SUMÁRIO: I - O artigo 63º, do TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção. II – É ilegal, por violação desta norma do TFUE, o artigo 22º, do EBF na parte em que exclui da sua aplicação os OIC não residentes em Portugal, por não existir diferença objetiva entre OIC’s residentes e OIC´s não residentes relativa ao tratamento fiscal dos dividendos distribuídos que permita justificar essa discriminação.III – Os juros indemnizatórios, na situação de retenção do imposto na fonte, são devidos desde a data do despacho em que, em sede administrativa, a AT conhece pela primeira vez e não reconhece, a ilegalidade, total ou parcial, da retenção.
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DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros José Poças Falcão (árbitro-presidente), Vasco António Branco Guimarães e Manuel Lopes da Silva Faustino (árbitros vogais), designados, pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o presente Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I - RELATÓRIO
A..., organismo de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) constituído e a operar no Luxemburgo, com sede em ..., ..., ..., Luxembourg, residente, para efeitos fiscais, no Luxemburgo e aí registado com o número de identificação fiscal ..., tendo-lhe sido atribuídos os números de identificação fiscal portugueses ... (Doc 1, com o PPA), doravante designado por “A...” ou “Requerente” , de que é sociedade gestora B..., SARL, com nºs fiscal luxemburguês ..., registada sob o número ...no Registo Comercial do Luxemburgo, com sede em ..., Luxembourg (cfr. Docs 2 a 4) - doravante designada por “B...” ou “ sociedade gestora”, abrangido pelo Serviço de Finanças de Lisboa ...,
veio, nos termos e para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e no artigo ambos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), pedindo para “(...) ser declarada a ilegalidade da, e anulada a, decisão de indeferimento da reclamação graciosa (que identifica), e bem assim declarada a ilegalidade dos atos de liquidação de retenção na fonte de IRC ao A... do exercício de 2019, no que respeita ao montante em excesso de (i) € 185.625,27, incluído nas guias de retenção na fonte n.ºs ... e ... apresentadas pelo Banco C..., NIF ..., referentes a retenções na fonte dos meses de abril e maio de 2019, com a sua consequente anulação nesta parte, atenta a manifesta ilegalidade da liquidação nesta parte, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal contados, até integral reembolso, desde a data do despacho de indeferimento da precedente reclamação graciosa, isto é, desde 31.08.2020 (...)”
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art. 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD nomeou os signatários como árbitros do tribunal arbitral coletivo, que ficou constituído no dia 3-5-2021.
As partes foram devidamente notificadas dessa designação, à qual não se opuseram, nos termos conjugados dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas b) e c) e 8.º do RJAT e 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
A AT apresentou resposta/contestação em 7-6-2021 e formulou pedido de suspensão da instância até decisão por parte do TJUE em sede do pedido de reenvio prejudicial das questões prejudiciais formuladas no âmbito do processo do CAAD n.º 93/2019-T, com o fundamento na circunstância de estar nesse processo em causa a mesma questão de Direito, com um substrato fáctico em tudo semelhante ao dos presentes autos. Juntou cópia do processo administrativo instrutor.
Ouvidas previamente as partes, por decisão do Tribunal de 9-8-2021, foi determinada a suspensão da instância nos termos seguintes:
Conforme se pode constatar pela decisão publicada no site do CAAD, no âmbito do processo arbitral nº 93/2019-T do CAAD, em que se discute matéria em tudo semelhante à que é objeto destes autos, foi determinada a suspensão da instância e suscitada a pronúncia do TJUE, nos termos da alínea a) do artigo 267.º, do TFUE, sobre as seguintes questões prejudiciais:
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O artigo 56.º [CE] (atual artigo 63.º TFUE), relativo à livre circulação de capitais, ou o artigo 49.º [CE] (atual artigo 56.º TFUE), relativo à livre prestação de serviços, opõem-se a um regime fiscal como o que está em causa no litígio no processo principal, constante do artigo 22.º do EBF, que prevê a retenção na fonte de imposto com caráter liberatório sobre os dividendos recebidos de sociedades portuguesas a favor de OIC não residentes em Portugal e estabelecidos noutros países da UE, ao mesmo tempo que os OIC constituídos ao abrigo da legislação fiscal portuguesa e residentes fiscais em Portugal podem beneficiar de uma isenção de retenção na fonte sobre tais rendimentos?
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Ao prever uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OIC não residentes e reservar aos OIC residentes a possibilidade de obter a isenção de retenção na fonte, a regulamentação nacional em causa no processo principal procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OIC não residentes, uma vez que a estes últimos não lhes é dada qualquer possibilidade de aceder a semelhante isenção?
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O enquadramento fiscal dos detentores de participações dos OIC será relevante para efeitos de apreciação do caráter discriminatório da legislação portuguesa, tendo presente que esta prevê um tratamento fiscal autónomo e distinto (i) para os OIC (residentes) e (ii) para os respetivos detentores de participações dos OIC? Ou, tendo presente que o regime fiscal dos OIC residentes não é, de todo, alterado ou afetado pela circunstância de os respetivos participantes serem residentes ou não residentes em Portugal, a apreciação da comparabilidade das situações para fins de determinar o caráter discriminatório da referida regulamentação deve ser realizada apenas por referência à fiscalidade aplicável ao nível do veículo de investimento?
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Será admissível a diferença de tratamento entre OIC residentes e não residentes em Portugal, tendo em conta que as pessoas singulares ou coletivas residentes em Portugal, que sejam detentoras de participações de OIC (residentes ou não residentes) são, em ambos os casos, igualmente sujeitas (e, em regra, não isentas) a tributação sobre os rendimentos distribuídos pelos OIC, sujeitando os detentores de participações em OIC não residentes a uma fiscalidade mais elevada?
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Tendo em consideração que a discriminação em análise no presente litígio diz respeito a uma diferença na tributação do rendimento relativamente a dividendos distribuídos pelos OIC residentes aos respetivos detentores de participações nos OIC, é legítimo, para efeitos da análise da comparabilidade da tributação sobre o rendimento considerar outros impostos, taxas ou tributos incorridos no âmbito dos investimentos efetuados pelos OIC? Em particular, é legítimo e admissível, para efeitos da análise de comparabilidade, considerar o impacto associado a impostos sobre o património sobre despesas ou outros, que não estritamente o imposto sobre o rendimento dos OIC, incluindo eventuais tributações autónomas?
Pese embora existir Jurisprudência no CAAD, em questões análogas, que considerou não haver fundamento para o citado incidente de reenvio [cfr., v. g., decisões nos processos nºs 96/2019-T(com recurso para STA, que decidiu suspender a instância até decisão no incidente de reenvio - Proc C-545/19, do TJUE), 926/2019-T e 528/22019-T], torna-se, no entanto, prudente, até para cumprimento do disposto no artigo 8º, nº 3, do Código Civil e harmonização na aplicação do direito europeu, aguardar pela decisão do TJUE em sede de reenvio no citado processo nº 93/2019-T (citado processo do TJUE nº C-545/19).
Assim e nos termos do disposto no artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, determina-se a suspensão da instância até à publicação e conhecimento por este Tribunal do acórdão do TJUE, em sede de reenvio prejudicial, no mencionado processo nº 93/2019-T, do CAAD.
Conhecido o Acórdão do TJUE no processo causal da citada suspensão da instância (nº C-545/19), este Tribunal, após prévia audição das partes, declarou, por despacho de 24-4-2022, a cessação da suspensão da instância e determinou o prosseguimento da tramitação do processo.
Por não ter sido requerida pelas partes e ser considerada desnecessária, o tribunal dispensou a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, através de despacho proferido em 24-4-2022, tendo simultaneamente determinado a notificação das partes para alegações finais escritas e fixado data (14/7/2022) para a prolação e notificação do acórdão final às partes.
II – SANEAMENTO
O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, nos termos n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.
O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído (artigos 5.º, n.º 2, 6.º, n.º 1, e 11.º do RJAT), e é materialmente competente (artigos 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT).
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e mostram-se devidamente representadas.
O processo não padece de nulidades nem foram invocadas exceções, podendo prosseguir-se para a decisão sobre o mérito da causa.
III - FUNDAMENTAÇÃO
De facto
São os seguintes os factos essenciais provados:
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O requerente é um Organismo de Investimento Coletivo em Valores Mobiliários (OICVM) que se encontra constituído sob a forma societária, mais concretamente sob a forma de uma “Société d’Investissement à Capital Variable” (SICAV), com sede e direção efetiva no Luxemburgo, administrado por “B..., SARL, com residência fiscal no Luxemburgo [Doc 2, 3 e 4 com o PPA (Pedido de Pronúncia Arbitral)]);
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No ano de 2019 (meses de abril e maio) recebeu lucros, no montante global de € 1.237.501,65 distribuídos (cfr quadro infra) por diversas sociedades com residência fiscal em Portugal...
-
...com retenção de IRC na fonte efetuada, à taxa reduzida de 15%, pelo substituto tributário – C...-, no montante global de € 185,625,28 [artigo 94º-1/c) e 7 do CIRC e ADT celebrado entre Portugal e o Luxemburgo]:
Entidade
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Data
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Valor bruto dos lucros
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Imposto retido na fonte
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Pedido de reembolso de imposto ao abrigo da Convenção
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Imposto final retido ao abrigo da Convenção
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D… S.A.
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24/04/2019
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181.477,21
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45.369,30
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18.147,72
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27.221,58
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E... SGPS S.A.
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29/04/2019
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27.686,40
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6.921,60
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2.768,64
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4.152,96
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F... SGPS S.A.
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09/05/2019
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269.031,98
|
67.257,99
|
26.903,20
|
40.354,79
|
G... SGPS S.A.
|
09/05/2019
|
69.747,28
|
17.436,82
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6.974,73
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10.462,09
|
H... S.A.
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15/05/2019
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3.059,95
|
764,99
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306,00
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459,00
|
H... S.A.
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15/05/2019
|
47.356,17
|
11.839,04
|
4.735,62
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7.103,42
|
I... S.A.
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23/05/2019
|
113.490,48
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28.372,62
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11.349,05
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17.023,57
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J… SGPS S.A.
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24/05/2019
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119.364,00
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29.841,00
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11.936,40
|
17.904,60
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K… SGPS S.A.
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24/05/2019
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255.607,10
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63.901,77
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25.560,71
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38.341,06
|
L…SGPS S.A.
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30/05/2019
|
150.681,28
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37.670,32
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15.068,13
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22.602,19
|
T o t a l
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1.237.501,85
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309.375,45
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123.750,19
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185.625,27
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-
O requerente suportou o imposto retido em Portugal a título definitivo, isto é, sem possibilidade alguma de recuperar no Luxemburgo o imposto assim suportado em Portugal;
-
Invocando, em síntese, que a não aplicação do regime previsto no artigo 22º, do EBF, resulta apenas do facto do Requerente não ser residente em Portugal e, em consequência, considerar que foi alvo de um tratamento discriminatório face àquele que seria conferido a um OICVM residente para efeitos fiscais em Portugal, à luz do Direito da União Europeia (“Direito da UE”) e respectiva jurisprudência, o ora requerente apresentou reclamação graciosa...
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...que, por despacho de 31-8-2020, foi indeferida com a seguinte fundamentação:
Não há outros factos essenciais para o objeto dos autos, provados ou não provados
Motivação
Para a fixação do sobredito quadro factual, fundou-se o Tribunal nos documentos juntos aos autos, no processo administrativo instrutor e na posição não divergente das partes quanto à matéria de facto.
III – FUNDAMENTAÇÃO (cont.)
O Direito
A questão decidenda
A questão a decidir prende-se com a alegada incompatibilidade com o direito europeu da legislação nacional aplicável à tributação dos fundos de investimento (OIC’s) constituídos e a operar de acordo com a legislação nacional, em particular com os princípios da não discriminação e da liberdade de circulação de capitais, sendo com fundamento nessa alegada incompatibilidade, que o Requerente solicita a anulação dos atos tributários de retenção na fonte e consequente reconhecimento do direito à restituição da quantia de € 185.625,27, relativa a retenções na fonte de IRC suportadas em Portugal sobre dividendos distribuídos no ano de 2019, ao abrigo do disposto nos artigos 94º, do CIRC e 22º, do EBF, tudo com as demais consequências legais.
Dito doutro modo: trata-se aqui de apurar da conformidade das normas relevantes do CIRC e do EBF em vigor à data dos factos tributários (ano de 2019) relativas ao regime de tributação dos dividendos auferidos pelo OIC em presença dos princípios estabelecidos no TFUE, em particular com o artigo 63.º do TFUE que garante a liberdade de circulação de capitais e/ou, mais concretamente, saber se a retenção na fonte em IRC sobre os dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal a OIC’s estabelecidos noutros Estados-Membros da União Europeia (in casu o Luxemburgo), isentando de tributação a distribuição de dividendos a OIC’s estabelecidos e domiciliados em Portugal viola, ou não, o artigo 63.º do TFUE.
Vejamos então a questão.
Seguindo muito de perto, o texto do acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral constituído no âmbito do processo do CAAD nº 528/2019-T (que pode ser consultado em www.caad.org.pt) e a que presidiu também o árbitro que preside a este Tribunal, importa, desde logo, ter presente a estrita relação que o artigo 26.º do TFUE estabelece entre a criação do mercado interno e a liberdade de circulação de capitais, arvorada esta, pelo artigo 63.º do TFUE, como uma liberdade fundamental do mercado interno, dotada de relevância constitucional no âmbito do Direito da União Europeia[1] - e que nessa qualidade, goza da primazia normativa sobre o direito interno - , cabendo aos poderes públicos legislativos e administrativos a tomada das medidas internas de transposição, execução e aplicação, consoante os casos, do direito primário e secundário relevante, de forma a assegurar a efetividade da livre circulação de capitais.
Aos tribunais nacionais, na sua qualidade de tribunais europeus em sentido amplo, compete assegurar a primazia de aplicação do direito da União Europeia, desaplicando o direito nacional de sentido contrário. Neste âmbito, sublinha-se a importância do papel interpretativo do TJUE, nomeadamente em sede de ações por incumprimento e de reenvios prejudiciais, devendo os tribunais nacionais conformar-se com o entendimento das normas dos Tratados que venha a ser vertido na jurisprudência daquele tribunal, sob pena de incumprimento do direito da União Europeia e de responsabilidade por parte do Estado-Membro, nos termos que resultam da jurisprudência Francovich[2].
Liberdade de circulação de capitais
Consagrada no artigo 63.º do TFUE, a liberdade de circulação de capitais é indissociável das demais liberdades fundamentais, a saber, de circulação de pessoas, de estabelecimento e de prestação de serviços, diferenciando-se delas na medida em que se estende a terceiros Estados. A liberdade de circulação de capitais implica a proibição de diferenciação discriminatória entre capitais do Estado-Membro e capitais provenientes de fora. Os Estados-Membros podem regular em alguma medida a circulação de capitais, mas não podem discriminar. Quando se trata de densificar o âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais observa-se a inexistência de uma definição deste conceito. Por este motivo, o TJUE tem sucessivamente acolhido e sublinhado o valor enumerativo e indicativo, mas não exaustivo, da Diretiva n.º 88/361/CEE, incluindo o respetivo Anexo I, nomeadamente o número IV, onde se subsume ao conceito uma vasta constelação de operações e transações transfronteiriças sobre certificados de participação em organismos de investimento coletivo, em que se incluem as relevantes in caso[3]. Com efeito, a distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal ao ora Requerente é passível de ser qualificada como movimento de capital na aceção do artigo 63.º do TFUE e da própria Diretiva 88/361/CEE, de 24 de junho de 1988.
Existem pelo menos quatro aspetos fundamentais de regime jurídico que se revestem de grande relevância hermenêutica e metódica, e que por esse motivo devem ser salientados. O primeiro diz respeito à aplicabilidade direta do artigo 63.º TFUE e da inerente proibição de restrições injustificadas da liberdade de circulação de capitais. O segundo refere-se ao facto de as liberdades fundamentais do mercado interno terem como principais destinatários os Estados-Membros, que devem abster-se de adotar medidas legislativas, administrativas e jurisdicionais de restrição das mesmas. O terceiro aspeto prende-se com a relação de complementaridade – e por vezes de sobreposição – que a liberdade de circulação de capitais estabelece com as liberdades de circulação de mercadorias e de pessoas, a liberdade de estabelecimento e a liberdade de prestação de serviços. Um quarto ponto tem que ver com o reforço progressivo da importância da liberdade de circulação de capitais no mercado interno, especialmente a partir da criação da União Económica e Monetária (UEM)[4]. Um dos principais objetivos da UEM consiste, precisamente, em facilitar a livre transferência de capital entre os Estados-Membros no quadro do mercado interno e das relações económicas e financeiras com Estados terceiros. A criação de um mercado interno supõe, por definição, a gradual e efetiva abolição dos diferentes mercados nacionais, em favor de um único mercado interno, de forma a potenciar o crescimento económico à escala europeia através da mais fácil disponibilização de capital[5].
Âmbito normativo e tributação
O âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais do artigo 63.º, do TFUE abrange vários domínios (v.g. movimento físico da moeda; investimento em propriedade imobiliária e títulos de crédito, etc.), sendo um deles, justamente, o do tratamento fiscal dos movimentos de capitais, que cai sob alçada da respetiva aplicabilidade direta[6]. Embora a fiscalidade direta seja da competência dos Estados‑Membros, a mesma deve ser exercida no respeito do direito da União Europeia, sem de qualquer discriminação em razão da nacionalidade ou da residência[7].
O problema específico do tratamento fiscal da distribuição de dividendos tem ocupado um lugar central na jurisprudência europeia, incluindo não apenas o TJUE, mas também o Tribunal EFTA[8]. Tanto este último órgão, no caso Focus Bank[9], como o TJUE, em casos como ACT GLO[10], Denkavit[11], Amurta[12], Truck Center[13], Aberdeen Property[14], Comissão v. Países Baixos[15], Comissão v. Portugal[16], Santander Asset Management[17] e Sofina SA[18], para citar apenas alguns dos mais relevantes exemplos, pese embora algumas diferenças factuais e jurídicas nas respetivas decisões, apontam globalmente no sentido de dever considerar-se que o tratamento fiscal diferenciado de residentes e não residentes – v.g. imputando aos investidores residentes um crédito de imposto e sujeitando as entidades não residentes a retenção de imposto sem imputação; retendo imposto sobre dividendos pagos a não residentes e não retendo no caso de dividendos pagos a residentes – configurar, em princípio, uma violação da liberdade de circulação de capitais e nalguns casos também da liberdade de estabelecimento, pondo em causa o funcionamento do mercado interno[19].
Como acima se assinalou, a discriminação começou a ser apontada pelo Tribunal EFTA no caso E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004, sobre dividendos pagos por uma empresa norueguesa a acionistas residentes e não residentes na Noruega, beneficiando os primeiros (e não os segundos) de um crédito de imposto sobre a retenção feita na empresa. Posteriormente, o TJUE sustentou, no caso C-374/04 - Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, 12.12.2006, sobre o tratamento diferenciado de dividendos pagos por sociedades britânicas a sociedades mãe residentes ou não residentes no Reino Unido, sofrendo as mesmas uma desvantagem no fluxo de caixa, que quando o Reino Unido exerce a sua jurisdição fiscal sobre rendimento obtido na fonte deve fazê-lo de forma a garantir a igualdade de tratamento em matéria de crédito de imposto relativamente a residentes e não residentes, considerando-se que uns e outros estão em situação comparável.
No mesmo sentido se pronunciou a mesma instância jurisdicional no caso C-170/05, Denkavit, 14.12.2006, relativamente à retenção de imposto, pela França, sobre dividendos pagos por filiais residentes a sociedades mães não residentes, ficando os dividendos pagos a sociedades mães residentes quase isentos de impostos, tendo o tribunal sublinhado que a partir do momento em que a França, unilateralmente ou mediante tratado, decide impor uma retenção sobre pagamentos a não residentes, os mesmos ficam colocados em situação comparável aos residentes. No caso C-379/05, Amurta SGPS, 08.11.2007, relativamente retenção de imposto de 25%, pela Holanda, sobre dividendos pagos a sociedades mães não residentes, sendo os dividendos pagos a residentes isentos de imposto, considerou-se que ambos estão em situação comparável, devendo qualquer mitigação da dupla tributação abranger residentes e não residentes.
Importa igualmente ter em conta a decisão proferida no caso C-282/07, Belgian State - SPF Finances v Truck Center SA., 22.12.2008, relativamente à retenção de imposto sobre pagamentos de juros ao exterior, em que o TJUE considerou que residentes e não residentes não estavam em situação comparável, na medida em que, quando a sociedade distribuidora de juros e a sociedade beneficiária desses juros residem na Finlândia, esta última atua na sua qualidade de Estado da residência, ao passo que quando uma sociedade residente nesse Estado paga juros a uma sociedade não residente, a Finlândia atua na sua qualidade de Estado de origem dos juros. No caso C-282/07, Aberdeen Property Fininvest Alpha, 18.06.2009, o TJUE sustentou que a diferença de tratamento fiscal dos dividendos entre as sociedades‑mãe, em função do local da sua sede, é suscetível de constituir uma restrição à liberdade de estabelecimento, em princípio proibida pelo TFUE, uma vez que torna menos atraente o exercício da liberdade de estabelecimento por sociedades estabelecidas noutros Estados‑Membros, as quais poderiam, consequentemente, renunciar à aquisição, à criação ou à manutenção de uma filial no Estado‑Membro que aplica esta diferença de tratamento.
Na decisão proferida no processo C-521/07, Comissão v. Países Baixos, 11.06.2009, entendeu-se que a não isenção de retenção de imposto a dividendos pagos a sociedades não residentes, diferentemente do que sucedia relativamente a sociedades residentes com participações iguais ou superiores a 5% constitui uma restrição da liberdade de circulação de capitais no EEE. Também no caso C-493/09, Comissão v. Portugal, 06.10.2011, o TJUE entendeu que não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 63.° TFUE e 40.° do Acordo Espaço Económico Europeu, o Estado‑Membro que reserva o benefício da isenção de imposto sobre as sociedades apenas aos fundos de pensões residentes no seu território. Esta diferença de tratamento tem por efeito dissuadir os fundos de pensões não residentes de investir em sociedades portuguesas e os aforradores residentes de investir nesses fundos de pensões.
Uma posição semelhante foi seguida pelo TJUE na decisão relativa aos casos C‑338/11 a C‑347/11, Santander Asset Management SGIIC SA, 10.05.2012, numa situação de retenção de 25% sobre dividendos distribuídos a OIC’s (valores mobiliários) não residentes, em que se considerou que quando um Estado‑Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos OIC beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do caráter discriminatório ou não da referida regulamentação. Também no caso C-575/17, Sofina, Rebelco e Sidro, 22.11.2018, o TJUE sustentou, relativamente a uma retenção na fonte de 25% sobre dividendos distribuídos a não residentes, reduzida a 15% por uma CDT, que, uma vez que os dividendos recebidos por uma sociedade não residente são tributados aquando da sua distribuição, há que ter em conta o exercício fiscal de distribuição dos dividendos para comparar a carga fiscal que incide sobre esses dividendos e a que incide sobre os dividendos distribuídos a uma sociedade residente.
Embora não estejam sempre numa situação comparável, residentes e não residentes são colocados nessa posição a partir do momento em que o Estado-Membro que se considere, unilateralmente ou por convenção, opte por tributar os acionistas não residentes de maneira menos favorável que os residentes, relativamente aos dividendos que uns e outros recebam de sociedades residentes. Especialmente relevante, em sede das liberdades de estabelecimento e de circulação de capitais, é o facto de o tratamento fiscal menos favorável dos não residentes os dissuadir, na qualidade de acionistas, de investirem no Estado da residência das empresas distribuidoras de dividendos, e constituir, igualmente, um obstáculo à obtenção de capital no exterior por parte dessas empresas[20].
Por outro lado, a jurisprudência europeia tem insistido na noção de que um Estado-Membro não pode deixar de cumprir as suas obrigações jurídicas decorrentes das liberdades fundamentais do mercado interno por considerar que outro Estado-Membro se encarregará de compensar de alguma maneira o tratamento desfavorável gerado pela sua própria legislação[21]. Neste domínio vale o princípio geral de que as liberdades de circulação de capitais e de estabelecimento requerem a igualdade de tratamento fiscal dos dividendos pagos a residentes e não residentes pelo Estado-Membro anfitrião, no caso de ambos estarem sujeitos a tributação de dividendos[22].
Na interpretação e aplicação das liberdades fundamentais do mercado interno prevalece o entendimento, amplamente sufragado pelo TJUE, segundo o qual a liberdade é a regra e as restrições à liberdade são a exceção. Estas últimas compreendem, quer as limitações ao exercício da liberdade, quer as discriminações no exercício da liberdade. Atento o caráter excecional das restrições, devem as mesmas ser devidamente fundamentadas e objeto de interpretação restritiva. A admissibilidade de restrições à liberdade de circulação de capitais por parte dos Estados-Membros encontra-se prevista no artigo 65.º do TFUE, na senda das derrogações à liberdade de circulação de capitais já previstas na Diretiva n.º 88/361/CEE. A análise do caso concreto deve ser levada a cabo com base nas premissas normativas acima sintetizadas[23].
Comparabilidade das situações
O artigo 65.º alínea a) do TFUE prevê a possibilidade de os Estados-Membros aplicarem disposições pertinentes de direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao lugar de residência ou ao lugar onde o capital é investido. No entanto, essa previsão deve ser atenuada pelo requisito do artigo 65.º, n.º 3, do mesmo Tratado, segundo o qual qualquer exceção não pode constituir um meio de discriminação arbitrária nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida pelo artigo 63.º. Quer dizer, as restrições têm como limite a garantia da própria liberdade de circulação de capitais[24]. Importa, pois, para este efeito, saber se a situação dos fundos de investimento residentes e não residentes em Portugal é objetivamente comparável[25].
No caso de fundos de investimento residentes no Luxemburgo, o artigo 10.º da relevante CDT[26], permite que o imposto retido na fonte, com carácter definitivo, seja limitado à taxa de 15%. No entanto, como os fundos de investimento em causa gozam de uma isenção à luz do direito luxemburguês, sendo considerados fiscalmente transparentes, não podem beneficiar do referido artigo. Numa primeira análise, poder-se-ia dizer que essa impossibilidade resulta do facto de gozarem de uma vantagem fiscal, a isenção, de que os seus congéneres portugueses não usufruem. Estes, beneficiam da isenção de retenção, ao mesmo tempo que estão sujeitos a dois impostos – IRC e Imposto do Selo – cujo efeito cumulativo pode, em certos casos, exceder 23% do valor bruto dos dividendos.
Por outro lado, o imposto retido à Requerente poderá eventualmente dar lugar a um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera dos investidores individualmente considerados. Num caso e noutro, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pelos fundos luxemburgueses. Estas diferenças podem ser invocadas, prima facie, para sustentar que não se trata de situações comparáveis.
Porém, em causa está saber se a determinação da comparabilidade da situação dos fundos residentes e não residentes em Portugal deve entrar em linha de conta com a situação fiscal em que se encontram os fundos de investimento não residentes em Portugal no respetivo Estado de residência – tendo em conta pertinente regime jurídico e as CDT’s entre Portugal e esses Estados – especialmente no caso dos Estados-Membros da União Europeia ou integrantes do Espaço Económico Europeu, ou ainda levar em conta a situação concreta dos respetivos investidores[27]. Soluções normativas que obrigassem a ter em conta, para efeitos de comparação, a situação concreta dos fundos de investimento dos 27 Estados-Membros, a partir das relevantes CDT’s, se os houver, ou a indagar do impacto fiscal da retenção e das medidas de mitigação da dupla tributação económica na situação fiscal de cada investidor individualmente considerado seriam extremamente complexas, mesmo numa situação em que os acionistas fossem, eles próprios, pessoas coletivas, cada qual residente numa jurisdição diferente[28].
Por outras palavras, se se quiser fazer uma determinação caso a caso para cada fundo de investimento não residente ou investidor individual, o trabalho administrativo envolvido, embora possa compensar os Estados-Membros por via de um aumento das receitas, acaba por ser, tendo em conta o grande número de investidores de alguns fundos, administrativamente impraticável. Tanto os fundos residentes em Portugal como os não residentes podem ter acionistas institucionais e individuais de todos os Estados-Membros da União Europeia e de Estados terceiros. Em causa estão, na prática, diferenças significativas de facilidade e praticabilidade administrativa. Diferentemente, se se circunscrever a análise ao nível da situação fiscal dos fundos residentes e não residentes a quem são distribuídos dividendos, uma única determinação será suficiente.
Neste contexto, o que deve relevar é o impacto direto que as normas tributárias têm na atividade dos fundos e não o efeito indireto na situação fiscal dos investidores individualmente considerados. Estes não têm necessariamente a mesma nacionalidade dos fundos, já que hoje é extremamente fácil levar a cabo investimentos transfronteiriços, sendo que esse mesmo é um dos objetivos do mercado interno e da liberdade de circulação de capitais. O rastreamento de investidores individuais espalhados por todo o mundo e a aplicação de um conjunto diferente de regras a cada um deles, dependendo de seu país de domicílio, apresentaria uma situação impraticável para os tribunais que, no futuro, fossem chamados a analisar a conformidade da legislação fiscal nacional em causa com as liberdades de estabelecimento e de circulação de capitais.
O Fundo Requerente, residente no Luxemburgo, pode ter investidores estrangeiros, incluindo portugueses, e os Fundos fiscalmente residentes em Portugal podem ter investidores estrangeiros, incluindo luxemburgueses. A presente ação não foi intentada pelos investidores nem os mesmos são partes nela, nem é lícito chamar à colação a posição (para efeitos fiscais) dos referidos investidores.
O artigo 22.º do EBF não estabelece nenhuma ligação entre o tratamento fiscal dos dividendos de origem nacional recebidos pelos OIC —residentes ou não residentes — e a situação fiscal dos seus detentores de participações. Da mesma forma, a AT não afere da posição dos investidores em OIC estabelecidos (e residentes para efeitos fiscais) em Portugal para reconhecer a estes o regime fiscal previsto no artigo 22.º do EBF[29].
Deve, por conseguinte, considerar-se decisivo, para efeitos de comparabilidade, o facto de a lei portuguesa diferenciar expressamente, para efeitos de retenção na fonte, entre Fundos de Investimento residentes e não residentes – e não a situação fiscal, mais ou menos vantajosa, que os Fundos não residentes possam gozar nos respetivos Estados da residência ou ainda a situação fiscal individual dos respetivos investidores. Do ponto de vista do Estado-Membro que se considere, Fundos residentes e não residentes estão numa situação comparável se ambos estão sujeitos à respetiva tributação[30].
Como sublinhou o TJUE no caso Santander Asset Management[31], quando um Estado‑Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos OIC beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do caráter discriminatório ou não da referida regulamentação. Também não parece a este Tribunal Arbitral ser relevante aferir do impacto fiscal que, nas mais variadas situações individuais e concretas, a sujeição da Imposto de Selo dos OIC residentes em Portugal possa produzir neste ou naquele fundo de investimento, visto tratar-se aí de um imposto sujeito a uma lógica patrimonial totalmente distinta da tributação do rendimento. O critério a ter em conta é, em primeira linha, o da letra do artigo 22.º do EBF, só depois havendo que tomar em consideração outros fatores[32].
Como se pôs em relevo acima, os Fundos residentes e não residentes são colocados numa posição comparável a partir do momento em Portugal opta por tributar os não residentes de maneira menos favorável do que os residentes, dissuadindo aqueles, na qualidade de acionistas, de investirem das empresas residentes distribuidoras de dividendos e dificultando a obtenção de capital no exterior por parte destas mesmas empresas. Por outro lado, Portugal não pode deixar de cumprir as obrigações jurídicas decorrentes das liberdades fundamentais do mercado interno por considerar que os outros Estados-Membros se encarregarão, de alguma forma, de compensar de tratamento desfavorável gerado pela sua própria legislação[33].
Justificação da diferenciação
No âmbito das liberdades fundamentais do mercado interno assume a maior importância a problemática dos chamados limites dos limites. Cumpre, assim, indagar sobre se a diferenciação entre Fundos residentes e não residentes, nos termos do artigo 22.º do EBF na redação relevante à data dos factos, pode ser justificada, à luz da alínea b) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE, nomeadamente por se tratar de uma medida indispensável para impedir infrações às leis e regulamentos nacionais, nomeadamente em matéria fiscal e de supervisão prudencial das instituições financeiras. A própria derrogação prevista nesse preceito é ulteriormente limitada pelo disposto n.o 3, do mesmo artigo – uma norma especial de limite dos limites – que prevê que as disposições nacionais a que se refere o n.o 1 “não devem constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais e pagamentos, tal como definida no artigo 63.°”[34].
Pois bem, no entender deste Tribunal Arbitral, dificilmente se poderia argumentar de forma convincente no sentido da indispensabilidade da medida diferenciadora em apreciação. Em primeiro lugar, é o Estado português que, no exercício da sua jurisdição fiscal, opta deliberadamente por diferenciar entre Fundos residentes e fundos não residentes, isentando os primeiros da retenção de imposto sobre a distribuição de dividendos e sujeitando à mesma os segundos, colocando-os numa situação comparável, e em seguida tratando-os de forma diferente. Ora, não se vê em que medida é que essa diferenciação é indispensável à prevenção de infrações fiscais. Com efeito, não se percebe que a diferenciação em causa possa prevenir a evasão fiscal, nada existindo na mesma que se refira à prevenção de montagens ou construções meramente artificiais, desprovidas de genuína substância económica. Recorde-se que o critério da indispensabilidade aponta para a justificação da diferenciação fiscal em causa apenas quando não existam meios alternativos menos restritivos – de limitação e diferenciação – à disposição do Estado-Membro em presença[35], adequados à salvaguarda do sistema fiscal ou de supervisão[36].
Em segundo lugar, e na linha do que acaba de ser dito, sempre seria possível isentar de retenção (ou diminuir o respetivo montante) tanto os Fundos residentes em Portugal como os Fundos residentes noutros Estados-Membros e, simultaneamente, dar um tratamento fiscal em geral idêntico aos investidores residentes em Portugal pelos dividendos recebidos de sociedades residentes em Portugal ou noutros Estados-Membros, seguindo as orientações definidas pela jurisprudência do TJUE em sede de dupla tributação económica[37]. A existência de alternativas menos restritivas de relativamente fácil concretização legislativa constitui evidência de que se está, no caso, perante uma diferenciação desproporcional e, portanto, ilegítima[38] . Por outro lado, o TJUE tem sustentado que um tratamento fiscal desfavorável contrário a uma liberdade fundamental não pode ser considerado compatível com o direito da União devido à eventual existência de outros benefícios[39]. Nas suas palavras, se os Estados‑Membros utilizarem a liberdade de sujeitar a imposto os rendimentos gerados no seu território, são obrigados a respeitar o princípio da igualdade de tratamento e as liberdades de circulação garantidas pelo direito primário da União[40].
Acresce que, e este é um terceiro aspeto relevante em sede do artigo 65.º n.º1 e 3 do TFUE, a garantia da coerência do sistema fiscal português também não pode ser invocada para justificar a diferenciação de regime da retenção, na medida em que a jurisprudência do TJUE exige uma ligação direta entre a vantagem fiscal em causa e a compensação dessa vantagem através de uma imposição específica, situação que não se verifica necessariamente através da eventual sujeição dos OIC’s às taxas de tributação autónoma de IRC e da Verba 29 da Tabela Geral do Imposto Selo, sendo este um tributo de natureza e lógica patrimonial.
A aplicação trimestral do Imposto de Selo a Fundos em diferentes condições (v.g. Fundos com valorização súbita de ativos, seguida de alienação e distribuição de dividendos; Fundos com perfil conservador de investimento e valor da carteira de investimentos relativamente constante), estando dependente da eventual capitalização dos rendimentos provenientes dos dividendos, pode gerar, dentro de cada um dos sucessivos exercícios, consideráveis disparidades arbitrárias de tratamento fiscal entre os vários Fundos de investimento residentes e entre estes e os não residentes, com impacto evidente nos respetivos Fundos de caixa. Esta realidade é tanto mais significativa quanto é certo que, de acordo com a jurisprudência do TJUE, a apreciação da existência de um eventual tratamento desvantajoso dos dividendos pagos a não residentes deve ser efetuada em relação a cada ano fiscal individualmente considerado[41].
Por outro lado, a aplicação da taxa de tributação autónoma de 23% prevista no artigo 88.º n.º 11 do CIRC – por força do artigo 22.º do EBF – está dependente do facto eventual da não permanência, de modo ininterrupto, das partes sociais a que correspondem os lucros na titularidade dos sujeitos passivos aí previstos durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição, e da sua não manutenção durante o tempo necessário para completar esse período, situações de ocorrência eventual e incerta. Ora, as disparidades de tratamento fiscal assim geradas não asseguram necessariamente a neutralização da desvantagem fiscal em que ficaram colocados os fundos não residentes, sujeitos a uma retenção de imposto suscetível de os dissuadir de investirem em Portugal e de dissuadir os residentes em Portugal de investirem em fundos de investimento de outros Estados-Membros[42].
Também não colhe o argumento do interesse geral na garantia de uma repartição e equilibrada do poder de tributar, devendo entender-se, com o TJUE, que quando um Estado‑Membro tenha optado por não tributar os OIC residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributação entre os Estados‑Membros para justificar a tributação dos OIC não residentes beneficiários de tais rendimentos[43]. Ou seja, em caso algum se poderá entender que se trata aqui de restrições justificadas por razões de segurança pública ou ordem pública[44].
Do mesmo modo, em quarto lugar, a garantia da efetividade da supervisão financeira não justifica, por si só, a diferenciação de tratamento entre fundos residentes e fundos não residentes em Portugal. Como efeito, se é certo que um OIC constituído ao abrigo de legislação estrangeira (em concreto, ao abrigo da legislação de um outro Estado-Membro da UE) e aí sujeito aos poderes de supervisão da respetiva entidade reguladora não cumpre os pressupostos previstos na legislação portuguesa e certamente não estará sujeito à supervisão da CMVM, também o é que o TJUE já sustentou, num caso envolvendo o nosso país, a inadmissibilidade de uma regulamentação nacional que impeça de forma absoluta um determinado fundo de fazer prova de que satisfaz as exigências que lhe permitiriam beneficiar da isenção, nomeadamente fornecendo os documentos comprovativos pertinentes que permitam às autoridades fiscais nacionais verificar, de forma clara e precisa, que esses fundos preenchem, no seu Estado de residência, exigências equivalentes às previstas pela legislação nacional[45].
Como tem sido sucessivamente afirmado pelo TJUE, a liberdade de circulação de capitais consagrada no artigo 63.º do TFUE deve ser interpretada em sentido amplo e as possibilidades de restrição à mesma, previstas e limitadas no artigo 65.º do mesmo Tratado devem ser indispensáveis à prossecução de interesses públicos ponderosos, devidamente fundamentadas e interpretadas de maneira restritiva[46]. É sobre o Estado português que recai o ónus de provar que os seus objetivos fiscais e financeiros não poderiam ser prosseguidos por meios alternativos menos restritivos do que a diferença de tratamento fiscal em causa[47], ónus esse que manifestamente não foi cumprido pela argumentação expendida pela AT, sem prejuízo de se reconhecer o empenhado e competente esforço nesse sentido. A orientação de fundo seguida pela jurisprudência do TJUE sobre o âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais, os seus limites e os limites dos limites – da maior importância à luz da garantia de uniformidade de interpretação e aplicação do direito da União Europeia – torna inviável essa missão probatória no caso concreto.
Este Tribunal Arbitral aceita como boa a noção, várias vezes sustentada pelo TJUE, de que o reconhecimento de uma ampla margem de conformação dos Estados-Membros em sede de regulação dos capitais tornaria a respetiva liberdade de circulação ilusória[48]. Dada a linguagem prudente nelas incorporada, resulta claro que as exceções do artigo 65.º, nº 1, alínea a) e do n.º 3 do TFUE devem ser aplicadas somente em circunstâncias raras e especiais. Esta é uma barreira significativa de difícil superação por parte do Estado português[49].
O Acórdão do TJUE em sede de reenvio prejudicial no Proc CAAD nº 93/2019-T
Pese embora a jurisprudência do TJUE acima referida permitisse sustentar que o artigo 63.º do TFUE consubstancia, para o caso sub judice, uma situação de ato esclarecido (acte éclairé)[50] porquanto, suportada em múltiplos casos, fornece parâmetros suficientemente seguros sobre a interpretação e aplicação que deve ser feita do preceito em causa relativamente às circunstâncias fácticas e normativas do caso concreto, a verdade é que, considerando ter sido determinada a suspensão da instância e determinado o reenvio prejudicial no processo do CAAD nº 93/2019-T e a ulterior formação de jurisprudência significativa, arbitral e até do STA, no sentido de suspender a tramitação dos processos que tivessem por objeto a discussão de situações análogas até ser conhecida a decisão do TJUE sobre a questão, este Tribunal decidiu também suspender a instância por despacho de 9-8-2021 até conhecimento da decisão do TJUE no processo de reenvio nº C-545/19.
Em síntese, dir-se-á que o TJUE foi questionado (i) sobre se os artigos 56º e 63º, do TFUE, devem ser interpretados no sentido de que se opõe a que uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção, (ii) se o tratamento fiscal diferente em função do local de residência da instituição beneficiária pode ser justificado pelo facto de os OIC residentes estarem sujeitos a outra técnica de tributação e (iii) se a apreciação da comparabilidade das situações dos OIC residentes e dos OIC não residentes para efeitos de determinar se existe uma diferença objetiva entre estes de molde a justificar a diferença de tratamento instituída pela legislação desse Estado-Membro, deve ser efetuada apenas ao nível do veículo de investimento ou deve igualmente ter em conta a situação dos detentores de participações sociais.
Pois bem, o TJUE, por acórdão proferido em 17-3-2022, no citado processo de reenvio (C-545/19), decidiu responder às questões suscitadas no sentido de que o artigo 63º, do TFUE, “(...)deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção (...)”.
Ou seja: o TJUE sufragou ou confirmou no essencial o entendimento que alguma jurisprudência arbitral já vinha seguindo[51] que, denegando fundamento para o reenvio, considerava à luz da teoria do ato claro ou do ato esclarecido, que, no caso, a legislação fiscal portuguesa citada, violava o disposto no artigo 63º, do TFUE, quando consagrava diferente tratamento dos dividendos distribuídos consoante a residência do OIC: sujeitos a retenção na fonte os distribuídos por OIC residente a OIC não residente e isentos dessa retenção os distribuídos a OIC residente.
Será, por conseguinte, este também – e agora obrigatoriamente - o sentido da decisão que este Tribunal irá proferir.
Pedido de restituição da quantia paga e juros indemnizatórios
A Requerente formula o pedido de restituição das quantias arrecadadas pela AT, bem como de pagamento de juros indemnizatórios, sendo que nos termos do disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito», de acordo com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Não obstante o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilizar a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, há muito que se entende que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
Por outro lado, apesar de ser, essencialmente, um processo de anulação de atos tributários, o processo de impugnação admite a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT - em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» -e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial) – que dispõe que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.
No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade parcial dos atos de retenção, há lugar a reembolso das importâncias indevidamente retidas, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se os atos tributários objecto do processo arbitral não tivesse sido praticado”.
E no que concerne ao pedido de juros indemnizatórios?
Recorde-se que em causa está, no caso, a aplicação, pela AT, da isenção e das retenções resultantes, respetivamente, dos artigos 22.º do EBF e 94.º n.º 1 alínea c), n.º 3 alínea b), e n.º 4 e 87.º, n.º 4, do CIRC, criando uma diferenciação entre fundos de investimento residentes e não residentes, com potencial impacto dentro de cada um de sucessivos exercícios fiscais, em violação da liberdade de circulação de capitais, uma liberdade fundamental do mercado interno, consagrada no artigo 63.º da TFUE, em termos, de resto, que sempre dariam lugar a infração e responsabilidade por parte do Estado português, na linha do disposto nos artigos 258.º a 260.º do TFUE e da jurisprudência Francovich[52].
A questão que se coloca, no entanto, é a de saber até que ponto a AT deverá ser responsável pelo pagamento de juros indemnizatórios de atos que tiveram origem em procedimentos do substituto tributário traduzidos na retenção fonte de imposto [recebimento de dividendos com retenção de IRC na fonte efetuada, à taxa reduzida de 15%, pelo substituto tributário – C...-, no montante global de € 185,625,28 (cfr supra, factos provados)] - e que ulteriormente vieram a ser impugnados, por via de reclamação graciosa.
Ora, se por um lado, será inquestionável o direito do contribuinte ver anulada a retenção na fonte, por ilegalidade, mais duvidosa é a resposta à questão de saber se serão devidos pela AT juros indemnizatórios e se, sendo-o, desde quando deverão ser contados.
Nesta matéria não poderá deixar de ser ponderada a questão ao nível da natureza do tipo de juros em causa - substancialmente idêntica à dos juros compensatórios, sendo, como estes, uma indemnização atribuída com base em responsabilidade civil extracontratual[53] - e, em especial, nas exceções espelhadas nas diversas alíneas do sobredito artigo 43º-3, da LGT.
Na verdade, revelar-se-ia no mínimo estranha a condenação da AT pelo pagamento de indemnização (os juros indemnizatórios têm, como se viu, essa natureza) desde a data de ato (a retenção de IRC) a que foi completamente alheia a AT ou, por outras palavras, não seria justo nem equitativo fazer retroagir o dies a quo da contagem à data da prática dos citados atos de retenção.
Perguntar-se-á então qual deverá ser, no caso, a data de início da contagem de juros indemnizatórios?
Pois bem, a esta questão tem respondido, de forma consistente, a Jurisprudência, designadamente a do STA, no sentido de que essa contagem se inicia na data em que os Serviços da AT se pronunciam sobre a questão, em sede de reclamação ou recurso hierárquico porquanto só nesse momento se pode falar verdadeira e consistentemente no “erro imputável aos serviços” a que alude o citado artigo 43º, da LGT [“(...) no caso e atos de retenção na fonte..., embora esteja, em princípio, afastada a possibilidade de existir erro imputável aos serviços (na medida em que tanto a determinação da matéria coletável como a liquidação de imposto são levadas a cabo pelo próprio contribuinte ou por substituto, e não pelos serviços), o legislador entendeu que o erro passa a ser imputável aos serviços caso o contribuinte deduza impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) contra tais atos e ocorra a o seu indeferimento (expresso ou silente). Isto é, passará a ser imputável aos serviços a partir do momento em que, pela primeira vez, a administração tributária toma posição desfavorável ao contribuinte e indefere a sua pretensão (...)”] – Cfr. entre outros, o Acórdão do STA de 8-12-2017, no Proc nº 0926/17 e o Acórdão, mais recente, de 7-4-2021, no Proc nº 0360/11.8BELRS.
Por outro lado e de forma algo divergente desta, haverá quem entenda que, dispondo o artigo 100º, da LGT, que sendo a decisão favorável ao contribuinte, a AT está obrigada “(...)á imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na Lei (...)”, tal reconstituição, com juros indemnizatórios incluídos, nem sequer está dependente de pedido formulado nesse sentido pelo contribuinte e impugnante (Cfr, neste sentido e entre outros, Ac. do TCAS de 10-9—2015 – Proc nº 08862/15.
Não se sufraga inteiramente, com o devido respeito, este último entendimento quando o mesmo abrangeria esse momento como coincidente com o da retenção na fonte de imposto sobre dividendos, mas antes o que considera como início da contagem dos juros indemnizatórios a data em que a AT se pronunciou pela primeira vez sobre a questão suscitada pelo contribuinte, ou seja, no caso, a data em que indeferiu a reclamação graciosa apresentada pois que foi neste ato que teve a oportunidade de corrigir a ilegalidade ora reconhecida e não o fez ao manter a aplicação de normas jurídicas nacionais em vigor, a despeito de as mesmas violarem o direito da União Europeia tal como ele foi interpretado pelo TJUE.
Como já deixou, pelo menos, implícito anteriormente, a questão estará então, em saber se a AT poderia ou mesmo deveria desaplicar esse quadro legal nacional violador do TFUE e se, não agindo desse modo, poderá analisar-se a omissão como integrando o conceito de “erro imputável aos serviços” previsto no artigo 43º, da LGT.
Vejamos:
Considerou-se no acórdão do STA de 8 de Março de 2017, proferido no proc. 01019/14, em sintonia com jurisprudência constante do mesmo Tribunal, o seguinte:
“Sobre o denominado “erro imputável aos serviços” tem a jurisprudência desta secção uniforme e reiteradamente afirmado que o respetivo conceito compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como também o erro de direito, e que essa imputabilidade é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na liquidação afetada pelo erro (Vide, entre outros, os seguintes Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: de 12.02.2001, recurso nº 26.233, de 11.05.2005, recurso 0319/05, de 26.04.2007, recurso 39/07, de 14.03.2012, recurso 01007/11 e de 18.11.2015, recurso 1509/13, todos in www.dgsi.pt.).”
Por outro lado, consta do acórdão TJUE de 4 de dezembro de 2018,no processo C‑378/17, em linha com a jurisprudência do mesmo Tribunal aí referida, o seguinte:
“(...) Como diversas vezes afirmou o Tribunal de Justiça, a referida obrigação de não aplicar uma legislação nacional contrária ao direito da União incumbe não só aos órgãos jurisdicionais nacionais mas também a todos os órgãos do Estado, (sublinhado nosso) incluindo as autoridades administrativas, encarregados de aplicar, no âmbito das respetivas competências, o direito da União (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de junho de 1989, Costanzo, 103/88, EU:C:1989:256, n.o 31; de 9 de setembro de 2003, CIF, C‑198/01, EU:C:2003:430, n.o 49; de 12 de janeiro de 2010, Petersen, C‑341/08, EU:C:2010:4, n.o 80; e de 14 de setembro de 2017, The Trustees of the BT Pension Scheme, C‑628/15, EU:C:2017:687, n.o 54) (...) Daqui resulta que o princípio do primado do direito da União impõe não só aos órgãos jurisdicionais mas a todas as instâncias do Estado‑Membro que confiram plena eficácia às normas da União (...)”
Também na decisão do processo The Trustees of the BT Pension Scheme, C‑628/15, pode também ler-se que “(...) há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, tanto as autoridades administrativas como os órgãos jurisdicionais nacionais encarregados de aplicar, no âmbito das respetivas competências, as disposições do direito da União têm a obrigação de garantir a plena eficácia dessas disposições e de não aplicar, se necessário pela sua própria autoridade, qualquer disposição nacional contrária, sem pedir nem aguardar pela eliminação prévia dessa disposição nacional por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional (v., neste sentido, relativamente às autoridades administrativas, acórdãos de 22 de junho de 1989, Costanzo, 103/88, EU:C:1989:256, n.o 31, e de 29 de abril de 1999, Ciola, C‑224/97, EU:C:1999:212, n.os 26 e 30, e, relativamente aos órgãos jurisdicionais, acórdãos de 9 de março de 1978, Simmenthal, 106/77, EU:C:1978:49, n.o 24, e de 5 de julho de 2016, Ognyanov, C‑614/14, EU:C:2016:514, n.o 34 (...)”
E, na Doutrina nacional, refere Fausto de Quadros:
“(…) temos a obrigação para a Administração Pública de recusar a aplicação de normas ou atos nacionais contrários ao Direito Comunitário, e de aplicar este mesmo contra Direito nacional de sentido contrário, conforme doutrina acolhida, de forma modelar no caso Factortame, já referido neste livro por diversas vezes. A Administração Pública vai ter, ainda mais do que o legislador, a necessidade de levar essa doutrina em conta no desempenho da sua missão de aplicar o Direito (...)” (DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA, Almedina, 2004, p. 530).
No mesmo sentido, vai Miguel Gorjão-Henriques, que escrevendo sobre o princípio do primado do direito comunitário escreve: ”(…) indubitavelmente, a dimensão clássica do princípio é aquela que, com clareza, nos enuncia Rostane MEHDII, ao salientar que o juiz e a administração têm a obrigação de «excluir as regras internas adotadas em violação da legalidade comunitária” (DIREITO DA UNIÃO, Almedina, 8ª edição, 2017, pag. 365).
E assim também tem concluído, pacificamente, a Jurisprudência nacional, pois, como se pode ler no acórdão do STA proferido em 19.11.2014, no processo 0886/14: “(...) desde há muito tem entendido este Supremo Tribunal, de forma pacífica, que existindo um erro de direito numa liquidação efetuada pelos serviços da administração tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, pois tanto o n.º 2 do artigo 266° da Constituição como o artigo 55° da Lei Geral Tributária estabelecem a obrigação genérica de a administração tributária atuar em plena conformidade com a lei, razão por que qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável à própria Administração, sendo que esta imputabilidade aos serviços é independente da demonstração da culpa de qualquer um dos funcionários envolvidos na emissão do ato afetado pelo erro, conforme se deixou explicado, entre outros, no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 12/12/2001, no recurso n.º 026233, pois «havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário e sendo ela efetuada pelos serviços, é à administração tributária que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte. Por outro lado, esta imputabilidade aos serviços é independente da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efetuar liquidação afetada por erro» já que «a administração tributária está genericamente obrigada a atuar em conformidade com a lei (arts. 266°, n.° 1 da CRP e 55° da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços. - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 14 de Março de 2012, rec. n.º 1007/11, e numerosa jurisprudência aí citada.”
E o mesmo resulta do acórdão do TCAS n.º 1058/10.0BELRS, de 31.01.2019, onde se decidiu: “(...)Em suma, para decidir pela procedência da impugnação o Tribunal de 1ª instância entendeu que, ao contrário do que considerou a AT, ocorreu, no caso, violação do direito comunitário, o que configura erro de direito, a enquadrar no conceito de “erro imputável aos serviços” e que, assim sendo, apelando à jurisprudência resultante do acórdão do STA de 12/12/2001, no proc. nº 026.233, o pedido de revisão é o meio processual adequado para suscitar a apreciação do vício de violação do direito comunitário por parte de norma da legislação nacional, por ser imputável aos serviços. Sendo que o pedido de revisão apresentado pela impugnante (atendendo ao prazo de 4 anos previsto no nº 1 do art. 78º da LGT) é tempestivo e meio idóneo para a apreciação da ilegalidade da liquidação, uma vez que é invocado o apontado erro imputável aos serviços (...)” E aí mais se refere “(...) que está em causa alegado erro de direito imputável aos serviços, consistente na emissão de ato tributário em violação do Direito da União Europeia, o qual é reconduzível ao 2.º inciso do n.º 1 do artigo 78.º da LGT. Está em causa erro de direito determinante do agravamento da situação fiscal do contribuinte. De onde se extrai que, ao julgar improcedente a exceção da caducidade da ação, a sentença não enferma do alegado erro de julgamento, pelo que deve ser confirmada, nesta parte (...)”
Finalmente também a Jurisprudência Arbitral tem sufragado o sobredito entendimento alargado do conceito de erro, como se verifica, v. g., na sentença proferida no Proc do CAAD nº 457/2020-T, de 1-4-2020, assim sumariado: “(...) 1. O erro imputável aos serviços concretiza qualquer ilegalidade, compreendendo o erro material ou o erro de facto, como também o erro de direito, no âmbito do qual se enquadra a violação das normas de direito da UE. 2. Existindo um erro de direito numa liquidação efetuada pelos serviços da Administração Tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão considera-se imputável aos serviços, pois tanto o n.º 2 do artigo 266° da Constituição como o artigo 55° da Lei Geral Tributária estabelecem a obrigação genérica de a Administração Tributária atuar em plena conformidade com a lei (...)”.
Subsumindo
No caso sub juditio, à luz da jurisprudência e doutrina referidas e que este Tribunal não vê fundamento para não sufragar, não estando a Requerida, como se viu, exonerada do dever de aplicação do primado do direito europeu, não poderá deixar de proceder o pedido de condenação quanto aos juros indemnizatórios, com fundamento em erro imputável aos serviços decorrente do não reconhecimento, no despacho que, em 31-8-2020, indeferiu a reclamação graciosa a ilegalidade cometida e reclamada.
Ou dito doutro modo: estando a Requerida obrigada a desaplicar o direito nacional contrário ao direito da União, a não observância de tal dever no sobredito despacho consubstancia erro de direito imputável aos serviços.
Daí que o Requerente tenha direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia de € 185.625,27, indevidamente retida, conforme pedido.
Assim é que deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução ao presente acórdão, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do RJAT, determinando o montante a restituir ao Requerente e calcular os respetivos juros indemnizatórios, contados desde 31-8-2020, à taxa legal supletiva das dívidas cíveis, nos termos dos arts. 35.º, n.º 10, e 43.º, n.ºs 1 e 5, da LGT, 61.º, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).
Os juros indemnizatórios são devidos desde a data mencionada (31-8-2020) até à do processamento da nota de crédito, em que são incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT).
IV - DECISÃO
Termos em que acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Declarar ilegal o artigo 22.º, n.º 1, do EBF, na parte em que limita o regime nele previsto a sociedades constituídas segundo a legislação nacional, excluindo as sociedades constituídas segundo legislações de Estados Membros da União Europeia;
b) Declarar ilegal e anular o sobredito ato de indeferimento da reclamação graciosa, na medida em que recusou a anulação, nos termos que aqui se discutiram;
c) Declarar ilegais e anular os atos de retenção na fonte de IRC relativos ao exercício de 2019 nos termos peticionados, ou seja, com fundamento na ilegalidade parcial das guias de retenção na fonte n.ºs ... e ... apresentadas pelo Banco C..., NIPC..., referente a retenções na fonte dos meses de Abril e Maio de 2019;
d) Condenar a Requerida na restituição ao Requerente no montante de € 185.625,27 pago em excesso em consequência da ilegalidade parcial das sobreditas retenções
e) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios nos termos expostos supra e
f) Condenar ainda a Autoridade Tributária e Aduaneira nas custas do processo, atento o seu decaimento.
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Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em € 185.625,27, nos termos do artigo 306.º, n.º 1 do CPC e do 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Valor das Custas: Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.672,00, a cargo da Requerida conforme decidido supra, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I anexa ao mesmo.
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Notifique-se.
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Envie-se ao Ministério Público, para os fins convenientes, cópia deste acórdão.
Lisboa, 29 de junho de 2022
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão
(Presidente do Tribunal e Relator)
Vasco António Branco Guimarães
(Árbitro Adjunto)
Manuel Lopes da Silva Faustino
(Árbitro Adjunto)
Nos termos do artigo 15º-A, do DL nº 10-A/2020, de 13 de março na sua redação atual, aplicável ao processo arbitral tributário nos termos do RJAT, atesta-se o voto de conformidade do árbitro, Senhor Professor Doutor Vasco António Branco Guimarães.
Lisboa, 29-6-2022
O Presidente do Tribunal Coletivo e relator,
José Poças Falcão
[1] C-203/80, Casati, 11-11-1981; cfr. John A. Usher The Evolution of the Free Movement of Capital, 31 Fordham International Law Journal, 5, 2007, 1533 ss.
[2] C-358/93, C-416/93, Bordessa, 23-02-1995; Jarrod Tudor, “The Free Movement of Capital in Europe: Is the European Court of Justice Living Up to its Framers' Intent and Setting an Example for the World?”, 42, Ohio Northern University Law Review, 2015, 195 ss.
[3] C-222/97. Trummer, 16.03.1999; C-302/97, Klaus Konle, 01-06-1999. Acórdão Arbitral do CAAD, Proc. n.º 22/2013 - T, 12.09.2013.
[4] Andreas Haratsch, Christian Koenig, Matthias Pechstein, Europarecht, 9 ed., Tübingen, 2014, 516 ss.
[5] Estes pontos são sublinhados pela Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019, em litígio sobre matéria de facto e argumentação das Requerente e Requerida muito semelhantes aos constantes do presente processo, com reflexos na presente decisão.
[6] Walter Frenz, Handbuch Europarecht, 1 Europaïsche Grundfreiheiten, Berlin, 2014, 1034 ss.
[7] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[8] Cfr., sobre esta matéria, Christiana Hji Panayi, European Union Corporate Tax Law, Cambridge, 2013, 253 ss.
[9] Case E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004.
[10] C-374/04 - Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation, 12.12.2006.
[11] C-170/05, Denkavit, 14.12.2006.
[12] C-379/05, Amurta SGPS, 08.11.2007.
[13] C-282/07, Belgian State - SPF Finances v Truck Center SA., 22.12.2008.
[14] C-282/07, Aberdeen Property Fininvest Alpha, 18.06.2009.
[15]C-521/07, Comissão v. Países Baixos, 11.06.2009.
[16] C- 493/09, Comissão v. Portugal, 06.10.2011.
[17] C‑338/11 a C‑347/11, Santander Asset Management SGIIC SA, 10.05.2012.
[18] C-575/17, Sofina, Rebelco e Sidro, 22.11.2018.
[19] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[20] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[21] Case E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004.
[22] Christiana Hji Panayi, European Union Corporate Tax Law, Cambridge, 2013, 256.
[23] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[24] C-358/93, C-416/93, Bordessa, 23-02-1995.
[25] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[26] Lei 12/82 de 03 de Junho, Aviso publicado em 14.10.1982, em vigor desde 08.10.1982.
[27] William Dickson, “Keeping More of What's Ours: Withholding Refunds and Exemptions in European Union Investments for Public Pension Funds”, 34 Wisconsin International Law Journal, 2016, 120 ss., 132 ss.
[28] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[29] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[30] Christiana Hji Panayi, European Union Corporate Tax Law, Cambridge, 2013, 374.
[31] C‑338/11 a C‑347/11, Santander Asset Management SGIIC SA, 10.05.2012.
[32] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[33] Case E – 1/04, Focus Bank ASA v. The Norwegian State, 23.11.2004.
[34] Haratsch, Koenig, Pechstein, Europarecht…, cit., 525 ss.
[35] C-463/00, Comissão v. Espanha, 13.05.2003, n. 37; C-163/94, Sanz de Lera, 14.12.1995.
[36] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[37] Christiana Hji Panayi, European Union Corporate Tax Law, Cambridge, 2013, 373 ss.
[38] C-203/80, Casati, 11.11.1981.
[39] C-18/15, Brisal e KBC Finance Ireland, 13.07,2016.
[40] C-18/15, Brisal e KBC Finance Ireland, 13.07,2016, n.º 36.
[41] C-252/14, Pensioenfonds Metaal en Techniek, 02.06.2016, n.º 41.
[42] C-252/14, Pensioenfonds Metaal en Techniek, 02.06.2016; C-10/14, C-14/14 e C-17/14, J. B. G. T. Miljoen, 17.09.2015.
[43] C‑338/11 a C‑347/11, Santander Asset Management SGIIC SA, 10.05.2012.
[44] C-423/98, Alfredo Albore, 11-07-2000, sobre restrições à aquisição de imóveis por cidadãos de outros Estados-Membros em zonas de sensíveis de “importância militar”.
[45] C- 493/09, Comissão v. Portugal, 06.10.2011.
[46] C-10/14, C-14/14 e C-17/14, J. B. G. T. Miljoen, 17.09.2015, n.º 63.
[47] C-423/98, Alfredo Albore, 11-07-2000.
[48] C-163/94, Sanz de Lera, 14-12-1995.
[49] Neste sentido, Decisão do CAAD no Processo n.º 90/2019-T, de 23.07.2019.
[50] Haratsch, Koenig, Pechstein, Europarecht…, cit. 251.
[51] Cfr., por exemplo, os Acórdãos proferidos nos Processos do CAAD nºs 528/2019-T, de 23-12-2019 (Tribunal presidido pelo árbitro que também preside a este Tribunal e que ora se seguiu muito de perto) e nº 11/2020-T, de 6-11-2020.
[52] Cfr. Koen Laenarts, Ignace Maselis, Kathlen Gutman, EU Procedural Law, Oxford, 2014, 244 ss.
[53] Aos juros indemnizatórios e compensatórios foi dado carater ressarcitório ou indemnizatório; ao contrário, os juros de mora visam a atribuição de caráter sancionatório.