Sumário:
I. Na eventualidade de os contratos de trabalho elegíveis para efeitos do artigo 19.º do EBF cessarem ou se iniciarem durante o período de tributação, o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 não pode ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos;
II. Se o sujeito passivo impugna a legalidade de actos de autoliquidação e junta para o efeito elementos de prova que visam sustentar a sua posição, incumbe à AT realizar a sua contestação especificada de modo a cumprir com o ónus da contraprova que sobre si recai nos termos do artigo 74.º da LGT e a ilidir a presunção de veracidade e boa-fé das declarações e da contabilidade do sujeito passivo;
III. Não se considera cumprido o ónus da contraprova que incide sobre a AT se esta se limitou a refutar de forma genérica e não especificada os elementos de prova juntos aos autos pelo sujeito passivo;
IV. No âmbito do artigo 19.º do EBF não vigorava um regime de prova vinculada que obstasse à apresentação de elementos probatórios internos para a demonstração dos pressupostos de que depende a dedução do benefício fiscal nele previsto.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Carla Castelo Trindade (árbitra-presidente), José Campos Amorim e Luís Ricardo Farinha Sequeira (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I. RELATÓRIO
1. O A..., S.A., titular do número de identificação fiscal ... (“...”), a B..., S.A., titular do número de identificação fiscal ... (“B...”), a C..., S.A., titular do número de identificação fiscal ... (“C...”), a D..., S.A., titular do número de identificação fiscal ... (“D...”), conjuntamente designadas por “Dominadas” e a E..., S.A., titular do número de identificação fiscal ... (“E...” ou “Dominante”), na qualidade sociedade dominante do perímetro do Grupo F... sujeito ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (“RETGS”), no qual as demais Requerentes se encontram incluídas, vêm requerer a constituição de Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), ambos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente:
À revogação do acto de indeferimento da Reclamação Graciosa com o número de processo ...2020...;
À consideração e dedução no Quadro 07 da declaração Modelo 22 de IRC de 2017 do benefício fiscal da criação de emprego no montante de 7.798,00 € quanto ao A..., de 4.871,47 € quanto ao B..., de 1.455.189,69 € quanto ao C... e de 1.483.551,01 € quanto ao D...;
À consequente correcção do lucro tributável (prejuízo fiscal no caso da C...) individual de cada entidade Requerente declarado no período de tributação de 2017;
Ao reembolso à Requerente do montante de imposto indevidamente pago por erro na autoliquidação no valor de 102.271,58 €;
Ao pagamento dos juros indemnizatórios que se mostrem devidos nos termos do n.º 6 do artigo 137.º do Código do IRC e dos artigos 43.º, n.º 1 e 100.º da LGT.
2. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”), aqui Requerida, em 12 de Julho de 2021.
3. As Requerentes vieram sustentar a procedência do pedido arbitral alegando, em síntese, que à data da entrega das declarações Modelo 22 do exercício de 2017 seguiram o entendimento da AT no que respeita à interpretação do artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”) que, à data, previa um benefício fiscal por criação de emprego. De acordo com as Requerentes, ao terem seguido o entendimento que era defendido pela AT, aplicaram enquanto limite máximo de majoração dos encargos com a criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração o montante correspondente a 14 vezes a retribuição mensal mínima, ajustada proporcionalmente em função do número de dias de aplicação efectiva do benefício fiscal num dado exercício nos casos em que o colaborador não trabalhasse o ano completo ou nos casos em que se completasse os cinco anos de vigência do contrato antes do final do exercício. Segundo as Requerentes, após a entrega das declarações Modelo 22 e da autoliquidação do IRC do período de tributação de 2017, o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) uniformizou jurisprudência no sentido de não ser possível extrair do artigo 19.º do EBF a referida restrição proporcional em função do número de dias de trabalho. Assim, no entender das Requerentes, os actos de autoliquidação e o indeferimento do pedido de Reclamação Graciosa eram ilegais na medida em que estas teriam direito a um montante de benefício fiscal superior àquele que foi deduzido, correspondente à eliminação do ajuste proporcional outrora defendido pela AT. Referiram ainda as Requerentes que a AT procedeu à validação do valor do benefício fiscal deduzido no período de tributação de 2017 o que incluía, necessariamente, a listagem dos colaboradores considerados para efeitos do benefício. Quer isto dizer que, para as Requerentes, a AT nunca colocou em causa a efectiva criação líquida de postos de trabalho, seja em sede de acompanhamento permanente do grupo, seja em sede de inspecções tributárias, seja aquando da submissão das declarações Modelo 22, seja no âmbito da Reclamação Graciosa. Por essa razão, consideraram as Requerentes que a AT não só aceitou a dedução do montante de benefício deduzido no período de tributação de 2017, como também aceitou o cálculo da criação líquida de postos de trabalho que lhe esteve subjacente. Salientaram ainda as Requerentes que à semelhança do que sucedeu com a Reclamação Graciosa, o objecto da impugnação do pedido arbitral é unicamente a correcção dos montantes a deduzir a título do benefício fiscal de criação de emprego por força da alteração de entendimento no que respeita ao limite máximo de majoração do benefício e não a alteração ao cálculo da criação líquida de postos de trabalho. No que em concreto respeita à correcção daquele montante, concluíram as Requerentes que tinham colocado à disposição da AT todos os elementos probatórios para comprovar os encargos incorridos e certificar o montante de benefício fiscal que entendiam ter direito a deduzir.
4. Nos termos do disposto na alínea a), do n.º 2, do artigo 6.º e da alínea b), do n.º 1, do artigo 11.º, ambos do RJAT, o Conselho Deontológico designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável. Em 9 de Setembro de 2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo ficou constituído em 28 de Setembro de 2021.
6. A Requerida, tendo sido devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual se defendeu por impugnação, tendo peticionado a improcedência da acção e, consequentemente, a sua absolvição do pedido. Para o efeito, alegou em síntese que apesar de o artigo 19.º do EBF dever ser interpretado sem o referido ajuste proporcional, as Requerentes não trouxeram ao conhecimento da AT os elementos necessários à comprovação do direito ao referido benefício fiscal, designadamente no que respeita à prova documental. De acordo com a Requerida, não era possível verificar se existiu efectivamente uma criação líquida de postos de trabalho nos termos e para os efeitos do o artigo 19.º do EBF porque as Requerentes não juntaram os contratos de trabalho, os comprovativos de descontos para a segurança social e as cópias dos documentos comprovativos do nível de escolaridade, mas apenas documentos e listas internas que não continham os elementos de suporte aos registos contabilísticos e ao apuramento do benefício em questão, designadamente o nome e o número de identificação fiscal dos funcionários elegíveis para efeitos do benefício, com a correspondente data de admissão ou passagem a efectivo e idade, bem como os encargos repartidos pelos diversos itens e o limite e valor do benefício para o período de tributação em análise. Acresce que, segundo a Requerida, as Requerentes solicitaram a dedução de valores diferentes no pedido de reclamação graciosa, no direito de audição referente ao pedido de reclamação graciosa e no pedido de pronúncia arbitral o que demonstra, no seu entender, a falta de um método de cálculo e da existência dos elementos de prova necessários para que as Requerentes pudessem deduzir o benefício fiscal em questão. Nestes termos, concluiu a Requerida que os elementos de prova carreados pelas Requerentes não eram suficientes para comprovar e certificar a pretendida alteração aos actos de autoliquidação de IRC do período de tributação de 2017, não tendo aqueles cumprido com o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que invocavam, conforme lhes era imposto nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da LGT.
7. Por despacho arbitral de 10 de Novembro de 2021, foi dispensada a realização de reunião arbitral a que alude o artigo 18.º, do RJAT e facultada às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas, direito que estas exerceram e no qual reiteraram os argumentos expostos nas peças processuais já anteriormente apresentadas.
8. Em 25 de Março de 2022, mediante despacho arbitral, foi prorrogado por dois o prazo para proferir a decisão arbitral nos termos e para os efeitos do artigo o 21.º, n.º 2, do RJAT.
II. SANEAMENTO
9. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, em face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades e não existem quaisquer excepções ou outros obstáculos à apreciação do mérito da causa e que cumpra conhecer.
III. DIREITO
III.1. MATÉRIA DE FACTO
III.1.1. Factos provados
10. Analisada a prova produzida nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
a) A E..., S.A. é a sociedade dominante do Grupo F..., sujeito a IRC e enquadrado no RETGS;
b) No exercício de 2017 o Grupo F... detinha no seu perímetro empresarial as sociedades A..., B..., HC... e D...;
c) As Requerentes são sociedades vinculadas ao regime da contabilidade organizada, sujeitas a certificação legal de contas e são objecto de acompanhamento pela Unidade de Grandes Contribuintes da AT;
d) As sociedades A..., B..., C... e D... apresentaram, em Junho de 2018, as autoliquidações de IRC referentes ao exercício de 2017 por via da submissão de declarações Modelo 22, com os n.ºs..., ..., ... e ..., as quais constam respectivamente dos Docs. 3, 4, 5 e 6 juntos com o pedido arbitral;
e) As Dominadas deduziram nas autoliquidações individuais de IRC um montante de benefício fiscal de criação líquida de emprego previsto no artigo 19.º do EBF, correspondente aos seguintes valores:
- A...: 6.729,78 €;
- B...: 1.984,30 €;
-C...: 1.332.654,89 €;
- D...: 1.157.017,82 €;
f) O montante de benefício fiscal deduzido foi ajustado proporcionalmente ao período de vigência dos contratos elegíveis nos termos do artigo 19.º do EBF em conformidade com o entendimento defendido pela AT à data da entrega das autoliquidações de IRC referidas no ponto d) da matéria de facto;
g) Em conformidade com as declarações Modelo 22 supramencionadas, no período de tributação de 2017 foram apurados os seguintes montantes de lucro tributável/prejuízo fiscal e de IRC a pagar em relação a cada sociedade Dominada:
Sociedade dominada Lucro tributável / (prejuízo fiscal) em € IRC a pagar / (recuperar) em €
A... 105,263,20 35.202,28
B... 634,033,24 141.968,07
C... (6.665.686,85) 63.689,19
D... 472.016,00 96.337,72
h) Em 29 de Junho de 2018 a E... apresentou a Declaração Modelo 22 do Grupo referente ao exercício de 2017, conforme Doc. 7 junto com o pedido arbitral;
i) Em 5 de Junho de 2019, a E... apresentou declaração Modelo 22 de substituição, na qual apurou um lucro tributável agregado de 26.683,12 € e um montante de IRC a recuperar de 825.124,48 €;
j) Em 19 de Junho de 2020, as Requerentes apresentaram Reclamação Graciosa, tramitada sob o n.º ...2020..., a qual teve por objecto as autoliquidações de IRC identificadas no ponto d) da matéria de facto, visando a correcção do valor da dedução de benefício fiscal da criação líquida de emprego previsto no artigo 19.º do EBF evidenciado no ponto e) da matéria de facto;
k) Na Reclamação Graciosa as Requerentes invocaram que o quantitativo do benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego deduzido no período de tributação de 2017 tinha de ser alterado, de modo a corrigir a sua ilegalidade, para os seguintes montantes:
- A...: 7.798,00 €;
- B...: 12.084,80 €;
- C...: 1.572.904,92 €;
- D...: 1.637.462,47 €;
l) Para o efeito de tal pretensão as Requerentes juntaram no âmbito da Reclamação Graciosa mapas autonomizados por cada uma das Dominadas, onde se evidencia o número de empregado, a data de nascimento, a data de entrada/contratação, a idade do empregado, a data do fim do benefício, os dias trabalhados em 2017, os encargos majoráveis, o limite majorável, o valor deduzido na declaração Modelo 22, o limite sem especialização e o montante de benefício fiscal que entendiam ter direito a deduzir;
m) A Reclamação Graciosa foi objecto de projecto de indeferimento através de despacho exarado em 26 de Novembro de 2020 onde consta, em suma, a seguinte argumentação:
“Analisada a argumentação da reclamante e todos os elementos constantes dos autos, cumpre referir o seguinte:
- Com efeito, as entidades sujeitas a IRC que celebrarem contratos individuais de trabalho por tempo indeterminado com desempregados de longa duração e/ou jovens com idade superior a 16 anos e inferior a 35 anos, inclusive, podem aceder ao benefício fiscal estabelecido no art.º 19º do EBF;
- Este benefício consubstancia-se na consideração em 150% do montante dos encargos suportados pela entidade empregadora com os trabalhadores que geraram uma criação líquida de postos de trabalho, ao longo dos 5 anos seguintes ao do início do contrato, em conformidade com as demais condições impostas pelo estatuído na supracitada norma;
- Entende-se por “criação líquida de postos de trabalho”, a diferença positiva, num determinado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis e o número de saídas dos trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontram nas mesmas condições [al. d) do nº 2 do art.º 19º do EBF];
- Importa salientar que os encargos elegíveis para efeitos de majoração são “os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social” [al. c) do nº 2 do art.º 19º do EBF], tendo sido sancionado pela Direção de Serviços do IRC (DSIRC) que “remuneração fixa” é toda a remuneração auferida pelo trabalhador que não esteja dependente do desempenho individual, da equipa ou da empresa, bem como as remunerações acessórias enunciadas na al. b) do nº 3 do art.º 2º do CIRS, que se revelem de caráter fixo e nas condições aí enunciadas;
- A majoração máxima anual, por posto de trabalho, nos termos do nº 3 do art.º 19º do EBF, corresponde a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida (RMMG);
- Efetivamente, o entendimento que vinha a ser veiculado pela AT, através de diversas fichas doutrinárias (ou informações vinculativas, as quais têm o objetivo de vincular a AT, às conclusões plasmadas nas mesmas e não os contribuintes) considerava que, existindo um limite temporal para o benefício fiscal (5 anos) calculado com base no início da vigência do contrato de trabalho, então a majoração máxima anteriormente referida também devia ter por base o mesmo período. Pelo que, no exercício em que se verificasse o início ou o fim das condições de elegibilidade do trabalhador para o benefício, o limite máximo da majoração anual devia ser ajustado proporcionalmente ao tempo em que se mantiveram essas condições;
- A este respeito, importa referir que, por despacho de 2019-07-13, da Diretora Geral, exarado na Informação n.º 2019..., da Direção de Serviços do IRC, foi determinada a alteração da interpretação dada aos citados normativos, no sentido de que o limite máximo de majoração anual, por posto de trabalho, corresponda a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida (sem o seu ajustamento proporcional anteriormente defendido pela AT) nos anos inicial e final dos contratos de trabalho elegíveis, quando estes não sejam inteiramente coincidentes com o início e o fim do período de tributação.
- De notar ainda que, nos termos do nº 5 do art.º 19º do EBF, a majoração referente a este benefício não é cumulável com outros benefícios fiscais ou outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho, nomeadamente os previstos no DL nº 72/17, de 21 de junho, despacho conjunto nº 561/2001, de 22 de junho, Lei nº 53-A/2006, de 29 de dezembro (art.º 41º) e benefícios fiscais relativos à interioridade (art.º 43º do EBF, entretanto revogado pelo nº 1 do art.º 146º da Lei nº 64-B/2011, de 30 de dezembro);
Posto isto, importa aferir da verificação dos condicionalismos estabelecidos no art.º 19º do EBF, no caso em concreto, no qual se encontra em causa o seguinte:
- Considerando que o benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego, indicado no ponto anterior, foi apurado pelas sociedades dominadas com base na anterior interpretação da AT quanto ao estipulado no nº 5 do art.º 19º do EBF, pretende agora a reclamante que o mesmo seja corrigido, por forma a refletir a interpretação conferida pelo referido acórdão do STA e a correcção os lapsos detetados no seu apuramento, de acordo com as alterações explanadas nos pontos 24 a 29 da PI;
Assim, considera a reclamante, na qualidade de empresa dominante do Grupo fiscal, que a correta dedução do benefício fiscal da criação de emprego a ser refletida nas declarações individuais de rendimentos Mod.22 apresentadas pelas dominadas, com reflexo no apuramento do resultado tributável do Grupo, deve ser a seguinte:
A... – benefício fiscal passar de € 6.729,78 para € 7.798,00 – alteração resultante apenas da interpretação conferida pelo Acórdão do STA em referência (nos moldes detalhados no Doc. 7 anexo à PI);
B... - benefício fiscal passar de € 1.984,30 para € € 12.084,80 – alteração resultante apenas da interpretação conferida pelo Acórdão do STA em referência – nos moldes detalhados no Doc. 8 anexo à PI);
D...- benefício fiscal passar de € 1.157.017,82 para € 1.637.462,47 (alteração baseada na interpretação conferida pelo Acórdão do STA em referência e nos ajustes ao benefício fiscal desta empresa dominada decorrentes dos lapsos cometidos no seu apuramento inicial (nos moldes detalhados no Doc. 9 anexo à PI);
C...- benefício fiscal passar de € 1.332.654,89 para € 1.572.904,92 (alteração baseada na interpretação conferida pelo Acórdão do STA em referência e nos ajustes ao benefício fiscal desta empresa dominada decorrentes dos lapsos cometidos no seu apuramento inicial (nos moldes detalhados no Doc. 10 anexo à PI);
Atendendo a que o nº 1 do art.º 74º da LGT determina que “O ónus da prova dos factos constitutivos ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”, compete, por isso, à reclamante provar a efetiva criação líquida de postos de trabalho que alega ser dedutível na esfera das empresas dominadas, no período de 2017, nos termos previstos no art.º 19º do EBF e, bem assim, os correspondentes encargos suportados, uma vez que tais fatores se refletem no apuramento do consolidado do Grupo fiscal.
Para efeitos de prova do alegado, a reclamante procedeu à junção do citado acórdão do STA e de quadros de apuramento da criação líquida de emprego (pág. 72 a 110 – anexos à p.i. – GPS), onde evidencia o número interno de empregado, data de nascimento, data de entrada/contratação e as respectivas datas de início e fim e respetivos encargos majoráveis, relativos a cada uma das sociedades dominadas.
Junta ainda quadros de apuramento do benefício fiscal que pretende que lhe seja considerado no período de tributação de 2017, na esfera jurídica de cada dominada [mediante as alterações descritas nos pontos C), D) e E) da PI] e que constituem as alterações que pretende ver refletidas na autoliquidação do Grupo fiscal, de modo a que seja reembolsada do valor de € 160.928,97.
O anexo 11 à p.i. consubstancia um quadro resumo onde são evidenciadas as diferenças entre a Mod. 22 submetida e os ajustamentos à declaração de rendimentos corrigida, relativamente a cada uma das empresas dominadas, discriminando os encargos majoráveis e respetivos limites, os valores deduzidos nas correspondentes Mod.22 de 2017 e o benefício fiscal a deduzir apurado consoante os critérios uniformizados pelo citado Acórdão do STA.
Na p.i. (ponto 30) a reclamante apresenta um quadro resumo onde reflete os ajustamentos derivados do impacto das correções individuais na autoliquidação do Grupo fiscal e que suportam a diferença de IRC a reembolsar acima indicada, verificada entre a Mod.22 submetida e a respetiva repercussão das alterações pretendidas na autoliquidação do Grupo.
Todavia, através da análise aos supramencionados quadros anexos aos autos, constata-se que não contêm os elementos de suporte aos registos contabilísticos e ao apuramento do benefício em questão (quer quanto ao benefício inicialmente declarado, quer quanto ao acréscimo decorrente da uniformização de critério de cálculo do limite máximo do benefício uniformizado pelo do Acórdão do STA), nomeadamente a identificação dos funcionários elegíveis para efeitos do benefício (nome e número de identificação fiscal - NIF), com a correspondente data de admissão ou passagem a efetivo e idade, bem como, os encargos repartidos pelos diversos itens e o limite e valor do benefício para o período de tributação em análise.
Situação que, à partida, inviabiliza a confirmação dos valores do benefício apurados pelas empresas dominadas, através do cruzamento de informação resultante da consulta às aplicações informáticas da AT e o controle dos valores declarados.
Verifica-se também que, relativamente à criação líquida de emprego, não foram carreados aos autos cópias dos contratos de trabalho e adendas assinadas pelas duas partes, aquando da conversão em contrato sem termo, se for o caso, dos trabalhadores considerados elegíveis para efeitos do benefício fiscal em referência.
Bem como, cópias dos documentos comprovativos da conclusão do ensino secundário ou de frequência de uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade, no caso de trabalhadores em que é exigido tal requisito.
Acresce que não foram apresentados quaisquer comprovativos dos descontos efetuados para a Segurança Social com referência a qualquer dos trabalhadores que considerados elegíveis pelas sociedades dominadas, elemento que se afigura também indispensável para se aferir da aludida permanência ao serviço, ou inexistência de cumulatividade com outros incentivos de apoio ao emprego (cf. nº 5 do art.º 19º do EBF) e, bem assim, do apuramento dos encargos suportados pelas reclamantes com referência às contribuições para a SS.
Nesta conformidade, face às razões anteriormente aduzidas, não se afigura que os elementos probatórios anexos aos autos sejam bastantes para comprovarem a pretendida alteração à autoliquidação de IRC na esfera da reclamante, enquanto sociedade dominante do Grupo fiscal no qual as coligadas se incluem.
Com efeito, encontrando-se o sujeito passivo investido da condição de reclamante, cabe-lhe o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que alega, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, o que não se verifica no caso em apreço.
Consequentemente, os factos só devem ser considerados provados quando forem determinados com uma certeza absoluta, razão pela qual a não prestação de prova ou a sua prestação insuficiente não poderá deixar de influenciar o mérito da pretensão.”;
n) No seguimento do projecto de indeferimento, as Requerentes exerceram o direito de audição prévia, onde disponibilizaram, perante a AT, via pasta partilhada (Google Drive) a seguinte informação:
- Mapa por cada uma das sociedades Dominadas com identificação dos colaboradores por NIF e NISS, segregação da remuneração por tipologia e contribuições, bem como cálculos do apuramento do benefício fiscal;
- Contratos de trabalho assinados e respectivas adendas;
- Comprovativo de escolaridade para colaboradores com idade igual ou inferior a 23 anos;
- Relatórios Únicos (Anexo A – Quadro de Pessoal) submetidos junto do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, dos quais constam por colaborador, entre outra informação, a categoria profissional, data de admissão, NIF, NISS, data de nascimento, tipo de contrato, habilitações literárias, nível de qualificação, remuneração base, prémios, subsídios e trabalho suplementar;
o) Aquando do exercício do direito de audição as Requerentes registaram a existência de um lapso na quantificação das deduções relativas a contratos que foram objecto de conversão durante o ano de 2017 em contratos sem termo, decorrendo da correcção de tal lapso um montante superior susceptível de dedução quando comparado com o constante do pedido formulado com a entrega da Reclamação Graciosa;
p) Em 5 de Março de 2021, mediante despacho do Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, foi indeferido o pedido de Reclamação Graciosa;
q) Na fundamentação do indeferimento da Reclamação Graciosa referiu se o seguinte relativamente aos elementos juntos pelas Requerentes no exercício do direito de audição prévia que se encontram referidos no ponto m) da matéria de facto:
“I – Audição Prévia
Atendendo aos fundamentos de facto e de direito constantes do projecto de decisão, foi exarado em 2020-11-26, despacho no sentido do indeferimento do pedido, pela Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, por subdelegação, relativamente à autoliquidação de IRC, nº 2019..., referente ao período de tributação de 2017, em que a reclamante, na qualidade de sociedade dominante do grupo tributado ao abrigo do RETGS e em coligação de pedidos com as sociedades por si dominadas: C..., SA (C...), NIF ...; D..., SA (D...), NIF ...;A..., SA (A...), NIF:...;B..., SA (B...), NIF ..., solicita o reembolso do montante de € 160.928,97, por alegadamente, devido a orientações da AT, ter calculado erradamente o montante do benefício fiscal consagrado no art.º 19º do EBF (Criação Líquida de Postos de Trabalho - CLPT).
A reclamante foi notificada, na pessoa do seu anterior mandatário, pelo ofício nº..., de 2020-11-27, expedido através do registo CTT – RH ... PT, da mesma data, para, no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição prévia, previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT.
Nessa mesma data, foi comunicado à reclamante, através do ofício nº ..., que foi remetido ao mandatário a notificação para, querendo, exercer o direito de participação na decisão, na modalidade de audição prévia, nos termos do art.º 60º da LGT.
Considerando o estatuído no art.º 39.º do CPPT, quanto à perfeição das notificações, a notificação foi considerada concretizada em 2020-11-30.
Nesta sequência, veio a reclamante, através de email, datado de 2020-12-11, solicitar prorrogação do prazo anteriormente concedido para exercer o direito de audição prévia. Na mesma data, através do email 46/2020 da DJA, foi-lhe concedido o alargamento do prazo para exercício daquele direito, até ao limite máximo de 25 dias consignados na lei.
Ainda no âmbito do direito de audição do projecto de decisão, tendo a reclamante informado que o mandatário tinha sido alterado, foi então comunicado no mesmo email (nº 46/2020 desta DJA), que, nesse caso, deveria ser enviada a competente procuração forense.
Em 2020-12-15, a reclamante, através de correio eletrónico, remeteu a solicitada procuração, onde constitui sua bastante procuradora G..., com o NIF:... .
Tendo a reclamante requerido o envio dos elementos em falta através do recurso à técnica de amostragem, através do email nº .../2020, foi informada de que o procedimento de contencioso administrativo não contempla a utilização da metodologia solicitada.
Assim, em 2020-12-29, por conseguinte dentro do limite do prazo prorrogado, a reclamante veio exercer o direito de audição, através de correio eletrónico, tendo para o efeito enviado em anexo os seguintes ficheiros:
- Relatório Único – Anexo A – C...
- Relatório Único – Anexo A – D...
- Relatório Único – anexo A – A...
- Relatório Único – Anexo A- B...
- Mapas CLTT 2017 – VF (Excel)
- Link para acesso a pastas partilhadas para n/ análise (devido ao elevado número de colaboradores), contendo contratos de trabalho e comprovativo da escolaridade para colaboradores com idade menor ou igual a 23 anos.
Cumpre realçar que, apesar de ter sido indicado pela mandatária que os elementos supra enunciados respeitam ao procedimento de reclamação graciosa em curso e também ao procedimento ...2020... - REC 2020... DFL (deduzido autonomamente por outra entidade – H..., ACE, atualmente designada I..., ACE, com o NIF:...), não consta do peticionado qualquer destrinça, ou referência em concreto a cada uma das reclamações graciosas em apreciação (verificando-se inclusive que os mapas resumo com os cálculos e apuramento do benefício fiscal inerentes a cada reclamante constam da mesma folha de Excel).
Salienta-se que após consulta, na presente data, às aplicações informáticas da AT – Sistema de Contencioso Judicial Tributário, não constatamos a interposição de impugnação judicial, sobre a matéria em crise (cf. ficheiro PDF constante dos autos – GPS).
II – Questão Prévia – Extensão/Ampliação do pedido
A reclamante, vem no exercício do direito de audição, solicitar a ampliação dos montantes inicialmente reclamados na sua petição inicial, no montante de € 160.928,97, alterando também os parâmetros subjacentes ao apuramento do valor inicialmente solicitado.
No entanto, não especifica quais os montantes que, nesta sede, pretende que lhe sejam concedidos, nem quais os colaboradores alvo das mencionadas alterações adicionais, limitando-se a referir que “(…) aquando da recolha da informação solicitada, reparamos que os encargos anteriormente indicados na Reclamação, para os colaboradores cujo contrato foi convertido para contrato sem termo no decurso do ano de 2017, não estavam totalmente corretos. Nesse sentido, e tendo agora conseguido obter um detalhe mais preciso das referidas remunerações, incluímos no excel resumo agora enviado os valores que correspondem apenas aos valores recebidos pelo colaborador a partir da data da conversão do seu contrato para a termo. Adicionalmente, gostaríamos ainda de salientar que a diferença agora 'apurada resulta num benefício fiscal superior ao inicialmente peticionado, a favor das requerentes.”
De acordo com a disposição legal prevista no artigo 131º do CPPT, este pedido de ampliação deveria ter sido formulado dentro do prazo dos dois anos, o qual, tendo a Mod.22 sido submetida em 2018-06-29, terminaria em 2020-06-29. No entanto, a ampliação do pedido ocorreu apenas em exercício de direito de audição, ou seja, em 2020-12-29.
Pelo exposto, este pedido de modificação dos montantes inicialmente solicitados afigura-se-nos manifestamente intempestivo, pelo que não se procede à apreciação do mesmo.
III – Alegações da Reclamante
No exercício do direito de audição, a reclamante veio, via correio eletrónico apresentar elementos adicionais (email – entrada GPS 2020... e anexos A01 a A05), com vista a esclarecer e suportar o solicitado, remetendo em anexo os seguintes elementos (apresentados de forma comum a ambos os procedimentos de reclamação graciosa, conforme já referido anteriormente):
- Link para pasta partilhada, com todos os dados que lhe foi possível compilar;
- Mapa Excel com a identificação dos colaboradores por NIF e NISS, a segregação da remuneração por tipologia e contribuições, bem como os seus cálculos do apuramento do benefício fiscal;
- Contratos de trabalho assinados e respectivas adendas;
- Quadro resumo dos cálculos de apuramento das alterações ao benefício fiscal da criação líquida de emprego declarado na Mod.22 inicialmente submetida.
Conforme já referido no ponto anterior, por referência ao mapa elaborado em Excel com os cálculos, a reclamante acrescenta que, aquando da recolha da informação solicitada, reparou que os encargos anteriormente indicados na petição inicial da reclamação graciosa, para os colaboradores cujo contrato foi convertido para contrato sem termo no decurso do ano de 2017, não estavam totalmente corretos. Implicando este facto que a diferença, agora apurada, resulte num benefício fiscal superior ao inicialmente peticionado a favor das requerentes.
Por forma a complementar o envio da informação que considera comprovar o pretendido e com o propósito de se aferir a situação de cada um dos colaboradores por referência ao ano em análise, a reclamante optou por enviar também os Relatórios Únicos submetidos junto do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, bem como os NIF's e NISS dos colaboradores.
IV – Análise e Parecer
Confrontada a informação constante dos documentos disponibilizados e tendo presente os factos e fundamentos invocados no projecto de decisão notificado à reclamante, constata-se que pretende que seja aceite um apuramento da criação líquida de emprego, nesta sede, divergente do apuramento efectuado na PI, em virtude das correções que efetuou na sequência dos lapsos que afirma ter detetado aquando da preparação da documentação solicitada no projecto de decisão (no entanto, não quantifica as divergências detetadas).
Nesta senda, vem agora juntar os elementos elencados no ponto anterior que se encontravam em falta, nomeadamente, os certificados de habilitações e certificados profissionais dos trabalhadores com idade inferior a 23 anos e contratos de trabalho a termo certo, todavia, relativamente aos link’s fornecidos pela reclamante para acesso a pastas partilhadas, temos a informar que o sistema informático da AT impõe restrições que impedem que possamos aceder a essas pastas.
No entanto, verifica-se que no peticionado a reclamante não logrou estabelecer uma correlação direta, de forma devidamente evidenciada, entre os dados que suportam as correções iniciais, as que afirma só agora ter detetado (que, conforme já demonstrado anteriormente, são extemporâneas no âmbito da presente reclamação graciosa) e os restantes elementos fornecidos.
Pois, no email enviado no âmbito do direito de audição, faz apenas uma breve referência aos lapsos por si identificados e à retificação do cálculo do benefício relativo à criação líquida de postos de trabalho (CLPT) que entende ser dedutível em 2017, remetendo para o quadro resumo elaborado em Excel em anexo (entrada GPS – 2020...).
Em suma, da análise aos elementos constantes dos autos, constata-se que a reclamante não evidencia de forma clara e objetiva as alterações que efetuou e que tiveram repercussões nos valores de benefício apurados, quer na p.i., quer agora em sede de direito de audição, o que inviabiliza a destrinça entre os elementos suscetíveis de análise e os abrangidos pela extensão do pedido, cuja análise fica prejudicada face à sua intempestividade.
Assim, uma vez que a reclamante procedeu a retificações nas entradas e saídas e remunerações dos colaboradores que constavam dos mapas de apuramento da CLPT apresentados na p.i., sem que, no entanto, tenha evidenciado que colaboradores foram alvo dessas alterações, não se torna possível aferir com assertividade e clareza quais os montantes do benefício apurado que correspondem à extensão do pedido.
Ademais, as alterações a que a reclamante procedeu em sede de direito de audição encontram-se entrosadas com os valores anteriormente apurados, não permitindo a confirmação dos mesmos face aos elementos ora apresentados.
Nesta sequência, cumpre referir que não se torna possível quantificar o benefício fiscal resultante da criação líquida de emprego verificada, atendendo a que, em sede de direito de audição, a reclamante apurou uma criação líquida, no ano de 2017, diferente da apurada inicialmente aquando da apresentação da reclamação graciosa, solicitando que lhe seja considerado um valor de benefício superior ao anterior, sem que sequer o tenha quantificado.
Em síntese, não evidencia de forma clara e inequívoca todos os dados e critérios que levaram à reformulação do cálculo, de maneira a permitir a confirmação dos elementos constantes da p.i., conforme lhe competia, nos termos do art.º 74º da LGT, uma vez que é a reclamante quem pretende que lhe seja aceite a dedução do benefício fiscal em referência.
De salientar ainda que permanecem em falta alguns elementos de suporte essenciais à confirmação dos dados fornecidos pela reclamante, nomeadamente, a devida evidência das alterações efetuadas pela reclamante, bem como os correspondentes extratos contabilísticos, ou outros elementos da contabilidade, que corroborem, de forma clara, concreta e inequívoca, o apuramento do benefício em questão.
Quanto à interpretação do disposto no nº 3 do art.º 19º do EBF, com efeito, por despacho de 2019-07-13, da Diretora – Geral, exarado na Informação n.º 2019..., da Direção de Serviços do IRC, foi determinada a alteração da interpretação dada aos citados normativos, no sentido de que o limite máximo de majoração anual, por posto de trabalho, corresponde a 14 vezes a retribuição
mínima mensal garantida (sem o seu ajustamento proporcional anteriormente defendido pela AT) nos anos inicial e final dos contratos de trabalho elegíveis, quando estes não sejam inteiramente coincidentes com o início e o fim do período de tributação.
Todavia, atendendo à falta de clareza na justificação das retificações efetuadas pela própria reclamante que levaram à alteração dos valores inicialmente solicitados e à manifesta extemporaneidade da extensão do pedido, a sua pretensão não pode ser atendida.
Nesta conformidade, constatando-se que a reclamante não veio, em sede de direito de audição, juntar aos autos elementos novos suficientemente capazes de comprovar o alegado, e, bem assim, de contrariar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa projetada, mantêm-se os pressupostos e a fundamentação que levaram a concluir pelo indeferimento do pedido.
V – Conclusão
Face ao exposto, atendendo a que a reclamante apresentou elementos suscetíveis de alterar o sentido da decisão projetada, pelo que se propõe o INDEFERIMENTO da presente reclamação graciosa, de acordo com os fundamentos descritos”;
r) Em 9 de Abril de 2021, mediante carta registada, a AT a remeteu a notificação da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa;
s) Inconformadas com a decisão de indeferimento, as Requerentes apresentaram em 9 de Julho de 2021 o pedido de constituição de Tribunal Arbitral que está na origem do presente processo, no qual sustentam, além do mais, terem verificado a incorrecção dos valores do benefício fiscal de criação líquida de emprego apresentados aquando da submissão das Modelos 22, mas igualmente incorrecção de valores face aos vertidos na Reclamação Graciosa apresentada, pugnando pela dedutibilidade dos seguintes montantes por sociedade Dominada:
-A...: 7.798,00 €;
-B...: 15.596,00 €;
-C...: 1.585.226,17 €;
-D...: 1.637.936,26 €;
t) Para efeito da consideração dos valores a deduzir no âmbito do benefício fiscal referidos no ponto antecedente, as Requerentes procederam à junção da seguinte documentação:
a) Documento interno do Grupo contendo mapas por cada uma das sociedades Dominadas com o detalhe do apuramento do benefício fiscal de 2017 – Doc. 14 junto com o pedido arbitral – onde constam as seguintes informações:
(i) Identificação de cada um dos colaboradores elegíveis para efeitos de aplicação do benefício, NIF, NISS, data de nascimento, data de admissão ou passagem a efectivo e idade do colaborador, nessa data;
(ii) Valor do benefício fiscal de criação de emprego com referência ao período de tributação de 2017, por colaborador, considerado para efeitos da submissão das Modelos 22;
(iii) Valor do benefício fiscal de criação de emprego com referência ao período de tributação de 2017, por colaborador, que as Requerentes entendem susceptível de dedução;
b) Documento interno do Grupo contendo as tabelas que identificam encargos suportados por cada uma das Dominadas em 2017 e respectivas componentes remuneratórias atribuídas aos colaboradores nesse período de tributação – Doc. 15 junto com o pedido arbitral;
c) Documentos relativos à conversão dos contratos de trabalho a termo para contratos de trabalho sem termo – Doc. 16 junto com o pedido arbitral – onde constam as seguintes informações:
(i) Cópias dos contratos de trabalho sem termo celebrados;
(ii) Cartas de comunicação aos colaboradores da conversão do contrato de trabalho a termo para contrato de trabalho sem termo;
d) Declarações emitidas por cada uma das sociedades Dominadas, onde se mencionam as importâncias devidas aos colaboradores no ano de 2017, as retenções na fonte de IRS realizadas e contribuições para a Segurança Social entregues – Documento n.º 17 junto com o pedido arbitral;
e) Cópia dos relatórios únicos da Segurança Social submetidos pelas sociedades Dominadas relativos aos anos de 2011 a 2018 – Doc. 18 junto com o pedido arbitral.
III.1.2. Factos não provados
11. Com relevo para a decisão da causa, não existem outros factos que devam ser considerados provados ou não provados.
III.1.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
12. O Tribunal não tem o dever de pronunciar sobre toda a matéria de facto alegada pelas partes, tendo antes o dever de seleccionar a que interessa à decisão, tendo em conta a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelas requerentes, e decidir se a considera provada ou não provada, conforme resulta do artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e do artigo 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT.
Considerando as posições assumidas pelas partes nas respectivas peças processuais, o princípio da livre apreciação da falta de contestação especificada dos factos expresso nos artigos 110.º, n.º 7 e 115.º, n.º 1, ambos do CPPT, a prova documental e a cópia do processo administrativo junto aos autos, que foram objecto de exame e avaliação cuidada por este Tribunal, tendo em conta as regras da experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da envolvência, consideraram-se provados e não provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
Não se consideraram provadas nem não provadas as alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada
IV. Matéria de direito
IV.1. Benefício fiscal por criação de emprego – artigo 19.º do EBF
13. A questão central a dirimir no presente processo consiste na apreciação do vício de violação de lei imputado pelas Requerentes ao indeferimento do pedido de Reclamação Graciosa apresentado quanto aos actos de autoliquidação de IRC do período de tributação de 2017, com fundamento na violação do disposto no artigo 19.º do EBF que consagrava um benefício para a criação de emprego.
À data dos factos, a redacção daquela norma era a seguinte:
“Artigo 19.º
Criação de emprego
1 – Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:
a) “Jovens” os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;
b) 'Desempregados de longa duração' os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses;
c) «Encargos» os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;
d) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
3 – O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
4 – Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respectiva entidade patronal.
5 – A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.
6 – O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.”.
Sinteticamente, com a previsão deste benefício fiscal atribuía-se aos contribuintes o direito à dedução enquanto custo do exercício majorado em 50% dos encargos despendidos com a criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, desde que admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado. Enquanto “criação líquida de postos de trabalho” considerava-se o diferencial positivo num mesmo período de tributação entre o número de colaboradores contratados e o número daqueles que, nesse mesmo exercício, tenham visto cessar a sua relação laboral. Verificando-se essa diferença, e assumindo o preenchimento dos demais pressupostos, aqueles encargos podiam ser majorados em 50%, tendo como montante máximo por posto de trabalho, o montante correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
No que concerne à interpretação deste artigo, foi sendo entendimento reiterado da AT ao longo do período de vigência da norma que a quantificação do montante dedutível para efeitos do benefício fiscal em apreço tinha de ser sujeito a uma “diarização”, ou seja, o montante da majoração apenas podia ser considerado na proporção temporal durante o qual o contrato de trabalho por tempo indeterminado vigorou em cada exercício de tributação. Dito de outro modo, entendia a AT que sempre que a vigência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado nas condições supra referidas não vigorasse na totalidade de um período de tributação, impor-se-ia corrigir o montante da majoração susceptível de dedução no sentido de desconsiderar o benefício relativamente ao ou aos segmentos temporais durante os quais, nesse mesmo período de tributação, o referido contrato de trabalho não tivesse estado em vigor.
Este entendimento foi defendido pela AT em diversa doutrina administrativa, designadamente, na informação vinculativa emitida no âmbito do processo n.º 1498/2006 mediante despacho do Director Geral de 26 de Setembro de 2006, bem como em diversos processos, conforme se constata, por exemplo, da leitura da decisão arbitral proferida em 4 de Março de 2019 no âmbito do processo n.º 202/2018-T, onde consta que a AT defendeu que “face ao disposto nos n.ºs 3 e 5 do artigo 19.º do EBF, o limite anual deve ser ajustado proporcionalmente ao n.º de meses em que se verificam as condições, sob pena de ser considerado um benefício fiscal superior ao que consta da lei”. Em idêntico sentido, vejam-se as conclusões do recurso apresentado pela AT junto do Tribunal Central Administrativo (“TCA”) Sul, no âmbito do processo n.º 881/12.5BELRS, cujo acórdão data de 10 de Fevereiro de 2022:
XIX) Afigura-se assim que o supra entendimento perfilhado pela AT se configura adequado para atingir o objetivo prosseguido com a criação do beneficio fiscal da criação líquida de postos de trabalho, ou seja, a Impugnante continua a ter a vantagem social decorrente do benefício fiscal, e por outro lado, o ajustamento do beneficio fiscal é também proporcional ao objetivo visado, dado que o benefício está associado ao n.º de meses em que os contratos de trabalho reúnem as condições elegíveis pelo art.º 17 do EBF, caso contrário teríamos um benefício fiscal superior ao que consta da lei.
XX) Assim sendo, a aplicação proporcional do limite máximo de majoração por referência ao período de vigência do contrato que está subjacente à concessão do benefício fiscal, justifica-se, inequívoca e inevitavelmente, por razões relativas à salvaguarda da coerência do regime fiscal.
XXI) O mesmo entendimento é seguido na informação vinculativa relativa ao processo n.º 1498/2006, com despacho de 26.09.2006 do Diretor Geral, onde refere que “o prazo de 5 anos a que se refere o n.º 3 do artigo 17.º do EBF pode refletir-se em 6 exercícios económicos, sempre que o início do contrato de trabalho não coincida com o início do exercício económico.”.
Ora, foi com base na interpretação que a AT propugnava nesta matéria que as Requerentes ajustaram proporcionalmente nas respectivas Modelos 22 do período de tributação de 2017 o montante de benefício fiscal a deduzir por criação de emprego previsto no artigo 19.º do EBF e que se encontra expresso no ponto e) da matéria de facto dada como provada nos presentes autos.
Em 8 de Maio de 2019, o STA proferiu um acórdão uniformizador de jurisprudência, no âmbito do processo n.º 01054/17.6BALSB, onde concluiu que “As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do art. 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do art. 19.º do EBF se extraia o sentido de que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do referido artigo cessem ou se iniciem durante o período de tributação, o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 deva ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos”.
Na sequência deste acórdão do STA, segundo o qual o artigo 19.º do EBF não admite a interpretação de que o limite máximo da majoração deva ser limitado em termos proporcionais ao concreto período em que um contrato de trabalho vigorou durante um certo período de tributação, veio a AT a inverter o seu posicionamento sobre esta matéria. Para tal efeito, por via da Instrução de Serviço n.º .../2019, de 21 de Agosto de 2019, da Subdiretora-geral do IR e das Relações Internacionais foi sancionada a seguinte doutrina administrativa: “Relativamente à matéria em epígrafe, considerando que a jurisprudência já emitida, nomeadamente no Acórdão de uniformização de jurisprudência pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do Processo n.º 01054/17.6BALSB, de 2019-05-08, é contrária à interpretação assumida pela AT;
Foi, por despacho de 2019-07-13, da Diretora – Geral, exarado na Informação n.º 2019..1, da Direção de Serviços do IRC, determinada a alteração da interpretação dada aos citados normativos, no sentido de que o limite máximo de majoração anual, por posto de trabalho, corresponde a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida (sem o seu ajustamento proporcional anteriormente defendido pela AT) nos anos inicial e final dos contratos de trabalho elegíveis, quando estes não sejam inteiramente coincidentes com o início e o fim do período de tributação.
Entendeu o Tribunal que “As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do artigo 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do artigo 19.º do EBF se extraia o sentido de que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do referido artigo cessem ou se iniciem durante o período de tributação, o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 deva ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos.”
Assim, nos procedimentos que estejam pendentes de decisão, como sejam, nomeadamente, as reclamações, os recursos ou as impugnações, em que esteja a ser discutida a matéria em apreço, deve ser refletido o entendimento agora sancionado.”. (destaque nosso)
Contextualizada, de forma sucinta, a evolução da problemática interpretativa sobre a quantificação da majoração do benefício fiscal por criação de emprego que se encontrava consagrado no artigo 19.º do EBF, cumpre então analisar se assistia razão às Requerentes quanto à ilegalidade imputada aos actos de autoliquidação de IRC e ao indeferimento de reclamação graciosa, com fundamento na inaplicabilidade da “diarização” ou redução proporcional do quantum de benefício fiscal que entendiam ter direito a deduzir no período de tributação de 2017.
Como ponto de partida, cumpre relembrar que a AT negou as pretensões das Requerentes por entender que no âmbito do procedimento gracioso aquelas não apresentaram os necessários elementos de suporte aos registos contabilísticos que suportassem quer o quantum inicialmente deduzido nas autoliquidações de IRC, quer o acréscimo de dedução que em sede de Reclamação Graciosa pretendiam ver deferido com base no acórdão uniformizador de jurisprudência do STA. No fundo, não seria possível certificar o montante de benefício apurado pelas Requerentes o que significava, no entender da AT, que aquelas não teriam cumprido com o ónus probatório que lhes era imposto nos termos do artigo 74.º da LGT.
Apesar de entender que as Requerentes não tinham reunido os elementos de suporte necessários ao preenchimento dos requisitos de que dependia a dedução do benefício fiscal por criação de emprego previsto no artigo 19.º do EBF, certo é que a AT não negou às Requerentes a sua dedução, pelo menos na extensão inicialmente prevista, nas autoliquidações do IRC do período de 2017.
O que se revela contraditório já que, atento o exposto, seria expectável e, de resto, constituída um dever do sujeito activo da relação jurídico tributária, desencadear o necessário procedimento com vista ao concreto apuramento das deduções já materializadas. Para o efeito, poderia a AT, a título de exemplo, ter desencadeado um procedimento inspectivo de forma a apurar a concreta situação jurídico tributária das Requerentes. Se no seguimento dessas diligências a AT concluísse que o benefício fiscal por criação de emprego tinha sido ilegalmente deduzido, caberia então proceder às consequentes correcções ao IRC apurado no período de 2017. Tudo, porquanto a AT está vinculada na sua actuação à prossecução do interesse público e à descoberta da verdade material, assim garantindo que a tributação é feita no estrito cumprimento do princípio da legalidade tributária, tal como impõem os artigos 55.º e 58.º, ambos da LGT e o artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”).
Sucede que nada disto aconteceu. Não só a AT não esclareceu as ambiguidades e, sobretudo, incoerências e contradições práticas entre a posição que assumiu na Reclamação Graciosa e as consequências que dela retirou, como também não demonstrou a concreta medida da insuficiência dos elementos de prova juntos pelas Requerentes para certificar os requisitos constantes do artigo 19.º do EBF.
A este respeito, convém antes de mais registar que nos termos do artigo 75.º da LGT se presumem verdadeiras e de boa-fé as declarações apresentadas pelas Requerentes, encontrando-se abrangidas por essa presunção a contabilidade e os dados e apuramentos contabilísticos a esta atinentes. Por conseguinte, se a AT não demonstrar a falta de correspondência entre o teor de tais declarações, da contabilidade ou da escrita com a realidade, o seu conteúdo terá de se considerar como verdadeiro. Ainda para mais quando estão em causa sujeitos passivos legalmente vinculados ao regime da contabilidade organizada, sujeitos a certificação legal de contas por Revisor Oficial de Contas nos termos do artigo 413.º do Código das Sociedades Comerciais e, inclusive, objecto de acompanhamento pela Unidade de Grandes Contribuintes da AT.
Neste sentido, veja-se a título de exemplo o acórdão do TCA Sul proferido em 8 de Fevereiro de 2018, no âmbito do processo n.º 892/12.0BELRS, no qual se referiu que “I - Deve entender-se que os factos tributários expressos nas declarações apresentadas pelo contribuinte são verdadeiros e que nenhuns outros podem relevar, relativamente a esse contribuinte, para efeitos de incidência tributária e, por conseguinte, de sujeição a imposto. No entanto, tratando-se de uma presunção legal, o legislador admite, contudo, a sua ilisão através da produção, por parte da Administração Tributária, de prova em sentido contrário. II - Apenas se admite o afastamento da veracidade das declarações apresentadas quando a AT demonstre inequivocamente a existência de um facto tributário não reflectido nessas declarações ou divergente do declarado, através de elementos carreados para o procedimento, tendo em vista ilidir a presunção da veracidade das mesmas.”.
Portanto, ao gozarem as Requerentes da presunção prevista no artigo 75.º da LGT e ao terem estas apresentado elementos de comprovação do seu direito à dedução do benefício fiscal aqui em questão, era sobre a AT que recaía o ónus de realizar a contraprova relativamente aos factos alegados pelas Requerentes, tornando-os duvidosos nos termos do disposto no artigo 346.º do Código Civil. Só desta forma poderia a AT considerar demonstrada a verificação dos factos constitutivos dos direitos que invocou, assim cumprindo com o ónus que lhe era imposto nos termos do artigo 74.º da LGT.
Invocou ainda a AT em sede graciosa e na presente instância arbitral, em ordem a sustentar o indeferimento e a improcedência dos pedidos formulados pelas Requerentes, que a documentação por aquelas apresentada, para além de revestir natureza interna, não permitia no seu conjunto aferir a conformidade do benefício fiscal usufruído e a usufruir com base na jurisprudência uniformizadora do STA. Acontece que para fundamentar a sua posição a AT limitou-se a refutar de forma genérica e não concretizada, sem mais, a documentação junta pelas Requerentes, nunca colocando em crise a metodologia de cálculo do benefício fiscal aqui em questão.
Esta falta de impugnação especificada dos elementos de suporte juntos pelas Requerentes é assumida pela própria Requerida quando expressamente se refere ao facto de o acesso a pastas partilhadas – designadamente, via Google Drive – colocadas à disposição pelas Requerentes aquando do exercício do direito de audição, ser de acesso proibido por restrições do sistema informático da AT. Ora, a não análise da documentação por essa via disponibilizada à AT por suposta limitação informática para o efeito não pode deixar de apenas a esta ser imputável, para além de que o acesso por tal via a “pastas partilhadas” não se crê especialmente complexo, desajustado e desproporcionado. Ainda para mais quando se está perante contribuintes sujeitos a acompanhamento pela “Unidade de Grandes Contribuintes”, isto é, perante sujeitos passivos que, não raras vezes, devido ao elevado número de operações, recursos humanos, entre outros factores, são geradores de um elevado volume de dados, pouco ou nada compatíveis com a utilização de suporte físico. O que é precisamente o caso das ora Requerentes no que ao universo de colaboradores e ao conjunto de elementos de suporte à comprovação dos pressupostos previstos no artigo 19.º do EBF diz respeito, bastando para tal conclusão observar a extensa documentação junta por estas ao procedimento gracioso e ao pedido de pronúncia arbitral.
Tendo presente a vinculação da AT ao princípio da legalidade e ao princípio do inquisitório já anteriormente evidenciada, não se afigura consentâneo que perante a pretensa incapacidade de aceder à informação e documentação disponibilizada pelas Requerentes em sede de audição prévia e sem mais qualquer diligência conhecida tendente a apurar a pertinência dos documentos partilhados, a AT tenha concluído que as Requerentes não haviam, afinal, apresentado documentação suficiente que permitisse a validação do montante de benefício fiscal cuja dedução era permitida. À referida omissão de análise de parte da documentação disponibilizada e à falta de contestação especificada dos elementos probatórios juntos pelas Requerentes, acresce ainda o facto de a AT não ter colocado em crise a presunção de veracidade e boa-fé não só do teor das autoliquidações, como também dos elementos, dados e apuramentos que suportam a sua contabilidade, avançados em sede de Reclamação Graciosa pelas Requerentes.
Por conseguinte, é por si só inócuo o argumento da AT de que as Requerentes se teriam apoiado em meros documentos internos em ordem a demonstrar o quantum de benefício que entendiam ser dedutível nos termos da lei. Ainda para mais quando não vigorava um regime de prova vinculada no âmbito do artigo 19.º do EBF. Quer isto dizer que a lei não obstava à apresentação de elementos probatórios internos e não impunha a apresentação de uma determinada prova para o reconhecimento da verificação dos pressupostos de que dependia a dedução do benefício fiscal por criação de emprego. E se o legislador não procedeu a qualquer distinção, ou seja, não estabeleceu qualquer tipo de limitação quanto à concreta ou específica tipologia documental na qual se pode ou não suportar probatoriamente o direito à dedução em sede de IRC de tal benefício fiscal, não cabe ao intérprete distinguir e proceder a essa mesma limitação tipológica, em obediência às regras hermenêuticas da interpretação constantes do artigo 9.º do Código Civil. Portanto, o carácter interno dos elementos de prova juntos pelas Requerentes – e nos quais, de resto, se encontram espelhados os cálculos por colaborador em ordem à quantificação da dedução majorada do benefício fiscal em apreço – não era por si só um argumento suficiente para que se considerasse cumprido o ónus de contraprova que recaía sobre a AT.
Aqui chegados, cumpre precisar que, em bom rigor, não só a AT não logrou colocar em causa o direito à extensão do quantum de dedução do benefício fiscal, como, acima de tudo, não colocou em causa o preenchimento na esfera das Requerentes dos pressupostos de aplicabilidade do benefício previstos no artigo 19.º do EBF.
É que, conforme prontamente se referiu supra, a AT não retirou quaisquer consequências materiais, designadamente em matéria de correcção dos actos de autoliquidação, resultantes da suposta impossibilidade de validar e confirmar os valores do benefício apurados pelas Requerentes. De facto, em sede do procedimento gracioso a AT não alegou nem colocou em causa que as Requerentes não tenham efectivamente procedido à criação líquida de emprego na qual se baseia o direito à dedução em sede de IRC dos encargos majorados a que respeita o artigo 19.º do EBF. Tanto assim é que a AT continuou a aceitar a dedução do quantum de benefício inicialmente deduzido o que implica, necessariamente, que estavam reunidos os respectivos pressupostos de aplicação.
Tendo isto presente, resta a este Tribunal apreciar a legalidade do método de cálculo utilizado na quantificação do benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego aqui em questão.
A este respeito, quer as Requerentes, quer a Requerida, não mostram qualquer dissonância que o critério interpretativo pelo qual se deve pautar a quantificação da dedução do benefício fiscal previsto no artigo 19.º do EBF corresponde ao critério defendido pelo STA no acórdão uniformizador de jurisprudência já anteriormente referido.
Acresce que também não é controvertido que os valores deduzidos pelas Requerentes nas respectivas autoliquidações de IRC do período de 2017 não se encontram em conformidade com o método de cálculo defendido no acórdão uniformizador de jurisprudência do STA, já que foram calculados com base no critério do “ajuste proporcional” ou “diarização” anteriormente defendido pela AT.
Sendo certo que a AT nada alegou ou invocou de forma a colocar em crise ou indiciar que os cálculos apresentados pelas Requerentes eram destituídos de aderência ao enquadramento jurídico-fiscal decorrente, quer da interpretação que levou à dedução do benefício deduzido nas autoliquidações de IRC, quer do pretendido quantum de dedução invocado como decorrente da interpretação posteriormente firmada pelo STA.
Em face do exposto, tendo em conta que não foi ilidida a presunção de veracidade e boa-fé dos elementos contabilísticos e dos elementos de suporte que lhes estão subjacentes, tendo em conta que a AT não cumpriu com o ónus da prova que sobre si recaía, tendo em conta que não foi colocado em causa o cumprimento dos pressupostos de que dependia a aplicabilidade do benefício fiscal por criação líquida de emprego previsto, à data dos factos, no artigo 19.º do EBF e tendo em conta que a documentação junta aos presentes autos se demonstra apta a verificar o acréscimo à quantificação do benefício fiscal inicialmente deduzido, não poderá deixar de se concluir pela ilegalidade do indeferimento do pedido de Reclamação Graciosa e, consequentemente, dos actos de autoliquidação que constituem o seu objecto, na medida em que não reflectem o montante da dedução decorrente da metodologia de cálculo versada na interpretação jurisprudencial uniformizada pelo STA e à qual este Tribunal adere, impondo se consequentemente a anulação daqueles actos na concreta medida em que materializaram um “ajuste proporcional” não previsto no artigo 19.º do EBF, com as devidas consequências legais.
IV.2. Extensão da decisão anulatória quanto aos actos de liquidação de IRC
14. Tendo-se concluído pela ilegalidade do indeferimento do pedido de Reclamação Graciosa apresentado pelas Requerentes e, consequentemente, pela ilegalidade dos actos de autoliquidação de IRC que constituem o seu objecto, cumpre ainda precisar a extensão do efeito da decisão anulatória.
No seu pedido arbitral peticionaram as Requerentes a consideração e dedução no Quadro 07 da declaração Modelo 22 de IRC de 2017 do benefício fiscal da criação de emprego no montante de 7.798,00 € quanto ao A..., de 4.871,47 € quanto ao B..., de 1.455.189,69 € quanto ao C... e de 1.483.551,01 € quanto ao D..., bem como a consequente correcção do lucro tributável (prejuízo fiscal no caso da C...) individual de cada Dominada declarado no período de tributação de 2017 e, consequentemente, o reembolso do montante de imposto indevidamente pago por erro na autoliquidação no valor de 102.271,58 €.
Quanto a este conjunto de pedidos revela-se necessário precisar que “O processo arbitral tributário, à semelhança do que acontece com a impugnação judicial, é, essencialmente um contencioso de mera anulação. Não obstante, à semelhança do que sucede com o contencioso tributário impugnatório no âmbito dos tribunais tributários estaduais, existem alguns poderes condenatórios, estritamente ligados ao poder anulatório, relacionados com o direito a juros indemnizatórios, com o direito a indemnização por prestação indevida de garantia ou com o direito à restituição do imposto indevidamente pago.
Ressalvadas estas excepções, estaremos sempre perante um contencioso de mera anulação, o que significa que perante a impugnação de um acto tributário junto de um tribunal arbitral, a este tribunal caberá apenas considerar o acto legal ou ilegal e, em consequência, mantê-lo ou anulá-lo, cabendo à AT retirar as consequências da eventual decisão anulatória, no respeito pelo disposto no art.º 24.º do RJAT.”, conforme se referiu no acórdão arbitral de 1 de Junho de 2021, proferido no âmbito do processo n.º 694/2019 T.
Ainda a respeito desta temática, referiu-se no acórdão do TCA Norte, proferido em 9 de Julho de 2020, no âmbito do processo n.º 9655/16.3BCLSB que “Ao contrário do que sucede no domínio das ações administrativas, quando está em causa a legalidade de atuação da administração, no âmbito das quais o julgador pode emitir injunções e pronúncias condenatórias relativamente à Administração, condenando-a à prática de ato com um conteúdo determinado, tal não sucede no âmbito do contencioso tributário de impugnação de ato de liquidação (quer arbitral quer estadual) com esse alcance, não estando legalmente prevista a possibilidade de condenação à prática de ato devido.”
Tendo em conta a natureza essencialmente anulatória do contencioso arbitral tributário acabada de evidenciar com base na citada jurisprudência, constata-se que ao Tribunal Arbitral não assistem os poderes para emitir as injunções condenatórias formuladas pelas Requerentes no seu pedido arbitral. Assim sendo, e porquanto o apuramento da quantificação do montante de benefício fiscal que pode ser deduzido consiste numa tarefa cuja competência é atribuída por lei à AT, devem os actos de autoliquidação de IRC impugnados nos presentes autos ser parcialmente anulados, cabendo à AT a posterior quantificação do montante de benefício fiscal a deduzir, se necessário em sede de execução de julgados, de modo a conformar os actos de autoliquidação impugnados com os termos da presente decisão arbitral anulatória, da qual decorre o aumento do quantum de benefício fiscal a deduzir. Nesse exercício, haverá que ter em consideração que a quantificação do montante de benefício fiscal a deduzir não poderá ser superior ao quantum que tiver sido peticionado no âmbito da Reclamação Graciosa, conforme sucede com o montante invocado pelas Requerentes B... e C...no âmbito do pedido arbitral, sob pena de uma inadmissível ampliação do escopo impugnatório que se encontra limitado pelo dies a quo fixado pelos artigos 131.º, n.º 1, do CPPT e 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
IV.3. Juros indemnizatórios
15. Peticionaram ainda as Requerentes o pagamento dos juros indemnizatórios nos termos do n.º 6 do artigo 137.º do Código do IRC e dos artigos 43.º, n.º 1 e 100.º da LGT.
Dispõe-se a este respeito no artigo 43.º, n.º 1, da LGT que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”.
Quanto à aplicabilidade deste regime aos casos de autoliquidação de imposto refere JORGE LOPES DE SOUSA, em Código de Procedimento e de Processo Tributário, Vol. I, 6.ª ed., 2011, Áreas Editora, p. 537 que “Nas situações em que a prática do acto que define a dívida tributária cabe ao contribuinte (como sucede, nomeadamente, nos referidos casos de autoliquidação (…) o erro passará a ser imputável à Administração Tributária após o eventual indeferimento da pretensão apresentada pelo contribuinte, isto é, a partir do momento em que, pela primeira vez, a Administração Tributária toma posição sobre a situação do contribuinte, dispondo dos elementos necessários para proferir uma decisão com pressupostos correctos. Será indiferente, para este efeito de imputabilidade do erro, gerador de dívida de juros indemnizatórios, que se trate de caso de impugnação administrativa necessária ou facultativa, pois, em qualquer dos casos, a decisão da impugnação (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) é um acto da autoria da Administração Tributária, pelo que o eventual erro ser-lhe-á imputável, a partir do momento em que o praticou”.
No caso em apreço concluiu-se pela ilegalidade do indeferimento da Reclamação Graciosa nos termos anteriormente evidenciados, o que significa que a Requerida, tendo tido a oportunidade de sanar uma situação de ilegalidade, decidiu mantê-la na ordem jurídica, erro que só a si é imputável.
Tendo a Reclamação Graciosa sido apresentada em 19 de Junho de 2020 e decidida em 5 de Março de 2021, isto é, para além do prazo legal de quatro meses fixado no n.º 1 do artigo 57.º da LGT, deve o termo inicial do direito a estes juros ter lugar desde o terminus do mesmo, ou seja, desde 20 de Outubro de 2020, os quais deverão ser apurados em execução do presente acórdão, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal supletiva, nos termos conjugados dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
V. DECISÃO
Nestes termos, acorda este Tribunal Arbitral em:
a) Anular a decisão de indeferimento do pedido de Reclamação Graciosa impugnado nos autos;
b) Anular parcialmente os actos de autoliquidação de IRC de 2017 objecto daquele procedimento, nos termos acima expostos;
c) Condenar a Requerida a restituir à Requerente o montante de imposto indevidamente pago, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios, nos termos acima referidos;
d) Condenar a Requerida nas custas do processo.
VI. VALOR DO PROCESSO
De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 102.271,58 €.
VII. CUSTAS
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de 3.060,00 €, a cargo da Requerida, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Lisboa, 11 de Abril de 2022.
Os Árbitros,
Carla Castelo Trindade
José Campos Amorim
Luís Ricardo Farinha Sequeira (relator)