DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros designados para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 16 de julho de 2021, Alexandra Coelho Martins (presidente), Catarina Belim, indicada pela Requerente, e Sofia Ricardo Borges, designada pela Requerida, acordam no seguinte:
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Relatório
A..., Lda., adiante “Requerente”, com o número de identificação de pessoa coletiva ... e sede na ..., ..., ..., ...-... ..., apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”).
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante identificada por “AT” ou Requerida.
A Requerente pretende a declaração de ilegalidade, e consequente anulação, das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) referentes ao ano 2019, no valor global de € 116.408,61, incluindo juros compensatórios (na importância de € 1.408,61), provenientes de correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa relativas a comparticipações recebidas da Região Autónoma da Madeira em 2018 e 2019, bem como a condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes indevidamente pagos, ao abrigo do disposto nos artigos 43.º e 100.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) em 14 de abril de 2021 e notificado à AT.
A Requerente designou como árbitro a Dra. Catarina Belim, ao abrigo da prerrogativa prevista no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT, tendo a Requerida indicado a Dra. Sofia Ricardo Borges.
As árbitros designadas comunicaram ao CAAD a designação da Dra. Alexandra Coelho Martins como árbitro presidente, conforme preveem os artigos 6.º, n.º 2, alínea b) e 11.º, n.º 6 do RJAT.
Todas as árbitros comunicaram a aceitação do encargo, tendo o Exmo. Presidente do CAAD informado as Partes da respetiva nomeação, em 28 de junho de 2021, para efeitos do disposto no artigo 11.º, n.º 7 do RJAT, não tendo estas manifestado oposição.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 16 de julho de 2021.
Em 29 de setembro de 2021, a Requerida apresentou a sua Resposta, com defesa por impugnação, tendo junto o processo administrativo (“PA”) em 23 de novembro de 2021.
Por despacho de 4 de outubro de 2021, o Tribunal dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessidade, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo e da celeridade, simplificação e informalidade processuais (artigos 16.º, alínea c) e 29.º, n.º 2 do RJAT).
As Partes foram notificadas para apresentarem alegações, não o tendo feito em prazo.
Por despachos de 10 de janeiro, 14 de março e 10 de maio de 2022, foi prorrogado o prazo para prolação da decisão, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, derivado da tramitação processual, da interposição de períodos de férias judiciais e da situação pandémica.
Posição da Requerente
A Requerente alega erro sobre os pressupostos de direito e contesta o enquadramento conferido pela Requerida às transferências de fundos recebidas por ações de promoção e divulgação das produções da agricultura, das pescas e do agroalimentar da Região Autónoma da Madeira, realizadas nos termos do Protocolo celebrado com o governo desta Região. Está em causa, nomeadamente, a aposição física pela Requerente da marca “...” em diversos suportes materiais, como viaturas e contentores, e a inserção de banner da marca “...”, com placement de produções-chave da agricultura. Segundo a Requerente a comparticipação recebida para este efeito não constitui a contraprestação por prestações de serviços tributadas em IVA, conforme preconizado pela AT, mas uma subvenção pública, não sujeita a IVA uma vez que não se encontra relacionada com o preço de operações tributáveis.
Argumenta a Requerente que a comparticipação foi atribuída pela entidade competente e que as atividades por si desenvolvidas nesse quadro não revestem as características de uma prestação de serviços para efeitos dos artigos 1.º, n.º 1, alínea a) e 4.º, n.º 1 do Código do IVA, dado que tal implicaria que as vantagens económicas decorrentes aproveitassem ao Governo da Região Autónoma, o que não sucede, pois os beneficiários são os produtores agrícolas dessa região e, indiretamente, a população madeirense. Cita, neste contexto, jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Justiça.
Salienta que não estamos perante atividades da responsabilidade do Governo da Região Autónoma ou que este tivesse a incumbência ou obrigação de desenvolver (diretamente ou por meio de contrato com terceiros), nem aquelas se destinam a satisfazer necessidades do próprio Governo, pelo que nunca poderiam ser objeto de um contrato administrativo de prestação de serviços. São atividades de promoção comercial de uma região que têm subjacente o interesse público, tendo a Requerente recebido fundos públicos destinados a custear as correspondentes despesas incorridas, enquadráveis no conceito comum de subvenções.
Por outro lado, a Requerente invoca vício formal de falta/insuficiência de fundamentação por considerar que a Requerida não justificou a não aceitação da qualificação de subvenção atribuída pelas Partes e a sua configuração alternativa como comparticipação financeira com caráter remuneratório de uma “prestação de serviços de publicidade”, nos termos do disposto no artigo 77.º da LGT.
Para sustentar o pedido de juros indemnizatórios, a Requerente alega a ocorrência de erro imputável aos serviços, do qual resultou o pagamento de prestação tributária em montante superior ao legalmente devido.
Posição da Requerida
Em posição oposta, a Requerida defende que a Requerente prestou serviços de promoção e divulgação de marca, operação que considera sujeita a IVA por aplicação da taxa normal, nos termos conjugados do artigo 4.º com o artigo 18.º, ambos do Código do IVA, revestindo a comparticipação financeira caráter remuneratório, por configurar a contrapartida da atividade promocional a desenvolver pela Requerente em relação à marca designada por quem atribuiu a comparticipação, tendo em vista a valorização dos produtos da Região Autónoma da Madeira, conforme Protocolo celebrado.
Acrescenta que o compromisso assumido pela Requerente de prestação de serviços de promoção e de divulgação dos produtos da Região Autónoma da Madeira corresponde a um consumo, pois fornece às autoridades desta região vantagens qualificáveis como potenciadoras das vendas dos produtos daquela região, inputs do ativo que visa promover.
Aduz que a referida região é a beneficiária direta das prestações de serviços e que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o facto de o pagamento ser efetuado por uma autoridade pública no interesse geral não afasta o seu enquadramento como contrapartida de uma prestação de serviços e não implica que a noção de prestação de serviços dependa do destino que é dado ao serviço por quem o paga, sendo o elemento decisivo a natureza do compromisso assumido.
Apesar de concordar com a qualificação de serviços de publicidade, a Requerida salienta que, para efeitos de sujeição a imposto, apenas é relevante que estejamos perante uma prestação de serviços com caráter oneroso, não devendo a designação conferida pelas Partes à comparticipação financeira (subvenção, subsídio, ou outra) afetar a qualificação em sede de IVA (v. artigo 36.º, n.º 4 da LGT).
Sobre a questão de saber quem beneficia da prestação ou do seu impacto económico (a ocorrência de vantagens individualizáveis) refere ainda que, segundo o Tribunal de Justiça, tal circunstância não terá importância para o conceito da prestação de serviços.
Sobre a alegada falta de fundamentação, sustenta que não se verifica, pois a motivação aduzida no Relatório de Inspeção Tributária é apta a revelar a um destinatário normal as razões de facto e de direito que determinaram a decisão, habilitando o sujeito passivo a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respetiva lesão.
Afirma que a Requerente revela ter compreendido o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, o que afasta o vício formal de falta de fundamentação. Porém, se assim não se entendesse, caberia à Requerente lançar mão do mecanismo previsto no artigo 37.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), não o tendo feito.
Conclui a Requerida pela improcedência da ação arbitral.
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Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, relativa a atos de liquidação de IVA, atenta a conformação do objeto do processo (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º do RJAT).
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo e Procedimento Tributário (“CPPT”), tendo em conta a suspensão de prazos procedimentais e processuais, operada pela Lei n.º 4-B/2021, de 1 de fevereiro, no âmbito das medidas da pandemia Covid 19, cuja vigência cessou com a entrada em vigor da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril (as liquidações impugnadas têm o prazo limite de pagamento fixado nos dias 9 e 10 de dezembro de 2020 e a presente ação foi deduzida em 12 de abril de 2021).
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
Não foram identificadas questões prévias a apreciar. O processo não enferma de nulidades.
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Fundamentação de Facto
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Factos Provados
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos:
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A..., Lda., aqui Requerente, é uma sociedade por quotas que iniciou a atividade em 25 de novembro de 2016 e está registada para o exercício de consultoria para negócios e a gestão com o CAE 70220 – cf. Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”).
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A Requerente enquadra-se no regime normal de periodicidade mensal de IVA desde 1 de janeiro de 2019 e no regime geral de tributação de IRC – cf. RIT.
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A Requerente dedica-se, em concreto, à atividade de transporte de mercadoria por via aérea entre o aeroporto de Lisboa e os aeroportos da Madeira, de Ponta Delgada e da Terceira, não dispondo de aeronaves próprias, pelo que subcontrata o serviço de transporte a operadores de transporte aéreo localizados fora do território nacional – cf. RIT.
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A Requerente celebrou com a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, dois Protocolos, um em 23 de agosto de 2018, para vigorar até ao final desse ano civil, e outro em 18 de julho de 2019, para vigorar até 31 de dezembro de 2019, com o seguinte objeto e finalidade:
“CLÁUSULA PRIMEIRA
(Objeto)
Este protocolo tem por objeto a definição do processo de cooperação financeira entre as partes outorgantes com vista a estimular a expedição e ou exportação dos produtos da agricultura, das pescas e do agroalimentar que reúnam vantagens competitivas nos mercados exteriores da Região Autónoma da Madeira.
CLÁUSULA SEGUNDA
(Objetivos e finalidades específicas)
1 . O objetivo deste protocolo é comparticipar nos encargos financeiros que a Segunda Outorgante incorra, em complemento à ação comercial de promoção dos seus serviços, na promoção e divulgação das produções da agricultura, das pescas e do agroalimentar, contribuindo para o incremento da sua valorização e o alcance de novos mercados, designadamente:
a) Divulgar produções-chave da agricultura, das pescas e do agroalimentar (a selecionar em articulação com a Primeira Outorgante) em ações de comunicação e relações públicas, bem como em eventos nacionais e internacionais nas áreas da logística e da fileira agroalimentar;
b) Mandar produzir e manter, para os seus suportes comunicacionais, conteúdos informativos e promocionais em português, inglês, francês e alemão sobre diversas produções-chave da agricultura, das pescas e do agroalimentar (a selecionar em articulação com a Primeira Outorgante), com link aos fornecedores regionais respetivos;
c) Estudar, na sua dinâmica, os circuitos logísticos mais vantajosos para que as produções agrícolas, das pescas e do agroalimentar possam aceder aos principais mercados europeus, e a mercados de países-terceiros, designadamente os da "saudade", e disponibilizar essa informação;
d) Pesquisar, no seu âmbito de intervenção, potenciais distribuidores nos mercados internacionais para as produções agrícolas, das pescas e do agroalimentar, e disponibilizar atualizadamente essa informação;
e) Promover contactos comerciais entre operadores da distribuição agroalimentar internacional e as empresas regionais dos setores inseridos na respetiva fileira;
f) Conceber outras ações que se enquadrem no âmbito do objetivo deste protocolo, ou concorram para a sua melhor prossecução, desde que previamente acordadas com a Primeira Outorgante, as quais, à medida da sua aprovação, constarão de adenda ao patente documento.
2. A Segunda Outorgante, como contrapartida, obriga-se a:
a) Associar a marca «... » a diversos dos seus meios materiais, como viaturas, contentores, suportes publicitários, e outros;
b) Inserir banner da marca «...», com placement de produções-chave da agricultura, das pescas e do agroalimentar (a selecionar em articulação com a Primeira Outorgante) nas suas redes sociais e websites.
3. A Segunda Outorgante mais se obriga a apresentar, até 31 de dezembro de 2018, relatório circunstanciado, incluindo dossiers de contactos e planos de desenvolvimento, das ações realizadas no âmbito do ponto 1 desta cláusula.” – cf. Documentos 5 [2018] e 6 [2019] juntos pela Requerente.
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O Protocolo de 2018 contém os seguintes considerandos – cf. Documento 5 junto pela Requerente:
“Considerando que é objetivo expresso no Programa do XII Governo Regional da Madeira, estimular, na articulação dos interesses dos produtores e dos agentes da comercialização, a estruturação de dois modelos de orientação e especialização produtivas, um dirigido à satisfação das necessidades correntes do mercado local, e outro vocacionado pare as solicitações dos mercados externos;
Considerando que, naquele sentido, entre outras, é política incentivar a expedição e ou exportação dos produtos da agricultura, das pescas e do agroalimentar que reúnem vantagens competitivas nos mercados exteriores da Região Autónoma de Madeira, para isso criando sustentadamente as condições que facilitem o melhor acesso aos mesmos, a passar necessariamente pela promoção e comunicação do valor destas produções e, dentro dos stakeholders, designadamente junto dos distribuidores da fileira agroalimentar;
Considerando que, por outro lado, no desenvolvimento daquele desiderato, é um dos objetivos da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas intensificar a difusão e divulgação da marca «...» relevando a qualidade distinta das produções que a ostentam e, com isso, alicerçando a sua competitividade nos mercados;
Considerando que a A..., vem assegurando h[á] pouco mais de um ano, com qualidade reconhecida, um serviço exclusivamente dedicado ao transporte aéreo de mercadorias Lisboa/Funchal/Lisboa, com aeronaves adaptadas a este objetivo específico, sendo no presente a única empresa que disponibiliza este tipo de solução à fileira agroalimentar da Região Autónoma da Madeira, fundamental, sobretudo para os géneros alimentícios de maior valor acrescentado, e em que um elevado grau de frescura e ou a rapidez e regularidade de fornecimento são condição base à competição nos mercados;
Considerando que a A..., pelos meios que reúne e ações que desenvolve, pode constituir-se, per si, um excelente meio de promoção e divulgação direta das produções com a marca «... », contribuindo pare o incremento da sua valorização e o alcance de novos mercados internacionais, como ainda, indiretamente, do próprio destino Madeira;
Considerando que a A..., está disposta, em complemento à sua ação comercial de promoção dos seus serviços, a desenvolver um conjunto ações de promoção e divulgação das produções com a marca «... » quer no mercado do continente português quer em mercados premium internacionais;
Considerando que o Orçamento da Região Autónoma da Madeira, inclui o projeto SIGO 50042, com a designação “Promoção e valorização dos produtos regionais”, o qual, entre outros objetivos, visa apoiar a promoção dos produtos agrícolas e agroalimentares regionais, principalmente dos que giram sob a égide da marca «...», relevando e sua qualidade distinta e alicerçando a sua competitividade nos mercados;
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 32.0 e do n.0 2 do artigo 33. 0 do Decreto Legislativo Regional n.0 2/2018/M, de 9 de janeiro, e da Resolução n.0 511/2018, de 16 de agosto, é celebrado o presente protocolo entre a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas […]”
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O Protocolo de 2019 contém os seguintes considerandos – cf. Documento 6 junto pela Requerente:
“Considerando a relevância social, económica, cultural e turística do sector agrícola da Região Autónoma da Madeira.
Considerando ser perspícuo que a agricultura da Madeira sempre se assumiu historicamente como uma fonte complementar de subsistência das economias familiares madeirenses e como uma forma de preservar uma cultura específica no que respeita à conservação paisagística e ambiental, que muito contribui para a oferta turística da Ilha da Madeira.
Considerando que o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar, por força da conjugação dos apoios comunitários, regionais e dos investimentos particulares, tem vindo a assistir nos últimos anos a um período de desenvolvimento e crescimento, tendo adquirido uma dimensão empresarial que não se compadece com o escoamento das respetivas produções no mercado regional.
Considerado que na sequência da execução do XII programa do Governo Regional, o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar tem sido orientado para produções específicas e diferenciadas como forma de contornar a concorrência das grandes economias no que respeita às produções convencionais e, consequentemente, de gerar mais receitas e rentabilidade para os agricultores, produtores e demais operadores económicos.
Considerando que atualmente a RAM, por força da concretização das políticas do XII Governo Regional para o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar possui efetivamente produtos diferenciados e específicos capazes de se afirmarem no mercado nacional e europeu e de gerarem mais receitas e maior rentabilidade económica.
Considerando que pela primeira vez na história do sector agrícola da Madeira estamos a produzir e a exportar, de modo organizado, sustentado e promissor, frutos tropicais e subtropicais para além da banana da Madeira, como sejam a anona e a pera abacate, bem como peixe fresco, em especial a dourada da Madeira.
Considerando o crescimento significativo da aquicultura da Madeira e a necessidade de assegurar o escoamento da respetiva produção para o mercado nacional, europeu e extracomunitário, como forma de garantir um desenvolvimento equilibrado, sustentado e rentável de uma atividade que possui enormes potencialidades económicas.
Considerando que a única forma de garantir a sustentabilidade, o crescimento e o desenvolvimento do sector agrícola, das pescas e do agroalimentar consiste incontestavelmente em apoiar ações e projetos que visem a promoção dos mencionados produtos regionais diferenciados e específicos no mercado nacional e europeu.
Considerando que o consórcio denominado A..., LDA. tem como propósito potenciar o mercado da carga área entre o Continente e o arquipélago da Madeira, através do abastecimento regular de carga composta por produtos frescos, perecíveis e urgentes entre aqueles mercados e da abertura de novos mercados no continente europeu.
Considerado que a A..., LDA. está especialmente vocacionada para o transporte de produtos frescos e de carga perecível, tais como peixe, frutas e flores, sendo a única empresa especializada e com condições logísticas para o efeito a operar no mercado do transporte aéreo daqueles produtos entre o arquipélago da Madeira e Portugal continental.
Considerando que a especialização da logística que a A..., LDA implementou nos seus transportes aéreos de carga composta por produtos frescos e perecíveis permite assegurar a respetiva qualidade com elevados padrões, o que se reflete diretamente na própria promoção dos produtos regionais como sendo produtos diferenciados e específicos de qualidade destacada.
Considerando que a A..., LDA. apresentou um projeto de enorme importância social e económica que visa incentivar as exportações dos produtos denominados frescos e urgentes, tais como frutas e peixe através da respetiva promoção e valorização junto do mercado nacional e comunitário, em especial o mercado espanhol.
Considerando que o mencionado projeto implica uma promoção permanente e regular dos produtos agrícolas regionais específicos e diferenciados através da realização de viagens áreas diárias para o transporte de carga composta por produtos frescos e perecíveis de terça a sábado, com capacidade para 8 toneladas/dia.
Considerando que o Orçamento da Região Autónoma da Madeira contempla o Projeto SIGO 50042, com a designação "Promoção e valorização dos produtos regionais", que entre outros objetivos, visa apoiar a promoção de produtos agrícolas e agroalimentares regionais, principalmente dos que giram sob a égide da marca "...", destacando as suas qualidades específicas e alicerçando a sua competitividade nos mercados nacional e internacional.
Considerando que o referido projeto coincide integralmente com as medidas vertidas no programa do XII Governo Regional que visam incentivar a produção e exportação de produtos regionais diferenciados, através da respetiva promoção no mercado nacional e europeu.
Considerado que na sequencia da celebração do "Protocolo de Cooperação Financeira Entre a Região Autónoma da Madeira, Através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas e a A..., LDA.", datado de 23, de 2018, autorizado pela Resolução do Conselho do Governo Regional n. 0 511/2018, de 20 de agosto, publicada no JORAM, I Série, N. 0 133, foram visíveis os efeitos positivos do apoio do projeto de promoção dos produtos regionais em causa no mercado do continente português e espanhol, patente no aumento da procura.
Considerado que todos os esforços e investimentos efetuados a montante no sector agrícola, das pescas e do agroalimentar, bem como o sucesso das políticas preconizadas e concretizadas pelo Governo Regional dependem inteiramente do apoio a jusante de todas as ações e projetos que tenham como finalidade a promoção dos produtos regionais no mercado nacional e europeu, sob pena de existir o sério risco de se perder todo o trabalho que tem vindo a ser efetuado com vista a assegurar a sustentabilidade e rentabilidade dos referidos sectores económicos.
Considerado que a promoção dos produtos regionais específicos e diferenciados contribui, também, para a própria promoção do Arquipélago da Madeira, no mercado nacional e europeu, como destino turístico com características singulares.
Considerando, por conseguinte, que se reveste de manifesto interesse público apoiar o projeto de promoção e divulgação dos produtos regionais específicos e diferenciados apresentado pela A..., LDA.
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 34. 0 e do n o 2 do artigo 35, 0 do Decreto Legislativo Regional n. 0 26/2018/M, de 31 de dezembro, e da Resolução n 413/2019, de 27 de junho, é celebrado o presente protocolo entre a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas […]”.
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O Protocolo de 2018 estabelece na sua Cláusula Quarta o regime de comparticipação financeira nos seguintes termos:
“1. Para a prossecução do objeto estabelecido na cláusula primeira e dos objetivos e finalidades específicas definidos na cláusula segunda, a Primeira Outorgante concede uma comparticipação financeira à Segunda Outorgante até ao montante máximo de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros).
2. A comparticipação financeira prevista no número anterior será processada da seguinte forma:
a) após a assinatura do protocolo: €50.000,00;
b) até 30 de setembro de 2018: €50.000,00;
c) até 31 de outubro de 2018: €50.000,00;
d) até 30 de novembro de 2018: €50.000,00;
e) até 31 de dezembro de 2018: €50.000,00.
3. A Segunda Outorgante deverá apresentar o documento comprovativo das despesas incorridas com o referido no n.º 1 da cláusula segunda, discriminando todos os custos envolvidos, até 31 de janeiro de 2019.
4. Caso o custo total devidamente comprovado de todos os documentos referidos no número anterior, seja inferior ao montante máximo da comparticipação definida no n | desta cláusula, esse passará a ser o montante da comparticipação financeira, devendo a Segunda Outorgante devolver o montante recebido em excesso (sem juros), exceto se este for igual ou inferior a cinco euros. […]” – cf. Documento 5 junto pela Requerente.
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O Protocolo de 2019 contém uma Cláusula Quarta idêntica à anterior, com a diferença do escalonamento temporal que é o seguinte, devendo os documentos de suporte das despesas ser apresentados até 31 de janeiro de 2020:
“a) até 31 de agosto de 2019: €50.000,00;
b) até 30 de setembro de 2019: €50.000,00;
c) até 31 de outubro de 2019: €50.000,00;
d) até 30 de novembro de 2019: €50.000,00;
e) até 31 de dezembro de 2019: €50.000,00.” – cf. Documento 6 junto pela Requerente.
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Ao abrigo dos Protocolos referidos, a Requerente recebeu do Governo Regional da Madeira os valores de € 200.000,00 e € 300.000,00 – cf. RIT.
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A Requerente não liquidou IVA sobre as importâncias recebidas ao abrigo dos dois Protocolos celebrados com a Região Autónoma da Madeira, por considerar tratar-se de uma comparticipação financeira recebida com a natureza de subvenção não sujeita a IVA – cf. RIT.
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Na declaração periódica de IVA de abril de 2020, a Requerente solicitou o reembolso de IVA de € 27.478,39, o que motivou um procedimento inspetivo de natureza interna, para controlo do pedido de reembolso, abrangendo os anos 2018, 2019 e 2020, ao abrigo das Ordens de Serviço OI2020..., OI2020... e OI2020..., respetivamente – cf. RIT.
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No âmbito da referida ação inspetiva, a AT identificou que a Requerente reconheceu na sua contabilidade rendimentos no total de € 500.000,00 decorrentes dos referidos Protocolos celebrados com a Região Autónoma da Madeira, sem que sobre a referida quantia tivesse sido liquidado IVA – cf. RIT.
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Em 10 agosto de 2020, a Requerente foi notificada do projeto de relatório de inspeção, que propunha correções ao IVA liquidado, à taxa de 23%, no valor global de € 115.000,00, com referência aos rendimentos auferidos nos termos dos Protocolos acima referidos, tendo aquela exercido o direito de audição, com fundamentos idênticos aos da presente ação arbitral[1] – cf. documentos 2 e 3 juntos pela Requerente e RIT.
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O projeto de relatório converteu-se em Relatório de Inspeção Tributária (final), sobre o qual recaiu despacho de concordância do Chefe de Divisão da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa (Divisão VI), por subdelegação, de 11 de setembro de 2020, notificado pelo ofício n.º..., de 21 de setembro de 2020, do qual consta a fundamentação dos atos tributários impugnados, de que se retiram os seguintes excertos com relevância para a matéria dos autos – cf. RIT:
“I – CONCLUSÕES DA AÇÃO DE INSPEÇÃO
Do presente procedimento inspetivo realizado à sociedade A... […], resultou, atenta o exposto infra, por aplicação do disposto no artigo 18º do CIVA, na identificação da omissão de liquidação do imposto relativo aos serviços de promoção e divulgação de marca que prestou à Região Autónoma da Madeira.
[…]
Face ao conteúdo dos protocolos celebrados […], resulta claro que as obrigações que dali advêm para a A... são cumpridas por via de uma prestação de serviços de promoção (publicidade) à Marca «... ».
Ora, tratando-se de uma prestação de serviços de publicidade, será a operação sujeita a IVA por força do disposto no artigo 4º do CIVA.
Com efeito, independentemente da designação que for atribuída à comparticipação financeira recebida ao abrigo e nos termos daqueles protocolos (subvenção; subsídios;(…), certo é que esta comparticipação corresponde à efetiva contraprestação que o adquirente paga pelo serviços de promoção de que aproveita.
Trata-se, portanto, de uma comparticipação financeira com caráter remuneratório, isto é, para a qual se identifica algo suscetível de ser entendido como um consumo por parte da entidade adquirente, no caso concreto, o serviço de promoção tendente à valorização dos produtos da região.
Com efeito, o caráter remuneratório tem sido frequentemente reconhecido pelo TJUE como condição para se estar perante uma contraprestação de uma operação tributável. Sobre esta matéria, esclareceu aquele tribunal em decisão ao processo C-384/95 (caso relativo a subsídios), que o raciocínio relativo ao nexo entre a prestação do serviço e a comparticipação financeira não exclui que um pagamento efetuado por uma entidade pública no interesse geral possa constituir a contrapartida de uma prestação de serviços na aceção do IVA e também não implica que a noção de prestação de serviços dependa do destino que é dado ao serviço por quem o paga. Mais refere que apenas a natureza a natureza do compromisso assumido deve ser tida em consideração.
No caso em apreço o compromisso assumido (prestação de serviços de promoção e divulgação) corresponde a um consumo pois fornece às autoridades – Região Autónoma da Madeira, vantagens qualificáveis como potenciadoras das vendas dos produtos daquela região, como tal, inputs do ativo que visa promover.
Face a todo o exposto impõe-se a realização da correção, liquidando o imposto relativo aos serviços de promoção e divulgação remunerados ao abrigo dos protocolos referido, nos termos quantificados no capítulo III.
[…]
III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
Da análise a tudo quanto foi recebido resultou na identificação de um conjunto de imperfeições concretizadas na omissão de liquidação, nos termos justificados acima e que abaixo se quantificam.
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Omissão de liquidação do imposto relativo aos serviços de promoção e divulgação da marca «...» (conforme detalhado nos protocolos em Anexo I).
Por tudo quanto ficou exposto acima, resulta que a sociedade prestou serviços de promoção e divulgação de marca, não tendo procedido à emissão da respetiva fatura nem à liquidação do respetivo imposto.
Ora, a prestação e serviços de promoção e divulgação de marca prestada a operador económico localizado na Região Autónoma da Madeira, é uma operação sujeita a IVA por aplicação da taxa normal, nos termos do conjugado do disposto no artigo 4º, com o disposto no artigo 18º, ambos, do CIVA, considerados localizados no lugar da sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, do domicílio do prestador por força da alínea b) do nº 6 do artigo 6º do mesmo código, uma vez que a região Autónoma da Madeira, não se identificou no protocol[o] com a qualidade de sujeito passivo do IVA, sendo, por isso, considerado como consumidor final.
Quanto às obrigações em sede do IVA da sociedade A...:
Nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 29º do CIVA, os sujeitos passivos devem emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3.º e 4.º, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhes sejam efetuados antes da data da transmissão de bens ou da prestação de serviços.
Por outro lado, quanto à exigibilidade do imposto, em caso de obrigação de emissão de fatura, determina o nº 1 do artigo 8º do CIVA, que o imposto se torna exigível:
a) Se o prazo previsto para a emissão da fatura for respeitado, no momento da sua emissão; (Redacção do D.L.nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013) b) Se o prazo previsto para a emissão não for respeitado, no momento em que termina; c) Se a transmissão de bens ou a prestação de serviços derem lugar ao pagamento, ainda que parcial, anteriormente à emissão da fatura, no momento do recebimento desse pagamento, pelo montante recebido, sem prejuízo do disposto na alínea anterior. (Redacção do D.L.nº 197/2012, de 24 de Agosto, com entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2013)
No caso em apreço, não tendo sido emitida a fatura a exigibilidade do imposto relativo aos serviços de promoção e divulgação da marca «... » ocorre com o seu recebimento.
[…]
Ora, face à regra da exigibilidade acima referida, somos a propor a correção da omissão da liquidação do IVA com o seguinte resumo por período:
[…]
[…]
2019
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69.000,00 €
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Total Correções
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115.000,00 €
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Por último, chama-se a atenção para o facto de haver lugar ao pagamento de juros compensatórios, quando por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária, conforme disposto no artigo 35º da Lei Geral Tributária.”
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Na sequência do procedimento inspetivo, a Requerida emitiu liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, que foram notificadas à Requerente, relativas aos seguintes períodos – cf. liquidações juntas aos autos como documento 1:
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2019-01 – IVA de € 5.373,94 e juros compensatórios de € 323,31; prazo limite de pagamento – 9 de dezembro de 2020;
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2019-08 – IVA de € 52.126,06; prazo limite de pagamento – 9 de dezembro de 2020;
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2019-10 – IVA de € 24.646,93 e juros compensatórios de € 726,57; prazo limite de pagamento – 9 de dezembro de 2020;
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2019-12 – IVA de € 9.853,07 e juros compensatórios de € 222,43; prazo limite de pagamento – 10 de dezembro de 2020;
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2019-12 – IVA de € 6.037,62 e juros compensatórios de € 136,30; prazo limite de pagamento – 9 de dezembro de 2020;
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2019-12 – IVA de € 16.962,38; prazo limite de pagamento – 9 de dezembro de 2020.
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Em discordância com as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios acima identificadas, a Requerente apresentou junto do CAAD, em 12 de abril de 2021, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo que deu origem ao presente processo – cf. registo de entrada do pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) no SGP do CAAD.
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Fundamentação da Matéria de Facto e Factos não Provados
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.
No que se refere aos factos provados, a convicção dos árbitros fundou-se essencialmente na análise crítica da prova documental junta aos autos que reúne o consenso das Partes, sendo o dissídio sobre matéria de direito.
Com relevo para a decisão não existem factos alegados que devam considerar-se não provados.
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Do Direito
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Razão de Ordem
Considerando a tutela mais estável e eficaz dos interesses em presença no âmbito deste processo, importa apreciar, em primeiro lugar, a ilegalidade substantiva (erro de direito) relativamente à incidência de IVA sobre a comparticipação financeira recebida, e, em segundo lugar, o vício de forma, por insuficiente fundamentação (artigo 124.º do CPPT, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea a) do RJAT).
A questão jurídica suscitada nos presentes autos prende-se com a qualificação, como contraprestação de serviços prestados, das comparticipações recebidas pela Requerente ao abrigo de dois Protocolos (idênticos) celebrados com a Região Autónoma da Madeira nos anos 2018 e 2019.
Interessa, neste âmbito, aferir a natureza económica da atividade realizada pela Requerente e a sua configuração como prestação de serviços, na aceção do IVA, bem como, em caso afirmativo, concluir sobre o caráter oneroso da mesma, i.e., se existe um vínculo sinalagmático que permita estabelecer uma conexão direta entre os serviços realizados e o recebimento de uma contrapartida, in casu materializada na comparticipação paga pela Secretaria Regional de Agricultura e Pescas da Região Autónoma da Madeira.
Em relação ao argumento, invocado pela Requerente, de que a contraprestação não pode ser enquadrada como uma subvenção conexa com o preço das operações, afigura-se que a análise do mesmo não é pertinente para a solução do caso, uma vez que os atos tributários controvertidos, cuja invalidade é peticionada, não assentam nesse fundamento.
Com efeito, como se extrai do Relatório de Inspeção que contém a motivação das liquidações, estas foram emitidas unicamente por ter sido entendido que a Requerente prestou serviços remunerados através da comparticipação financeira prevista nos Protocolos celebrados com a Região Autónoma da Madeira e não com base na caracterização dessa comparticipação como uma subvenção alegadamente conexa com o preço dos serviços prestados.
Neste contexto, cabe relembrar que o processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (v. n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril), é, assim como este, um meio processual que visa a declaração de ilegalidade dos atos indicados no artigo 2.º do RJAT – atos tributários e atos de fixação da matéria tributável – e a eliminação dos efeitos jurídicos por eles produzidos, anulando-os, através de uma pronúncia constitutiva e cassatória, ou declarando a sua nulidade ou inexistência (v. artigos 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º daquele diploma).
Posição alinhada com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo que considera, no âmbito do processo de impugnação judicial previsto no artigo 99.º e seguintes do CPPT, modelo e paradigma do processo arbitral, que “o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do ato sindicado em face da fundamentação contextual integrante do próprio ato, estando impedido de valorar razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, quer estas sejam por ele eleitas, quer sejam invocados a posteriori. […]” – v. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de outubro de 2020, processo n.º 02887/13.8BEPRT, e, no mesmo sentido, o acórdão de 17 de fevereiro de 2021, processo n.º 02111/14.6BEPRT 0981/16.
Por isso, sendo o objeto de apreciação do Tribunal Arbitral o ato (tributário ou de fixação de valores tributáveis, consoante os casos) praticado, tal como o foi, a sua legalidade tem de ser apreciada à face do seu teor, não podendo o Tribunal, apreciar a validade ou invalidade da qualificação da comparticipação como subvenção conexa com o preço dos serviços, tendo em conta que esse fundamento não foi invocado como suporte da decisão administrativa sob escrutínio, sendo irrelevante se esta poderia ter arrimo noutros fundamentos.
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O conceito de prestação de serviços e de valor tributável
O IVA incide sobre operações económicas definidas por recurso a dois conceitos, o de transmissão de bens (corpóreos) e o de prestação de serviços. A delimitação deste último é efetuada a título residual, com considerável amplitude, sendo assim qualificadas todas as operações efetuadas a título oneroso que não constituam transmissões de bens ou operações transfronteiriças sobre bens (aquisições intracomunitárias e importações), como estipula o artigo 4.º, n.º 1 do Código do IVA, em transposição do disposto no artigo 24.º, n.º 1 da Diretiva IVA[2].
A natureza económica das operações refere-se a qualquer atividade, seja ela de produção, comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas e a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência – v. artigos 1.º, n.º 1, 3.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º, n.º 1 do Código do IVA e 2.º, 14.º e 24.º da Diretiva IVA (v. Acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de fevereiro de 1985, Rompelman, processo 268/83, p.19).
A jurisprudência do Tribunal de Justiça tem sido constante na afirmação de que as atividades económicas estão abrangidas pelo âmbito de incidência do IVA independentemente dos fins (v.g. públicos ou privados) ou resultados (v.g. lucrativos ou deficitários) dessas atividades, compreendendo, de igual modo, a fase preparatória, nomeadamente as primeiras despesas de investimento efetuadas, mesmo que não cheguem a ser realizadas operações tributáveis (v. Acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de janeiro de 1998, Ghent Coal Terminal, C-37/95, p. 15; de 29 de fevereiro de 1996, INZO, C-110/94, p. 16; de 21 de março de 2000, Gabalfrisa, C-110/98, p. 44-45; e de 6 de setembro de 2012, Portugal Telecom, C-496/11, p. 44 e Rompelman, já referido, p.19).
O mesmo é dizer que todas as prestações de serviços, incluindo aquelas que revistam natureza pública, estão, à partida capturadas pelo campo de incidência objetiva do IVA. Os exemplos de serviços públicos tributados em IVA pontuam, como sucede com o serviço público de radiodifusão e de televisão, cuja remuneração, a “contribuição para o áudio-visual”, é sujeita a IVA a uma taxa reduzida, conforme previsto na verba 2.2 da Lista I anexa ao Código deste imposto.
A natureza pública não é de modo algum incompatível ou antitética à natureza económica das atividades prosseguidas, pelo que o facto de estarmos perante prestações de serviços públicos ou de serviços que, não sendo públicos, são afetos à consecução de atribuições de interesse público, ou integrados na prossecução de políticas públicas, não colide, nem compromete, por si, a tributação em IVA[3].
De igual modo, convém firmar que a circunstância de a contraprestação de uma atividade não conter uma margem de lucro, ou de poder mesmo comportar um prejuízo, não tem por consequência o afastamento da tributação em IVA. Este imposto incide sobre o montante recebido ou a receber em contrapartida das operações realizadas, independentemente desse valor corresponder à exata importância dos encargos suportados, ou de ser superior ou inferior a esses encargos.
Em relação ao valor tributável das prestações de serviços, o artigo 16.º, n.º 1 do Código do IVA, em linha com o artigo 73.º da Diretiva IVA, determina que corresponde ao montante da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, clarificando o seu n.º 5, alínea c) que esse valor inclui as subvenções diretamente relacionadas com o preço das operações.
O conceito de “contraprestação” foi densificado pelo Tribunal de Justiça que, em traços essenciais, afirma que a contrapartida deve poder ser expressa em dinheiro[4] e corresponde a um valor subjetivo, efetivamente recebido (ou a receber), constituído por tudo o que é recebido em troca do serviço prestado, e não a um valor calculado segundo critérios objetivos[5].
O facto de uma operação económica ser levada a cabo a um preço superior ou inferior ao preço de custo é, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, irrelevante para determinar a onerosidade da operação. Esta qualificação pressupõe unicamente a existência de uma contrapartida com tradução pecuniária e um nexo direto entre aquela e a prestação de serviços[6].
Assim, para efeitos de IVA, a conexão entre os consumos e a atividade económica exercida, não depende da existência de uma margem positiva, uma vez que este imposto não visa tributar o lucro ou o resultado da atividade económica, ao contrário do IRC, mas, sim, o valor total das operações realizadas, independentemente de gerarem ou não lucros ou prejuízos. Aliás, se não fosse desta forma, estariam justificadas as situações de ausência de liquidação de IVA por todas as empresas que registassem prejuízos, o que não é manifestamente o caso e seria manifestamente absurdo.
O quadro descrito nada impede, pelo contrário postula, que uma situação de simples reembolso de despesas configure uma prestação de serviços que cai no âmbito de incidência do IVA, na fórmula normativa residual constante do artigo 4.º, n.º 1 do Código deste imposto[7].
Quanto ao vínculo direto, o mesmo é erigido como atributo essencial à qualificação de uma transação como “onerosa”, e tem de ser constatado na relação entre os serviços prestados e o contravalor devido ao sujeito passivo de IVA[8].
De acordo com o órgão jurisprudencial europeu, uma operação só é efetuada “a título oneroso”, e portanto só é tributável, se existir entre o prestador e o beneficiário uma relação jurídica na qual são transacionadas prestações recíprocas, constituindo a retribuição recebida pelo prestador o contravalor efetivo do serviço fornecido ao beneficiário[9].
Porém, o nexo direto não exige necessariamente que os serviços sejam efetivamente utilizados pelo destinatário. No Acórdão de 21 de março de 2002, Kennemer Golf & Country Club, processo C-174/2000, o TJCE decidiu que se mantinha o carácter recíproco das prestações num caso em que um Clube de Golfe cobrava uma quotização anual fixa, devida independentemente da utilização pessoal do campo de golfe pelos seus membros, que eram compelidos a pagar mesmo que não fizessem uso das instalações. Para o Tribunal, as prestações de serviços em causa consubstanciavam-se na (mera) disponibilização aos membros, com carácter permanente, das instalações desportivas e das vantagens a elas inerentes, e não nas prestações pontuais efetuadas a pedido destes, mantendo-se o vínculo direto necessário ao preenchimento do tipo legal do imposto. Em sentido similar, v. os casos Air France-KLM, C-250/14, de 23 de dezembro de 2015, e MEO, C-295/17, de 22 de novembro de 2018.
Esta tese encerra uma nítida alusão ao sinalagma contratual que preside à bilateralidade dos contratos[10]. O objeto material do IVA é, pois, constituído por prestações contratuais reciprocamente acordadas no âmbito das relações jurídicas de que fazem parte.
Por outro lado, conclui o Tribunal que não se verifica o requisito do nexo direto quando os montantes recebidos configuram “contribuições obrigatórias”, ex lege, i.e., que não derivam de prestações contratuais acordadas, mas de uma proposição impositiva[11].
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Erro nos Pressupostos. Análise Concreta
Resulta dos autos que a Requerente celebrou dois Protocolos de idêntico teor, um em 2018 e outro em 2019, tendo em vista desenvolver um conjunto de atividades de divulgação dos produtos do setor agroalimentar e das pescas da Região Autónoma da Madeira, em concreto, obrigando-se a associar a marca “...” a diversos meios materiais que utiliza, como viaturas, contentores e suportes publicitários, e a inserir “banner”[12] da marca “...” e respetivas produções-chave dos referidos setores nas suas redes sociais e websites.
O objeto específico dos referidos Protocolos consiste, desta forma, na realização de ações de cariz promocional que a Requerente se comprometeu a desenvolver para o Governo Regional da Madeira. É inequívoco que as referidas ações consubstanciam operações [serviços] enquadráveis no âmbito de uma atividade económica materializada na realização de tarefas de natureza promocional e publicitária – de divulgação de marcas e de produtos, em suportes físicos e/ou eletrónicos (websites), como preconiza a Requerida.
De salientar que a natureza económica da atividade e a sua tributação em IVA não são influenciadas ou comprometidas pela circunstância de a Requerente não se dedicar a atividades de publicidade ou de não as ter contempladas no seu objeto social. Alicerçada no princípio da neutralidade, a jurisprudência do Tribunal de Justiça opõe-se a qualquer distinção entre transações lícitas e ilícitas, com a única exceção de bens fora do mercado (de iure e não de facto), o que não é manifestamente o caso[13]. São, deste modo, irrelevantes as reflexões da Requerente sobre o enquadramento e regularidade jurídica das prestações realizadas, prevalecendo, para efeitos de tributação, a realidade substantiva e não a qualificação jurídica ou nomen iuris atribuídos pelas Partes.
Por outro lado, também não colhe o argumento de que a Requerente não prestaria esse tipo de serviços por não estarem contemplados no seu objeto, pois os mesmos constam com clareza das cláusulas dos Protocolos celebrados e por ela firmados.
Deste modo, estamos perante prestações de serviços, efetuadas pela Requerente à Região Autónoma da Madeira, que caem no campo de incidência objetiva do IVA, nos termos do disposto nos artigos 1.º, n.º 1 e 4.º, n.º 1 do Código deste imposto.
Em relação ao caráter oneroso da prestação de serviços em análise, decorre ainda dos referidos Protocolos que, para a prossecução deste objeto, a Secretaria Regional de Agricultura e Pescas da mencionada região concedeu uma comparticipação financeira à Requerente, a pagar faseadamente, implicando a apresentação de comprovativos das despesas incorridas.
Por conseguinte, os serviços não são prestados pela Requerente a título gratuito, nem se alcança qualquer animus donandi. A sua realização encerra o dever, que impende sobre a Secretaria Regional, de efetuar pagamentos à Requerente. Dever que os Protocolos correlacionam de forma expressa e direta com os encargos que a Requerente incorra na atividade promocional a que ficou adstrita. Também neste ponto não subsistem dúvidas de que se verifica um nexo direto e imediato entre a comparticipação recebida pela Requerente e os serviços promocionais que se comprometeu a prestar nos moldes acima descritos.
Posto que se julga incontroverso que as operações objeto dos autos são abrangidas pelo campo de incidência real do imposto (prestações de serviços de divulgação e promoção em suportes físicos e eletrónicos da marca “...” associada a produtos dos setores agroalimentar e das pescas), são realizadas por um sujeito passivo agindo como tal (a Requerente) e localizadas em Portugal, não estando abrangidas por um regime de isenção, importa concluir sobre a natureza dos pagamentos efetuados pela Secretaria Regional de Agricultura e Pescas à Requerente, como contraprestação recebida, nos termos e para os efeitos do artigo 16.º, n.º 1 do Código do IVA, sendo devido este imposto em conformidade com a posição da AT.
A relação entre a Requerente e a Região Autónoma da Madeira prefigura um vínculo contratual e sinalagmático, do qual derivam prestações recíprocas – de facere (para a Requerente) e de pagamento (para a Região Autónoma) – independentemente de quem sejam os beneficiários dos serviços, nomeadamente entidades terceiras aos Protocolos, como os produtores da Região Autónoma da Madeira. Relembra-se que o artigo 16.º, n.º 1 do Código do IVA e, bem assim, o seu correlativo artigo 73.º da Diretiva IVA, incluem no âmbito de incidência deste imposto qualquer contraprestação por serviços prestados, seja esta contraprestação obtida do adquirente dos serviços, dos seus destinatários ou de terceiros.
Ponto é que a contraprestação tenha um nexo direto (direct link) com os serviços prestados, como tem sido reiterado pelo Tribunal de Justiça, o que nas circunstâncias do caso se infere com nitidez dos factos, uma vez que os pagamentos efetuados pela Secretaria Regional, qualquer que seja o nome que lhes atribuam, têm por pressuposto e condição a realização das atividades de divulgação e promoção da marca “...”.
De igual modo, a natureza pública das atribuições da Região Autónoma da Madeira e a afetação dos serviços prestados pela Requerente a fins de interesse público não têm qualquer impacto no enquadramento em IVA. Aliás, na generalidade dos casos, as atividades de interesse geral prosseguidas pelas entidades públicas são-no com recurso à aquisição de bens e serviços, como a eletricidade, comunicações, entre outros, que não deixam de ser tributados em IVA pelo facto de serem consumidos nesse enquadramento. Neste sentido, o Tribunal de Justiça, no Acórdão de 18 de dezembro de 1997, Landboden-Agrardienste GmbH, processo C-384/95, p. 20, vem declarar que um pagamento efetuado por uma autoridade pública no interesse geral pode “constituir a contrapartida de uma prestação de serviços na aceção da Sexta Diretiva [atualmente Diretiva IVA] e também não implica que a noção de prestação de serviços dependa do destino que é dado ao serviço por quem o paga. Apenas a natureza do compromisso assumido deve ser tida em consideração: para se inserir no sistema comum do IVA, esse compromisso deve acarretar um consumo.”
No caso concreto, a Requerente forneceu serviços específicos de divulgação de marca que lhe foram solicitados e contratados pela Região Autónoma da Madeira, em relação aos quais recebeu uma comparticipação financeira, concluindo-se, por isso, que estamos perante uma prestação de serviços realizada com caráter oneroso, tributável nos termos do preceituado nos artigos 4.º, n.º 1 e 16.º, n.º 1 do Código do IVA, à taxa normal de 23% prevista no artigo 18.º, n.º 1, alínea c) do mesmo diploma. Não assiste, neste ponto, razão à Requerente, improcedendo o alegado vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.
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Sobre a Alegada Insuficiência de Fundamentação
A Requerente suscita o vício de fundamentação das liquidações em crise que, na sua perspetiva, não permite compreender as razões que levaram a Requerida a rejeitar a qualificação efetuada pelas Partes nos Protocolos acima referidos, caracterizando a atividade da Requerente como prestação de serviços e sujeitando-a a IVA, enfermando de ilegalidade formal, e consequente anulabilidade, ao abrigo do disposto nos artigos 77.º, da LGT e 153.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”).
A este respeito interessa assinalar que o dever de fundamentação dos atos da Administração Pública que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes deriva de imperativo constitucional, abrangendo os atos lesivos e impositivos (v. artigo 268.º, n.º 3 da Constituição). Este dever de fundamentação, desempenha a função primordial de permitir que o destinatário do ato se inteire das razões que subjazem à decisão administrativa, permitindo o controlo da sua validade, através da análise dos respetivos pressupostos, e o acesso à garantia contenciosa, dando a conhecer ao sujeito passivo o itinerário cognoscitivo e valorativo para a AT ter decidido no sentido em que decidiu.
Na situação vertente, ao contrário do que a Requerente alega, o Relatório de Inspeção Tributária é explícito em relação às razões que justificam as correções operadas, tendo a Requerida dado a conhecer as razões da sua atuação e as normas em que se alicerça, pelo que, do ponto de vista formal, e independentemente dos seus méritos, o ato se encontra suficientemente justificado com a enunciação clara e percetível dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo. Relatório que foi adequadamente compreendido pela Requerente, que o refuta de forma pormenorizada na presente ação arbitral.
Por outro lado, a AT não rejeitou a qualificação efetuada pelas Partes nos Protocolos, pois estes não contêm qualquer enquadramento das operações em IVA, nem a menção a subsídios, subvenções ou serviços. Essa qualificação que a Requerente pretende impor como ato de vontade (unilateral) não deriva dos Protocolos, e sempre terá de extrair-se da aplicação das normas vigentes, atenta a situação concreta a subsumir.
Tendo a Requerente sido notificada do Relatório de Inspeção Tributária contendo a fundamentação circunstanciada das razões subjacentes às liquidações de IVA e juros compensatórios aqui discutidas, conclui-se que foram observados os requisitos de fundamentação do ato tributário previstos no artigo 77.º da LGT e 153.º do CPA, não se constatando a ilegalidade formal suscitada pela Requerente.
Questão distinta, atrás apreciada, é a da validade, já não formal (relativa à enunciação dos motivos), antes substancial dos fundamentos do ato, que “tem já a ver com o mérito da decisão e com a legalidade «stricto sensu» do próprio ato”, quer por os factos não corresponderem à realidade, quer por terem sido extraídas conclusões erradas ou não serem “suficientes para legitimar a concreta atuação administrativa (VIEIRA DE ANDRADE, O Dever de Fundamentação Expressa de Atos Administrativos, Almedina, 2003, pág. 231)” – acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 23 de abril de 2014, processo n.º 1690/13, e de 21 de novembro de 2019, processo 0404/13.9BEVIS. Neste ponto, e conforme atrás apreciado, a fundamentação substantiva também não padece do erro de direito que lhe foi imputado.
À face do exposto, conclui-se, quer em relação à fundamentação formal, quer no tocante à fundamentação substantiva, serem improcedentes as ilegalidades alegadas pela Requerente, mantendo-se válidos os atos tributários de liquidação de IVA supra identificados, emitidos com referência ao ano 2019.
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Restituição das Importâncias Pagas e Juros Indemnizatórios
A Requerente peticiona o reembolso das quantias pagas adicionado dos juros indemnizatórios correspondentes, ancorada nos artigos 43.º e 100.º da LGT. Contudo, as liquidações de IVA e de juros compensatórios aqui impugnadas não padecem dos vícios invalidantes suscitados pela Requerente, mantendo-se válidas, pelo que improcede, sem mais, por falta de preenchimento dos respetivos pressupostos constitutivos, o pedido de restituição de imposto e, bem assim, dos juros indemnizatórios àquele respeitantes.
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Desnecessidade de Reenvio Prejudicial
As questões discutidas nos autos estão clarificadas pelo Tribunal de Justiça conforme a jurisprudência que foi atrás referenciada.
Neste contexto, de acordo com o entendimento do Tribunal de Justiça, a partir do acórdão Cilfit[14], a obrigação de suscitar a questão prejudicial de interpretação pode ser dispensada quando:
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A questão não for necessária, nem pertinente para o julgamento do litígio principal; ou
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O Tribunal de Justiça já se tiver pronunciado de forma firme sobre a questão a reenviar, ou quando já exista jurisprudência sua consolidada sobre a mesma; ou
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O juiz nacional não tenha dúvidas razoáveis quanto à solução a dar à questão de Direito da União, por o sentido da norma em causa ser claro e evidente.
No caso sub judice, verifica-se o preenchimento dos requisitos previstos nas alíneas b) e c), podendo afirmar-se que o “ato” em questão está devidamente aclarado pela jurisprudência consolidada do Tribunal de Justiça que já se pronunciou “de forma firme”, pelo que não há fundamento para suscitar o reenvio prejudicial.
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Por fim, importa referir que foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, nos termos do disposto nos artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
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Decisão
À face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em julgar improcedente a ação arbitral, incluindo o pedido de juros indemnizatórios, com a consequente manutenção dos atos tributários de IVA e juros compensatórios impugnados, referentes a 2019.
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Valor do Processo
Fixa-se ao processo o valor de € 116.408,61, indicado pela Requerente, respeitante ao montante de IVA liquidado e juros compensatórios cuja anulação pretende, e não impugnado pela Requerida, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Lisboa, 24 de junho de 2022
Os árbitros,
Alexandra Coelho Martins
Catarina Belim
(com declaração de voto de vencido)
Sofia Ricardo Borges
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDA
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Admitindo a complexidade do tema em discussão e com todo o respeito pela decisão do coletivo, não consigo acompanhar a mesma na parte em que desconsidera o valor monetário atribuído à Requerente como subvenção pública (classificando-o “automaticamente” de compensação por serviços de publicidade) – “parte VI. Direito 1. Razão de Ordem” – o que parece afastar-se dos testes exigidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e do Supremo Tribunal Administrativo para validação do tratamento em IVA da atribuição aqui em causa.
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Dos autos consta a cópia dos dois Protocolos celebrados entre a Requerente e a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, um em 23 de agosto de 2018, para vigorar até ao final desse ano civil (documento 5 junto ao PPA), e outro em 18 de julho de 2019, para vigorar até 31 de dezembro de 2019 (documento 6 junto ao PPA).
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Os considerandos dos Protocolos contêm o seguinte teor:
Quanto a 2018:
“Considerando que é objetivo expresso no Programa do XII Governo Regional da Madeira, estimular, na articulação dos interesses dos produtores e dos agentes da comercialização, a estruturação de dois modelos de orientação e especialização produtivas, um dirigido à satisfação das necessidades correntes do mercado local, e outro vocacionado para as solicitações dos mercados externos;
Considerando que, naquele sentido, entre outras, é política incentivar a expedição e ou exportação dos produtos da agricultura, das pescas e do agroalimentar que reúnam vantagens competitivas nos mercados exteriores da Região Autónoma da Madeira, para isso criando sustentadamente as condições que facilitem o melhor acesso aos mesmos, a passar necessariamente pela promoção e comunicação do valor destas produções e, dentro dos stakeholders, designadamente junto dos distribuidores da fileira agroalimentar;
Considerando que, por outro lado, no desenvolvimento daquele desiderato, é um dos objetivos da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas intensificar a difusão e divulgação da marca «...», relevando a qualidade distinta das produções que a ostentam e, com isso, alicerçando a sua competitividade nos mercados;
Considerando que a A..., vem assegurando há pouco mais de um ano, com qualidade reconhecida, um serviço exclusivamente dedicado ao transporte aéreo de mercadorias Lisboa/Funchal/Lisboa, com aeronaves adaptadas a este objetivo especifico, sendo no presente a única empresa que disponibiliza este tipo de solução à fileira agroalimentar da Região Autónoma da Madeira, fundamental, sobretudo para os géneros alimentícios de maior valor acrescentado, e em que um elevado grau de frescura e ou a rapidez e regularidade de fornecimento são condição base à competição nos mercados;
Considerando que a A..., pelos meios que reúne e ações que desenvolve, pode constituir-se, per si, um excelente meio de promoção e divulgação direta das produções com a marca «... », contribuindo para o incremento da sua valorização e o alcance de novos mercados internacionais, como ainda, indiretamente, do próprio destino Madeira;
Considerando que a A..., está disposta, em complemento á sua ação comercial de promoção dos seus serviços, a desenvolver um conjunto ações de promoção e divulgação das produções com a marca «... », quer no mercado do continente português quer em mercados premium internacionais;
Considerando que o Orçamento da Região Autónoma da Madeira, inclui o projeto SIGO 50042, com a designação "Promoção e valorização dos produtos regionais", o qual, entre outros objetivos, visa apoiar a promoção dos produtos agrícolas e agroalimentares regionais, principalmente dos que giram sob a égide da marca «... », relevando a sua qualidade distinta e alicerçando a sua competitividade nos mercados;
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 32.º e do n.0 2 do artigo 33.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/2018/M, de 9 de janeiro, e da Resolução n.º 511/2018, de 16 de agosto, é celebrado o presente protocolo entre a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, legalmente representada pelo Dr.º..., adiante designada por Primeira Outorgante, e a A..., Lda., contribuinte fiscal ... (…):”
Nesta sede, o Decreto Legislativo Regional n.º 2/2018/M, de 9 de janeiro, publica o Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2018.
Os artigos 32.º e n.º 2 do artigo 33.º deste diploma têm o seguinte teor:
“ CAPÍTULO VIII
Artigo 32.º
Concessão de subsídios e outras formas de apoio
1 - Nos limites necessários ao cumprimento dos compromissos e objetivos orçamentais assumidos pela Região Autónoma da Madeira, fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a entidades públicas e privadas no âmbito das ações e projetos de desenvolvimento que visem a melhoria da qualidade de vida e tenham enquadramento no plano de desenvolvimento económico e social da Região Autónoma da Madeira, designadamente para:
a) Construção ou a reabilitação de habitação social;
b) Requalificação dos bairros sociais;
c) Apoio à habitação para jovens e para desempregados;
d) Recuperação de habitações pertencentes a famílias carenciadas;
e) Projetos e iniciativas de inclusão social.
2 - Fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a ações e projetos de caráter social e económico, cultural, desportivo e religioso, que visem, nomeadamente a salvaguarda das tradições, usos e costumes, o património regional e ou a promoção da Região Autónoma da Madeira.
3 - Fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a entidades públicas no âmbito da subsidiação do preço de água de rega, tendo em conta o enquadramento social e ambiental da atividade agrícola na Região Autónoma da Madeira.
4 - O Governo Regional pode ainda criar linhas de crédito bonificadas, nomeadamente nas áreas da educação, da formação profissional, da agricultura e da pesca, cujas condições são aprovadas por resolução do Conselho do Governo Regional.
5 - No âmbito do disposto no n.º 2, os apoios a conceder podem assumir a forma de compensação pelos financiamentos utilizados pelas entidades beneficiárias na prossecução dos objetivos inerentes.
6 - Em casos excecionais, devidamente fundamentados, podem ser comparticipadas despesas de funcionamento assumidas antes da vigência do respetivo contrato-programa, incluindo eventos que tenham sido realizados dentro do mesmo ano económico e a consolidação do passivo de entidades integradas no universo das administrações públicas em contas nacionais, cujas despesas tenham sido devidamente contabilizadas para efeitos de contas nacionais.
7 - A concessão destes auxílios fundamenta-se em motivo de interesse público e faz-se com respeito pelos princípios da publicidade, da transparência, da concorrência e da imparcialidade.
8 - Com exceção das linhas de crédito bonificado a que se refere o n.º 4, os subsídios e outras formas de apoio concedidos são formalizados através de contrato-programa com o beneficiário, onde são definidos os objetivos, as formas de auxílio, as obrigações das partes e as penalizações em caso de incumprimento, podendo não ser efetuada a transferência dos montantes em causa caso subsista qualquer tipo de incumprimento à Região Autónoma da Madeira por parte da entidade beneficiária, ficando, nestes casos, o departamento do Governo Regional com a tutela das finanças autorizado a proceder, sem qualquer formalidade adicional, à retenção dos subsídios e outras formas de apoio atribuídos, até ao montante do incumprimento.
9 - A concessão dos auxílios previstos neste artigo é sempre precedida de uma quantificação da respetiva despesa, devendo ser autorizada através de resolução do Conselho do Governo Regional, após parecer favorável do departamento do Governo Regional com a tutela das finanças, sem prejuízo do disposto nos n.os 10 e 11.
10 - O parecer prévio favorável do departamento do Governo Regional com a tutela das finanças é dispensado nos seguintes casos:
a) Quando os valores a atribuir não ultrapassem os montantes anteriormente concedidos para a mesma finalidade e mesma entidade que tenha beneficiado desse apoio;
b) Quando os valores se destinem a concessão de auxílios a atribuir no âmbito do Plano Regional de Apoio ao Desporto (PRAD) e os mesmos não ultrapassem os montantes definidos e aprovados na portaria que regulamenta e define os valores máximos a atribuir a cada capítulo de apoio ao desporto.
11 - Nas situações de dispensa do parecer prevista no número anterior, a proposta de concessão de auxílio é obrigatoriamente comunicada ao departamento do Governo Regional com a tutela das finanças, antes da sua autorização por resolução do Governo, nos termos a regulamentar por despacho do respetivo membro do Governo.
12 - É nula a concessão de auxílios prevista no presente artigo com omissão de quaisquer formalidades exigíveis.
13 - Todos os subsídios e formas de apoio concedidos são objeto de publicação no Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira.
14 - Os demais procedimentos inerentes aos apoios previstos nesta norma são definidos no decreto regulamentar regional de execução orçamental.
Artigo 33.º
Subsídios e outras formas de apoio abrangidos pelo artigo 32.º deste diploma
1 - Estão abrangidos pelo disposto no artigo anterior os subsídios e outras formas de apoio concedidos pelos serviços da administração direta regional, assim como os referentes a todas as entidades públicas que, nos termos da lei, gozem de autonomia administrativa e financeira.
2 - Os apoios financeiros concedidos ao abrigo de legislação específica respeitam o previsto no respetivo regime legal e os n.os 7 a 12 do artigo anterior.”
Quanto a 2019:
“Considerando a relevância social, económica, cultural e turística do sector agrícola da Região Autónoma da Madeira. Considerando ser perspícuo que a agricultura da Madeira sempre se assumiu historicamente como uma fonte complementar de subsistência das economias familiares madeirenses e como uma forma de preservar uma cultura específica no que respeita à conservação paisagística e ambiental, que muito contribui para a oferta turística da Ilha da Madeira.
Considerando que o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar, por força da conjugação dos apoios comunitários, regionais e dos investimentos particulares, tem vindo a assistir nos últimos anos a um período de desenvolvimento e crescimento, tendo adquirido uma dimensão empresarial que não se compadece com o escoamento das respetivas produções no mercado regional.
Considerado que na sequência da execução do XII programa do Governo Regional, o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar tem sido orientado para produções específicas e diferenciadas como forma de contornar a concorrência das grandes economias no que respeita às produções convencionais e, consequentemente, de gerar mais receitas e rentabilidade para os agricultores, produtores e demais operadores económicos.
Considerando que atualmente a RAM, por força da concretização das políticas do XII Governo Regional para o sector agrícola, das pescas e do agroalimentar possui efetivamente produtos diferenciados e específicos capazes de se afirmarem no mercado nacional e europeu e de gerarem mais receitas e maior rentabilidade económica.
Considerando que pela primeira vez na história do sector agrícola da Madeira estamos a produzir e a exportar, de modo organizado, sustentado e promissor, frutos tropicais e subtropicais para além da banana da Madeira, como sejam a anona e a pera abacate, bem como peixe fresco, em especial a dourada da Madeira.
Considerando o crescimento significativo da aquicultura da Madeira e a necessidade de assegurar o escoamento da respetiva produção para o mercado nacional, europeu e extracomunitário, como forma de garantir um desenvolvimento equilibrado, sustentado e rentável de uma atividade que possui enormes potencialidades económicas.
Considerando que a única forma de garantir a sustentabilidade, o crescimento e o desenvolvimento do sector agrícola, das pescas e do agroalimentar consiste incontestavelmente em apoiar ações e projetos que visem a promoção dos mencionados produtos regionais diferenciados e específicos no mercado nacional e europeu.
Considerando que o consórcio denominado A..., LDA. tem como propósito potenciar o mercado da carga área entre o Continente e o arquipélago da Madeira, através do abastecimento regular de carga composta por produtos frescos, perecíveis e urgentes entre aqueles mercados e da abertura de novos mercados no continente europeu.
Considerado que a A..., LDA. está especialmente vocacionada para o transporte de produtos frescos e de carga perecível, tais como peixe, frutas e flores, sendo a única empresa especializada e com condições logísticas para o efeito a operar no mercado do transporte aéreo daqueles produtos entre o arquipélago da Madeira e Portugal continental.
Considerando que a especialização da logística que a A..., LDA implementou nos seus transportes aéreos de carga composta por produtos frescos e perecíveis permite assegurar a respetiva qualidade com elevados padrões, o que se reflete diretamente na própria promoção dos produtos regionais como sendo produtos diferenciados e específicos de qualidade destacada.
Considerando que a A..., LDA. apresentou um projeto de enorme importância social e económica que visa incentivar as exportações dos produtos denominados frescos e urgentes, tais como frutas e peixe através da respetiva promoção e valorização junto do mercado nacional e comunitário, em especial o mercado espanhol.
Considerando que o mencionado projeto implica uma promoção permanente e regular dos produtos agrícolas regionais específicos e diferenciados através da realização de viagens áreas diárias para o transporte de carga composta por produtos frescos e perecíveis de terça a sábado, com capacidade para 8 toneladas/dia.
Considerando que o Orçamento da Região Autónoma da Madeira contempla o Projeto SIGO 50042, com a designação "Promoção e valorização dos produtos regionais", que entre outros objetivos, visa apoiar a promoção de produtos agrícolas e agroalimentares regionais, principalmente dos que giram sob a égide da marca "...", destacando as suas qualidades específicas e alicerçando a sua competitividade nos mercados nacional e internacional.
Considerando que o referido projeto coincide integralmente com as medidas vertidas no programa do XII Governo Regional que visam incentivar a produção e exportação de produtos regionais diferenciados, através da respetiva promoção no mercado nacional e europeu.
Considerado que na sequência da celebração do "Protocolo de Cooperação Financeira Entre a Região Autónoma da Madeira, Através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas e a A..., LDA", datado de 23, de agosto de 2018, autorizado pela Resolução do Conselho do Governo Regional n.º 511/2018, de 20 de agosto, publicada no JORAM, 1 Série, N.0 133, foram visíveis os efeitos positivos do apoio do projeto de promoção dos produtos regionais em causa no mercado do continente português e espanhol, patente no aumento da procura.
Considerado que todos os esforços e investimentos efetuados a montante no sector agrícola, das pescas e do agroalimentar, bem como o sucesso das políticas preconizadas e concretizadas pelo Governo Regional dependem inteiramente do apoio a jusante de todas as ações e projetos que tenham como finalidade a promoção dos produtos regionais no mercado nacional e europeu, sob pena de existir o sério risco de se perder todo o trabalho que tem vindo a ser efetuado com vista a assegurar a sustentabilidade e rentabilidade dos referidos sectores económicos.
Considerado que a promoção dos produtos regionais específicos e diferenciados contribui, também, para a própria promoção do Arquipélago da Madeira, no mercado nacional e europeu, como destino turístico com características singulares.
Considerando, por conseguinte, que se reveste de manifesto interesse público apoiar o projeto de promoção e divulgação dos produtos regionais específicos e diferenciados apresentado pela A..., LDA
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 34.º e do n.º 2 do artigo 35.º do Decreto Legislativo Regional n.º 26/2018/M, de 31 de dezembro, e da Resolução n.º 413/2019, de 27 de junho, é celebrado o presente protocolo entre a Região Autónoma da Madeira, através da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas, legalmente representada pelo Dr.º ..., adiante designada por Primeira Outorgante, e a A..., Lda., (…)”.
Nesta sede, o Decreto Legislativo Regional n.º 26/2018/M, de 31 de dezembro publica o Orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2019.
Os artigos 34.º e n.º 2 do artigo 35.º deste diploma têm o seguinte teor:
“ CAPÍTULO VIII
Artigo 34.º
Concessão de subsídios e outras formas de apoio
1 - Nos limites necessários ao cumprimento dos compromissos e objetivos orçamentais assumidos pela Região Autónoma da Madeira, fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a entidades públicas e privadas no âmbito das ações e projetos de desenvolvimento que visem a melhoria da qualidade de vida e tenham enquadramento no plano de desenvolvimento económico e social da Região Autónoma da Madeira, designadamente para:
a) Construção ou reabilitação de habitação social;
b) Requalificação dos bairros sociais;
c) Apoio à habitação para jovens e para desempregados;
d) Recuperação de habitações pertencentes a famílias carenciadas;
e) Projetos e iniciativas de inclusão social;
f) Projetos de recuperação/reabilitação de imóveis destinados à prossecução de atividades na área da inclusão social.
2 - Fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a ações e projetos de caráter social e económico, cultural, desportivo e religioso, que visem, nomeadamente a salvaguarda das tradições, usos e costumes, o património regional e/ou a promoção da Região Autónoma da Madeira.
3 - Fica o Governo Regional autorizado a conceder apoio a entidades operadoras de radiodifusão sonora que promovam a divulgação de projetos de caráter social, económico, cultural e desportivo da Região Autónoma da Madeira.
4 - Fica o Governo Regional autorizado a conceder subsídios e outras formas de apoio a entidades públicas no âmbito da subsidiação do preço de água de rega, tendo em conta o enquadramento social e ambiental da atividade agrícola na Região Autónoma da Madeira.
5 - O Governo Regional pode ainda criar linhas de crédito bonificadas, nomeadamente nas áreas da educação, da formação profissional, da agricultura e da pesca, cujas condições são aprovadas por resolução do Conselho do Governo Regional.
6 - No âmbito do disposto no n.º 2, os apoios a conceder podem assumir a forma de compensação pelos financiamentos utilizados pelas entidades beneficiárias na prossecução dos objetivos inerentes.
7 - Em casos excecionais, devidamente fundamentados, podem ser comparticipadas despesas de funcionamento assumidas antes da vigência do respetivo contrato-programa, incluindo eventos que tenham sido realizados dentro do mesmo ano económico e a consolidação do passivo de entidades integradas no universo das administrações públicas em contas nacionais, cujas despesas tenham sido devidamente contabilizadas para efeitos de contas nacionais.
8 - A concessão destes auxílios fundamenta-se em motivo de interesse público e faz-se com respeito pelos princípios da publicidade, da transparência, da concorrência e da imparcialidade.
9 - Com exceção das linhas de crédito bonificado a que se refere o n.º 5, os subsídios e outras formas de apoio concedidos são formalizados através de contrato-programa com o beneficiário, onde são definidos os objetivos, as formas de auxílio, as obrigações das partes e as penalizações em caso de incumprimento, podendo não ser efetuada a transferência dos montantes em causa caso subsista qualquer tipo de incumprimento à Região Autónoma da Madeira por parte da entidade beneficiária, ficando, nestes casos, o departamento do Governo Regional com a tutela das finanças autorizado a proceder, sem qualquer formalidade adicional, à retenção dos subsídios e outras formas de apoio atribuídos, até ao montante do incumprimento.
10 - A concessão dos auxílios previstos neste artigo é sempre precedida de uma quantificação da respetiva despesa, devendo ser autorizada através de resolução do Conselho do Governo Regional, após parecer favorável do departamento do Governo Regional com a tutela das finanças, sem prejuízo do disposto nos n.os 11 e 12.
11 - O parecer prévio favorável do departamento do Governo Regional com a tutela das finanças é dispensado nos seguintes casos:
a) Quando os valores a atribuir não ultrapassem os montantes anteriormente concedidos para a mesma finalidade e mesma entidade que tenha beneficiado desse apoio;
b) Quando os valores se destinem a concessão de auxílios a atribuir no âmbito do Plano Regional de Apoio ao Desporto (PRAD) e os mesmos não ultrapassem os montantes definidos e aprovados na portaria que regulamenta e define os valores máximos a atribuir a cada capítulo de apoio ao desporto.
12 - Nas situações de dispensa do parecer prevista no número anterior, a proposta de concessão de auxílio é obrigatoriamente comunicada ao departamento do Governo Regional com a tutela das finanças, antes da sua autorização por resolução do Governo.
13 - É nula a concessão de auxílios prevista no presente artigo com omissão de quaisquer formalidades exigíveis.
14 - Todos os subsídios e formas de apoio concedidos são objeto de publicação no Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira.
15 - Os demais procedimentos inerentes aos apoios previstos nesta norma são definidos no decreto regulamentar regional de execução orçamental.
Artigo 35.º
Subsídios e outras formas de apoio abrangidos pelo artigo 34.º deste diploma
1 - Estão abrangidos pelo disposto no artigo anterior os subsídios e outras formas de apoio concedidos pelos serviços da administração direta regional, assim como os referentes a todas as entidades públicas que, nos termos da lei, gozem de autonomia administrativa e financeira.
2 - Os apoios financeiros concedidos ao abrigo de legislação específica respeitam o previsto no respetivo regime legal e os n.os 7 a 12 do artigo anterior.”
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Resulta dos considerandos dos Protocolos que está em causa a atribuição, pela administração regional (autónoma) do Estado a uma entidade privada, de dinheiros públicos, no âmbito da prossecução de interesses da Região Autónoma da Madeira.
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Esta realidade pode integrar o conceito de subvenção ou subsídio.
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Pelo que cabe analisar se a atribuição em causa constitui ou não uma subvenção e, concluindo-se pela sua qualificação como subvenção, validar se os fundamentos que legitimam a sua tributação em sede de IVA foram verificados.
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Neste contexto, em sede de IVA, não existe um conceito específico de subvenção.
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O Código do IVA, como referido pela doutrina (vide dissertação de mestrado de Cláudia Gomes sobre “As subvenções e o IVA – algumas reflexões”, publicada online pelo Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa, pág. 56) e pela jurisprudência dos Tribunais Superiores (vide Acórdão STA no processo
09/19.0BEPDL, 14.10.2020, ponto 3.2), prevê o tratamento das subvenções, essencialmente, em duas vertentes:
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a primeira vertente estatui que as subvenções devem ser incluídas na base tributável do imposto e assim sujeitas a tributação, quando diretamente relacionadas com o preço das operações tributáveis praticadas pelos sujeitos passivos (cfr. artº. 16, nº.5, al. c), do Código do IVA; artº 11-A, nº. 1, al. a), da Sexta Directiva IVA., 77/388/CEE do Conselho, 17/05/1977 e atual artº 73, da Diretiva IVA., 2006/112/CE do Conselho, 28/11/2006);
-
uma segunda vertente consubstancia-se na sua inclusão no denominador da fração para efeitos de cálculo do "pro rata", causando deste modo efeitos no cálculo do direito à dedução dos sujeitos passivos mistos (cfr. artigo 19.º n.º 1.º 2º parágrafo da Sexta Diretiva, atual artigo 174.º, n.º 1 alínea b) 2.º parágrafo da Diretiva IVA).
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Podendo ou não concordar com a técnica legislativa utilizada, decorre da letra da lei nacional e comunitária que uma realidade que seja qualificada como subvenção é tratada, regra geral como não tributável em IVA, exceto quando deva ser incluída na base tributável do imposto por ser diretamente relacionada com o preço das operações tributáveis praticadas pelos sujeitos passivos (beneficiários da subvenção).
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Neste sentido, está a resposta dada pela Comissão Europeia a 21 de janeiro de 2019, disponível para consulta online, na sequência de uma questão colocada pelo Parlamento Europeu sobre o tratamento em IVA de subvenções concedidas a nível ambiental, que se passa a transcrever para melhor referência, traduzida para língua portuguesa:
“6 dezembro 2018
Pergunta para resposta escrita P-006156-18
à Comissão
Regra 130
… (S&D)?
Assunto: IVA sobre as subvenções ambientais da UE
Os eleitores chamaram a minha atenção para a aplicação desigual dos regulamentos fiscais na Polónia relativos ao IVA sobre as subvenções da UE aos governos locais para projetos ambientais (por exemplo, instalação de fontes de energia renováveis nas propriedades dos residentes).
Na opinião do Ministério das Finanças polaco, os regulamentos da UE, incluindo o Artigo 73 da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, exigem que os Estados-Membros tratem as subvenções da UE como um valor tributável para o IVA, e também impedem os Estados-Membros de aplicar uma taxa de IVA diferente, ou uma taxa zero, às subvenções ambientais da UE.
No entanto, as interpretações das autoridades fiscais não são uniformes, como é confirmado, entre outras coisas, pela jurisprudência dos tribunais administrativos, que por vezes se sobrepõem a tais interpretações. Como resultado, muitos residentes da província de Kujawsko-Pomorskie estão em desvantagem porque são obrigados a pagar uma taxa de IVA mais elevada, ou seja, sobre a totalidade dos custos, e não apenas sobre a sua própria contribuição para o investimento ambiental.
Tendo isto em conta:
1. As regras da UE exigem que os Estados-membros incluam as subvenções da UE na base tributável do IVA?
2. Não são os Estados-membros autorizados a fixar uma taxa mais baixa ou a isentar tais subsídios de IVA?
3. As subvenções da UE podem ser aumentadas pelo IVA devido de forma a que os residentes não incorram em obrigações fiscais que excedam a sua própria contribuição para o investimento ambiental?
Língua original da pergunta: Polaco
21 de Janeiro de 2019
P-006156/2018(ASW)
Resposta dada pelo Sr. Moscovici em nome da Comissão Europeia
Referência da pergunta: P-006156/2018
1. De acordo com o artigo 73 da Diretiva do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)(1), os subsídios que estão "diretamente ligados ao preço" de uma entrega de bens ou prestação de serviços devem ser incluídos na base tributável sobre a qual o IVA é cobrado. Só podem ser considerados como diretamente ligados ao preço(2) os subsídios que constituem a totalidade ou parte da contrapartida de uma entrega de bens ou prestação de serviços e que são pagos por um terceiro ao vendedor ou fornecedor. Se as subvenções da UE recebidas estão de facto diretamente ligadas ao preço deve ser avaliado à luz dos factos de cada caso
Outras subvenções não são abrangidas pelo âmbito do IVA e, por conseguinte, não podem ser tributadas pelos Estados-Membros. [sublinhado nosso]
2. Se, relativamente a uma entrega tributável, a subvenção tiver de ser incluída no valor tributável, os Estados-membros não estão autorizados a aplicar uma taxa de IVA inferior à normalmente aplicada à entrega em questão, nem podem isentar a subvenção do IVA. O facto de uma subvenção ser concedida ao vendedor ou fornecedor deve permitir-lhe exigir um preço inferior ao preço que teria de exigir na ausência de tal subvenção. No entanto, isto não pode afetar o tratamento do IVA do próprio fornecimento.
3. O IVA, quando não for recuperável ao abrigo da legislação nacional aplicável em matéria de IVA e pago por um beneficiário que não seja uma pessoa não tributável na aceção da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, pode ser declarado como um custo elegível pelo beneficiário de uma subvenção da UE, a menos que o ato de base do programa de despesas da UE preveja o contrário. Na prática, a subvenção da UE pode então reembolsar esse IVA não recuperável. As regras de elegibilidade aplicáveis em matéria de IVA são anunciadas nos respetivos convites à apresentação de propostas.
(1) Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO L 347 de 11.12.2006, p. 1).
(2) Processo C-184/00, Office des Produits Wallons, parágrafo 18.
-
No mesmo sentido está a doutrina nacional de referência nesta matéria, MARIA ODETE OLIVEIRA e SEVERINO HENRIQUES DUARTE, “O Tratamento das Subvenções em IVA, Reflexões Antes e Depois dos Acórdãos de 2005”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal. N.º 202. DGI/Centro de Estudos Fiscais. ISBN 978-972-653-174-6. 2007. p. 223-241, que, de forma eloquente, dispõe sobre o tratamento das subvenções em sede de IVA como “operações fora do campo do imposto” o seguinte (pág. 227 e seguintes):
“A temática das subvenções tem nas disposições sobre valor tributável a sua sede própria. Só aqui lhes resulta efetuada a primeira referência. Sendo a base ou valor tributável das transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto (as efetuadas a título oneroso ou a tal assimiladas) constituído pela «contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro», compreende-se a chamada da subvenção à delimitação e abrangência do conceito de contraprestação, certo como é que o valor desta pode ser satisfeito quer pelo adquirente ou utilizador dos bens ou serviços quer por um terceiro.
Antes não. E assim tem de ser uma vez que o recebimento ou atribuição do
direito a uma subvenção não prefigura em si qualquer operação sujeita a imposto.
Consideradas, quase unanimemente, como entregas gratuitas de fundos, com ausência de contraprestação, de contrapartida direta, sem valor de mercado, e não devolutivas porque a fundo perdido face a um geral interesse público que alicerça a sua concessão, as subvenções situam-se em domínio estranho ao imposto por não integrarem o respetivo pressuposto, o que melhor se entende ainda se e atentar a que as mesmas não podem ser objeto de tráfego empresarial, esgotando-se em quantias monetárias entregue por entes públicos a empresas.
Não constituindo em si próprias operações tributáveis em IVA face ao conceito para estas acolhido no Código do IVA, as subvenções poderão, porém, assumir-se como valor tributável dessas mesmas operações, se para tal estiverem vocacionadas. E isso acontece, rotundamente, quando a subvenção se encontre diretamente vinculada ao preço dos bens ou serviços transacionados, razão que está na base da explicitação constante da alínea c) do n.º 5 do artigo 16º quanto à sua inclusão no valor tributável das transmissões de bens e prestações de serviços, embora tal disciplina se retirasse já, por interpretação, no n.º 1 do mesmo artigo, do conceito de valor tributável.
Este é constituído, como se disse, pelo total da contraprestação, a qual, neste caso, abrange não só o valor pago pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços mas também o valor que é pago pela entidade pública através da subvenção. O preço pago pelo consumidor é menor em virtude da subvenção e então a tributação desta repõe a lógica da tributação global da despesa efetuada, ou seja do total da contraprestação respeitante à transmissão do bem ou prestação do serviço, repondo, por assim dizer, a situação anterior à decisão de concessão da subvenção. E é esta lógica que na sua abrangência restringe as subvenções diretamente conexas com o preço de cada operação àquelas «que são estabelecidas em função do número de unidades transmitidas ou do volume de serviços prestados e sejam fixadas anteriormente à realização das operações».
A vinculação ao preço é determinante, exigindo-se que a subvenção se apresente devida e firmemente fixada antes da operação, deixando de fora do campo de tributação todas aquelas em que, embora exista uma relação subvenção-preço, não há, contudo, uma referência às quantidades transacionadas, resultando pois excluídas, entre outras, as subvenções de investimento ou equipamento ou as de cobertura de prejuízos.
Sendo assim, resta saber qual o tratamento que devem merecer as subvenções não ligadas diretamente ao preço das operações tributáveis. Não sendo em si próprias passíveis de qualificação como operações sujeitas ao imposto, e não integrando, nos termos descritos, o conceito de valor tributável, retira-se, obviamente, que são operações não sujeitas, direta ou indiretamente, i.e., são operações fora do campo do imposto.”
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E está, por fim, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo:
“O artigo 16 do CIVA ao estipular sobre o valor tributável nas transações internas estabelece na alínea c) do nº 5 que o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto inclui “as subvenções diretamente conexas com o preço de cada operação considerando-se como tais as que são estabelecidas em função do número de unidades transacionadas ou do volume de serviços prestados e sejam fixadas anteriormente à realização das operações”.
Da leitura deste preceito retira-se que para que as subvenções possam ser consideradas como diretamente vinculadas ao preço das operações e como tal sujeitas a imposto devem preencher os seguintes requisitos:
a) Constituírem total ou parcialmente a contraprestação.
b) Serem determinadas com antecedência à realização das operações a que se refiram
c) Ou serem estabelecidas em função do número de unidades transmitidas
d) Ou ao volume dos serviços prestados e
e) Serem entregues ao sujeito passivo que efetue as correspondentes operações.
É que só reunidos cumulativamente tais requisitos é que são constitutivas do valor tributável “ex. vi” do disposto na alínea c) do artigo 16 do CIVA, integrando o conceito de contrapartida da operação a que respeitam.”
(cfr. Processo STA 01593/13 de 15.03.2017, “Do Direito))
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Concluindo-se que as subvenções são tratadas, regra geral, como operações não tributáveis em IVA, é assim fundamental, para avaliar da legalidade das liquidações adicionais aqui em causa, aferir se as atribuições monetárias efetuadas à Requerente constituem ou não subvenções (tal como o exercício do TJUE na decisão à 1ª pergunta prejudicial que lhe foi colocada no caso Keeping Newcastle Warm Limited, processo C-353/00).
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Nesta sede, não obstante não existir um conceito específico de subvenção para efeitos de IVA, a jurisprudência dos tribunais superiores tem aplicado o conceito de subvenção baseado na doutrina dominante, o qual abrange:
“a atribuição a um sujeito passivo de IVA., por parte de um organismo internacional ou de um organismo público nacional, ou a expensas destes, de uma prestação de carácter patrimonial, assumindo o sujeito passivo subvencionado o compromisso de adotar uma determinada conduta, prosseguir um dado objetivo ou realizar um certo projeto ou tarefa, de que a entidade que concede a subvenção não é a direta beneficiária/destinatária, mas que visa a satisfação de uma necessidade coletiva ou ir ao encontro de um interesse público considerado relevante (cfr. Rui Laires, O tratamento em IVA das subvenções na legislação e na jurisprudência comunitária, in Ciência e Técnica Fiscal, nº 419, Janeiro/Junho 2007, pág. 86), cfr, ponto 3.2. do Acórdão STA no processo 09/19.0BEPDL, 14.10.2020.
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Ora se aplicarmos o conceito de subvenção em referência ao caso sub judice, a conclusão é a de que as atribuições conferidas à Requerente são subvenções, na medida em que:
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são efetuadas por um organismo de direito público português, o Governo Regional da Região Autónoma da Madeira;
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estão em causa dinheiros públicos, sendo as atribuições realizadas objeto de dotação orçamental no orçamento da Região Autónoma da Madeira e de Resolução do Governo Regional da Madeira, resolução essa a que se dá conhecimento público mediante publicação no Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira (Resolução n.º 511/2018, de 16 de agosto e Resolução n.º 413/2019, de 27 de junho);
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estão em causa interesses gerais públicos de estimular a expedição e ou exportação dos produtos da agricultura, das pescas e do agroalimentar da RAM que reúnam vantagens competitivas nos mercados exteriores da Região Autónoma da Madeira;
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a Requerente tem, naturalmente que cumprir obrigações de reporte ou de prestação de contas pelas atribuições recebidas na medida em que, conforme jurisprudência superior, a assunção do compromisso de adotar uma determinada conduta, um dado objetivo ou um provejo ou tarefa é inerente à transparência e controlo exigidos quando se atribuem dinheiros públicos.
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E por tudo o acima exposto se justifica o meu voto de vencida: não é possível acompanhar a decisão do coletivo quando desconsidera o valor monetário atribuído à Requerente como subvenção pública (classificando-o “automaticamente” de compensação por serviços de publicidade aderindo à posição da AT sem questionar a respetiva qualificação, impugnada pelo Requerente), o que parece afastar-se dos testes exigidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e do Supremo Tribunal Administrativo.
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É que sendo as atribuições realizadas à Requerente subvenções, dita a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do TJUE que as mesmas apenas são tributadas quando “constituem a contrapartida total ou parcial de uma operação de entrega de bens ou de prestação de serviços e que são pagas por um terceiro ao vendedor ou ao prestador de serviços, competindo ao órgão jurisdicional nacional verificar, com base nos elementos de facto que lhe foram apresentados, se a subvenção constitui ou não essa contrapartida. Não sendo contraprestação de operações realizadas por aquele que as auferiu em favor do concedente tais subvenções não são tributadas por inexistência de facto tributário.”
(cfr. Processo STA 01593/13 de 15.03.2017, “Do Direito, por referência ao acórdão do TJUE C184/100).
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E aqui, tal como sucedeu no processo STA 09/19.0BEPDL, 14.10.2020 a AT não provou que as subvenções auferidas pela Recorrente estivessem conexionadas com o preço das suas operações, o que permitiria legitimar a tributação das mesmas em sede de IVA (até porque os elementos dos autos apontam no sentido de não ser possível estabelecer essa conexão – a Requerente não prossegue a atividade de serviços de publicidade mas sim de transporte de mercadoria por via aérea e, nesta ocasião particular, os valores recebidos não são repercutidos no preço dos seus serviços mas sim afetos a custos com agências publicitárias terceiras no âmbito das condutas a que se havia comprometido de divulgação e promoção de produtos da RAM).
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Não existindo demonstração pela AT do cumprimento dos critérios para que uma subvenção seja tributada nos termos do artigo 16.º n.º 5, alínea c) do CIVA (teste que parece ser exigido pelos tribunais superiores e TJUE) – antes existiu pela AT um raciocínio indutivo e “automático” de que as atribuições monetárias visavam o pagamento de serviços onerosos – as liquidações adicionais aqui em causa são, em minha opinião, ilegais por ausência dos pressupostos que permitem tributar subvenções, sendo devida a sua anulação.
Catarina Belim
[1] Além da invocação da prova testemunhal que acabou por não arrolar na ação arbitral.
[2] Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, que estabelece o sistema comum do IVA e que sucedeu à Diretiva 388/77/CEE, de 17 de Maio, conhecida por Sexta Diretiva. A nova Diretiva IVA limitou-se a proceder à renumeração e reorganização da Sexta Diretiva, mantendo praticamente inalterado seu conteúdo, pelo que a anterior jurisprudência do Tribunal de Justiça, referente à Sexta Diretiva, permanece válida e aplicável.
[3] Questão distinta, que não está aqui em apreciação, é a de as autoridades públicas não serem, em princípio, sujeitos passivos de IVA quando atuem no exercício de poderes de autoridade (v. artigo 2.º, n.ºs 2 a 4 do Código do IVA). Na situação vertente, o sujeito passivo é a Requerente e não reveste natureza pública, sendo uma sociedade comercial de direito privado, pelo que o ponto não se suscita.
[4] V. Acórdão do TJCE, de 23 de novembro de 1988, Naturally Yours Cosmetics Ltd., processo 230/87, p. 16; e Acórdão de 5 de fevereiro de 1981, Coöperatieve Aardappelenbewaarplaats GA, processo 154/80.
[5] Acórdão citado Naturally Yours Cosmetics Ltd., processo 230/87, p. 16. V. também Acórdão de 2 de junho de 1994, Empire Stores Ltd, processo C-33/93, p. 18; e, por todos, Acórdão de 20 de janeiro de 2005, Hotel Scandic AB, processo C-412/03, p. 21.
[6] V. Acórdão de 20 de janeiro de 2005, Hotel Scandic AB, processo C-412/03, p. 22.
[7] Se a prestação de serviços como facto tributário de IVA não fosse compaginável com o reembolso exato de despesas, o artigo 9.º, n.º 21 do Código do IVA, que prevê a isenção das prestações de serviços realizadas por grupos autónomos de pessoas que exerçam uma atividade isenta, não poderia elegê-lo como condição da isenção. De facto, se os serviços prestados por estes grupos aos seus membros só são isentos quando deem lugar ao reembolso exato das despesas é porque este reembolso exato das despesas e o conceito de prestação de serviços não se excluem.
[8] V. Acórdão citado Naturally Yours Cosmetics Ltd., processo 230/87, p. 11-12; Acórdão de 8 de março de 1988, Apple and Pear Development, processo 102/86, ponto 12; e Acórdão de 1 de abril de 1982, Kong Trade Development Council, processo 89/81, p. 10.
[9] V. Acórdão de 3 de março de 1994, R. J. Tolsma, processo C-16/03, p. 13-14. Foi a constatação da inexistência de qualquer obrigação jurídica entre o Sr. Tolsma, que tocava realejo na via pública na Holanda, e os passantes ou lojistas que lhe deixavam uma contribuição monetária, meramente voluntária, que afastou a incidência de IVA sobre a dita contribuição.
[10] Contratos sinalagmáticos são aqueles que “dêem lugar a obrigações recíprocas, ficando as partes, em simultâneo, na situação de credores e devedores ou, pelo contrário, apenas facultem uma prestação” – v. António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I Parte Geral, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra, Almedina 2000, p. 309.
[11] V. o acima mencionado Acórdão de 8 de março de 1988, Apple and Pear Development, p. 15-16.
[12] Informação publicitária e de divulgação em suporte físico ou virtual. No primeiro caso, é em geral impressa em grandes formatos e em materiais mais resistentes (como a lona).
[13] Exemplos de bens fora do mercado são a importação ou comercialização de drogas/estupefacientes em relação às quais exista uma proibição total de circulação em todos os Estados-Membros, ou de notas falsas. V. os seguintes Acórdãos do Tribunal de Justiça:
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294/82, de 28.02.1984, Senta Einberger (importação ilegal de estupefacientes);
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289/86, de 05.07.1988, Happy Family (comercialização de haxixe);
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343/89, de 06.12.1990, Max Witzemann (importação de notas falsas);
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C-283/95, de 11.06.1998, Fischer (roletas ilegais, jogos de azar ilícitos e puníveis);
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C-158/97, de 29.06.1999, Coffeeshop Siberië (locação de espaço em café para comercialização de estupefacientes);
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C-3/97, de 28.05.1998, Goodwin and Unstead (venda de perfumes contrafeitos);
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Despacho – C-381/09, de 07.07.2010, Gennaro Curia (empréstimos usurários, isenção).
[14] Acórdão de 6 de outubro de 1982, processo n.º 283/81.