento baseadas em cartões ou a atividades conexas”.

[10] E, na sua esteira, também o processo arbitral n.º 763/2020-T.

[11] Decisão semelhante, ainda que com fundamento distinto foi proferida na decisão arbitral do processo n.º 763/2020-T.