SUMÁRIO:
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O regime de dividendos distribuídos a OIC constituídos de acordo com a legislação nacional, estabelecendo uma isenção quanto aos mesmos, de acordo com a legislação em vigor em 2016, diverge do regime aplicável aos OIC constituídos, no caso vertente, na Alemanha, para os quais o legislador nacional estabelece uma tributação de 25% por retenção na fonte.
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Chamado a pronunciar-se, em sede de reenvio prejudicial no âmbito de um processo em que a questão de Direito era exatamente a mesma, o TJUE concluiu que o artigo 63º do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa tributação.
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Em consequência, a liquidação de imposto retido por força da distribuição dos dividendos é ilegal e consequentemente é anulada, tendo em conta o acórdão do TJUE que é de aplicação obrigatória.
DECISÃO ARBITRAL
O árbitro presidente do Tribunal Arbitral, Prof. Doutor Vasco Valdez, designado pelo Conselho Deontológico do CAAD, profere a seguinte decisão arbitral:
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RELATÓRIO
1.1 MARCHA DO PROCESSO
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A..., Organismo de Investimento Coletivo constituído de acordo com o direito alemão, com o NIF português ..., com sede em ..., Frankfurt ... (doravante designada por Requerente), representado por B... GMBH, na qualidade de sociedade gestora, com sede na mesma morada, veio, nos termos do disposto no nº 1 a) do artigo 2º e no artigo 10º do RJAT, requerer a constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do nº 1 do artigo 6º do mesmo RJAT, para apreciação da legalidade dos atos de retenção na fonte de IRC incidente sobre pagamentos de dividendos relativos a 2016 ou colocação da questão ao TJUE através do reenvio prejudicial, nos termos da artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
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O pedido de constituição do Tribunal foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 2019-03-19.
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Em conformidade com os artigos 5º, nº 2 a), 6, nº 1 e 11º, nº 1 do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD, designou o signatário como árbitro singular em 2019-05-19.
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As partes foram notificados dessa notificação não tendo formulado recusa, pelo que, em conformidade com a comunicação do Senhor Presidente do CAAD, o Tribunal ficou constituído em 2019-05-29.
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A AT, doravante designada por Requerida, apresentou a sua resposta em 2019-07-02, vindo a sustentar a improcedência do pedido, a manutenção na ordem jurídica do ato de liquidação impugnado e a sua absolvição do pedido, não se opondo, contudo, antes pelo contrário, pugnando pelo envio a título prejudicial de pedido de pronúncia sobre a questão de fundo em matéria jurídica, a saber, da compatibilidade do Direito português, em particular do artigo 22º do EBF com o Direito comunitário, em particular com o direito de circulação de capitais.
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As partes produziram as suas alegações finais escritas em 2019-07-23 (Requerente) e 2019-09-12 (Requerida) e reafirmaram o que anteriormente haviam já expendido no pedido de pronúncia arbitral (PPA) e na respetiva resposta por parte da AT.
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Entretanto, no âmbito do processo nº 93/2019-T a correr os seus termos no CAAD, processo em tudo semelhante àquele que se encontra em apreciação no processo sub judice, mormente quanto à questão de fundo em matéria de Direito, foi feito um pedido de reenvio prejudicial para que o TJUE se pronunciasse quanto a tal questão de Direito, pelo que a pedido expresso da Requerente e obtida a concordância da Requerida, o Tribunal Arbitral, ao abrigo dos artigos 269º, nº 1 c) e 272º do CPC, aplicáveis por força do artigo 29º do RJAT, determinou, desde 2019-09-16, a suspensão da instância até que fosse conhecida a douta decisão do TJUE.
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O Tribunal tomou conhecimento do acórdão do TJUE proferido em 17 de março de 2022, tendo notificado em 2022-03-18 as partes para acrescentarem o que fosse tido por adequado, o que a Requerente fez em-2022-03-31, não tendo a Requerida emitido sobre o mesmo qualquer pronúncia.
1.2. A POSIÇÃO DAS PARTES
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Sucintamente, aduzir-se-ão, de seguida, os motivos invocados por Requerente e Requerida para sustentar as suas posições. Principiando pela Requerente esta diz:
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A Requerente é uma pessoa coletiva de direito alemão, mais concretamente um Organismo de Investimento Coletivo (“OIC”) constituído sob a forma contratual, comummente designado de fundo de investimento, sendo também sujeito passivo de IR, não residente, para efeitos fiscais em Portugal e sem qualquer estabelecimento estável em Portugal.
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A Requerente é gerida por uma entidade gestora de fundos de investimento, a B... GmbH, entidade igualmente com sede na Alemanha obedecendo à Estrutura de Investimento Coletivo prevista na Diretiva 2009/65/CE do Conselho.
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Os UCITS são tidos no Direito da União Europeia como OIC em Valores Mobiliários que obedecem a um conjunto de normas previstas em diplomas da União Europeia, o que lhes permite operar livremente no mercado interno europeu com base na autorização de uma única entidade responsável pela supervisão destes organismos, desde que esta última pertença a um Estado Membro.
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No caso em apreço, a Requerente e a respetiva entidade gestora são entidades sujeitas a supervisão do Bundesanstalt für Finanzdienstleistungsaufsicht (“BaFin“), entidade federal responsável pela supervisão do setor financeiro na Alemanha.
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O objeto do fundo de investimento prende-se exclusivamente com a administração, gestão e com o investimento do seu património.
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Por não se tratar de um OIC sob a forma societária (sociedade de investimento), mas antes meramente contratual (fundo de investimento), a Requerente não reveste juridicamente a forma de sociedade comercial, não estando, nos termos da legislação alemã aplicável, sujeito a qualquer obrigação de registo no Registo Comercial alemão e, como tal, não pode ser titular de direitos ou obrigações.
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Do ponto de vista tributário, a Requerente é uma entidade residente fiscal na Alemanha, sujeita a imposto sobre as pessoas coletivas no seu país de residência, tendo-lhe sido, todavia, concedida uma isenção (nos termos da Secção 11 parágrafo 1 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Sociedades Alemão – “German Corporate Income Tax Act” – e da secção 11 parágrafo 2 do Código Fiscal de Investimento Alemão – “German Investment Tax Act”), o que a impossibilita de recuperar a título de crédito por dupla tributação internacional ou formular qualquer pedido de reembolso dos impostos suportados ou pagos no estrangeiro.
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A Requerente detém diversos investimentos financeiros em Portugal, consubstanciados na detenção de participações sociais em sociedades residentes, para efeitos fiscais, em Portugal, sendo o C..., Lda a entidade responsável pela custódia de títulos.
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No ano de 2016, a Requerente recebeu dividendos e suportou em Portugal imposto por retenção na fonte no montante a seguir discriminado:
Ano da Retenção
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Valor Bruto do Dividendo
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Data de Pagamento
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Taxa de Retenção na Fonte
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Guia de Pagamento
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Valor da retenção
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2016
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137.155,40
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25.05.2016
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25
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...
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34.288,85
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O quadro permite discriminar, relativamente ao ano de 2016, (i) os lotes de ações detidos pelo Requerente, (ii) os montantes brutos dos dividendos recebidos, (iii) o imposto suportado por retenção na fonte e a data de pagamento dos referidos rendimentos e (iv) o número da guia de pagamento através do qual o imposto foi retido na fonte e foi entregue junto dos cofres da AT em Portugal.
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Conforme resulta do quadro mencionado no ponto acima, a Requerente suportou, em Portugal, no ano de 2016, a quantia total de imposto de EUR 34.288,85, a qual constitui objeto do presente pedido de pronúncia arbitral.
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Na ótica da Requerente, Portugal ao sujeitar, à data dos factos tributários em análise, a retenção na fonte em IRC os dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal aos Organismos de Investimento Coletivo estabelecidos em Estados Membros da União Europeia (in casu a Alemanha), simultaneamente isentando de tributação a distribuição de dividendos a Organismos de Investimento Coletivo estabelecidos e domiciliados em Portugal viola, de forma frontal, o artigo 63.º do Tratado para o Funcionamento da União Europeia (doravante “TFUE”), conforme tem sido entendimento unânime do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”).
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Neste sentido, no dia 29.12.2017, a Requerente apresentou, ao abrigo dos artigos 98.º e 137.º do CIRC, 132.º do CPPT e 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), reclamação graciosa dos atos de retenção na fonte de IRC relativos ao ano de 2016, na qual solicitou a anulação dos mesmos por vício de ilegalidade por violação direta do Direito Comunitário, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal – processo que correu termos na Direção de Finanças de Lisboa sob o n.º REC .../18.
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Todavia, no dia 20.12.2018, a Requerente foi notificada da decisão final de indeferimento da Reclamação Graciosa, fundada no entendimento de que não competiria à AT “avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, nem tampouco apreciar a sua constitucionalidade”.
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Mais refere a AT na sua decisão final que “não pode (…) aceitar de forma direta e automática as orientações interpretativas do TJUE, quando estas não têm, na sua origem, a apreciação de compatibilidade entre as disposições do direito interno português e o direito europeu” (cfr. § 11 da decisão final da AT acima junta como documento n.º 9).
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Ora, a Requerente não pode conformar-se com a decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa proferida pela AT, não só porque esta se destitui do seu papel decisório, mas também porque, por consequência dessa inércia e da confirmação da legalidade dos atos tributários clamados, acabou por emitir uma decisão desfavorável ao contribuinte e que padece de um vício de violação de lei, o que sustenta a apresentação do presente pedido de pronúncia arbitral.
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Considerando que a Requerente foi notificado da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa no passado dia 20 de dezembro de 2018, não restam dúvidas sobre a tempestividade do presente pedido de pronúncia arbitral.
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Acresce que, no que diz respeito ao regime interno de tributação dos dividendos, sempre que os mesmos são pagos por uma entidade residente a um sujeito passivo também ele residente em Portugal, tais rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte por conta do imposto devido a final a uma taxa de 25% (ver artigos 94.º, n.º 1 alínea c), 94.º n.º 3 alínea b) e 94.º, n.º 4 do CIRC).
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Contudo, nos casos de OIC constituídos de acordo com a legislação nacional, os mesmos estavam, à data dos factos tributários, isentos de IRC sobre dividendos obtidos, nos termos do artigo 22.º do EBF, pois como estipula o n.º 3 do referido preceito legal, “Para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º, 8.º e 10.º do Código do IRS (…)”.
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Com efeito, o Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, procedeu à reforma do regime de tributação dos OIC, alterando o EBF e o Código do Imposto do Selo (“CIS”), sendo o novo regime aplicável aos rendimentos obtidos após 1 de julho de 2015.
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Ou seja, resulta das disposições legais a que se fez referência nos pontos imediatamente anteriores, que um OIC constituído ao abrigo do Regime Geral dos OIC, aquando da distribuição de dividendos provenientes de sociedades sediadas em Portugal, estava sujeito, no ano de 2016, a um regime fiscal mais favorável do que o aplicável a um OIC constituído de acordo com a legislação de um qualquer outro Estado Membro da União Europeia aquando da distribuição de dividendos de fonte portuguesa.
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Com efeito, a legislação nacional concede expressamente aos OIC constituídos em Portugal a possibilidade de beneficiarem de um regime que lhes permite receber os dividendos totalmente isentos de tributação, bastando, para tal, que estejam constituídos de acordo com a legislação nacional.
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Por oposição, no caso de OIC constituídos noutros Estados Membros da União Europeia, os mesmos não são passíveis de beneficiar de idêntica isenção, estando sujeitos a uma tributação efetiva e liberatória de 25% em sede de IRC, sobre os dividendos auferidos, no ano de 2016, em Portugal.
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Neste sentido, o artigo 18.º do TFUE estabelece uma proibição genérica de discriminações baseadas na nacionalidade, princípio esse concretizado, no que diz respeito à livre circulação de capitais, no artigo 63.º, o qual proíbe todas as formas de discriminação baseadas na nacionalidade ou no local de investimento entre entidades/pessoas residentes em Estados Membros da EU, o que , aliás, é confirmado por diversos acórdãos do TJUE, mencionados na petição inicial da Requerente, pelo que conclui que a leitura feita pela AT é contrária à liberdade de circulação de capitais e viola o ordenamento jurídico comunitário.
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Face ao exposto, a norma do artigo 22º do EBF é contrária ao Direito da União Europeia, uma vez que colide com as disposições do TFUE relativas ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade, bem como relativas à livre circulação de capitais previstas no seu artigo 63.º.
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Por seu turno a Requerida, na sua resposta, alegou o seguinte:
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Conforme resulta do PPA, bem como do processo administrativo (PA), este tem por objeto a anulação de atos de retenção na fonte de IRC sobre dividendos relativos ao ano de 2016, por vício de ilegalidade por violação direta do Direito Comunitário, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal.
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Conforme referido pela Requerente no artigo 24.º do PPA em “29.12.2017, o Requerente apresentou, ao abrigo dos artigos 98.º e 137.º do CIRC, 132.º do CPPT e 22.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), reclamação graciosa dos atos de retenção na fonte de IRC relativos ao ano de 2016, na qual solicitou a anulação dos mesmos por vício de ilegalidade por violação direta do Direito Comunitário, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal – processo que correu termos na Direção de Finanças de Lisboa sob o n.º REC .../18”.
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No despacho de indeferimento da reclamação graciosa, a AT, sucintamente, adoptou o seguinte entendimento:
“
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A factualidade em causa respeita à retenção na fonte de IRC, no montante de € 34.288,85, calculado à taxa de 25%, sobre dividendos distribuídos pela entidade melhor identificada no artigo 17.º do PPA, no montante total de € 137.155,40, sobre os quais incidiu IRC, retido na fonte, por força, do disposto na alínea c), n.º 2 do artigo 2.º; alínea d), n.º 1, do artigo 3.º; subalínea 3), alínea a), n.º 3, do artigo 4.º; alínea c), n.º 1 e alínea b), n.º 3, artigo 94.º e n.º 4 do artigo 87.º, todos do Código do IRC.
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Note-se que, tanto quanto nos é dado a conhecer a Requerente optou por não solicitar o reembolso ao abrigo do n.º 2 do artigo 10.º, da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Alemanha (adiante CDT), que estabelece um limite máximo para o imposto cobrado no Estado da fonte de 15% do montante bruto dos dividendos.
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A Requerente omite dois aspetos de grande relevância para a definição completa do quadro fiscal dos OIC, a que importa dar o devido relevo.
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Um, tem a ver com a opção legislativa de “aliviar” estes sujeitos passivos da tributação em IRC, mediante a subtração à base tributável dos rendimentos típicos dos OIC, isto é, dos rendimentos de capitais (artigo 5.º do Código do IRS), dos rendimentos prediais (artigo 8.º do Código do IRS) e das mais-valias (artigo 10.º do Código do IRS) conforme previsto no n.º 3 do artigo 22.º do EBF, e ainda prevendo a isenção de derrama municipal e de derrama estadual, nos termos do n.º 6 do artigo 22.º do EBF, deslocando a tributação para a esfera do Imposto do Selo.
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Com efeito, foi aditada, à TGIS, a Verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa 0,0125%, sobre o valor líquido global dos restantes OIC, sendo que, neste caso, a base tributável pode incluir dividendos distribuídos.
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Ora, a tributação em Imposto do Selo apenas recai sobre os OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, o que significa que dela são excluídos os OIC constituídos e que operem ao abrigo de uma legislação estrangeira.
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A outra omissão prende-se justamente com a tributação incidente sobre os dividendos, porquanto, além de não integrarem a matéria coletável do IRC, também beneficiam da isenção de retenção na fonte (cfr. n.º 10 do artigo 22.º do EBF).
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No entanto a Requerente nada adianta sobre a sujeição dos OIC a taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do Código do IRC, prevista no n.º 8 do artigo 22.º do EBF, que revela a intenção do legislador de subsumir os dividendos obtidos por estes organismos ao disposto no n.º 11 do referido artigo 88.º, cuja redação é seguinte:
«São tributados autonomamente, à taxa de 23%, os lucros distribuídos por entidades sujeitas a IRC a sujeitos passivos que beneficiam de isenção total ou parcial, abrangendo, neste caso, os rendimentos de capitais, quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.»
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Por conseguinte, os OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF – tal como ocorre com os fundos de pensões - por beneficiarem de isenção parcial de IRC, estão obrigados a liquidar e entregar a tributação autónoma incidente sobre os lucros distribuídos, quando as correspondentes partes sociais não sejam detidas, de modo ininterrupto, há pelo menos um ano.
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Como é óbvio, os OIC não abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, como é o caso da Requerente, não está sujeito a tributação autónoma sobre os dividendos.
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Ou seja, os investidores alemães dos Fundos de Investimento eram tratados como se detivessem diretamente os ativos dos fundos de investimento, portanto, qualquer rendimento gerado na esfera do Fundo era atribuído aos investidores e tributada em conformidade, mas, para a determinação dos rendimentos imputados por unidade de participação, os Fundos de Investimento estavam obrigados a publicar, no diário federal eletrónico, relatórios diários e anuais com informações fiscalmente relevantes.
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Do acima exposto, é possível concluir que os regimes fiscais aplicáveis aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional e dos OIC constituídos e estabelecidos na Alemanha não são genericamente comparáveis, pois que a tributação dos primeiros compreende uma tributação em IRC sobre um lucro tributável que integra rendimentos marginais e repousa sobretudo no Imposto do Selo, ao passo que os segundos estavam isentos de tributação no imposto sobre o rendimento e, aparentemente, também de outros impostos.
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Consequentemente, não pode afirmar-se de forma categórica – como é feito no artigo 42.º do PPA - “que um OIC constituído ao abrigo do Regime Geral dos OIC aquando da distribuição de dividendos provenientes de sociedades sediadas em Portugal, estava sujeito, no ano de 2016, a um regime fiscal mais favorável do que o aplicável a um OIC constituído de acordo com a legislação de um qualquer outro Estado Membro da União Europeia aquando da distribuição de dividendos de fonte portuguesa”.
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Basta recordar que um OIC constituído e estabelecido em Portugal, embora isento de retenção na fonte, está sujeito a uma tributação autónoma sobre os dividendos, à taxa de 23%, se as correspondentes partes sociais não forem detidas, de modo ininterrupto, pelo período de um ano e, além disso, esses rendimentos, quando forem parte integrante do valor líquido global do OIC, em cada trimestre, ainda sofrem a incidência do Imposto do Selo.
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Ao passo que os dividendos distribuídos por uma sociedade residente em Portugal a um Fundo de Investimento constituído ao abrigo da legislação alemã, em 2016, apenas foi objeto de retenção na fonte, a título definitivo, à taxa de 15% (taxa máxima estabelecida no artigo 10.º da CDT) e como os rendimentos gerados no Fundo, distribuídos e imputados, apenas, eram tributados na esfera dos investidores, certamente, os impostos suportados pelo Fundo eram igualmente imputados aos investidores.
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Para efeitos de comparação da carga fiscal incidente sobre os dividendos auferidos em Portugal pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e os OIC constituídos na Alemanha, é redutor, e manifestamente insuficiente para extrair conclusões, atender apenas ao imposto retido na fonte e abstrair de outras imposições suscetíveis de onerar fiscalmente os dividendos.
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Do mesmo modo que, não está demonstrado cabalmente que, embora a Requerente não consiga recuperar o imposto retido na fonte (Portugal) no seu estado de residência (Alemanha), devido ao seu estatuto de entidade isenta de tributação, a parte do imposto não recuperado pelo fundo não venha a ser recuperado pelos investidores.
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No âmbito da apreciação da conformidade das normas do Código do IRC e do EBF, atinentes aos dividendos com o princípio da liberdade de circulação de capitais consagrada no artigo 63.º do TFUE, o Requerente convoca o artigo 18.º do TFUE que estabelece o seguinte: “No âmbito de aplicação dos Tratados, e sem prejuízo das suas disposições especiais, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade”.
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E, ainda, o artigo 63.º do TFUE, cuja redação dispõe que:
«1 – No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.
2 – No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as retenções aos pagamentos entre Estados-Membros e países terceiros.»
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Por sua vez, prescreve o Artigo 65.º do TFUE:
«1. O disposto no artigo 63.º não prejudica o direito de os Estados-Membros:
a) Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;
b) Tomarem todas as medidas indispensáveis para impedir infrações às suas leis e regulamentos, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras, preverem processos de declaração dos movimentos de capitais para efeitos de informação administrativa ou estatística, ou tomarem medidas justificadas por razões de ordem pública ou de segurança pública.
2 - (…)
3. As medidas e procedimentos a que se referem os n.ºs 1 e 2 não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º»
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Ora, o artigo 63.º do TFUE visa assegurar a liberalização da circulação de capitais dentro do mercado interno europeu e entre este e países terceiros, portanto, proíbe qualquer restrição ou discriminação que resulte do tratamento fiscal diferenciado concedido pelas disposições da lei nacional a entidades de Estados-membros ou de países terceiros que crie condições financeiras mais desfavoráveis a estes últimos e seja suscetível de os dissuadir de investir em Portugal.
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No entanto, para se avaliar se o tratamento fiscal aplicado aos dividendos obtidos em Portugal é menos vantajoso do que o tratamento fiscal atribuído aos dividendos obtidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e se tal diferenciação é suscetível de afetar o investimento em ações emitidas por sociedades residentes, teria de ser colocado em confronto o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, à taxa de 15%, e os impostos – IRC e Imposto do Selo - que incidem sobre os segundos, e que, em conjunto, podem, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos.
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Além do mais, o imposto retido à Requerente poderá eventualmente dar lugar a um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera dos investidores, questão que a Requerente também omitiu, ou, pelo menos, não esclareceu.
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Assim, não pode afirmar-se que se esteja perante situações objetivamente comparáveis, porquanto, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela Requerente, antes, pelo contrário.
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E, portanto, o que existe é uma aparência de discriminação na forma de tributar os dividendos distribuídos por sociedades residentes a OIC não residentes, mas, a que não corresponde uma discriminação em substância, conforme supra referido.
2. SANEAMENTO
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O pedido de pronúncia arbitral é legal, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e mostram-se devidamente representadas.
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O processo não padece de nulidades, não foram invocadas exceções, mas foi pedido que o mesmo aguardasse pela decisão do TJUE no processo nº 93/2019-T. Proferida que foi tal decisão, o mesmo pode prosseguir em ordem a decidir sobre o mérito da causa.
3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. Factos dados como provados
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Com base nos documentos trazidos aos autos são dados como provados os seguintes factos relevantes para a decisão:
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A Requerente, com residência fiscal na Alemanha, é uma pessoa coletiva de direito alemão, mais concretamente um OIC constituído sob a forma contratual e não societária (Docs. 1,2 e 3);
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A Requerente é uma entidade residente na Alemanha, sujeita a imposto sobre as pessoas coletivas no seu país de residência, tendo-lhe sido concedida uma isenção nos termos da Secção I parágrafo I do Código do Imposto sobre o Rendimento das Sociedades Alemão e da Secção11 parágrafo 1.2 do Código Fiscal de Investimento Alemão;
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Em 2016-5-25 foram distribídas à Requerente dividendos no montante bruto de 137.155,40€ e sujeitos a retenção na fonte no valor de 34.288,85€ (Docs. 6 e 7);
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A Requerente é a beneficiária dos rendimentos (Doc.7);
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O Fundo responsável pela custódia dos títulos, procedeu à retenção e entrega à AT da respetiva importância ( Doc.7);
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No dia 29 de de dezembro de 2017, a Requerente apresentou reclamação graciosa de IRC relativamente ao ano de 2016, solicitando a respetiva anulação por vício de ilegalidade por violação direta do Direito da União Europeia , bem como o reconhecimento à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal (Doc. 8), no que respeita à retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos;
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No dia 20 de dezembro de 2018, a Requerente foi notificada do indeferimento da reclamação graciosa, fundada no entendimento de que não cabe à AT “avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, nem tampouco apreciar a sua constitucionalidade” (Doc. 9).
3.2 Factos não provados
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Com relevo para a decisão sobre o mérito não existem factos alegados que devam considerar-se como não provados.
3.3- Motivação
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Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe selecionar os factos que importam para decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada (cfr. Artigos 123º, nº 3 do CPPT e artigo 607º, nº 3 do CPC, aplicáveis por força do artigo 29º, nº 1 alínea e) do RJAT), considerando-se, assim, provados os factos supra identificados como sendo relevantes para a decisão da causa.
4- DO DIREITO APLICÁVEL
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Como foi dito anteriormente no presente relatório, a questão de Direito sub judice foi objeto de remessa, a título de reenvio prejudicial, ao TJUE, no âmbito do processo nº 93/2019-T, sendo que as questões que se colocaram neste são as mesmas que se discutem no presente processo, o que originou a anuência expressa de Requerente e Requerida no sentido de suspender o presente processo até que o TJUE se pronunciasse, o que viria a fazer em 2022-03-17.
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Nesta conformidade, transcreve-se em grande medida o referido acórdão do TJUE para melhor compreensão de qual o entendimento formulado.
“O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.° e 63.° TFUE.
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a AllianzGI‑Fonds AEVN à Autoridade Tributária e Aduaneira (Portugal) a respeito da anulação de atos através dos quais esta última procedeu à retenção na fonte do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas relativo aos anos de 2015 e 2016.
Direito português
3 O artigo 22.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «EBF»), dispunha:
«1 — São tributados em IRC, nos termos previstos neste artigo, os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional.
[...]
3 — Para efeitos do apuramento do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.°, 8.° e 10.° do [Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares], exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada em portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.°‑A do [Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas], bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para as entidades referidas no n.° 1.
[...]
6 — As entidades referidas no n.° 1 estão isentas de derrama municipal e derrama estadual.
7 — Às fusões, cisões ou subscrições em espécie entre as entidades referidas no n.° 1, incluindo as que não sejam dotadas de personalidade jurídica, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 73.°, 74.°, 76° e 78.° do Código do IRC, sendo aplicável às subscrições em espécie o regime das entradas de ativos previsto no n.° 3 do artigo 73.° do referido Código.
8 — As taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.° do Código do IRC têm aplicação, com as necessárias adaptações, no presente regime.
[...]
10 — Não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC relativamente aos rendimentos obtidos pelos sujeitos passivos referidos no n.° 1.
[...]
14 — O disposto no n.° 7 aplica‑se às operações aí mencionadas que envolvam entidades com sede, direção efetiva ou domicílio em território português, noutro Estado‑Membro da União Europeia ou, ainda, no Espaço Económico Europeu, neste último caso desde que exista obrigação de cooperação administrativa no domínio do intercâmbio de informações e da assistência à cobrança equivalente à estabelecida na União Europeia.
15 — As entidades gestoras de sociedades ou fundos referidos no n.° 1 são solidariamente responsáveis pelas dívidas de imposto das sociedades ou fundos cuja gestão lhes caiba.»
4 O artigo 22.°‑A do EBF prevê:
«1 — Sem prejuízo do disposto no n.° 3, os rendimentos de unidades de participação ou participações sociais em entidades a que se aplique o regime previsto no artigo anterior, são tributados em IRS ou IRC, nos seguintes termos:
a) No caso de rendimentos distribuídos a titulares residentes em território português, ou que sejam imputáveis a um estabelecimento estável situado neste território, por retenção na fonte:
i) À taxa prevista no n.° 1 do artigo 71.° do Código do IRS, quando os titulares sejam sujeitos passivos de IRS, tendo a retenção na fonte caráter definitivo quando os rendimentos sejam obtidos fora do âmbito de uma atividade comercial, industrial ou agrícola;
ii) À taxa prevista no n.° 4 do artigo 94.° do Código do IRC, quando os titulares sejam sujeitos passivos deste imposto, tendo a retenção na fonte a natureza de imposto por conta, exceto quando o titular beneficie de isenção de IRC que exclua os rendimentos de capitais, caso em que tem caráter definitivo;
[...]
c) No caso de rendimentos de unidades de participação em fundos de investimento imobiliário e de participações sociais em sociedades de investimento imobiliário de que sejam titulares sujeitos passivos não residentes, que não possuam um estabelecimento estável em território português ao qual estes rendimentos sejam imputáveis, por retenção na fonte a título definitivo à taxa de 10 %, quando se trate de rendimentos distribuídos ou decorrentes de operações de resgate de unidades de participação ou autonomamente à taxa de 10 %, nas restantes situações;
d) No caso de rendimentos de unidades de participação em fundos de investimento mobiliário ou de participações sociais em sociedades de investimento mobiliário a que se aplique o regime previsto no artigo anterior, incluindo as mais‑valias que resultem do respetivo resgate ou liquidação, cujos titulares sejam não residentes em território português sem estabelecimento estável aí situado ao qual estes rendimentos sejam imputáveis, os mesmos estão isentos de IRS ou de IRC;
e) Nos restantes casos, nos termos previstos no Código do IRS ou no Código do IRC.
2 — O disposto na subalínea i) da alínea a) e na alínea b) do número anterior não prejudica a opção pelo englobamento quando os rendimentos sejam obtidos por sujeitos passivos de IRS fora do âmbito de uma atividade comercial, industrial ou agrícola, caso em que o imposto retido tem a natureza de imposto por conta, nos termos do artigo 78.° do Código do IRS.
3 — O disposto nas alíneas c) e d) do n.º 1 não é aplicável, sendo os rendimentos tributados nos termos das alíneas a), b) ou e) do mesmo número, quando:
a) Os titulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças;
b) Os titulares sejam entidades não residentes que sejam detidas, direta ou indiretamente, em mais de 25 % por entidades ou pessoas singulares residentes em território nacional.
[...]
13 — Para efeitos da aplicação deste regime, os rendimentos de unidades de participação em fundos de investimento imobiliário e as participações sociais em sociedades de investimento imobiliário, incluindo as mais‑valias que resultem da respetiva transmissão onerosa, resgate ou liquidação, são considerados rendimentos de bens imóveis.»
5 O artigo 3.°, n.° 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, tinha a seguinte redação:
«1 — O IRC incide sobre:
[...]
d) Os rendimentos das diversas categorias, consideradas para efeitos de IRS e, bem assim, os incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito por entidades mencionadas na alínea c) do n.° 1 do artigo anterior que não possuam estabelecimento estável ou que, possuindo‑o, não lhe sejam imputáveis.»
6 Nos termos do artigo 4.° deste código:
«2 — As pessoas coletivas e outras entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos.
3 — Para efeitos do disposto no número anterior, consideram‑se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam:
[...]
c) Rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado:
[...]
3) Outros rendimentos de aplicação de capitais;
[...]»
7 O artigo 87.°, n.° 4, do referido código prevê:
«Tratando‑se de rendimentos de entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português e aí não possuam estabelecimento estável ao qual os mesmos sejam imputáveis, a taxa do IRC é de 25 % […]»
8 Nos termos do artigo 88.°, n.° 11, do mesmo código:
«São tributados autonomamente, à taxa de 23 %, os lucros distribuídos por entidades sujeitas a IRC a sujeitos passivos que beneficiam de isenção total ou parcial, abrangendo, neste caso, os rendimentos de capitais, quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.»
9 O artigo 94.° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas enuncia:
«1 — O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português:
[...]
c) Rendimentos de aplicação de capitais não abrangidos nas alíneas anteriores e rendimentos prediais, tal como são definidos para efeitos de IRS, quando o seu devedor seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à atividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade;
[...]
3 — As retenções na fonte têm a natureza de imposto por conta, exceto nos seguintes casos em que têm caráter definitivo:
[...]
b) Quando, não se tratando de rendimentos prediais, o titular dos rendimentos seja entidade não residente que não tenha estabelecimento estável em território português ou que, tendo‑o, esses rendimentos não lhe sejam imputáveis.
[...]
5 — Excetuam‑se do disposto no número anterior as retenções que, nos termos do n.° 3, tenham caráter definitivo, em que são aplicáveis as correspondentes taxas previstas no artigo 87.°
6 — A obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC ocorre na data que estiver estabelecida para obrigação idêntica no Código do IRS ou, na sua falta, na data da colocação à disposição dos rendimentos, devendo as importâncias retidas ser entregues ao Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foram deduzidas e essa entrega ser feita nos termos estabelecidos no Código do IRS ou em legislação complementar.»
10 O n.° 29 do quadro geral que figura no [Código do Imposto do Selo], na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, dispunha:
«29 — Valor líquido global dos organismos de investimento coletivo abrangidos pelo artigo 22.° do EBF:
29.1 — Organismos de investimento coletivo que invistam, exclusivamente, em instrumentos do mercado monetário e depósitos — sobre o referido valor, por cada trimestre: 0,0025 %.
29.2 — Outros organismos de investimento coletivo — sobre o referido valor, por cada trimestre: 0,0125 %.»
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
11 A AllianzGI‑Fonds AEVN é um organismo de investimento coletivo (OIC) de tipo aberto, constituído ao abrigo da legislação alemã e com sede na Alemanha. É gerido por uma entidade gestora cuja sede também se situa na Alemanha, não sendo essa entidade residente nem possuindo um estabelecimento estável em Portugal.
12 Uma vez que tem residência fiscal na Alemanha, a AllianzGI‑Fonds AEVN está isenta do imposto sobre o rendimento das sociedades nesse Estado‑Membro ao abrigo da regulamentação alemã. Este estatuto fiscal impede‑a de recuperar os impostos pagos no estrangeiro sob a forma de crédito fiscal por dupla tributação internacional, ou de formular um pedido de reembolso desses impostos.
13 Nos anos de 2015 e de 2016, a AllianzGI‑Fonds AEVN era detentora de participações sociais em diversas sociedades residentes em Portugal. Os dividendos recebidos a este título durante esses dois anos foram sujeitos, em conformidade com o artigo 87.°, n.° 4, alínea c), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, a tributação por retenção na fonte liberatória, à taxa de 25 %, pelo valor total de 39 371,29 euros.
14 Relativamente ao ano de 2015, a AllianzGI‑Fonds AEVN obteve o reembolso de 5 065,98 euros ao abrigo da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha, na qual se prevê a taxa máxima de 15 % para a tributação dos dividendos.
15 Em 29 de dezembro de 2017, a AllianzGI‑Fonds AEVN apresentou, na Autoridade Tributária e Aduaneira, uma reclamação graciosa dos atos através dos quais esta última procedeu à retenção na fonte do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas relativo aos anos de 2015 e 2016. Pedia a anulação desses atos por violação do direito da União, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal. Essa reclamação foi indeferida por Decisão de 13 de novembro de 2018.
16 Em 12 de fevereiro de 2019, a AllianzGI‑Fonds AEVN recorreu ao órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal Arbitral Tributário (Centro de Arbitragem Administrativa — CAAD) (Portugal), pedindo a anulação dos atos de retenção na fonte pela quantia remanescente, de 34 305,31 euros.
17 Perante o órgão jurisdicional de reenvio, a AllianzGI‑Fonds AEVN alega que, nos anos de 2015 e 2016, os OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa estavam sujeitos a um regime fiscal mais favorável do que aquele a que foi sujeita em Portugal, na medida em que, relativamente aos dividendos pagos por sociedades estabelecidas em Portugal, esses organismos estavam isentos, ao abrigo do artigo 22.°, n.° 3, do EBF, do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas. A AllianzGI‑Fonds AEVN considera que, sendo tributada à taxa de 25 % sobre os dividendos que lhe são pagos por sociedades estabelecidas em Portugal, é objeto de um tratamento discriminatório proibido pelo artigo 18.° TFUE, bem como de uma restrição à liberdade de circulação de capitais proibida pelo artigo 63.° TFUE.
18 A Autoridade Tributária e Aduaneira afirma, por sua vez, que o regime fiscal português aplicável aos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação nacional e o regime aplicável aos OIC constituídos e estabelecidos na Alemanha não são, por natureza, comparáveis, uma vez que o primeiro destes regimes também não exclui a tributação dos dividendos a cargo dos organismos que abrange, seja através do imposto do selo ou do imposto específico previsto no artigo 88.°, n.° 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas. Tendo em conta que a tributação dos dividendos é feita segundo modalidades diferentes, nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa seja mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal por um organismo como a AllianzGI‑Fonds AEVN. A Autoridade Tributária e Aduaneira acrescenta que também não está demonstrado que a parte do imposto não recuperada pela AllianzGI‑Fonds AEVN não possa ser recuperada pelos investidores desta última.
19 O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se, ao isentar do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas os dividendos pagos por sociedades estabelecidas em Portugal a OIC com sede neste Estado‑Membro e que foram constituídos e operam de acordo com a legislação portuguesa, ao mesmo tempo que tributa à taxa de 25 % os dividendos pagos por essas sociedades a OIC com sede noutro Estado‑Membro da União, não sendo assim constituídos nem operando de acordo com a legislação nacional, o regime fiscal português é contrário ao artigo 56.° TFUE relativo à livre prestação de serviços ou ao artigo 63.° TFUE relativo à livre circulação de capitais.
20 Nestas condições, o Tribunal Arbitral Tributário (Centro de Arbitragem Administrativa — CAAD) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) O [artigo 63.° TFUE], relativo à livre circulação de capitais, ou o [artigo 56.° TFUE], relativo à livre prestação de serviços, opõem‑se a um regime fiscal como o que está em causa no litígio no processo principal, constante do artigo 22.° do EBF, que prevê a retenção na fonte de imposto com caráter liberatório sobre os dividendos recebidos de sociedades portuguesas a favor de OIC não residentes em Portugal e estabelecidos noutros países da UE, ao mesmo tempo que os OIC constituídos ao abrigo da legislação fiscal portuguesa e residentes fiscais em Portugal podem beneficiar de uma isenção de retenção na fonte sobre tais rendimentos?
2) Ao prever uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OIC não residentes e reservar aos OIC residentes a possibilidade de obter a isenção de retenção na fonte, a regulamentação nacional em causa no processo principal procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OIC não residentes, uma vez que a estes últimos não lhes é dada qualquer possibilidade de aceder a semelhante isenção?
3) O enquadramento fiscal dos detentores de participações dos OIC será relevante para efeitos de apreciação do caráter discriminatório da legislação portuguesa, tendo presente que esta prevê um tratamento fiscal autónomo e distinto (i) para os OIC (residentes) e (ii) para os respetivos detentores de participações dos OIC? Ou, tendo presente que o regime fiscal dos OIC residentes não é, de todo, alterado ou afetado pela circunstância de os respetivos participantes serem residentes ou não residentes em Portugal, a apreciação da comparabilidade das situações para fins de determinar o caráter discriminatório da referida regulamentação deve ser realizada apenas por referência à fiscalidade aplicável ao nível do veículo de investimento?
4) Será admissível a diferença de tratamento entre OIC residentes e [OIC] não residentes em Portugal, tendo em conta que as pessoas singulares ou coletivas residentes em Portugal, que sejam detentoras de participações de OIC (residentes ou não residentes) são, em ambos os casos, igualmente sujeitas (e, em regra, não isentas) a tributação sobre os rendimentos distribuídos pelos OIC, sujeitando os detentores de participações em OIC não residentes a uma fiscalidade mais elevada?
5) Tendo em consideração que a discriminação em análise no presente litígio diz respeito a uma diferença na tributação do rendimento relativamente a dividendos distribuídos pelos OIC residentes aos respetivos detentores de participações nos OIC, é legítimo, para efeitos da análise da comparabilidade da tributação sobre o rendimento considerar outros impostos, taxas ou tributos incorridos no âmbito dos investimentos efetuados pelos OIC? Em particular, é legítimo e admissível, para efeitos da análise de comparabilidade, considerar o impacto associado a impostos sobre o património sobre despesas ou outros, que não estritamente o imposto sobre o rendimento dos OIC, incluindo eventuais tributações autónomas?»
Quanto ao pedido de reabertura da fase oral do processo
21 Na sequência da apresentação das conclusões da advogada‑geral, a AllianzGI‑Fonds AEVN, por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 21 de julho de 2021, pediu que fosse ordenada a reabertura da fase oral do processo, ao abrigo do artigo 83.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.
22 Em apoio do seu pedido, a AllianzGI‑Fonds AEVN alega, em substância, que as conclusões da advogada‑geral, na medida em que examinam a questão da aplicabilidade, no processo principal, do artigo 14.°, n.° 3, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, se baseiam em elementos novos, ainda não debatidos entre as partes. A AllianzGI‑Fonds AEVN refere‑se, em especial, aos n.os 10, 20 e 92 dessas conclusões. Além disso, contesta tanto a interpretação feita pela advogada‑geral no que respeita à pretensa necessidade de evitar a não tributação dos dividendos distribuídos por OIC não residentes como a análise efetuada pela mesma no que respeita à técnica de tributação dos dividendos efetuada através do imposto do selo.
23 A este respeito, importa recordar, por um lado, que o Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça não preveem a possibilidade de os interessados visados no artigo 23.° deste Estatuto apresentarem observações em resposta às conclusões apresentadas pelo advogado‑geral (Acórdão de 3 de março de 2020, Tesco‑Global Áruházak, C‑323/18, EU:C:2020:140, n.° 22 e jurisprudência referida).
24 Por outro lado, por força do artigo 252.°, segundo parágrafo, TFUE, cabe ao advogado‑geral apresentar publicamente, com toda a imparcialidade e independência, conclusões fundamentadas sobre as causas que, nos termos do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, requeiram a sua intervenção. O Tribunal de Justiça não está vinculado por essas conclusões nem pela fundamentação no termo da qual o advogado‑geral baseia essas conclusões. Por conseguinte, o facto de uma parte interessada discordar das conclusões do advogado‑geral, sejam quais forem as questões nelas examinadas, não constitui, por si só, um fundamento justificativo da reabertura da fase oral do processo (Acórdão de 3 de março de 2020, Tesco‑Global Áruházak, C‑323/18, EU:C:2020:140, n.° 23 e jurisprudência referida).
25 Não obstante, o Tribunal pode, a qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, em conformidade com o artigo 83.° do seu Regulamento de Processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido ou ainda quando o processo deve ser decidido com base num argumento que não foi debatido entre os interessados (Acórdão de 3 de março de 2020, Tesco‑Global Áruházak, C‑323/18, EU:C:2020:140, n.° 24 e jurisprudência referida).
26 No caso em apreço, o Tribunal de Justiça considera, no entanto, ouvida a advogada‑geral, que dispõe, no termo da fase escrita e tendo em conta, por um lado, as informações prestadas pelo órgão jurisdicional de reenvio em resposta ao pedido de informações complementares do Tribunal de Justiça e, por outro, as respostas dadas pelas partes às perguntas escritas do Tribunal de Justiça, de todos os elementos necessários para decidir. Por outro lado, o presente processo não deve ser decidido com base num argumento que não foi debatido entre as partes e o pedido de reabertura da fase oral do processo não revela nenhum facto novo que possa influenciar a decisão a proferir.
27 Além disso, à luz da jurisprudência que figura no n.° 24 do presente acórdão, as contestações da AllianzGI‑Fonds AEVN relativamente à análise efetuada pelas conclusões da advogada‑geral sobre a pretensa necessidade de evitar a não tributação dos dividendos distribuídos por OIC não residentes, bem como sobre a técnica de tributação dos dividendos efetuada através do imposto do selo, não podem justificar a reabertura da fase oral do processo.
28 Nestas condições, o Tribunal de Justiça considera, ouvida a advogada‑geral, que não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.
Quanto às questões prejudiciais
29 Com as suas cinco questões, que há que examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 56.° e 63.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção. Esse órgão jurisdicional interroga‑se, por um lado, sobre a questão de saber se esse tratamento fiscal diferente em função do local de residência da instituição beneficiária pode ser justificado pelo facto de os OIC residentes estarem sujeitos a outra técnica de tributação e, por outro, se a apreciação da comparabilidade das situações dos OIC residentes e dos OIC não residentes para efeitos de determinar se existe uma diferença objetiva entre estes, de molde a justificar a diferença de tratamento instituída pela legislação desse Estado‑Membro, deve ser efetuada apenas ao nível do veículo de investimento ou deve igualmente ter em conta a situação dos detentores de participações sociais.
Quanto à liberdade de circulação aplicável
30 Uma vez que as questões são submetidas à luz tanto do artigo 56.° TFUE como do artigo 63.° TFUE, há que determinar, a título preliminar, se e, sendo caso disso, em que medida uma legislação nacional como a que está em causa no processo principal é suscetível de afetar o exercício da livre prestação de serviços e/ou a livre circulação de capitais.
31 A este respeito, resulta de jurisprudência assente que, para determinar se uma legislação nacional é abrangida por uma ou outra das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado FUE, é necessário ter em conta o objetivo da legislação em causa (v., neste sentido, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 33 e jurisprudência referida, e de 3 de março de 2020, Tesco‑Global Áruházak, C‑323/18, EU:C:2020:140, n.° 51 e jurisprudência referida).
32 O litígio no processo principal diz respeito a um pedido de anulação de atos que procederam à retenção na fonte dos dividendos pagos à recorrente no processo principal por sociedades estabelecidas em Portugal relativamente aos anos de 2015 e 2016, bem como à compatibilidade com o direito da União de uma legislação nacional que reserva a possibilidade de beneficiar da isenção dessa retenção na fonte aos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa ou cuja entidade gestora opera em Portugal através de um estabelecimento estável.
33 Uma vez que a legislação nacional em causa no processo principal tem, assim, por objeto o tratamento fiscal de dividendos recebidos pelos OIC, deve considerar‑se que a situação em causa no processo principal é abrangida pelo âmbito de aplicação da livre circulação de capitais (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.os 35 e 36).
34 Além disso, admitindo que a legislação em causa no processo principal tem por efeito proibir, perturbar ou tornar menos atrativas as atividades de um OIC estabelecido num Estado‑Membro diferente da República Portuguesa, onde presta legalmente serviços análogos, esses efeitos seriam a consequência inevitável do tratamento fiscal de que são objeto os dividendos pagos a esse organismo não residente e não justificam uma análise distinta das questões prejudiciais à luz da livre prestação de serviços. Com efeito, esta liberdade afigura‑se, neste caso, secundária relativamente à livre circulação de capitais e pode estar‑lhe associada (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 37).
35 Atendendo às considerações precedentes, há que examinar a legislação nacional em causa no processo principal exclusivamente à luz do artigo 63.° TFUE.
Quanto à existência de uma restrição à livre circulação de capitais
36 Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que as medidas proibidas pelo artigo 63.°, n.° 1, TFUE, enquanto restrições aos movimentos de capitais, incluem as que são suscetíveis de dissuadir os não residentes de investir num Estado‑Membro ou de dissuadir os residentes de investir noutros Estados (v., designadamente, Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek, C‑252/14, EU:C:2016:402, n.° 27 e jurisprudência referida, e de 30 de janeiro de 2020, Köln‑Aktienfonds Deka, C‑156/17, EU:C:2020:51, n.° 49 e jurisprudência referida).
37 No caso em apreço, é facto assente que a isenção fiscal prevista pela legislação nacional em causa no processo principal é concedida aos OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa, ao passo que os dividendos pagos a OIC estabelecidos noutro Estado‑Membro não podem beneficiar dessa isenção.
38 Ao proceder a uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OIC não residentes e ao reservar aos OIC residentes a possibilidade de obter a isenção dessa retenção na fonte, a legislação nacional em causa no processo principal procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OIC não residentes.
39 Esse tratamento desfavorável pode dissuadir, por um lado, os OIC não residentes de investirem em sociedades estabelecidas em Portugal e, por outro, os investidores residentes em Portugal de adquirirem participações sociais em OIC e constitui, por conseguinte, uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63.° TFUE (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.os 44, 45 e jurisprudência referida).
40 Não obstante, segundo o artigo 65.°, n.° 1, alínea a), TFUE, o disposto no artigo 63.° TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.
41 Esta disposição, enquanto derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, é de interpretação estrita. Por conseguinte, não pode ser interpretada no sentido de que qualquer legislação fiscal que comporte uma distinção entre os contribuintes em função do lugar em que residam ou do Estado‑Membro onde invistam os seus capitais é automaticamente compatível com o Tratado FUE. Com efeito, a derrogação prevista no artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE é ela própria limitada pelo disposto no artigo 65.º, n.º 3, TFUE, que prevê que as disposições nacionais a que se refere o n.º 1 desse artigo «não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.º [TFUE]» [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.° 29 e jurisprudência referida].
42 O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, por conseguinte, há que distinguir as diferenças de tratamento permitidas pelo artigo 65.°, n.° 1, alínea a), TFUE das discriminações proibidas pelo artigo 65.°, n.° 3, TFUE. Ora, para que uma legislação fiscal nacional possa ser considerada compatível com as disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento daí decorrente diga respeito a situações que não sejam objetivamente comparáveis ou se justifique por uma razão imperiosa de interesse geral [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.° 30 e jurisprudência referida].
Quanto à existência de situações objetivamente comparáveis
43 Para apreciar a comparabilidade das situações em causa, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, por um lado, sobre a questão de saber se a situação dos detentores de participações deve ser tida em conta do mesmo modo que a dos OIC e, por outro, sobre a eventual pertinência da existência, no sistema fiscal português, de certos impostos aos quais apenas estão sujeitos os OIC residentes.
44 O Governo português alega, em substância, que as respetivas situações dos OIC residentes e dos OIC não residentes não são objetivamente comparáveis uma vez que a tributação dos dividendos recebidos por estas duas categorias de organismos de investimento de sociedades residentes em Portugal é regulada por técnicas de tributação diferentes — a saber, por um lado, esses dividendos são objeto de retenção na fonte quando são pagos a um OIC não residente e, por outro, estão sujeitos ao imposto do selo e ao imposto específico previsto no artigo 88.°, n.° 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas quando são pagos a um OIC residente.
45 Este Governo indica igualmente que resulta do artigo 22.°‑A do EBF que os dividendos distribuídos por OIC residentes a detentores de participações sociais residentes em território português ou que sejam imputáveis a um estabelecimento estável situado neste território são tributados à taxa de 28 % (quando os beneficiários estão sujeitos ao imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) ou de 25 % (quando os beneficiários estão sujeitos ao imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas), ao passo que os dividendos pagos a detentores de participações sociais que não residem no território português e que não têm estabelecimento estável neste último estão, em princípio, isentos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (com algumas exceções destinadas essencialmente a prevenir abusos).
46 Segundo o referido Governo, há uma estreita coerência entre a tributação dos rendimentos dos OIC e dos detentores de participações sociais nestes organismos. Assim, o modelo português de tributação dos OIC, de natureza «compósita», conjuga estruturalmente os impostos incidentes, por um lado, sobre os OIC residentes, ou seja, o imposto do selo e o imposto específico previsto no artigo 88.°, n.° 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, bem como, por outro, os incidentes sobre os detentores de participações sociais em tais organismos, conforme referidos no número anterior. Estas diferentes tributações, muito bem integradas entre si, sendo cada uma delas imprescindível à coerência do sistema de tributação instituído, devem ser entendidas como um todo.
47 Além disso, este mesmo Governo acrescenta, em substância, que, no âmbito da apreciação da comparabilidade das situações em causa, não se deve abstrair dos efeitos da transparência fiscal que caracteriza a relação entre a recorrente no processo principal e os detentores de participações sociais na mesma, o que leva a que a retenção na fonte efetuada em Portugal possa ser imediatamente repercutida nos detentores de participações sociais que, não estando isentos de imposto, podem imputar ou, ainda, creditar a sua participação dessa retenção efetuada em Portugal sobre o imposto do qual são devedores na Alemanha.
48 Por último, o Governo português considera que, ao ter livremente optado por não operar em Portugal através de um estabelecimento estável, a recorrente no processo principal autoexcluiu‑se de qualquer comparação com os OIC estabelecidos em Portugal, sendo a sua situação, isso sim, comparável a todas as situações das demais entidades não residentes e cujos dividendos auferidos em Portugal são sempre tributados a taxas nunca inferiores a 25 %.
49 Resulta de jurisprudência constante que, a partir do momento em que um Estado, de modo unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só os contribuintes residentes mas também os contribuintes não residentes, relativamente aos dividendos que auferem de uma sociedade residente, a situação dos referidos contribuintes não residentes assemelha‑se à dos contribuintes residentes (Acórdão de 22 de novembro de 2018, Sofina e o., C‑575/17, EU:C:2018:943, n.° 47 e jurisprudência referida).
50 Quanto ao argumento do Governo português que figura no n.° 44 do presente acórdão, há que recordar que, nas circunstâncias que deram origem ao Acórdão de 22 de dezembro de 2008, Truck Center (C‑282/07, EU:C:2008:762), o Tribunal de Justiça admitiu a aplicação, aos beneficiários de rendimentos de capitais, de técnicas de tributação diferentes consoante esses beneficiários sejam residentes ou não residentes, uma vez que esta diferença de tratamento diz respeito a situações que não são objetivamente comparáveis (v., neste sentido, Acórdão de 22 de dezembro de 2008, Truck Center, C‑282/07, EU:C:2008:762, n.° 41).
51 Do mesmo modo, no processo que deu origem ao Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek (C‑252/14, EU:C:2016:402), o Tribunal de Justiça declarou que o tratamento diferenciado da tributação dos dividendos pagos a fundos de pensões segundo a qualidade de residente ou de não residente destes últimos, resultante da aplicação, a esses fundos respetivos, de dois métodos de tributação diferentes, era justificado pela diferença de situação entre estas duas categorias de contribuintes à luz do objetivo prosseguido pela regulamentação nacional em causa nesse processo, bem como do seu objeto e do seu conteúdo.
52 No entanto, sob reserva da verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, a legislação nacional em causa no processo principal não se limita a prever diferentes modalidades de cobrança de imposto em função do local de residência do OIC beneficiário de dividendos de origem nacional, mas prevê, na realidade, uma tributação sistemática dos referidos dividendos que onera apenas os organismos não residentes (v., por analogia, Acórdão de 8 de novembro de 2012, Comissão/Finlândia, C‑342/10, EU:C:2012:688, n.° 44 e jurisprudência referida).
53 A este propósito, importa salientar, por um lado, no que respeita ao imposto do selo, que resulta tanto das observações escritas apresentadas pelas partes como da resposta do órgão jurisdicional de reenvio ao pedido de informações do Tribunal de Justiça que, pelo facto de a sua matéria coletável ser constituída pelo valor líquido contabilístico dos OIC, esse imposto do selo é um imposto sobre o património, que não pode ser equiparado a um imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas.
54 Além disso, como salientou a advogada‑geral no n.° 47 das suas conclusões, no processo principal, a legislação fiscal portuguesa distingue, no caso dos OIC residentes, entre o rendimento do capital acumulado e o que é imediatamente redistribuído, apenas o primeiro sendo englobado na matéria coletável do referido imposto do selo. Ora, este aspeto basta, por si só, para distinguir este processo do que deu origem ao Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek (C‑252/14, EU:C:2016:402).
55 Com efeito, mesmo considerando que esse mesmo imposto do selo possa ser equiparado a um imposto sobre os dividendos, um OIC residente pode escapar a tal tributação dos dividendos procedendo à sua distribuição imediata, ao passo que esta possibilidade não está aberta a um OIC não residente.
56 Por outro lado, no que se refere ao imposto específico previsto no artigo 88.°, n.° 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, resulta das indicações da Autoridade Tributária, contidas na decisão de reenvio, que, por força desta disposição, este imposto só incide sobre os dividendos recebidos por OIC residentes quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período. Assim, o imposto previsto pela referida disposição só incide sobre os dividendos de origem nacional recebidos por um OIC residente em casos limitados, pelo que não pode ser equiparado ao imposto geral de que são objeto os dividendos de origem nacional recebidos pelos OIC não residentes.
57 Por conseguinte, a circunstância de os OIC não residentes não estarem sujeitos ao imposto do selo e ao imposto específico previsto no artigo 88.°, n.° 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas não os coloca numa situação objetivamente diferente em relação aos OIC residentes no que se refere à tributação dos dividendos de origem portuguesa.
58 Em seguida, quanto ao argumento do Governo português que figura no n.° 48 do presente acórdão, há que salientar que, como alegou a Comissão em resposta às perguntas escritas do Tribunal de Justiça, no domínio da livre prestação de serviços, ao abrigo do artigo 56.° TFUE, os operadores económicos devem ser livres de escolher os meios adequados para exercer as suas atividades num Estado‑Membro diferente do da sua residência, independentemente de se estabelecerem ou não de modo permanente nesse outro Estado‑Membro, não devendo esta liberdade ser limitada por disposições fiscais discriminatórias.
59 Além disso, na medida em que o argumento do Governo português se refere à pretensa necessidade de ter em conta a situação dos detentores de participações sociais, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a comparabilidade de uma situação transfronteiriça com uma situação interna do Estado‑Membro em causa deve ser examinada tendo em conta o objetivo prosseguido pelas disposições nacionais controvertidas (v., designadamente, Acórdão de 30 de abril de 2020, Société Générale, C‑565/18, EU:C:2020:318, n.° 26 e jurisprudência referida), bem como o objeto e o conteúdo destas últimas (v., designadamente, Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek, C‑252/14, EU:C:2016:402, n.° 48 e jurisprudência referida).
60 Por outro lado, apenas os critérios de distinção pertinentes estabelecidos pela legislação em causa devem ser tidos em conta para apreciar se a diferença de tratamento resultante dessa legislação reflete uma diferença de situação objetiva (v., neste sentido, Acórdão de 2 de junho de 2016, Pensioenfonds Metaal en Techniek, C‑252/14, EU:C:2016:402, n.° 49 e jurisprudência referida).
61 No caso em apreço, no que diz respeito, em primeiro lugar, ao objeto, ao conteúdo e ao objetivo do regime português em matéria de tributação dos dividendos, seja ao nível dos próprios OIC ou dos seus detentores de participações sociais, resulta tanto da resposta do órgão jurisdicional de reenvio ao pedido de informação do Tribunal de Justiça como da resposta do Governo português às perguntas escritas que lhe foram dirigidas no âmbito do presente processo que o referido regime foi concebido numa lógica de «tributação à saída», ou seja, os OIC que são constituídos e operam de acordo com a legislação portuguesa estão isentos do imposto sobre o rendimento, sendo o encargo que este último representa transferido para os detentores de participações sociais que têm a qualidade de residentes, estando os detentores de participações sociais não residentes dele isentos.
62 Com efeito, o Governo português precisou que o regime nacional em matéria de tributação dos dividendos visava alcançar objetivos como, nomeadamente, evitar a dupla tributação económica internacional e transferir a tributação na esfera dos OIC para a esfera dos respetivos participantes, procurando assim que a tributação incidente sobre estes rendimentos seja aproximadamente equivalente à que ocorreria caso esses rendimentos tivessem sido obtidos diretamente pelos participantes nesses mesmos OIC.
63 Caberá ao órgão jurisdicional de reenvio, que tem competência exclusiva para interpretar o direito nacional, tendo em conta todos os elementos da legislação fiscal em causa no processo principal e o conjunto dos elementos constitutivos desse mesmo regime de tributação, determinar o objetivo principal prosseguido pela legislação nacional em causa no processo principal (v., neste sentido, Acórdão de 30 de janeiro de 2020, Köln‑Aktienfonds Deka, C‑156/17, EU:C:2020:51, n.° 79).
64 Se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que o regime português em matéria de tributação dos dividendos visa evitar a dupla tributação dos dividendos pagos por sociedades residentes, atendendo à qualidade de intermediário dos OIC face aos seus detentores de participações sociais, importa recordar que o Tribunal de Justiça já declarou que, relativamente às medidas previstas por um Estado‑Membro para evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica dos rendimentos distribuídos por uma sociedade residente, as sociedades beneficiárias residentes não se encontram necessariamente numa situação comparável à das sociedades beneficiárias não residentes (Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 53 e jurisprudência referida).
65 Todavia, como resulta do n.° 49 do presente acórdão, a partir do momento em que um Estado‑Membro, de modo unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só as sociedades residentes mas também as sociedades não residentes, relativamente aos rendimentos que auferem de uma sociedade residente, a situação das referidas sociedades não residentes assemelha‑se à das sociedades residentes.
66 Com efeito, é unicamente o exercício por esse mesmo Estado da sua competência fiscal que, independentemente de tributação noutro Estado‑Membro, cria um risco de tributação em cadeia ou de dupla tributação económica. Em tal caso, para que as sociedades beneficiárias não residentes não sejam confrontadas com uma restrição à livre circulação de capitais, proibida, em princípio, pelo artigo 63.° TFUE, o Estado de residência da sociedade distribuidora deve assegurar que, em relação ao mecanismo previsto no seu direito nacional para evitar ou atenuar a tributação em cadeia ou a dupla tributação económica, as sociedades não residentes sejam submetidas a um tratamento equivalente ao tratamento de que beneficiam as sociedades residentes (Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 55 e jurisprudência referida).
67 Tendo a República Portuguesa optado por exercer a sua competência fiscal sobre os rendimentos auferidos pelos OIC não residentes, estes encontram‑se, por conseguinte, numa situação comparável à dos OIC residentes em Portugal no que respeita ao risco de dupla tributação económica dos dividendos pagos pelas sociedades residentes em Portugal (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 56 e jurisprudência referida).
68 Caso o órgão jurisdicional de reenvio chegue à conclusão de que o regime português em matéria de tributação dos dividendos visa, no intuito de não renunciar pura e simplesmente à tributação dos dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal, transferir essa tributação para a esfera dos detentores de participações sociais dos OIC, há que recordar que o Tribunal de Justiça já declarou que, se o objetivo da legislação nacional em causa for deslocar o nível de tributação do veículo de investimento para o acionista desse veículo, são, em princípio, as condições materiais do poder de tributação sobre os rendimentos dos acionistas que devem ser consideradas determinantes e não a técnica de tributação utilizada (Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 60).
69 Ora, um OIC não residente pode ter detentores de participações sociais que tenham residência fiscal em Portugal e sobre cujos rendimentos este Estado‑Membro exerce o seu poder de tributação. Nesta perspetiva, um OIC não residente encontra‑se numa situação objetivamente comparável à de um OIC residente em Portugal (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 61).
70 É certo que a República Portuguesa não pode tributar os detentores de participações sociais não residentes sobre os dividendos distribuídos por OIC não residentes, como aliás o Governo português admitiu tanto nas suas observações escritas como em resposta às perguntas que lhe foram submetidas pelo Tribunal de Justiça. Contudo, essa impossibilidade é coerente com a lógica de deslocação do nível de tributação do veículo para o detentor de participações sociais (v., por analogia, Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 62).
71 No que respeita, em segundo lugar, aos critérios de distinção pertinentes, na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça referida no n.° 60 do presente acórdão, há que observar que o único critério de distinção estabelecido pela legislação nacional em causa no processo principal se baseia no lugar de residência dos OIC, sujeitando apenas os organismos não residentes a uma retenção na fonte dos dividendos que recebem.
72 Ora, como resulta de jurisprudência do Tribunal de Justiça, a situação de um OIC residente que beneficia de uma distribuição de dividendos é comparável à de um OIC beneficiário não residente, na medida em que, em ambos os casos, os lucros realizados podem, em princípio, ser objeto de dupla tributação económica ou de tributação em cadeia (v., neste sentido, Acórdão de 10 de abril de 2014, Emerging Markets Series of DFA Investment Trust Company, C‑190/12, EU:C:2014:249, n.° 58 e jurisprudência referida).
73 Por conseguinte, o critério de distinção a que se refere a legislação nacional em causa no processo principal, que tem por objeto unicamente o lugar de residência dos OIC, não permite concluir pela existência de uma diferença objetiva de situações entre os organismos residentes e os organismos não residentes.
74 Atendendo a todos os elementos precedentes, há que concluir que, no caso em apreço, a diferença de tratamento entre os OIC residentes e os OIC não residentes diz respeito a situações objetivamente comparáveis.
Quanto à existência de uma razão imperiosa de interesse geral
75 Há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma restrição à livre circulação de capitais pode ser admitida se se justificar por razões imperiosas de interesse geral, for adequada a garantir a realização do objetivo que prossegue e não for além do que é necessário para alcançar esse objetivo [Acórdão de 29 de abril de 2021, Veronsaajien oikeudenvalvontayksikkö (Rendimentos distribuídos por OICVM), C‑480/19, EU:C:2021:334, n.° 56 e jurisprudência referida].
76 No caso em apreço, há que constatar que, embora o órgão jurisdicional de reenvio não invoque essas razões no pedido de decisão prejudicial, uma vez que este se concentra na eventual comparabilidade das situações em causa no processo principal, o Governo português alega, tanto nas suas observações escritas como em resposta às perguntas que lhe foram submetidas pelo Tribunal de Justiça, que a restrição à livre circulação de capitais efetuada pela legislação nacional em causa no processo principal se justifica à luz de duas razões imperiosas de interesse geral, a saber, por um lado, a necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional e, por outro, a de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os dois Estados‑Membros em causa, ou seja, a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha.
77 No que respeita, em primeiro lugar, à necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional, o Governo português considera, como resulta do n.° 46 do presente acórdão, que o modelo de tributação português dos dividendos constitui um modelo «compósito». Assim, só seria possível garantir a coerência deste modelo se a entidade gestora dos OIC não residentes operasse em Portugal através de um estabelecimento estável, de modo a que essa entidade pudesse concretizar as retenções na fonte necessárias junto dos detentores de participações sociais residentes, bem como, em certos casos excecionais orientados por considerações ligadas ao facto de evitar a planificação fiscal, junto dos detentores de participações sociais não residentes.
78 A este respeito, há que recordar que, embora o Tribunal de Justiça tenha declarado que a necessidade de preservar a coerência de um regime fiscal nacional pode justificar uma regulamentação nacional suscetível de restringir as liberdades fundamentais (v., neste sentido, Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.° 50 e jurisprudência referida, e de 13 de março de 2014, Bouanich, C‑375/12, EU:C:2014:138, n.° 69 e jurisprudência referida), precisou, contudo, que, para que um argumento baseado nessa justificação possa ser acolhido, é necessário que esteja demonstrada a existência de uma relação direta entre o benefício fiscal em causa e a compensação desse benefício por uma determinada imposição fiscal (v., neste sentido, Acórdão de 8 de novembro de 2012, Comissão/Finlândia, C‑342/10, EU:C:2012:688, n.° 49 e jurisprudência referida, e de 13 de novembro de 2019, College Pension Plan of British Columbia, C‑641/17, EU:C:2019:960, n.° 87).
79 Ora, no presente processo, como resulta do n.° 71 do presente acórdão, a isenção da retenção na fonte dos dividendos em benefício dos OIC residentes não está sujeita à condição de os dividendos recebidos pelos organismos serem redistribuídos por estes e de a sua tributação na esfera dos detentores de participações sociais permitir compensar a isenção da retenção na fonte (v., por analogia, Acórdão de 10 de maio de 2012, Santander Asset Management SGIIC e o., C‑338/11 a C‑347/11, EU:C:2012:286, n.° 52, e de 10 de abril de 2014, Emerging Markets Series of DFA Investment Trust Company, C‑190/12, EU:C:2014:249, n.° 93).
80 Consequentemente, não há uma relação direta, na aceção da jurisprudência referida no n.° 78 do presente acórdão, entre a isenção da retenção na fonte dos dividendos de origem nacional auferidos por um OIC residente e a tributação dos referidos dividendos enquanto rendimentos dos detentores de participações sociais nesse organismo.
81 A necessidade de preservar a coerência do regime fiscal nacional não pode, por conseguinte, ser invocada para justificar a restrição à livre circulação de capitais induzida pela legislação nacional em causa no processo principal.
82 No que diz respeito, em segundo lugar, à necessidade de preservar uma repartição equilibrada do poder de tributar entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha, há que recordar que, como o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente, a justificação baseada na preservação da repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados‑Membros pode ser admitida quando o regime em causa visa prevenir comportamentos suscetíveis de comprometer o direito de um Estado‑Membro exercer a sua competência fiscal em relação às atividades realizadas no seu território (v., neste sentido, Acórdão de 22 de novembro de 2018, Sofina e o., C‑575/17, EU:C:2018:943, n.° 57 e jurisprudência referida, e de 20 de janeiro de 2021, Lexel, C‑484/19, EU:C:2021:34, n.° 59).
83 No entanto, como o Tribunal de Justiça também já declarou, quando um Estado‑Membro tenha optado, como na situação em causa no processo principal, por não tributar os OIC residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados‑Membros para justificar a tributação dos OIC não residentes beneficiários desses rendimentos (Acórdão de 21 de junho de 2018, Fidelity Funds e o., C‑480/16, EU:C:2018:480, n.° 71 e jurisprudência referida).
84 Daqui resulta que a justificação baseada na preservação de uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados‑Membros também não pode ser acolhida.
85 Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:
O artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.”.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
71- Como é sabido, resulta da Constituição da República Portuguesa, em particular do seu artigo 8, nº 4, assim como pela jurisprudência comunitária e nacional, que o Direito europeu é, não só válido na ordem jurídica interna, como tem primazia sobre o direito interno e que as decisões sobre o alcance e as eventuais divergências entre o Direito da União Europeia e o Direito nacional podem, em última instância, ser resolvidas mediante o reenvio prejudicial ao TJUE, que as resolverá, cabendo aos tribunais portugueses conformar-se com as mesmas.
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Ora, no caso em apreciação o Acórdão do TJUE não podia ser mais claro quanto à desconformidade do nosso Direito interno com o pilar da liberdade de circulação de capitais, como vimos. Na verdade, na sua conclusão, o TJUE conclui inequivocamente no sentido de que a legislação – neste caso a portuguesa- não pode determinar que os dividendos distribuídos a OIC constituídos de acordo com a legislação nacional estão isentos de retenção na fonte enquanto OIC não residentes que recebam dividendos originários de sociedades localizadas em Portugal são sujeitos a retenção na fonte.
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Acresce que, seja na ótica de o legislador português ter feito tal discriminação com fundamento em que se visa com isso evitar a dupla tributação económica, a verdade é que o TJUE conclui que tal não afasta a necessidade de tratar de forma idêntica sociedades residentes e sociedades não residentes, o que, uma vez mais, afastaria do plano da legalidade a forma como tal discriminação se concretizou no plano legislativo interno.
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Por outro lado, se a justificação fosse transferir para os detentores das participações o regime diferenciador, então tal diferenciação ter-se-ia de fazer ao nível dos detentores das participações e não dos organismos de investimento, até porque é irrelevante para o detentor da participação saber se o OIC está ou não isento de retenção na fonte.
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Resta abordar a questão dos juros indemnizatórios. Quanto a estes, embora a Requerente não faça menção expressa aos mesmos – pede a anulação da liquidação, com todas as consequências legais (e uma delas são os juros indemnizatórios) - a verdade é que não tem de o fazer de forma expressa, atento, designadamente, o artigo 100º da LGT.
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Neste particular, seguimos de perto a decisão arbitral proferida no processo nº 90/2019-T, onde no ponto 66 se diz que “na sua atuação, a AT aplicou as normas jurídicas nacionais em vigor, a despeito de as mesmas violarem o direito da União Europeia, tal como ele vem sendo interpretado pelo TJUE. Sendo a primazia do direito da União Europeia relativamente ao direito nacional uma primazia de aplicação e não uma primazia de validade, cabe ao presente Tribunal arbitral desaplicar o direito nacional contrário ao Direito da União Europeia, declarando a respetiva ilegalidade. Caso em que, nos termos do artigo 43º, nº 3 da LGT, são devidos juros indemnizatórios, a partir do trânsito em julgado da sentença”.
5- DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal arbitral:
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Declarar a ilegalidade do ato sindicado de retenção na fonte por erro nos pressupostos de direito, a saber, por violação da liberdade de capitais consagrada no artigo 63º do TFUE, conforme acórdão de 17 de março de 2022 proferido no âmbito do processo C-545/19 pelo TJUE;
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Condenar a Requerida à restituição de 34.288,85€ relativo a retenções na fonte de IRC suportadas sobre dividendos distribuídos à Requerente em 2016, ao abrigo do artigo 94º do CIRC e 22º do EBF e ao pagamento de juros indemnizatórios a partir do trânsito em julgado da sentença, nos termos do artigo 43º, nº 3 da LGT.
6- VALOR DO PROCESSO
Fixa-se em 34.288,85€ o valor do processo ao abrigo dos artigos 306º, nº 1 do CPC e da alínea a) do nº 1 do artigo 97º-A do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do nº 1 do RJAT e do nº 2 do artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
7-CUSTAS
Fixa-se a taxa de arbitragem em 1.836,00€ a cargo da Requerida nos termos dos artigos 12º, nº 2 e 22º, nº 4 do RJAT e artigo 4º, nº 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária e tabela I anexa.
Notifique.
Lisboa, 26 de abril de 2022.
O Árbitro
(Vasco Valdez)