SUMÁRIO:
I – O tribunal arbitral é competente para apreciar a legalidade dos atos de liquidação de IMI e de Adicional ao IMI, quando a impugnação tenha como fundamento a quantificação errónea do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção em causa;
II – A fixação do valor patrimonial tributário de terrenos para construção com base na aplicação de coeficientes de afetação e localização, bem como na aplicação da majoração de 25% sobre o valor médio de construção por metro quadrado, violava o disposto no artigo 45.º do CIMI até à entrada em vigor da Lei nº 75-B/2020, de 31 de Dezembro.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Fernando Araújo (presidente), Francisco Melo e Sérgio Santos Pereira, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 10 de novembro de 2021, acordam no seguinte:
I. Relatório
A...– FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO, doravante designado por “Requerente”, titular do número de identificação fiscal ..., gerido e nesta sede representado pela B...– Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Coletivo, S.A., com sede na ..., ..., ..., ...-..., Lisboa, titular do número de identificação fiscal..., veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
O Requerente pretende a declaração de ilegalidade, e consequente anulação parcial, dos atos de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), em relação ao período de tributação de 2019, e de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”), em relação ao período de tributação de 2020, bem como do ato decisório de segundo grau que indeferiu tacitamente a Reclamação Graciosa deduzida contra estes atos tributários. Neste âmbito, peticiona ainda o reembolso dos montantes pagos em excesso, no total de € 104.092,33, acrescidos de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT.
É requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante também identificada por “Requerida” ou “AT”.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 01 de setembro de 2021 e, de seguida, notificado à AT.
Nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 5.º, na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação vigente, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo.
Em 21 de outubro de 2021, as Partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 10 de novembro de 2021.
Em 14 de dezembro de 2021, a Requerida apresentou Resposta, na qual se defendeu por exceção e por impugnação, sustentando a improcedência do pedido de pronúncia arbitral por não provado.
O Requerente foi notificado para exercer o contraditório sobre a matéria de exceção constante da Resposta, o que fez em 12 de janeiro de 2022.
Em 13 de janeiro de 2022, o Tribunal Arbitral, em aplicação dos princípios da autonomia na condução do processo, e da celeridade, simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT), dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, concedendo um prazo de 10 dias, sucessivo, para apresentação de alegações finais.
Apenas o Requerente veio apresentar alegações finais, o que fez em 27 de janeiro de 2022.
Em 31 de janeiro de 2022, o Requerente solicitou a junção aos autos da decisão da AT de anulação administrativa oficiosa do ato de fixação de valores patrimoniais, relativa aos 225 terrenos para construção melhor identificados no presente processo.
Em 14 de março de 2022, o Tribunal Arbitral notificou a Requerida para, querendo, se pronunciar, no prazo de dez dias sobre a decisão junta pelo Requerente aos autos. Mais concedeu o Tribunal, nos termos do art. 16º do RJAT, a ambas as partes o mesmo prazo de dez dias, simultâneo, para se pronunciarem, querendo, sobre as questões que subsistem e terão que ser objecto da decisão arbitral, mormente a relativa ao pedido de juros indemnizatórios.
Em 29 de março de 2022, o Requerente pronunciou-se, mantendo o pedido formulado, quer quanto ao reembolso do montante de IMI e AIMI que considera ter pago a mais, quer quanto aos juros indemnizatórios.
Também na mesma data, a Requerida pronunciou-se, considerando dever ser declarada a extinção do processo arbitral por inutilidade superveniente da lide.
Por despacho de 6 de maio de 2022, foi prorrogado, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, o prazo de prolação da decisão arbitral por dois meses, até 10 de Julho de 2022.
II. Questões a Apreciar
Importa começar por decidir as questões prévias suscitadas pela Requerida, em relação:
1- {C}{C}{C}À incompetência material do Tribunal Arbitral para se pronunciar sobre o pedido de pronúncia arbitral;
2- {C}{C}{C}À inutilidade superveniente da lide.
Sobre o mérito, o problema colocado a este Tribunal Arbitral respeita ao seguinte vício alegado pelo Requerente:
Erro sobre os pressupostos de direito, em particular, a aplicação das taxas legalmente previstas sobre uma base tributável (o VPT dos imóveis a 31 de dezembro de 2019 e 1 de janeiro de 2020) apurada em clara violação dos normativos aplicáveis.
* * *
Tendo sido suscitadas diversas exceções pela Requerida, cujo conhecimento reveste caráter prioritário, as mesmas são de seguida apreciadas, logo após a fixação da matéria de facto.
III. Fundamentação de Facto
1. {C}{C}{C}Factos Provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
A. {C}{C}{C}O Requerente é um organismo especial de investimento imobiliário fechado de subscrição particular, constituído segundo o direito português, que iniciou a sua atividade em 26 de setembro de 2008 e cuja política de investimentos se dirige, essencialmente, à aquisição, para ulterior venda ou arrendamento, de prédios rústicos e prédios urbanos destinados a habitação, comércio, indústria ou serviços;
B. A 31 de dezembro de 2019 e 1 de janeiro de 2020, o património do Requerente era constituído, entre outros, por 225 terrenos para construção inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho do Seixal, distrito de Setúbal no ano de 2019 – cf. Documento 3 junto pelo Requerente.
C. O Requerente procedeu, nos prazos previstos para o efeito, ao pagamento do IMI incidente sobre a totalidade do seu património existente à data de 31 de dezembro de 2019, o qual ascendeu a € 117.739,98 e no qual se inclui o IMI imputável aos referidos 225 terrenos para construção (o qual ascendeu a € 98.654,35) – cf. Documento 4 junto pelo Requerente;
D. O Requerente procedeu ao pagamento atempado do AIMI incidente sobre os terrenos para construção por si detidos à data de 1 de janeiro de 2020 (num total de € 123.898,00), incluindo o AIMI relativo aos mencionados 225 terrenos para construção (o qual ascendeu a € 103.846,68) – cf. Documento 5 junto pelo Requerente;
E. Em 27 de janeiro de 2021, o Requerente deduziu reclamação graciosa junto da Unidade de Grandes Contribuintes, requerendo a anulação parcial dos atos de liquidação de IMI de 2019 e de AIMI de 2020, nos termos do artigo 129.º do Código do IMI – cf. Documento 1 junto pelo Requerente.
F. A reclamação graciosa apresentada pelo Requerente não obteve resposta da AT a 27 de maio de 2021.
G. Por despacho proferido em 14 de janeiro de 2022, pela Subdiretora-Geral da Área dos Impostos sobre Património, exarado na Informação n.º 8/2022, da Direção de Serviços de Avaliações, os atos de fixação do VPT dos 225 terrenos para construção foram objeto de anulação administrativa oficiosa com efeitos retroativos, com fundamento em invalidade. – cf. Documento junto pelo Requerente.
2. {C}{C}{C}Factos Não Provados
Não há outros factos relevantes para a apreciação da causa que não se tenham provado.
3. {C}{C}{C}Motivação da Decisão da Matéria de Facto
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se, essencialmente, na análise crítica da prova documental junta aos autos, tendo em conta as posições assumidas pelas Partes em relação aos factos essenciais.
IV. Saneamento – Questões Prévias
1. {C}{C}{C}Da Incompetência do Tribunal Arbitral
Segundo a Requerida, o que está em causa é, apenas e só, a validade dos atos de fixação da matéria tributável e não a do ato de liquidação, sendo o tribunal arbitral incompetente para apreciar vícios de atos de fixação do valor patrimonial, atos esses que são destacáveis e autonomamente impugnáveis, e se encontram consolidados na ordem jurídica.
Refere ainda a Requerida que, não tendo o Requerente colocado em causa o valor patrimonial obtido pela 1.ª avaliação, o que poderia ter feito requerendo uma 2.ª avaliação, mas não fez, o mesmo valor fixou-se, não sendo possível conhecer, na posterior liquidação, de eventuais erros ou vícios cometidos nessa primeira (e única) avaliação.
Esta matéria da competência do Tribunal Arbitral numa situação como a dos presentes autos já foi ampla e adequadamente analisada e decidida na jurisprudência arbitral.
Assim, na Decisão Arbitral proferida no âmbito do Processo Arbitral n.º 760/2020-T é expresso o entendimento de que uma das concretizações do princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva é o princípio pro actione, consagrado no artigo 7.º do CPTA, afirmando-se que este princípio «aponta para a interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal, evitando situações de denegação de justiça por excessivo formalismo: as regras processuais são um instrumento para a realização da justiça e não (devem ser) um obstáculo a que ela aconteça».
Na mesma Decisão Arbitral é manifestado o entendimento de que «a previsão da impugnabilidade autónoma de atos destacáveis visa, em geral, conferir maiores garantias aos particulares e não reduzir o âmbito das garantias que a lei, em geral, prevê», concluindo-se que «[a]ssim, tal previsão legal não deve ser entendida – salvo existindo razões substanciais que a tal se oponham, o que não acontece no presente caso –como precludindo a possibilidade de impugnação dos vícios do ato instrumental (fixação do VPT) em processo de impugnação do ato conclusivo do procedimento (liquidação)».
No mesmo sentido decidira já o TCAS, em Acórdão de 31-10-2019, proferido no âmbito do Processo n.º 2765/12.BELRS. Neste Acórdão pode ler-se o seguinte
«A errada fixação do VPT (…) pode ser arguida através do pedido de revisão oficiosa das liquidações, nos termos conjugados dos artigos 78.º da LGT e 115.º do CIMI, ainda que o contribuinte não tenha reagido atempadamente contra essa fixação. (…) o legislador tributário, ciente da natureza agressiva das leis fiscais, que afectam coercivamente o património dos contribuintes, criou válvulas de escape para as situações de ilegalidade, permitindo que a própria Administração reveja as suas decisões, a fim de corrigir as ilegalidades que porventura tenha cometido.»
Assim, ao contrário do que conclui a Requerida, e na esteira das decisões ora reproduzidas, considera este Tribunal Arbitral que é da sua competência a apreciação da legalidade dos atos de liquidação de IMI e de AIMI, quando a impugnação tenha como fundamento o erróneo apuramento do VPT dos terrenos de construção que lhes deram origem.
Pelo que não procede a exceção invocada pela Requerida de incompetência material do Tribunal Arbitral.
2. {C}{C}{C}Da Extinção da Instância por Inutilidade Superveniente da Lide
Em 24 de janeiro de 2022, foi o Requerente notificado da decisão da AT de anulação administrativa oficiosa do ato de fixação de valores patrimoniais, relativa aos 225 terrenos para construção objeto do pedido de pronúncia arbitral.
Considera a Requerida que a pretensão do Requerente se encontra satisfeita, em virtude da anulação das avaliações indicadas, e objeto dos presentes autos; e, não vislumbrando a utilidade ou interesse na manutenção da pronúncia arbitral nessa parte, requer a extinção do processo arbitral por inutilidade superveniente da lide.
A inutilidade superveniente da lide é, nos termos do disposto na alínea e) do artigo 277.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 29.º do RJAT, uma causa de extinção da instância, a qual ocorre quando, «por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio.» - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 0875/14, de 30.07.2014.
Ora, sucede que nos presentes autos, não obstante a anulação das avaliações colocadas em crise pelo Requerente, as liquidações por este contestadas permanecem em vigor na ordem jurídica, porquanto não foram, à data, revogadas e substituídas por outras, mormente para efeitos de devolução do imposto pago em excesso, e dos correspondentes juros.
Deste modo, teremos de concluir que a pretensão do Requerente, a qual, recorde-se, se consubstancia na anulação parcial dos atos tributários de liquidação de IMI, referente ao ano de 2019, e de AIMI, referente ao ano de 2020, com consequente restituição do imposto pago em excesso, não está, de todo, satisfeita, pelo que subsiste a utilidade ou interesse na manutenção da pronúncia arbitral, ou seja, por outras palavras, não se verifica a inutilidade superveniente da lide.
Também não procede, pois, esta exceção.
3. {C}{C}{C}Outros Pressupostos Processuais
O Tribunal foi regularmente constituído e as partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e artigo 10.º, n.º 2 do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
Nos termos dos artigos 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e 102.º, nº1, alínea d), do CPPT, será a partir de 27 de maio de 2021, data da formação da presunção do indeferimento tácito, que se conta o prazo de 90 dias para a apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral, o qual terminaria no dia 25 de agosto de 2021, sendo que, por força das disposições conjugadas dos art.ºs 20.º n.º 1 do CPPT, 279.º do Código Civil e art.ºs 17.ºA e 29.º do RJAT, o prazo transfere-se para o dia 1 de setembro, pelo que se deve considerar cumprido, visto o pedido ter sido submetido e aceite em 1 de setembro de 2021: pelo que a ação é tempestiva.
V. Fundamentação de Mérito
1. {C}{C}{C}Da Avaliação dos Terrenos para Construção
Alega o Requerente que a determinação do valor patrimonial dos 225 terrenos para construção é ilegal, porquanto tem em consideração os coeficientes de localização (Cl) e de afetação (Ca) como fatores multiplicadores do VPT dos terrenos para construção, bem como a majoração de 25% prevista no n.º 1 do artigo 39.º do Código do IMI sobre o valor médio de construção por metro quadrado (€ 492,00), critérios que não têm sustentação na redação do artigo 45.º do Código do IMI, normativo que, segundo defende o Requerente, estabelece o método específico de determinação do VPT dos terrenos para construção.
Conforme resulta da factualidade provada, a Requerida veio, por despacho proferido em 14 de janeiro de 2022, anular, com efeitos retroativos, os atos de fixação do VPT dos 225 terrenos para construção com fundamento em invalidade.
Compulsado o referido despacho, decorre a seguinte análise da Requerida
«Ora, verifica-se que na avaliação dos prédios urbanos (terrenos para construção) identificados no anexo mapa_prédios_CAAD_515-2021-T, foram considerados os coeficientes de localização e de afetação na determinação do valor patrimonial tributário, concluindo-se assim, face ao entendimento jurisprudencial, pela sua ilegalidade.
Por conseguinte, estamos perante um erro de avaliação por errónea consideração dos coeficientes de localização e de afetação na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção em análise.
O erro de avaliação traduz-se num vício de violação de lei, o que acarreta a ilegalidade dos atos de fixação do valor patrimonial tributário em causa, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA).»
Não se antevendo razão válida para dissentir do assim apreciado e decidido pela Requerida, de resto, em linha com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (por todos, o entendimento sufragado pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, em recurso por oposição de julgados, através do acórdão de 21 de setembro de 2016, no Processo n.º 01083/13), conclui-se que, relativamente à avaliação de terrenos para construção, a utilização de critérios não previstos na norma específica do artigo 45.º do Código do IMI, constitui erro na aplicação do direito, suscetível de alterar a base tributável e o cálculo do imposto.
Nestes termos, a fixação do valor patrimonial tributário de terreno para construção com base na aplicação de coeficientes de afetação e de localização, bem como na aplicação da majoração de 25% sobre o valor médio de construção por metro quadrado, mostra-se ser ilegal por violação do artigo 45.º do Código do IMI, na redação em vigor à data dos factos, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei nº 75-B/2020, de 31 de Dezembro.
Pelo que se julga procedente o pedido de anulação parcial das liquidações de IMI do ano de 2019 e de AIMI do ano de 2020, nos termos peticionados.
2. {C}{C}{C}Da restituição do indevido, acrescido de juros indemnizatórios
Determina a alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º do RJAT que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos precisos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que incluiu “o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário.”.
De igual modo, o artigo 100.º, da LGT, aplicável ao processo arbitral tributário por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º, do RJAT, estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”.
O restabelecimento da situação que existiria se os atos tributários objeto do pedido de pronúncia arbitral não enfermassem de erro na determinação dos VPT subjacentes, obriga, por um lado, à restituição do imposto indevidamente pago pelo Requerente, no valor de € 104.092,33; e, por outro, obriga ao pagamento de juros indemnizatórios.
O regime dos juros indemnizatórios consta do artigo 43.º, da LGT, cujo n.º 1 estabelece que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”.
Pelo exposto, tendo ficado demonstrada a errada aplicação da norma que justifica a anulação parcial das liquidações impugnadas, reconhece-se o direito do Requerente a juros indemnizatórios à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, contados com base no imposto indevidamente pago, no montante de € 104.092,33, desde a data em que o Requerente efetuou o pagamento até à data do processamento da respetiva nota de crédito, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 61.º do CPPT.
VI. Decisão
À face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em:
a) {C}{C}{C}Julgar improcedentes as exceções de incompetência material do Tribunal Arbitral e de inutilidade superveniente da lide;
b) {C}{C}{C}Declarar a ilegalidade da liquidação de IMI do ano de 2019, e da liquidação de AIMI do ano de 2020, bem como da decisão de indeferimento tácito da reclamação graciosa que as teve por objeto;
c) {C}{C}{C}Determinar a anulação parcial das liquidações de IMI do ano de 2019 e de AIMI do ano de 2020, no valor de € 104.092,33;
d) {C}{C}{C}Condenar a Requerida na restituição do montante do imposto indevidamente pago e ora anulado, acrescido de juros indemnizatórios, a calcular nos termos do artigo 43.º da LGT;
e) {C}{C}{C}Condenar a Requerida no pagamento das custas.
VII. Valor do Processo
VIII. Custas
Custas no montante de € 3.060,00, a suportar pela Requerida, em razão do decaimento.
Notifique-se.
Lisboa, 14 de junho de 2022
Os árbitros,
Fernando Araújo
Francisco Melo, Relator
Sérgio Santos Pereira