Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 257/2021-T
Data da decisão: 2022-02-28  IRS  
Valor do pedido: € 37.966,64
Tema: IRS. Mais Valias. Despesas - alínea a) n.º 1 artigo 51.º do CIRS. Imóvel.
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Sumário                                             

  1. - Para efeitos de determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 5 anos e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas no artigo 10.º n.º 1 alínea a) do CIRS-artigo 51.º alínea a) do mesmo diploma legal.
  2. - Despesas inerentes à alienação são aquelas que são inseparáveis da alienação, que com esta têm uma relação intrínseca, que não meramente extrínseca e que dela são indissociáveis.
  3. - Não se pode considerar como despesa necessária inerente à alienação de um imóvel as despesas suportadas relacionadas com execução de trabalhos de carpintaria, fornecimento e instalação de material de cozinha, casa de banho, serviço de limpeza e de deslocação para pequenos arranjos domésticos.
  4. - O caso das comissões imobiliárias é diferente das despesas em causa, pois que, se o interessado opta pela venda do imóvel através da mediação imobiliária, como pode fazer, estas despesas estão, inequivocamente, conexas com a transação concreta na origem das mais-valias, são-lhe inerentes, o que já não acontece com as despesas mencionadas em III.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

1.Relatório

 

A…, casada, titular do número de identificação fiscal (NIF)…, residente na Rua …, n.º …, …, … Lisboa, adiante designada de "Requerente", vem ao abrigo da alínea  a) do n.º1 do artigo 2.º , e alíneas b) e c) (primeira parte) do n.º 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro (RJAT) requerer a constituição de tribunal arbitral e submeter pedido de pronúncia arbitral (doravante designado por PPA) tendo por objeto a declaração de ilegalidade da liquidação adicional de IRS  relativa aos rendimentos de 2018, no valor de € 37.966,64, com a consequente anulação da mesma com fundamento em vício de lei.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 28-04-2021.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou o signatário como árbitro do tribunal singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 16-06-2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados das alíneas a) e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 06-07-2021.

A AT apresentou Resposta, tendo junto o processo administrativo, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral e requerido a dispensa de produção de prova testemunhal e da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT. A Requerente prescindiu da audição de testemunha arrolada.

Não existe qualquer matéria de exceção sobre a qual as partes tenham que se pronunciar.

Ao abrigo do disposto nas alíneas c) e e), ambas, do artigo 16.º e n.º 2 do artigo 29.º, todos do RJAT plasmado no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/1/2011, em vigor, foi decidido pelo tribunal arbitral dispensar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, dispensar as alegações escritas e designar a data da prolação da decisão arbitral conforme com o previsto no n.º1 do artigo 21.º do RJAT.

Ao abrigo do n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, o prazo para a prolação da decisão foi prorrogado uma vez tendo em conta a situação pandémica.

O Tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2.Matéria de facto 

2.1.Factos provados 

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

  1. A Requerente, em sede de IRS, casada, optou pelo regime regra, tributação separada, ou seja, cada um dos cônjuges apresentou a sua declaração de rendimentos para efeitos de IRS relevando nas mesmas 50% da sua capacidade contributiva. 
  2. A Requerente apresentou a sua declaração de IRS relativa a 2018 com o n.º de identificação …-…-… em 27-06-2019 em que no Q4 do anexo G da Modelo 3 de IRS declarou a alienação de um bem imóvel localizado na freguesia com o código …, tipo urbano e com o artigo matricial …, tendo como ano/mês da venda - 2018/07 - um valor de venda: €767.500, ano/mês de aquisição:2012/07, valor de aquisição: €300.000, Despesas e Encargos - €360.028,17, com uma quota-parte de 50%., cf. Doc. 5 anexo ao PPA. Da declaração supra, resultou a liquidação n.º 2019…. no montante de imposto a pagar de €18.019,41, cf. Doc. 6 anexo ao PPA, tendo a Requerente alegado que efetuou o pagamento voluntário até 31-8-2019, não sendo contestado pela Requerida.
  3. O cônjuge B..., com o número de identificação fiscal ..., relativamente à alienação do mesmo imóvel, no Q4 do anexo G da Modelo 3 apresentou a mesma informação numérica necessária ao cálculo da mais valia a ser apurada em sede de IRS, com uma quota-parte de 50%, cf. Doc. 7 anexo ao PPA. Da declaração apresentada pelo cônjuge da Requerente resultou a liquidação n.º 2019…. no montante de €30.022,65, cf. Doc. 8 anexo ao PPA. 
  4.  Em 23-03-2020, a Requerente recebeu um email da Chefe do Serviço de Finanças ...-Lisboa … a comunicar que o montante de €360.028,17 referente a despesas e encargos, já o marido - B..., com o NIF ... - tinha declarado na respetiva declaração de IRS relativa a 2018, pelo que deveria apresentar uma declaração de substituição devendo não declarar qualquer montante de despesas e encargos no Anexo G da sua declaração de IRS ou então seria efetuada uma declaração oficiosa de correção pelos serviços, cf. Doc. 9 anexo ao PPA.
  5. Em 16-04-2020, foi efetuada a declaração oficiosa de correção pela AT tendo dado origem à liquidação oficiosa n.º 2020.... relativa ao ano de 2018 no montante de imposto a pagar de € 107.841,58, cf. Doc. 10 anexo ao PPA, em que o valor de despesas e encargos suportados pela Requerente era de 0 (zero). O montante apurado de €107.841,58 foi deduzido o montante da liquidação inicial de IRS referida no ponto B (€18.019,41€), dando origem a um imposto a pagar de € 89.822,17.
  6. Contestando a liquidação oficiosa n.º 2020.... relativa ao ano de 2018, da qual resultou um montante de imposto a pagar de €107.841,58, em sede de IRS, a Requerente apresentou a reclamação graciosa n.º ...2020... que veio a ser parcialmente deferida.
  7. A Requerente em sede de reclamação graciosa exerceu o contraditório através do exercício do direito de audição prévia, ao abrigo do artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT), e no qual foi apresentada documentação e suporte justificativos de despesas e encargos num total de €272.552,42 a inscrever no Q4 do anexo G da declaração Modelo 3, o qual mereceu deferimento parcial por parte da AT. Assim, houve um deferimento parcial por parte da AT relativo a despesas e encargos no montante de €272.552,42.
  8. Da decisão em sede de reclamação graciosa n.º ...2020..., em que foram aceites por parte da AT despesas e encargos no montante de €272.552,42, resultou a liquidação n.º 2021...., de 10-04-2021, no montante de €38.602,76, cf. documento enviado pela Requerente em 13/5/2021 que veio substituir o Doc. 1 anexo ao PPA no montante de €37.966,64[1].
  9. Em 2-7-2021, a AT submeteu requerimento ao CAAD, para junção do mesmo aos autos, informando que ao abrigo do artigo 13.º do RJAT foi proferido despacho datado de 29/6/2021, em que é aceite o montante de €56.641,50 (correspondente a uma quota parte de 50% imputável à Requerente do montante total da despesa de comissão imobiliária de €113.283,00) a título de despesas e encargos referentes a despesas de mediação imobiliária, conforme Informação n.º 274 da DSIRS. Assim, o montante total de despesas e encargos aceites pela AT imputável à requerente ascende a €329.193,92 (€272.552,42+€56.641,50), cf. artigo 8.º da Resposta. Foi emitida uma nova liquidação referente ao ano de 2018, liquidação n.º 2021…. no montante de €24.999,39, cf. ficheiro Nova Liquidação.pdf constante do PA[2].
  10. A Requerente foi notificada em 13-7-2021(registo CTT: RF … PT) através do Ofício n.º ... de 9-7-2021 do deferimento parcial relativo às despesas de mediação imobiliária no montante de €56.641,50 dando origem à revogação parcial do ato tributário que constitui o objeto do presente PPA, cf. ficheiro Not.Decisão Final.pdf constante do PA.
  11. Emissão por parte do contribuinte C…, Lda. com o NIF ... das seguintes faturas: FT 2015/0717, de 3-11-2015, no montante total de €7.000, com a descrição de  “Adjudicação Caixilharia de Madeira”, cf. Doc. 14 anexo ao PPA; FT 2015/0730, de 17-11-2015, no montante total de €7.000, com a descrição de “Caixilharia de Madeira”, cf. Doc. 15 anexo ao PPA e FT 2016/0786, de 7/1/2016, montante total de €4.815,54, com a descrição “Caixilharia de Madeira (Pgt.Final), cf. Doc. 16 anexo ao PPA, perfazendo as faturas anteriormente indicadas um montante total de €18.815,54.
  12.  Relativamente ao contribuinte D..., SA com o NIF ..., o mesmo emitiu no que releva para o caso em análise os seguintes documentos:

 

 

  1.  Relativamente ao contribuinte D..., SA com o NIF ..., o mesmo emitiu a GT JB16/… com data de 6-4-2016 com chave de AT: … com local de descarga: ... n.º ... … Lisboa, cf. Doc. 40 anexo ao PPA.
  2.  Relativamente ao contribuinte D..., SA com o NIF ..., o mesmo emitiu no que releva para o caso em análise os seguintes documentos:

 

 

 

Constata-se que o saldo de €25.710,25 corresponde ao somatório de duas (2) faturas, a saber: FT 20160149-€7.062,66 e FT: 20160178-€18.647,59, cf. Doc. 42 e Doc. 44 anexos ao PPA e dizem respeito a diverso material para cozinha.

  1. Relativamente ao contribuinte F..., Lda com o NIF …, o mesmo emitiu a fatura n.º 1600/000068, de 2/3/2016, no montante de 11.900,72 com a descrição de “Fornecimento e instalação de jardim vertical”, cf. Doc. 52 anexo ao PPA, sendo a mesma paga por transferência bancária, sendo a mesma paga em 2 tranches, a saber; €5.700 e €6.290, respetivamente, cf. Docs. 54 e 55 anexos ao PPA.
  2. Relativamente ao contribuinte G... com o NIF …, com data de 30/11/2015, no montante de 2.565,05 existe um montante de €200 a título de “Deslocações e Estadas” que constitui despesa controvertida nos presentes autos, cf. Doc. 68 anexo ao PPA.
  3. Relativamente ao contribuinte H... com o NIF ... foi emitida uma fatura/recibo n.º ..., com data de 11/172016, no montante de €537,01 com a descrição “Serv. Limpeza nas V/Instalações. Este serviço foi efectuado e colocado à disposição do adquirente na data da factura”, cf. Doc. 83 anexo ao PPA.

 

2.2.Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

2.3.Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos que foram dados como provados tiveram por base os documentos juntos pela Requerente no processo administrativo.

 

3.Matéria de direito

 

Nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do CIRS constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, sendo o ganho sujeito a IRS constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, nos termos da alínea a) do n.º4 da disposição legal supra.

Nos termos do artigo 51.º n.º 1 alínea a) do CIRS “os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela Renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativamente a esses bens (…)”, acrescem ao valor de aquisição para efeitos de determinação da mais-valia resultante da alienação onerosa do imóvel.

 

No caso controvertido estão despesas e encargos suportados e identificados nos pontos K) a Q) do ponto 2.1 Factos provados com a alienação do imóvel identificado no Q4 do Anexo G da Modelo 3 da Requerente que a mesma entende serem fiscalmente dedutíveis para efeitos de mais-valias e a Requerida entende que não.

 

As despesas e encargos objeto do presente PPA são as seguintes, cf. artigo 57.º do PPA:

 “

57º

 

E

Em conclusão: deverão ser aceites os seguintes encargos e despesas, não aceites em sede de Reclamação Graciosa:

 

 

C

503416860 - Maciça Industria de Janelas e Portas de Madeira Lda Total

 

 

 

18 815,54

 

 

 

 

D

... - Jose Ricardo Botas, Sa Total

 

 

 

 

13 816,64

         

 

F

 

 

 

 

H

G

 

 

 

 

I

505621479 - Realtors Mediação Imobiliaria Lda Total

 

 

 

 

113 283,00

 

 

 

 

 

 

Total Geral

184 363,16

 Do montante acima referido, por parte da AT, através do Ofício n.º ... de 9-7-2021, mereceu deferimento parcial relativo às despesas de mediação imobiliária, no montante de € €56.641,50 (50% x €113.283), imputável à Requerente, cf. provado nos pontos I e J dos Factos provados.

Assim, no caso controvertido estão despesas e encargos suportados e identificados nos pontos K) a Q) do ponto 2.1 Factos provados com a alienação do imóvel identificado no Q4 do Anexo G da Modelo 3 da Requerente que a mesma entende serem fiscalmente dedutíveis para efeitos de mais-valias e a Requerida não.

 

E

Deste modo, as despesas e encargos objeto do presente PPA passam ser de:

 

 

C

503416860 - Maciça Industria de Janelas e Portas de Madeira Lda Total

 

 

 

 

 

 

 

18 815,54

 

 

 

 

D

... - Jose Ricardo Botas, Sa Total

 

 

 

 

13 816,64

         

 

F

 

 

 

H

G

 

 

 

 

 

 

 

Total Geral

71 080,16

 

 

 

 

 

 

 

Legenda

  • € - Euros

 

 

 

 Do montante acima referido, levanta-se a questão de deverem ou não ser imputados € 35.540,08 (50% x 71.080,16) à Requerente a título de despesas e encargos necessários e inerentes à alienação do imóvel e sobre os quais o tribunal arbitral se pronunciará.

 

3.1.Posições das Partes

             

A Requerente alega em síntese que: 

 

  1. Faturas emitidas por C... com o NIF ...: € 18.815,54

- deverá ser aceite o montante acima referido, uma vez que apesar de não identificarem o local da obra, a responsabilidade não é sua e que se a fatura não contempla o local de carga e descarga houve a emissão de Guia de Transporte, disponível no e-fatura, a que a mesma não pode aceder, mas que permitiria à AT tomar conhecimento que os bens foram transportados e descarregados no local da obra sito, na ..., 26 em Lisboa, conforme documentos que se reproduzem com os códigos de certificação da AT e adicionalmente se anexa o respetivo orçamento, cf. Docs. 14 a 20, anexos ao PPA, pugnando pela aceitação das mesmas, cf. artigos 38.º e 39.º do PPA; 

  1. Faturas de D..., SA com o NIF ...: € 13.816,64

- deverá ser aceite o montante de €3.816,64 correspondente à faturação liquida relativa à obra realizada resultam da compensação entre a faturação bruta emitida por D... de €13.816,64 deduzida do total de NC emitidas pelo mesmo D... no montante de €10.000 que anularia o adiantamento feito no montante de €10.000 , cf. Docs. 21 a 38 anexos ao PPA; igualmente alegam que solicitaram o extrato de conta corrente do cliente 2113-B… que à data de 3/8/2016 estava relevado um montante de €3.816,64[3] relativo à obra realizada, cf. Doc. 39 anexo ao PPA a artigos 39.º e 40.º do PPA; foi solicitado a D... uma 2ª via da fatura FAJB16 /29 para verificação se a mesma continha a descrição do local de carga e descarga, o que não se confirmou tendo solicitado ao mesmo a Guia de Transporte (Guia de Transporte GT JB16/5) com  o código de validação AT: 3543710240  onde se identificam diversos materiais  com o local de descarga na ... n.º ...  Lisboa 1700-150 Lisboa  e local de carga  na Rua …, morada idêntica do contribuinte D... com o NIF ..., cf. artigos 41 e 42 do PPA; alega existirem contradições existentes entre as despesas não aceites por parte da AT pelo facto de as mesmas serem enquadráveis nos termos do artigo 51.º do CIRS e só terem sido aceites as de valor reduzido de €1.123,91 e 77,49, concluindo que os documentos justificativos do fornecedor D..., S.A. com o NIF ... totalizando € 13.816,64 suportam despesas enquadráveis nos termos do artigo 51.º do CIRS, cf. artigos 43.º e 44.º do PPA;

  1. Faturas e NC de E... com o NIF ...: €25.710, 25

- o montante de €25.710,25 diz respeito a 2 faturas: FT 20140149 (€7.062,66) e FT 20160178 (€ 18.647,59) referentes a móveis de cozinha, equipamentos e acessórios tendo as mesmo sido pagas, cf. Doc. 41 a 51 anexos ao PPA e artigos 45.º e 49.º do PPA;

  1. Fatura 1600/000068 de F... Lda, de 2/3/2016, com o NIF: …: €11.190,72

-  a fatura acima referida diz respeito ao fornecimento e instalação de um jardim vertical, cf. Docs., 52 a 55 anexos ao PPA e artigo 49.º do PPA; 

  1. Fatura 35 2017/... de H... com o NIF ...: € 547,01

- a fatura diz respeito a despesa de limpeza realizadas, não tendo sido objeto de qualquer apreciação especifica segundo a Requerente, cf. Doc. 83 anexo ao PPA e artigo 46.º do PPA;

  1. Fatura FA 2015/190 de G... com o NIF ... “diferença de FT”: €200

- montante respeitante a deslocação para trabalhos de deslocação para trabalhos adicionais à realização da obra, cf. artigo 53.º do PPA.

  1. A Requerente alega que em direito de audição prévia questionou visão restritiva por parte da AT quanto à aplicação do artigo 51.º do CIRS, cf. artigo 46.º do PPA, não concordando com a visão defendida pela Requerida, cf. artigos 50.º, 51.º, 53.º do PPA concluindo que as despesas mencionadas nos números 1 a 6 supra, devem ser consideradas como despesas enquadráveis no artigo 51.º do CIRS, ao contrário do defendido pela Requerida.  

 

Por sua vez, a Requerida, a AT contesta por impugnação, defendendo a improcedência do pedido dos Requerentes alegando que:

 

  1. Por despacho de 2021/29/6, da Senhora Subdiretora-Geral da área do Rendimento, foi parcialmente revogado o ato de liquidação contestado porquanto foi aceite a despesa de mediação imobiliária na proporção da quota parte 50% do total, no montante de €56.641,50, ascendendo assim a totalidade de despesas aceites no valor de €329.193,92;
  2. No caso em análise, estão em causa despesas e encargos que no seu entender não são elegíveis para efeitos do artigo 51.º n.º 1 alínea a) do CIRS, identificadas nos pontos infra.

 

  1. Faturas emitidas por C..., NIF ... no valor de €18.815,34

 

  1. Ao abrigo do artigo 51.º do CIRS para que os encargos possam ser comprovadamente aceites, torna-se necessário, que os documentos apresentados, tais como faturas, recibos vendas a dinheiro e outros, evidenciem os trabalhos efetuados e/ou os materiais adquiridos, de forma a serem enquadrados no conceito de “encargos com a valorização dos bens”, a pessoa a quem incumbem através da sua identificação  como requisitante/cliente, a pessoa que os suportou, através da identificação do local onde foram executadas as obras e/ou os materiais que foram instalados e/ou se destinem;
  2. Uma vez que não está identificado o imóvel onde foram executados os trabalhos ou fornecidos os materiais, não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o bem em causa, concluindo as despesas mencionados acima não podem ser aceites nos termos do artigo 51.º do CIRS.

 

  1. Faturas emitidas por D..., SA, no valor de €13.816,64
    1. Relativamente a fatura FC-JB15/0581, com a descrição “adiantamento inicial” no montante de €10.000, a mesma não pode ser aceite nos termos e para os efeitos do artigo 51.º do CIRS, por não ser possível aferir os trabalhos realizados e/ou materiais adquiridos;

 

  1. Foram emitidas mais cinco (5) faturas, a saber: FA JB15/773, FA JB 15/840, FA JB 16/1, FA JB 16/14 e FA JB 16/29 no montante total de€ 13.816,64. Igualmente foram emitidas cinco (5) notas de crédito, a saber: NC JB 15/104, NC JB 15/114, NC JB 16/1, NC JB 16/3 e NC JB 16/5 no montante total de €10.000,00.

 

  1. O valor da fatura FA JB 15/840 (€ 3.078,94) foi anulado pela nota de crédito NC JB 15/840, sem referência à anulação da fatura de adiantamento, pelo que a despesa constante na fatura FA JB 15/840 não pode ser considerada aceite para efeitos fiscais, por não se encontrar comprovado o seu pagamento;

 

  1. As faturas FA JB 15/773 (€103,32) e FA JB 16/29 (€9.428,98) não podem ser aceites para efeitos fiscais por não conterem a referência à morada do imóvel, não permitindo estabelecer a conexão entre o encargo suportado e o bem em causa;

 

  1. As faturas FAJB16/1 (€1.127,91) e FAJB16/14 (€77,49), uma vez que mencionam a morada do imóvel, as despesas são enquadráveis no artigo de 51.º do CIRS e as NC emitidas na data das faturas referentes à anulação parcial da FT FC JB15/582, procedem à liquidação desta fatura, sendo que, todas as outras faturas emitidas por este fornecedor, não reúnem os requisitos de forma a serem enquadrados no conceito de ”encargos com a valorização dos bens”, a pessoa a quem incumbem, através da sua identificação como requisitante/cliente, a pessoa que os suportou, através da identificação da mesma no documento de pagamento e a identificação do bem, através da identificação do local onde foram executadas as obras e/ou os materiais que foram instalados e/ou se destinem.

 

  1. Outas faturas (eletrodomésticos de cozinha, fornecimento e instalação de jardim vertical, deslocação e estada e limpeza geral do imóvel
    1. A fatura FAN1/20160149, no valor de €7.062,66, referente ao fornecimento de eletrodomésticos de cozinha, releva uma despesa que não tem enquadramento no artigo 51.º do CIRS, na medida em que os eletrodomésticos de cozinha não podem ser considerados como parte integrante do prédio urbano onde se encontram naquele momento, na medida em que a sua ligação ao imóvel é precária sendo facilmente separável e substituível;
    2.   Relativamente à fatura FT 160000068, no montante de €11.990,72, relativo ao fornecimento e instalação de um jardim vertical, a aquisição instalação do mesmo não integra o conceito de despesa necessária, nos termos do artigo 51.º do CIRS;
    3. Relativamente à fatura 2015/190, no montante de €200, referente a deslocações e estadas, a mesma também não é enquadrável no artigo 51.º do CIRS, na medida em que não se enquadra como encargo com valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, como despesa necessária efetivamente praticada inerente à aquisição e alienação do bem;
  2. A AT defende que de acordo com o entendimento divulgado pela informação vinculativa no processo 2483/2004 com despacho concordante da Senhora Diretora de Serviços de 2005/03/04 (disponível em www.portaldasfinancas.gov.pt), os encargos têm de dizer respeito a valorização do próprio bem imóvel, isto é, são as despesas que, por natureza, trazem um valor adicional ao imóvel, como por exemplo as obras de beneficiação; os serviços respeitantes a todas as faturas referidas anteriormente, na qual se inclui a despesa referente com a limpeza do imóvel, não são enquadráveis no artigo 51.º do CIRS, em virtude de não se considerarem incorporados nos bens imóveis e/ou não lhe aumentarem o valor intrínseco;
  3. A AT no reforço da sua posição refere jurisprudência do Tribunal Central Administrativo (TCA) Sul através dos Acórdãos referentes ao Processo 06824/13, de 2015/04/14 e Processo 715/11.8 BEALM, de 2017/05/25; 
  4. Conclui que com base no exposto as despesas que a Requerente apresenta, não podem relevar para efeitos de cálculo das mais valias inerentes à alienação do imóvel nem podem ser abrangidas pelo disposto no artigo 51.º do CIRS.

 

3.2.A questão que é objeto do processo e o seu regime

 

A questão que se discute no presente processo arbitral diz respeito à elegibilidade ou não de determinado tipo de despesas apresentado pela Requerente e contestado pela Requerida, identificadas no ponto 3. Matéria de Direito no montante de €71.080,16 sendo 50% da mesma - €35.540,08- imputável à Requerente, para efeitos do artigo 51.º do CIRS e, consequentemente afetando o montante de mais-valia a apurar para efeitos de IRS.

 

3.3.Apreciação da questão colocada a título principal

 

 A questão sobre a qual este tribunal tem que se pronunciar é se todas as despesas suportadas pelo(s) proprietário(s) do imóvel que alienou, são elegíveis ao abrigo do artigo 51.º do CIRS?

Está plasmado no artigo 51.º do CIRS o seguinte:

Artigo 51.º

Despesas e encargos

1 - Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem: (Anterior corpo do artigo; passou a n.º 1 pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro)

 

a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;

 

(…)”

 

A questão que se levanta é o que se entende por “encargos com a valorização dos bens “  e  “ despesas necessárias e efetivamente praticadas”?

 

Ora na jurisprudência citada pela Requerida, artigos 26.º e 27.º da Resposta, o TCA Sul no Acórdão 06824/13, de 2015/04/14 já se pronunciou sobre o alcance das “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e a alienação” de um imóvel abrangidas pelo artigo 51.º do CIRS do seguinte modo:

 

[Ora, do texto legal resulta a expressão despesas “necessárias” e “inerentes” pelo que devem ser interpretadas conforme a necessidade e a inerência da despesa face à alienação do imóvel, pelo que se coloca a questão de saber se tal “assumpção”, com os gastos inerentes, constitui despesa enquadrada naquele normativo, a considerar para efeitos de tributação da mais-valia respectiva. E, aí, a subordinante é, sem dúvida, “a inerência” da despesa à alienação. No critério legal, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Tal critério contém uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável. De outro modo: a despesa há-de ser integrante da própria alienação.

Não se vê, efectivamente, que outro sentido se possa atribuir à expressão “inerentes à alienação”.

Não basta, pois, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento, é necessário que elas dele sejam indissociáveis.

Ora, não é a hipótese das despesas em causa, que apenas são conexas à alienação, não são dela inseparáveis.

(...)

Segundo a doutrina mais recente são exemplos de “despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação”, são os registos e as escrituras-publicas – leia-se Rui Duarte Morais in Sobre o IRS, 2ª Edição, pag. 141 e Paula Rosado Pereira in Estudos sobre o IRS, Rendimentos de Capitais e Mais-valias, Cadernos IDEFF, nº 2.

Poder-se-á também considerar as despesas de mediação mobiliária, mais concretamente a comissão de intermediação, como despesas necessárias e inerente à venda do imóvel para efeitos no nº 1 alínea a) do art. 51º C.IRS.], posição reiterada pelo mesmo Tribunal Superior no Acórdão referente ao Processo 715/11.8 BEAL, de 2017/05/25.

 

Mais recentemente o STA[4] no Acórdão, de 18/11/2020, referente ao Processo 0245/15.4BELRA[5] se pronunciou no mesmo sentido dos Acórdãos do TCA Sul supra.

 

Assim, do exposto acima, é importante realçar que as despesas relevantes ao abrigo do critério plasmado no artigo 51.º do CIRS, são as indissociáveis da alienação do imóvel, e no Acórdão referido acima são dadas como exemplo as suportadas com a comissão de intermediação imobiliária e as referentes a registos e escrituras públicas.

Ora a questão que importa levantar é se as despesas suportadas e referidas nas alíneas K a Q do ponto 2.1 Factos provados e identificadas no ponto 3. Matéria de Direito no montante de €71.080,16 se revestem desta natureza, sendo 50% das mesmas imputável à Requerente?

É convicção deste tribunal que não. De facto, as despesas referidas nas alíneas K a Q do ponto 2.1 Factos provados, podem ser importantes para definir por parte do alienante o preço de venda que depois até poderá ser ajustado em função das vontades de comprador e vendedor, mas, não assume um caráter indissociável relativo à alienação do imóvel. De facto, a natureza das despesas descritas nas alíneas K a Q do ponto 2.1 Factos provados, não permite defender que se esteja perante despesas que sejam indissociáveis relativos à alienação do imóvel.

Deste modo, é convicção deste tribunal que as despesas peticionadas pela Requerente, identificadas nas alíneas K a Q do ponto 2.1 Factos provados, não são elegíveis para efeitos do artigo 51.º do CIRS, improcedendo o pedido da Requerente e acompanhando a posição da Requerida quanto à não elegibilidade das mesmas para efeitos do artigo 51.º do CIRS.   

 

 

4.Decisão 

 

Nestes termos este Tribunal arbitral decide:

  1. julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à elegibilidade de determinado tipo de despesas suportadas pela Requerente identificadas nas alíneas K a Q do ponto 2.1 Factos provados no montante de €71.080,16;
  2. manter na ordem jurídica os atos tributários objeto do presente processo;
  3. condenar a Requerente e Requerida no pagamento das custas processuais.

 

5.Valor do processo

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 37.966,64.

 

O valor indicado pela Requerente posteriormente foi alterado para €38.602,76 resultante da liquidação n.º 2021...., de 10-04-2021, e enviado ao tribunal pela mesma em 13/5/2021 vindo a substituir o Doc. 1 anexo ao PPA. Assim, considera o Tribunal existir fundamento para o alterar, pelo que, de harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e ainda artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se à presente causa o valor de €38.602,76.

 

6.Custas

             Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e no artigo 4 n.º 4 e na Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em €1.836,00, repartidas na proporção de 65% do respetivo valor - €1.193,40 -, a suportar pela Requerente, que foi vencida quanto ao pedido da elegibilidade ao abrigo do artigo 51.º do CIRS de 50% das despesas identificadas no ponto 3. Matéria de Direito no montante de €71.080,16, e na proporção de 35% do respetivo valor - €642,60- , a suportar pelo Requerida, que foi vencida quanto à não elegibilidade de despesas elegíveis ao abrigo do artigo 51.º do CIRS, referidas na alínea I) do ponto 2.1 Factos provados.

 

Notifique-se.

  Lisboa, 28 de fevereiro de 2022

 

O Árbitro Singular

 

 

Júlio Tormenta

 



[1] A diferença entre o montante constante no Doc.1 anexo ao PPA, €37.966,64, e o montante de €38.602,76 constante da liquidação n.º 2021...., de 10/4/2021, n.º 2021...., resulta de juros compensatórios no montante de €636,12 não incluído no Doc.1 anexo ao PPA.

[2] PA - Processo Administrativo.

[3] Se a este valor de €3.816,64 adicionarmos o montante do adiantamento de €10.000,00, apura-se um valor total de €13.816,64 que constitui objeto do PPA.

[4] STA-Supremo Tribunal Administrativo

[5] Disponível em www.dgsi.pt [Consulta on line em 21/2/2022]