Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 409/2021-T
Data da decisão: 2022-07-09  IMI  
Valor do pedido: € 4.298,13
Tema: IMI – Impugnação do valor patrimonial tributário.
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SUMÁRIO:                                           

- Pode haver lugar á discussão da legalidade os atos de avaliação de valores patrimoniais previstos no CIMI, na impugnação dos atos de liquidação neles baseados.

- A avaliação dos terrenos para construção deve ser efetuada de acordo com o previsto 45º do CIMI, no qual não está prevista a aplicação dos coeficientes de localização, de qualidade e conforto nem de afetação, tal como previstos no art. 38º do CIMI.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o subscritor e notificou as partes dessa designação. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012 de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 10-09-2021, seguindo-se os pertinentes trâmites legais.

 

1- No dia 05-07-2021, A...‐ Sociedade Gestora de Organismos de Investimento Colectivo, S.A., Nipc ... e com sede na ..., ..., ..., ...‐... ..., neste acto em representação do Fundo de Investimento Imobiliário Fechado –B..., com o número de identificação fiscal ..., apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira… 

 

2- …Pretendendo pronuncia sobre a legalidade do indeferimento da Reclamação Graciosa, tacitamente presumido, apresentada junto da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”), com vista à anulação dos actos tributários de liquidação de IMI, com referência ao ano de 2019, no montante global de €4.298,13. 

 

3- Como fundamento para o pedido formulado, invoca a Requerente a existência de erros de direito no ato de fixação do valor patrimonial tributário

É alegado, concretamente, como fundamento do pedido, a errónea quantificação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, na medida em que na determinação do mesmo foram considerados os coeficientes de locação, de afetação e da qualidade e conforto referidos na fórmula do artigo 38.º do CIMI mas não contemplados na regra específica aplicável à avaliação de terrenos para construção consagrada no artigo 45.º do mesmo Código na redação vigente à data dos respetivos factos tributários.

 3.1- Acolhendo a jurisprudência constante e reiterada dos tribunais superiores, a AT, em 2020, veio a retificar os valores patrimoniais tributários dos terrenos para construção aplicando no respetivo cálculo a regra específica do artigo 45.º do CIMI não procedendo, contudo, a retificação das liquidações entretanto operadas com base nos valores erroneamente determinados.

4. A posição da Requerida ATA, é de não procedência do alegado, sem base contestatória especifica, no que ao mérito diz respeito, apontando argumentos, sobretudo para ….

 a inimpugnabilidade do ato de liquidação com base em vícios de fixação do valor patrimonial tributário, porque os atos de fixação dos valores patrimoniais devem ser impugnados autonomamente, não podendo os seus vícios ser apreciados na impugnação dos atos de liquidação subsequentes (art. 86º, n.º2 da LGT e 134º do CPPT).

 

5- O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

6- As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

7- O processo não enferma de nulidades.

8- Entende-se que o acto ficcionado quando ocorre indeferimento tácito de pedido de Reclamação Graciosa é um acto que comporta a apreciação da legalidade do acto de liquidação cuja revisão foi pedida, dando resposta negativa aos fundamentos invocados, pelo que o meio contencioso adequado para o impugnar é o processo de impugnação judicial e o processo arbitral.

 

II- MATÉRIA DE FACTO

Factos Provados:

 

1- O Fundo é um fundo especial de investimento imobiliário fechado, constituído por subscrição particular, gerido e administrado pela sociedade gestora identificada como Requerente. 

2- No âmbito da sua actividade, o Fundo é proprietário de diversos prédios, incluindo terrenos para construção, nomeadamente os inscritos na matriz predial urbana: - Artigo ... da freguesia de ...; - Artigo ... da freguesia de ...; - Artigo ... da freguesia de ...; -Artigo ... da união das freguesias de ... e ... . 

3- A Requerente foi notificada dos documentos nºs documentos n.º 2019 ..., 2019 ... e 2019..., no valor total de no montante global de € 117.755,95. que respeitam à liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), sobre esses imóveis, referente ao ano de 2019. 

4- O Fundo procedeu ao pagamento, integral e atempado, das respectivas liquidações de IMI supra identificadas. 

5- A AT corrigiu o cálculo e a fixação dos valores patrimoniais tributários dos terrenos para construção, deixando de aplicar fórmula adoptada anteriormente pela Autoridade Tributária e Aduaneira que considerava a aplicação de coeficientes de (i) localização, (ii) de afectação e / ou (iii) de qualidade e conforto. 

6- Relativamente aos terrenos para construção detidos pelo Fundo gerido pela Requerente e que foram igualmente objecto da reavaliação acima mencionada (e com a consequente redução dos valores patrimoniais tributários), a AT não rectificou as respectivas colectas de IMI.

7- A rectificação por força da reavaliação importaria numa diferença € 4.298,13.

8- A Requerente apresentou, no dia 26 de Fevereiro de 2021, Reclamação Graciosa dos referidos actos tributários - a qual não tinha até á entrada do Pedido Arbitral - formal decisão expressa notificada ao Requerente. 

9- Em 02-07-2021 deu entrada o presente pedido de pronúncia Arbitral. 

 

Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

III- DO DIREITO

 

A questão controvertida na presente ação arbitral centra-se na determinação dos valores patrimoniais tributários (VPT) dos prédios sobre que incidiu o imposto.

Antes dessa questão, cumpre, não obstante, apreciar, nos termos requeridos a alegada inimpugnabilidade do ato de liquidação com base em vícios de fixação do valor patrimonial tributário porque os atos de fixação dos valores patrimoniais devem ser impugnados autonomamente, não podendo os seus vícios ser apreciados na impugnação dos atos de liquidação subsequentes (art. 86º, n.º2 da LGT e 134º do CPPT).

 Vejamos

1- A questão já foi algumas vezes tratada neste CAAD, não sendo, contudo, unânime, o entendimento adoptado e sentido das decisões proferidas.

 

2- No sentido da impossibilidade de impugnação directa do acto de liquidação, sem esgotar o meio tutelar previsto no procedimento de avaliação e subsequente ato destacável, vejam-se as decisões/acórdãos constantes dos processos 540/2020-T, 756/2021-T, ou 614/2021-T.

 

3- Com todo o respeito, que é muito, tendemos, contudo, a concordar com o entendimento preconizado no voto de vencido proferido na Decisão constante no último processo dos processos mencionados, que, por sua vez, faz profunda alusão ao processo 760/2012-T, de que, com a devida vénia, transcrevemos partes:

[No mesmo sentido os processos 759/2020-T e 634/2021-T, deste CAAD]

 “A Requerida alega, em suma (nº 11 e ss da sua resposta): os atos de fixação do VPT não são atos de liquidação, são atos autónomos e individualizados com eficácia jurídica própria e diretamente sindicáveis; o princípio da impugnação unitária é expressamente afastado neste caso pelo artigo 86.º da Lei Geral Tributária; ao estabelecer a sindicância direta destes atos, qualificando-os como atos destacáveis com autonomia e lesividade própria, o legislador teve em vista alcançar a desejável estabilização e consolidação da matéria tributável em momento anterior ao da efetivação da liquidação; sendo assim, não é nem legal nem admissível a apreciação da correção do VPT em impugnação do ato de liquidação, uma vez que nesta sede há-de ter-se como pressuposto o valor fixado na avaliação.

A Requerente, no seu requerimento inicial, havia já abordado esta questão, adiantado conclusão contrária, louvando-se, no essencial, no acórdão do TCAS que pôs termo ao processo n.º 2765/12, de 31-10-2019.

Começaremos por notar que, no presente caso, o iter procedimental / processual é diferente daquele sobre que versou tal acórdão: aqui, estamos perante uma impugnação direta da liquidação; no caso apreciado pelo TCAS tinha havido um pedido de revisão oficiosa, de cujo indeferimento o sujeito passivo reagiu pela via da impugnação, o que foi admitido, não obstante a causa de pedir ser a errónea fixação do VPT em causa.

Pelo a que a argumentação do TCAS não pode, no nosso entender, ser, sem mais, transposta para o presente litígio.

Haverá que começar pelo enquadramento constitucional da questão. Acompanhando, neste ponto, o referido acórdão do TCAS, restringir ou eliminar essa impugnabilidade constituiria, outrossim, uma agressão manifesta ao princípio da tutela jurisdicional efetiva, plasmado nessa norma constitucional.

Uma das concretizações do referido princípio constitucional é o princípio pro actione.

Como escrevemos noutro lugar, a rigidez das formas processuais, decorrente do princípio da tipicidade, resulta minimizada pela concorrência de outro princípio, o do favorecimento do processo (pro actione).

Tal princípio aponta para a interpretação e aplicação das normas processuais no sentido de favorecer o acesso ao tribunal, evitando situações de denegação de justiça por excessivo formalismo: as regras processuais são um instrumento para a realização da justiça e não (devem ser) um obstáculo a que ela aconteça.

Este princípio, que encontra consagração expressa no art.º 7º do CPTA, tem sido, pacificamente, aplicado pela nossa jurisprudência no domínio do processo tributário.

A nosso ver, a questão não é a de saber se a lei configura a fixação do VPT como um ato destacável, prevendo a sua impugnação judicial autónoma – o que é um facto -, mas sim saber se existem razões que obstem a que tal ato, quando surja como instrumental relativamente a um ato de liquidação, possa, também, ser objeto de apreciação em processo dirigido à impugnação desta.

Há, pois, que ponderar sobre a ratio das normas que preveem a impugnabilidade judicial autónoma de atos administrativos que constituem pressuposto de outros atos administrativos.

Estas razões serão, essencialmente, três:

(i) O ato ser imediatamente lesivo, produzir diretamente efeitos negativos na esfera do particular, o que não é o caso, pois a ablação do património pela via do imposto só acontece após a prática de um ato de liquidação.

(ii) A sindicância judicial imediata oferecer maiores garantias ao particular: é o caso, desde logo porquanto o decidido em tal recurso produzirá efeitos de caso julgado relativamente a todas as liquidações que tiverem por base o VPT impugnado.

Está, pois, presente uma intencionalidade garantística (consagração de meio de garantia mais abrangente) e não um intuito de restrição dos normais meios de garantia, como resultaria do acolhimento do pensamento sufragado pela Requerida)

(iii) Previsão legal de um "filtro" pré-judicial que possa contribuir para reduzir o número de casos que os tribunais sejam chamados a apreciar, quando a decisão dependa essencialmente de conhecimentos técnicos próprios de outras áreas do saber, que não a jurídica (o "filtro" aqui existe - a segunda avaliação dos prédios urbanos).

Porém, atenta a razão de ser destes sistemas, há que entender que a previsão da impugnabilidade direta e imediata, em processo a tal diretamente dirigido, do «resultado das segundas avaliações», como diz a lei, só se mostra «indispensável» quando esteja em causa o resultado da aplicação da lei (das normas que regulam o procedimento de avaliação) num caso concreto, pois é em tal aplicação que poderão estar envolvidos conhecimentos técnicos, não jurídicos, e não, como acontece no presente caso, quando esteja em causa a determinação da lei aplicável à avaliação. Esta é uma questão exclusivamente jurídica, para a qual, por definição, um tribunal é mais qualificado para a precisar que uma comissão de peritos avaliadores.

Em resumo, entendemos que a previsão da impugnabilidade autónoma de atos destacáveis visa, em geral, conferir maiores garantias aos particulares e não reduzir o âmbito das garantias que a lei, em geral, prevê.

Assim, tal previsão legal não deve ser entendida - salvo existindo razões substanciais que a tal se oponham, o que não acontece no presente caso - como precludindo a possibilidade de impugnação dos vícios do ato instrumental (fixação do VPT) em processo de impugnação do ato conclusivo do procedimento (liquidação). Num quadro interpretativo da lei que procura dar relevância à sua conformidade com os princípios constitucionais, não podemos subscrever, como constituindo uma regra sem exceções, o pensamento do distinto Autor em que a Requerida, no essencial, se louva.

Como referido no citado acórdão do TCA, há que não esquecer que a coberto de um VPT ilegal foram produzidas liquidações de um tributo, que foi exigido à Requerente.

Pelo que improcede a exceção ora em causa.

b) Incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer, apreciar e pronunciar-se sobre os vícios do valor patrimonial tributário.

A resposta a esta exceção resulta do decidido relativamente à anterior.

Tendo-se concluído que, ao menos em casos como o presente, a errónea fixação do VPT pode ser causa de pedir em processos de impugnação de liquidações que assumiram tal valor como matéria coletável, há que concluir pela competência dos tribunais arbitrais (CAAD) em razão da matéria, nos termos do art. 2.º, n.º 1, do RJAT”

 4- No mesmo sentido, e sobre questão em tudo idêntica à que se suscita no presente processo, se pronunciou o tribunal arbitral, na decisão de 04-10-2021, proferida no processo 759/2020-T, nos seguintes termos: 

“ Importa começar por referir que os atos aqui sindicados são as liquidações de IMI. A exigência de esgotamento dos meios de defesa administrativos dos atos de fixação dos valores patrimoniais prevista no art. 134. n.º 7 do CPPT e no art. 86º, n. 2 da LGT, obriga o contribuinte e permite que a AT se pronuncie antes de se recorrer aos meios judiciais. Contudo, no caso em apreço, tal como resulta da matéria de facto provada, as liquidações de IMI resultam de uma segunda avaliação efetuada e de um subsequente ato de revisão oficiosa promovida pela AT, em cumprimento do disposto no art. 115º, n.º1, al. b) do CIMI. A AT já teve a oportunidade de apreciar a legalidade das avaliações aquando da revisão oficiosa e não o fez. Mesmo que o contribuinte não esgote os meios defesa administrativos, a prévia fixação do valor patrimonial tributário é suscetível de apreciação em sede de revisão, tal como resulta expressamente do art. 115º, n.º1, al, b) do CIMI. Em resultado de uma nova avaliação, a AT deve oficiosamente rever a liquidação inerente. É inequívoco que o legislador não pretendeu impedir aos contribuintes a formulação de pedidos de revisão oficiosa nos casos de atos de liquidação de IMI, pois o art. 115º do CIMI prevê a sua utilização, sem prejuízo do disposto no art. 78º da LGT. Igual interpretação foi seguida pelo TCA do Sul no Ac. n.º 2765/12.8 BELRS de 31-10-2019 (...)”

 5 - Acompanhando, a jurisprudência citada, considera-se que, é legitimo ao Tribunal apreciar a legalidade dos atos tributários impugnados, não procedendo as objeções avançadas pela Requerida, no respeitante.

Mérito

6- No que concerne ao mérito do Pedido, para maior facilidade, e sem perda de eficácia, transcrevemos, (com a devida vénia), o entendimento vertido no processo nº 759/2020-T, com o qual se concorda, inclusive no que aos juros respeita: 

erro que a Requerente imputa à fixação de valores patrimoniais é o de ter aplicado à avaliação de terrenos para construção, normas legais relativas às avaliações dos prédios edificados, nomeadamente o coeficiente de afetação, o coeficiente de localização e o coeficiente de qualidade e conforto.

 Os artigos 41.º, 42.º e 45.º do CIMI, nas redações da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (vigente até à Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro), estabeleciam o seguinte, no que aqui interessa:

Artigo 41.º

Coeficiente de afectação

O coeficiente de afectação (Ca) depende do tipo de utilização dos prédios edificados, de acordo com o seguinte quadro:

(...)

 Artigo 42.º

Coeficiente de localização

(...)

3 - Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:

a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;

b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;

c) Serviços de transportes públicos;

d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.

 4 - O zonamento consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização do município e as percentagens a que se refere o n.º 2 do artigo 45.º

 Artigo 45.º

Valor patrimonial tributário dos terrenos para construção

1 - O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.

2 - O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.

3 - Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no n.º 3 do artigo 42.º

4 - O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do n.º 4 do artigo 40.º .

5 - Quando o documento comprovativo de viabilidade construtiva a que se refere o artigo 37.º apenas faça referência aos índices do PDM, devem os peritos avaliadores estimar, fundamentadamente, a respectiva área de construção, tendo em consideração, designadamente, as áreas médias de construção da zona envolvente. (aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30-12)

 O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a decidir, uniformemente, na esteira do Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 23-10-2019, processo n.º 170/16.6BELRS 0684/17, que:

“I – Na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção há que observar o disposto no artigo 45.º do Código do IMI, não havendo lugar à consideração do coeficiente de qualidade e conforto (cq).

II – O artigo 45 do CIMI é a norma específica que regula a determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção.

III – O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não pode ser aplicado analogicamente por ser susceptível de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI).”

 Na fundamentação deste acórdão refere-se o seguinte:

 “O terreno em causa nos autos integra uma das espécies de prédios urbanos na categoria de terreno para construção. E, tratando-se de uma das espécies de prédio urbano o valor patrimonial deverá ser determinado por avaliação directa (nº 2 do artigo 15 do CIMI) devendo ser avaliado de acordo com o disposto no artigo 45º do mesmo compêndio normativo pois que a fórmula prevista no nº 1 do artigo 38 do CIMI (Vt= Vc x A x CA x CL x Cq x Cv) apenas tem aplicação aos prédios urbanos aí discriminados ou seja àqueles que já edificados estão para habitação, comércio, indústria e serviços (assim se decidiu no ac. deste STA de 20/04/2016 tirado no recurso 0824/15 disponível no site da DGSI - Jurisprudência do STA) onde se expendeu:

 (…) Todavia o legislador não incluiu aí os terrenos para construção que também classifica de prédios urbanos no artigo 6º do CIMI.

Para a determinação do valor patrimonial tributário dos mesmos há a norma do artigo 45 já referida onde apenas é relevada a área de implantação do edifício a construir e o terreno adjacente e as características do nº 3 do artigo 42.

Os restantes coeficientes não estão aí incluídos porquanto apenas podem respeitar aos edifícios, como tal.

O coeficiente de afectação só pode relevar face à comprovada utilização do prédio edificado e bem assim o de conforto e qualidade.

Tais coeficientes multiplicadores do valor patrimonial tributário apenas respeitam ao edificado mas não têm base real de sustentação na potencialidade que o terreno para construção oferece.

A aplicação destes factores valorizadores na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos de construção só poderia ser levada a cabo por analogia com o disposto no artigo 38 do CIMI.

Mas porque a aplicação desses factores tem influência na base tributável tal analogia está proibida por força do disposto no nº 4 do artigo 11 da LGT por se reflectir na norma de incidência na medida em que é susceptível de alterar o valor patrimonial tributário.

A aplicação desses coeficientes na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção seria violadora do princípio da legalidade e da reserva de lei consagrado no artigo 103 nº 2 da CRP.

A própria remissão para os artigos 42 e 40 do CIMI constante do artigo 45 e mesmo a redacção dada ao artigo 46 relativo ao valor patrimonial tributário dos prédios da espécie “outros” em que expressamente se refere que “o valor patrimonial tributário é determinado nos termos do artigo 38 com as necessárias adaptações “é demonstrativo de que na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não entram outros factores que não sejam o valor da área da implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação.

É que mesmo a remissão feita para os artigos 42 e 40 do CIMI não consagra a aplicação dos coeficientes aí referidos mas apenas acolhe, respectivamente as características que hão-de determinar o valor do coeficiente a utilizar e o modo de cálculo.

O que se compreende face à definição de terrenos para construção do nº 3 do artigo 6 do C.I.M.I.(…)

Concordando e não olvidando a doutrina expressa por José Maria Fernandes Pires in Lições de Impostos Sobre o Património e do Selo 2012, 2ª edição pp104 de que “o valor de um terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio ou prédios com determinadas características e com determinado valor,” e que para a avaliação de terrenos para construção a lei manda separar duas partes do terreno (uma primeira parte a do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir) e uma segunda parte a restante constituída pelo terreno que fica livre no lote de terreno para construção expressando que para alcançar o valor da primeira parte é necessário proceder à avaliação do edifício a construir como se ele já estivesse construído.

Com o devido respeito, não se acolhe integralmente esta doutrina pelas dúvidas e imprecisões que pode acarretar e que em matéria fiscal devem ser evitadas. Desde logo a lei, no artº 6º nº 3 do CIMI classifica de terrenos para construção realidades que não têm aprovado qualquer projecto de construção pelo que a sua inexistência determina por si só a inviabilidade de efectuar o cálculo da chamada área de implantação do edifício porque inexistente mesmo em projecto e por outro lado, nos casos em que existe esse projecto (parece ser o caso dos autos uma vez que no processo administrativo apenso se faz referência a uma moradia unifamiliar (vide fls.48 a 56)) cumpre salientar que a qualidade e o conforto têm de ser efectivos o que se compreende porque o direito tributário se preocupa com realidades e verdades materiais não podendo a expectativa ou potencial construção de um edifício com anunciados/programados índices de qualidade e conforto integrar um conceito que objectivamente, só é palpável e medível se efectivada a construção e se, realizada sem desvios ao constante da comummente conhecida “memória descritiva” que acompanha cada projecto de construção. Também é certo que a valorização imediata do prédio por efeito da atribuição do alvará de terreno para construção não deixará de ser levada em conta para efeitos de tributação, em caso de alienação, com a tributação noutra sede tributária.

Como se expressou no acórdão deste STA a que supra fizemos referência (…) Efectivamente o coeficiente de afectação tem a ver com o tipo de utilização do prédio já edificado e o mesmo se diga do coeficiente de qualidade e conforto.

Nos terrenos em construção as edificações aprovadas são meramente potenciais e é o valor dessa capacidade construtiva, geradora de acréscimo de valor patrimonial ou riqueza para o seu proprietário que se procura taxar. E não factores ainda não materializados (…).

Tendo em conta a realidade o legislador consagrou para a determinação do valor patrimonial tributário desta espécie de prédios a regra específica constante do supra referido artigo 45 do CIMI e não outra, onde reitera-se se tem em conta o valor da área de implantação do edifício a construir e o valor do terreno adjacente à implantação bem como as características de acessibilidade, proximidade, serviços e localização descritas no nº 3 do artigo 42, tendo em conta o projecto de construção aprovado, quando exista, e o disposto no nº 2 do artigo 45 do C.I.M.I, mas não outras características ou coeficientes.

Isto só pode significar que na determinação do seu valor patrimonial tributário dos terrenos para construção não tem aplicação integral a fórmula matemática consagrada no artigo 38º do CIMI onde expressamente se prevê, entre outros o coeficiente, aqui discutido, de qualidade e conforto relacionado com o prédio a construir. O que, faz todo o sentido e dá coerência ao sistema de tributação do IMI uma vez que os coeficientes previstos nesta fórmula só podem ter a ver com o que já está edificado, o que não é o caso dos terrenos para construção alvo de tributação específica, sim, mas na qual não podem ser considerados para efeitos de avaliação patrimonial factores ainda não materializados. E, sendo verdade que para calcular o valor da área de implantação do edifício a construir a lei prevê que se pondere o valor das edificações autorizadas ou previstas (artº 45º nº 2 do CIMI) para tal desiderato, salvo melhor opinião não necessitamos/devemos entrar em linha de conta, necessariamente, com o coeficiente de qualidade e conforto pois que não estando materializado não é medível/quantificável, sendo consabido da experiência comum que um projecto de edificação contemplando possibilidades modernas de inserção acessória de equipamentos vulgarmente associados ao conceito de conforto tais como ar condicionado, videovigilância robótica doméstica, luzes inteligentes etc, se edificado/realizado com defeitos pode não se traduzir em qualquer comodidade ou bem estar, antes pelo contrário ser fonte de problemas/insatisfações e dispêndios financeiros.”

 Esta jurisprudência foi posteriormente reafirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se, entre vários outros, pelos seguintes acórdãos:

– de 05-04-2017, processo n.º 01107/16 («Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»);

– de 28-06-2017, processo n.º 0897/16 («II – Os coeficientes de afectação e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto. III – Na fórmula final de cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse factor de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»).

– de 16-05-2018, processo n.º 0986/16 («O coeficiente de qualidade e conforto, factor multiplicador do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI)»;

– de 14-11-2018, processo n.º 0133/18 («No cálculo do VPT dos terrenos para construção é de afastar a aplicação do coeficiente de localização, na medida em que esse fator de localização do terreno já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI»;

– 23-10-2019, processo n.º 170/16.6BELRS 0684/17 («os coeficientes de localização, qualidade e conforto, factores multiplicadores do valor patrimonial tributário contidos na expressão matemática do artigo 38 do CIMI com que se determina o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação comércio indústria e serviços e bem assim o coeficiente de afectação não podem ser aplicados analogicamente por serem susceptíveis de alterar a base tributável interferindo na incidência do imposto (IMI).»

– de 13-01-2021, processo n.º 0732/12.0BEALM 01348/17 («Relativamente à avaliação de terrenos para construção, sobre o que regula o art. 45.º do C.I.M.I., não são de aplicar os coeficientes ou características não especificamente previstos, entre os quais o coeficiente de qualidade e conforto».

– de 07-04-2021, processo n.º 919/07.8 BEBRG («Na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção a que seja aplicável o artigo 45.º, n.º 2, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, na redacção anterior à que lhe foi introduzida pelo artigo 392.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31/12, não se consideram os coeficientes de afetação [Ca] e de qualidade e conforto [Cq]-»

 Na linha desta jurisprudência, é de entender que a avaliação dos terrenos para construção devia ser efetuada sem aplicação dos coeficientes não especificamente previstos, entre os quais os coeficientes de localização, de qualidade e conforto e de afetação.

No caso em apreço, como se vê pelas cadernetas prediais juntas como documento n.º 4 do pedido de pronúncia arbitral e pela fundamentação das avaliações efetuadas em 2013 juntas na resposta da requerida, foram aplicados os coeficientes de localização, de afetação e de qualidade e conforto nas avaliações, em que se basearam, as liquidações relativas ao ano de 2019.

O coeficiente de localização não deve ser aplicado no apuramento do valor patrimonial tributário de terrenos para construção porque já está contemplado na percentagem prevista no nº 3 do art. 45º do CIMI. A sua consideração levaria a uma dupla consideração deste fator.

Acresce que a avaliação dos terrenos para construção deve ser efetuada de acordo com o previsto 45º do CIMI, no qual não está prevista a aplicação dos coeficientes de localização, de qualidade e conforto nem de afetação.

  A aplicação destes fatores valorizadores na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos de construção só poderia ser levada a cabo por analogia com o disposto no artigo 38º do CIMI.

Mas, porque a aplicação desses fatores tem influência na base tributável tal analogia está proibida por força do disposto no nº 4 do artigo 11º da LGT, por se refletir na norma de incidência, na medida em que é suscetível de alterar o valor patrimonial tributário.

A aplicação desses coeficientes na determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção seria violadora do princípio da legalidade e da reserva de lei consagrado no artigo 103º, nº 2 da CRP.

Assim, face à jurisprudência referida, tem de se concluir que a fixação de valores patrimoniais destes prédios enferma dos erros que a Requerente alega, que são exclusivamente imputáveis à Administração Tributária que praticou os atos de avaliação.

 ii) Juros Indemnizatórios

 Nos termos do artigo 43º, n.º 1, da LGT "são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido".

Os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no art. 43, nº1, da LGT, são os seguintes:

1-Que haja um erro num ato de liquidação de um tributo;

2-Que o erro seja imputável aos serviços;

3-Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;

4-Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

(Cfr. Jorge Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, I Volume, Áreas Editora, 6ª. Edição, 2011, pág.530).

A anulação das liquidações de IMI objeto do pedido de pronúncia arbitral ficou a dever-se a uma incorreta aplicação da Lei. A incorreta aplicação da Lei conduz à consequente anulação dos atos tributários que o tenha por base.

A incorreta aplicação da Lei enquadra-se no erro sobre os pressupostos de direito, que funciona como requisito do direito a juros indemnizatórios consagrado no examinado artº.43, nº.1, da LGT. O erro é imputável aos serviços da AT, tendo originado um pagamento superior ao devido.

Nestes termos, deve considerar-se que se encontram reunidos os pressupostos de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios à Requerente, em virtude da anulação da liquidação, dado estarem reunidos todos os pressupostos previstos no artº43, nº1, da LGT.

Procede, pois, o pedido de juros indemnizatórios, que deverão ser contados, à taxa apurada, de harmonia com o disposto no artigo 43.º, n.º 4, da LGT, entre 23/11/2020 (data do último pagamento) até à data da emissão da correspondente nota de crédito.  

 

DECISÃO

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

a) anular a liquidação de IMI nos termos que foram impugnados, referentes ao ano de 2019, (na parte em que tiveram como pressupostos valores patrimoniais em que foram considerados coeficientes de localização, de afetação e de qualidade e conforto);

b) Condenar a Requerida a restituir a quantia de €4.298,13, acrescida de juros indemnizatórios, desde o pagamento, até ao integral reembolso do montante que deve ser restituído;

c) Condenar a Requerida nas custas do processo, face ao decaimento.

 

Fixa-se o valor do processo em €4.298,13, nos termos do artigo 97º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força da alínea a) do n. º1 do artigo 29.º do RJAT e do n. º2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €612,00 nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, da responsabilidade da Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.

 

Lisboa, 09 de Julho 2022

 

O Árbitro,

 

(Fernando Miranda Ferreira)