Decisão Arbitral
Os árbitros Professor Doutor Nuno Cunha Rodrigues (árbitro-presidente), Dr. José Manuel Parada Ramos e Dr. Hélder Faustino (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 20-04-2022, acordam no seguinte:
1. Relatório
A..., pessoa colectiva com sede Rua ..., ..., ..., ...– ... Lisboa, NIPC ... (doravante “Requerente”), veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), tendo em vista a declaração de ilegalidade e anulação parcial das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (doravante “IVA”) n.ºs 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021... (parcialmente), 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021... (parcialmente), 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., respeitantes ao período de 2017 e 2018 e, bem assim, anulação parcial do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante “IRC”) n.º 2021..., respeitante ao período de tributação de 2017.
A Requerente pede ainda o reembolso das quantias pagas, acrescido de juros.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 15-02-2022.
Em 01-04-2022, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes da designação dos Árbitros, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 8 do artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT sem que as Partes alguma coisa viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 20-04-2022.
A AT apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Em 30-05-2022 foi dispensada a realização da reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.
As Partes apresentaram alegações.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:
A. A Requerente é uma Associação Científica de direito privado fundada em 1951, dotada de personalidade jurídica própria e declarada Entidade de Utilidade Pública, sem fins lucrativos, em 26 de fevereiro de 1998 (cfr. DR número 65; II Série, de 18/03/1998) e que se rege pelos seus estatutos e pelas disposições legais aplicáveis.
B. A Requerente congrega, reúne e representa a atividade dos médicos que exercem Medicina ... em Portugal e visa promover o desenvolvimento da Medicina ... ao serviço da população portuguesa.
C. De acordo com os seus Estatutos, a Requerente tem como finalidades:
a. Promover o desenvolvimento e a valorização da Medicina ... no Sistema de Saúde Português, ao serviço da população, o que deverá concretizar-se junto das autoridades de saúde, da Ordem dos Médicos e das instituições de ensino e assistência médica;
b. Elaborar e divulgar documentação científica que melhore a prática clínica;
c. Cooperar na organização de atividades de formação contínua – presenciais ou no ciberespaço - dirigidas aos seus membros e outros profissionais de saúde;
d. Desenvolver acções educativas e de apoio à população, visando a prevenção das doenças e a promoção da saúde;
e. Representar e fomentar a participação dos internistas em reuniões internacionais;
f. Cooperar com outras associações científicas portuguesas e estrangeiras.
D. A Requerente encontra-se sujeita ao regime geral de IRC, sendo que, para efeitos de IVA vigora o regime de tributação normal de periodicidade mensal;
E. Para efeitos de enquadramento em sede de IVA, a Requerente considera-se um sujeito passivo misto porquanto, na prossecução das suas atividades estatutárias pratica, em simultâneo, operações isentas sem direito à dedução e operações tributadas que conferem direito à dedução de IVA.
F. Foi efectuada uma Inspecção Tributária à Requerente e foi elaborado Relatório da Inspecção Tributária que consta do Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
IVA deduzido indevidamente:
a. Custos de produção da revista: “a A... nem sempre cumpriu com o disposto no artigo 23.º do Código do IVA, ou seja, deduziu pela totalidade o IVA suportado referente às aquisições de bens e serviços que têm como destino a atividade sujeita e não isenta e atividades isentas de IVA, nomeadamente a aquisição de serviços relacionadas com a produção da revista distribuída pelos sócios em que as receitas associadas às mesmas são as quotas dos associados e publicidade e aquisição de serviços referentes à organização do congresso nacional, transversal a toda a atividade” (pp. 11 a 13 do Documento n.º 5).
b. Custos com a organização de congressos: “A regra geral do direito à dedução comporta algumas exceções, as quais se encontram previstas no artigo 21.º do CIVA (…) não obstante as exclusões previstas no n.º 1 do artigo 21.º do CIVA, o n.º 2 do mesmo artigo, permite, em certos casos, a dedução ainda que parcial do IVA incluído nessas despesas, nomeadamente as despesas resultantes da participação em congressos, feiras, exposições, seminários, conferencias e similares. (…) Tendo em atenção a exclusão do direito à dedução e os limites previstos no n.º 2 do artigo 21.º do CIVA, quando o sujeito passivo atua como organizador (pode deduzir 50% do imposto), verificou-se que o mesmo deduziu indevidamente imposto” (pp.14 e 15 do Documento n.º 5).
c. Falta liquidação de IVA – Formação: “(…) é pressuposto obrigatório para a aplicação da referida isenção [número 10, do artigo 9.º do Código do IVA], que as entidades em causa sejam reconhecidas como competentes nos domínios da formação e reabilitação profissionais. (…) Da análise da contabilidade, constatamos que o sujeito passivo nas faturas que emitiu referente às ações de formação que promoveu, não liquidou o IVA, ao abrigo da isenção do artigo 9.º n.º 10 do CIVA, sem, contudo, preencher os requisitos consignados na lei, designadamente estar habilitada com a certificação de entidade formadora, atribuída pela entidade competente para o efeito que é a atualmente a DGERT” (pp.16 e 17 do Documento n.º 5).
IRC: Amortizações e depreciações
a. Depreciação de edifícios incluindo valor do terreno: “Os imóveis adquiridos, classificados como um item do ativo fixo tangível, devem ser mensurados inicialmente pelo respetivo custo, conforme o previsto no parágrafo 16 da NCRF 7. (…) Nessa classificação como item do ativo fixo tangível, há que proceder à contabilização separada entre o valor do edifício e do terreno que não está sujeito a depreciação, conforme previsto no parágrafo 58 da NCRF 7. (…) Uma vez que o sujeito passivo não procedeu à separação do valor dos edifícios e dos terrenos, em termos fiscais, para a determinação da depreciação fiscal do edifício e conforme o n.º 3 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, quando não existe essa separação entre o valor do edifício e do terreno na escritura, o valor do terreno corresponde a 25% do valor global” (pp.19 e 20 do Documento n.º 5).
b. Depreciação de gastos não depreciáveis: “No valor contabilizado na conta 64.2.2 – Ativos fixos tangíveis – Edifícios e outras construções, está incluído o valor de € 5.011,46 referente a amortizações/depreciações de “Edificações ligeiras (fibrocimento, madeira, zinco, etc)” (…) Uma vez que de acordo com os documentos de suporte já referidos, trata-se de prestações de serviços relacionados com desenvolvimento, produção, montagem e desmontagem de exposição, estes gastos deveriam ser imputados ao período de tributação em que foram suportados de acordo com o regime de periodização económica, previsto no artigo 18.º do CIRC” (pp 21 do Documento n.º 5).
c. Depreciação de grandes reparações: “O sujeito passivo contabilizou na conta 64.2.2 – Ativos fixos tangíveis – Edifícios e outras construções, o valor de € 23.264,50, referente a obras registadas no valor de € 232.644,95. Consultando os documentos de suporte aos referidos elementos, verifica-se que os mesmos respeitam a projeto de arquitetura, adjudicação e elaboração de projetos da rede da rede de abastecimento de água, rede de drenagem de esgotos domésticos, acondicionamento acústico e segurança contra incêndio, (…)”. “Pelo que se trata de obras que cabem no conceito legal de grandes reparações e beneficiações, tal como definido no al.a), n.º5 do artigo 5.º, que se integram no ativo corpóreo, previsto na Tabela II anexo ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro. Assim, a sua amortização deve ser determinada de acordo com o respetivo período de desgaste ou de utilidade esperada do bem que elas visaram beneficiar no seu todo, sendo de aplicar a norma que se encontra prevista para os edifícios onde tais reparações/remodelações tiveram lugar”. (pp.21 a 23 do Documento n.º 5).
G. Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as seguintes liquidações de IVA e juros compensatórios:
– Liquidações adicionais de IVA n.ºs 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., respeitantes ao período de 2017 e 2018, e respectivas liquidações de juros compensatórios;
H. A Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu, ainda, a liquidação de IRC n.º 2021..., respeitante ao período de tributação de 2017.
I. A Requerente apresentou Reclamação Graciosa contra os mencionados atos de liquidação de IRC e IVA (cfr. Documento n.º 2) a qual recaiu sobre as seguintes matérias constantes do RIT:
a. Do IVA deduzido indevidamente - Custos de produção da revista (pp. 11 a 13 do Documento n.º 5);
b. Da falta de liquidação de IVA - Formações (pp.16 e 17 do Documento n.º 5); e
c. Gastos com Amortizações e depreciações não aceites fiscalmente - grandes reparações (pp.21 a 23 do Documento n.º 5).
J. Por Ofício datado de 12-11-2021, a Requerente foi notificada da decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa.
K. Constitui direito dos sócios da Requerente, receber gratuitamente a revista (publicação periódica da Requerente melhor identificada no RIT).
L. Em 27-11-2018, a Requerente apenas obteve o certificado como entidade formadora nas áreas de desenvolvimento pessoal, informática na ótica do utilizador, e medicina.
M. A Requerente concorda parcialmente com as correções constantes nas liquidações adicionais infra, num total de Euro 6.284,01 (seis mil, duzentos e oitenta e quatro euros e um cêntimo), montante este já não considerado na Reclamação Graciosa apresentada.
N. A AT deu conhecimento ao Tribunal Arbitral que foi proferido Despacho de revogação parcial, revendo o valor da matéria colectável considerar para o ano de 2017, para efeitos de IRC.
O. Em 14-02-2022, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados e fundamentação e fixação da matéria de facto
Com relevo para a decisão não existem factos não provados.
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos e nas posições assumidas por ambas as Partes em relação aos factos essenciais, sendo as questões controvertidas estritamente de Direito.
3. Matéria de direito
A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção à Requerente da qual resultaram as seguintes correcções contestadas pela Requerente, que serão apreciadas separadamente:
a) Dedução integral do IVA deduzido indevidamente nas aquisições relacionadas com a produção da revista;
b) Isenção de IVA praticada nas acções de formação antes da certificação do sujeito passivo como entidade formadora pela DGERT;
c) Gastos com amortizações e depreciações não aceites fiscalmente em sede de IRC - grandes reparações.
3.1. IVA deduzido nas aquisições relacionadas com a produção da revista
A Requerente é um sujeito passivo misto, ou seja, pratica operações sujeitas a imposto e dele não isento que conferem 0 direito à dedução e operações isentas que não conferem direito à dedução.
Segundo os SIT, a Requerente eduziu pela totalidade o imposto suportado nas despesas relacionadas com a revista.
Com efeito, a AT foca-se na potencial existência de um sinalagma entre a quota e a distribuição da revista.
Entende a AT que, por um lado, os sócios que têm de pagar quota, têm direito a receber a revista, por serem sócios, condição essa que apenas mantêm na condição de pagarem as quotas, pelo que, inquestionavelmente, existe um sinalagma entre o pagamento da quota (isenta) e o direito a receber a revista.
Logo, pelo menos nesta parte, Requerente não poderia ter o direito a deduzir o imposto suportado na produção da revista.
A Requerente deduziu na totalidade o IVA suportado com os custos da revista por entender que estes estão na totalidade associados, exclusivamente, à venda de publicidade na revista.
Entende a Requerente que a publicação das revistas é um instrumento de publicidade, sendo esta actividade isolável dentro do contexto da actividade da Requerente.
Vejamos,
No caso da produção da revista, estamos perante uma operação decorrente de uma actividade económica, que tem como contraprestação (i) as receitas da venda de espaços utilizados na publicação de publicidade e (ii) as receitas provenientes das quotas pagas pelos associados não exonerados das mesmas. As receitas da publicidade estão sujeitas a IVA e são tributadas à taxa normal do imposto. Já as quotas pagas pelos associados estão isentas de IVA, nos termos do n.º 19 do artigo 9.º do Código do IVA.
É certo que as quotas pagas pelos associados lhes conferem um vasto conjunto de direitos, que constam do artigo 6.º dos Estatutos e que não se subsumem ao recebimento das publicações produzidas pela Requerente, não havendo uma reciprocidade exclusiva entre as quotas e a revista. Mas também é verdade que o conjunto de direitos enunciados no artigo 6.º dos Estatutos compreende, para além dos enunciados no n.º 13 das alegações da Requerente, o de “receber um exemplar das publicações distribuídas gratuitamente pela Sociedade e ser informado sobre a existência de outros trabalhos científicos eventualmente por ela editados”.
Não se poderá considerar, então, que inexiste qualquer correspondência entre as quotas e a revista. Essa correspondência não é diretamente determinável e a sua expressão (em termos de montante) poderá até ser reduzida, mas existe e, consequentemente, condiciona o direito à dedução do IVA suportado nos “inputs” relacionados com a revista.
Pelo que estamos perante uma actividade económica financiada por (i) receitas de valor determinado (publicidade) que dão origem à liquidação de IVA, a par de (ii) receitas de valor indeterminado (parte da importância das quotas) isentas de IVA.
Assim sendo, importa determinar se a Requerente poderia, ou não, ter deduzido o IVA suportado com a aquisição de bens e serviços relacionados com a produção da revista na sua totalidade.
Para apuramento do IVA a deduzir nestas operações deverá atender-se ao disposto no artigo 23.º do Código do IVA, o qual preconiza a seguinte metodologia na dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços utilizados em operações que conferem o direito à dedução e em operações que não conferem esse direito:
i. Na determinação do IVA dedutível respeitante a bens ou serviços parcialmente afetos à realização de operações não decorrentes do exercício de uma atividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do art.º 2.º do Código do IVA, é obrigatório o recurso à afectação real com base em critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito (cfr. alínea a) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 23.º do Código do IVA).
A publicação e distribuição da revista, tendo como contraprestação receitas de publicidade e parte indeterminada das quotas, consubstancia o exercício de uma actividade económica, pelo que a metodologia a adotar na dedução do IVA suportado a montante não deverá ser analisada à luz da alínea a), mas sim da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA, como veremos em seguida. Consequentemente, o regime da afectação real não seria o preconizado como primeira opção para dedução do imposto na situação em apreciação.
ii. Tratando-se de bens ou serviços afetos à realização de operações decorrentes do exercício de uma atividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que deem lugar a dedução, i.e. de acordo com o pro rata (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA). Não obstante, o sujeito passivo pode efectuar a dedução pela afectação real, recorrendo a critérios objetivos que permitam determinar a utilização dos bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito (cfr. n.º 2 do art.º 23.º do CIVA).
Como a publicação da revista decorre do exercício de uma atividade económica, a regra a observar na dedução do IVA suportado na aquisição de bens e serviços relacionados será a referida em ii. acima, ou seja:
· a dedução será feita, regra geral, com base no “pro rata”;
· podendo o sujeito passivo, em alternativa, deduzir o imposto segundo a afectação real, recorrendo a critérios objetivos para tal afectação.
Ora, na aquisição de bens e serviços destinados à publicação da revista a Requerente deduziu o IVA suportado na sua totalidade, não tendo seguido nenhum dos métodos preconizados para a dedução do imposto nos “inputs”relacionados com uma atividade económica mista.
Com efeito, tratando-se de uma actividade económica financiada por (i) receitas de valor determinado (publicidade) que dão origem à liquidação de IVA, a par de (ii) receitas de valor indeterminado (parte da importância das quotas) isentas de IVA, a Requerente não deveria ter deduzido o IVA suportado com a aquisição de bens e serviços relacionados com a produção na revista na sua totalidade.
Assim, importa apurar se as correcções promovidas pela AT quanto ao IVA deduzido se apresentam, ou não, em conformidade com a metodologia prevista no artigo 23.º do Código do IVA.
Conforme referido, estando em causa a aquisição de bens ou serviços decorrentes de uma atividade económica mista, a Lei preconiza, em primeira instância, que o imposto dedutível seja determinado mediante a utilização da uma percentagem apurada nos termos do n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA (“pro rata”). Em alternativa, a AT poderá recorrer ao método da afectação real quando a metodologia do “pro rata” conduza a distorções significativas da tributação (cfr. n.º 3 do artigo 23.º do Código do IVA).
Na determinação do imposto dedutível nas aquisições de bens ou serviços relacionados com a produção da revista, os SIT recorreram ao método do “pro rata” contemplado no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA, em conformidade com o preconizado na alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo.
Em conclusão, o Tribunal Arbitral entende que o procedimento adoptado pela Requerida está em linha com o previsto na Lei, não competindo ao Tribunal Arbitral apreciar o mérito do recurso à metodologia do “pro rata” ao caso presente. Caso a Requerente considerasse que a metodologia do “pro rata” conduz a distorções significativas no presente caso, e pretendesse que a AT tivesse privilegiado o recurso ao método da afectação real, competir-lhe-ia alegá-lo, juntando ao processo a sua proposta dos critérios objectivos que considerasse adequados para um cálculo alternativo. Não o tendo feito, o Tribunal Arbitral entende que as correcções efectuadas pela AT são legítimas e apresentam-se em conformidade com o disposto no artigo 23.º do Código do IVA.
3.2. Isenção de IVA praticada nas acções de formação antes da certificação do sujeito passivo como entidade formadora pela DGERT
Consideram os SIT em sede do RIT anteriormente referido, bem como a AT em sede da decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada, que a Requerente apenas pode beneficiar da isenção consignada no número 10 do artigo 9.º do Código do IVA a partir de 27 de novembro de 2018, data em que obteve o certificado .../2018 da DGERT como entidade formadora nas áreas de desenvolvimento pessoal, informática na ótica de do utilizador, e medicina, no âmbito do disposto na Portaria n.º 851/2010, de 6 de setembro, alterada e republicada pela Portaria n.º 208/2013, de 26 de junho.
Com efeito, a Requerente apenas obteve o certificado como entidade formadora nas áreas de desenvolvimento pessoal, informática na ótica do utilizador, e medicina, a 27 de novembro de 2018, não dando assim cumprimento, antes desta data, ao disposto pela Portaria n.º 851/2010, de 6 de setembro, para aplicação da isenção prevista no n.º 10 do artigo 9.º do Código do IVA.
Não obstante, entende o Tribunal Arbitral que a Requerente não pode deixar de ser considerada uma entidade isenta de IVA antes da referida data, não por aplicação do número 10 do Artigo 9.º do Código do IVA, mas sim por aplicação do número 14 do mesmo artigo.
Senão vejamos,
Nos termos do disposto no número 14, do Artigo 9.º do Código do IVA, estão isentas de imposto, “As prestações de serviços e as transmissões de bens com elas conexas, efetuadas por pessoas coletivas de direito público e organismos sem finalidade lucrativa, relativas a congressos, colóquios, conferências, seminários, cursos e manifestações análogas de natureza científica, cultural, educativa ou técnica.” [sublinhado nosso].
Ora, a própria AT, no contexto da decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa, refere que “dispõe o n.º 14 do art.9º do CIVA, que a organização de congressos, colóquios, conferências, seminários, cursos e manifestações análogas de natureza científica, cultural educativa ou técnica está isenta quando efectuada por pessoas coletivas de direito público e organismos sem finalidade lucrativa, tal como definidos no art.º 10.º do mesmo código”. [sublinhado nosso].
Mais ainda, defende a AT que “esta norma isenta apenas a inscrição (os ingressos vendidos ao público) para o acesso aos referidos eventos, quando efetuados por pessoas coletivas de direito público e organismos sem finalidade lucrativa, incluindo as transmissões de bens conexas com os referidos serviços, como a disponibilização aos participantes de material ou documentação especificamente relacionados com as intervenções feitas pelos oradores nesses eventos (incluída no preço de inscrição pago pelos participantes)”. [sublinhado nosso].
Por fim, conclui a AT que, “também beneficia da isenção prevista na al. 14) do art.º 9.º do CIVA se estiveram cumulativamente verificados os pressupostos previstos no art.º 10.º do CIVA, o que não se encontra devidamente comprovado nos presentes autos”.
Ora, para efeitos de aplicação da isenção prevista no número 14 do Artigo 10.º do Código do IVA, temos efetivamente que atender primeiramente ao disposto no Artigo 10.º do mesmo Código, o qual estipula que, “para efeitos de isenção, apenas são considerados como organismos sem finalidade lucrativa os que, simultaneamente:
a. Em caso algum distribuam lucros e os seus corpos gerentes não tenham, por si ou interposta pessoa, algum interesse direto ou indireto nos resultados da exploração;
b. Disponham de escrituração que abranja todas as suas atividades e a ponham à disposição dos serviços fiscais, designadamente para comprovação do referido na alínea anterior;
c. Pratiquem preços homologados pelas autoridades públicas ou, para as operações não suscetíveis de homologação, preços inferiores aos exigidos para análogas operações pelas empresas comerciais sujeitas de imposto;
d. Não entrem em concorrência direta com sujeitos passivos do imposto”. [sublinhado nosso].
Sendo que, conforme já mencionado, a Requerente é uma Associação Científica fundada em 1951, dotada de personalidade jurídica própria e declarada Entidade de Utilidade Pública, sem fins lucrativos, em 26 de fevereiro de 1998 (cfr. DR número 65; II Série, de 18/03/1998), que se rege pelos seus estatutos e pelas disposições legais aplicáveis (cfr. Documento n.º 4).
Pelo que, dúvidas inexistem, ao contrário da tese defendida pela AT, que a Requerente cumpre com os requisitos cumulativos do artigo 10.º do Código do IVA, sendo por isso considerada como organismo sem finalidade lucrativa ao abrigo do artigo em causa.
Ainda sobre esta matéria, e não obstante a AT não ter colocado em causa que os serviços prestados pela Requerente (ações de formação e outros eventos) têm acolhimento no disposto no número 14 do artigo 9.º do Código do Código do IVA, mas apenas a (in)capacidade da Requerente de cumprir com os requisitos elencados no artigo 10.º do Código do IVA, recorde-se que, com vista à prossecução das suas finalidades previstas no artigo 3.º dos Estatutos (cfr. Documento n.º 4), a Requerente promove a realização de congressos, seminários, debates, conferencias, colóquios ou outras atividades, dirigidas a todos os seus associados ou a terceiros.
Assim, e conforme a mais recente Doutrina Administrativa, por Despacho da Direção de Serviços do IVA, em 24 de novembro de 2017, no âmbito do processo 12429, “(…) a realização dos referidos congressos, seminários, debates, conferencias, colóquios ou atividades, de acordo com os fins estatutários da associação, desde que esta não tenha finalidades lucrativas nos termos do disposto no art. 10.º do CIVA, efetuadas aos associados ou a terceiros, encontram-se isentas de IVA, quer sejam organizadas pela própria, quer por terceiros que lhe prestem o referido serviço de organização”[sublinhado nosso].
Este é, aliás, um entendimento unanime na Doutrina Administrativa, veja-se:
· Informação Vinculativa proferida por Despacho IVA, P 11895, de 26/05/2017;
· Informação Vinculativa proferida por Despacho da DSIVA, P 11643, 21/05/2017;
· Informação Vinculativa proferida por Despacho da AT, P 9697, de 07/09/2016;
· Informação Vinculativa proferida por Despacho da SDG, P 495, 13/04/2012;
· Informação Vinculativa proferida por Despacho da SDG, P A419 20080039, de 09/02/2009;
· Informação Vinculativa proferida por Despacho DG, P S509 2003010 de 06/04/2004;
· Despacho SDG, Informação 1249 de 15/04/2002; e
· Despacho DGCI, Informação 2597 de 19/10/1988.
É, assim, evidente que a Requerente procedeu corretamente quando não liquidou IVA nas facturas emitidas em 2017 e 2018, relativas às acções de formação e outros eventos que promoveu, por lhe ser aplicável a isenção prevista no número 14 do artigo 9.º do Código do IVA.
Procede, assim, o pedido da Requerente.
3.3. IRC - Gastos com amortizações e depreciações não aceites fiscalmente em sede de IRC - grandes reparações
A Requerente contabilizou na rubrica 64.2.2 – Ativos fixos tangíveis – Edifícios e outras construções, o valor de Euro 23.264,50 (vinte e três mil, duzentos e sessenta e quatro euros e cinquenta cêntimos), relativas a obras registadas pelo valor de Euro 232.644,95 (duzentos e trinta e dois mil, seiscentos e quarenta e quatro euros e noventa e cinco cêntimos).
Entenderam os SIT que, as construções em causa dizem respeito a “obras necessárias para o exercício da atividade do sujeito passivo e que se integram, assim nos próprios imóveis e que contribuem de forma clara não só para aumentar o valor real dos imoveis, mas também contribuem para um aumento provável da duração desses imóveis, passando a ser parte integrante e a constituir um todo”.
Independentemente de as obras em causa deverem, ou não, ser qualificadas como “grandes reparações e beneficiações” (como defende a Requerida), ou como “meras obras de manutenção” (como alega a Requerente), importa atender ao seguinte,
Do ponto de vista fiscal e do SNC, as importâncias despendidas por uma sociedade em edifícios afetos à sua exploração, poderão merecer um dos seguintes tratamentos:
a. Aquisição de edifícios em estado novo (ou construção de novos edifícios): no método das quotas constantes, a quota anual de depreciação aceite fiscalmente é determinada aplicando-se ao custo histórico as taxas de depreciação fixadas nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro (cfr. n.º 1 do art.º 5.º do DR 25/2009).
b. Aquisição de edifícios em estado de uso: as taxas de depreciação são calculadas com base no período de utilidade esperada, não podendo o mesmo ser inferior à diferença entre o período mínimo de vida útil do mesmo elemento em estado de novo e o número de anos de utilização já decorrido (cfr. alínea a) do n.º 2 e n.º 4 do art.º 5.º do DR 25/2009).
c. Grandes reparações e beneficiações (tal como definidas no n.º 5 do art.º 5.º do DR 25/2009): as taxas de depreciação são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada (cfr. alínea c) do n.º 2 do art.º 5.º do DR 25/2009).
d. Gastos gerais de conservação e reparação: gasto do exercício (cfr. alínea a) do n.º 2 do art.º 23.º do CIRC).
Segundo consta do RIT, a Requerente terá efectuado obras em edifício(s) próprio(s) no montante de € 232.644,95, investimento sobre o qual praticou uma taxa de depreciação de 10%, correspondente a um período de utilidade esperada de 10 anos.
Os SIT entendem que as obras efetuadas correspondem a grandes reparações e beneficiações, devendo a sua depreciação “ser determinada de acordo com o respetivo período de desgaste ou de utilidade esperada do bem que elas visaram beneficiar no seu todo, sendo de aplicar a mesma [taxa] que se encontra prevista para os edifícios onde tais reparações/remodelações tiveram lugar (edifícios destinados a fins comerciais ou administrativos, taxa de depreciação fiscal de 2%), na falta de outra aplicável.” Promovendo, em decorrência, correções à matéria coletável pela diferença entre a taxa de depreciação considerada pela Requerente (10%) e a taxa de depreciação constante das tabelas (2%).
No entanto,
São os próprios SIT, no seu RIT, que afirmam que “No método da linha reta, a quota de depreciação … aceite como gasto é determinada aplicando-se… as taxas genéricas fixadas na tabela II…”, acrescentando que “excetuam -se do disposto no número anterior os seguintes casos, em que as taxas de reintegração ou amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada, … grandes reparações e beneficiações.” (pág. 22 do RIT)
Os SIT reconhecem, assim, que no caso das grandes reparações e beneficiações o legislador afasta o recurso às taxas constantes das tabelas anexas ao DR 25/2009, privilegiando o período de utilidade esperada.
Afirmam, ainda, os SIT que a depreciação das obras que cabem no conceito de grandes reparações e beneficiações “deve ser determinada de acordo com o respectivo período de utilidade esperada do bem que elas visaram beneficiar no seu todo, sendo de aplicar a mesma [taxa] que se encontra prevista para os edifícios onde tais reparações / remodelações tiveram lugar (edifícios destinados a fins comerciais ou administrativos, taxa de depreciação fiscal de 2%), na falta de outra aplicável.”.
Ora, entende o Tribunal Arbitra tratar-se de uma evidente contradição, senão vejamos,
Os SIT começam por excecionar das taxas das tabelas as grandes reparações e beneficiações, e de seguida subordinam a utilidade esperada destas às taxas das tabelas.
Reconhecendo os SIT que a depreciação a praticar deve ser determinada de acordo com o período de utilidade esperada, ao promover as correções que constam do RIT os SIT (i) não acolhem a vida útil de 10 anos que vinha a ser considerada pela Requerente; e (ii) entende que essa vida útil deverá ser de 50 anos.
Sendo que o RIT não apresenta qualquer justificação, estudo ou projeção, que permita fundamentar esse período de 50 anos (ou para contraditar a vida útil de 10 anos considerada pela Requerente).
Acresce que os SIT mencionam que a Requerente dispõe de 3 edifícios, mas parece não terem sequer procurado apurar a qual ou a quais edifícios as obras em apreciação dizem respeito. Aliás, o RIT não fornece qualquer detalhe / informação sobre os edifícios em causa, nomeadamente ano de aquisição, vetustez, estado de conservação.
Imagine-se então que as obras haviam sido efetuadas num edifício com 40 anos de vida útil já decorridos. Ao acolher-se a utilidade esperada considerada pelos SIT dar-se-ia uma situação insólita: o edifício objeto de obras teria uma vida útil remanescente de 10 anos e as obras feitas no mesmo seriam depreciadas ao longo de 50 anos.
Por todo o exposto, o pedido da Requerente é julgado procedente.
3.4. Juros compensatórios
As liquidações de juros compensatórios têm como pressuposto as respectivas liquidações de IVA (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos mesmos vícios que afectam estas, justificando-se também a sua anulação, nas partes em que estas liquidações devem ser anuladas.
4. Restituição de quantia paga indevidamente e juros indemnizatórios
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que « A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei».
Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.
Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios.
4.1. Reembolso de quantias pagas
Na sequência da anulação da liquidação, a Requerente tem direito a ser reembolsada das quantias indevidamente suportadas, que são as partes das liquidações de IVA e de IRC que têm como pressupostos as correcções relativas à isenção de IVA praticada nas acções de formação antes da certificação do sujeito passivo como entidade formadora pela DGERT e, bem, assim, a gastos com amortizações e depreciações não aceites fiscalmente em sede de IRC - grandes reparações (pontos 3.2. e 3.3. deste acórdão), bem como as respectivas liquidações de juros compensatórios nas partes correspondentes a essas correcções.
4.2. Juros indemnizatórios
No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
No caso em apreço, conclui-se que, quanto às partes das liquidações que têm como pressupostos as correcções relativas a «no shows» (pontos 3.1. e 3.1.1. deste acórdão) há erros nas liquidações imputáveis aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira, pois foi esta que as elaborou por sua iniciativa.
Os juros indemnizatórios devem ser contados, quanto a cada liquidação, da data em que foi efectuado o respectivo pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
5. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular parcialmente as liquidações de IVA, IRC e juros compensatórios, nas partes em que têm como pressupostos as correcções relativas à isenção de IVA praticada nas acções de formação antes da certificação do sujeito passivo como entidade formadora pela DGERT e, bem, assim, a gastos com amortizações e depreciações não aceites fiscalmente em sede de IRC - grandes reparações (pontos 3.2. e 3.3. deste acórdão);
c) Julgar parcialmente procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los à Requerente nos termos referidos no ponto 4 deste acórdão;
d) Absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos nas partes restantes.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 112.703,87, atribuído pela Requerente, sem contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira.
7. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, na percentagem de 33% a cargo da Requerente e 67% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 15-07-2022
Os Árbitros
(Nuno Cunha Rodrigues)
(José Manuel Parada Ramos)
(Hélder Faustino)
(Relator)