DECISÃO ARBITRAL
O árbitro Dr. Francisco Carvalho Furtado designado pelo Concelho Deontológico do CAAD, para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 29 de Junho de 2021, decide o seguinte:
1. Relatório
A..., residente na Rua ..., ... (doravante designada como “Requerente”), contribuinte n.º ... veio ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (doravante “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a anulação do acto de liquidação de Imposto sobre Veículos (ISV), resultante da apresentação da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º2021/..., de 26 de Fevereiro de 2021, praticado pelo Director da Alfândega do Leixões.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 19 de Abril de 2021.
O signatário comunicou a aceitação do exercício das funções no prazo aplicável.
Em 09 de Junho de 2021, as Partes foram notificadas da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 29 de Junho de 2021.
A AT apresentou resposta, em que defendeu que o pedido de pronúncia arbitral deve improceder.
Não existindo diligências probatórias adicionais, em 28 de Abril de 2022 as Partes foram notificadas para, querendo, apresentarem as suas alegações.
Em 9 de Maio de 2022 a Requerida apresentou as suas alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. - Questões Prévias. Saneamento
2.1 - Da Incompetência Material do Tribunal Arbitral
Na sua Resposta a Requerida começa por suscitar a excepção de incompetência absoluta do Tribunal, em razão da matéria.
Para tanto a Requerida sustenta que o Requerente não impugna um acto de liquidação mas apenas suscita uma questão que se prende com a natureza e conformidade jurídico-constitucional da Declaração de Rectificação n.º 6/2021, de 24 de Fevereiro e concomitantemente do artigo 391.º, da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, que alterou o artigo 11.º, do Código do ISV.
A competência dos tribunais é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria, pelo que se impõe a sua apreciação (cf. artigo 13.º do CPTA, ex vi alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT).
O âmbito material da jurisdição arbitral é recortado pelo artigo 2.º do RJAT e, bem assim, pela Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de Março, que determinam que a respetiva competência abrange a apreciação de pretensões de “declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta”.
A Requerente identifica como objeto da acção arbitral o acto de liquidação de ISV resultante da Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/..., e deduz como pedido principal a sua anulação, pelo que neste ponto, não subsistem dúvidas do enquadramento na previsão da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
Relativamente à causa de pedir que constitui o fundamento do pedido anulatório, decorre dos autos que o acto de liquidação em causa foi praticado tendo por pressuposto um regime de tributação não pretendido pelo contribuinte num enquadramento em que, na sua opinião, a lei em vigor lhe permite optar por um outro regime alternativo previsto no n.º 3 do artigo 11.º, do Código do ISV. O que a este respeito a Requerente invoca é o erro sobre os pressupostos, de direito, na prática do acto de liquidação controvertido matéria que se afigura enquadrável na competência material deste Tribunal. Erro esse que decorre de não ter sido considerado um concreto regime pelo qual o contribuinte exerceu o seu direito de opção.
À face do exposto, não pode acompanhar-se a tese da Requerida de que o Requerente não contesta um qualquer acto de liquidação.
Improcede, pois, a excepção de incompetência invocada pela Requerida, pelo que o Tribunal Arbitral é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. alínea a) do n.º 1 do artigo e artigo 5.º do RJAT), que é o da declaração de ilegalidade e anulação de um ato tributário de liquidação de ISV.
3. Matéria de facto
3.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
-
O Requerente introduziu em Portugal o veículo automóvel de passageiros de marca ... (Doc. 1 e Doc. 5);
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O veículo introduzido em Portugal teve origem na Alemanha (Doc.s 1 e 5);
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O veículo introduzido em Portugal utiliza gasolina como combustível (Doc. 5);
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O veículo foi introduzido em Portugal por autotransporte (Doc. 5);
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O veículo foi introduzido em Portugal em 13 de Dezembro de 2020 (Doc. 5);
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O veículo foi introduzido em Portugal teve a sua primeira matrícula em 14 de Fevereiro de 2020 (Doc. 5),
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O veículo foi introduzido em Portugal tinha já circulado 16.665 quilómetros (Doc. 5);
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Em 16 de Fevereiro de 2021, o requerente apresentou o formulário Mod. 1460.1 exercendo a opção pelo tributação pelo Método da Avaliação (Doc. 1)
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Em 16 de Fevereiro de 2021, o Requerente juntou também a avaliação do veículo (…) (Doc. 2)
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Por e-mail de 19 de Fevereiro de 2021, subscrito pelo Senhor Director Adjunto da Alfândega de Leixões, o Requerente foi informado de que as liquidações de imposto efectuadas nos termos do n.º 3 do artigo 11.º, do CISV se encontravam suspensas (Doc. 3)
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Em 26 de Fevereiro de 2021 o Requerente apresentou a Declaração Aduaneira de Veículo n.º 2021/... (Doc. 5);
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Na sequência da apresentação da Declaração Aduaneira de Veículo, foi liquidado ISV no valor de € 9.867,39 (Doc. 5);
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€ 9.613,04 correspondem à componente de cilindrada (Doc. 5);
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€ 2.418,84 respeitam à componente ambiental (Doc. 5);
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Beneficiou de redução de 20% sobre a componente cilindrada, no valor de € 1.922,61 (Doc. 5);
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Beneficiou de redução de 10% sobre a componente cilindrada, no valor de € 241,88 (Doc. 5);
-
O imposto liquidado foi pago (Doc. 5).
2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pelo Requerente e no processo administrativo.
3. Matéria de direito
O Requerente introduziu em Portugal um veículo automóvel, cuja primeira matrícula foi emitida em 14 de Fevereiro de 2020 e com 16.665 quilómetros percorridos.
Por esse motivo o Requerente apresentou a respectiva Declaração Aduaneira de Veículo e foi liquidado Imposto sobre Veículos, no valor de € 9.867,39.
O imposto liquidado teve por base a tabela D) constante do artigo 11.º, n.º 1, do Código do ISV.
Invoca, assim, o Requerente que a liquidação de Imposto sobre Veículos em causa foi emitida com violação de Lei, designadamente do artigo 11.º, n.º 3, do Código do ISV – método alternativo, “de avaliação” -, na redacção anterior à Declaração de Rectificação n.º 6/2021, sendo que tinha exercido a opção por este último método.
Na sua resposta a Requerida pugna pela improcedência do pedido, sustentando (para além da questão da excepção já acima apreciada) que o acto de liquidação em causa foi praticado nos exactos termos previstos na Lei, designadamente nos termos dos artigos 7.º e 11.º, n.º 1, do Código do ISV.
3.1. A questão que é objecto do processo
Antes de mais, há que esclarecer que o processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].
Por isso, os actos têm de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. ( [1] )
Assim, a questão decidenda no presente processo é a de saber a liquidação de Imposto sobre os Veículos efectuada, viola o disposto no artigo 11.º, n.º 3, na redacção anterior à Declaração de Rectificação n.º 6/2021
3.2. Apreciação da questão
Como resulta do Requerimento Inicial o Requerente pretende ver apreciada a legalidade do acto de liquidação de ISV, praticada ao abrigo do artigo 11.º, n.º 1, do CISV,
Nos termos do disposto no artigo 11.º, do CISV, na redacção aplicável (dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro):
Artigo 11.º
Taxas – veículos usados
1 -(Redação dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro) O imposto incidente sobre veículos portadores
de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados -Membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, ao qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, tendo em conta a componente cilindrada e ambiental, incluindo -se o agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, respetivamente
TABELA D
Componente cilindrada
Tempo de uso Percentagem
de redução
Até 1 ano...................................... 10
Mais de 1 a 2 anos .................. . 20
Mais de 2 a 3 anos ..................... 28
Mais de 3 a 4 anos ..................... 35
Mais de 4 a 5 anos ..................... 43
Mais de 5 a 6 anos ..................... 52
Mais de 6 a 7 anos ..................... 60
Mais de 7 a 8 anos ..................... 65
Mais de 8 a 9 anos ..................... 70
Mais de 9 a 10 anos.................... 75
Mais de 10 anos .......................... 80
Componente ambiental
Tempo de uso Percentagem de redução
Até 2 anos.................................... 10
Mais de 2 a 4 anos ..................... . 20
Mais de 4 a 6 anos ..................... 28
Mais de 6 a 7 anos ..................... 35
Mais de 7 a 9 anos ..................... 43
Mais de 9 a 10 anos ................... 52
Mais de 10 a 12 anos ................. 60
Mais de 12 a 13 anos ................. 65
Mais de 13 a 14 anos.................. 70
Mais de 14 a 15 anos ................. 75
Mais de 15 anos……………. 80
2 - Para efeitos de aplicação do número anterior, entende-se por «tempo de uso» o período decorrido desde a atribuição da primeira matrícula e respetivos documentos pela entidade competente até ao termo do prazo para apresentação da declaração aduaneira de veículos.
3 - (Redação dada pelo artigo 217.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro) Sem prejuízo da liquidação provisória efetuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado dos termos do n.º 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula a seguir indicada, pode requerer ao diretor da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa a fixar por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, e até ao termo do prazo de pagamento a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º, que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto: ISV = (V/VR) x Y + (1- U/UR) x C
em que:
ISV representa o montante do imposto a pagar;
V representa o valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, do modelo e respetivo equipamento de série, da idade, do modo de propulsão e da quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do setor, apresentadas pelo interessado;
VR é o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, tal como declarado pelo interessado, considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez;
Y representa o montante do imposto calculado com base na componente cilindrada, tendo em consideração a tabela e a taxa aplicável ao veículo, vigente no momento da exigibilidade do imposto;
C é o ‘custo de impacte ambiental’, aplicável a veículos sujeitos à tabela A, vigente no momento da exigibilidade do imposto, e cujo valor corresponde à componente ambiental da referida tabela, bem como ao agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º;
U é o número de dias de tempo de uso da viatura;
UR é a média do número de dias de tempo de uso dos veículos contados desde a data da primeira matrícula até à data do cancelamento da matrícula dos veículos em fim de vida abatidos nos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV.
4 - Na falta de pedido de avaliação formulado nos termos do número anterior presume-se que o sujeito passivo
aceita como definitiva a liquidação do imposto feita por aplicação da tabela constante do n.º 1.
A actual redacção do artigo 11.º do Código do ISV resulta do artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro (aprova o Orçamento de Estado para o ano de 2021). Esta nova redacção entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2021, conforme previsto no artigo 445.º, da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro.
Sucede, porém, que, na sua redacção originária a fórmula constante do n.º 3 do artigo 11.º, era a seguinte: ISV = (V/VR) x Y + (U/UR) x C
Posteriormente, e por considerar que a fórmula de cálculo do imposto inclusa no n.º 3 do artigo 11.º, do Código do ISV (na redacção que lhe foi dada pelo artigo 391.º, da Lei n.º 75.B/2020, de 31 de Dezembro) padecia de erro, foi aquela corrigida através da Declaração de Rectificação n.º 6/2021, de 24 de Fevereiro de 2021. Passando a ser ISV = (V/VR) x Y + (1- U/UR) x C
Sustentando-se no facto de a alteração ter sido promovida através de Declaração de Retificação, a Requerida argumenta que, à luz do previsto n.º 4 do artigo 5.º da Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, as declarações de retificação reportam os efeitos à data da entrada em vigor do texto retificado.
Assim, a Requerida sustenta que o Requerente nunca teria direito ao cálculo do imposto de acordo com a versão originária no n.º 3 do artigo 11.º, do Código do ISV, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 391.º, da Lei n.º 75-B/ 2020, de 31 de Dezembro.
Contudo, sendo o contencioso tributário um contencioso de mera anulação, o que está em causa nos presentes autos é saber se o acto de liquidação de ISV cuja legalidade se contesta foi praticado nos termos previstos na Lei, ou não.
Inexistem dúvidas que a introdução no consumo do veículo automóvel acima identificado ocorreu em 23 de Fevereiro de 2021.
Destarte encontrava-se em vigor o artigo 11.º, do Código do ISV, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 391.º, da Lei n.º 75-B, de 31 de Dezembro.
Na versão em vigor, o artigo 11, do Código do ISV previa expressamente a possibilidade de os contribuintes requererem ao Director da Alfândega que o imposto seja calculado através do método da avaliação.
Ora, tendo ficado demonstrado nos autos que o Requerente expressamente solicitou, conforme previsto nos n.ºs 3 e 4 do Código do ISV o cálculo do imposto através do método da avaliação, impunha-se que a Requerida o tivesse feito. Não tendo tal sucedido, isto é, não tendo a Requerida calculado o imposto de acordo com o método da avaliação previsto nos n.ºs 3 e 4 do Código do ISV, impõe-se a conclusão de que o acto de liquidação de ISV em apreço é ilegal porque praticado em erro sobre os pressupostos e violação das anteditas disposições legais, impondo-se a sua anulação.
Por fim, o Requerente pede o reembolso dos valores pagos, acrescidos de juros indemnizatórios, nos termos previstos no artigo 43.º da LGT.
O artigo 43.º da LGT dispõe que o contribuinte terá direito a ser ressarcido, através de juros indemnizatórios, sempre que o pagamento indevido de imposto seja imputável a erro dos serviços. “O erro imputável aos serviços que operaram a liquidação fica demonstrado quando procederem a reclamação graciosa ou a impugnação dessa mesma liquidação e o erro não for imputável ao contribuinte (por exemplo, haverá anulação por erro imputável ao contribuinte quando a liquidação assentar em errados pressupostos de facto, mas o erro ter por base uma indicação errada na declaração que o contribuinte apresentou).” (Campos, Diogo Leite de; Rodrigues, Benjamim Silva, Sousa, Jorge Lopes de, Lei Geral Tributária, Anotada e Comentada, 4.º Ed. 2012 Encontro da Escrita, Lisboa, pág. 342).
Também o STA concretiza o conceito de erro imputável aos serviços (embora por referência ao artigo 78.º, da LGT, mas que aqui tem toda a aplicação) como qualquer ilegalidade independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram. “Como se refere no Ac. de 12/12/2001, rec. 26.233: «havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário e sendo ela efectuada pelos serviços, é à administração tributária que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte. Por outro lado, esta imputabilidade aos serviços é independente da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efectuar liquidação afectada por erro» já que «a administração tributária está genericamente obrigada a actuar em conformidade com a lei (arts. 266°, n.° 1 da CRP e 55° da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços». Cfr., no mesmo sentido e por todos, os Acds. de 06/02/2002 rec. 26.690, 05/06/2002 rec. 392/02, 12/12/2001 rec. 26.233, 16/01/2002 rec. 26.391, 30/01/2002 rec. 26.231, 20/03/2002 rec. 26.580, 10/07/2002 rec. 26.668.” (cfr. Acórdão do STA – 2.ª Secção, proferido no Recurso n.º 1009/10, em 22 de Março de 2011, disponível em:
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b1e7cc04381b03af802578620046b202?OpenDocument&ExpandSection=1).
No caso em apreço, o acto de liquidação de ISV é ilegal, porque foi praticado com erro de direito e ofensa das normas e princípios jurídicos aplicáveis, sendo que tal erro não emerge de qualquer conduta do Requerente, pelo que é imputável aos Serviços.
Em face do exposto, procede o pedido de condenação da Requerida no pagamento ao Requerente de juros indemnizatórios, calculados sobre o valor indevidamente pago, nos termos previstos no artigo 43.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, a liquidar em execução de julgado.
4. Decisão
Nestes termos decide este Tribunal Arbitral em:
-
Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral declarando ilegal e anulando o acto de liquidação de ISV resultante da apresentação da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º2021/..., de 26 de Dezembro de 2021, praticado pelo Director da Alfândega de Leixões;
-
Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito a juros indemnizatórios condenando a Requerida ao seu pagamento
5. Valor do processo
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 9.867,39, por corresponder ao valor do acto de liquidação anulado.
6. Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida – Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 29 de Junho de 2022
O Árbitro
(Francisco Carvalho Furtado)
[1] Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:
- de 10-11-98, do Pleno, processo n.º 32702, publicado em AP-DR de 12-4-2001, página 1207;
- de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em AP-DR de 10-2-2004, página 4289.
- de 09/10/2002, processo n.º 600/02.
- de 12/03/2003, processo n.º 1661/02.