Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 530/2021-T
Data da decisão: 2022-06-20  IMI  
Valor do pedido: € 293.723,64
Tema: IMI / AIMI - Contagem de prazos para o indeferimento presumido de reclamação graciosa e para o requerimento para constituição do tribunal arbitral.
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SUMÁRIO

  1. A intempestividade do pedido de constituição do tribunal arbitral é uma exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do mérito e que impõe a absolvição da instância, nos termos das normas do artigo 89.º, n.º 2 e n.º 4, alínea k) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, por remissão da norma do artigo 3.º-A, n.º 1 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária
  2. O prazo para apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral conta-se nos termos previstos no artigo 279.º do Código Civil, por aplicação do regime regulado no artigo 20.º, n.1º do Código do Procedimento e do Processo Tributário, por remissão da norma do artigo 29.º, n.º 1 do citado RJAT, i.e., corre ininterruptamente, nele não se considerando o dia do termo inicial.
  3. Com o pedido de constituição de tribunal arbitral inicia-se o procedimento arbitral, como está previsto no artigo 10.º, n.º 1 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, passando o regime dos prazos a obedecer às normas do artigo 87.º do Código do Procedimento Administrativo, por aplicação do norma do artigo 3.º-A, n.º 1 do citado Regime Jurídico, e consequentemente a sua tramitação obedece às regras sobre prazos do procedimento administrativo, onde se estabelece, no artigo 87.º, alínea f), que quando o prazo procedimental termine em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, esse prazo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, ainda que este caia no período das férias judiciais.

 

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros Regina de Almeida Monteiro (Presidente), Nuno Maldonado Sousa (árbitro adjunto e relator) e José Ramos Alexandre (árbitro relator), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 10-11-2021, acordam no seguinte:

 

  1. Relatório

 

A..., S.A., com sede na ..., n.º..., ..., ...-... Lisboa, pessoa coletiva n.º..., doravante designada como “Requerente”, requereu a constituição de tribunal arbitral ao abrigo do disposto no artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do regime jurídico da arbitragem em matéria tributária constante do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (“RJAT”),e nos artigos 1.º, alínea a) e 2.º, ambos da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março e apresentar pedido de pronúncia arbitral onde peticionou a anulação do indeferimento tácito da reclamação graciosa que apresentou em 27 de janeiro de 2021, e a consequente anulação das liquidações  os atos de liquidação n.º 2019..., n.º 2019... e n.º 2019..., relativos ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), que se reportam ao período de tributação de 2019 e do ato de liquidação de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º 2020 ... referente ao período de tributação de 2020.

A Requerente sustenta o seu pedido no erróneo cálculo do valor patrimonial tributário (“VPT”) que a AT efetuou sobre os seus terrenos para construção e que constituiu a base de incidência dos impostos, por ter recorrido a fórmula de cálculo que não corresponde àquela que a lei estabelece, violando os preceitos legais correspondentes e cobrou resultou montante de IMI e AIMI a pagar superior ao que é legalmente devido. Não aceitando esse cálculo a Requerente deduziu reclamação graciosa dessas liquidações que apresentou em 27-01-2021 e na falta de sua atempada decisão recorrendo para efeitos processuais à presunção do seu indeferimento tácito. Conclui pedindo a revogação do indeferimento tácito da reclamação graciosa e a anulação dos atos de liquidação de IMI e AIMI, na parte referente aos terrenos para construção, referentes ao ano de 2019 e 2020. Pede também o reembolso, dos impostos citados no montante de € 293.723,64 e a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal.

É Requerida nestes autos a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante designada apenas por “AT” ou por “Requerida”.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 01-09-2021 e foi notificado à Requerida na mesma data.

Os árbitros já identificados e signatários manifestaram a aceitação das suas funções no prazo legal. Em 21-10-2021 as partes foram notificadas da designação dos árbitros e não manifestaram intenção de a recusar, nos termos previstos nas normas do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e nas normas dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico. Em conformidade com a disciplina constante do artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 13-10-2021.

A Requerida apresentou resposta em 14-12-2021, que concluiu afirmando que o pedido de pronúncia arbitral não deve proceder devendo a AT ser absolvida de todos os pedidos.

Em 09-05-2022 foi proferido por este Tribunal despacho de prorrogação do prazo para a decisão, pelo período de dois meses.

Em 17-05-2022 foi proferido despacho que anunciou às partes a possibilidade deste Tribunal decidir pela intempestividade do pedido de constituição do Tribunal Arbitral e convidou-as a pronunciarem-se sobre a questão, com expressa invocação da disciplina prevista no artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil. A Requerente apresentou requerimentos a este propósito em 20-05-2022 e em 30-05-2022 e defendeu a tempestividade do seu pedido de pedido de constituição de tribunal arbitral. A Requerida não se manifestou sobre a questão.

 

2.Saneamento

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, em subordinação às normas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT e é competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo regime e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2.1.Intempestividade

Parece ser pacífico que o prazo para propositura de ações em juízo está sujeito a regras que estabelecem o tempo em que o exercício desse direito deve ser feito e que o não cumprimento constitui a exceção dilatória da intempestividade, que é do conhecimento oficioso, de acordo com as normas do artigo 89º nºs 2 e 4 alínea k) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), ex-vi artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT. Esta interpretação, que nos parece consensual face à clareza da lei, tem sido sufragada pelo Supremo Tribunal Administrativo[1] (“STA”) e pelos tribunais arbitrais[2].

Significam estas conclusões que este Tribunal deve apreciar a questão da intempestividade (como lhe chama o CPTA) mesmo que ela não seja suscitada pela parte contra quem o direito de ação é exercido e deve apreciá-la antes de conhecer do mérito da causa, como estipula a norma do artigo 89.º, n.º 2, do CPTA, aplicável a este processo nos aludidos termos. Esta interpretação da norma, que cremos ser também consensual, tem vindo a ser repetidamente feita na jurisprudência do STA acabada de referir.

Pelas razões invocadas é este o momento para apreciar a questão da intempestividade que, quando procede, conduz à absolvição da instância (artigo 89.º, n.º 2 do CPTA).

Os factos que vão fundamentar a decisão sobre esta matéria são os seguintes:

A. A reclamação graciosa foi apresentada pela Requerente por correio eletrónico aos serviços da AT em 27-01-2021, quarta-feira, pelas 16:34 horas (documento junto pela Requerente em 07-03-2022).

B. O pedido de constituição de tribunal arbitral com o pedido de pronúncia arbitral da Requerente, foi apresentado ao CAAD no dia 31-08-2021, terça-feira, pelas 19:06 horas (facto cuja prova resulta do próprio registo informático deste processo).

Não há outra matéria de facto com interesse para apreciar a questão.

Há agora que aplicar o direito, o que nos obriga a visitar o RJAT, as normas de interposição da impugnação judicial do Código de Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”) e diversos regimes de contagem de prazos.

É decerto pacífico que o pedido de constituição de tribunal arbitral é feito mediante requerimento enviado por via eletrónica para o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (10.º-2 do RJAT) e que a data da sua apresentação será aquela que o sistema de envio certificar, por aplicação analógica da norma do artigo 103.º, n.º 6 do CPPT. O prazo para o pedido de constituição de tribunal arbitral é de 90 dias e conta-se a partir da formação da presunção de indeferimento tácito da reclamação graciosa (artigo 10.º-1 do RJAT e artigo 102.º-1-c do CPPT, por remissão do mesmo artigo do RJAT).

Os prazos relativos à reclamação graciosa contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil (“C.C.”), por remissão do artigo 57.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária (“LGT”). Como a reclamação graciosa foi apresentada aos serviços da AT em 27-01-2021, o termo inicial para a contagem do prazo para a sua decisão ou indeferimento presumido, ocorre em 28-01-2021 (279.º-b) do C.C.). Como a reclamação graciosa deveria ter sido concluída pela AT no prazo de 4 meses (57.º-1 da LGT) o termo final para a decisão ocorreu em 28-05-2021 (279.º-c) do CC), que foi uma sexta-feira, pelo que o primeiro dia de incumprimento da obrigação de decidir a reclamação graciosa pela AT foi no dia seguinte, em 29-05-2021, que por ter sido sábado, faz transferir esse termo para o dia 31-05-2021, data em que, tudo visto, se presume o indeferimento da reclamação graciosa (57.º-5 da LGT e 279.º-e) do CC, ex-vi 57.º-3 da LGT). Como não se conta dentro do prazo, o dia em que ocorre o evento, que neste caso é o indeferimento presumido (279.º-b do CC), o termo inicial para a Requerente reagir, com pedido de constituição deste tribunal arbitral, ocorreu em 01-06-2021 e o termo final de 90 dias (10.º-1-a do RJAT), recaiu sobre o dia 29-08-2021, que foi domingo. Este dia estava compreendido no período de férias judiciais, que decorrem de 16 de julho até 31 de agosto, nos termos da norma do artigo 28.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, estabelecido pela Lei n.º 62/2013 de 26 de agosto.

Perfilam-se agora três soluções possíveis: (i) aplicar o regime do Código Civil (artigo 279.º); (ii) aplicar o regime do processo arbitral (artigo 3.º-A, n.º 2 do RJAT) ou; (ii) aplicar o regime do procedimento arbitral (artigo 3.º-A, n.º 1 do RJAT). Crê-se que o princípio da especialidade leva a que se aplique o regime próprio do procedimento arbitral, que se encontra previsto no artigo 3.º-A, n.º 1 do RJAT. É que o pedido de constituição de tribunal arbitral é feito mediante requerimento enviado por via eletrónica (artigo 10.º-2 do RJAT) e inicia-se então o procedimento para constituição do tribunal arbitral. Nos termos do artigo 87.º, alínea f) do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), ex-vi artigo 3.º-1 do RJAT, o termo do prazo que coincida com dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, que neste caso foi o dia 30-08-2021, que foi segunda-feira.

Como vimos e de acordo com o registo no processo, o pedido de pronúncia arbitral da Requerente foi apresentado no dia 31-08-2021, pelas 19:06 horas, quer dizer, depois do termo final para o poder fazer, nos termos da norma do artigo 10.º, n.º1, alínea a) do RJAT.

É certo que durante o ano de 2021 vigoraram regimes excecionais de contagem de prazos e de suspensão do prazo de caducidade. Há que ver se têm aplicação aos períodos em causa. Veja-se em primeiro lugar se alguma dessas regras afeta a formação do indeferimento tácito que tem, em qualquer caso, como termo inicial a data da apresentação da reclamação graciosa em 27-01-2021.

A Lei 1-A/2020 de 19 de março decretou medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, entre elas diversas regras provisórias relativas a prazos e diligências judiciais e processuais. Este regime foi subsequentemente alterado por várias vezes[3]. Para o que aqui interessa, que é o regime dos atos no procedimento tributário, importa levar em consideração o artigo 6.º-C, que foi introduzido pela Lei 4-B/2021 de 1 de fevereiro, com produção de efeitos em 22-01-2021[4], que declarava a suspensão de prazos para a prática de atos em procedimentos administrativos e tributários no que respeita à prática de atos por particulares. Quer dizer, a suspensão da contagem para a prática de atos a praticar pela AT não se suspendeu, apenas se suspendeu a contagem para a prática de atos pelos particulares. Como a formação do ato tácito pressupõe a inação da AT durante o período de quatro meses e este prazo não foi suspenso, o termo final para decidir o procedimento ocorreu em 28-05-2021 (sexta-feira) e o indeferimento tácito produzir-se-ia no dia seguinte (29-05-2021) mas, como este dia foi um sábado, o indeferimento ocorreu efetivamente no dia útil seguinte, que foi na segunda-feira, 31-05-2021, nos termos gerais já referidos.

Veja-se agora se algum regime excecional suspendeu ou interrompeu o prazo de caducidade para instauração do procedimento de constituição do tribunal arbitral, no período que se iniciou em 31-05-2021. Entre as medidas de natureza processual e procedimental tomadas pelo Governo e pela Assembleia da República, de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, constantes da já citada Lei n.º 1-A/2020 de 19 de março, conta-se a suspensão dos prazos de caducidade relativos a atos que devessem ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corressem termos nos tribunais arbitrais, nos termos previstos nas disposições combinadas do artigo n.º 6.º-B, n.º 3 e n.º 1. No entanto, esta disciplina que suspende os prazos de caducidade foi introduzida pelo artigo 2.º da Lei n.º 4-B/2021 de 1 de fevereiro, com produção de efeitos em  22 de janeiro de 2021 e foi revogada pelo artigo 6.º da Lei n.º 13-B/2021 de 5 de abril[5], com efeitos a partir de 06-04-2021.

Em súmula, há que concluir que as medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, relativas à suspensão de prazos, não afetaram a formação do indeferimento tácito, porque a suspensão de prazos em vigor apenas incidiu sobre atos a praticar por particulares e também não afetaram o prazo de caducidade para dar início ao procedimento de constituição do tribunal arbitral pois o seu termo inicial ocorreu em 01-06-2021, fora do período de aplicação do regime excecional de suspensão, decorrido entre 22-01-2021 e 06-04-2021.

Regressemos agora ao problema onde o tínhamos deixado, antes verificar se os regimes excecionais introduzidos no âmbito das medidas de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.

Importa verificar que contributos deram as decisões dos tribunais coletivos e a doutrina que confirmem ou infirmem a interpretação do regime de contagem dos prazos da caducidade para requerer a constituição do tribunal arbitral que se elegeu: a aplicação da norma do artigo 87.º, alínea f) do CPA, ex-vi artigo 3.º-A, n.º 1 do RJAT, que estipula que os prazos que terminem em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transferem-se para o primeiro dia útil seguinte, independentemente de estarem ou não estarem a decorrer férias judiciais.

A interpretação que se explanou, foi já sustentada noutro processo, por tribunal arbitral coletivo constituído por árbitros diferentes daqueles que constituem este Tribunal, no âmbito deste Centro de Arbitragem, tomada no mesmo quadro jurídico, designadamente no acórdão de 16-06-2014, no processo 9/2014 [Jorge Lino de Sousa]. No citado acórdão o Tribunal Arbitral seguiu o entendimento que aqui perfilhamos e afirmou de forma inequívoca[6]:

 

23. Tendo a reclamação graciosa entrado no serviço competente no dia 24 de Maio de 2013, presume-se tacitamente indeferida no dia 24 de Setembro subsequente, nos termos do art. 57º da LGT, pelo que o pedido de constituição do Tribunal Arbitral deveria ter dado entrada até 24 de Dezembro subsequente, sendo extemporânea a sua apresentação a 31 de Dezembro[7].

 

Na doutrina são conhecidos os contributos de Jorge Lopes de Sousa e Carla Castelo Trindade, ambos defensores da tese que a contagem do prazo para requerer a constituição do tribunal arbitral deve seguir a regra do artigo 279.º, alínea e) do Código Civil. Este Tribunal ponderou devidamente o contributo destes autores, mas considerou, que neste aspeto particular, a solução deve ser outra.

Crê-se que não há posições divergentes quanto à forma de contar o prazo de caducidade para apresentar o pedido de constituição do tribunal arbitral, porque a remissão do termo inicial para as normas do 102.º, n.º 1 e n.º 2 do CPPT deixa implícito que esse é o regime que se pretende que se aplique para esse efeito. Estando em causa a contagem de um prazo previsto no CPPT é o seu regime de contagem que deve prevalecer, e este é o que o artigo 279.º do Código Civil consagra, ex-vi artigo 20.º, n.º 1 do CPPT. É o passo seguinte que constitui a verdadeira vexata quaestio. Se o pedido de constituição do tribunal arbitral inicia o procedimento arbitral, então não restarão dúvidas que há que recorrer ao artigo 87.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”).

Lopes de Sousa[8] sustenta que o pedido de constituição do tribunal arbitral não faz parte do procedimento arbitral, mas este Tribunal não partilha desse entendimento, porque a interpretação das normas do artigo 10.º, n.º 1 do RJAT não conduz a essa solução. O pedido de constituição dos tribunais arbitrais, na sistemática do RJAT, é o primeiríssimo ato do procedimento e não lhe é prévio.

Também Carla Trindade[9] considera que ao pedido de constituição do tribunal arbitral não é aplicável a norma do artigo 3.º-A, n.º 1 do RJAT porque a própria norma não faz referência expressa à sua aplicação ao pedido de constituição. Lopes de Sousa[10] parece comungar desta opinião. Não se pode concordar com essa interpretação, pois ela esvaziaria de conteúdo esta norma, que como não enumera em que situações é aplicada, acabaria por nunca se aplicar a situação nenhuma e essa interpretação não é possível, pois o legislador não cria normas inúteis (9.º-3 do CC); a interpretação das normas tem de ser sempre harmonizada com este princípio. Se a norma existe no sistema, não é possível interpretá-la de forma em que se exclua a sua aplicação a qualquer situação. Aliás, a técnica legislativa de eleger um determinado regime de contagem do tempo para todo um instituto ou instrumento jurídico, sem enumerar a que atos se aplica, é comum no ordenamento jurídico português. O artigo 3.º-A do RJAT regula no sentido de no procedimento arbitral, os prazos contam-se nos termos do Código do Procedimento Administrativo, quer dizer, todos os atos do procedimento têm os seus prazos regulados nos termos do CPA, obviamente se norma especial não regular em sentido diferente. Técnica legislativa semelhante é utilizada no mesmo regime jurídico para a prática de atos no processo arbitral [que] contam-se nos termos do CPC (artigo 3.º-A, n.º 2), que estipula uma regra geral de dez dias, que não determina exatamente a que atos se aplica (artigo 149.º-1 do CPC) e seria fastidioso enumerar aqui as dezenas de atos processuais com prazos diferentes fixados no CPC e que não obstante este Código conter a regra geral da continuidade dos prazos (138.º-1), sem identificar a que atos se aplica, não deixa por isso de regular situações especiais em que os prazos são contados em dias úteis[11] (v.g. artigo 139.º-5). A mesma metodologia é seguida no Código Civil, que contendo o regime geral (279.º), que estipula como regra a contagem do prazo sem suspensões (ou “em dias seguidos” como é uso dizer-se), sem identificar a que atos concretos se aplica, não deixa por isso de regular todos os atos previstos no Código, não obstante conter, por vezes, disciplina que, em situações especiais, segue regra diferente[12]. E esta técnica legislativa não é apenas usada nos regimes que o artigo 3.º-A do RJAT referencia, mas em toda a legislação subsidiária a este regime[13]. A técnica de indicar um regime de fixação ou contagem de prazos, para um instituto, um procedimento ou determinada espécie de atos é comummente usada no direito português e não suscita dúvidas a sua aplicação geral a todos os atos que se contenham nesse instituto, procedimento ou espécie, sempre sem prejuízo do velho princípio olex specialis derogat legi generali.

É nestes termos e com base nestes argumentos que este Tribunal Arbitral entende que com a apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral inicia-se o procedimento arbitral e a contagem dos prazos nele compreendidos é feita de acordo com as regras do artigo 87.º do CPA, cuja alínea f) impõe, que tendo o ato em causa de ser praticado em dia em que o serviço em que deva ser feito não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.

É justamente esta a situação dos autos; como o prazo para requerer a constituição do Tribunal Arbitral terminava no dia 29-08-2021, que foi domingo, esse termo final transferiu-se para segunda-feira, dia 30-08-2021. Após esta data o pedido de constituição do tribunal arbitral, enquanto primeiro ato do procedimento, tornou-se intempestivo.

Como vimos e de acordo com o registo no processo, o pedido de pronúncia arbitral da Requerente foi apresentado no dia 31-08-2021, pelas 19:06 horas, quer dizer, depois do termo final para o poder fazer, nos termos da norma do artigo 10.º, n.º1, alínea a) do RJAT.

Também não se ignora a existência de jurisprudência que afirma o deferimento para o primeiro dia útil após férias judiciais, do prazo para propositura de impugnação judicial, cujo direito de interposição caduque no período de férias judiciais. Não se crê que essa orientação tenha aplicação neste caso. Em primeiro lugar porque a impugnação judicial e a impugnação nos tribunais arbitrais são processos propositadamente diferentes e até alternativos, como afirma o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro, que institui o RJAT, sem estabelecer quaisquer paralelismos gerais e sobretudo porque o recurso à via arbitral tem regras próprias, entre elas o procedimento de constituição do tribunal arbitral, que tem um regime privativo, que decorre da necessidade de procedimento prévio para constituir um tribunal específico, para determinada causa e conferir-lhe poderes jurisdicionais. Essa função é anterior ao processo; é mais exatamente um procedimento que está regulado nos artigos 10.º a 13.º do RJAT, cujo regime de prazos está também regulado no artigo 3.º-A, n.º 1 do citado regime.

Aliás, a criação de paralelismos entre a impugnação judicial e o processo arbitral, ao nível processual, é um exercício muito difícil, se verificarmos a raiz do RJAT, que é a autorização legislativa que consta da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, no seu artigo 124.º. Com efeito, na definição dos efeitos da instauração do processo arbitral, esta lei faz uma expressa harmonização entre os dois regimes (artigo 124.º, n.º 4, d) mas não segue o mesmo princípio ao nível da regulação de natureza processual, afirmando a natureza independente e alternativa, do processo arbitral, expressando claramente que princípios devem enformar este novo processo, sem nunca remeter ou aludir a qualquer identidade entre este e a impugnação judicial (cfr. artigo 124.º, n.2). Se a lei pretendesse essa identidade de regimes, seria certamente mais fácil ao legislador equiparar os dois processos, por mera remissão, fixando algumas especialidades; mas não foi essa a opção legislativa. Aliás, a ideia de recorrer à tramitação da impugnação judicial, para apoiar o esclarecimento de dúvidas que surjam na interpretação do RJAT não pode nunca deixar de ter em conta que o legislador, de forma clara e expressa, proclamou a pretensão de criar um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial, manifestou a intenção de como regra, a existência de três árbitros, com disciplina própria, designadamente a dispensa de formalidades essenciais, de acordo com o princípio da autonomia dos árbitros na condução do processo, e consagrando, em regra, a irrecorribilidade da sentença proferida pelo tribunal arbitral.

Não se conhece jurisprudência dos tribunais administrativos sobre a aplicação a casos semelhantes da norma do n.º 1 do artigo 3.º-A do RJAT, que não tem paralelo no regime da impugnação judicial, pela singela razão de a impugnação correr nos tribunais estaduais, já constituídos. As referências legislativas mais próximas constam do Título VIII do CPTA, que regula a atividade dos tribunais administrativos e centros de arbitragem e da Lei da Arbitragem Voluntária aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro, regime para o qual o próprio CPTA remete (artigo 181.º-1). A questão da tempestividade da celebração do compromisso arbitral, que nos parece ser o ato análogo ao pedido de constituição do tribunal arbitral, não se coloca certamente do mesmo modo que temos de enfrentar neste processo, atendendo à natureza convencional desse instrumento e ao alargado espetro que podem ter essas convenções (artigo 1.º, n.ºs 1 e 2), em sentido divergente do que acontece com a arbitragem tributária, onde as partes não podem estabelecer as regras de dirimir os seus conflitos com a AT.

 

  1. Decisão

 

Nos termos e pelos fundamentos expostos este Tribunal Arbitral julga procedente a exceção dilatória da intempestividade a impugnar as liquidações identificadas e absolve a Requerida da instância.

Condena-se a Requerente no pagamento integral das custas.

 

  1. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 306.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de  € 293.723,64 (duzentos e noventa e três mil, setecentos e vinte e três euros e sessenta e quatro cêntimos).

 

  1. Custas

 

O valor da taxa de arbitragem é fixado em € 5.202,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 20 de junho de 2022

 

 

Os árbitros

 

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(Regina de Almeida Monteiro, árbitro presidente)

 

 

___________________________

(Nuno Maldonado Sousa, árbitro adjunto e relator)

 

____________________________

(José Ramos Alexandre, árbitro adjunto), com voto de vencido

 

 

Declaração de voto

 

O artº 9º da Lei Geral Tributária garante o acesso à justiça tributária para tutela plena e efetiva de todos os direitos ou interesses legalmente protegidos, no seguimento, aliás, do direito constitucional de acesso à justiça (artº 20º nº 1 e artº 268º, nº 4 da CRP).

Para tanto, é garantido aos administrados que a tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos é levada a cabo através da impugnação dos atos tidos como ilegais, com recurso à justiça tributária exercida, atualmente, pelos tribunais administrativos e fiscais em jurisdição plena por via do processo judicial tributário (artº 96º e 97º do CPPT) ou, alternativamente, pelos tribunais arbitrais, conforme prevê o artº 1º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, criado pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, por via do processo arbitral nos casos cuja competência esteja prevista no seu artº 3º e na Portaria de Vinculação da Autoridade Tributária (Portaria nº 112-A/2011, de 22/3).

De todo o modo, o direito conferido ao sujeito passivo de recorrer aos tribunais é exercido obrigatoriamente (artº 3º do CPC, subsidiariamente aplicável) com um pedido de instauração de um processo de impugnação judicial ou de um processo arbitral, consoante a opção escolhida, para apreciação do seu pedido.

Portanto, antes de tudo o mais, o administrado tem um direito constitucional para interpor uma ação junto dos órgãos jurisdicionais competentes no sentido de instaurarem um processo de impugnação judicial ou de pronúncia arbitral, consoante a sua opção, com vista à apreciação da legalidade dos atos da administração tributária o qual, como todos os direitos, por questões relacionadas com o princípio da segurança jurídica, deve ser exercido dentro de um determinado prazo sob pena de o não exercício dentro desse prazo legalmente fixado o fazer caducar.

Na verdade, este direito de ação é um direito prévio, abstrato e incondicional (no sentido de estar dependente da verificação ou não do direito material subjacente) visando procurar a resolução de um conflito por meio de uma atividade jurisdicional, mas que, por questões relacionadas com a segurança jurídica, caduca com o seu não exercício dentro do tempo que a lei atribui ao beneficiário para o seu exercício.

Trata-se de um direito, cujo prazo para o seu exercício tem natureza substantiva, anterior e independente do processo, que deve ser exercido, no caso de a opção ser a via arbitral, no prazo de 90 dias ou de 30 conforme as situações previstas no nº 1 do artº 10º do RJAT, pelo que a sua natureza não pode ser de cariz nem procedimental nem processual, mas antes inerente à relação jurídica tributária material que compreende o direito de impugnar ou reclamar das situações que sejam desconformes com a legalidade.

Na ótica do processo arbitral em sentido amplo, entendemos que antes da apresentação da petição inicial nem sequer há procedimento, o qual só pode, obviamente, ter início precisamente com esse pedido do interessado, como decorre do artº 53º do CPTA, subsidiariamente aplicável, pelo que a previsão do artº 3º/A do RJAT não pode ser aplicada ao direito de ação que é autónomo e anterior a qualquer procedimento.

Por outro lado, como decorre do artº 15º do RJAT, o processo arbitral só tem início na data da constituição do tribunal arbitral, ou seja, continua a ser uma realidade o facto de o direito de ação não ter natureza processual por ser prévio ao próprio procedimento arbitral, não lhe sendo, por isso, aplicável nem o nº 1 nem o nº 2 do citado artº 3º/A do RJAT, ao contrário do que decorre da decisão maioritária tomada no presente processo.

É com a apresentação do pedido arbitral que se inicia primeiramente o procedimento e, depois da constituição do tribunal, o processo.

O que a presente decisão declara é que por ser aplicável ao ato de apresentação da petição inicial o artº 3º/A do RJAT e as normas aplicáveis subsidiariamente do CPTA, à data da sua apresentação estava precludido o direito de ação, sendo, consequentemente, intempestivo o pedido arbitral, pelo que, de conformidade com o disposto no artº 139º do CPC o decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato, o que importa a absolvição da instância (artº 576º, nº 2 do CPC).

Entende a decisão que não estamos perante um problema de falta de regulamentação específica em matéria de prazos e que o CAAD não é equiparado à secretaria de um tribunal judicial pelo que nunca o artº 279º, do Código Civil seria aplicável ao caso.

Vejamos

Acompanhamos a posição que parece ser unânime na doutrina e até mesmo na jurisprudência do STA de que na contagem do prazo para o exercício do direito de ação, por este ser um direito de natureza substantiva, se aplica o artº 279º do Código Civil, aqui subsidiariamente aplicável por força do artº 29º, nº 1, in fine, do RJAT, com remissão para o artº 20º do CPPT.

Se bem que exista pelo menos um acórdão do CAAD em sentido contrário, há, todavia, a decisão tomada no Proc.º 314/2014-T, que acompanhou esta tese, considerando que o prazo para deduzir impugnação é um prazo de caducidade, de natureza substantiva, contínuo e integrante da própria relação jurídica material controvertida e, como tal, contado de acordo com as regras do artº 279º do CC e artº 20º do CPPT. Trata-se, com efeito, de um prazo perentório, cujo decurso, extingue o direito de praticar o ato.

No entanto a decisão tomada nestes autos, por maioria, entende, a nosso ver por força de uma interpretação meramente literal da norma, que se aplica o artº 3º/A do RJAT também na contagem do prazo para a apresentação do pedido arbitral, o que implica que se considere o direito de apresentar um pedido arbitral como sendo um ato já pertencendo a um procedimento que ele próprio se destina a fazer nascer.

O que tem prazo para ser exercido não é o pedido mas sim o direito que lhe é anterior, e é este que deve ser exercido até uma determinada data, daí estarmos perante um caso de caducidade, e é, portanto, o exercício deste direito que está em causa e que é exterior e anterior ao procedimento a que se refere o artº 3º/A do RJAT porque ele existe independentemente de qualquer procedimento, que por sinal só surge com a apresentação da petição e, a nosso ver, se mantém até à constituição do tribunal.

E, efetivamente, não fazendo o direito de ação parte do procedimento arbitral, constatamos que nem o artº 3º/A do RJAT, nem outro qualquer referem qual a forma ou modo de contagem do respetivo exercício do direito. As normas referentes à apresentação só dizem que o direito deve ser exercido em 90 ou em 30 dias, conforme o artº 10º. Trata-se, pois, de prazos de natureza substantiva e não processuais ou procedimentais, por isso, o regime aplicável é necessariamente o do artº 279º do Código Civil.

Perante este enquadramento legal, atendendo à não existência no RJAT de norma específica que regulamente a forma de contagem dos prazos de 90 ou de 30 dias previstos no artº 10º, há necessidade de recurso à disposição do artº 29º do mesmo RJAT que estabelece a aplicação de normas subsidiárias para os casos de falta de regulamentação expressa, sendo nós remetidos para o artº 20º do CPPT, que é a norma que fixa o modo de contagem dos prazos e que logo no seu nº 1 estabelece que “Os prazos do procedimento tributário e interposição da impugnação judicial contam-se de modo contínuo e nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em dia em que os serviços ou os tribunais estiverem encerrados, para o primeiro dia útil seguinte (Redação da Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro)”.

Ou seja, manda aplicar à contagem do prazo para a apresentação do pedido arbitral o regime estabelecido no artº 279º do CC, e que se o termo coincidir com um dia em que os serviços estão encerrados então o termo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.

E se anteriormente poderiam existir dúvidas sobre a forma de encontrar o último dia do prazo, agora a norma é clara quando diz que o prazo para a “interposição de impugnação…” se transfere para o primeiro dia útil seguinte.

A jurisprudência do STA desde há muito que vem decidindo pacificamente que o primeiro dia útil seguinte será o do primeiro dia pós-férias se o termo do prazo se verificar no decurso do período de férias, uma vez que é feita a equiparação do período de férias aos dias em que o tribunal está encerrado.

No presente processo foi isso mesmo que o tribunal deu como provado, ou seja, que o último dia do prazo ocorreu em 29/08/2021, e assim sendo, o último dia do prazo se transferiu para o dia 30 de agosto de 2021, data em que ainda decorriam as férias judiciais.

É jurisprudência é praticamente unânime no entendimento de que há uma perfeita identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral, entendendo nós que  é a tese que está em sintonia com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, de onde sobressai a intenção de que o processo arbitral tributário constitua «um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (n.º 2), tese depois confirmada com a redação dada ao art.º 1º do RJAT quando determina que “O presente Decreto-Lei disciplina a arbitragem como meio alternativo de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária”.

Assim sendo, somos forçados a admitir que ao processo arbitral são aplicadas as mesmas regras que são aplicáveis ao processo de impugnação judicial, em sede do qual parece não existirem dúvidas de que ao prazo para propositura da ação se aplica o art.º 279º do Código Civil, por força do nº 1 do art.º 20 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Inexistindo no RJAT, como ficou demonstrado, forma expressa de contagem desse prazo, é subsidiariamente aplicável o disposto no artº 20º do CPPT e no art.º 279º do CC para a contagem do prazo para exercer o direito de ação com a apresentação de pedido de pronúncia, pelo que, o último dia do prazo que termine em período de férias judiciais se transfere para o primeiro dia útil após férias.

Nessa conformidade, é meu entendimento de que o pedido é tempestivo, pelo que o processo deveria prosseguir os termos ulteriores com a apreciação pelo tribunal arbitral coletivo da restante matéria do pedido.

 

José Ramos Alexandre

 

 



[1] Veja-se o acórdão do STA de 20-06-2018, processo 0748/15, [Pedro Delgado], acessível em www.dgsi.pt. Este acórdão contém extensa lista dos acórdãos que o antecederam, em sentido coincidente.

[2] Veja-se o acórdão proferido em tribunal arbitral coletivo no CAAD, em 27-12-2021, processo nº 691/2020-T, [Carlos Cadilha].

[3] Veja-se a compilação no sítio do Diário da República Eletrónico, em https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/lei/2020-131193460 .

[4] O artigo 6.º-C da Lei n.º 1-A/2020 foi mais tarde revogado pelo artigo 6.º da Lei n.º 13-B/2021 de 5 de abril, que fez cessar o regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, com efeitos em 6 de abril de 2021, nos termos do seu artigo 7.º

 

[5] Com a entrada em vigor deste diploma “Cessa o regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.” e passa a vigorar apenas o “regime processual excecional e transitório” que disciplina sobretudo a organização das diligências de forma a evitar contactos entre os intervenientes processuais e limita a suspensão de prazos aos casos especiais de apresentação à insolvência, entrega de casa de morada de família e locais arrendados (veja-se o artigo 6.º-E da Lei n.º 1-A/2020, então aditado)

[6] Em sentido diverso pode ver-se a decisão tomada por Tribunal Arbitral singular em 20-06-2014, neste Centro de Arbitragem Administrativa, no processo n.º 17/2014, que considera dever-se contar este prazo nos termos previstos no artigo 279.º,do Código Civil, embora a questão em discussão fosse um pouco diferente.

[7] Nos termos da norma do artigo 28.º da Lei n.º 62/2013 de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário) as férias judiciais decorrem, nesta altura, entre 22 de dezembro e 3 de janeiro.

[8] Jorge Lopes de Sousa – “Comentário ao regime jurídico da arbitragem tributária”. In Guia da arbitragem tributária (coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira), Coimbra: Almedina. 2013. p. 174.

[9] Carla Castelo Trindade - Regime jurídico da arbitragem tributária. Reimpressão. Coimbra: Almedina, 2016, pp. 168-169.

[10] Jorge Lopes de Sousa – “A aplicação da regra do art. 279.º do Código Civil aos prazos de apresentação de pedidos de constituição de tribunais arbitrais”. Cadernos de Justiça Tributária, n.º 11, (2016), pp. 3-9.

[11] Vejam-se também as regras dos artigos 233.º e 780.º-8.

[12] Vejam-se, por exemplo, as normas dos artigos 1.436.º-1-b) que regulam a contagem em dias úteis.

[13] Na legislação com natureza processual ou procedimental veja-se no CPTA o artigo 29.º, no CPPT o artigo 20.º e na Lei Geral Tributária o artigo 57.º-3.