Decisão Arbitral
Se
I. RELATÓRIO
1. A…, S.A., com o NIF …, adiante identificada por Requerente, solicitou em 25 de Março de 2014, a constituição de tribunal arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (adiante, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária ou RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 março, com vista:
a) À declaração de ilegalidade da liquidação de Imposto do Selo (“IS”), relativo ao prédio urbano …, da freguesia de …, concelho de Oeiras, com data de 21.03.2013, no montante € 12.395,39, notificado através do Ofício nº 2013 …, bem como do indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada contra este acto de liquidação
b) À anulação desta liquidação;
2. A Liquidação contestada tem por objecto a tributação, nos termos da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto do Selo (“TGIS”), da propriedade de “prédios com afectação habitacional” com um valor patrimonial tributário (“VPT”) igual ou superior a € 1.000.000, tendo por referência o ano de 2012.
3. Foram emitidas à Requerente, sendo a obrigação do seu pagamento, como vimos, fraccionada em três prestações.
4. No pedido, a Requerente optou por não designar árbitro.
5. Nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou o ora signatário Árbitro Singular, desse facto notificando as partes.
6. O tribunal encontra-se regularmente constituído desde o dia 29 de Maio de 2014, para apreciar e decidir sobre o objecto do processo, conforme despacho proferido pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD.
7. Os fundamentos, de facto e de direito, que sustentam o pedido de pronúncia arbitral da Requerente são, em súmula, os seguintes:
7.1 A Requerente é dona e legitima possuidora do prédio urbano …, da freguesia de …, concelho de Oeiras, e que tem um Valor Patrimonial Tributário (VPT) superior a um milhão de euros, mais concretamente um VPT de € 1.239.538,81.
7.2 O prédio aqui identificado é um “lote de terreno para construção”, correspondente ao lote nº … criado pelo alvará de loteamento nº …, emitido pela Câmara Municipal de … em 15 de Abril de 2014, sendo que, de acordo com este alvará era permitida a construção de um edifício para habitação, comércio e serviços.
7.3 Em 11 de Outubro de 2004 e em 10 de Março de 2005, o Ministério Publico requereu, junto do TAF de …, a declaração de nulidade da licença de loteamento titulada pelo referido alvará e dos licenciamentos de construção emitidos com base nesse alvará, ficando, por consequência, suspensos todos os efeitos da licença de loteamento, o que impossibilitou a realizaçao de quaisquer construção no prédio.
7.4 Em Dezembro de 2012 a Requerente foi notificada da liquidação de IS relativa a ano de 2012, respeitante ao referido lote e no valor de € 12.395,39.
7.5 Em Agosto de 2013 a Requerente apresentou reclamação graciosa relativa a tal acto de liquidação.
7.6 No prazo de 4 (quatro) meses não foi proferida decisão expressa sobre esta reclamação, formando-se, por isso, a presunção de indeferimento tácito.
7.7 A Requerente pagou as importâncias que lhe foram cobradas na sequência dos actos de liquidação acima referidos.
7.8 O critério da afectação habitacional só se deve aplicar aos prédios edificados, pois depende do tipo de utilização dos mesmos.
7.9 A Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro criou uma nova incidência de IS, sobre uma determinada categoria de prédios - urbanos afectos à habitação - cujo VPT seja igual ou superior a € 1.000.000,00, em moldes idênticos à liquidação e cobrança do IMI.
7.10 Os lotes de terreno não se encontram abrangidos na base de incidência desta verba da TGIS, uma vez que tal só se verificaria se o prédio sobre o qual incidiu a liquidação tivesse afectação habitacional.
7.11 Ora, um terreno para construção não tem, de forma óbvia, esta afectação, pelo simples e evidente facto que não se mostra habitável, uma vez que apenas não está apto para qualquer outra afectação que não seja a construção.
7.12 Só quando essa construção estiver realizada, é que existirá, eventualmente, um edifício que poderá, então, ficar afecto à habitação e que preenchendo os restantes pressupostos poderá ser tributado em sede IS, nos termos já referidos.
7.13. As regras do CIMI, para o qual remete o próprio CIS, confirmam o entendimento da Requerente.
7.14 De acordo com o CIMI, os prédios urbanos são classificados quanto à sua espécie por referência ao critério da sua utilização, o que permite concluir que os fins ou afectações apenas se encontrarão previstos para prédios que já sejam edifícios e não para outra espécie de prédios.
7.15 Não se encontra qualquer fundamento para crer que o legislador pretendesse desconsiderar, em sede de IS, a distinção entre prédios habitacionais e terrenos para construção que se estabelece no CIMI, tanto mais que o regime previsto para este novo imposto sobre o património é instituído à imagem e semelhança do IMI e exige especifica e explicitamente a “afectação habitacional"
7.16 Esta nova forma de tributação visa tributar uma realidade que se entendeu reveladora de uma maior riqueza e, consequentemente, uma maior capacidade contributiva do sujeito passivo, sendo, como tal, conhecido como o “imposto de luxo” ou “das casas de luxo”.
7.17. Tratando-se a Requerente de uma sociedade que se dedica à compra de terrenos para construção e revenda em fracções, independentemente do seu valor, os terrenos que adquire não são demonstrativos da sua riqueza ou capacidade contributiva, porque se trata de “matéria-prima” necessária à actividade da sociedade.
7.18 No terreno em questão não há nenhuma garantia que o mesmo se venha a destinar à construção de um edifício com as características que o alvará do loteamento titula e mesmo que se viesse a concretizar a afectação habitacional o que existirá, finda a construção, não será já um prédio urbano com valor patrimonial superior a €1.000.000,00, mas sim uma pluralidade de prédios urbanos com um VPT inferior, cada um deles, a este limite.
7.19 Para além de que no alvará se prevê ainda a ocupação do prédio também para comércio, serviços e estacionamentos.
7.20 O acto de liquidação e cobrança em questão, referindo-se ao ano de 2012 – o mesmo ano relativamente ao qual tal tributo foi exigido à Requerente e por esta pago – consubstancia uma situação de duplicação de colecta.
8. Na sua contestação, a AT vem considerar que os pedidos formulados pela Requerente devem ser julgados improcedentes e, consequentemente, os actos de liquidação mantidos, sustentando a sua posição com os seguintes argumentos:
8.1. O IS incide sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstas na tabela geral.
8.2. Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afectação habitacional em sede de IS, deve-se, face ao disposto no artigo 67º nº 2 do Código do IS, recorrer ao Código do IMI (CIMI) na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS
8.3 No CIMI, a noção de afectação de prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que no entender da AT se justifica e compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante.
8.4 Conforme resulta da expressão “… ao valor das edificações autorizadas” (cf. art. 45º nº 2 do CIMI), o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral à avaliação dos terrenos para construção, pelo que lhes é aplicável o coeficiente de afectação previsto no artigo 41º do CIMI (cf., para este efeito, o Acordão nº 04950/11 de 14.02.20129.
8.5 Assim, para efeitos de determinação do VPT dos terrenos para construção é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS não pode ser ignorada.
8.6 A verba 28 da TGIS ao remeter para a expressão “prédios com afectação habitacional”, apela a uma classificação que se sobrepõe às espécies previstas no artigo 6º nº 1 do CIMI.
8.7 Assim, a AT considera que o conceito de “prédios com afectação habitacional” para efeitos da verba 28 da TGIS, inclui quer os prédios edificados, quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma.
8.8 Considera a AT que o legislador ao não referir “prédios destinados a habitação”, optando pela noção “afectação habitacional”, quer integrar neste conceito outras realidades para além das que estão identificadas no artigo 6º alínea a) do CIMI.
8.9 A mera constituição de um direito potencial de construção faz aumentar o valor do imóvel em causa, dai a regra constante do artigo 45º do CIMI de mandar separar as duas partes do terreno, devendo considerar-se de um lado a parte do terreno onde vai ser implantado o edifício, e do outro a área livre.
8.10 Atendendo às regras previstas em diversas normas (artigo 77º do RJUE e Planos Directores Municipais), muito antes da efectiva edificação do prédio é possível determinar a afectação de um prédio para construção.
8.11 Entende ainda a AT que a previsão da verba 28.1 não consubstancia a violação de qualquer comando constitucional, pois a verba 28 da TGIS não põe, de forma alguma, em causa os princípios da igualdade e da proporcionalidade.
8.12 Na medida em que se trata de uma norma geral e abstracta que é aplicável, de forma indistinta a todos os casos em que se verifiquem os respectivos pressupostos, quer de facto, quer de direito.
8.13 A diferente valoração e tributação de um imóvel em propriedade total face a um outro constituído em propriedade horizontal, decorre dos efeitos jurídicos inerentes a estas duas figuras, pois um prédio em propriedade total, constitui, para todos os efeitos, uma única entidade, ao passo que um prédio em propriedade horizontal determina a independência e autonomia de cada uma das fracções.
8.14 Considera, ainda, a AT que a diferente aptidão de um imóvel (habitação/serviços/comércio) sustenta a diferença de tratamento, tendo sido opção do legislador, por razões económicas e políticas, afastar da incidência de IS os imóveis destinados a fins que não os habitacionais.
8.15 A violação dos referidos princípios constitucionais não se verifica porquanto esta medida é aplicável, de forma indistinta a todos os titulares de prédios com afectação habitacional que tenham um VPT superior a € 1.000.000,00.
9. Em 31 de Outubro de 2014, foi emitido pelo Tribunal um despacho a dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, por se ter considerado que essa reunião, atendendo à natureza das questões suscitadas, era desnecessária.
10. No mesmo despacho foram as partes notificadas para apresentarem as suas alegações, sendo esse direito conferido de forma sucessiva, em primeiro lugar à Requerente e de seguida à Requerida.
11. Ainda neste despacho, o signatário notificou as partes que a decisão seria proferida até ao dia 29 de Novembro de 2014.
11. No seguimento deste despacho, a Requerente apresentou as suas alegações mantendo os argumentos já deduzidos no seu requerimento inicial, reforçando apenas o facto de a sua posição ter merecido acolhimento nas mais diversas instâncias judiciais.
12. A Requerida não apresentou alegações.
12. Posteriormente, por despacho proferido neste dia 28 de Novembro, e considerando que o dia 29 de Novembro é um sábado, o prazo para prolação da decisão foi prorrogado até ao dia 2 de Dezembro de 2014.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MATÉRIA DE FACTO
1. A Requerente é dona e legitima possuidora do prédio urbano …, da freguesia de …, concelho de Oeiras e que tem o Valor Patrimonial Tributário (VPT) de € 1.239.538,81 (um milhão duzentos e trinta e nove mil quinhentos e trinta e oito euros e oitenta e um cêntimos).
2. O prédio sobre o qual incidiu a liquidação de IS está qualificado, na respectiva matriz, como terreno para construção.
3. A Liquidação contestada tem por objecto a tributação do prédio acima identificado nos termos da verba 28.1 da TGIS, por se tratar, no entendimento da AT, de um prédio urbano com afectação habitacional e com um VPT superior a € 1.000.000,00.
4. A Requerente procedeu ao pagamento do imposto liquidado no valor de € 12.395,39.
5. Em Agosto de 2013 a Requerente apresentou reclamação graciosa relativa a tal acto de liquidação.
6. Não tendo sido proferida decisão expressa sobre esta reclamação no prazo de 4 (quatro) meses, formou-se, por isso, a presunção de indeferimento tácito.
7. Em 25 de Março de 2014, a Requerente apresentou o pedido de constituição do Tribunal Arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (adiante, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária ou RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de Março, tendo em vista a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de IS e a anulação dessa liquidação.
8. O Tribunal Arbitral ficou constituído no dia 29 de Maio de 2014.
A decisão da matéria dos factos provados baseou-se nos documentos juntos ao processo e na não oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira quanto a factos invocados pela Requerente.
Não há factos não provados com relevo para a decisão da causa.
II.2 QUESTÕES A APRECIAR
A questão de fundo e principal a ser apreciada pelo Tribunal, tem que ver com o enquadramento legal do prédio identificado no número 1 do ponto II.1 supra, no âmbito de incidência da verba 28.1 da TGIS e a consequente legalidade da liquidação realizada pela AT e contestada pela Requerente.
A liquidação contestada pela Requerente foi emitida ao abrigo da norma de incidência constante da verba 28.1 da TGIS, com a redacção que tinha na época a que se reportam os factos.
Entende a Requerente que, sendo o prédio objecto de tributação qualificado e registado na matriz como terreno para construção, é manifestamente ilegal a liquidação, porque esse prédio não pode, de forma alguma, ser considerado como tendo “afectação habitacional”.
A questão fundamental é, pois, determinar se o prédio em questão pode ter, à luz das normas aplicáveis, esse tipo de “afectação”.
Conforme já foi referido, a Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro, veio introduzir diversas alterações ao Código do Imposto do Selo, sendo a principal o aditamento à TGIS de uma verba 28, a que deu a seguinte redacção:
“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%
8.2 - ………..”
A referida Lei veio depois, no seu artigo 6º, fixar algumas normas transitórias de aplicação, tendo nesta disposição, da mesma forma que na citada e transcrita verba 28, utilizado, de novo, o mesmo conceito de prédio com afectação habitacional.
Refira-se que este conceito não é utilizado pelo legislador em qualquer outra legislação de natureza tributária, designadamente no CIMI, sendo ainda de recordar e de salientar, que, em várias normas do CIS, é este Código indicado como o diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previsto na verba 28 da TGIS (confira-se, a este propósito, os artigos 2º nº 4, 3º nº 3 u), 5º u), 23º nº 7 e 46º e 67º, todos do CIS).
Efectivamente, no CIMI, mais concretamente nos seus artigos 2º a 6º, enumeram-se e definem-se as espécies de prédios nos seguintes termos:
Artigo 2º
Conceito de prédio
1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.
4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.
Artigo 3º
Prédios rústicos
1 - São prédios rústicos os terrenos situados fora de um aglomerado urbano que não sejam de classificar como terrenos para construção, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º, desde que:
a) Estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como são considerados para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS);
b) Não tendo a afectação indicada na alínea anterior, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.
2 - São também prédios rústicos os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano, desde que, por força de disposição legalmente aprovada, não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos ou só possam ter utilização geradora de rendimentos agrícolas e estejam a ter, de facto, esta afectação.
3. São ainda prédios rústicos:
a) Os edifícios e construções diretamente afetos à produção de rendimentos agropecuários, quando situados nos terrenos referidos nos números anteriores;
b) As águas e plantações nas situações a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º
4 - Para efeitos do presente Código, consideram-se aglomerados urbanos, além dos situados dentro de perímetros legalmente fixados, os núcleos com um mínimo de 10 fogos servidos por arruamentos de utilização pública, sendo o seu perímetro delimitado por pontos distanciados 50 m do eixo dos arruamentos, no sentido transversal, e 20 m da última edificação, no sentido dos arruamentos.
Artigo 4º
Prédios urbanos
Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
Artigo 5º
Prédios mistos
1 - Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.
2 - Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto.
Artigo 6º
Espécies de prédios urbanos
1 - Os prédios urbanos dividem-se em:
a) Habitacionais;
b) Comerciais, industriais ou para serviços;
c) Terrenos para construção;
d) Outros.
2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.
3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos.
4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.
Fácil é, pois, constatar da leitura destas normas que, como já se referiu supra, o conceito de “prédio com afectação habitacional” não é, em caso algum, utilizado pelo legislador no CIMI.
Assim, uma interpretação literal da norma constante da verba 28.1 da TGIS, leva a concluir que a intenção do legislador foi a de incluir no seu âmbito de aplicação os prédios urbanos que tenham uma afectação habitacional.
Partindo desta intenção, deve ser apurado quando é que um prédio está afectado a um fim habitacional, designadamente se é (i) quando lhe é fixado esse destino num qualquer acto de licenciamento administrativo ou num acto com semelhante natureza, ou (ii) se é apenas quando a atribuição desse destino é efectivamente concretizada.
Da redacção dada à verba 28.1, parece claro que a intenção do legislador foi a de considerar necessária uma afectação efectiva e não apenas quando os prédios, terrenos, edifícios ou construções foram para tal licenciados - ou, na falta dessa licença, aqueles que devam ter como destino normal esse fim.
Se o legislador, na verba 28.1 se bastasse com estes factos teria utilizado a expressão “prédios habitacionais” constante do artigo 6º do CIMI e não a expressão “prédios com afectação habitacional”.
Daqui resulta, pois, que prédio com “afectação habitacional” não poderá ser apenas um prédio licenciado para habitação ou destinado a esse fim, tendo que ser “algo mais que isso”, isto é, terá que ser um prédio já edificado, com uma efectiva afectação a esse fim habitacional.
Ou seja, tem que ser algo de efectivamente edificado.
Ora, parece-nos evidente que os prédios classificados como terrenos para construção, não têm ainda, enquanto tal, qualquer tipo de edificação com um fim habitacional, não preenchendo, dessa forma, qualquer condição que os possam levar a ser considerados como prédios habitacionais, logo, por maioria de razão, “prédios com afectação habitacional”.
Na medida em que o entendimento correcto é o de que a norma da verba 28.1 só estará preenchida, quando a afectação habitacional estiver efectivamente concretizada.
Desta forma, não nos parece possível acompanhar a tese defendida pela Requerida (AT), de que basta ter utilizado, no processo de avaliação dos prédios, o coeficiente de afectação “habitação” para se estar perante um prédio com afectação habitacional,
Sendo, dessa forma, de acolher, a tese suportada pela Requerente de que não pode ser atribuída afectação habitacional a um terreno para construção.
Em conclusão, considera este Tribunal que a liquidação contestada está ferida de ilegalidade, na medida em que incide sobre um prédio que é um terreno para construção, realidade esta que, pelas razões que foram sendo expostas, não pode estar incluída no conceito de “prédios com afectação habitacional” consagrado na verba 28.1 da TGIS.
III. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se:
Julgar procedente o pedido de anulação da liquidação contestada, por vício de violação de lei.
IV. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto no artigo 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária atribui-se ao processo o valor de € 12.395,39 (doze mil trezentos e noventa e cinco euros e trinta e novecêntimos)
V. CUSTAS
De acordo com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o o montante das custas é fixado em € 918,00 (novecentos e dezoito euros).
Notifique-se.
Lisboa, 2 de Dezembro de 2014
O Juiz Singular
(João Marques Pinto)