Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 675/2021-T
Data da decisão: 2022-06-17  IRS  
Valor do pedido: € 3.715,20
Tema: IRS – Rendimentos prediais; Deduções.
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            SUMÁRIO:

 

Não se evidenciando que determinadas despesas correspondem a gastos comuns do condomínio, antes configurando encargos de natureza financeira, não pode tal despesa considerar-se dedutível, à luz do disposto no artigo 41.º do Código do IRS.  

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

A. Sérgio de Matos, árbitro designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”), profere a seguinte decisão:

 

 

            I.         Relatório

 

A..., contribuinte fiscal número..., com residência fiscal em ..., ..., ..., ..., ...-..., ..., ... (Algarve), notificado da nota de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares n.º 2020..., datada de 2020/08/14, referente ao período de tributação de 2016 (doravante “Requerente”), veio intentar impugnação judicial, aqui havida como pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”) e formular pedido de pronúncia arbitral, tendo por objeto a anulação parcial da referida nota de liquidação, bem como o reembolso dos montantes que considera indevidamente pagos.

 

É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante “AT” ou “Requerida”.

 

Em 19-10-2021, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT.

 

Em conformidade com o disposto nos artigos 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do Tribunal Arbitral o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. Notificadas dessa designação, as Partes não se opuseram (artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD).

 

O Tribunal Arbitral ficou constituído em 28 de Dezembro de 2021.

 

            Em 07-01-2022, a Requerida apresentou requerimento ao qual anexou despacho de revogação parcial do acto sindicado nestes autos, despacho esse exarado, em 14-12-2021, pela Senhora Subdirectora-Geral da Área dos Impostos sobre o Rendimento e Relações Internacionais.

            Por despacho da mesma data, foi o Requerente convidado a pronunciar-se sobre se, em face da revogação parcial do acto impugnado, pretendia ou não a prossecução dos autos, ao que veio responder afirmativamente, em 17-01-2022, alegando que as despesas ainda não consideradas pela AT respeitam a pagamentos de despesas comuns de Condomínio, razão pela qual devem ser consideradas como despesas dedutíveis.

            Em 07-02-2022, a Requerida apresentou Resposta, à qual juntou o Processo Administrativo (PA), nela tendo pugnado pela improcedência do PPA e, consequentemente, pela sua absolvição na parte excedente ao que foi reconhecido no despacho de revogação parcial ante mencionado.

 

            Por despacho de 25-02-2022, dispensou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, por desnecessidade, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, simplificação e informalidade processuais (arts. 16.º, al. c), e 29.º, n.º 2, do RJAT) e determinou-se a prossecução com alegações escritas, de facto e de direito, por prazo simultâneo de 15 dias (art. 120.º do CPPT, ex vi art. 29.º, n.º 1, do RJAT). Foi advertido o Requerente de que deveria, no prazo previsto para proferir a decisão arbitral, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente e solicitou-se às partes a remessa das peças processuais em formato editável, com vista a facilitar a elaboração daquela decisão.

            Em 09-03-2022, o Requerente ofereceu as suas alegações finais, nelas expressando que, tendo em conta a revogação parcial do acto controvertido, se cingia às despesas incorridas com a entidade “B..., Ltd”, no valor de 7.011,20 € (sete mil e onze euros e vinte cêntimos), despesas essas constantes dos Documentos 31 a 34 do PPA e que, ao invés do entendimento da AT, que as tomou como pagamentos de serviços de contabilidade, de natureza financeira, configuram despesas de Condomínio, pelo que devem considerar-se dedutíveis, por força dos disposto no n.º 1 do artigo 41.º do CIRS.

            A Requerida apresentou alegações, em 22-03-2022, em que se limitou a dar por reproduzido o já exposto na Resposta e a reafirmar que o pedido deve decair na parte que não foi alvo de revogação parcial.

II.        SANEAMENTO

 

O Tribunal foi regularmente constituído.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

A ação é tempestiva, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, de acordo com a remissão operada para o artigo 102.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”).

O processo não enferma de nulidades.

 

            III.      Fundamentação de Facto

 

            1.         Matéria de Facto Provada

 

Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:

 

  1. O Requerente, residente fiscal em Portugal, entregou, em 2020-08-13, declaração de rendimentos referente ao IRS de 2016, com anexo J, indicando rendimentos de pensões e prediais, bem como o respetivo imposto pago no Estrangeiro, da qual emergiu a liquidação número 2020..., onde se apurou um montante de imposto a pagar no valor de 8.633,62 € (oito mil seiscentos e trinta e três euros e sessenta e dois cêntimos) – cfr. PA e admitido por acordo.

 

  1. Em 22-09-2020, substituiu a declaração supra pela declaração ... (convolada na Reclamação Graciosa n.º ...2021...), tendo declarado rendimento predial líquido no montante de € 7.488,55 e imposto no montante de € 1.804,29 – cfr. PA-RG (fls. 35) e Doc. 1, junto com o PPA.

 

  1. Fundamentando a reclamação graciosa, em síntese alegou que, após ter sido notificado pela AT, apresentou declaração de substituição Mod. 3/ IRS com a identificação ..., na qual declarou rendimento no valor de € 24.527,55 e imposto no valor de € 1.545,63 por ter sido este o valor comunicado à Administração Tributária Portuguesa ao abrigo do Sistema de Troca de Informação Fiscal Internacional (Directiva 2011/16/EU; DL 61/2013 e DL 64/2016), vindo agora requerer que se proceda a nova liquidação atendendo à dedução específica dos rendimentos prediais (rendimento predial liquido) e ao crédito de imposto pago no Reino Unido – cfr. PA.

 

  1. Em 04-03-2021, por despacho da Chefe do Serviço de Finanças de ... a reclamação graciosa foi indeferida, com fundamento em que os documentos apresentados não constituíam prova bastante para comprovar o alegado pelo Requerente – cfr. PA.

 

  1. Inconformado, a 05-05-2021, o Requerente deduziu recurso hierárquico, que recebeu o n.º ...2021..., o qual foi rejeitado liminarmente por ter sido considerado extemporâneo, segundo despacho do Director de Finanças de Faro, de 18-08-2021, comunicado pelo ofício n.º..., de 19-08-2021 – cfr. PA-RH.

 

  1. O Requerente deduziu o presente PPA, em 18-10-2021.

 

  1. A Requerida, por despacho de 14-12-2021, da Senhora Subdiretora Geral do IR promoveu o deferimento parcial do PPA no sentido de “corrigindo-se o ato contestado, uma vez que documentos provenientes das autoridades fiscais do Reino Unido comprovam o imposto pago no estrangeiro de acordo com o previsto na respetiva CDT” e “considerar-se no anexo J do contribuinte o rendimento predial no valor de € 18.895,37 e o imposto pago no estrangeiro no montante de € 925,69 referente ao IRS de 2016

 

  1. Desse acto de revogação parcial da liquidação impugnada colhe-se, ademais, o seguinte:

     “9. O sujeito passivo A... vem alegar o mesmo peticionado na reclamação graciosa, isto é, os documentos apresentados, comprovam todos os montantes declarados na declaração que deu origem à reclamação graciosa, inclusive o imposto pago no estrangeiro.

     10. Antes de mais, é pertinente realçar que o sujeito passivo residente fiscal em Portugal procedeu à entrega voluntária da declaração de rendimentos relativa ao ano de 2016, omitindo os rendimentos auferidos no estrangeiro, tendo a AT posteriormente vindo a notificá-lo para proceder à regularização da situação acrescentando os rendimentos auferidos no estrangeiro no anexo J.

     11. Neste sentido, importa esclarecer que a informação que dispomos é proveniente de uma troca de informação automática das autoridades fiscais do Reino Unido.

     12. Esta informação é proveniente da troca automática de informação, que tem origem na Diretiva 2011/16/EU de Conselho de 15 de fevereiro de 2011(DAC1), relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade que foi transposta para a ordem jurídica nacional através do Decreto-Lei 61/2013 de 10 de maio.

     13. Em consulta ao SITI, verifica-se que as autoridades fiscais do Reino Unido comunicaram que o sujeito passivo A..., auferiu, em 2015/2016, rendimentos de pensões no total de 15.292,72 EUR e rendimentos de imóveis (rendas) no montante total de 21.000,00 GBP (24527.55 EUR), sem qualquer referência a imposto; E, no ano 2017 (2016/2017) rendimentos de pensões no total de 14.930,67 EUR rendimentos de imóveis (rendas) no montante de 20.991,00 GBP (23659.03 EUR), sem qualquer referência a imposto.

     14. Também, atendendo ao alegado pelo sujeito passivo, informa-se que o ano fiscal do Reino Unido não coincide com o ano civil, como acontece em Portugal.

     15. No Reino Unido o ano fiscal inicia-se a 6 de abril e termina no dia 5 de abril do ano seguinte.

     16. Assim, a informação que nos foi comunicada ao abrigo da DAC1 (rendimentos prediais) respeita a valores do período compreendido entre 06/04 dum ano e 05/04 do ano seguinte.

     17. Tendo em conta o referido, para o cálculo dos rendimentos do ano 2016, deverá considerar-se duas parcelas: uma de 95 dias, correspondente ao período compreendido entre 1 de janeiro e 5 de abril do ano 2016 e a outra parcela, respeitante a 270 dias do ano 2015; e no período seguinte o mesmo cálculo.

     18. No caso concreto, para se apurar os rendimentos totais de 2016, temos que consultar o comunicado referente a 2016 (2015/2016) e 2017 (2016/2017).

     19. E, tendo em conta a informação recebida (cf. Valores indicados no ponto 13 da presente informação), fracionado o rendimento de 21.000,00 GBP e 20.991,00 GBP, nos termos acima indicados obtemos um rendimento total de 20.993,34 GBP, os quais convertidos à taxa invocada na petição pelo contribuinte obtemos o montante de €24.518,12.

     20. Neste momento, cabe fazer um ponto de situação em face da argumentação usada pelo contribuinte na sua petição, pois conforme assume no paragrafo 64º da petição da presente impugnação ele aceita o valor de 21.000,00 GBP como o rendimento obtido no ano de 2016, quando atrás ficou demonstrado que não deve ser esse o entendimento em virtude do ano fiscal inglês ser diferente do português.

     21. Mais, conforme ficará demonstrado, o sujeito passivo ao longo da sua petição ora invoca os valores do ano civil de 2016, ora invoca os valores constantes de anos ficais do Reino Unido de 2016 e 2017, não usando uma linha coerente do apuramento dos valores a considerar na declaração de IRS de 2016.

     22. Ainda assim, prosseguindo a análise ao alegado pelo sujeito passivo, isto é, a dedução específica dos rendimentos prediais (rendimento predial liquido) e ao crédito de imposto pago no Reino Unido, terá que se analisar em primeiro lugar o enquadramento de rendimento predial auferido no Reino Unido e uma eventual determinação da competência tributaria nos termos do disposto na Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e o Reino Unido.

     23. No que diz respeito ao art. 6º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e o Reino Unido, informa-se o seguinte:

     24. Para uma melhor interpretação da norma em causa, transcreve-se a mesma:

Artigo 6.º

Rendimentos dos bens imobiliários

1) Os rendimentos provenientes de bens imobiliários podem ser tributados no Estado Contratante em que esses bens estiverem situados

2) a) A expressão «bens imobiliários», salvo o disposto na alínea b), é definida de acordo com o direito do Estado Contratante em que tais bens estiveram situados

b) A expressão «bens imobiliários» compreende sempre os acessórios, o gado e o

equipamento das explorações agrícolas e florestais, os direitos a que se apliquem as disposições do direito privado relativas à propriedade de bens imóveis, o usufruto de bens imobiliários e os direitos a retribuições variáveis ou fixas pela exploração ou pela concessão da exploração de jazigos minerais, fontes e outros recursos naturais; os navios e aeronaves não são considerados bens imobiliários.

3) A disposição do parágrafo 1) aplica-se aos rendimentos derivados da utilização directa, do arrendamento ou de qualquer outra forma de utilização dos bens imobiliários. Essa disposição aplica-se igualmente aos rendimentos derivados dos bens que, de acordo com a legislação do Estado Contratante em que tais bens estiverem situados, sejam assimilados aos rendimentos derivados dos bens imobiliários.

4) O disposto nos parágrafos 1) e 3) aplica-se igualmente aos rendimentos provenientes dos bens imobiliários de uma empresa e aos rendimentos dos bens imobiliários utilizados para o exercício de profissões liberais.

     25. Nos termos do n.º1 e n.º 3 do art. 6º da CDT celebrada entre Portugal e o Reino Unido os rendimentos que um residente de um Estado Contratante aufira de bens imobiliários situados no outro Estado Contratante podem ser tributados nesse outro Estado.

     26. Quer isto dizer, que o rendimento em causa nos termos da CDT celebrada entre Portugal e o Reino Unido é de competência cumulativa (ambos os Estados podem tributar).

     27. Deste modo, tratando-se de sujeito passivo residente em território português que obtém rendimentos do Reino Unido sobre os quais paga imposto, de acordo com a CDT entre Portugal e aquele país, fica sujeito a IRS, o qual incide sobre a totalidade dos rendimentos, incluindo os auferidos no estrangeiro (ex vi dos artigos 13º e 15º, n.º 1 do CIRS), tendo direito ao crédito de imposto por dupla tributação internacional, calculado nos termos do n.º 1 do art. 22º da

Convenção citada.

     28. E, relativamente aos rendimentos prediais que devem ser considerados (total de rendimento contestado pelo sujeito passivo), deverão ser os Rendimentos auferidos, conforme previstos no artigo 8.º do Código do IRS.

     29. Isto é, o sujeito passivo deverá inscrever o montante dos rendimentos líquidos dos gastos suportados com a respetiva obtenção.

     30. Mais, deverá ainda atender-se ao seguinte:

•Os gastos a considerar correspondem aos efetivamente suportados e pagos no ano pelo sujeito passivo, pelo período em que o(s) prédio(s) esteve(iveram) arrendado(s), nomeadamente os que digam respeito à conservação e manutenção do(s) prédio(s), a despesas de condomínio, a impostos e taxas autárquicas.

•Não podem ser considerados os gastos de natureza financeira, os relativos a depreciações e os relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração (n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRS);

•Caso o SP arrende parte de prédio suscetível de utilização independente, os encargos a deduzir são imputados de acordo com o respetivo valor patrimonial tributário ou, na falta deste, na proporção da área utilizável de tal parte na área total utilizável do prédio.

     31. E, de acordo com o alegado na petição da presente impugnação e em face da prova documental apresentada, verifica-se que parte dos valores invocados como deduções não podem ser aceites.

     32. Seguiremos a cronologia dos valores apresentados na petição do contribuinte, pelo que em primeiro lugar no parágrafo 65º da petição são invocados os montantes de £1.382,00 relativos a encargos suportados com seguros.

     33. O sujeito passivo remete a prova do valor apresentado para os documentos identificados como 2 a 16, mas consultando os documentos referentes à entidade Rentguard apenas se identificam 4 documentos (12, 13, 13 e 15) com o valor total de £257,10.

     34. Mais, os documentos em causa dizem respeito ao período de 22/07/2016 a 21/07/2017, pelo que em rigor apenas se deveria considerar os montantes relativos aos 5 meses de 2016.

     35. Ainda relativamente aos encargos com seguros, e atendendo ao parágrafo 69º da petição em que são invocados mais £1.088,83 de custos, verifica-se que mais uma vez são considerados os encargos da entidade Rentguard no valor total de £257,10, bem como outros encargos de £761,73 de uma seguradora (docs. 7, 8, 9 e 10) e £70 (doc 16).

     36. Também relativamente à prova documental apresentada verifica-se que os documentos identificados como 7, 8, 9 e 10 dizem respeito ao período de 16/07/2016 a 17/06/2017, pelo que em rigor apenas se deveria considerar os montantes relativos aos 6 meses de 2016.

     37. Quanto à despesa de £450,00 que consta no parágrafo 69º da petição (doc. 6) a mesma será de considerar na totalidade.

     38. No mesmo sentido, a despesa invocada no parágrafo 71º da petição no montante de £2.515,25 deverá ser aceita na totalidade, uma vez que os documentos 17 a 25 dizem respeito a despesas efetuadas nas propriedades durante o ano civil de 2016.

     39. Por último, relativamente à despesa constante do parágrafo 73º da petição no montante de £6.763,18, apenas uma parte deverá ser aceite enquanto despesa.

     40. É que relativamente a £6.002,85 (doc 34), verifica-se que dizem respeito a encargos financeiros com contabilista, pelo que não se enquadram nas despesas aceites nos termos do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRS, devendo apenas considerar-se a diferença das £6.763,18 por as mesmas serem relativas a “fees”.

     41. Resumindo, as despesas identificadas nos pontos 35, 37, 38 e parte do ponto 39 (£760,33) devem ser aceites enquanto documentos que se enquadram como gastos a considerar por corresponderem a gastos que dizem respeito à conservação e manutenção do prédio, a despesas de condomínio, a impostos e taxas autárquicas.

     42. Ainda, relativamente aos montantes elencados nos pontos 35 e 39 (£1.088,83 + £760,33),aceita-se a totalidade dos valores apresentados, apesar de dizerem respeito apenas a parte do ano 2016, uma vez que ainda que o contribuinte não tenha logrado apresentar os documentos corretos tendo por base o principio da boa fé deverá ter suportado tais montantes, e por outro lado, poderá aceitar-se que ainda que o pagamento diga respeito a parte dos anos de 2016 e 2017, terá sido pago no ano civil de 2016.

     43. No que diz respeito às restantes despesas, as mesmas não podem ser aceites por se enquadrarem como gastos de natureza financeira, os relativos a depreciações e os relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração (n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRS).

     44. Concluindo, da totalidade dos documentos aceites apurou-se o montante de £4.814,41, do qual aplicando a taxa de conversão invocada pelo contribuinte se obtém o valor de €5.622,75.

     45. Deste modo, ao montante ilíquido de €24.518,12 terá que se subtrair os €5.622,75 apurando-se o rendimento liquido de €18.895,37.

     46. E, no que diz respeito ao imposto suportado no Reino Unido, no que concerne aos documentos apresentados relativamente aos rendimentos obtidos no Reino Unido, os mesmos têm que estar em conformidade com o disposto no ofício-circulado n.º 20124 de 2007/05/09, isto é, tratarem-se de fotocópias autenticadas ou originais emitidos pela autoridade fiscal do país de origem.

     47. Da documentação enviada constam documentos provenientes das autoridades fiscais do Reino Unido que indicam que relativamente aos dois períodos, o sujeito passivo terá pago imposto naquele país.

     48. Em primeiro lugar, os documentos apenas comprovam que terá sido pago imposto sem demonstrar que o mesmo é relativo aos rendimentos prediais, pois os documentos apresentados dizem respeito aos avisos de pagamento e não aos documentos emitidos pelas autoridades fiscais do Reino Unido que se equiparam à nossa liquidação final.

     49. Verifica-se que o sujeito passivo considerou que todo o montante de imposto que consta dos documentos (identificados como 42 e 44) deve ser considerado como imposto correspondente a 2016, mesmo o que diz respeito a 2014!

     50. E, como se pode observar da leitura atenta aos documentos, existem várias rubricas dos montantes pagos, desde parcelas do ano 2014-15, 2015-16 e 2016-17.

     51. Dos documentos apresentados pelo sujeito passivo, verifica-se que consta um total de imposto pago para o período de 2015-16 no montante de £1.239,70 e para o período de 2016-17 £635,30.

     52. Tal como se aplicou a regra do fracionamento aos rendimentos, deverá suceder o mesmo com os montantes do imposto pago, pelo que do primeiro período obtém-se o valor de £322,66 e do segundo período £469,95 que dá um total de £792,61 os quais convertidos resultam no valor de €925,69.

     53. Concluindo, da análise aos documentos apresentados pelo sujeito passivo confirma-se que deverá ser atendido parcialmente o pedido do sujeito passivo corrigindo-se o ato contestado, uma vez que documentos provenientes das autoridades fiscais do Reino Unido comprovam o imposto pago no estrangeiro de acordo com o previsto na respetiva CDT e por outro lado, os rendimentos prediais que devem ser considerados deverão ser os Rendimentos auferidos, conforme previstos no artigo 8.º do Código do IRS.

     54. Face ao exposto, atendendo a toda a documentação constante do processo, deverá considerar-se no anexo J do contribuinte o rendimento predial no valor de €18.895,37 e o imposto pago no estrangeiro no montante de €925,69 referente ao IRS de 2016.

 

  1. Os Rendimentos controvertidos advêm de rendas auferidas pelo Demandante no Reino Unido, correspondentes ao arrendamento de 3 prédios, sitos em ..., ..., ..., ..., ..., ..., e ..., ..., ...– admitido por acordo.

 

  1. Estes prédios são propriedade de C..., sociedade britânica, registada no Reino Unido com o número de companhia ..., com sede ..., ..., ..., ..., ..., que os  arrenda ao Demandante pelo preço de 150,00 £ (cento e cinquenta libras) cada, mediante facturas emitidas por D..., entidade gestora do arrendamento em nome da proprietária – cfr. Docs. 2 a 6, juntos com o PPA.

 

  1. O Demandante, posteriormente, subarrenda os referidos prédios, por recurso a uma empresa de gestão imobiliária, D..., Ltd. sociedade britânica com número de companhia ... e sede em..., ..., United Kingdom, ...- admitido por acordo.

 

  1. O Requerente suportou as despesas por si elencadas nos itens 65.º a 71.º do PPA, na medida em que as mesmas foram reconhecidas nos pontos 32 a 38, 41 e 42 do despacho de revogação parcial do acto impugnado - admitido por acordo.

 

M.     O Requerente pagou imposto no estrangeiro (Reino Unido) no montante de 925,69 €, referente ao IRS de 2016 – admitido por acordo.    

 

  2.    Factos não Provados

 

N.      O Requerente suportou despesas comuns do Condomínio em que se inserem os mencionados imóveis, no montante de 6.002,85 libras, i.e. o equivalente a 7.011,20€ (sete mil e onze euros e vinte cêntimos), à taxa de conversão por si indicada e aceite pela Requerida.

          

             3.        Motivação da Decisão de Facto

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

A convicção do Tribunal fundou-se unicamente na análise crítica da prova documental junta aos autos e na matéria admitida por acordo, que está referenciada em relação a cada facto julgado assente.

            Assim, os factos dados como provados foram-no com base no constante do PA, nos documentos juntos pelo Requerente e / ou admitidos por acordo das partes.

            O facto não provado resulta da manifesta insuficiência dos documentos em que o Requerente pretende suportar tal prova.

 

 

            IV.      Fundamentação Jurídica

 

            Após a revogação parcial do acto impugnado, a controvérsia resume-se a saber se as despesas representadas nos Docs. 31, 32, 33 e 34 juntos com o PPA configuram pagamentos de serviços de natureza financeira, como as entendeu a Requerida, ou se representam despesas de condomínio, como defende o Requerente, quer no requerimento em que pediu a prossecução dos autos, quer nas alegações escritas, sem referir qualquer outra discrepância.   Em suma, trata-se se apurar se tais despesas devem ou não considerar-se dedutíveis, à luz do disposto no artigo 41.º do Código do IRS.

 

Dispõe tal norma:

 

SECÇÃO V
Rendimentos prediais

Artigo 41.º
Deduções

1 - Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis.

2 - No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, são dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, outros encargos que, nos termos da lei, o condómino deva obrigatoriamente suportar e que sejam efetivamente pagos pelo sujeito passivo.

3 - Caso o sujeito passivo detenha mais do que uma fração autónoma do mesmo prédio em regime de propriedade horizontal, os encargos referidos no número anterior são imputados de acordo com a permilagem atribuída a cada fração ou parte de fração no título constitutivo da propriedade horizontal.

4 - Caso o sujeito passivo arrende parte de prédio suscetível de utilização independente, os encargos referidos no número anterior são imputados de acordo com o respetivo valor patrimonial tributário ou, na falta deste, na proporção da área utilizável de tal parte na área total utilizável do prédio.

5 - O imposto municipal sobre imóveis e o imposto do selo, pagos em determinado ano, apenas são dedutíveis quando respeitem a prédio ou parte de prédio cujo rendimento seja objeto de tributação nesse ano fiscal.

6 - Na sublocação, a diferença entre a renda recebida pelo sublocador e a renda paga por este não beneficia de qualquer dedução.

7 - Podem ainda ser deduzidos gastos suportados e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento relativos a obras de conservação e manutenção do prédio, desde que entretanto o imóvel não tenha sido utilizado para outro fim que não o arrendamento.

8 - Os gastos referidos nos números anteriores devem ser documentalmente comprovados.

 

  1. Da  prova

            Enquanto tal, e para o que aqui releva, resulta deste artigo que: “Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira…”(n.º1); “No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, são dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, outros encargos que, nos termos da lei, o condómino deva obrigatoriamente suportar e que sejam efetivamente pagos pelo sujeito passivo” (n.º 2); “Caso o sujeito passivo detenha mais do que uma fração autónoma do mesmo prédio em regime de propriedade horizontal, os encargos referidos no número anterior são imputados de acordo com a permilagem atribuída a cada fração ou parte de fração no título constitutivo da propriedade horizontal” (n.º 3); e ainda que “Os gastos referidos nos números anteriores devem ser documentalmente comprovados” (n.º 8).

            Daqui se alcança, inquestionavelmente, que para que pudesse deduzir aos rendimentos obtidos as despesas que alegadamente imputa a gastos de condomínio, ponto era que o Requerente apresentasse evidência documental de tais gastos. Em suporte desta prova, o Requerente aponta para a realidade representada nos documentos 31 a 34 que juntou com o PPA. A verdade é que, por mais que se esmiúcem tais documentos, deles não se colhe o mínimo indício de corresponderem a uma qualquer permilagem, atribuída às fracções em causa, nas despesas de condomínio. Aliás, aparentam configurar encargos de natureza financeira, tal como os enquadrou a Autoridade Tributária, logo não sendo dedutíveis, à luz do preceituado no n.º 1 do artigo 41.º do CIRE. Nessa medida, improcede o pedido nesta parte.

 

     2. Reembolso de quantia paga e juros indemnizatórios

 

            O Requerente pede a anulação parcial da referida nota de liquidação, bem como o reembolso dos montantes indevidamente pagos, sendo que os não quantifica com exactidão, nem o Tribunal dispõe de elementos para o fazer.

            Enquanto tal, deverá a AT, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito, nos termos do disposto no artigo 24.º, n.º 1, b) do RJAT.

            No que toca a juros indemnizatórios, o n.º 1 do artigo 43.º da LGT reconhece o direito quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços. No caso, não restam dúvidas de que esse erro existiu, como assoma, cristalino, do próprio despacho que revoga parcialmente o acto impugnado.

            Por seu turno, estabelece o artigo 61.º do CPPT que “O pagamento de juros indemnizatórios não está sujeito a impulso processual da iniciativa do contribuinte” (n.º 8), bem assim que “Em caso de anulação judicial do acto tributário, cabe à entidade que execute a decisão judicial da qual resulte esse direito determinar o pagamento dos juros indemnizatórios a que houver lugar” (n.º 2). Assim, é indiferente que o pedido de juros indemnizatórios apenas tenha sido formulado aquando das alegações escritas do SP, devendo haver-se como desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, nos termos do artigo 265.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, ex vi artigo 29.º, nº 1, e) do RJAT.

            Os juros indemnizatórios devem ser contados com base no valor do reembolso de imposto e juros compensatórios que vier a ser apurado na execução da presente decisão,
desde a data do pagamento indevido de tais quantias até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º, n.º 5, do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

 

V.        Decisão

 

            De harmonia com o supra exposto, decide este Tribunal Arbitral:

            a) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;

            b) Anular parcialmente a liquidação de IRS n.º 2020..., datada de 2020/08/14, referente ao período de tributação de 2016, onde se apurou um montante de imposto a pagar no valor de 8.633,62 € (oito mil seiscentos e trinta e três euros e sessenta e dois cêntimos);

            c) Julgar procedente o pedido de reembolso da quantia paga em excesso, a título de imposto e de juros compensatórios, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a devolver ao Requerente a quantia que resultar das correcções emergentes do despacho de revogação parcial da liquidação impugnada e da execução da presente decisão, restabelecendo a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, nos termos do artigo 24.º, n.º1, b), do RJAT;

            d) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los ao Requerente, calculados à taxa legal supletiva, sobre a quantia que vier a apurar-se ser-lhe devida, desde a data do respectivo pagamento indevido até ao efectivo reembolso.

 

             

VI.      Valor do Processo

 

Fixa-se o valor do processo em 3.715,20 €, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e do artigo 306.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).

 

 

VII.     Custas

 

            Custas no montante de 612,00 €, na proporção do vencimento/decaímento de cada uma das Partes, ou seja, de 44,50%, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira, e de 55,50%, a cargo do Requerente, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.º 5, do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

 

            Notifique-se.

 

Lisboa, 17 de Junho de 2022.

 

 

O Árbitro,

 

 

(A. Sérgio de Matos)