Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 470/2021-T
Data da decisão: 2022-06-15  IRS  
Valor do pedido: € 12.742,07
Tema: IRS – regime do reinvestimento de mais-valias – habitação própria e permanente – artigo 10º do CIRS
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DECISÃO ARBITRAL

O Árbitro Maria Antónia Torres, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 18 de outubro de 2021, acorda no seguinte:

 

I. RELATÓRIO

  1. A..., contribuinte n.º ..., residente na ..., nº..., ..., Charneca da Caparica (doravante designada por “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“RJAT”), requerer a constituição de tribunal arbitral e apresentar pedido de pronúncia arbitral (doravante “PPA”).
  2. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou "Requerida").
  3. A Requerente pretende a apreciação da legalidade do ato de liquidação oficiosa nº 2019 ... (doravante “Liquidação Contestada”), referente ao ano de 2018, e a sua revogação.
  4. A Requerente fundamenta o PPA, em síntese, nos seguintes termos:
  1. Em 9 de Maio de 2018, a Requerente adquiriu um imóvel sito na Rua ..., ..., ..., na Freguesia ..., inscrito na matriz com o número ..., fração E, pelo valor de €73.000, destinando-o à sua habitação própria e permanente;
  2. O imóvel foi adquirido com recurso ao financiamento, através de um empréstimo junto do B..., no valor de €67.500;
  3. O imóvel pertencia a uma herança e encontrava-se desabitado há anos, pelo que a Requerente teve necessidade de proceder à sua remodelação total;
  4. Durante as obras não foi possível a Requerente habitar o imóvel, facto que se pode aferir pelo valor das obras a realizar, bem como do seu prazo de execução;
  5. Sucede que no final das obras a Requerente teve uma proposta irrecusável de alienação do imóvel.
  6. A Requerente dirigiu-se ao Serviço de Finanças – Lisboa ... a fim de saber quais os procedimentos a seguir. Foi informada que estando dentro do prazo legal para habitar o imóvel que não era necessário mudar o domicílio fiscal, já que iria alienar o imóvel;
  7. Atendendo à referida proposta irrecusável, a Requerente procedeu imediatamente à procura de um imóvel para sua habitação e para posteriormente fixar a sua residência fiscal, uma vez que não dispunha de outro imóvel para habitar;
  8. Tendo a Requerente concluído a alienação do imóvel da ... em 05.12.2018, declarou tal facto na sua declaração de IRS relativa a esse ano;
  9. A Requerente teve sempre a pretensão de reinvestir a mais-valia obtida da venda do imóvel em Lisboa na aquisição de um outro imóvel para sua residência;
  10. Contudo, o imóvel que veio a adquirir, sito na ..., nº..., ..., Charneca da Caparica não dispunha de licença de habitabilidade, facto que atrasou a escritura de aquisição que apenas se veio a realizar em Dezembro de 2019;
  11. Nessa data estava ainda a Requerente dentro do prazo previsto para o referido reinvestimento;
  12. Contudo, tendo a Requerida analisado a Modelo 3 da Requerente, notificou-a para prestar esclarecimentos sobre a mesma, designadamente:
    1. Apresentação da fatura da agência imobiliária que realizou o negócio;
    2. Cópia da escritura de aquisição do imóvel sito na Charneca da Caparica;
  13. Em 29 de Janeiro de 2020, a Requerente foi notificada para proceder à correcção da sua Modelo 3 relativa a 2018, uma vez que fora declarado o montante de €66.760,37 e o valor correcto seria €66.415,02;
  14. A diferença no montante de €332,07 corresponde à penalização cobrada pelo banco pelo acto;
  15. Foi ainda corrigido o montante declarado de despesas e encargos de €33.702,29 para €26.993,80;
  16. Foi também declarado pela Requerente o montante de reinvestimento de €95.000, tendo a Requerida aceite apenas o montante escriturado (€90.000). A diferença de €5.000 corresponde ao custo de obtenção da licença de habitação;
  17. Porém, a Requerida entende que tal valor não deve ser considerado, posição da qual a Requerente discorda;
  18. A Requerida defende que entregou toda a informação e esclarecimentos que lhe foram solicitados;
  19. A actualização do domicílio fiscal da Requerente, para o imóvel em que pretendeu reinvestir, só ocorreu em Maio de 2020, ainda dentro do prazo que a Requerente entende que teria para o efeito;
  20. A Requerente alega que não foi também ouvida em audiência prévia para efeitos de correcção dos elementos declarados na modelo 3 referente ao ano de 2018, nomeadamente no que concerne ao tema do reinvestimento;
  21. A Requerente conclui que o imóvel no qual considera ter efectuado o reinvestimento foi afeto à sua habitação própria e permanente e considerado como o seu domicílio fiscal e centro de vida pessoal e familiar (cfr. artigo 10.º do PPA);
  22. Tendo a Requerente dado integral e pleno cumprimento a todos os requisitos de que depende a aplicação do regime de reinvestimento estatuído no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, não encontra fundamento para a Liquidação Contestada;
  1. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD, e subsequentemente notificado à Requerida.
  2. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na al. a) do n.º 2 do artigo 6.º e da al. b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD nomeou a signatária como árbitro do presente Tribunal Arbitral, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
  3. As partes foram devidamente notificadas dessa nomeação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, al. a) e b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
  4. Em conformidade com o preceituado na al. c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o presente Tribunal Arbitral foi constituído em 18/10/2021, tendo sido a Requerida notificada para apresentar a sua Resposta, nos termos do artigo 17.º, n.º 1, do RJAT.
  5. A Requerida apresentou a sua Resposta defendendo a improcedência do presente PPA, com as devidas e legais consequências.
  6. A Requerida alicerçou a sua Resposta, essencialmente, na seguinte argumentação:
    1. A Requerente entregou em 19 de Junho de 2019 uma primeira declaração de IRS relativa ao ano de 2018, que acabou posteriormente por substituir em 21 de Junho de 2019.
    2. A declaração deu origem à liquidação nº 2019..., no montante de €437,57, a qual foi paga em 9 de Setembro de 2019.
    3. A declaração foi seleccionada para análise de divergências no Anexo G, tendo a Requerente sido notificada para entrega de nova declaração de substituição em conformidade com o projecto de correcções do montante de empréstimo em dívida e das despesas e encargos. A Requerente não entregou tal declaração.
    4. Pelo que foi emitida uma declaração oficiosa, liquidação nº 2019..., no valor de €12.882,31, a qual, por compensação com o valor já anteriormente pago, deu origem a uma nota de cobrança no montante de €12.444,74, objecto dos presentes autos e que se encontra em execução fiscal.
    5. Em 5/5/2020 a Requerente entregou nova declaração de substituição, a fim de corrigir o anexo G. Esta declaração encontra-se na situação de “não liquidável”, tendo sito convolada nos autos da reclamação graciosa apresentada pela Requerente.
    6. Ora, a questão dos valores de despesas e encargos foram aceites pela Requerente em sede da última declaração entregue, pelo que a única questão em aberto se ficou a prender com o tema do reinvestimento da mais-valia.
    7. Foi a Requerente notificada do projecto de indeferimento da reclamação graciosa, tendo exercido o direito de audição prévia. Analisada a audição prévia, a Requerida entendeu não terem sido trazidos elementos novos ao processo pelo que indeferiu a reclamação graciosa a título definitivo, decisão essa comunicada à Requerente a 2 de Janeiro de 2021.
    8. A 7 de Janeiro de 2021 a Requerente apresentou Recurso Hierárquico, o qual foi indeferido por despacho de 4 de Agosto de 2021.
    9. Da análise do recurso hierárquico resultou que não foram apresentados factos novos, pelo que os fundamentos para indeferimento da reclamação graciosa se mantêm no indeferimento do recurso hierárquico.
    10. As decisões de indeferimento da Requerida tiveram por fundamento principal o facto de não se ter apresentado prova de que o imóvel alienado era a habitação própria e permanente da Requerida.
    11. Aliás com a petição inicial veio confirmar que nunca residiu nesse imóvel.
    12. Pelo que não considera a Requerida que estejam preenchidos os requisitos previstos no nº 5 do artigo 10º do Código do IRS, não podendo assim considerar-se ter existido reinvestimento na compra do segundo imóvel.
    13. Considera assim a Requerida que não havendo lugar à aplicação da norma relativa ao reinvestimento, os outros temas que a Requerente levanta no que concerne ao cálculo do valor reinvestido, deixam de ter qualquer relevância.
  7. A Requerida procedeu à junção aos autos do processo administrativo, não tendo requerido a produção de prova adicional.
  8.  o Tribunal Arbitral dispensou a reunião prevista no artigo 18.º, n.º 1, do RJAT e as Partes não apresentaram alegações escritas.

 

II. SANEADOR

  1. A apresentação do PPA foi tempestiva (cfr. artigo 10.º, n.º 1, al. a), do RJAT).
  2. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), e 4.º, ambos do RJAT.
  3. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).  

 

 

III. MATÉRIA DE FACTO

§1 – Factos provados

  1. Com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
  1. Em 9 de Maio de 2018, a Requerente adquiriu um imóvel sito na Rua..., ..., na Freguesia da ..., inscrito na matriz com o número ..., fração E, pelo valor de €73.000;
  2. Este imóvel foi objecto de obras de reabilitação, no final das quais foi alienado (em 5 de Dezembro de 2018);
  3. A Requerente não transferiu nunca para o referido imóvel o seu domicílio fiscal e, de facto, nunca nele viveu, conforme a própria Requerente refere na sua petição inicial;
  4. A Requerente tinha um imóvel arrendado desde 12 de janeiro de 2017, na morada do qual manteve o seu domicílio fiscal desde 26 de maio de 2017 até 29 de maio de 2020, data na qual transferiu o seu domicílio fiscal para o imóvel que entretanto adquiriu, o qual abaixo se refere;
  5. Em Dezembro de 2019, a Requerente adquiriu um imóvel sito na Charneca da Caparica, ..., nº..., lote ...;
  6. Em 19 de Junho de 2019, a Requerente apresentou a declaração de IRS referente ao ano de 2018, seguida de uma declaração de substituição em 21 de Junho de 2019;
  7. Nesse momento, o processo culminou na emissão de uma liquidação oficiosa n.º 2019 ..., no montante de €437,57, a qual foi paga em 9 de Setembro de 2019.
  8. A declaração foi seleccionada para análise de divergências no Anexo G, tendo a Requerente sido notificada para entrega de nova declaração de substituição em conformidade com o projecto de correcções do montante de empréstimo em dívida e das despesas e encargos. A Requerente não entregou tal declaração.
  9. Pelo que foi emitida uma declaração oficiosa, liquidação nº 2019..., no valor de €12.882,31, a qual, por compensação com o valor já anteriormente pago, deu origem a uma nota de cobrança no montante de €12.444,74, objecto dos presentes autos e que se encontra em execução fiscal.
  10. Foi pelo Oficio nº GI-... de 29 de Janeiro de 2020 a Requerente notificada para efeitos de direito de audição quanto ao projecto de correcções que deu origem à liquidação acima referida.
  11. Apesar de não ter reagido ao direito de audição, a Requerente, em 5 de maio de 2020, entregou nova declaração de substituição, tendo corrigido o anexo G, no sentido do projecto de correções.
  12. Esta declaração encontra-se na situação de “não liquidável”, tendo sito convolada nos autos da reclamação graciosa apresentada pela Requerente.
  13. A reclamação graciosa da referida liquidação foi indeferida.
  14. Foi a Requerente notificada do projecto de indeferimento da reclamação graciosa, tendo exercido o direito de audição prévia.
  15. Analisada a audição prévia, a Requerida entendeu não terem sido trazidos elementos novos ao processo pelo que indeferiu a reclamação graciosa a título definitivo, decisão essa comunicada à Requerente a 2 de Janeiro de 2021.
  16. Seguiu-se o Recurso Hierárquico, apresentado em 7 de Janeiro de 2021, igualmente indeferido, com base nos mesmos fundamentos.

 

Factos não provados

Com relevo para a decisão, considera-se como não provado a afectação pela Requerente do imóvel alienado, sito na Rua ..., ..., ..., na Freguesia da ..., inscrito na matriz com o número ..., fração E, à sua habitação própria e permanente. Igualmente, esse imóvel nunca esteve registado como seu domicílio fiscal.

 

Motivação da matéria de facto

  1. Cabe ao Tribunal selecionar os factos relevantes para a decisão e discriminar a matéria provada e não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. a) e e), do RJAT).
  2. Os factos pertinentes para a decisão da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, face às soluções plausíveis das questões de direito (cfr. artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  3. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação aos factos alegados pelas partes, e no exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo (cfr. artigo 16.º, al. e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  4. Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados como factos provados, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, e dos factos alegados pelas partes que não foram impugnados, e na adequada ponderação dos mesmos à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum, e segundo juízos de normalidade e razoabilidade.
  5. Relativamente ao facto dado por não provado supra referido, cumpre referir que o Tribunal baseou a sua convicção na própria petição inicial da Requerente, e na ausência de qualquer outra prova documental produzida pela Requerente que pudesse suportar a afectação do imóvel à sua habitação própria e permanente, o que lhe cabia provar.

 

 

IV. MATÉRIA DE DIREITO

  1. O caso sub judice reporta-se à exclusão de tributação de mais-valias imobiliárias por reinvestimento do valor de realização, ao abrigo do artigo 10.º, n.ºs 5 a 7, do CIRS (na redação em vigor à data dos factos).
  2. Alega ainda a Requerente que a liquidação impugnada padece de vício de forma por ausência de projecto de liquidação e por violação do direito fundamental procedimental à fundamentação. Vejamos, pois, que razão assiste à Requerente quanto ao vício de forma alegado.
  3. Entende a Requerente que não foi notificada para ser ouvida em sede de audição prévia para efeitos de correcção dos elementos declarados na declaração modelo 3 de 2018.
  4. Acrescenta que a notificação nº GI-..., junta aos autos, apenas refere o direito de audição prévia relativo à correcção dos valores indicados no anexo G da Declaração de IRS de Modelo 3, e que esse direito não lhe foi concedido no que se refere ao reinvestimento da mais-valia.
  5. Ora, tais argumentos não se afiguram correctos. Foi a Requerente notificada para audição prévia em dois momentos:
  6. Num primeiro momento em que o que estava em causa era o cálculo da mais-valia, ou seja, uma correção dos valores indicados no anexo G da sua declaração modelo 3 relativa a 2018;
  7. A Requerente tinha entregue a sua declaração modelo 3 em 19 de Junho de 2019, a qual substituiu a 21 de Junho do mesmo ano, tendo pago o valor de IRS daí resultante a 9 de Setembro desse mesmo ano.
  8. A Requerida abriu um processo de divergências relativa à referida declaração que se focou no cálculo da mais-valia apurada, tendo solicitado alguns documentos referentes a esse mesmo tema.
  9. Nesse âmbito, a Requerente foi notificada para exercer o direito de audição prévia pela notificação GI-..., direito de audição esse que não exerceu, e que se referia apenas àquilo que estava em controvérsia naquele momento: os valores indicados para cálculo da mais-valia.
  10. Embora não tenha exercido o direito de audição, a Requerente tinha elementos suficientes para o fazer. E tanto é assim que, em 5 de Maio de 2020, a Requerente apresenta uma nova declaração de substituição da Modelo 3 de 2018 em que corrige precisamente os valores que estavam em questão.
  11. Só nessa declaração de substituição, é que a Requerente comunica a sua intenção de reinvestir, pelo que a notificação para audição prévia acima referida não poderia referir um tema que a Requerida ainda desconhecia no momento da sua notificação.
  12. Esta nova declaração de substituição é convolada no processo de Reclamação Graciosa, o qual, com base no seu projecto de indeferimento, deu origem a uma nova notificação para audição prévia, a qual a Requerente exerceu.
  13. Não se entende, assim, o que pretendeu a Requerente a argumentar que lhe tinha sido negado o direito de audição prévia.
  14. Ora, passemos então à análise da questão. O artigo 10.º, n.º 5, do CIRS prevê uma exclusão de tributação dos ganhos provenientes da alienação de imóvel destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo (ou do seu agregado familiar), que sejam reinvestidos na aquisição de um outro imóvel destinado à habitação própria e permanente do sujeito passivo (ou do seu agregado familiar).
  15. A razão de ser da norma é a proteção e favorecimento fiscal da aquisição de habitação própria e permanente.
  16. Para que opere esta exclusão de tributação, é desde logo necessário que o imóvel alienado, cujo valor de realização se pretende reinvestir, seja a habitação própria e permanente do sujeito passivo.
  17. Tem assim, para beneficiar do regime de investimento estatuído no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, o sujeito passivo que provar que habitava o imóvel alienado.
  18. Fazendo o paralelo com o artigo 10.º, n.º 6, do Código do IRS, podemos concluir que o facto do domicílio fiscal do sujeito passivo não ter sido nunca alterado para o imóvel alienado, cujo valor de realização se pretende reinvestir, não possa ser considerado, por si só factor de exclusão da aplicação do benefício.
  19. A presunção contida no artigo 19.º da LGT, a que a AT lança mão para desconsiderar a exclusão de tributação prevista no n.º 5 do artigo 10.º do CIRS, nos caos em que não houve correcta comunicação do domicílio fiscal, é uma presunção ilidível nos termos do artigo 73.º da LGT (cfr. artigos 64.º do PPA), e já o era antes da introdução dos atuais nºs 12 e 13 do artigo 13.º do CIRS (cfr. artigos 64.º e 66.º do PPA).
  20. Contudo, não é esse o caso concreto. A não aplicação do benefício do artigo 10º do CIRS, no caso sub judice, nada tem a ver com o facto do domicílio fiscal da Requerente não ter sido nunca o imóvel alienado, e muito menos, eventuais atrasos na alteração do seu domicílio fiscal para o imóvel no qual pretendeu efectuar o reinvestimento.
  21. No caso concreto, o tema é tão somente a própria Requerente assumir que nunca habitou o imóvel que alienou e cujo valor de realização pretendeu reinvestir. O imóvel nunca foi de facto a sua habitação própria e permanente.
  22. Ora, o artigo 10º do CIRS é um benefício que se aplica apenas face a uma alienação de um imóvel que seja efectivamente a habitação própria e permanente do sujeito passivo, onde habitou, o que, a própria Requerente assumiu não ter sido o caso.
  23. Pelo que não se reconhece razão à Requerente quanto à petição.

 

V. DECISÃO

Termos em que este Tribunal Arbitral decide julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se integralmente na ordem jurídica a liquidação de IRS que lhe está subjacente.

 

 

 

VI. VALOR DO PROCESSO

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, al. a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 12.742,07.

 

VII. CUSTAS 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e de harmonia com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas arbitrais em €918,00, a cargo da Requerente.

Notifique-se.

Lisboa, 15 de Junho de 2022

O árbitro,

 

(Maria Antónia Torres)