SUMÁRIO
1. Conforme resulta do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), estando em causa a apreciação da legalidade de um ato de liquidação oficiosa praticado pela Autoridade Tributária, corrigindo anterior liquidação efetuada com base na declaração do sujeito passivo, é a AT que incumbe o ónus da prova dos pressupostos legais da correção que operou
2. Segundo a doutrina e reiterada jurisprudência, a consideração como gastos fiscais, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, para que remete o n.º 2 do mesmo artigo, não depende de uma relação de causalidade entre gastos incorridos pelo sujeito passivo e a obtenção de rendimentos, bastando que aqueles sejam suportados pelo sujeito passivo no interesse da empresa.
3. Não sendo questionada a finalidade empresarial da venda de ativos, nem a veracidade dos elementos declarados e contabilizados pelo sujeito passivo, ilidindo a presunção legal de que beneficiam nos termos do artigo 75.º, n.º 1, da LGT, o valor de realização relevante para apuramento das mais-valias ou menos-valias tributáveis é determinado nos termos do artigo 46.º do CIRC.
4. Contém-se no âmbito de aplicação do RFAI o investimento realizado por empresa que tem por objeto a exploração de pedreiras e outros recursos minerais: a) a aquisição de terrenos para exploração abrangidos pela competente licença; b) a aquisição de equipamento de substituição que, comprovadamente, concorra para o aumento da capacidade produtiva de estabelecimento existente; e c) dos investimentos realizados resulte a criação de postos de trabalho.
DECISÃO ARBITRAL
I. Relatório
1. A..., LDª, pessoa coletiva com o n.º..., com sede em ..., ..., ...-... ..., ..., vem, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, apresentar pedido de constituição de tribunal arbitral, em que figura como Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
2. O pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 25-08-2021, tem como objeto imediato a revogação de decisão de indeferimento expresso de reclamação graciosa e, como objeto mediato, a declaração de ilegalidade e anulação parcial dos atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimentos da Pessoas Coletivas (IRC), e juros compensatórios, resultantes de correções técnicas efetuadas à matéria coletável declarada pela empresa relativa ao exercício de 2016.
3. A Requerente pede também a devolução do imposto e juros que considera indevidamente cobrados, no valor de € 25 024,80 - sendo €22 293,43 de imposto e € 2 731,40 de juros compensatórios - acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios contados nos termos legais.
4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo senhor presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
5. A Requerida apresentou resposta defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
6. O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro.
7. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável, tendo, oportunamente, notificado as Partes.
8. Devidamente notificadas dessa designação, as Partes não manifestaram vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
9. Pelo que em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o tribunal arbitral foi constituído em 03-11-2021.
10. O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.
11. A Requerente goza de personalidade e capacidade judiciárias, é legítima e encontra-se legalmente representadas (cfr. art.º 4.º e n.º 2 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 e art.º 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22/03).
12. A Requerida apresentou a sua Resposta alegando, no essencial, a improcedência da argumentação da Requerente mantendo entendimento no sentido da legalidade dos atos impugnados.
13. Antecipando não ser possível a prolação da decisão arbitral no prazo previsto no artigo 21.º, n.º1, do RJAT, em face da complexidade da análise da prova documental apresentada, o tribunal, por despacho de 29-04-2022, decidiu prorrogar por dois meses o referido prazo, nos termos do n.º 2 daquele artigo. Esta decisão foi oportunamente notificada às Partes.
14. Por despacho de 23-05-2022, foi determinado notificar-se a Requerente para, no prazo de 10 dias, juntar ao processo prova documental do alegado nos pontos 95 e seguintes da PI e documento 12 que se lhe encontra anexo, designadamente documento comprovativo de comunicação de admissão de trabalhador, e respetivo vínculo, junto da Segurança Social.
15. Os documentos em causa foram apresentados pela Requerente em 06-06-2022 e nesta data juntos aos autos.
16. Em 07-06-2022, a AT requereu a não admissão e consequente desentranhamento dos documentos juntos pela Requerente alegando, no essencial, que a prova apresentada após a apresentação do pedido de pronúncia arbitral não pode ser relevada por este tribunal, sob pena de violação de lei.
17. Por despacho de 17-06-2022, foi indeferido o pedido formulado pela Requerida no seu requerimento de 07-06-2022, conforme decisão que a seguir se transcreve:
” I – Indeferimento do pedido formulado pela Requerida no seu requerimento de 07-06-2022 - A Requerida (AT) requereu a não admissão e o consequente desentranhamento dos documentos juntos pela Requerente e solicitados pelo nosso despacho de 23-05-2022, considerando, em suma, (i) ser tal junção ilegal por intempestiva e (ii) que “(…) os fins que presidiram à criação deste centro de arbitragem não podem validar a anarquia e o arbítrio processual sob as pretensas vestes da liberdade de gestão e condução processual.”
Este requerimento vai indeferido, porquanto: (i) quer os artigos 13.º, 114.º e 115.º do CPPT, quer os artigos 6.º e 411.º (ver também arts. 423.º e 424.º) do CPC, impõem ao (juiz) árbitro a realização das diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição dos litígios, quanto aos factos que lhe é lícito conhecer; (ii) quer ainda por tais deveres impostos aos (juízes) árbitros serem plenamente reconhecidos pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, que enfatizam que o (juiz) árbitro deverá desenvolver a atividade de indagação e esclarecimento dos factos relevantes para o desfecho do litígio, atribuindo expressamente aos (juízes) árbitros um dever de agir.
18. Pelo mesmo despacho foi ainda decidido: II – Dispensa da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e de alegações -À luz do disposto nos artigos 16.º - C do RJAT e do princípio da proibição da prática de atos inúteis, fica dispensada a reunião do tribunal com as partes, considerando, por um lado, que se trata de processo não passível de uma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comumente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais e que não há exceções ou outras questões prévias a apreciar e, por outro lado, por os autos conterem os elementos de prova essenciais para a decisão arbitral final.
III – Data para a prolação e notificação da decisão final - Fixa-se o dia 29-06-2022 como data limite previsível para a prolação e notificação da decisão arbitral final.
IV – Taxa de arbitragem remanescente - A Requerente deverá dar oportuno cumprimento ao disposto no artigo 4.º, 3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (pagamento antes da decisão e pela forma regulamentar do remanescente da taxa arbitral).
V- Apresentação dos articulados em formato “word” - À luz do princípio da cooperação, convidam-se ambas as partes para remeter ao CAAD cópias dos respetivos articulados em formato “word” com vista a facilitar e abreviar a tarefa de elaboração da decisão arbitral final, no que respeita sobretudo à fixação da matéria de facto.
19. O despacho referido nos pontos que antecedem foi oportunamente notificado às Partes.
20. O processo não enferma de nulidades.
21. Não existem quaisquer exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e que cumpra conhecer.
III. Matéria de facto
22. Com base nos elementos documentais que integram o presente processo, destacam-se os seguintes elementos factuais que, não sendo contestados, se consideram inteiramente provados:
22.1. A Requerente é uma sociedade comercial que tem como objeto a exploração e comercialização de minérios extraídos de concessões em exploração, nomeadamente areias, seixos, britas e caulinos.
22.2.A Requerente foi destinatária de uma ação de inspeção externa ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2018..., de âmbito parcial, em sede de IRC e de IVA, tendo como objetivo a verificação declarativa dos períodos de tributação de 2016.
22.3. A Requerente foi notificada do projeto de Relatório da Inspeção Tributária não tendo exercido o direito de audição prévia, embora tenha solicitado dilação do respetivo prazo, que lhe não foi concedida por falta de suporte legal.
22.4. Posteriormente, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária, que consta do documento 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral e do processo administrativo, do qual, com relevo para a apreciação do presente pedido, se destaca o seguinte:
“ 3.1.1.2 – Perdas em resultado da alienação de bens do ativo fico tangível não aceites fiscalmente – No exercício de 2016, o SP procedeu à alienação de alguns ativos fixos tangíveis, entre os quais se incluem alguns adquiridos nesse mesmo ano, conforme é o caso das situações elencadas no quadro seguinte:
Conforme se verifica, à exceção da compra e venda da viatura “... Trator...”, a qual foi vendida pelo mesmo preço de aquisição, o mesmo não sucede com os outros dois ativos, ou seja, no mesmo ano regista a aquisição por um valor e vem a alienar o mesmo por valor muito inferior, levando ao registo de uma perda uma menos-valia contabilística e fiscal de € 48 340,00.
Já no caso do ativo “Pá Carregadora...”, adquirida e vendida também no mesmo período, foi registada uma perda de cerca de 56% face ao valor de aquisição.
0 ativo "barracão (estrutura metálica equivalente a um "contentor" segundo informação verbal recolhida na empresa) foi alienado como "venda de sucata” (fatura FRA 2016/620 de 2016-11-04) a uma empresa de reciclagem de metais, apenas alguns meses (cinco) após o registo da sua aquisição nos ativos da empresa, registando neste caso uma perda de cerca de 92% face ao valor de aquisição. Tratam-se de alienações com reporte a aquisições muito recentes, não parecendo que tenha havido circunstâncias extraordinárias justificadas que conduzissem a perdas tão significativas. O SP encontra-se assim a assumir perdas muito expressivas com a alienação de ativos adquiridos no próprio ano (e até sem grande diferença de dias como é o caso da “Pá Carregadora ...), não sendo como tal uma situação que se possa caracterizar como dita normal.
Regra geral, em contexto de atividades económicas, o valor normal de alienação de um bem não pode ser inferior ao preço de aquisição do mesmo, a menos que o decurso do tempo e uso enquanto ativo produtivo tenha consumido parte do seu valor original, o que até será aceitável, mas não nas dimensões aqui relatadas.
Refira-se, a sustentar a nossa leitura, o disposto nos termos da al. b) do n.° 4 do artigo 16.° do CIVA, para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado, pela qual se entende que o valor normal de um bem ou serviço, na falta de bem similar, não pode ser inferior ao valor de aquisição do bem ou, na sua falta, ao preço de custo, reportados ao momento em que a transmissão de bens se realiza.
Em nossa opinião, os factos descritos não se coadunam com o objeto de uma atividade económica tendente à geração de rendimentos e não encontra assim enquadramento para aceitação das perdas em causa como dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável dado não se tratarem de gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC conforme determina o n.º 1 do art. 23.º do CIRC, sendo por isso de corrigir o resultado tributável pelo acréscimo do montante acima indicado de €48.340.00.
(...)
3.1.1.5 – Dotação de benefício RFAI indevido
Encontra-se inscrito em 2016, na declaração de rendimentos modelo 22, no campo 355 – benefícios fiscais, do quadro 10 da referida declaração, a importância de € 24.811,42, a deduzir à coleta.
O referido benefício fiscal decorre da dedução de valor a abrigo do REGIME FISCAL DE APOIO AO INVESTIMENTO (RFAI) previsto nos artigos 22.º a 26.º do Código Fiscal do Investimento (CFI) aprovado pelo Dec.-Lei n.º 162/2014, de 31/10, conforme decorre dos montantes indicados no anexo D da referida declaração modelo 22 de 2016, conforme se reproduz:
Existe contudo uma diferença entre os valores indicados na modelo 22 pelo SP e o indicado no quadro anterior no que diz respeito ao saldo transitado do período anterior (€ 212.139,78 - € € 10 478,60=€20 661,18), sendo certo que os valores indicados no quadro se encontram de acordo com os dados conhecidos, parecendo erro de preenchimento da modelo 22 de 2016 quanto ao saldo anterior.
Contudo, no âmbito da inspeção tributária ao período de 2015 já concluída, credenciada pela ordem de serviço 012018..., cujo relatório foi oportunamente notificado e do qual aqui se dá por totalmente reproduzido por ser do conhecimento do SP. Foram promovidas correções em sede de RFAI, designadamente quanto aos investimentos considerados elegíveis tendo conduzido a correção do valor de dotação apurado nesse ano em menos € 135.055,67, bem como, decorrente da correção da coleta, na consideração de um valor superior de dedução em 2015 em mais €1.243,07. Desse modo, o saldo transitado de 2015 para os anos seguintes ficou em € 65.362,44, conforme se resume no quadro seguinte:
Já tendo sido analisados os investimentos de 2015, com impacto no ano de 2016 e seguintes, importa assim analisar quanto ao presente período de 2016 a origem de validade dos valores considerados pelo SP em termos de dotação desse ano em sede de RFAI, o que se faz nos termos seguidamente desenvolvidos.
Conforme previsto no CFI, o RFAI é aplicável, aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de janeiro de 2014, estabelecendo-se ainda o âmbito de aplicação e definições do RFAI, designadamente a quem se aplica, quais as aplicações relevantes, as condições objetivas e cumulativas exigidas aos sujeitos passivos para poderem beneficiar deste regime, outras definições e enquadramento e, os benefícios e obrigações acessórias designadamente os elementos a constarem do processo de documentação fiscal.
Pela Portaria 297/2015, de 21 de setembro, foi estabelecido em melhor detalhe a regulamentação do RFAI, entre outros nomeadamente os conceitos de investimento/aplicações relevantes e elementos a constar do processo de documentação fiscal.
Verificados os elementos justificativos apresentados pelo SP constata-se que o mesmo considerou de dotação em sede de RFAI do ano de 2016 os montantes resumidos no quadro seguinte:
Em relação aos investimentos efetuados no ano de 2016 (conforme mapa resumo do sujeito passivo em anexo 2, justificativos dos investimentos efetuados nesse ano, e em anexo 3, mapas de identificação dos investimentos e justificativos de criação de postos de trabalho) quanto ao enquadramento para efeitos da utilização do RFAI conclui-se conforme resumidamente se descreve:
Enquadramento dos investimentos efetuados:
I . Os investimentos considerados e indicados pelo sujeito passivo totalizaram € 716.980,43), visaram em particular o aumento da capacidade de produção da empresa, sendo indicado terem sido efetuados de forma resumida em três locais diferentes correspondentes a alguns dos polos onde a empresa desenvolve a sua atividade nos montantes totais seguidamente indicados:
II. A repartição dos investimentos em cada um dos referidos locais e a razão dos mesmos é descrito pelo SP na informação que apresentou, sendo que, em resumo, os investimentos elencados se repartem pelos locais referidos conforme seguidamente descrevemos (complementamos a informação com a indicação do reconhecimento de depreciações /amortizações no ano de 2016):
Ill. Nos termos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes, as efetuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015, de 21 de setembro), designadamente investimentos em ativos fixos tangíveis, afetos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que não estejam afetos à exploração da empresa, bem como eventuais reparações de equipamentos pré-existentes.
A alínea d) do n,º 2 do artigo 2.º da portaria 297/2015, de 21 de setembro, regulamenta e estabelece claramente que o RFAI apenas se aplica a investimentos iniciais (novos) considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
Segundo justificado pelo SP, “Ao abrigo do RFAI, de acordo com o artigo n.º 2.º da portaria 297/2015, considerou-se o benefício fiscal por aumento da capacidade do estabelecimento existente, diversificação da produção com alterações no processo produtivo.
Analisados os elementos e documentos de suporte fornecidos pelo sujeito passivo referenciados de acordo com os registos na contabilidade e fichas do imobilizado, concluímos o seguinte quanto aos investimentos efetuados em cada um dos locais indicados:
A. ALBERGARIA DOS DOZE
Segundo justificado pelo SP, os investimentos efetuados “...tiveram como principais objetivos o aumento da extração, produção e venda de caulinos e areias, assim como assegurar a sustentabilidade futura da exploração na concessão “Destacando que fruto dos referidos investimentos potenciou o aumento significativo em 2916 dessa exploração (volume de negócios aumentou € 901.633,75, traduzindo um crescimento de 48% em relação ao ano anterior).
Analisados os documentos de suporte constata-se que:
1 – Investimentos indicados como Terrenos de Exploração - €88.746,84
Os terrenos de exploração indicados, tratam-se todos de prédios rústicos, adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos, relativamente aos quais também não foi promovida pelo sujeito passivo em 2016 (nem em ano posterior) a alteração nos termos do artigo 13.º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos.
De facto, nos termos do artigo 3.º do CIMI, define-se para efeitos tributários o que se entende ser um prédio rústico (designadamente que a sua afetação, ou na falta de concreta afetação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas e silvícolas), sucedendo, quando a afetação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos, por exemplo, para fins de exploração como “pedreiras, saibreira, argilas e fins análogos”, que a classificação de tais prédios seja alterada para o de prédio urbano (artigo 4.º do CIMI), na categoria “Outros”, prevista na alínea d) do n,º 1 do artigo 6.º do CIMI (conforme entendimento divulgado pela Autoridade Tributária, nomeadamente pela Circular n.º 13/2000, de 24 de Maio, com as necessárias adaptações quanto às alterações legislativas subsequentes).
Acresce que, apesar do SP destacar o aumento significativo da exploração em 2016 fruto destas aquisições, também não evidencia qualquer depreciação dos referenciados terrenos neste ano, em resultado da sua utilização.
Atendendo ao descrito, apesar do SP afirmar que a aquisição dos referidos prédios terá como fim a exploração dos mesmos no âmbito da sua atividade, mas atento o enquadramento tributário dos mesmos à data, não nos parece assim poderem ser enquadráveis nos termos do artigo 22.º do CFI, designadamente na exceção prevista na subalínea i) da alínea a) do n.º 2 do referido artigo: Ativos fixos tangíveis adquiridos em estado de novo, com exceção de: 1) Terrenos, salvo no caso de se destinarem a exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimento na indústria extrativa (sublinhados nossos).
Repare-se que, o que o SP pretendia aproveitar era de uma exceção na Lei.
Para poder aproveitar da exceção a exclusão da elegibilidade da aquisição de terrenos, estes tinham que ser adquiridos como terrenos destinados a exploração e não apenas alegar tal facto em sede de procedimento inspetivo, quando para os efeitos oficiais (escritura pública e registo dos terrenos), se mantenha a declaração como sendo terrenos rústicos.
Decorrente do descrito, os investimentos nos referidos terrenos não pode assim ser considerados como devidamente enquadrados, sendo de os desconsiderar na totalidade no montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI.
2 – Equipamento de produção - € 189 602,50
O investimento indicado em equipamento de produção, ficha 16ª038, refere-se à aquisição de uma “PÁ CARREGADORA” marca ... modelo ... série ...”, em estado de novo, através de um contrato de locação financeira mobiliária junto do C... (contrato n.º...), cujo fornecedor foi a “B..., Unipessoal, Lda, NIF... .
Aparentemente, parecia poder cumprir o critério de investimento relevante nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.
Contudo, analisada a aquisição do referido equipamento, constata-se que na aquisição do mesmo terá sido dado a troca, como parte do pagamento de entrada (1ª renda), equipamento usado com natureza equivalente, no caso uma “PÁ CARREGADORA marca ... modelo ... séria 753” (correspondente à ficha de ativo A008 1), conforme consta da fatura do SP n.º FM2016/4 de 25/07/2016 emitida ao fornecedor atrás referido “B...”, NIF..., pelo montante de €10.000 que com o IVA totaliza € 12.300,00
A nosso ver a aquisição do equipamento em causa traduz-se na substituição de outro com características próximas e equivalentes. Ora, é elegível para RFAI apenas investimento inicial e não investimento de substituição.
Concluímos assim pela não aceitação da consideração do investimento em causa como investimento relevante passível de ser aceite em sede de RFAI.
...
B. MIRANDA DO CORVO
Segundo justificado pelo sujeito passivo, os investimentos efetuados “...tiveram com principal objetivo o alargamento do portfolio de produção da A..., assim comi o alargamento da oferta de produtos em áreas geográficas diferentes daquelas abrangidas pelo polo de Albergaria dos Doze”. Destaca ainda que fruto dos referidos investimentos potenciou o aumento significativo em 2016 dessa exploração (volume de negócios aumentou €192.592,20, uma variação de 28% em relação ao ano anterior.
Neste local indicou ter efetuado investimentos no total de €6.410,00, decorrente de investimentos em imóveis, nomeadamente terrenos de exploração, concluindo-se o seguinte:
1 – Investimentos indicados como Terrenos de Exploração - € 6.410,00
No que se refere ao terreno de exploração verifica-se o mesmo já acima descrito quanto ao polo de Albergaria, ou seja, tratou-se da aquisição de um prédio rústico, sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação como prédios rústicos, e relativamente ao qual também não foi promovida pelo sujeito passivo em 2016 (nem em ano posterior) a alteração nos termos do artigo 13.º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento de definição de prédio rústico.
A fim de não nos repetirmos quanto a esta temática, remete-se para o já anteriormente referido relativamente ao polo de Albergaria dos Doze por ser em tudo idêntico, dando-se por isso aqui reproduzido nos mesmos termos.
Decorrente do descrito, o investimento no referido terreno não pode assim ser considerado como devidamente enquadrado (nos termos da exceção prevista na subalínea i) da alínea a) do n.° 2do artigo 22.° do CFI), sendo de o desconsiderar na totalidade no montante dos investimentos relevantes para efeitos do RFAI.
C. POLO DO OESTE
No referido polo do Oeste o sujeito passivo indica ter efetuado investimentos essencialmente em equipamento de transporte, usados na exploração em causa.
...
IV. Considerando assim o exposto, e se cumpridas todas as demais restantes condições exigíveis em sede de RFAI, pode-se concluir quanto aos montantes que poderiam ser aceites e não aceites como investimento relevante. Assim, e considerando o mapa apresentado pelo SP, com as referências de investimentos, atento o referido acima, em particular o exposto no subponto Ill, construiu-se os seguintes mapas finais resumo:
Ou seja, em resumo, a tais investimentos eventualmente aceites se cumpridas as demais condições do RFAI, corresponderia a dotação do montante de benefício fiscal eventualmente utilizável seguidamente indicado:
concluíu-se assim que os investimentos gue poderiam ser consjderados relevantes totalizaria no montante de € 432.222.09 e não aos indicados pelo SP de € 716.980,43, sendo gue tal permitiria no limite usufruir de um beneficio fiscal em sede de RFAI. Se cumpridos todas as restantes condições de acordo com a leqislação existente ao tempo, de €108.055.52 e não o indicado pelo SP de €179.245.11
V. Em face do indicado nos elementos justificativos dos investimentos por parte do sujeito passivo, pode-se inferir que os investimentos realizados pretenderam cobrir um pouco das várias vertentes enunciadas no referido normativo, embora por estar mais direcionado para o aumento da capacidade de produção conforme decorre do exposto pelo mesmo.
Porém, tendo efetuado alguma referência a remeter em parte para a diversificação da produção ou eventualmente alteração ao fundamental do processo de produção, então teria de se ter em conta o cumprimento do n.°2 e/ou do n.°1 do art.º3.° da portaria 297/2015 de 21 de setembro, constatandose pelos dados apresentados pelo sujeito passivo que este não demonstrou os elementos exigíveis para a consideração dos mesmos como relevantes nesta vertente, podendo-se ainda assim referir que não parece que os investimentos pudessem satisfazer tais enquadramentos.
Criação de postos de trabalho:
VI. Para efeitos do RFAI importa também ter em conta em 2016 o cumprimento cumulativo das condições previstas no n.° 4 do art.° 22.° do CFI, designadamente o previsto na al. t) dessa norma, ou seja, que o investimento relevante proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento.
De referir que um dos objetivos dos benefícios fiscais ao investimento previstos no Código Fiscal do Investimento (CFI) no qual se inclui o RFAI é de que os investimentos proporcionem a criação e manutenção de postos de trabalho (veja-se o preâmbulo do Decreto-Lei n.º162/2014, de31 de outubro, e o seu artigo 1.°, tendo vindo a ser entendido que integra o conceito de "criação de postos de trabalho" a admissão de trabalhadores através da celebração de contrato de trabalho sem termo (ou por tempo indeterminado), abrangendo a admissão de trabalhadores novos e de trabalhadores que já estivessem na empresa mas ao abrigo de um contrato com termo.
Ora, nessa referida condição, a da criação de postos de trabalho, o SP veio indicar na documentação apresentada ter satisfeito a mesma, designadamente com mapas de identificação de trabalhadores admitidos e saídos no ano de 2016, com as suas seguintes indicações conclusivas:
- Nas entradas temos 10 efetivos atualmente e 15 com contrato a termo.
- Nas saídas temos 9 efetivos e 9 a termo certo.
- Cumpre assim o disposto no artigo 19, n°2 c) e d) do EBF.
Embora não se compreenda a referência ao artigo 19 do EBF, quando a questão em análise do RFAI consta do CFI, sempre será de salientar os conceitos indicados na norma citada pelo SP, designadamente "Criação Líquida de postos de trabalho" a qual é tida pela diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações e o número de saídas de trabalhadores que, se encontravam nas mesmas condições. Sendo que, no referido artigo do EBF, vem também no seu n.°1 referir- se a criação de postos de trabalho por contrato de tempo indeterminado.
Importa, porém, analisar a questão em sede de RFAI, e nos termos do entendimento atrás exposto quanto à matéria de aferição da criação de postos de trabalho, avaliando-se a situação dos postos de trabalho não temporário, ou seja, a título definitivo (efetivos), nomeadamente face ao indicado pelo SP que teria acrescido em 1 posto, o que, naturalmente conduziria à satisfação da condição requerida.
Contudo, dadas as divergências entre esses dados apresentados e o que foi inscrito em documentação oficial relativamente a emprego criado, nomeadamente anexos A e B dos denominados "Relatórios Únicos" (especificado no modelo de relatório único previsto na portaria n.°55/2010 de 21 de janeiro tendo por objeto a "...informação sobre a actividade social da empresa, por parte do empregador, ao serviço com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral. ” em particular o Anexo B (o qua! visa o "fluxo de entrada e saída de trabalhadores do ano de 2016, foi possível verificar que a diferença entre entradas e saídas de trabalhadores, sucedidas nesse período do investimento em causa, com referência a trabalhadores com contratos sem termo, é negativa.
Dado que o SP indica nos mapas justificativos do RFAI, no que se refere aos contratos sem termo, a admissão de 10 pessoas e a saída de 9, ou seja, uma variação positiva de 1 posto de trabalho, analisaram-se as situações indicadas observando-se o seguinte:
- No mapa do SP este indica alguns postos de trabalho admitidos como sem termo, mas que constam do anexo B do relatório único como admitidos por contrato a termo, estando esta indicação dada na declaração oficial sobre o emprego de acordo com os contratos efetuados com esses trabalhadores a que tivemos acesso, totalizando 8 casos, pelo que o número de entradas por contrato sem termo não serão as 10 indicadas pelo SP, mas antes e apenas 2.
Os 8 casos indicados referem-se aos seguintes trabalhadores:
- No mapa do SP este indica ainda um total de 9 saídas de postos de trabalho sem termo, não constando nesta relação o caso da saída indicada no anexo B do relatório único de "L... ", o qual contratado sem termo em 2015 saiu no início de 2016, ainda que tenha voltado a entrar meses mais tarde em 2016, só que desta vez foi por via de contrato a termo. Assim, considerando as 9 saídas indicadas pelo SP de contratos sem termo, e juntando mais 1 não incluída referente a "L...", conclui-se que não serão 9 as saídas de trabalhadores com contratos sem termo, mas antes 10.
Assim, tendo em conta o descrito, conclui-se que não houve a criação de postos de trabalho por tempo indeterminado de + 1, mas antes uma diminuição de 8 conforme indicado no quadro seguinte:
Constata-se que tendo na prática havido mais saídas do que entradas de trabalhadores com contratos de trabalho sem termo (postos de trabalho criados diretamente pela própria empresa com fins duradouros), o SP não demonstra no caso reunir na conclusão do investimento as condições exigíveis para poder beneficiar do incentivo fiscal do RFAI, designadamente por não cumprir com a condição de criação de postos de trabalho prevista pela al. f) do n.°4 do artigo 22.° do CFI.
O entendimento por nós seguido encontra-se também em consonância com a interpretação já publicamente expressa pela Autoridade Tributária constante de informações vinculativas designadamente no âmbito dos processos "2010002853, PIVn.º1212, com entendimento sancionado por Despacho de 2010-10-27, do Director-Geral", e "2010 001800, PIV n.º818, com Despacho de 2010-07-16, do Director-Geral" (ambos consultáveis no portal da AT na internet em:http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/informacoes_vinculativas/rendimento/Pages/ default.aspx).
Em face do descrito, apesar de uma parte do investimento indicado até eventualmente poder ser enquadrável como elegível em sede de RFAI atento o acima descrito (investimentos de€ 432.222,09 que em sede de RFAI eventualmente permitiria usufruir de uma dotação de €108.055,52), sucede que o SP não reuniu as demais condições exigíveis para poder beneficiar do incentive fiscal do RFAI, dado nomeadamente não cumprir coma totalidade das condições objetivas referidas em termos de investimento relevante e de criação de postos de trabalho aferida no final do período de investimento o corrido em 2016, pelo que se propõe por essa razão a correção total dos montantes das dotações relativas ao ano 2016 no montante de €179.245,11.
Dado que o montante da dotação de 2016 corrigida, não ter sido utilizada no período, não implica qualquer outra correção a não ser no saldo em reporte para períodos seguintes, o qual não pode ser utilizado na dedução à coleta de períodos seguintes, e caso tenha sucedido deverá ser corrigido nos períodos em que tenha ocorrido essa utilização.
Já no que se refere ao saldo dedutível da dotação de 2015 transitada para 2016 (de acordo com os montantes corrigidos no ano de 2015 indicados no início), atentas as correções em sede de IRC, com o consequente aumento de coleta do IRC resultante das correções à matéria coletável em 2016, também o benefício à coleta do RFAI poderá ser superior, como limite de 50% da mesma (art.º23.°/n.°2/b) do CFI), o que será tido em conta na elaboração do relatório final.
...
IX – DIREITO DE AUDIÇÃO- FUNDAMENTAÇÃO
Remeteu-se notificação para o exercício do direito de audição, nos termos previstos no Art.º60.° da Lei Geral Tributária e no Art.º60.° do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária, por correio registado pelo ofício n°SPGAl-... (número de registo nos CTT RF...PT de 2020/05/14) para o domicílio fiscal conforme consta na base de dados da AT, para no prazo de 25 dias, querendo, o mesmo se pronunciar sobre o projeto de relatório da inspeção tributária.
De referir, porém, terminado o prazo em 12/06/2020 para o exercício do correspondente direito de audição, foi remetido por via de correio eletrónico entrado na DF de ... em 16/06/2020 requerimento subscrito por mandatário legal do sujeito passivo solicitando o alargamento do prazo de direito de audição prévia sustentado no seguidamente reproduzido:
"Tal pretensão justifica-se pelo facto do processo inspetivo revestir manifesta complexidade técnica e de extrema importância para a empresa, uma vez que a sua viabilidade poderá estar posta em causa em caso de eventual futura liquidação do imposto.
Os mandatários do SP necessitarão, para pleno exercício do direito de audição, de um prazo adicional por forma a poderem analisar devidamente o projeto de inspeção bem como toda a documentação contabilística de suporte, razão pela qual se requer a V.E.xª o alargamento do prazo de audição por mais 10 dias.”
Nos termos do n.°6 do art.º60.° da LGT e n.° 2 do art-º 60 do RCPITA, o prazo normal previsto para efeitos de direito de audição seria de 15 dias, podendo ser alargado ate o máximo de 25 dias em função da complexidade da matéria, situação que o sujeito passivo alegou neste requerimento, mas que a inspeção já tinha desde logo tido em conta na notificação para o exercício do direito de audição.
Dado que o prazo máximo legalmente admissível para efeitos de exercício do direito de audição é de 25 dias, prazo este continuo, cuja contagem terminou no dia 12/06/2020, ou seja, anterior à data do requerido, não foi atendido o solicitado dado não existir disposição legal para o efeito conforme despacho e notificação oportunamente remetido e que se dá aqui por totalmente reproduzido.
Assim, verificamos que findo o prazo concedido, o sujeito passivo não exerceu o referido direito, pelo que se mantém na íntegra os factos e conclusões expostos no presente relatório.”
22.5. Com efeito, foi a Requerente notificada através do ofício DPGAI –..., da Direção de Finanças de ..., de 19.5.2020, para exercer o direito de audição, no prazo de 25 dias, sobre o Projeto de Relatório de Inspeção Tributária acima referido.
22.6. Em 16.2020 a Requerente, submeteu, por correio eletrónico, pedido de dilação do prazo para exercício do direito de audição prévia alegando que as matérias em causa revestem manifesta complexidade.
22.7.Por despacho de 18.6.2020, do Diretor de Finanças de ..., foi indeferido o pedido de dilação daquele prazo. A decisão fundamenta-se em informação técnica no sentido de que o prazo concedido para exercício do direito de audição já tinha sido o prazo máximo previsto na lei -cfr. n.º 6 do art.º 60.º da LGT e n.º 2 do art.º 60.º do RCPITA - e ainda porque o prazo concedido terminara a 12-06-2020, pelo que o requerimento apresentado foi submetido para além deste prazo. Esta decisão, e respetiva fundamentação, foi notificada à Requerente através do ofício n.º SPGAI-..., de 18.6.2020.
22.8. Assim, foi o projeto de Relatório de Inspeção Tributária convertido em definitivo, concluindo-se a ação inspetiva com o despacho da Chefe de Divisão da Direção de Finanças de ..., proferido no uso de delegação de competências, em sentido concordante com as correções técnicas constantes daquele Relatório, respetiva quantificação e fundamentação.
22.9. A decisão referida no ponto anterior foi notificada à Requerente nos termos do artigo 62.º do RCPITA através do ofício n.º SPGAI..., de 29-06-2020.
22.10. Com base nas correções aritméticas constantes do RIT foi efetuada a liquidação de IRC e juros compensatórios n.º 2020 ..., resultando da demonstração de acerto de contas o saldo de € 25 024,83, a pagar até 11-09-2020, tendo o pagamento sido efetuado em 01-09-2020.
22.11. Em 30-12-2020, a Requerente, deduziu reclamação graciosa contra a liquidação adicional em causa, pugnando pela sua anulação parcial.
22.12. Alegando, em geral, a insuficiente fundamentação das correções efetuadas à base tributável, a Reclamante delimita o âmbito da reclamação:
a) à correção aritmética à matéria coletável no valor de € 48.340,00 (menos-valias realizadas com a alienação de bens do ativo fixo tangível não aceites fiscalmente) e
b) às correções aritméticas ao imposto em falta no valor de 179.245,11 € (valor de dotação indevidamente considerado para dedução à coleta de IRC relativo a benefício fiscal – RFAI do ano de 2016).
22.13. Relativamente à correção à matéria coletável respeitante a perdas em resultado da alienação de bens do ativo fixo tangível não aceites fiscalmente (pá carregadora e barracão) registadas no mesmo ano como aquisição e alienação por valor inferior ao da aquisição, alega a Reclamante, em síntese, que:
- a pá carregadora terá sofrido uma avaria cuja reparação implicaria um gasto que não compensava pelo que procurou a solução menos onerosa para a empresa. No caso, optando pela sua alienação por valor inferior ao da aquisição, assim minimizando o prejuízo;
- no que se refere ao barracão (“contentor”) foi o mesmo destruído por um camião em manobras, sendo o mesmo alienado como sucata por um valor meramente simbólico,
22.14. No tocante à dotação de benefício do RFAI indevido, alega-se na reclamação em causa que não tem fundamento legal a exigência de classificação como urbanos dos prédios rústicos adquiridos pela empresa com o objetivo de aumentar a extração, produção e venda de caulinos e areias, mostrando-se totalmente preenchidos os requisitos da subalínea i) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI.
22.15. No que respeita ao investimento efetuado em equipamento de produção - pá carregadora, marca ..., ...– que a Administração Tributária considera como mera substituição, sustenta a Reclamante que as novas características do equipamento adquirido não só aumentou a produtividade em 5% como proporcionou significativa poupança energética. Pelo que não pode deixar de ser considerado investimento elegível para efeitos do RFAI.
22.16. Quanto à criação líquida de postos de trabalho, condição que a AT considera não se mostrar preenchida, alega a Reclamante que tal conclusão se suporta no Relatório Único, sendo este reportado a outubro de 2016 não pode servir de referência para aquele efeito por dele não decorrer informação sobre a situação efetiva dos funcionários da empresa em 31 de dezembro daquele ano,
22.17. Além desse aspeto, acentua a Reclamante ter havido erro no preenchimento daquele Relatório Único, demonstrando, através de mapas por si elaborados, o número de postos de trabalho correspondentes a contratos sem termo existentes em janeiro de 2016, em número de 27 e de postos de trabalho nas mesmas condições existentes em dezembro do mesmo ano em número de 29.
22.18. Por despacho de 20-05-2021, do Chefe de Divisão da Direção de Finanças de ..., proferido ao abrigo da subdelegação de competência, notificado à reclamante através do ofício DJT ... 2021, de 24-05-2021, foi indeferida a reclamação. A decisão fundamenta-se por concordância com o explanado em informação técnica, cujos pontos essenciais a seguir se destacam:
22.19. Relativamente às correções propostas no RIT quanto à alienação de ativos fixos tangíveis por valor inferior ao da aquisição efetuada no mesmo ano, é esta matéria apreciada na informação sobre que recaiu a decisão de concordância com as correções propostas no RIT, nos seguintes termos:
“ No exercício de 2016, o SP procedeu à alienação de alguns ativos fixos tangíveis, entre os quais se incluem alguns adquiridos nesse ano, conforme é o caso de uma pá carregadora, barracão e um trator ..., sendo que, à exceção do trator ..., o qual foi vendido ao preço de custo, os outros dois ativos foram alienados por um preço muito inferior, levando ao registo uma perde (menos-valia) de € 48 340.
Segundo a Inspeção Tributária, em contexto de atividades económicas o valor normal de alienação de um bem não pode ser inferior ao preço de aquisição do mesmo, a menos que o decurso do tempo e uso enquanto ativo produtivo tenha consumido parte do seu valor original, o que até será aceitável, mas não nas dimensões aqui relatadas. Segundo o disposto nos termos da al. b) do n.º 4 do artigo 16.º do CIVA para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado, pela qual se entende que o valor normal de um bem ou serviço, na falta de bem similar, não pode ser inferior ao preço de aquisição do bem ou, na sua falta, ao preço de custo, reportados ao momento em que a transmissão de bens se realiza.
Assim, concluiu que “os factos descritos não se coadunam com o objeto de uma atividade económica tendente à geração de rendimentos e não encontra assim enquadramento para aceitação das perdas em causa, como dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável, dado não se tratarem de gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, conforme determina o n.º1 do artigo 23.º do CIRC, sendo por isso de corrigir o resultado tributável pelo acréscimo acima indicado de € 48 340,00”
Alega a reclamante que, não teve oportunidade de apresentar qualquer justificação para o facto de ter alienado os dois bens por um preço inferior ao valor de aquisição, sendo que a pá carregadora teve uma avaria não compensando o arranjo, de acordo com o orçamento que foi solicitado e relativamente ao barracão adquirido por € 30 000,00, foi alienado seis meses depois, porque foi destruído num acidente com um camião que estaria a ser manobrado.
Todavia não lhe assiste razão. Efetivamente, para cobrir determinados sinistros ou ocorrência de danos, normal é que a reclamante acionasse um seguro, o qual indemnizaria a destruição dos bens ou as avarias depois da aquisição. Por outro lado, segundo a doutrina, a menos-valia pode definir-se como uma perda de valor económico de um ativo empresarial devido a causas físicas (deterioração), técnicas (obsolência) ou económicas, sendo estas derivadas de uma baixa de preço no mercado. Em sede de IRC, o legislador dispõe que, são consideradas menos-valias realizadas (por contraposição às menos-valias latentes) as perdas sofridas relativamente a elementos do ativo fixo tangível, mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, segundo o artigo 46.º, n.º 1 a do CIRC. As menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das depreciações ou amortizações praticadas (Cfr. Art.46.º, n.º 2 do C.I.R.C.). O valor de realização é definido nas diversas alíneas do n.º 3 do artigo 46.º do C.I.R.C.
A noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspetiva económico-empresarial, por preenchimento direto ou indireto, da motivação última de contribuição pata a obtenção do lucro, e nenhum gestor prudente, cauteloso e diligente teria vendido por um preço tão inferior àquele que adquirira por um preço muito mais elevado, sendo que um custo é uma despesa que deve ter na sua origem e na sua causa, um fim empresarial, e por conseguinte a obtenção de proveitos e por fim do lucro, sendo este o princípio que norteia a constituição e a existência de qualquer sociedade – a obtenção de lucros, plasmado no artigo 980.º do Código Civil, e artigos 21.º e 22.º do Código das Sociedades Comerciais.
Nos termos previstos no artigo 64.º do Código das Sociedades Comerciais, os gerentes ou administradores devem empregar a diligência de um gestor criterioso e ordenado, devem empregar elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da empresa.
Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em lodos os atos abstratamente subsumíveis num perfil lucrativo, ficando fora do conceito de indispensabilidade, os atos desconformes com o escopo social, aqueles que não se inserem no interesse da sociedade, sobretudo porque não visam o lucro,
Através da realização do objeto estatutariamente fixado, a empresa visa o lucro, realizando gastos tendo em vista um tal escopo, não sendo de admitir que os mesmos possam servir fins estritamente pessoais ou externos à empresa, afinal, o sujeito passivo de imposto. A dedutibilidade fiscal dos gastos depende pois da convocação de um juízo quanto à sua afetação ao interesse societário, ainda que, a jusante, em benefícios dos sócios “21.20 RUI MARQUES, As Realizações de Utilidade Social em IRC e IRS, Wolters.
As restrições à dedutibilidade fiscal dos gastos são justificadas porque “a dedução indevida de gastos, pela inerente redução de imposto a pagar (a montante daquela) configura uma situação de abuso de direito, que não pode ser tolerada. Pelo que as restrições à dedutibilidade fiscal almejam preservar a unidade e coerência do sistema fiscal, logrando evitar a afetação dos recursos da esfera empresarial para a esfera pessoal (sócios, gerentes, ou terceiros), com a consequente redução da matéria coletável.
22.20. No que concerne às correções relativas ao RFAI, a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa da liquidação ora impugnada, fundamenta-se nos seguintes termos:
“A reclamante discorda das correções constantes do ponto 3.1.1.5 – Dotação do Benefício do RFAI indevido, nomeadamente, os investimentos indicados, como terrenos de exploração, alegando que os imóveis rústicos devem continuar a ser considerados fiscalmente como prédios rústicos, nos termos da alínea a) do artigo 3.º do CIMI e não como urbanos, e que nenhuma obrigação de alteração da classificação dos prédios rústicos para urbanos na categoria de “Outros” poderá ser imposta pela AT como condição essencial e relevante para efeitos de RFAI.
E considera que estão preenchidos todos os requisitos da subalínea i) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, nomeadamente serem ativo fixo tangível, terreno que se destina a exploração de concessões mineiras.
Mas também aqui não lhe assiste razão. Nos termos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes, as efetuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015 de 21 de setembro), designadamente investimento em ativos fixos tangíveis afetos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que não estejam afetos à exploração da empresa, bem como eventuais reparações de equipamentos pré-existentes.
No âmbito da ação inspetiva, apurou-se que os terrenos de exploração indicados, se tratam todos de prédios rústicos adquiridos sem indicação da finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos, relativamente aos quais também não foi promovida pelo sujeito passivo em 2016 (nem em ano posterior) a alteração nos termos do artigo 13.º do CIMI por eventual afetação a fim diferente do enquadramento da definição de prédios rústicos.
De facto, nos termos do artigo 3.º do CIMI, define-se para efeitos tributários o que se entende ser um prédio rústico (designadamente que a sua afetação, ou na falta de concreta afetação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas e silvícolas) sucedendo, quando a afetação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos. Por exemplo para fins de exploração como de “pedreiras, saibreiras, argilas e fins análogos”, que a classificação de tais prédios seja alterada para a de prédio urbano (artigo 4.º do CIMI), na categoria de “Outros”, prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º do CIMI (conforme entendimento já divulgado pela Autoridade Tributária, nomeadamente pela Circular n.º 13/2000, de 24 de maio, com as necessárias adaptações quanto às alterações legislativas subsequentes). Acresce que, apesar do SP destacar o aumento significativo da exploração em 2016 fruto destas aquisições, também não evidencia qualquer depreciação dos referenciados terrenos neste ano em resultado da sua utilização.
(...)
22.22. Sobre a aquisição de equipamento, a reclamação é objeto de apreciação nos seguintes termos:“ A reclamante discorda da correção efetuada quanto ao equipamento de produção – Pá carregadora marca ..., modelo ... séria ..., em que a IT não considerou elegível para RFAI, dado ser investimento de substituição e não investimento inicial, alegando que a ... tem produzido ao longo dos anos upgrades do modelo LI20 que permitem aumentar a produtividade e eficiência energética da reclamante.
De notar que, nos termos da alínea d), do n,º 2, do artigo 2,º, o benefício fiscal previsto nos artigos 23.º (aplicável ao RFAI do CFI), apenas é aplicável aos investimentos iniciais, considerando como tais os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabircados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
...
A análise dos argumentos e das fotos juntas pela reclamante confirmam que o anterior equipamento – Pá carregadora, marca..., foi substituído pelo novo modelo, referindo-se assim a um bem que já existia como propriedade da reclamante, não sendo, portanto, uma adição, mas uma substituição evidentemente com melhor performance tecnológica, a nível energético e outros. A própria descrição como “up grade” significa uma melhoria de algo que já existia, nas sendo razoável eftuar troca ou substituição por um bom com pior performance a nível de produtividade e de consumo energético, não tendo a reclamante logrado efetuar a prova do que alegou, conforme era seu ónus, de acordo com o artigo 74.º da LGT.
22.23. No tocante ao requisito da criação de postos de trabalho, a apreciação da AT em sede de reclamação graciosa é, no essencial, a seguinte: “ A reclamante alega que cumpriu a condição de “criação de postos de trabalho” para efeitos de RFAI pois esta não pode ser medida unicamente pela criação líquida de postos de trabalho num determinado ano com a contratação de funcionários com contratos sem termo, mas que deve ser parametrizado quando em 31 de dezembro de determinado ano se verifica um aumento líquido do número de trabalhadores relativamente à média dos 12 meses precedentes”.
Por seu turno segundo a IT, “Constata-se que tendo na prática havido mais saídas do que entradas de trabalhadores com contratos de trabalho sem termo (postos de trabalho criados diretamente pela própria empresa com fins duradouros), o SP não demonstra no caso reunir na conclusão do investimento as condições exigíveis para poder beneficiar do incentivo fiscal do RFAI, designadamente por não cumprir com a condição de criação de postos de trabalho prevista pela al. f) do n.º 4 fo artigo 22.º do CFI.”
Efetivamente, nos termos previstos na alínea f) do n.º 4 do artigo 22,º do CFI, a condição, cumulativa com outras, para beneficiar deste benefício fiscal (RFAI) é a de que “Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c), sendo que a condição mostra-se cumprida se o investimento conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores relevando apenas para este efeito, os trabalhadores admitidos por contratos de trabalho sem termo e os novos postos de trabalho forem diretamente criados pelo investimento realizado.
A criação de emprego prevista na al. f) do n.º 4 do art. 22.º do CFI deverá ser entendidas como um requisito sine qua non do direito ao benefício fiscal, já que é esse um dos propósitos assumidos pelo legislador e consta expressamente da letra da lei. Não obstante, não se deverá esquecer que o regime em questão visará fomentar o investimento, para além da modernização e a competitividade do País e das qualificações dos Portugueses, sendo essencialmente um regime de apoio ao investimento, e não ao emprego.
A reclamante não comprova o indicado nos quadros juntos sob o anexo n.º 4, onde constam os trabalhadores alegadamente elegíveis, nem demonstra que preenche a condição exigida, de que a criação de postos de trabalho deve ser causalmente associada ao investimento realizado, conforme exige o disposto na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.
23. Em 25-08-2021, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.
24.Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham por provados.
IV. Matéria de direito
25. Na sequência de ação inspetiva e com base nos elementos e propostas constantes do respetivo Relatório, a Administração Tributária efetuou correções à matéria coletável da Requerente relativa ao IRC e ao exercício de 2016.
Das referidas correções – em larga medida aceites pela Requerente - constituem objeto do presente pedido de pronúncia arbitral apenas as que respeitam a:
- Menos-valias realizadas na alienação de bens do ativo fixo tangível;
- Valor de dotação para dedução à coleta de imposto relativo a investimentos realizados ao abrigo do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI).
26. Das menos-valias realizadas - Conforme detalhadamente descrito no Relatório de inspeção tributária cujas conclusões, propostas e respetiva fundamentação se encontram na base da decisão da AT relativa às correções técnicas efetuadas, a Requerente, em 2016, alienou bens do ativo fixo tangível por preço muito inferior ao da respetiva aquisição efetuada no mesmo ano, pelo que as menos-valias realizadas não são fiscalmente aceites
26.1. Posição da Requerida
O entendimento da AT sobre esta matéria, explanado na respetiva Resposta ao presente pedido de pronúncia arbitral, corrobora integralmente o que se encontra vertido no RIT e na Informação que se encontra na base da decisão de indeferimento de reclamação graciosa. No essencial, alega a Requerida, nos pontos 27 e seguintes da Resposta, que as menos-valias realizadas “27. … não são aceites fiscalmente por, numa primeira fase, terem constatado que os dois ativos em causa (pá carregadora e barracão) foram registados no mesmo ano, como aquisição e alienação por um valor muito inferior ao da aquisição.
28. Entenderam aqueles serviços que não foram apresentados fundamentos suficientes que conduzissem a perdas tão significativas em tão pouco tempo, tendo para o efeito baseado a correcção efectuada nas normas contidas na al. b) do n.º 4 do art.º 16.º do CIVA e fundamentado a mesma com base na norma relativa ao conceito de gastos e perdas constante do n.º 1 do art.º 23.º do CIRC.”
29. A Requerente veio alegar em sede procedimental e na presente sede que a pá carregadora foi vendida por um valor inferior (€ 15.800,00) ao valor de aquisição (€ 35.452,00) devido a uma avaria da mesma, cuja reparação importava o pagamento de um valor superior ao valor de aquisição e,
30. No que concerne ao Barracão (contentor), o mesmo sucedeu em virtude de alegadamente o bem ter sido destruído por um camião do sujeito passivo que estaria a ser manobrado, tendo sido vendido para sucata pelo montante de € 1.652,00, quando tinha sido adquirido no mesmo ano pelo valor de € 30.000,00.
31. Todavia não lhe assiste razão, como se passará a demonstrar.
32. Em primeiro lugar cabe salientar que para cobrir determinados sinistros ou ocorrência de danos, normalmente é accionado um seguro, o qual indemnizaria a destruição dos bens ou as avarias depois da aquisição.
33. E quando se fala em seguro não nos queremos reportar somente ao seguro automóvel referente ao veículo/camião em manobras que alegadamente terá destruído o bem/barracão, mas também ao seguro do bem em causa, que de acordo com os usos são comummente utilizados para segurar/cobrir tanto as avarias de maquinaria como os bens que constituem o activo no âmbito da actividade desenvolvida pelos sujeitos passivos.
34. Por outro lado, não deixa de se estranha, que sendo a reparação da pá carregadora, segundo o sujeito passivo, superior ao preço de aquisição, mesmo assim, tenha sido possível vender a mesma por cerca de metade do preço.
35. Acresce ainda que não deixa igualmente de causar admiração, o facto de um bem que tenha sido recentemente adquirido e tenha avariado pouco tempo depois, não ter sido consertado ao abrigo da garantia, uma vez que tendo a pá carregadora sido adquirida naquele mesmo ano/exercício, estaria ainda a decorrer o respectivo prazo de garantia do bem.
36. Ademais a ora Requerente não apresentou qualquer documento comprovativo dos factos que alega, pelo que a decisão não poderia ser outra.
37. Na senda do supra exposto, sempre se dirá que o princípio do ónus da prova consubstanciasse no princípio de que quem alega um determinado facto constitutivo de um direito, tem a necessidade de prová-lo. (cf. art.º 342.º do CC e n.º 1 do art.º 74.º da LGT).
26.2 Posição da Requerente
A Requerente defende, em suma que, a venda dos bens em causa constitui um caso pontual e excecional, salientando o seguinte:
a) Quanto à venda da pá carregadoura
“27. No caso da pá carregadora, esta foi adquirida ao grupo M... pelo valor de 36,542,00 tendo tido uma avaria pouquíssimo tempo depois.
28. Aquando da avaria do equipamento industrial supra indicado, a A... solicitou orçamento para proceder à reparação do mesmo, através da qual se constatou que a reparação importava o pagamento de um valor superior ao do bem antes da sua aquisição, o qual era absolutamente ridículo, não compensando o mesmo.
29. Neste sentido, a A... tentou arranjar, de entre algumas possibilidades, a solução que fosse menos prejudicial para a empresa.
30. Razão pela qual acabou por vender o bem pelo valor de € 15.800,00 (quinze mil e oitocentos euros), de modo a diminuir o prejuízo e considerar como melhor estratégia uma menos-valia de € 20,742,00 (vinte mil setecentos e quarenta e dois euros) ao invés de € 36,542,00 (trinta e deis mil e quinhentos e quarenta e dois euros).
b) Quanto à venda do barracão/contentor
“32. Por outro lado, e no que se refere ao Barracão em Albergaria dos Doze (barracão esse que é um contentor), o Sujeito Passivo adquiriu-o pelo valor de € 30 000,00 (trinta mil euros).
33. Tendo sido o mesmo alienado volvidos seis meses pelo facto de ter sido destruído num acidente com um camião do sujeito passivo que estava a ser manobrado.
34. Ora tal acontecimento inutilizou completamente o barracão/contentor, deixando de poder ser utilizado para os seus fins.
35. Razões pelas quais o referido bem foi alienado com venda de sucata pelo simbólico valor de € 1 652,00 (mil seiscentos e cinquenta e dois euros)
36. Mais uma vez a A... tentou recuperar parte do valor investido no bem, apesar de, no caso em concreto, pela sua completa inutilização para e qualquer atividade, o valor ter acabado por ser bastante reduzido.
37. Tomando disso conhecimento, vem a Autoridade Tributária referir,relativamente à pá carregadora e ao barracão, que “para cobrir determinados sinistros ou ocorrência de danos, normal é que a reclamanteacionasse um seguro, o qual indemnizaria a destruição dos bens ou as avarias depois da aquisição”.
38. Ora, salvo o devido respeito, não compreende o Sujeito Passivo como poderia ser acionado um Seguro que não existe para os casos sub judice.
39. Designadamente, e em primeiro lugar, os Seguros não cobrem avarias, logo não poderia o Sujeito Passivo acionar um para cobrir os danos resultantes da avaria da pá carregadora.
40. Em segundo lugar, e no que respeita ao barracão/contentor, o Seguro do veículo que causou o dano, subscrito pelo Sujeito Passivo, apesar de abranger, até um certo limite, danos provocados ao próprio veículo em virtude de choque (cf. condições particulares do Seguro da frota de automóveis do Sujeito Passivo, que se junta como Doc. N.º 6, bem como a Cláusula 3ª do Seguro Automóvel Facultivio, p.15, que se junta como Doc. N.º 7)
41.º Exclui os danos próprios provocados pelos veículos segurados a outros bens próprios do Tomador do Seguro – que, no caso concreto, é o Sujeito Passivo -, conforme demonstra a alínea b) do n.º 2 da Cláusula 5.ª das Condições Gerais do Seguro Automóvel Obrigatório, p. 4, subscrito pelo sujeito passivo (Cf, Doc. n.º 7 supra indicado) como é o presente caso, da destruição do barracão pr um camião do Sujeito Passivo.
42.º Consequentemente, também não poderia, no caso do barracão, acionar qualquer seguro,
(...)
Concluindo, argumenta a Requerente que:
“49. Ora, por tudo o exposto, dúvidas não existem de que estão em causa “causas física (deterioração)”, quer da Pá Carregadora, quer do Barracão.
50. Razão pela qual as perdas de valor económico dos ativos empresariais supra indicados devem ser aceites como dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável e, consequentemente, consideradas para menos-valias, no valor registado de € 48 340,00.
27. Do Direito
Sintetizando tudo o que vem exposto, pode concluir-se que a AT fundamenta as correções à matéria coletável que se encontram na base da liquidação impugnada na consideração de que não podem ser aceites para efeitos fiscais as menos-valias realizadas pela Requerente com a venda dos referidos ativos, nas condições acima referidas.
Cabe, antes de mais, referir que, conforme resulta do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), estando em causa a apreciação da legalidade de um ato de liquidação oficiosa praticado pela Autoridade Tributária, corrigindo anterior liquidação efetuada com base na declaração do sujeito passivo, é a AT que incumbe o ónus da prova dos pressupostos legais da correção que operou. Não sendo recolhidos quaisquer indícios de simulação relativamente às transações em causa – que, de resto não é sequer expressamente suscitada pela AT – prevalece, no presente caso, o princípio da veracidade da declaração e contabilidade do sujeito passivo, consagrada no artigo 75.º, n.º 1, da LGT.
Consequentemente, o enquadramento da situação concreta passa, necessariamente, por referir o artigo 23.º do Código do IRC (CIRC).
28. Dispõe o artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, que“1- Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC". Segundo o n.º 2 do mesmo artigo, “. 2 - Consideram-se abrangidos pelo número anterior, nomeadamente, os seguintes gastos e perdas: (...) l) Menos-valias realizadas”
29. Segundo a doutrina[i] e reiterada jurisprudência[ii], a consideração como gastos fiscais, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, para que remete o n.º 2 do mesmo artigo, não é necessária uma relação de causalidade entre gastos incorridos pelo sujeito passivo e a obtenção de rendimentos, bastando que aqueles sejam suportados pelo sujeito passivo no interesse da empresa.
30. No presente caso é manifesto que os gastos realizados se adequam à estrutura produtiva da empresa sendo realizados no âmbito da sua atividade e contraídos no seu interesse.
31. Por seu lado, o conceito de mais-valias ou menos-valias encontra-se formulado no artigo 46.º. n.º 1, do mesmo Código, nos seguintes termos“1 - Consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, e, bem assim, os decorrentes de sinistros ou os resultantes da afetação permanente a fins alheios à atividade exercida, respeitantes a:a) Ativos fixos tangíveis, ativos intangíveis, ativos biológicos não consumíveis e propriedades de investimento, ainda que qualquer destes ativos tenha sido reclassificado como ativo não corrente detido para venda;(...)
Segundo o n.º 2 do mesmo artigo, “2 - As mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição, deduzido das depreciações e amortizações aceites fiscalmente, das perdas por imparidade e outras correções de valor previstas nos artigos 28.º-A e 31.º-B e ainda dos valores reconhecidos como gasto fiscal nos termos do artigo 45.º-A, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 3 do artigo 31.º-A.”
De acordo com o n,º 3 do mesmo artigo, considera-se “3 - Considera-se valor de realização:
a) No caso de troca, o valor de mercado dos bens ou direitos recebidos, acrescido ou diminuído, consoante o caso, da importância em dinheiro conjuntamente recebida ou paga;
b) No caso de expropriações ou de bens sinistrados, o valor da correspondente indemnização;
c) No caso de bens afetos permanentemente a fins alheios à atividade exercida, o seu valor de mercado;
d) Nos casos de fusão, cisão, entrada de ativos ou permuta de partes sociais, o valor de mercado dos elementos transmitidos em consequência daquelas operações;
e) No caso de alienação de títulos de dívida, o valor da transação, líquido dos juros contáveis desde a data do último vencimento ou da emissão, primeira colocação ou endosso, se ainda não houver ocorrido qualquer vencimento, até à data da transmissão, bem como da diferença pela parte correspondente àqueles períodos, entre o valor de reembolso e o preço da emissão, nos casos de títulos cuja remuneração seja constituída, total ou parcialmente, por aquela diferença;
f) No caso de afetação dos elementos patrimoniais referidos no n.º 1 a um estabelecimento estável situado fora do território português relativamente ao qual tenha sido exercida a opção pelo regime previsto no n.º 1 do artigo 54.º -A, o valor de mercado à data da afetação;
g) Nos demais casos, o valor da respetiva contraprestação.
32. Revertendo à concreta situação em análise, pode constatar-se que a decisão da AT não questiona a finalidade empresarial das vendas em causa, nem a veracidade dos elementos declarados e contabilizados pelo sujeito passivo, ilidindo a presunção legal de que beneficia nos termos do artigo 75.º, n.º1,da LGT, limitando-se à formulação de juízos meramente subjetivos. No plano do direito, a decisão suporta-se na invocação da norma do artigo 16.º, n.º 4, alínea b), do Código do IVA. Para efeitos deste imposto, estabelece aquele n.º 4 que “o valor normal não pode ser inferior ao preço de aquisição do bem ou, na sua falta, ao preço de custo, reportados ao momento em que a transmissão de bens se realiza”.
A norma em causa tem o seu âmbito de aplicação circunscrito não só à determinação do valor tributável de transmissões de bens em sede de IVA como também, conforme expressamente estabelece o n.º 3 do citado artigo, aos casos em que a contraprestação não seja definida, no todo ou em parte, em dinheiro. A norma em causa não é transponível para a determinação do valor de realização de mais-valias ou menos-valias em sede de IRC sendo este determinado com base nas regras previstas na norma acima transcrita do respetivo Código.
33. Pelo exposto, considera o tribunal que a correção relativa às menos-valias realizadas pela Requerente com a venda da pá carregadora e do barracão/contentor enferma de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, o que justifica a sua anulação bem como da liquidação consequente.
34. Da dotação indevidamente considerada para dedução à coleta ao abrigo do RFAI - Está em causa no presente processo a apreciação da legalidade das correções aritméticas, no montante de € 179 245,11 respeitantes ao valor considerado para dedução à coleta do IRC relativo ao RFAI do ano de 2016 que a Autoridade Tributária e Aduaneira considera indevido por entender não se mostrar preenchido o respetivo condicionalismo legal.
Segundo a AT não foram observadas na totalidade as condições de acesso ao benefício em termos de investimento relevante e de criação de postos de trabalho. No tocante a investimento relevante está em causa o investimento efetuado pela empresa em terrenos indicados como de exploração e em equipamento de produção. Entende também a AT que o investimento efetuado não cumpriu a condição de criação de postos de trabalho.
34.1. Posição da Requerida
A Requerida sustenta a decisão relativa às correções efetuadas à matéria coletável da Requerente essencialmente nos termos a seguir referidos.
a) Dos investimentos indicados como “terrenos de exploração” - Segundo a AT o investimento realizado nos terrenos em causa não preenche os requisitos de aplicação do RFAI por terem sido adquiridos como prédios rústicos e como tal se manterem na propriedade da Requerente. Este entendimento, já expresso no RIT, pode agora resumir-se nos seguintes pontos da Resposta da AT:
“58. De acordo com a subalínea i) da alínea a) do n.º 2 do art.º 22.º do CFI, apenas os terrenos que se destinam à “exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extractiva” são considerados investimentos relevantes para efeitos do benefício do RFAI.
59. Sucede que no caso em apreço, consultada a aplicação informática da AT “Sistema de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas (IMT)” e analisadas as matrizes dos terrenos considerados pelo sujeito passivo para efeitos de RFAI, bem como a declaração Mod.1 de IMT, conclui-se que os terrenos em causa são prédios rústicos, compostos, a maior parte deles de pinhal e mato, à excepção dos terrenos cujos n.ºs de matriz R22935, R 25754, R9775 e R9060, compostos de terreno com mato e lenha; eucaliptal, pinhal e mato, pinhal com pinheiros resinados e terreno matagoso, respetivamente.
60. De esclarecer que nos termos do RFAI, consideram-se aplicações relevantes, as efectuadas no âmbito de um investimento inicial (nos termos da portaria 297/2015 de 21 de setembro), designadamente, investimentos em activos fixos tangíveis, afectos à exploração da empresa adquiridos em estado novo, afastando-se desde logo mobiliário e artigos de conforto ou decoração ou outros bens que não estejam afectos à exploração da empresa, bem como eventuais reparações de equipamentos pré-existentes.
61. No âmbito da acçãoinspectiva da qual resultaram as correcções em dissídio, apuraram os SIT, que os terrenos em causa, se tratam de prédios rústicos adquiridos sem indicação de finalidade de exploração diferente da prevista na classificação dos prédios como rústicos,
62. E relativamente aos quais não foi promovido pelo sujeito passivo em 2016 (nem em ano posterior) a alteração nos termos do art.º 13.º do CIMI por eventual afectação a fim diferente do enquadramento de definição de prédios rústicos
(...)
65. Nos termos do art.º 3° do CIMI define-se o que é um prédio rústico para efeitos tributários, importando a tal conceito, designadamente que a sua afectação, ou na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas e silvícolas,
66. Porém, quando a afectação dos mesmos se destine a fins diferentes dos aí previstos, por exemplo para fins de exploração como de "pedreiras, saibreiras, argilas e, fins análogos", a classificação de tais prédios tem de ser alterada para a de prédio urbano (art.º 4° do CIMI), na categoria "Outros", prevista na al. d) do nº 1 do art.º 6º do CIMI (conforme entendimento já divulgado pela Autoridade Tributária, nomeadamente pela Circular nº 1312000, de 24 de Maio com as necessárias adaptações quanto às alterações legislativas subsequentes).
67. Acresce que, apesar da Requerente destacar o aumento significativo da exploração em 2016 fruto destas aquisições, também não evidencia qualquer depreciação dos referenciados terrenos neste ano, em resultado da sua utilização.
(...)
73. Ademais, no que concretamente à declaração Mod.1 de IMT respeita, constata-se que não se faz referência ao destino dos prédios adquiridos, pelo que, não foi efectuada a demonstração necessária para aqueles terrenos poderem ser enquadrados na excepção prevista na subalínea i) da alínea a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, prova que necessariamente deveria ter sido feito pela Requerente para que tais investimentos nos referidos terrenos pudessem ser considerados para efeitos de RFAI.
74. Com efeito, a Requerente não logrou por fazer convenientemente essa prova, o que consequentemente, levou às conclusões a que se chegou em sede procedimental.”
b) Do equipamento de produção - O investimento relativo ao equipamento de produção não aceite pela AT como investimento relevante, respeita à aquisição de uma “Pá Carregadora, marca ..., modelo ... série ...”, em estado de novo. Esta aquisição, de acordo com a Requerente, visou aumentar a capacidade do estabelecimento já existente e, por isso, considerou-o como elegível para efeitos de RFAI.
Tendo em atenção o facto de a aquisição do equipamento em causa, conforme decorre da argumentação aduzida pela Requerente bem como observação dos elementos juntos autos, maxime, fotografias, “...é possível constatar que a Requerente já possuía um bem similar (Pá carregadora, marca ... modelo ... H) e apenas se limitou com a aquisição do activo aqui em causa, a substituir o primeiro, por um novo modelo,”
Pelo que, prossegue a Requerida;
“89. Considerar como aplicação relevante o investimento realizado na aquisição de equipamentos de substituição subverte o espírito da lei no que ao âmbito de aplicação dos RFAI’s toca, uma vez que a letra da lei somente faz caber na sua previsão os investimentos iniciais, considerando-se como tais, nos termos do n.º 2 do art.º 4.º do CFI: “(…) projetos de investimento inicial os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo global de produção de um estabelecimento existente.”
(...)
97. Conclui-se pois, que a Requerente não fez qualquer investimento inicial, já que a aquisição deste novo activo se refere a um bem que já existia como sua propriedade e que já prosseguia os seus intrínsecos objetivos de produção,
98. Resulta, portanto, cristalino que não se trata de uma adição de um bem, mas sim de uma substituição, que até poderá eventualmente traduzir-se numa melhor performance tecnológica e energética,
99. porém, a própria Requerente ao utilizar o termo "up grade" para se referir ao bem em causa, indicia que estamos somente perante uma melhoria de algo que já existia,
100. Não se afigurando como razoável dentro do contexto de criação de tal benefício, bem como dos objectivos que prossegue, que o mesmo abarque as situações de mera troca ou substituição de um bem por outro.
101. Razão pela qual, bem andaram os serviços, ao considerarem em sede procedimental que o então sujeito passivo não logrou por efectuar a prova que lhe competia para que pudesse ter direito ao benefício em análise, conforme era seu ónus, de acordo com as regras gerais de repartição do ónus da prova constantes do já mencionado art.º 74° da LGT.
c) Da criação de postos de trabalho - No que concerne à criação de postos de trabalho considera a Requerida não se mostrarem preenchidos os requisitos legais, sustentando a sua posição essencialmente nos seguintes termos:
“102. Antes de mais, cabe referir, reforçando e sublinhado à saciedade que para os sujeitos passivos poderem beneficiar dos benefícios previstos no RFAI, devem preencher cumulativamente as condições do n.º 4 do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, nomeadamente a alínea f), que refere que o investimento além de relevante deve proporcionar a criação de postos de trabalho e deve verificar-se a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento.
103. No caso subjudice, a Requerente limitou-se a juntar como prova no seu ppa, listas de trabalhadores (págs. 8 e 9 dos anexos juntos como doc.5 e o doc.12), sem ter estabelecido qualquer elo de ligação entre o investimento e o trabalhador cujo posto de trabalho alega ter sido criado.
(...)
106. Porém, compulsados os documentos juntos aos autos, conclui-se que ficou por demonstrar o requisito essencial da acessibilidade ao benefício do RFAI, qual seja o do nexo de causalidade entre a realização de investimentos relevantes e elegíveis para o benefício do RFAI em 2016 e a criação líquida de postos de trabalho.”
Assinala, ainda, a AT, que a documentação apresentada pela Requerida– fls 8 e 9 do Anexo 3 do RIT e doc,12 – se mostra “manifestamente insuficiente para fazer essa prova, contém, também contrariedades e incongruências, que necessariamente, abalam a sua credibilidade.”
Da análise dos referidos documentos, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, conclui a Requerida:
114. De tudo quanto vem ante exposto, maxime, das várias irregularidades detectadas e demonstradas nos pontos que antecedem, bem como, face à ausência de prova constante do processo, como por exemplo, contratos de trabalho e consequente identificação dos funcionários, não poderiam os serviços da AT concluir pela verificação da criação líquida de postos de trabalho.
115. Acresce ainda que, a Requerente, também não comprovou a manutenção dos alegados postos de trabalho até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objecto de investimento,
116. Não tendo igualmente afectuado prova no sentido de demonstrar o nexo de causalidade ou correlação entre o investimento e os referidos postos de trabalho que alega ter criado.
117. E mais uma vez, a Requerente somente alega e nada prova! 118. A fim de comprovar o direito ao benefício a que se arroga ter direito, teria a Requerente de ter reunido todos os documentos idóneos para fazer a prova que acima se descreve, ao invés de apresentar meros mapas elaborados internamente sem qualquer documento de suporte que os sustente e pior, repletos de inarredáveis incongruências.”
34.2. Posição da Requerente
A Requerente fundamenta a sua posição argumentando, no essencial:
a) Dos investimentos indicados como “terrenos de exploração”- Os terrenos em causa, tanto os situados em Albergaria dos Doze como em Miranda do Corvo - encontram-se abrangidos pela concessão mineira de que é titular a Requerente (cfr. Docs, 8,9,e 10). Sendo destinados à exploração de concessão mineira preenchem os requisitos de acesso aos benefício previsto no artigo 22.º do CFI, conforme expressamente prevê o n.º 2, alínea a), ponto i),deste artigo, Diversamente do entendimento expresso pela AT, a norma referida não contém qualquer especificação no que diz respeito à classificação dos terrenos.
b) Do equipamento de produção – A aquisição do equipamento em causa – pá carregadora..., ...– teve em vista aumentar a capacidade do estabelecimento existente facto que, no caso concreto, se verificou traduzido no aumento significativo do volume de negócios verificado no exercício de 2016 em comparação com o do exercício anterior (cfr. Doc. 5).
Com efeito, alega a Requerente, que “76. ... de acordo com a alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, o benefício fiscal previsto no artigo 23.º do CFI (aplicável ao RFAI), apenas é aplicável aos investimentos iniciais, considerando-se como tais os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
77. A aquisição do equipamento de produção em causa visou, precisamente, aumentar a capacidade de estabelecimento já existente, o que se verificou.
78. Sendo que ainda que o sujeito passivo detivesse uma pá carregadora marca ..., modelo..., versão anterior do novo modelo adquirido por aquele que aqui está em causa, isso não impede que o investimento no novo modelo seja considerada “inicial” pata efeitos do RFAI.
79. Na medida em que estando em causa um investimento que aumente a capacidade de um estabelecimento já existente, esse investimento é considerado elegível para efeitos do RFAI.
80. Foi isso que se verificou no caso concreto (sendo um dos indicadores o aumento de vendas, conforme demonstra a página 3 dos documentos anexos ao doc.5 já junto.”
(...)
92.º Por tudo o exposto, dúvidas inexistem de que a pá carregadora ... ao permitir aumentar a produtividade em 5%, (ii) eficiência energética superior em 20%, (iii) aumento da potência motora e (iv) uma nova função de nivelamento da pá, gera um aumento da capacidade existente da Requerente,”
c) Da criação de postos de trabalho- A Requerente alega ter preenchido, em 2016, “as condições cumulativas previstas na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI, designadamente, que o investimento relevante proporcionou a criação de postos de trabalho e a sua manutenção por um período mínimo de cinco anosa contar da data em que a vaga foi preenchida.”
Para comprovar o alegado, junta diversos quadros com a identificação dos trabalhadores da empresa, com vínculo de trabalho “sem termo” existentes no final dos meses de dezembro de 2015 e de dezembro de 2016 pelos quais se verifica que naquela data eram 27 os que se encontravam naquela situação e 29 os que, na mesma situação, se mantinham ao serviço da empresa em 31 de dezembro de 2016.
Os elementos constantes dos referidos quadros (cf. Doc. 12) são suportados por cópia dos Anexos A - Quadro do Pessoal - e B. Fluxo de entrada ou saída de trabalhadores (cf, Doc.13) e documentos comprovativos da comunicação da admissão de trabalhadores, e respetivo vínculo, emitido pela Segurança Social (Cf. Doc.14).
35. Do direito
Neste segmento do pedido de pronúncia arbitral está em causa aferir-se da eventual ocorrência de erro de facto e/ou de direito relativamente a correções à matéria coletável operadas pela AT e contestadas pela Requerente relativas à não aceitação do benefício fiscal relativo ao Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI).
36. O RFAI constitui um regime de Auxílio de Estado com finalidade regional 5 que se traduz em incentivo fiscal - sob a forma de dedução à coleta do IRC - ao investimento em ativos fixos tangíveis e ativos fixos intangíveis, adquiridos por sujeitos passivos de IRC que exerçam a sua atividade em determinados setores, designadamente no da indústria extrativa, em que se inclui a Requerente.[iii]Verificado este requisito, o acesso ao benefício é sujeito ao preenchimento cumulativo de um conjunto de condições enumerados no artigo 22.º do CFI, nos seguintes termos:
“Artigo 22.º
Âmbito de aplicação e definições
1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.
2 - Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:
a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;
ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;
iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;
iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
v) Equipamentos sociais;
vi) Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;
b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.
3 - No caso de sujeitos passivos de IRC que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, as aplicações relevantes a que se refere a alínea b) do número anterior não podem exceder 50 % das aplicações relevantes.
4 - Podem beneficiar dos incentivos fiscais previstos no presente capítulo os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:
a) Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
b) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis n.os 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;
d) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer contribuições, impostos ou quotizações ou tenham o pagamento dos seus débitos devidamente assegurado;
e) Não sejam consideradas empresas em dificuldade nos termos da comunicação da Comissão - Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 249, de 31 de julho de 2014;
f) Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).
5 - Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos.
7 - Nas regiões elegíveis para auxílios nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia constantes da tabela do artigo 43.º, no caso de empresas que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, apenas podem beneficiar do RFAI os investimentos que respeitem a uma nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento.”
37. Este regime, complementado pelas Portarias n.ºs 282/2014, de 30/09 e 295/2915, de 21/09, encontra-se subordinado, na sua aplicação, aos princípios e regras comunitárias relativas aos Auxilios de Estado, designadamente aos regimes de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16-06-2014 (Cf. CFI, art.1.º. n.º 29).[iv]
38.No presente processo limita-se o enquadramento no âmbito do regime de incentivos fiscais em causa ao investimento realizado pela Requerente no ano de 2016 na aquisição de terrenos de exploração e aquisição de equipamento (pá carregadora) e consequente criação de postos de trabalho.
39. Da aquisição de terrenos de exploração - Conforme prevê o n.º 2 do artigo 22.º do CFI consideram-se aplicações relevantes para efeitos de acesso do benefício fiscal do RFAI, os investimentos realizados na aquisição de ativos afetos â exploração da empresa neles se incluindo entre outros, os respeitantes a terrenos destinados “à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa.”
No presente caso, os terrenos identificados nos autos foram afetos à exploração da empresa sendo destinados à exploração de pedreiras, conforme é documentalmente comprovado por licença de exploração emitida pela Direção Regional do Centro do Ministério da Economia (cfr. Docs, 9 e 10).
De resto, tal circunstância não é minimamente posta em causa pela AT que fundamenta a sua decisão, nesta matéria, no facto de aos terrenos em causa não ter sido requerida a atualização da respetiva matriz predial com a alteração da classificação desses prédios de rústicos para urbanos, na categoria de “Outros” Com bem argumenta a Requerida, tal circunstância não constitui requisito do incentivo previsto no artigo 22.º do CFI.
Nestes termos, dando-se como provado o alegado pela Requerente, considera o Tribunal ser o pedido, neste segmento, inteiramente procedente.
40. Da aquisição de equipamento de produção (pá carregadora) – Nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, os benefícios fiscais do RFAI “ apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”
Resulta, pois, do citado preceito que um investimento de substituição, como é o caso em análise no presente processo, apenas releva, para efeitos do RFAI, se, designadamente, traduzir um aumento da capacidade de um estabelecimento já existente.
No presente caso, segundo alega a Requerente e demonstra com abundante literatura relativa ao bem adquirido, esta aquisição veio aumentar a produtividade em 5%, proporcionando, ainda, até 20% na poupança de combustível. Trata-se, pois, de uma substituição que visa aumentar a capacidade produtiva da empresa, pelo que a respetiva aquisição de enquadra no âmbito do artigo do artigo 22.º do CFI, preenchendo os requisitos de investimento inicial, de acordo com o preceituado na Portaria acima referida.
Pelo exposto, considera o Tribunal que a correção efetuada pela AT enferma de vício de violação da lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
40. Da criação de postos de trabalho sem termo – Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, alínea f), do CFI, o acesso ao benefício do RFAI é condicionado à efetivação de “investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento mos termos da alínea c).”
Como bem se observa em acórdão arbitral de 22.01.2021, proferido no processo 82/2020-T, a legislação em vigor +e bastante omissa no que respeita aos critérios que devem ser aplicados para a elaboração do respetivo cálculo. Desde logo, a questão que se coloca é a de saber se a condição se mostra preenchida com a contratação de trabalhadores causalmente associada ao investimento efetuado ou, na mesma condição, se a lei exige que se trate de criação líquida de postos de trabalho, isto é, medida em função do número global de trabalhadores existentes em 31 de dezembro do ano do investimento face à média dos 12 meses anteriores.
Sobre a condição da criação líquida de postos de trabalho destaca-se o acórdão arbitral de 20-11-2019, no processo 565/2018-T que enquadra esta questão nos seguintes termos: “
"Constituindo o RFAI uma medida excecional de fomento à empregabilidade e de incremento do rendimento per capita das regiões desfavorecidas, no quadro de direito europeu (...) assinalado, a aferição da criação e manutenção dos postos de trabalho reclamados pela alínea f) em análise deve ser efetiva, ao nível da entidade que aufere o benefício, pelo que se afigura que a comparação há de ser feita nos moldes preconizados pela Requerida (entenda-se AT), i.e., globalmente, pois só assim se pode afirmar que o investimento tenha sido indutor da criação de postos de trabalho, pressuposto que, segundo entendemos, deve ser incremental. Aliás, a condição que a lei impõe de criação incremental de postos de trabalho no ano do investimento (...) é medida em função do número global de trabalhadores da entidade, a 31 de dezembro, face à média dos 12 meses anteriores, não havendo razão para adotar critério distinto em relação à manutenção dos postos de trabalho nos anos subsequentes".[v]
Todavia, posição diversa, à que, sem reservas se adere, é a que se sustenta no acórdão arbitral de 9.03.2020, proferido no processo 307/2019-T, nos seguintes termos “ Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, considera-se que a referência feita na al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, deve ser entendida como reportando-se à criação de postos de trabalho causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.
Com efeito, o regime legal em questão foi criado pela Lei 10/2009, no âmbito da Iniciativa para o Investimento e o Emprego, designada por Programa IIE, que visou "promover o crescimento económico e o emprego, contribuindo para o reforço da modernização e da competitividade do País, das qualificações dos Portugueses, da independência e da eficiência energética, bem como para a sustentabilidade ambiental e promoção da coesão social".
No âmbito do programa IIE, incluíram-se medidas de «Apoio especial à actividade económica, exportações e pequenas e médias empresas (PME)» e de «Apoio ao emprego e reforço da protecção social» (cfr. als. d) e e) do n.º 1 do art.º 2.º da Lei 10/2009).
No quadro daquele programa, o RFAI 2009 foi criado como "um sistema específico de incentivos fiscais ao investimento", conforme resulta do art.º 1.º do mesmo Regime.
Foi, assim, o regime em questão, expressamente e no que para o caso interessa, formulado como um incentivo ao investimento (gerador de crescimento económico) tendo em vista o reforço da modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, explicando-se dessa forma a al. f) do n.º 4 do art.º 22.º CFI, que radica na al. f) do n.º 3 do art.º 2.º do RFAI 2009, criado pela referida Lei 10/2009.
Neste contexto, a criação de emprego previsto na al. f) do n.º 4 do art.º 22.º CFI, deverá ser entendido como um requisito sine qua non do direito ao benefício fiscal, já que é esse um dos propósitos assumidos pelo legislador e consta expressamente da letra da lei.
Não obstante não se poderá, nem deverá, julga-se, esquecer que o regime em questão visará, à frente daquele propósito, fomentar o investimento, para além da modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, sendo essencialmente um regime de apoio ao investimento, e não ao emprego.
Neste quadro, portanto, e na leitura e interpretação do regime em questão, dever-se-á sempre ter presente em primeira linha a ideia do incentivo ao investimento, sendo a criação de emprego uma condição, mas não o fundamento, do direito ao benefício fiscal.
Assim, e tendo presente igualmente as finalidades de modernização e da competitividade do País, e das qualificações dos Portugueses, dever-se-á concluir que o regime em questão vida promover o investimento modernizador, que aumente a competividade do país, e fomente a actualização, ou a aquisição de novas, competências pelos trabalhadores.
Posto isto, sustenta a AT que, na leitura da al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, se deverá lançar mão do enquadramento europeu em matéria de auxílios de Estado com finalidade regional no qual se inscreve o RFAI, constituído, nos termos do n.º 2 do art.º 1.º do CFI, pelo Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de Junho de 2014 , que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.°e 108.° do Tratado.
Sendo, evidentemente, um elemento relevante, crê-se que, antes de mais, se deve recorrer ao Regulamento (CE) N.º 800/2008 da Comissão, de 6 de Agosto de 2008, vigente na altura da implementação do RFAI 2009, que, como se viu, está na génese do RFAI integrado no CFI.
No preâmbulo daquele Regulamento, menciona-se expressamente que "(37) A fim de não favorecer o factor «capital» de um investimento em relação ao factor «trabalho», o presente regulamento deve prever a possibilidade de quantificar os auxílios ao investimento a favor das PME e os auxílios regionais, com base quer nos custos do investimento quer nos custos relativos aos postos de trabalho directamente criados por um projecto de investimento.".
Nessa sequência, o art.º 15.º daquele Regulamento, numa Secção e artigo epigrafados "Auxílios ao investimento e ao emprego a favor das PME", previa que:
"3. Os custos elegíveis são os seguintes:
a) Os custos de investimento em activos corpóreos e incorpóreos; ou
b) Os custos salariais estimados dos postos de trabalho criados directamente pelo projecto de investimento, calculados para um período de dois anos.".
Também no n.º 13 do mesmo Regulamento se dispõe que:
"8. Quando o auxílio é calculado com base nos custos salariais, os postos de trabalho devem ser criados directamente pelo projecto de investimento."
Será a esta luz, salvo melhor opinião, que se deverá ler o art.º 12.º do mesmo Regulamento ao dispor que:
"1. Para serem considerados custos elegíveis para efeitos do presente regulamento, os investimentos devem incluir:
a) Um investimento em activos corpóreos e/ou incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, alargamento de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para novos produtos adicionais ou mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente; ou
b) A aquisição de activos imobilizados directamente ligados a um estabelecimento que tenha sido encerrado ou teria sido encerrado sem essa aquisição, devendo o imobilizado ser adquirido por um investidor independente. Em caso de transmissão, através de sucessão, de uma pequena empresa para a família do proprietário ou proprietários originais, ou a favor de antigos trabalhadores, a condição segundo a qual os activos devem ser adquiridos por um investidor independente não será exigida.
A mera aquisição das acções de uma empresa não é considerada um investimento.
2. Para poderem ser considerados custos elegíveis para efeitos do presente regulamento, os activos incorpóreos devem preencher todas as seguintes condições:
a) Serem exclusivamente utilizados na empresa beneficiária do auxílio: no que se refere aos auxílios ao investimento com finalidade regional, serem exclusivamente utilizados no estabelecimento beneficiário do auxílio;
b) Serem considerados elementos do activo amortizáveis;
c) Serem adquiridos a um terceiro em condições de mercado, sem que o adquirente tenha a possibilidade de exercer controlo, na acepção do artigo 3. do Regulamento (CE) n.º 139/2004 do Conselho, sobre o vendedor, ou vice-versa;
d) No caso de auxílio ao investimento a favor das PME, devem ser incluídos nos activos da empresa durante pelo menos três anos: no caso de auxílios ao investimento com finalidade regional, devem ser incluídos nos activos da empresa e permanecer no estabelecimento beneficiário do auxílio por um período mínimo de cinco anos ou, no caso das PME, de três anos.
3. Para serem considerados custos elegíveis para efeitos do presente regulamento, os postos de trabalho directamente criados por um projecto de investimento devem preencher todas as seguintes condições:
a) Os postos de trabalho devem ser criados nos três anos subsequentes à realização do investimento;
b) O projecto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de assalariados do estabelecimento em causa relativamente à média dos 12 meses precedentes;
c) Os novos postos de trabalho devem ser mantidos durante um período mínimo de cinco anos, no caso de uma grande empresa, e de três anos, no caso de uma PME.".
Aqui chegados será possível, crê-se, verificar que o Regulamento em questão distingue efectivamente, entre dois tipos distintos de apoios às PME, que são os apoios quantificados:
a) com base nos custos do investimento; e
b) nos custos relativos aos postos de trabalho directamente criados por um projecto de investimento.
E é para este último tipo de apoios que é utilizado o conceito, e exigido o aumento líquido de postos de trabalho por serem, justamente, aqueles em que a utilização de tal conceito se justifica.
O Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, segue, no que para o caso importa, a mesma lógica, referindo no preâmbulo que "A fim de não favorecer o investimento em capital em relação ao investimento nos custos da mão de obra, deve prever-se a possibilidade de quantificar os auxílios regionais ao investimento com base quer nos custos do investimento quer nos custos salariais do emprego diretamente criado por um projeto de investimento.", e dispondo no art.º 17.º que:
"2. Os custos elegíveis devem ser um dos seguintes custos ou ambos:
a) Os custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos;
b) Os custos salariais estimados do emprego diretamente criado pelo projeto de investimento, calculados para um período de dois anos.".
No art.º 14.º também se dispõe que:
"4. Os custos elegíveis devem ser os seguintes:
a) Custos de investimento em ativos corpóreos e incorpóreos;
b) Custos salariais estimados decorrentes da criação de emprego, em virtude de um investimento inicial, calculados ao longo de um período de dois anos; ou
c) Uma combinação das alíneas a) e b), que não exceda o montante de a) ou b), consoante o que for mais elevado.".
É neste contexto que o n.º 9 do mesmo art.º 14.º, citado pela AT, dispõe que:
"9. Quando os custos elegíveis são calculados por referência aos custos salariais estimados, descritos no n.º 4, alínea b), devem ser preenchidas as seguintes condições:
a) O projeto de investimento deve conduzir a um aumento líquido do número de trabalhadores do estabelecimento em causa, em comparação com a média dos 12 meses anteriores, ou seja, qualquer perda de postos de trabalho deve ser deduzida do número aparente de postos de trabalho criados nesse período;
b) Cada posto de trabalho deve ser preenchido no prazo de três anos após a conclusão dos trabalhos; e
c) Cada posto de trabalho criado através do investimento deve ser mantido na zona em causa durante um período mínimo de cinco anos a contar da data em que a vaga foi preenchida, ou três anos no caso de PME.".
Ora, como se viu já, o RFAI foi sempre um apoio ao investimento, e é calculado com base nos custos de investimento em activos corpóreos e/ou incorpóreos, e não com base nos custos de investimento em postos de trabalho ou em custos salariais estimados.
Daí que não seja fundada, julga-se, a invocação do conceito de criação líquida de postos de trabalho do Regulamento em questão, para a interpretação a fazer da al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFAI.
De resto, terá sido por ter noção do quanto se expôs que o legislador não utilizou a expressão "criação líquida de emprego", quando a mesma era utilizada, por exemplo, no art.º 19.º do EBF vigente à data, esse sim, um benefício fiscal que tem por base os custos de investimento em postos de trabalho.
Considerando-se, então, que a al. f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, não se reporta à criação líquida de postos de trabalho, nos termos em que, por exemplo, o referido art.º 19.º do EBF e as Directivas sobre apoios de Estado o fazem, é ainda necessário densificar qual o sentido e alcance da expressão "criação de postos de trabalho", ali empregue, tem.
Tendo em conta que, pelos fundamentos expostos, não se deverá equiparar a expressão "criação de postos de trabalho" a "criação líquida de postos de trabalho", dever-se-á, em obediência ao princípio hermenêutico do legislador razoável, obter um resultado interpretativo que seja coerente com a teleologia do benefício fiscal em questão e que tenha um efectivo conteúdo prático.
Nessa perspectiva, a única interpretação que não se reconduza à "criação líquida de postos de trabalho", será, julga-se, a de que a "criação de postos de trabalho" pressuposta pelo benefício fiscal em questão se refere à criação de postos de trabalho, e a sua manutenção, causalmente associáveis ao investimento realizado, independentemente de, sob um ponto de vista global, a empresa ter verificado, ou não, um aumento do número de trabalhadores ao seu serviço.
Ou seja: o que está em causa é que o investimento realizado por determinada empresa será elegível para usufruir do benefício fiscal em questão se, e na medida em que, dele resulte, de forma causalmente adequada, a criação de, pelo menos, um posto de trabalho, e a sua manutenção.”
Revertendo à situação em causa no presente processo e aplicando a orientação antes referida à situação concreta que no mesmo se evidencia, constata-se terem sido criados, no exercício de 2016, 4 postos de trabalho (Cfr. Comunicações à Segurança Social, Doc. 14).
Incidindo o investimento efetuado na aquisição de terrenos de exploração e modernização do equipamento de produção, tudo se traduzindo em incremento da produtividade, traduzido num aumento do volume de vendas na ordem dos 48% em relação ao exercício anterior (cfr. Doc,5, pag.3), julga-se ser de concluir da existência de um nexo causal entre o investimento efetuado e a criação de postos de trabalho.
41.Pelo exposto, mostrando-se integralmente preenchidos, no presente caso, os requisitos de acesso ao incentivo fiscal previsto no artigo 22.º do CFI, a correção efetuada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, o que justifica a revogação da decisão de indeferimento proferida em sede de reclamação graciosa e a anulação consequente da liquidação na parte decorrente da referida correção.
Do direito a juros indemnizatórios
42. A par da anulação parcial do ato de liquidação, e consequente reembolso das importâncias indevidamente cobrada, o Requerente solicita ainda que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT.
43. Com efeito, nos termos da norma do n.º 1 do referido artigo, serão devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido." Para além dos meios referidos na norma que se transcreve, entendemos que, conforme decorre do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros pode ser reconhecido no processo arbitral e, assim, se conhece do pedido.
44. O direito a juros indemnizatórios a que alude a norma da LGT supra referida pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.
45. No caso dos autos, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, pelas razões que se apontaram anteriormente, a Requerente efetuou o pagamento de importância manifestamente indevida.
46. Julgando-se, assim, que o erro sobre os pressupostos de facto e de direito em que se fundamentam as correções efetuadas com o consequente reflexo na liquidação ora anulada é imputável à AT, reconhece-se à Requerente o direito aos juros indemnizatórios peticionados, contados, à taxa legal, sobre o montante indevidamente cobrado, desde a data do respetivo pagamento até ao momento do efetivo reembolso (cfr. LGT, art.43.º, n.º 1 e CPPT, art. 61.º).
V. Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o Tribunal decide julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, revogar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e determinar a anulação parcial do ato de liquidação impugnado, na parte correspondente à tributação resultante das correções à matéria coletável a que se refere o presente processo, no valor global de € 25 024,80, com o consequente reembolso da importância indevidamente cobrada, acrescida dos correspondente juros indemnizatórios contados nos termos legais.
Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em € 25 024,80, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º1, alíneas a) e b), do RJAT e artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 1 530,00, a cargo da Requerida.
Lisboa, 27 de junho de 2022,
O árbitro,
Álvaro Caneira
[i] Vd. Saldanha Sanches, “Os Limites do Planeamento Fiscal”, Coimbra Editora, 2006, pp. 215-216 e Rui Duarte Morais, “Apontamentos ao IRC”, Almedina, 2007, pp. 87 e sgts.
[ii] Neste sentido, entre muitos outros, STA, acs. de 29-3-2016, proc. 01236/05; de 21-09-2016, proc. 0591/13; de 15-11-2017, proc. 0372/16; e CAAD, ac. de 11-10-2019, proc. 329/2019-T.
[iii]Cfr. CFI, art, 2.º, n.º 2, al. a) e Port. 282/2014, de 30/09, art. 1.º, al. a).
[iv]O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), foi criado pela Lei n.º 10/2009, de 10 /03, sendo, posteriormente, inserido no Código Fiscal do Investimento (CFI), pela Lei n.º 82/2013, de 17/06, revisto pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31/10, constitui um regime de auxílio com finalidade regional aprovado nos termos do Regulamento (UE) 651/2014, da Comissão, de 16-06-2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno.
[v]É esta a orientação seguida em acórdão arbitral de 22-01-2021, no processo 82/2020-T.