Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 162/2014-T
Data da decisão: 2014-12-15  IRC  
Valor do pedido: € 29.779,28
Tema: IRC – Falta de fundamentação; preterição de formalidade essencial
Versão em PDF

Decisão Arbitral

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º 162/2014 – T

Tema: IRC – Falta de fundamentação ; falta de notificação para participação da decisão.

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

1.                  Em 21 de Fevereiro de 2014 a sociedade A SGPS, S.A. titular do número de identificação fiscal … , com sede … (doravante designada por “Requerente”), submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à obtenção de pronúncia arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (de ora em diante designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de indeferimento da reclamação graciosa com o n.º … , e consequentemente, o acto tributário de reacerto financeiro de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) com o n.º 2013 … , de 13/05/2013, referente ao exercício de 2009, no valor de € 29.779,28 (vinte e nove mil, setecentos e setenta e nove euros e vinte e oito cêntimos), a demonstração de liquidação de juros n.º … e a demonstração de acerto de contas n.º … .

 

2.                  No pedido de pronúncia arbitral a Requerente optou por não designar árbitro.

 

3.                  Nos termos do n.º 1 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro único o signatário Jorge Carita, que aceitou o cargo no prazo legalmente estipulado.

 

4.                  O tribunal arbitral ficou constituído em 28 de Abril de 2014.

 

5.                   Em 30 de Maio de 2014, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou resposta.

 

6.                  Na mesma data da resposta a Requerida procedeu à junção do processo administrativo instrutor.

 

7.                  A reunião prevista no artigo 18.º do RJAT foi dispensada pelas Partes. 

 

8.                  A Requerente e a Requerida apresentaram, dentro do prazo fixado pelo tribunal arbitral, as alegações escritas, respectivamente em 31 de Outubro e 17 de Novembro de 2014.

 

9.                  A posição da Requerente, expressa no pedido de pronúncia arbitral e nas alegações

escritas, é, em resumo, a seguinte:

 

9.1.       A demonstração de reacerto financeiro da liquidação de IRC n.º … , referente ao exercício de 2009, objecto da reclamação graciosa com o n.º … indeferida, não foi elaborada nos termos legalmente previstos.

9.2.       Efectivamente, entende a Requerente que para chegar à matéria colectável corrigida de € 658.885,50, a Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada por “AT”) acrescentou, ao resultado fiscal do grupo € 96.384,18 correspondentes à matéria colectável corrigida da A, S.A. no exercício de 2009 sociedade dominada do Grupo em que a Requerente é a sociedade dominante e, adicionalmente, corrigiu os prejuízos fiscais do grupo em igual valor.

9.3.       Na continuação deste raciocínio, a AT, ao invés de, ao resultado fiscal do grupo (€ 607.355,00) deduzir os prejuízos fiscais resultantes das correcções efectuadas às sociedades que integram o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (RETGS) (€ 44.853,68), realizou uma dupla correcção, acrescendo ao resultado fiscal a matéria colectável apurada pela A, S.A., por um lado, e subtraindo aos prejuízos fiscais do grupo as mesmas correcções.

 

9.4.       Concretizando, o acto de reacerto financeiro encontra-se inquinado de erro sobre os pressupostos de direito, na medida em que a correcção em causa não resulta da aplicação do artigo 70.º do Código de IRC na redacção vigente à data, já que a matéria colectável apurada não resulta da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo.

9.5.       A Requerente refere, ainda, que o projecto de despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada, limita-se a concluir no sentido em que “Consultado o sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira verificou-se que a liquidação em reclamação teve origem, em correcções efectuadas pela Divisão de Gestão Tributária, não tendo origem na ordem de serviço indicada pelo reclamante. A … não deu origem a qualquer correcção, conforme resulta do documento junto aos autos a fls. 51/52.”, acrescentando que, “em face do exposto fica precludida a apreciação dos fundamentos apresentados pelo Reclamante”.

9.6.       Não apresentando qualquer resposta ao vício alegado pela então Reclamante, nem fornecendo qualquer subsídio para a respectiva fundamentação.

9.7.       O mesmo acontecendo quanto ao despacho final de indeferimento da Reclamação Graciosa que, mesmo após a Requerente ter exercido o seu direito de audição, se limita a referir que “Analisado o contraditório exercido, verifica-se que o reclamante, não apresenta factos novos, que permitam alterar o já explanado no projecto de decisão já notificado e, o sentido de indeferimento do pedido, projectado”.

9.8.       Deste modo, entende a Requerente que lhe foi sonegado o seu direito à defesa e ao contraditório, na medida em que o direito à fundamentação de todos os actos praticados em matéria tributária que afectem direitos e interesses legítimos é claramente uma garantia essencial dos sujeitos passivos, nos termos conjugados dos n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), artigo 77.º da Lei Geral Tributária (LGT) e artigos 36.º e 37.º do Código do Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

9.9.       Quanto ao meio de defesa utilizado (reclamação graciosa), ao contrário do que a AT sugere, que em vez de a Requerente ter apresentado reclamação graciosa, deveria antes ter recorrido ao artigo 37.º do CPPT, a Requerente entende que a AT incorre em erro. Isto porque, o que está em discussão na reclamação graciosa é a falta de fundamentação da decisão da reclamação graciosa e não a falta de fundamentação do acto de notificação da decisão. 

9.10.   Por outro lado, entende a Requerente que a demonstração de reacerto financeiro de liquidação cuja legalidade também contesta, se encontra desprovida de fundamentação, uma vez que não contém nenhuma fundamentação, violando assim os artigos 268.º, n.º 3 da CRP, 77.º da LGT e 36.º e 37.º do CPPT.

9.11.   Entende também a Requerente que foi inequivocamente postergado o seu direito de participação das decisões, concedido pela alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT.

9.12.   Concluindo que, a demonstração de reacerto de contas, e consequentes, demonstração de liquidação de juros e de acertos de contas, encontram-se inquinadas por erro sobre os pressupostos de direito, não se podendo validamente manter na ordem jurídica.

9.13.   Mesmo que assim não se entenda, a Requerente entende que a demonstração de acerto financeiro e a decisão da reclamação graciosa no processo sub judice sempre teriam de ser anulados, por manifesto vício de forma, por falta de fundamentação, que resulta numa inelutável postergação dos direitos de defesa da Requerente.

 

10.              A posição da Requerida expressa na resposta e nas alegações escritas é, em síntese abreviada, a seguinte:

10.1.        Na verdade, labora a Requerente em erro, ao associar que a liquidação posta em crise é fruto da acção inspectiva a que foi atribuída a Ordem de Serviço n.º … e da qual não resultaram quaisquer actos desfavoráveis.

10.2.        A Requerente bem sabe que a liquidação em apreço resulta, não da acção inspectiva à Requerente A SGPS, S.A., mas sim das correcções feitas à sociedad B – Sociedade de Representações, S.A., sociedade esta pertencente ao grupo de que a Requerente é sociedade dominante.

10.3.        Na verdade, no ano de 2008 a B Representações declarou prejuízos fiscais no montante de € 253.203,84, e na sequência da OI n.º …, procedimento inspectivo ao IRC/2008 da B Representações, foram corrigidos os prejuízos fiscais em € 99.561,84, pelo que os prejuízos fiscais reportáveis para o ano de 2009 passaram para € 153.642,00 (ao invés dos € 253.203,84 inicialmente declarados).

10.4.        Com efeito, a B Representações, de modo voluntário submeteu uma declaração modelo 22 de substituição, na qual apurou a título de prejuízos fiscais o valor de € 153.642,00 proposto pelos Serviços de Inspecção Tributária.

 

 

10.5.        Acontece que, foi aberta outra acção de inspecção à B Representações, mas para o exercício de 2009, de âmbito parcial em sede de IRC.

10.6.        Nesse exercício, a B Representações, na declaração inicial de IRC, declarou um lucro tributável de € 250.026,18, ao qual deduziu, nos termos do artigo 47.º do CIRC, parte do prejuízo fiscal por si apurado no ano de 2008 na declaração modelo 22 de IRC inicialmente entregue (€ 253.203,84), o que teve como consequência o apuramento de matéria colectável nula, quando somente poderia deduzir o montante já corrigido em 2008, isto é, € 153.642,00.

10.7.        Porém, na falta da correcção atempada pelo sujeito passivo B Representações e tratando-se de uma correcção meramente aritmética, os serviços procederam à sua correcção oficiosa, o que originou a liquidação posta em crise – liquidação n.º … de 13/05/2013, no montante de € 55.357,24.

10.8.        E, em período coincidente com o processamento da liquidação em apreço, foi aberto à Requerente o procedimento inspectivo interno n.º … de 21/01/2013, inserido nas ações de controlo de sujeitos passivos tributados pelo regime especial de tributação de grupos de sociedades.

10.9.        Sucede que, entretanto, a B Representações submeteu a declaração Modelo 22 de substituição em conformidade com o vertido no projecto de relatório da acção inspectiva com a Ordem de Serviço n.º … .

10.10.    Não existindo necessidade de correcções, foi a Requerente notificada do resultado da ação inspectiva … , do qual não resultaram quaisquer actos desfavoráveis.

10.11.    Em virtude da correcção efectuada à … , de acordo com a ordem de serviço … , vertida na declaração de substituição entregue por aquela, que originou a liquidação ora em causa, e sendo a … a sociedade dominada, de acordo com o RETGS, a Requerente pagou uma parte do montante apurado e vertido na liquidação impugnada e notificada a esta, que era de € 55.357,24.

10.12.    Deste modo, a Requerida procedeu à demonstração de reacerto financeiro, a qual traduz um montante a pagar de € 29.779,28 que reflecte somente o diferencial entre o montante a pagar/devido e o montante entretanto pago pela Requerente, ou seja, € 55.357,24 – € 25.577,96.

10.13.    Apesar de a Requerente invocar que não compreende, atenta a falta de fundamentação da liquidação alegada, acontece que a mesma bem percebeu o que estava em causa. Senão veja-se o artigo 30.º do Pedido “A demonstração de reacerto financeiro (…) visaram alterar o valor considerado como pagamento de autoliquidação da Requerente, tendo portanto em conta o montante pago (…)”.

10.14.    Refere-se, ainda, que a Requerente apresentou a reclamação graciosa cujo indeferimento aqui se discute, partindo do princípio que a liquidação em apreço se relaciona com a Ordem de Serviço n.º … aberta em nome da A SGPS, para dessa forma pôr em crise a liquidação.

10.15.    Sucede, que a liquidação em causa não está relacionada com o procedimento inspectivo aberto em nome da A SGPS.

10.16.    A liquidação em apreço é consequente das correcções aritméticas da alteração do prejuízo fiscal de 2008 à B Representações, que deveriam ter sido reflectidas pela B Representações na declaração de IRC/2009, e que gerariam uma liquidação correctiva, na medida em que a matéria colectável passou de nula a positiva.

10.17.    Não o tendo feito, procederam os serviços oficiosamente à sua correcção.

10.18.    A Requerente não utilizou o meio próprio para requerer a fundamentação alegadamente em falta. Assim, em vez de ter reclamado graciosamente deveria ter recorrido ao artigo 37.º CPPT.

10.19.    Na verdade a resposta da AT é sucinta, mas reflecte tudo o que é necessário informar, porquanto a Requerente labora em erro ao associar a liquidação em crise à Ordem de Serviço por si indicada e, fundando a Requerente a sua pretensão na OI … não poderia, em sede de reclamação, a AT ter decido de forma diferente da que decidiu, porque os fundamentos apresentados não decorriam da OI invocada.

10.20.    E, estando em causa correcções meramente aritméticas, não é necessário facultar o exercício do direito de audição.

10.21.    Concluindo, da dispensa do direito de audição, não resulta assim, no caso sub judice, qualquer violação do princípio do contraditório, não havendo quaisquer elementos novos que pudessem ser trazidos à colação pela Requerente que pudessem alterar a fundamentação de um acto tributário já consolidado no ordenamento jurídico, não existindo,  assim, qualquer preterição legal, consubstanciadora de qualquer ilegalidade.

 

II – QUESTÕES DECIDENDAS

 

11.              Em face do exposto, nos números anteriores, as principais questões a decidir são as seguintes:

a)                 A decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º … e o subjancente acto tributário de liquidação de IRC n.º … , referente ao exercício de 2009, no valor de € 29.779,28 da autoria do Ministério das Finanças, Autoridade Tributária e Aduaneira, Área da Justiça Tributária, Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa, padece de ilegalidade por incorrer no vício de violação da lei;

b)                 A decisão, identificada na alínea anterior, encontra-se inquinada de vício de forma por falta de fundamentação;

c)                  Quanto à liquidação de IRC sub judice verificou-se a falta de fundamentação, bem como a preterição da formalidade essencial de falta de audição prévia do contribuinte e consequente violação do artigo 60.º n.º 1 da LGT para participação na formação do acto.

 

III – SANEAMENTO

 

O Tribunal encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º., nº 2, e 6.º, n.º 1, do RJAT.

 

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, de acordo com o n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, nº 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

Tudo visto, cumpre proferir decisão.

 

 

IV – FUNDAMENTOS DE FACTO

 

12.              Tendo em conta o processo administrativo tributário e a prova documental junta aos autos, cumpre agora apresentar a matéria factual relevante para a compreensão da decisão, que se fixa como se segue:

 

12.1.        Da A – SGPS, S.A.” – sociedade dominante/Requerente

 

A.      A Requerente encontra-se enquadrada, para efeitos de IRC, no Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), como sociedade dominante.

 

B.       No ano de 2008, foi declarado pelo grupo da Requerente um prejuízo fiscal de € 147.162,52, tendo aquele sido corrigido para € 44.853,68, em resultado do artigo 78.º da Resposta.

 

C.       Em 31.05.2010, foi apresentado pela Requerente a declaração de rendimentos Modelo 22 do grupo, respeitante ao exercício de 2009, a que foi atribuído o código de identificação da Declaração … .

 

D.      Em 21.01.2013, a Requerente foi objecto de uma acção inspectiva realizada pela AT com a finalidade de analisar a declaração periódica de IRC do exercício de 2009, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º … (cfr. Relatório da Inspecção Tributária, fls. 17 do PA).

 

E.       Em 22.05.2013, a Requerente foi notificada da liquidação com o n.º … , da demonstração de juros n.º … e da demonstração de acerto de contas n.º … , com data limite de pagamento em 17.07.2013, referente ao exercício de 2009, no valor de € 55.357,24 (cinquenta e cinco mil, trezentos e cinquenta e sete euros e vinte e quatro cêntimos) (cfr. fls. 19 a 21 do PA).

 

F.       Em 30.05.2013, no âmbito da acção inspectiva, supre referenciada, a Requerente é notificada de que tal inspecção não proporcionou qualquer correcção (cfr. Relatório da Inspecção Tributária, fls. 23, 51 e 52 do PA).

 

G.      Em 03.06.2013, a Requerente efectua um pagamento parcial de autoliquidação referente à mencionada liquidação, no valor de € 25.577,96 (vinte e cinco mil e quinhentos e setenta e sete euros e noventa e seis cêntimos) (cfr. fls. 36 a 37 do PA).

 

H.      Em 02.07.2013, a Requerente foi notificada da liquidação de reacerto financeiro de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) com o n.º …. , referente ao exercício de 2009, no valor de € 29.779,28 (vinte e nove mil, setecentos e setenta e nove euros e vinte e oito cêntimos), da demonstração de liquidação de juros n.º … e da demonstração de acerto de contas n.º … (cfr. fls. 13 a 15 do PA).

 

I.         O valor referenciado na liquidação de reacerto financeiro, teve em conta o valor pago pela Requerente. Assim, o valor de € 29.779,28, foi determinado tendo em conta a liquidação de IRC de 22.05.2013 referente ao exercício de 2009, no valor de € 55.357,24, ao qual foi subtraído o montante € 25.577,96, que diz respeito ao valor pago pela Requerente (cfr. artigo 30.º do pedido da Requerente e o artigo 38.º da resposta da Requerida).

 

J.        Em 18.09.2013, foi aberto um procedimento de Reclamação Graciosa, a que foi atribuído o n.º … , pelos Serviços de Finanças … (cfr. fls. 1 do PA).

 

K.      O impulso para o procedimento referido, foi dado pela Requerente, uma vez que não se conformou com a liquidação em causa, razão pela qual, ao abrigo do disposto no artº. 137.º do Código do IRC e nos artigos 68.º e sgs do CPPT, apresentou a respectiva reclamação graciosa.

 

L.       Por fax datado de 28.10.2013, foi a Requerente notificada do projecto de indeferimento da reclamação graciosa, bem como para exercer o direito de audiência prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT.

 

M.     Em 12.10.2013, a Requerente exerceu o referido direito de audição.

 

N.       Em 26.11.2013 a Requerente foi notificada do indeferimento da decisão do procedimento de reclamação graciosa (cfr. fls. 1 a 40 e 53 a 76 do PA).

 

O.       Em 21.01.2014, mesmo não concordando com a correcção efectuada, a Requerente efectuou o pagamento do tributo vertido na liquidação de reacerto, ora em causa, no valor de € 29.779,28 (cfr. doc. n.º 13 junto ao Pedido).

 

12.2.   Da “B – … Representações, S.A.” – sociedade dominada

 

P.        Em 21.04.2010, foi emitida uma Ordem de Serviço n.º …, ao sujeito passivo “B – … Representações, S.A.”, sociedade dominada pela Requerente, que se inseriu na actividade de “acções de controlo de sujeitos passivos tributados pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades”, em sede de IRC do exercício de 2008.

 

 

Q.       Em 31.08.2012, a B Representações, S.A. foi notificada do projecto de correcções respeitante à Ordem de Serviço n.º …, nos termos e para os efeitos do artigo 60.º do RCPIT e da LGT, fazendo com que o resultado fiscal do exercício de 2008 passasse de um prejuízo fiscal declarado de € 253.203,84 para € 153.642,00, tendo sido efectuado uma correcção no valor de € 99.561,84.

 

R.       Como no decurso do prazo para o exercício do direito de audição, o sujeito passivo regularizou de forma voluntária a situação descrita, através da entrega de declaração modelo 22 de IRC de substituição em 17.09.2012, a incorrecção relatada no projecto de correcções, ficou sem efeito, pelo que se propôs o encerramento daquela ordem de serviço em 12.10.12 (cfr. fls. 43 a 47 do PA).

 

 

S.        Em 20.03.2012, foi emitida uma Ordem de Serviço n.º … , ao sujeito passivo “B – Representações, S.A.”, sociedade dominada pela Requerente, que se inseriu na actividade de “acções de controlo de sujeitos passivos tributados pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades”, em sede de IRC do exercício de 2009, tendo sido efectuado uma correcção ao prejuízo fiscal deduzido.

 

T.       A dita sociedade apurou na 1ª. Declaração Modelo 22 do IRC no exercício de 2009 um lucro tributável de € 250.026,18 ao qual foi deduzido, nos termos do artigo 47.º do Código de IRC (à data dos factos), parte do prejuízo apurado pelo sujeito passivo no ano de 2008, o que teve como consequência o apuramento de matéria colectável nula. Acontece que, em resultado da acção de inspecção ao ano de 2008, em que foram propostas correcções que alteravam o prejuízo fiscal calculado pelo sujeito passivo, este, de modo voluntário, apresentou uma declaração modelo de 22 de substituição, na qual foi apurado um prejuízo fiscal de € 153.642,00 (vd. 31 a 34 do PA).

 

U.       Em resultado da alteração do prejuízo fiscal do ano de 2008, o prejuízo fiscal dedutível nos exercícios seguintes, passou de € 253.203,84 para € 153.642,00, pelo que foi efectuada uma correcção à matéria colectável para € 96.384,18 (€ 250.026,18 - € 156.642,00) (cfr. fls. 25 a 30 do PA).

 

13.              Relativamente aos factos enunciados no n.º anterior, relevaram os documentos juntos aos autos, bem como o processo administrativo, tudo analisado e ponderado em conjugação com os articulados, dos quais resulta concordância quanto à factualidade apresentada pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral.

 

14.              Não existem factos dados como não provados, porque todos os factos relevantes para a apreciação do pedido foram dados como provados.

 

 

 

V – FUNDAMENTOS DE DIREITO

 

15.              Vamos determinar agora o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões já enunciadas (vd., supra n.º11).

 

16.              Começaremos por apreciar a primeira questão enunciada, ou seja, se a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º … e o subjancente acto tributário de liquidação de IRC n.º … , referente ao exercício de 2009, no valor de € 29.779,28 da autoria do Ministério das Finanças, Autoridade Tributária e Aduaneira, Área da Justiça Tributária, Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa, padece de ilegalidade por incorrer no vício de violação da lei.

 

17.              A Requerente encontra-se enquadrada no regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS), regime previsto nos artigos 69.º a 71.º do Código de IRC, tendo esta optado, como a lei lhe faculta, pela aplicação desse regime para determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo. Nos termos deste regime, cabe às sociedades dominadas o apuramento do respectivo lucro individual e cabe à sociedade-mãe o apuramento e liquidação do imposto devido pelo grupo.

A este respeito Rui Duarte Morais afirma que “Cada sociedade, incluindo a sociedade-mãe, entregará a sua declaração, apurando o respectivo resultado fiscal (como se este regime especial não fosse aplicável). A sociedade-mãe entregará, ainda, uma outra declaração, onde apura o lucro tributável do grupo (segundo as regras deste regime) e autoliquidará o imposto devido.” (vd. Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, págs. 155 e 156, nota 333). Este raciocínio, vai ao encontro ao artigo 70.º do Código de IRC que nos diz que o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo.

Transpondo a forma de determinação do lucro tributável dos grupos de sociedades, insertas no RETGS, para o caso da Requerente, no sentido de decompor a diferença entre a matéria colectável do grupo declarada, no valor de € 460.189,48 e a apurada pela AT no valor de € 658.885,50, temos:

 

Sociedade dominada “B – … Representações, S.A.”

 

Resultado Fiscal do Exercício

 

Empresa

AT

2008

 

 

Prejuízos Declarados

253.203,84 €

 

Correcção

 

99.561,84 €

Prejuízos Corrigidos

 

153.642,00 €

Prejuízos a reportar para 2009

253.203,84 €

153.642,00 €

 

 

 

2009

 

 

Lucro Tributável

250.026,18 €

 

Prejuízos Deduzido

250.026,18 €

 

Prejuízos Corrigidos

 

153.642,00 €

Matéria colectável corrigida

 

96.384,18 €

Liquidação

0

39.724,69 €

 

 

Sociedade dominante “A – SGPS, S.A.”

  

Resultado Fiscal do Exercício

 

Grupo

AT

2008

 

 

Prejuízo fiscal declarado

147.165,52 €

 

Prejuízo fiscal corrigido

44.853,68 €

 

Diferença entre o prejuízo declarado e o corrigido

 

102.311,84 €

Correcção das perdas de exercícios anteriores

44.853,68 €

 

 

 

 

2009

 

 

Prejuízo fiscal declarado

147.165,52 €

44.853,68 €

Soma algébrica dos resultados fiscais

607.355,00 €

 

Matéria colectável

460.189,48 €

658.885,50 €

Correcção

 

198.696,02 €

Liquidação IRC

131.114,80 €

186.472,04 €

Liquidação IRC corrigida (…)

 

55.357,24 €

 

 

Nestes termos, o apuramento da matéria colectável corrigida no valor de € 658.885,50 diz respeito ao acréscimo de € 96.384,18 referente à correcção da matéria colectável de IRC do ano de 2009 da sociedade dominada “B – Representações, S.A., conforme à acção inspectiva daquele ano e a declaração de substituição emitida (cfr. factos assentes T e U) e de € 102.311,84 relativo à correcção do prejuízo fiscal do exercício de 2008 da Requerente, cfr, facto assente C. (diferença entre o prejuízo fiscal declarado pela Requerente de  € 147.165,52 e a correcção, por esta, daquele prejuízo para € 44.853,68).

Assim, a matéria colectável apurada pela Requerente para o exercício de 2009 no valor de  € 460.189,48 foi corrigida para  € 658.885,50 (€ 460.189,48 +  € 96.384,18 + € 102.311,84).

O cálculo do lucro individual de cada sociedade dominada é, no RETGS, e no que concerne à sociedade dominante, apenas, um acto prévio de aplicação do regime de determinação do lucro tributável da sociedade dominante e da consequente liquidação do imposto.

Saliente-se que o Acórdão Arbitral do CAAD n.º 10/2012-T, refere que “O RETGS não exige que os lucros das sociedades dominadas se tenham tornado definitivos, i.e., que se tenha formado caso julgado ou resolvido sobre o acto da sua autoliquidação e, muito menos, que já tenham sido sujeitos a inspecção, correcção e aprovação pelas autoridades fiscais, antes de a sociedade dominante apurar o IRC do grupo.”.

Decorre, deste modo, que a liquidação, objecto da reclamação graciosa ora em Pronúncia, é uma correcção aritmética da matéria colectável da Requerente originada por uma correcção nos prejuízos fiscais apurados pela sociedade dominada “B – Representações, S.A.” no exercício de 2008 e que a AT teve necessidade de corrigir. 

 

 

18.              A Requerente, efectivamente, pretende atacar o acto primário que é a Liquidação de Reacerto Financeiro de IRC n.º …, e consequentes liquidações de acerto de contas e de juros (cfr. 13 a 15 do PA), que deram origem ao acto de segundo grau que foi o acto de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º … .

Acontece que, ao contrário do que transparece do Pedido apresentado pela Requerente, aquele acto primário deriva da Ordem de Serviço n.º … e não da Ordem de Serviço n.º … .

Conforme factos assentes em D. e E., a Requerente foi objecto de uma acção inspectiva realizada pela AT com a finalidade de analisar a declaração periódica de IRC do exercício de 2009, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º … (cfr. Relatório da Inspecção Tributária, fls. 17 do PA). No âmbito desta acção inspectiva, a Requerente é notificada pela AT com a informação de que não resultaram “(…) quaisquer actos tributários ou em matéria tributária que lhe sejam desfavoráveis”. (cfr. Relatório da Inspecção Tributária, fls. 51 e 52 do PA).

Assim sendo, a base que serviu de apoio à liquidação posta em crise, não foi efectivamente aquela que vem vertida no Pedido, da qual como vimos, não resultou qualquer correcção, mas sim da Ordem de Serviço n.º … .

Esta última mencionada acção de inspecção, foi inserida nas acções de controlo de sujeitos passivos tributados pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades, relativamente a IRC do exercício de 2009, efectuada à sociedade dominada “B – Representações, S.A.”.

Efectivamente, após a verificação de todos os elementos, a AT entendeu efectuar uma correcção ao prejuízo fiscal deduzido, uma vez que no exercício em causa, 2009, foi deduzido parte do prejuízo fiscal apurado no ano de 2008 que, no âmbito da acção de inspecção a este ano de 2008 (…) passou de € 253.203,84 para € 153.642,00, dando assim origem à liquidação posta em crise, produzindo efeitos na situação da sociedade dominante, que como vimos, é responsável pelo apuramento e liquidação do imposto devido pelo grupo. Por concordar integralmente com a respectiva fundamentação, a sociedade dominada apresentou uma declaração Modelo 22 de substituição em conformidade com as correcções propostas no projecto de relatório. Parte do montante apurado e vertido na liquidação em causa foi pago pela Requerente (€ 25.577,96), dando assim origem à demonstração de reacerto financeiro, a qual traduz um montante a pagar de € 29.779,28, valor já pago, em 21.01.2014, pela Requerente (cfr. facto assente O.).

 

Nestes termos, uma vez que a fundamentação da liquidação que a Requerente pretende anular diz respeito à Ordem de Serviço … (onde realmente derivaram correcções à matéria colectável, e consequentemente, liquidação de imposto em falta), o certo é que não pode utilizar a Ordem de Serviço n.º … para sustentar que a liquidação em crise está viciada, com erro nos pressupostos de direito, quando daquela acção de inspecção não resultou qualquer correcção à matéria colectável da Requerente. Pelo que, não deverá ser considerada procedente a arguida ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa por vício de violação da lei. De realçar que não nos cabe aqui discutir qualquer ilegalidade, à luz das normas substantivas, que expresse o carácter indevido da prestação tributária, conforme foi explicado neste ponto.

 

19.              Em seguida, analisamos a questão de saber se a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …, objecto nos presentes autos arbitrais, se encontra inquinada de vício de forma por falta de fundamentação.

 

20.              A questão agora colocada, vem no seguimento do ponto anterior. A liquidação ora objecto dos presentes autos arbitrais, não está relacionada com o procedimento inspectivo … , é consequente das correcções aritméticas da alteração do prejuízo fiscal de 2008, que deveriam ter sido refectidas na declaração de IRC do ano/exercício de 2009, na medida em que a matéria colectável passou de nula a positiva, gerando assim a liquidação correctiva, ora em crise.

 

21.              Cabe agora analisar a falta de fundamentação, bem como a preterição da formalidade essencial de falta de audição prévia do contribuinte e consequente violação do artigo 60.º n.º 1 da LGT para participação na formação do acto, quanto à liquidação de IRC n.º … subjacente à decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º … (vd., alínea c) do n.º 11).

 

22.              A fundamentação é uma exigência dos actos tributários em geral imposta constitucionalmente através do artigo 268.º da CRP. Em matéria tributária, o dever de fundamentação vem regulado no artigo 77.º da LGT. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, em anotação ao artigo 77.º da LGT, afirmam “Como o STA vem entendendo, a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa. Para ser atingido tal objectivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.” (vd., Lei Geral Tributária. Anotada e Comentada, 4.ª ed., Lisboa, Encontro da Escrita Editora, 2012, pp. 675).

 

23.              A fundamentação deve consistir numa exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão. Tal como vem vertido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo “Segundo a jurisprudência uniforme deste STA, e atendendo à funcionalidade do instituto da fundamentação dos actos administrativos, ou seja, ao fim instrumental que o mesmo prossegue, um acto estará devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade administrativa, e optar conscientemente entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação” (cfr. Processo n.º 0554/10, de 02.12.2010).

 

24.              Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência o acto considera-se não fundamentado (vd. n.º 2 do artigo 125.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA)). Além disso, a fundamentação de actos que afectem direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos deve ser acessível, ou seja, o conteúdo da fundamentação deve ser facilmente perceptível pelo destinatário (vd., n.º 3 do artigo 268.º da CRP).

 

25.              A liquidação de IRC sub judice, como já mencionada, decorre da correcção aritmética ao IRC de 2009 da sociedade dominada “B – Representações, S.A.”, de acordo com a OI … , acção inspectiva que teve como propósito refletir a correcção que derivou do procedimento inspectivo do ano de 2008 (OI…), também em sede de IRC, com efeito na situação tributária da sociedade dominante, uma vez que cabe às sociedades dominadas o apuramento do respectivo lucro individual e cabe à sociedade-mãe/dominante o apuramento e liquidação do imposto devido pelo grupo, de acordo com o RETGS. Ou seja: a sociedade dominada, no IRC de 2009 apenas poderia deduzir € 153.642,00 de perdas de exercícios anteriores, porém foi deduzido o valor de € 250.026,18, até à concorrência do respectivo lucro tributável. Por isso, a sociedade dominada não tendo relevado esta diferença de valores na declaração Modelo 22, respeitante ao IRC de 2009, e sendo o lucro tributável do grupo, quer o imposto, imputados em relação à sociedade dominante, foi necessário a AT corrigir esse resultado, passando a Requerente de uma matéria colectável nula a positiva. Aliás, no exercício de 2008 o grupo da Requerente declarou um prejuízo fiscal de € 147.165,52, tendo corrigido aquele prejuízo para € 44.853,68. Porém, no que diz respeito ao IRC do ano de 2009, a Requerente considerou sempre perdas de exercícios anteriores no valor de € 147.165,52 (vd. facto assente C.). Sendo necessário, face à correcção do ano de 2008, proceder-se à correcção aritmética ao IRC de 2009, acrescendo € 96.384,18, resultado de € 250.026,18 - € 153.642,00, ao lucro tributável e corrigindo as perdas de exercícios anteriores para € 44.853,68.

 

26.              Saliente-se que, da demonstração de reacerto financeiro resulta que o único campo alterado da liquidação de IRC foi o campo 28 referente a “Pagamento de auto liquidação”, que passou de € 131.114,80 para € 156.692,76, correspondendo ao pagamento efectuado pela Requerente de € 25.577,96 (vd. facto assente H.).

 

27.              Assim, resulta que o acto de liquidação, acto subjacente à decisão de indeferimento da reclamação graciosa em análise, objecto do pedido de pronúncia arbitral, preenche um teor mínimo de informação que permite considerar verificados os requisitos que são exigidos para a fundamentação dos actos tributários, e que se encontram referidos nos anteriores pontos n.ºs 21.º e 22.º.

 

28.              Uma vez que se trata de uma correcção aritmética, derivada da acção de inspecção OI …, foi possível à Requerente conhecer o itinerário valorativo e cognoscitivo seguido pela AT para proceder à liquidação. Do teor do argumentário ínsito do presente processo resulta ter efectivamente a Requerida conhecimento desse itinerário.

 

29.              Nestes termos, não deverá ser considerada procedente a arguida preterição de formalidade, decorrente do invocado incumprimento do dever legal de fundamentação, que nos termos do artigo 268 da CRP e 77.º da LGT impende sobre a AT.

 

30.              Por último, resta analisar a questão da preterição de formalidade essencial de falta de audição prévia e consequente violação do artigo 60.º da LGT.

 

31.              Como referido no ponto 17., o cálculo do lucro individual de cada sociedade dominada é, no RETGS, e no que concerne à sociedade dominante, apenas, um acto prévio de aplicação do regime de determinação do lucro tributável da sociedade dominante e da consequente liquidação de imposto. É a declaração periódica de rendimentos do grupo, apresentada pela sociedade dominante, que é liquidável e não as declarações das sociedades dominadas, apesar de cada uma das sociedades incluídas no perímetro ter o dever de submeter uma declaração periódica de rendimento individual, que não produz efeitos de liquidação (cfr. artigo 120.º n.º 6 do Código de IRC).

 

32.              O artigo 60.º da LGT assegura a participação dos contribuintes na formação das decisões e deliberações que lhe dizem respeito, de acordo com o estabelecido no n.º 5 do artigo 267.º da CRP.

 

33.              Acontece que, o n.º 3 do artigo 60.º da LGT afirma “Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado”.

 

34.              A jurisprudência do STA tem salientado que a circunstância do contribuinte ter sido ouvido antes da conclusão do relatório da inspecção tributária dispensa a sua audição antes da liquidação (vd. Ac. STA de 15-10-2003 recurso n.º 1115/03; Ac. STA de 16- 05-2007, recurso n.º 186/07; Ac. do Pleno do STA de 24-10-2007, recurso n.º 131/07, disponíveis em www.dgsi.pt/jsta).

 

35.              Na factualidade objecto dos presentes autos arbitrais ficou provado que a sociedade dominada, no período concedido para exercer o direito de audição prévia relativamente ao Projecto de Relatório de Inspecção Tributária OI …, concordou com as correcções propostas pela AT, submetendo a declaração Modelo 22 de substituição (vd. facto assente T.).

 

36.              Assim, a liquidação de reacerto de contas, a qual traduz um montante a pagar de € 29.779,28, reflete o diferencial entre o montante a pagar (decorrente da acção inspectiva OI…) e o montante entretanto pago pela Requerente, não configura um facto novo susceptível de ser enquadrado no n.º 3 do artigo 60.º da LGT, porque não existe uma alteração de factos ou de critérios de análise dos mesmos, relativamente ao estabelecido no Relatório da Inspecção Tributária OI … sobre o qual a Requerente foi ouvida, como a própria admite no artigo 23.º do seu Pedido.

 

37.              No sentido de tornar claro que, nos termos do RETGS, o cálculo do lucro individual de cada sociedade dominada é, e no que concerne à sociedade dominante, apenas, um acto prévio de aplicação do regime de determinação do lucro tributável da sociedade dominante e da consequente liquidação do imposto, saliente-se que o já referido Acórdão Arbitral do CAAD n.º 10/2012-T, mencionada que “É pressuposto de direito e de facto do regime fiscal estatuído que a sociedade dominante tem controlo sobre a actividade e sobre os lucros das sociedades dominadas. As sociedades dominadas são, verdadeiramente, uma longa manus da sociedade dominante.”.

 

38.              Considerando o exposto nos pontos anteriores, improcede a alegação da Requerente de que se verificou a preterição de formalidade essencial de falta de audição prévia.

 

VI – DECISÃO

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a)      Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, manter os actos tributários impugnados nos autos;

b)      Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante de € 765,00, tendo-se em conta o já pago.

 

Fixa-se o valor do processo em € 29.779,28, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 765,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi integralmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 15 de Dezembro de 2014.

 

O Árbitro

 

(Jorge Carita)